1. DISCURSO, TOM e CARÁTER:
uma análise do ethos tucano
(Dissertação de Mestrado de Fabiana Miqueletti. IEL/Unicamp, 2002)
Apresentação: Bruno Sampaio Garrido
Disciplina: Produção de Sentido e Alteridade
Docente: Profª. Dra. Marina Célia Mendonça
2.
Capítulo analisado: “Tucanos, 'mal-entendidos' e a
modalização autonímica (capítulo 3).
Objetivos da autora no capítulo: analisar as formas de
heterogeneidade mostrada no discurso e do ethos.
Estudar os mal-entendidos no discurso e as formas do
enunciador em corrigir “erros de interpretação”, isto é,
em tentar fixar o sentido em meio a outros possíveis
(não-coincidência com a palavra consigo mesma).
Estratégias usadas: formas metaenunciativas e sinais de
pontuação (aspas).
Percurso de Análise
3. Fundamentação teórica
Fundamentação teórica principal: interincompreensão
constitutiva do discurso e construção da polêmica
(MAINGUENEAU, 1997; 2008) e formas de
heterogeneidade mostrada (AUTHIER-REVUZ, 1990;
1998).
Interincompreensão: reação de um enunciador, inserido
em uma determinada formação discursiva (FD), a outro
dizer – referente a outra FD.
Discurso em questão: modelo desenvolvimentista de
“modernização” do PSDB, iniciado no governo
Fernando Henrique Cardoso (1995-2003).
4. Fundamentação teórica
Cenografia do discurso tucano: identidade social
sinalizada pelo comportamento verbal, a qual
deve ser compatível com o mundo a ser
construído no enunciado – espaço do
interdiscurso – e, a partir daí, legitima o ethos
enunciativo.
Termos debatidos nesse capítulo: “o caso de
'Caipiras'”, “o caminho do meio: desvio à
direita”, “nacionalismo”, “esquerda” e
“fisiologismo e política”.
7. “Caipiras”
“Caipira”: Palavra marcada, com efeitos de sentido cristalizados.
Sentido normalmente atribuído: ignorante, atrasado, ingênuo.
Sentido usado por FHC: provinciano, fechado.
Significados em oposição: brasileiros fechados, provincianos X
governantes cosmopolitas, sábios.
Polêmica: Intelectual que não conhece a realidade do povo,
estrangeiro no próprio país (saber formal X saber experimental).
Ethos: remete a uma maneira de ser (caráter).
Ethos no discurso: sociólogo que analisa criticamente o país,
com competência e legitimidade para tal. Entretanto, não escapa
a um tom assertivo e arrogante.
10. “O caminho do meio: desvio à direita”
Termo em questão: “política industrial” - é também uma palavra
marcada.
Sentido normalmente atribuído: intervencionismo estatal,
industrialização induzida pelo Estado, movida a “aumento de tarifa,
renúncia fiscal e juros subsidiados” (“velha política industrial”).
Sentido usado por FHC: política industrial progressista, movida
pela competição, com transparência e sem intervenção excessiva do
Estado (cronografia – oposição velho X novo).
Deslocamento de sentidos em um mesmo termo: marcação de
alteridade como forma de demostrar rejeição a um conteúdo,
distanciamento.
“Velha política industrial”: atribuído à oposição (atraso).
13. “Nacionalismo”
“Nacionalismo”: Termo ressignificado, assim como o anterior – em
seu sentido normalmente atribuído, soaria anacrônico.
Sentido normalmente atribuído: aparelhamento estatal, Estado-
empresário, gestor da economia, “não-sadio”, “botocudo”, “aquele
que olha para trás”.
Sentido usado por FHC: Estado incentivador e estimulador da
produção de riquezas pelas indústrias - “está ao lado da História”,
“aberto”.
Discurso tucano: em prol de um nacionalismo moderno, condizente
com os tempos atuais, e não um “nacionalismo velho e encarquilhado”
(atribuído ao discurso da oposição).
Internacionalização da economia: fato gerador desse deslocamento de
sentido – o discurso do nacionalismo “velho” esvaneceu-se.
18. “Esquerda”
Uso constante da modalização autonímica – formas de
comentar o próprio dizer como forma de provocar um efeito
de distanciamento entre elementos de formações discursivas
distintas (com sentidos pertencentes a essas FDs), sem,
contudo, romper com a ordem sintática.
Construção de identidades: Presidente FHC e grupos
esquerdistas.
Sentido histórico de “direita”: grupos político-ideológicos
de tendência conservadora, cuja preocupação é a defesa da
“ordem social”, do status quo.
Sentido rotulado: grupos elitistas, contrários ao fim das
desigualdades sociais.
19. “Esquerda”
Sentido histórico de “esquerda”: grupos político-ideológicos
de tendência reformista ou revolucionária, cujo objetivo é
provocar transformações no cenário social – ruptura do
status quo.
São conceitos que não são absolutos, mas historicamente
relativos (BOBBIO, 1995) e que podem, no curso histórico,
até mesmo se inverter (esquerdas conservadoras/direitas
reformistas).
Uso de esquerda entre aspas, por FHC (não-coincidência das
palavras consigo mesmas): esquerda que não é esquerda,
isto é, uma esquerda contrária a mudanças e, portanto,
contra o desenvolvimento do Brasil.
20. “Esquerda”
Outras possibilidades de reformas não são postas em discussão:
polarização entre duas propostas.
Proposta de FHC: proposta social-democrata, com posição tida
como reformista, inovadora, que rompa com a “velha” direita e a
“velha” esquerda.
Proposta da esquerda: chamada de neoliberal, por promover a
falência gradual do Estado (ao ser contrária às reformas) e
vinculada a um modelo econômico-político fracassado (socialismo)
Metadiscurso e uso de aspas, ao usar a palavra “esquerda”: procura
deslegitimar a esquerda, ao trazer discursos oriundos de outras FDs
e ressignificá-los.
21. “Esquerda”
Ethos do novo social-democrata: prevê a
participação do Estado para melhorar a vida das
pessoas ao fomentar condições que levem as
empresas a inovar e os trabalhadores a se tornarem
mais eficientes, e não mais oferecendo subsídios às
empresas ou proteção às pessoas – construção de
uma posição intermediária entre “direita” e
“esquerda”.
Ethos controverso: posiciona-se como vanguardista,
mas apaga ou desqualifica posicionamentos
diferentes dos que prega – autoritarismo.
23. “Fisiologismo e Política”
Dupla marcação de sentidos: as formas de designar o referente
(política e fisiologismo) testemunham o encontro de dois
enunciadores. Formas e posições diferentes de se dizer a
mesma coisa.
Primeiro enunciador: troca de cargos por apoio (fisiologismo)
Segundo enunciador: distribuir posições entre os apoiadores
(política).
Os especificadores “normal” e “perverso” são
reconhecidamente sustentados por uma voz tucana.
Tucanos leem política onde os não entendidos leem
fisiologismo – desqualificação de vozes contrárias.
24. “Fisiologismo e Política”
Política: sentido normal, ligado à necessidade de constituir
alianças, em prol de uma “governabilidade” – entendido
como algo “moderno”.
Fisiologismo: sentido negativo, ligado ao “loteamento” de
cargos públicos a aliados e apadrinhados políticos –
entendido como algo “atrasado”.
Recurso a Max Weber: reforço de autoridade enunciativa,
argumento de autoridade que busca não apenas fundamentar
o discurso, mas legitimar o ethos (homem de ciência,
representante de ideias da modernidade).