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LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
201Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
CONTEXTO e EDUCAÇÃO
Editora Unijuí Ano 21 nº 76 Jul./Dez. 2006 P. 201-222
Livro Didático de Ciências:
Fonte de Informação
ou Apostila de Exercícios?
Wildson Luiz Pereira dos Santos
Maria Helena da Silva Carneiro
Resumo
Considerando a necessidade de se desenvolver mais estudos sobre o uso do livro
didático, temos desenvolvido várias investigações sobre como isso ocorre. Nessas
pesquisas foi revisada a trajetória do livro didático nas escolas brasileiras, em
particular do livro de Ciências; discutidos os resultados de pesquisas a seu respeito
e contextualizadas as formas de produção desse livro, marcada pelo mercado
editorial. No presente trabalho, apresentamos resultados de algumas de nossas
pesquisas que revelam como o livro didático tem sido visto por professores e
alunos com a função restrita de resolução de exercícios. Propostas de uso do livro
são apresentadas ao final do trabalho.
Palavras-chave: Livro didático. Uso do livro didático. Função do livro didático.
THE TEXTBOOK OF SCIENCE:
a source of information or a booklet of exercises?
Abstract
Taking into consideration the significance to carry out investigations on use of
textbook, we have been developed some researches about kind of it use in class-
rooms. Making a historical overview of textbook in Brazilian schools, specially, of
science textbook; discussing outcomes of researches; and contextualizing kinds of
textbook production, marked by editorial business, in this paper we present some
research outcomes that point out how the textbook has been seen by teachers and
students with the restrict role to booklet of exercises. Some proposals to use
textbook are presented in the end of the paper.
Keywords: Textbook. Use of textbook. Role of textbook.
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
202 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
Há 20 anos Lajolo (1987) já indica no título de seu artigo “O livro
didático: velho tema, revisitado” que de fato esse não é um tema novo. Em
revisão da produção científica de livros escolares no Brasil, Batista e Rojo
(2005) identificaram em pesquisa que teve como fonte de consulta a Platafor-
ma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológi-
co (CNPq), no período de 1975 a 2003, 5.480 títulos sobre o tema livro didá-
tico – LD. Esses mesmos autores identificaram 229 dissertações e teses sobre
livros escolares defendidas entre 1987 e 2000 (Batista; Rojo, 2005), das quais
39 são referentes a disciplinas de Ciências (Ciências da Natureza, Biologia,
Física e Química). Fracalanza (2006b) menciona pesquisa sobre a produção
científica sobre aspectos do livro didático de Ciências no período de 1971 a
2001, no qual foram identificadas 76 dissertações e teses. Já Ferreira e Selles
(2003, 2004) identificaram 17 artigos de investigações sobre livros didáticos
em Ciências publicados em periódicos nacionais desde a década de 80 do
século 20.
Em todas essas pesquisas constata-se que o tema predominantemente
investigado tem sido as características do livro, análise de seus conteúdos,
metodologia, adequação e correção. Um número ainda inexpressivo tem se
dedicado ao estudo do uso do livro. Segundo Batista e Rojo (2005), do total
de títulos relativos a livros didáticos antes mencionados, apenas 7% se dedi-
caram ao uso do livro na escola ou em sala de aula e 4% a impactos das
propostas do LD sobre seus usuários; já nas dissertações e teses por eles inves-
tigados apenas 13 (5,68% do total) foram relativas ao uso de livros didáticos
em sala de aula.
Nesse sentido, embora o livro didático seja uma temática antiga e mui-
to investigada, temos desenvolvido pesquisas sobre o seu uso, tema que ainda
não foi exaustivamente explorado. No presente artigo levantamos dados e
reflexões sobre alguns desses trabalhos que mostram como esse uso tem redu-
zido a função do livro didático de Ciências a um recurso para resolução de
exercícios escolares. Para isso apresentamos considerações sobre o contexto
da mudança editorial dos livros didáticos das escolas de educação básica.
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
203Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
O mercado editorial do livro didático no Brasil
Segundo Batista, Galvão e Klinke (2002), no século 19 havia uma falta
de livros didáticos, sobretudo nas cidades do interior do Brasil. É a partir do
século 20, que começa a surgir uma maior diversidade de publicações por
editoras nacionais. Esse processo de transição de introdução do LD na escola
ocorreu por conta do que esses autores denominam de progressiva institucio-
nalização da escola como o principal espaço social da educação, que ocorreu
no final do século 19 e nas primeiras décadas do século 20.
Nesse processo foram-se instituindo, progressivamente, o ensino seria-
do e o emprego do método simultâneo. Assim
No interior desse quadro mais geral, a organização e o lugar ocupado
pelos saberes escolares e pelos materiais didáticos (sobretudo os manuais
escolares) destinados a ensinar esses saberes passam por diversas trans-
formações. Se, nas primeiras décadas do século XIX, os programas de
ensino para a escola elementar se limitavam ao ensino inicial das habilida-
des da leitura, da escrita e do cálculo, progressivamente se foram constitu-
indo conteúdos e saberes específicos para serem ensinados pela instituição
escolar; também progressivamente os saberes compreendidos como “lei-
tura” e “escrita” ganham novas dimensões, respondem a novas exigências
e demandas sociais, assumem formas mais complexas de escolarização.
Nesse contexto e com a paulatina implantação do método simultâneo, foi
necessária também a produção de materiais pedagógicos especificamente
destinados a esse modo de organização do ensino, como quadros-negros,
cartazes, materiais de ensino, livros didáticos (Batista; Galvão; Klinke,
2002, p. 28).
Surgem assim na década de 30 as primeiras grandes editoras nacionais
e o mercado se amplia progressivamente nas duas décadas seguintes. Com a
expansão da rede de ensino nos anos 70 esse mercado toma uma grande di-
mensão, quando o LD passa a ter um caráter notadamente de mercadoria.
Com a expansão da rede de ensino no final dos anos 60 e início da
década de 70, houve uma popularização da escola pública, que passou a aten-
der às camadas mais populares. Nesse processo, houve um deslocamento dos
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
204 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
filhos da classe média e rica para as escolas privadas, que passaram a ter um
padrão de referência de qualidade pelo índice de aprovação de seus alunos em
exames vestibulares.
Tal processo favoreceu a padronização do mercado editorial, que des-
tinou livros com maior quantidade de páginas para as escolas privadas e livros
resumidos com padrão editorial menor, conseqüentemente mais baratos, para
escolas públicas. Ambos, no entanto, passaram a contemplar uma grande quanti-
dade de exercícios no padrão dos que são cobrados nas provas de vestibulares.
Enquanto os livros nas décadas anteriores tinham uma maior longevi-
dade, com capa dura e edições que demoravam a ser renovadas, possibilitando
que os livros passassem de irmão para irmão, nas décadas finais do século 20
passaram a ser descartáveis, não podendo ser reaproveitados nos anos seguin-
tes. Para aumentar o consumo da mercadoria – livro didático – as capas duras
foram substituídas por capas finas, os exercícios foram apresentados com la-
cunas a serem preenchidas no próprio livro, as editoras passaram a promover
sucessivas reedições e publicações de coleções com novos autores, incenti-
vando a prática da adoção de novos livros a cada ano.
O trabalho do professor na sala de aula nas escolas privadas resumiu-se
ao ensino de todo o conteúdo do livro e a resolução de seus exercícios. Este
passou a ser o critério de padrão de qualidade das escolas, que demonstravam
aos pais que os conteúdos escolares foram cumpridos e justificavam o investi-
mento feito na aquisição desses materiais. Já a escola pública ficou relegada
ao ensino de quadro-negro, pela ausência do LD, inacessível para a maioria de
seus alunos de baixo poder aquisitivo.
Esse mercado começa a se alterar de forma significativa na última década
do século passado, com a instituição do Plano Nacional do Livro Didático –
PNLD – que passou a ter critério de distribuição universal para o Ensino
Fundamental a partir de 1996. O mercado editorial voltou a sua produção para
atender à demanda do governo, o que implicou mudanças no processo de
produção de livros, que tiveram de atender aos critérios estabelecidos pelo
programa governamental de aquisição de livros. Batista, Rojo e Zúñiga (2005)
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
205Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
apresentam dados que demonstram que a instituição do processo de avaliação
do LD “parece, enfim, ter resultado efetivamente, num amplo processo de
intervenção no currículo e em seu controle por meio do livro didático” (p. 67).
Estes autores revelam ainda que demonstram que a indústria editorial ao final
do século passou a depender do programa governamental, sobretudo devido à
crise do setor provocada pela migração de alunos de escolas privadas para a
escola pública e pelo crescimento da venda de apostilas e projetos pedagógi-
cos de grandes grupos educacionais.
Esse processo de mudança do mercado editorial se consolida atual-
mente com a expansão do programa de LD do Ensino Fundamental para o
Ensino Médio com a criação do Plano Nacional do Livro Didático para o
Ensino Médio – PNLEM –, em 2004, e com a expansão dos sistemas de ensino
estruturados. Esse sistema é caracterizado pela adoção de material próprio, no
formato de apostilas, contando com um grande número de exercícios de ves-
tibulares. Em muitos Estados as escolas privadas passaram a aderir ao sistema,
de forma que delas ainda adotam livros didáticos produzidos pelas editoras.
Segundo notícia veiculada pela ONG Cidade Escola Aprendiz “Não há dados
oficiais, mas, segundo estimativas dos próprios sistemas, 70% das escolas
particulares são filiadas a algum tipo de rede” (Cidade Escola Aprendiz, 2006).
Considerando o LD como tradutor do currículo escolar, levanta-se a
questão de comoessas mudanças têm caracterizado o uso do LD em sala de aula.
Funções do livro didático
Diversas definições, classificações e funções têm sido atribuídas aos
livros didáticos. Segundo Richaudeau (1979), em sentido amplo, LD é um
material impresso, estruturado, destinado a ser adotado em um processo de
aprendizagem (p. ex.: atlas, dicionários, gramáticas e todo texto impresso –
jornais, obras literárias, técnicas, científicas ou filosóficas). Já em sentido
restrito, Gérard e Roegiers (1988) consideram que o LD é um instrumento
impresso, intencionalmente estruturado para se inscrever num processo de
aprendizagem, com o fim de lhe melhorar a eficácia.
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
206 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
Tomando o conceito de LD nesse sentido restrito e adaptando da defi-
nição adotada por Batista e Rojo (2005), no presente artigo definimos LD
como material impresso produzido por editoras para servir a processos de
ensino e aprendizagem na educação básica.
Considerando o modo de funcionamento pedagógico, Richaudeau
(1979) destaca que o livro didático assume essencialmente três grandes fun-
ções: de informação, de estruturação e organização da aprendizagem e, fi-
nalmente, a função de guia do aluno no processo de apreensão do mundo exte-
rior. Segundo o autor, essa última função está condicionada ao tipo de livro,
ou seja, um LD pode permitir a integração das experiências do aluno e engen-
drar uma atividade livre e criativa, ou ao contrário, induzi-lo à repetição ou à
simples imitação de modelos de apreensão do real.
Choppin (2004) atribui a esse recurso de ensino as funções referencial,
instrumental, ideológica e cultural e documental. A função referencial ou
curricular seria a de depositário dos conhecimentos técnicos de uma discipli-
na, que traduziria os conteúdos programáticos. O livro didático evidencia
práticas e métodos de aprendizagem, propõe exercícios que facilitam a aqui-
sição de competências disciplinares, é o que caracteriza a sua função instru-
mental. A função ideológica e cultural faz com que o livro seja um dos vetores
essenciais da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes. Já a fun-
ção documental corresponde a oferecer um conjunto de documentos, textuais
ou icônicos, para desenvolver o espírito crítico do aluno.
Deve-se considerar ainda que o livro assume papéis diferentes para o
aluno e para o professor. Segundo Gérard e Roegiers (1988), a função do livro
para o aluno, dentre outras, é a de fornecer aprendizagens escolares para a vida
cotidiana ou para a vida profissional. Para Cachapuz e Praia (1998), essa
finalidade seria de ajudar o aprendiz a compreender a estrutura de uma dada
área do saber, analisar e esclarecer inter-relações entre diferentes temáticas. Já
para Richaudeau (1979), o livro teria a função de guiar o aluno na apreensão
do mundo exterior.
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
207Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
Ocorre que na prática pedagógica do LD no contexto editorial do mer-
cado brasileiro exposto anteriormente, entendemos que a função do LD foi se
reduzindo a de realização de tarefas escolares, como a resolução de exercícios,
perdendo paulatinamente o seu papel de função referencial e documental.
O livro didático como caderno de exercícios
Batista, Galvão e Klinke (2002) desenvolveram pesquisa sobre o cam-
po de produção cultural em torno do qual ocorrem tomadas de posição discur-
sivas, pedagógicas e editoriais desenvolvidas no campo da produção editorial
escolar. Nesse trabalho, eles identificaram que houve um decréscimo signifi-
cativo da presença de livros do gênero de compêndios no período de 1872 a
1975. Esses autores consideram “compêndios aqueles livros que se caracteri-
zam como uma exposição didática de um conjunto de conteúdos, organiza-
dos de forma progressiva, tendo em vista áreas de conteúdo diferentes” (Batis-
ta; Galvão; Klinke, 2002, p. 37). Por outro lado, constataram o surgimento, na
área da Língua Portuguesa, de livros do tipo cadernos de atividades no início
do século 20, que progressivamente foram aumentando a partir da terceira
década. Da mesma forma, verificaram que a presença de exercícios nesses
livros didáticos também foi crescendo ao longo do século. Concluem esses
autores que a prática pedagógica foi mudando com os livros, de forma que se
constata que no quadro da “progressiva atenção ao ‘entendimento’ e à leitura
silenciosa, em oposição à memorização e em complementação à leitura oral,
chama atenção a progressiva inclusão, nos livros, de exercícios” (ibidem, p. 45).
O uso do LD como fonte de resolução de atividades também foi cons-
tatado por Fernandes (2004) em sua pesquisa sobre a memória de usuários de
livros didáticos que fizeram uso desses materiais no período de 1940 a 1970.
Um entrevistado caracterizou o uso do livro no ensino ginasial1
como material
1
Primeiro nível de ensino do ciclo secundário do período em questão que corresponde
atualmente às quatro séries finais do atual Ensino Fundamental.
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
208 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
para estudo em casa, tanto para realização de tarefas quanto estudo para pro-
vas. Segundo esse entrevistado, os livros nunca eram usados em sala de aula,
nem para leitura e nem para discussão de textos. Ocorre que nesse período o
LD ainda era constituído por textos descritivos e informativos e que as tarefas
requisitavam a busca de informações contidas no livro. Essa situação foi mu-
dando, de forma que cada vez mais o livro foi se transformando em caderno de
exercícios.
Os estudos sobre livros didáticos de Ciências também constatam pro-
fundas mudanças editoriais do século 19 até os dias de hoje, as quais são
acompanhadas por alterações pedagógicas no uso desses livros. Parece-nos
claro que uma dessas mudanças é a perda da função do LD como obra de
referência e a sua caracterização como caderno de exercícios, subsidiado por
informações elementares exclusivas para orientação para resolução dos exer-
cícios apresentados.
Lorenz (1986) observou, ao analisar os livros didáticos e o ensino de
Ciências na escola secundária brasileira no século 19, que as obras daquele
período se configuravam em compêndios de Ciências de origem francesa.
Tomando o Colégio Pedro II como referência, conclui o autor que “se de fato
os livros foram utilizados por professores e/ou alunos conforme sugerido nos
programas, o ensino de ciências no Colégio foi caracterizado pela contínua
introdução dos mais modernos conceitos científicos do século” (p. 434). Em
outro trabalho, Krasilchik (1980) afirma que até meados do século 20 os livros
didáticos de Ciências eram na sua maioria constituídos por traduções e adap-
tações dos mais populares manuais europeus de Física, Química e Biologia.
Mortimer (1988), em seu estudo sobre a evolução dos livros didáticos de
Química destinados ao ensino secundário, também caracteriza esses livros até
1930 como compêndios de Química Geral.
A introdução de exercícios nos livros de Ciências parece que seguiu a
mesma tendência apontada por Batista, Galvão e Klinke (2002), que foi se
ampliando no decorrer do século. Krasilchik (1980) comenta que os livros
didáticos de Ciências até os anos 50 raramente incluíam problemas para que
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
209Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
os alunos resolvessem. Mortimer (1988) destaca que os livros de Química
anteriores a 1930 apresentavam uma ausência completa de exercícios ou ques-
tionários. Somente no período de 1940 a 1950 é que uma minoria de livros
começa a incorporar exercícios, problemas e questionários ao final da obra e/
ou de cada capítulo, tendência essa que continua até 1960. Já a partir daí a
totalidade dos livros passa a apresentar exercícios e questionários, com o
número desses exercícios crescendo de maneira significativa na década se-
guinte (Mortimer, 1988). Além disso, Mortimer (1988) ressalta que os livros
da década de 70 apresentam, em média, apenas 30% do espaço do livro ocupa-
do por textos, que, em geral, eram menores que o espaço ocupado pelos exer-
cícios e as ilustrações.
O livro didático como mercadoria
O processo de expansão da rede de ensino nas três últimas décadas do
século 20 favoreceu a indústria de livros didáticos, que foi agregando a esse
livro um caderno de exercícios. Já em 1976 Albuquerque afirmava que o LD,
“além de instrumento de ensino e de difusão da cultura, é um produto indus-
trial e, como tal, passou a ser estudado do ponto de vista econômico” (p. 219).
Ocorre que segundo este autor, pouco se conhecia na época sobre como esses
livros eram produzidos, como eram divulgados e vendidos, quem eram os seus
autores (Albuquerque, 1976).
Pouco a pouco as pesquisas sobre LD foram revelando o seu caráter
mercadológico e como ele foi alterando a forma de apresentação desse mate-
rial. Krasilchik (1980) explicita que nos anos 70 a proliferação de escolas de
formação de professores de nível superior, o crescimento do número de alunos
nas classes da educação básica, a deterioração das escolas e das condições de
trabalho dos professores, facilitaram o uso de livros que exigia menos tempo
para preparação de aulas práticas e estudo para atualização. Com isso houve o
favorecimento à publicação de livros didáticos de Ciências com fins estrita-
mente comerciais, de qualidade muito comprometida, que exigiam pouco
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
210 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
esforço na preparação de aulas, de forma que o professor passou a usar livros
em que os alunos ficavam ocupados fazendo exercícios (Krasilchik, 1980). Já
a pressão do vestibular fez com que os livros passassem a resumir as informa-
ções restritas que eram cobradas na provas, com truques de memorização e o
uso intensivo de questões estilizadas dos exames de vestibulares.
Como caracterizam Loguercio, Del Pino e Souza (2002), o LD enquan-
to mercadoria significou do ponto de vista econômico a manutenção de um
texto padronizado, com poucas diferenciações e revisões, favorecendo a lu-
cratividade fácil e segura. Nesse contexto, a definição do LD foi sendo molda-
da por condições em que os critérios mercadológicos predominassem em rela-
ção ao caráter pedagógico. Isso fez com que mesmo após o governo iniciar
uma política de análise dos livros, eles continuassem sendo produzidos com
qualidade inferior ao que se desejava. Serpa (1987), ao apresentar resultados
de encontros sobre livros didáticos promovidos pela Universidade Federal da
Bahia, comentava que a política de distribuição do PNLD, iniciada em 1985,
privilegiava um pequeno grupo de editoras e produzia distorções com a inter-
ferência dos interesses da indústria do livro sobre a escolha das obras. Esse
processo de interferência continuou mesmo com as versões do PNLD na déca-
da seguinte. Höfling (2000), ao discutir a política de instituição do PNLD até
1998, conclui:
A acentuada participação e intervenção de um grupo de editoras no PNLD
coloca em questão as perspectivas de descentralização do programa. Na
medida em que, por sua posição no mercado, dispõem de mecanismos mais
eficientes de divulgação, de marketing voltados aos setores compradores e
consumidores de seus produtos, esses grupos editoriais alcançam grande
poder de penetração e circulação entre seus “clientes”. Essa situação,
associada a outros fatores, condiciona, em grande medida, a escolha feita
pelo professor (p. 168).
No mesmo sentido Megid Neto e Fracalanza (2006) referem que pes-
quisadores acadêmicos vêm se dedicando há duas décadas a avaliar a qualidade
dos livros didáticos de Ciências. Esses autores apresentam dados das avalia-
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
211Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
ções dos livros do PNLD e concluem que as melhorias nos livros de Ciências
têm se “localizado principalmente: no aspecto gráfico e visual; na correção
conceitual; na eliminação de preconceitos e estereótipos de raça, de gênero
ou de natureza socioeconômica; na supressão de informações ou ilustrações
que possam propiciar riscos à integridade física do aluno” (p. 159). Em outro
artigo, Fracalanza (2006b) destaca que todas as avaliações dos livros didáti-
cos de Ciências continuam a mostrar a sua inadequação e excessiva padroni-
zação.
O que se constata é que o mercado editorial a partir da década de 70 do
século passado acabou por transformar o LD em cadernos de exercícios, sim-
plificando e reduzindo a quantidade de textos. Por outro lado, na década de
90 presenciamos outra mudança no uso de materiais didáticos nas salas de
aula, ou seja, o aumento do número de empresas que se especializaram em
produzir materiais didáticos apostilados destinados às escolas. Inicialmente o
mercado de apostilas surgiu vinculado a cursos preparatórios para exames
vestibulares. Aos poucos os donos desses cursos preparatórios começaram a
criar escolas privadas que passaram a adotar as mesmas apostilas, porém adap-
tadas para as três séries do Ensino Médio. A adoção de tais apostilas nessas
escolas acabou por concretizar um modelo de ensino total e exclusivamente
direcionado à preparação para o vestibular. Assim, em vez de os alunos serem
treinados para a realização de provas em um semestre, eles passaram a ser
preparados em três anos.
Estratégias de marketing fizeram com que essas escolas atraíssem um
número grande de alunos, e apesar da sua baixa qualidade pedagógica, apre-
sentavam bons resultados no sentido de preparar seus alunos para o vestibular.
Impulsionadas pela demanda da classe média em ingressar nas melhores uni-
versidades, essas escolas, ao atraírem muitos alunos que se dedicavam ex-
clusivamente à preparaçãoparaexamese aoarrebanharem uma grande quantidade
de alunos, de fato conseguiram as condições para manter o seu índice de
aprovação no vestibular. Esse índice, tomado com indicador de qualidade de
ensino, fez com que o sistema se perpetuasse. Os donos das demais escolas
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
212 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
privadas, ao perceberem que perdiam alunos para as escolas de sistemas pre-
paratórios, começaram a adotar também o regime apostilado na tentativa de
obter os mesmos resultados. Esse sistema começou então a gerar lucros finan-
ceiros e foi aperfeiçoado de forma que vem se expandindo de maneira signifi-
cativa desde o final do século passado. Assim, o mercado editorial das escolas
privadas foi mudando de mão, das grandes indústrias de LD para as empresas
dos sistemas de ensino que passaram a crescer por meio de franquias.
Deve-se considerar que, à medida que o LD se transformou nas décadas
de 60 e 70 de depositários do conhecimento para cadernos de exercícios, isso
abriu espaço para o favorecimento dos sistemas de ensino. Na verdade, muitos
autores de livros didáticos eram professores de cursinhos preparatórios para o
vestibular e os seus livros foram adaptações de suas apostilas. Sem pagar
direitos autorais e sem a necessidade de manter infra-estrutura de distribuição,
o custo dos sistemas barateou o processo e com facilidade promoveu a substi-
tuição. Afinal, a considerar os resultados das avaliações dos livros didáticos
padronizados pelo mercado editorial, a sua qualidade já estava comprometi-
da. Há de se ter emconta, todavia, que mesmo tendo perdido a sua qualidade
ao longo dos tempos, os livros didáticos ainda contêm uma quantidade de
informações maior que os as apostilas.
Dados sobre o emprego do livro didático
como caderno de exercícios
Quando se afirma que o livro didático desempenha um papel central no
processo de ensino e aprendizagem, esta declaração nos remete à análise das
diferentes funções do LD. A primeira delas centra-se, normalmente, no uso que
o professor faz desse recurso de ensino no momento de tomada de decisão
quanto à definição, organização e dosagem dos conteúdos a serem ensinados.
Nesse caso o LD assume a função, como diria Richaudeau (1979), de estrutu-
ração e organização da aprendizagem. Os trabalhos por nós realizados, entre-
tanto, têm evidenciado outro aspecto desse papel de organização de aprendi-
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
213Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
zagem: o de “treinamento dos alunos”. Para comprovar essa “nova função” do
LD analisaremos a seguir os resultados de algumas de nossas pesquisas sobre
o uso do LD.
Uma das investigações trata de um estudo de caso, realizado por Costa
(2004), que observou durante um ano as aulas de um professor de uma escola
privada, localizada em Brasília-DF. No primeiro semestre foram observadas 55
aulas de Química. Em 33 (60%) delas o professor reservava parte da aula para a
resolução de exercícios, após uma rápida explanação do tema. Este jovem pro-
fessor possuía na época da pesquisa, apenas cinco anos de experiência docente.
Apesar de o professor utilizar outros recursos de ensino, como filmes, por exem-
plo, a grande maioria das aulas centrava-se na exposição oral, sem participação
mais efetiva dos alunos, e resolução e correção de exercícios. Além dos exercí-
cios do próprio livro, o professor complementava com outras listas.
Essa forma de emprego do livro, como caderno de exercício, parece ser
coerente com a sua concepção linear do processo de ensino e aprendizagem,
explicitada a partir da sua prática pedagógica, ainda muito centrada no pro-
fessor. Para este professor existe uma relação direta e garantida entre “dar e
receber” conhecimentos. Por outro lado, esse modelo pedagógico é também
bastante coerente com os objetivos da escola na qual trabalha, ou seja, prepa-
rar o aluno para entrar na universidade.
O uso do livro didático para resolução de exercícios também foi iden-
tificado em outro estudo de caso, desenvolvido por Bezerra Neto (2006) em
uma escola privada localizada em Sobradinho-DF. Nesse caso, o uso do LD
para resolução de exercícios em aulas foi bem menor do que na escola do
estudo anterior: quatro em 35 aulas registradas. Ocorre que nesse estudo, Be-
zerra Neto (2006) constatou que o LD foi utilizado em sala de aula exclusiva-
mente para resolver exercícios, ou por alguns alunos para acompanhar as
aulas expositivas do professor que seguiam a seqüência didática do manual.
Em outro estudo de caso conduzido em uma escola pública localizada
em Ceilândia-DF, Taveira (2004) revela que a preocupação com a resolução
de exercícios também se fez presente nas aulas observadas, apesar de o profes-
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
214 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
sor fazer uso de outras atividades de ensino. Como destaca a autora, as aulas
eram basicamente: expositivas com exercícios; leitura de textos do livro si-
lenciosa ou em grupo ou em voz alta por alunos selecionados ou voluntários,
seguida ou não da resolução de exercícios; somente de exercícios ou alguma
outra atividade como, por exemplo, uma dinâmica ou demonstração de expe-
rimentos; somente correção de exercícios e leitura de textos da seção “tema
em foco” do livro com resolução e debate da seção Pense, debata e entenda. A
diferença desse estudo de caso está tanto na adoção de outras formas de uso do
LD quanto no número de aulas: de 22 aulas acompanhadas, apenas sete (32%)
envolveram resolução de exercícios do livro.
Em outra pesquisa (Carneiro; Santos; Mól, 2005) que tinha como obje-
tivo identificar a concepção de professores e alunos sobre um livro inovador,2
os usuários chamam atenção para um dos aspectos do livro didático, por eles
considerado negativo: o número reduzido de exercícios. Ocorre que o livro
inovador em questão “Química e Sociedade” (Mol et al, 2003), possui uma
grande diversidade de atividades e exercícios, mas para os professores eles
não correspondem ao padrão que estão acostumados a ver nos demais livros
do mercado.
Quando esses professores foram entrevistados, alguns, ao comentarem
ou apresentarem sugestões sobre os exercícios do livro em questão, afirmaram:
Prof. 5: Esse é o grande ponto. Não sei se é porque eu tô acostumado com
outros materiais que trazem assim, 2000 exercícios, 3000 exercícios no
material, então a gente faz muito exercício e no Química e Sociedade a gente
já não tem tantos exercícios, sabe? Nós temos exercícios interessantes sim,
temos atividades de pesquisa, temos outras atividades, mas eu sinto falta de
mais, até de mais atividades mesmo, assim, mais propostas de debates.
2
O que se pode destacar na caracterização do que estamos chamando de livro didático
inovador está na incorporação explícita na orientação metodológica do livro de princí-
pios de ensino derivados da pesquisa em ensino de Química. Certamente é muito difícil
julgar até em que extensão um LD incorpora ou não princípios inovadores, todavia
deve-se ter como referência se a obra como um todo apresenta características marcantes
que possam distingui-la dos livros padronizados pelo mercado editorial, denominados
aqui de “livros tradicionais”.
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
215Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
Prof. 25: Quantidade é mais, mais, enche de mais exercício. Sobre a teoria,
mais exercício, mesmo que a teoria não aborde o nível que a gente quer, põe
exercício de desafio, põe exercício mais puxado, põe exercício não só de
vestibulares, mas, põe exercício mesmo assim, como dizem os alunos, ca-
bulosos, coisa difícil aí, que daí a gente pode dar uma resgatada no livro, já
em termos de resolver alguma coisa. Aí põe um exercício difícil, um resol-
vido difícil e põe mais dois seguindo aquela mesma tendência é, pro aluno
resolver, então dá uma povoada aí de exercício.
Essa excessiva preocupação com a quantidade de exercícios nos indi-
ca que tanto os alunos quanto os professores estão condicionados a um mode-
lo de livro didático que vem se impondo no mercado brasileiro, e, naturalmen-
te no sistema educacional e que se consolidou nas três últimas décadas do
século passado.
Em outra investigação, ao analisar as diferentes formas de uso do refe-
rido livro, a partir de depoimentos dos alunos em questionários, Jesus (2006)
relacionou duas atividades que envolvem a utilização dos LD em sala de aula:
a primeira é a resolução de exercícios em grupos ou de forma individual e a
segunda é o acompanhamento de leitura de textos. Quando questionados so-
bre a forma de utilização do LD em outras situações de estudo fora de sala de
aula, a maioria dos alunos destaca também a atividade de resolução de exercí-
cios seguida de leitura de textos com o objetivo de revisar o tema explicado
durante a aula.
Os livros didáticos de Química hoje disponíveis no mercado seguem
normalmente o mesmo padrão: primeiro apresentam o texto no qual desenvol-
vem o conteúdo, seguido de uma lista de exercícios que por sua vez também
obedecem a um padrão já estabelecido. Raramente encontramos livros que
propõem atividades variadas, o que geralmente ocorre com o LD que estamos
denominando aqui de inovador.
Considerando esses dois modelos de livro, o tradicional e o inovador,
e o pressuposto anteriormente definido de o LD desempenhar um papel cen-
tral no ensino na medida em que é a referência no momento da definição e
dosagem dos conteúdos, poderíamos levantar a hipótese de que um livro do
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
216 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
tipo inovador pode descentralizar as atividades de ensino da lista de exercícios.
Na expectativa de verificar essa hipótese Barreto (2006) analisa a prática
docente de dois professores que utilizam LD com propostas metodológicas
diferentes.
Nessa pesquisa foram considerados livros didáticos “inovadores” aque-
les caracterizados por terem sido produzidos a partir de projetos de pesquisa
em Ensino de Ciências. Foram definidos como “tradicionais” aqueles caracte-
rizados por seguirem um padrão que vem sendo adotado pelo mercado edito-
rial nas últimas décadas. Na análise comparativa desenvolvida por Barreto
(2006), pôde-se observar que a forma de utilização mais comum do LD em sala
de aula, em ambos os casos, foi para a resolução de exercícios, sendo esse o
contato mais freqüente que os alunos de ambos os casos tiveram com o livro.
Barreto (2006), porém, constatou que o professor que adotava o LD inovador
não o fazia em sala de aula apenas para realização de atividades, mas também
para leitura e discussão de textos e realização de experimentos. Além disso,
observou-se que esse professor empregava estratégias diferenciadas em suas
aulas. Já o professor que adotava o LD tradicional, fez uso praticamente restri-
to para a resolução de exercícios e as suas aulas, geralmente, se limitavam a
exposições didáticas.
Ainda em termos de hipótese de trabalho, admitimos que as diferentes
formas de uso do LD durante o processo de ensino e aprendizagem de conhe-
cimentos químicos estão relacionadas a uma trama de fatores difíceis de serem
isolados. Esta primeira tentativa de identificar os elementos envolvidos nesse
processo para melhor compreender as relações que se estabelecem entre eles
nos levou, inicialmente, a concluir que existem três grandes fatores. O primei-
ro diz respeito às condições de uso, como disponibilidade do material, carac-
terísticas do livro, número de alunos na sala de aula, número de aulas, exten-
são do programa a ser cumprido, etc. O segundo está relacionado ao modelo
pedagógico desenvolvido pelo professor: tipo de atividade proposta para os
alunos (leitura e interpretação de trechos de livros, solução de problemas,
etc.), objetivos de ensino, etc. Finalmente, o terceiro relaciona-se às represen-
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
217Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
tações que foram construídas pelos professores a respeito da ciência (ou da
disciplina com a qual trabalha), do método científico, do processo ensino e
aprendizagem, etc.
A nossa hipótese é que o segundo e terceiro fatores são diretamente
influenciados pelos LD usados pelos professores. Nesse sentido, as represen-
tações dos professores sobre processo ensino e aprendizagem em aulas de
Ciências, evidenciadas em sua prática pedagógica, na medida em que super-
valorizam a atividade de resolução de exercícios, parecem ter sido modeladas
pelo padrão de LD imposto pelo mercado editorial nas últimas décadas. As-
sim, acreditamos, a partir da constatação de Barreto (2006), que o uso de LD
inovadores pode ter um papel diferenciado na medida em que apresenta outras
atividades e possibilita outras formas de uso do LD.
A produção de livros didáticos inovadores de Ciências no Brasil vem
ocorrendo desde a década de 50 do século passado, conforme destacam Barra
e Lorenz (1986) e Krasilchik (1980). Fracalanza (2006a) identificou, no período
de 1971 a 2000, que dentre os 76 trabalhos acadêmicos sobre LD por ele
investigados, havia menção a 18 projetos de ensino de Ciências, que podem
se caracterizar com o que denominamos de LD inovadores. No caso de Proje-
tos de Ensino de Química, Schnetzler (2002)3
destaca cinco deles que foram
criados na perspectiva de inovação, incorporando avanços da pesquisa em
ensino de Química. Ocorre que apenas dois desses projetos foram publicados
por editoras comerciais que possuem sistema de distribuição e divulgação nas
escolas, de forma que os demais permaneceram desconhecidos pela maioria
dos professores do Ensino Médio.
Dentre as mudanças desses LD inovadores que os diferenciam dos li-
vros convencionais padronizados pelo mercado editorial, está a diversidade
de atividades e ruptura com o modelo de LD caracterizado como caderno de
3
Schnetzler (2002) menciona os projetos coordenados por Maldaner, Mól e Santos;
Mortimer, Pitombo e Marcondes, e Romanelli e Justi. Além desses acrescentamos o
coordenado por Ambrogi e por Schnetlzer, os quais foram desenvolvido em período
anterior ao mencionado pela autora.
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
218 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
exercícios. Como constataram Carneiro, Santos e Mól (2005), contudo, existe
uma tensão entre os professores que adotam livros inovadores em superar o
modelo de ensino imposto pelo mercado editorial de LD e o modelo de ensino
dos livros inovadores.
Nesse quadro, podemos dizer que mesmo nas escolas públicas em que
o governo tem disponibilizado livros didáticos, ainda será necessário algum
tempo para a construção de novas representações dos professores para uso do
LD que não se limite à resolução de exercícios.
Considerações Finais
Os dados de nossas pesquisas comprovam que o LD continua sendo
utilizado em sala de aula com função quase exclusiva de resolução de exercí-
cios. Acreditamos, porém, que essa forma de uso pode ser mudada, a partir de
uma reflexão do professor sobre a sua prática pedagógica. A adoção de novas
estratégias de uso contribui para que os livros assumam o seu papel de fonte
do saber sistematizado e de facilitador da aprendizagem.
A produção e difusão de livros didáticos inovadores pode contribuir de
forma significativa para a reversão desse quadro. É importante ressaltar, todavia,
que não somos contra as atividades que envolvem resolução de exercícios. A
sua presença no livro didático desempenha um papel importante na consolida-
ção das aquisições dos alunos, desde que incentive a reflexão e não a mera
memorização e aplicação mecânica de fórmulas. Além disso, tanto a resolução
quanto a correção de exercícios fazem parte do processo de avaliação formativa
das aquisições, desde que os “erros” dos alunos não sejam considerados incom-
petência dos mesmos e sim um espaço pedagógico de análise do “erro” e, natu-
ralmente, mais uma possibilidade de aprendizagem. A correção pela correção,
com o objetivo de punição e/ou de premiação (atribuição de pontos que farão
parte da média no final do bimestre) deixa de teruma função pedagógica.Assim,
na verdade, o que estamos questionando é a centralização desse tipo de ativida-
de proposta aos alunos em detrimento de outras formas de uso do livro e muitas
vezes desconectada de seu papel pedagógico.
LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios?
219Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006
Recuperar as funções referencial e documental do livro significa usá-lo
de modo a explorar as informações por ele fornecidas. Isso pode ser feito em
sala de aula por meio da leitura e discussão da propriedade de suas informa-
ções; da análise e interpretação de suas imagens, evidenciando a sua relação
com o texto e dos dados fornecidos em tabelas, diagramas, etc.; da exploração
de seus diversos elementos físicos, apresentação, introdução, sumário; do esta-
belecimento de situações que estimulem o aluno para a localização e avalia-
ção de informações; da comparação com informações apresentadas em dife-
rentes livros didáticos, etc. Em uma realidade em que o livro não é mais a
única fonte de informação, ensinar a consultar e analisar essa fonte de conhe-
cimento é preparar o cidadão para ser crítico em relação à natureza e às fontes
das informações que lhe chegam pela mídia e especialmente pelos meios ele-
trônicos.
Talvez até mesmo precisemos recuperar as velhas práticas do uso do
LD do século 19 e início do século 20 por meio da leitura oral, em que se
ensinava postura de voz e interpretação de texto. Afinal, o cidadão moderno
precisa saber apresentar e defender oralmente suas idéias em público, atitude
essa que muitos de nossos alunos, acostumados a resolver exercícios comple-
xos, não possuem.
Para isso, mais do que ensinar os nossos alunos de cursos de Licencia-
tura e os professores da educação básica a avaliar e selecionar livros, temos de
ensiná-los a usar esses livros. Será que conseguiremos fazer isso antes que os
sistemas de ensino apostilados adestrem também os professores de escolas
públicas, como já começam a fazer por meio de convênios com Secretarias de
Educação de vários municípios?
Agradecimentos
Este trabalho teve o apoio material e financeiro do Funpe-DPP/UnB e
do CNPq – Projeto de Pesquisa.
WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO
220 CONTEXTO e EDUCAÇÃO
Referências
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Recebido em: 27/5/2007
Aceito em: 25/6/2007

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  • 1. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 201Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 CONTEXTO e EDUCAÇÃO Editora Unijuí Ano 21 nº 76 Jul./Dez. 2006 P. 201-222 Livro Didático de Ciências: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? Wildson Luiz Pereira dos Santos Maria Helena da Silva Carneiro Resumo Considerando a necessidade de se desenvolver mais estudos sobre o uso do livro didático, temos desenvolvido várias investigações sobre como isso ocorre. Nessas pesquisas foi revisada a trajetória do livro didático nas escolas brasileiras, em particular do livro de Ciências; discutidos os resultados de pesquisas a seu respeito e contextualizadas as formas de produção desse livro, marcada pelo mercado editorial. No presente trabalho, apresentamos resultados de algumas de nossas pesquisas que revelam como o livro didático tem sido visto por professores e alunos com a função restrita de resolução de exercícios. Propostas de uso do livro são apresentadas ao final do trabalho. Palavras-chave: Livro didático. Uso do livro didático. Função do livro didático. THE TEXTBOOK OF SCIENCE: a source of information or a booklet of exercises? Abstract Taking into consideration the significance to carry out investigations on use of textbook, we have been developed some researches about kind of it use in class- rooms. Making a historical overview of textbook in Brazilian schools, specially, of science textbook; discussing outcomes of researches; and contextualizing kinds of textbook production, marked by editorial business, in this paper we present some research outcomes that point out how the textbook has been seen by teachers and students with the restrict role to booklet of exercises. Some proposals to use textbook are presented in the end of the paper. Keywords: Textbook. Use of textbook. Role of textbook.
  • 2. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 202 CONTEXTO e EDUCAÇÃO Há 20 anos Lajolo (1987) já indica no título de seu artigo “O livro didático: velho tema, revisitado” que de fato esse não é um tema novo. Em revisão da produção científica de livros escolares no Brasil, Batista e Rojo (2005) identificaram em pesquisa que teve como fonte de consulta a Platafor- ma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológi- co (CNPq), no período de 1975 a 2003, 5.480 títulos sobre o tema livro didá- tico – LD. Esses mesmos autores identificaram 229 dissertações e teses sobre livros escolares defendidas entre 1987 e 2000 (Batista; Rojo, 2005), das quais 39 são referentes a disciplinas de Ciências (Ciências da Natureza, Biologia, Física e Química). Fracalanza (2006b) menciona pesquisa sobre a produção científica sobre aspectos do livro didático de Ciências no período de 1971 a 2001, no qual foram identificadas 76 dissertações e teses. Já Ferreira e Selles (2003, 2004) identificaram 17 artigos de investigações sobre livros didáticos em Ciências publicados em periódicos nacionais desde a década de 80 do século 20. Em todas essas pesquisas constata-se que o tema predominantemente investigado tem sido as características do livro, análise de seus conteúdos, metodologia, adequação e correção. Um número ainda inexpressivo tem se dedicado ao estudo do uso do livro. Segundo Batista e Rojo (2005), do total de títulos relativos a livros didáticos antes mencionados, apenas 7% se dedi- caram ao uso do livro na escola ou em sala de aula e 4% a impactos das propostas do LD sobre seus usuários; já nas dissertações e teses por eles inves- tigados apenas 13 (5,68% do total) foram relativas ao uso de livros didáticos em sala de aula. Nesse sentido, embora o livro didático seja uma temática antiga e mui- to investigada, temos desenvolvido pesquisas sobre o seu uso, tema que ainda não foi exaustivamente explorado. No presente artigo levantamos dados e reflexões sobre alguns desses trabalhos que mostram como esse uso tem redu- zido a função do livro didático de Ciências a um recurso para resolução de exercícios escolares. Para isso apresentamos considerações sobre o contexto da mudança editorial dos livros didáticos das escolas de educação básica.
  • 3. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 203Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 O mercado editorial do livro didático no Brasil Segundo Batista, Galvão e Klinke (2002), no século 19 havia uma falta de livros didáticos, sobretudo nas cidades do interior do Brasil. É a partir do século 20, que começa a surgir uma maior diversidade de publicações por editoras nacionais. Esse processo de transição de introdução do LD na escola ocorreu por conta do que esses autores denominam de progressiva institucio- nalização da escola como o principal espaço social da educação, que ocorreu no final do século 19 e nas primeiras décadas do século 20. Nesse processo foram-se instituindo, progressivamente, o ensino seria- do e o emprego do método simultâneo. Assim No interior desse quadro mais geral, a organização e o lugar ocupado pelos saberes escolares e pelos materiais didáticos (sobretudo os manuais escolares) destinados a ensinar esses saberes passam por diversas trans- formações. Se, nas primeiras décadas do século XIX, os programas de ensino para a escola elementar se limitavam ao ensino inicial das habilida- des da leitura, da escrita e do cálculo, progressivamente se foram constitu- indo conteúdos e saberes específicos para serem ensinados pela instituição escolar; também progressivamente os saberes compreendidos como “lei- tura” e “escrita” ganham novas dimensões, respondem a novas exigências e demandas sociais, assumem formas mais complexas de escolarização. Nesse contexto e com a paulatina implantação do método simultâneo, foi necessária também a produção de materiais pedagógicos especificamente destinados a esse modo de organização do ensino, como quadros-negros, cartazes, materiais de ensino, livros didáticos (Batista; Galvão; Klinke, 2002, p. 28). Surgem assim na década de 30 as primeiras grandes editoras nacionais e o mercado se amplia progressivamente nas duas décadas seguintes. Com a expansão da rede de ensino nos anos 70 esse mercado toma uma grande di- mensão, quando o LD passa a ter um caráter notadamente de mercadoria. Com a expansão da rede de ensino no final dos anos 60 e início da década de 70, houve uma popularização da escola pública, que passou a aten- der às camadas mais populares. Nesse processo, houve um deslocamento dos
  • 4. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 204 CONTEXTO e EDUCAÇÃO filhos da classe média e rica para as escolas privadas, que passaram a ter um padrão de referência de qualidade pelo índice de aprovação de seus alunos em exames vestibulares. Tal processo favoreceu a padronização do mercado editorial, que des- tinou livros com maior quantidade de páginas para as escolas privadas e livros resumidos com padrão editorial menor, conseqüentemente mais baratos, para escolas públicas. Ambos, no entanto, passaram a contemplar uma grande quanti- dade de exercícios no padrão dos que são cobrados nas provas de vestibulares. Enquanto os livros nas décadas anteriores tinham uma maior longevi- dade, com capa dura e edições que demoravam a ser renovadas, possibilitando que os livros passassem de irmão para irmão, nas décadas finais do século 20 passaram a ser descartáveis, não podendo ser reaproveitados nos anos seguin- tes. Para aumentar o consumo da mercadoria – livro didático – as capas duras foram substituídas por capas finas, os exercícios foram apresentados com la- cunas a serem preenchidas no próprio livro, as editoras passaram a promover sucessivas reedições e publicações de coleções com novos autores, incenti- vando a prática da adoção de novos livros a cada ano. O trabalho do professor na sala de aula nas escolas privadas resumiu-se ao ensino de todo o conteúdo do livro e a resolução de seus exercícios. Este passou a ser o critério de padrão de qualidade das escolas, que demonstravam aos pais que os conteúdos escolares foram cumpridos e justificavam o investi- mento feito na aquisição desses materiais. Já a escola pública ficou relegada ao ensino de quadro-negro, pela ausência do LD, inacessível para a maioria de seus alunos de baixo poder aquisitivo. Esse mercado começa a se alterar de forma significativa na última década do século passado, com a instituição do Plano Nacional do Livro Didático – PNLD – que passou a ter critério de distribuição universal para o Ensino Fundamental a partir de 1996. O mercado editorial voltou a sua produção para atender à demanda do governo, o que implicou mudanças no processo de produção de livros, que tiveram de atender aos critérios estabelecidos pelo programa governamental de aquisição de livros. Batista, Rojo e Zúñiga (2005)
  • 5. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 205Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 apresentam dados que demonstram que a instituição do processo de avaliação do LD “parece, enfim, ter resultado efetivamente, num amplo processo de intervenção no currículo e em seu controle por meio do livro didático” (p. 67). Estes autores revelam ainda que demonstram que a indústria editorial ao final do século passou a depender do programa governamental, sobretudo devido à crise do setor provocada pela migração de alunos de escolas privadas para a escola pública e pelo crescimento da venda de apostilas e projetos pedagógi- cos de grandes grupos educacionais. Esse processo de mudança do mercado editorial se consolida atual- mente com a expansão do programa de LD do Ensino Fundamental para o Ensino Médio com a criação do Plano Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio – PNLEM –, em 2004, e com a expansão dos sistemas de ensino estruturados. Esse sistema é caracterizado pela adoção de material próprio, no formato de apostilas, contando com um grande número de exercícios de ves- tibulares. Em muitos Estados as escolas privadas passaram a aderir ao sistema, de forma que delas ainda adotam livros didáticos produzidos pelas editoras. Segundo notícia veiculada pela ONG Cidade Escola Aprendiz “Não há dados oficiais, mas, segundo estimativas dos próprios sistemas, 70% das escolas particulares são filiadas a algum tipo de rede” (Cidade Escola Aprendiz, 2006). Considerando o LD como tradutor do currículo escolar, levanta-se a questão de comoessas mudanças têm caracterizado o uso do LD em sala de aula. Funções do livro didático Diversas definições, classificações e funções têm sido atribuídas aos livros didáticos. Segundo Richaudeau (1979), em sentido amplo, LD é um material impresso, estruturado, destinado a ser adotado em um processo de aprendizagem (p. ex.: atlas, dicionários, gramáticas e todo texto impresso – jornais, obras literárias, técnicas, científicas ou filosóficas). Já em sentido restrito, Gérard e Roegiers (1988) consideram que o LD é um instrumento impresso, intencionalmente estruturado para se inscrever num processo de aprendizagem, com o fim de lhe melhorar a eficácia.
  • 6. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 206 CONTEXTO e EDUCAÇÃO Tomando o conceito de LD nesse sentido restrito e adaptando da defi- nição adotada por Batista e Rojo (2005), no presente artigo definimos LD como material impresso produzido por editoras para servir a processos de ensino e aprendizagem na educação básica. Considerando o modo de funcionamento pedagógico, Richaudeau (1979) destaca que o livro didático assume essencialmente três grandes fun- ções: de informação, de estruturação e organização da aprendizagem e, fi- nalmente, a função de guia do aluno no processo de apreensão do mundo exte- rior. Segundo o autor, essa última função está condicionada ao tipo de livro, ou seja, um LD pode permitir a integração das experiências do aluno e engen- drar uma atividade livre e criativa, ou ao contrário, induzi-lo à repetição ou à simples imitação de modelos de apreensão do real. Choppin (2004) atribui a esse recurso de ensino as funções referencial, instrumental, ideológica e cultural e documental. A função referencial ou curricular seria a de depositário dos conhecimentos técnicos de uma discipli- na, que traduziria os conteúdos programáticos. O livro didático evidencia práticas e métodos de aprendizagem, propõe exercícios que facilitam a aqui- sição de competências disciplinares, é o que caracteriza a sua função instru- mental. A função ideológica e cultural faz com que o livro seja um dos vetores essenciais da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes. Já a fun- ção documental corresponde a oferecer um conjunto de documentos, textuais ou icônicos, para desenvolver o espírito crítico do aluno. Deve-se considerar ainda que o livro assume papéis diferentes para o aluno e para o professor. Segundo Gérard e Roegiers (1988), a função do livro para o aluno, dentre outras, é a de fornecer aprendizagens escolares para a vida cotidiana ou para a vida profissional. Para Cachapuz e Praia (1998), essa finalidade seria de ajudar o aprendiz a compreender a estrutura de uma dada área do saber, analisar e esclarecer inter-relações entre diferentes temáticas. Já para Richaudeau (1979), o livro teria a função de guiar o aluno na apreensão do mundo exterior.
  • 7. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 207Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 Ocorre que na prática pedagógica do LD no contexto editorial do mer- cado brasileiro exposto anteriormente, entendemos que a função do LD foi se reduzindo a de realização de tarefas escolares, como a resolução de exercícios, perdendo paulatinamente o seu papel de função referencial e documental. O livro didático como caderno de exercícios Batista, Galvão e Klinke (2002) desenvolveram pesquisa sobre o cam- po de produção cultural em torno do qual ocorrem tomadas de posição discur- sivas, pedagógicas e editoriais desenvolvidas no campo da produção editorial escolar. Nesse trabalho, eles identificaram que houve um decréscimo signifi- cativo da presença de livros do gênero de compêndios no período de 1872 a 1975. Esses autores consideram “compêndios aqueles livros que se caracteri- zam como uma exposição didática de um conjunto de conteúdos, organiza- dos de forma progressiva, tendo em vista áreas de conteúdo diferentes” (Batis- ta; Galvão; Klinke, 2002, p. 37). Por outro lado, constataram o surgimento, na área da Língua Portuguesa, de livros do tipo cadernos de atividades no início do século 20, que progressivamente foram aumentando a partir da terceira década. Da mesma forma, verificaram que a presença de exercícios nesses livros didáticos também foi crescendo ao longo do século. Concluem esses autores que a prática pedagógica foi mudando com os livros, de forma que se constata que no quadro da “progressiva atenção ao ‘entendimento’ e à leitura silenciosa, em oposição à memorização e em complementação à leitura oral, chama atenção a progressiva inclusão, nos livros, de exercícios” (ibidem, p. 45). O uso do LD como fonte de resolução de atividades também foi cons- tatado por Fernandes (2004) em sua pesquisa sobre a memória de usuários de livros didáticos que fizeram uso desses materiais no período de 1940 a 1970. Um entrevistado caracterizou o uso do livro no ensino ginasial1 como material 1 Primeiro nível de ensino do ciclo secundário do período em questão que corresponde atualmente às quatro séries finais do atual Ensino Fundamental.
  • 8. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 208 CONTEXTO e EDUCAÇÃO para estudo em casa, tanto para realização de tarefas quanto estudo para pro- vas. Segundo esse entrevistado, os livros nunca eram usados em sala de aula, nem para leitura e nem para discussão de textos. Ocorre que nesse período o LD ainda era constituído por textos descritivos e informativos e que as tarefas requisitavam a busca de informações contidas no livro. Essa situação foi mu- dando, de forma que cada vez mais o livro foi se transformando em caderno de exercícios. Os estudos sobre livros didáticos de Ciências também constatam pro- fundas mudanças editoriais do século 19 até os dias de hoje, as quais são acompanhadas por alterações pedagógicas no uso desses livros. Parece-nos claro que uma dessas mudanças é a perda da função do LD como obra de referência e a sua caracterização como caderno de exercícios, subsidiado por informações elementares exclusivas para orientação para resolução dos exer- cícios apresentados. Lorenz (1986) observou, ao analisar os livros didáticos e o ensino de Ciências na escola secundária brasileira no século 19, que as obras daquele período se configuravam em compêndios de Ciências de origem francesa. Tomando o Colégio Pedro II como referência, conclui o autor que “se de fato os livros foram utilizados por professores e/ou alunos conforme sugerido nos programas, o ensino de ciências no Colégio foi caracterizado pela contínua introdução dos mais modernos conceitos científicos do século” (p. 434). Em outro trabalho, Krasilchik (1980) afirma que até meados do século 20 os livros didáticos de Ciências eram na sua maioria constituídos por traduções e adap- tações dos mais populares manuais europeus de Física, Química e Biologia. Mortimer (1988), em seu estudo sobre a evolução dos livros didáticos de Química destinados ao ensino secundário, também caracteriza esses livros até 1930 como compêndios de Química Geral. A introdução de exercícios nos livros de Ciências parece que seguiu a mesma tendência apontada por Batista, Galvão e Klinke (2002), que foi se ampliando no decorrer do século. Krasilchik (1980) comenta que os livros didáticos de Ciências até os anos 50 raramente incluíam problemas para que
  • 9. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 209Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 os alunos resolvessem. Mortimer (1988) destaca que os livros de Química anteriores a 1930 apresentavam uma ausência completa de exercícios ou ques- tionários. Somente no período de 1940 a 1950 é que uma minoria de livros começa a incorporar exercícios, problemas e questionários ao final da obra e/ ou de cada capítulo, tendência essa que continua até 1960. Já a partir daí a totalidade dos livros passa a apresentar exercícios e questionários, com o número desses exercícios crescendo de maneira significativa na década se- guinte (Mortimer, 1988). Além disso, Mortimer (1988) ressalta que os livros da década de 70 apresentam, em média, apenas 30% do espaço do livro ocupa- do por textos, que, em geral, eram menores que o espaço ocupado pelos exer- cícios e as ilustrações. O livro didático como mercadoria O processo de expansão da rede de ensino nas três últimas décadas do século 20 favoreceu a indústria de livros didáticos, que foi agregando a esse livro um caderno de exercícios. Já em 1976 Albuquerque afirmava que o LD, “além de instrumento de ensino e de difusão da cultura, é um produto indus- trial e, como tal, passou a ser estudado do ponto de vista econômico” (p. 219). Ocorre que segundo este autor, pouco se conhecia na época sobre como esses livros eram produzidos, como eram divulgados e vendidos, quem eram os seus autores (Albuquerque, 1976). Pouco a pouco as pesquisas sobre LD foram revelando o seu caráter mercadológico e como ele foi alterando a forma de apresentação desse mate- rial. Krasilchik (1980) explicita que nos anos 70 a proliferação de escolas de formação de professores de nível superior, o crescimento do número de alunos nas classes da educação básica, a deterioração das escolas e das condições de trabalho dos professores, facilitaram o uso de livros que exigia menos tempo para preparação de aulas práticas e estudo para atualização. Com isso houve o favorecimento à publicação de livros didáticos de Ciências com fins estrita- mente comerciais, de qualidade muito comprometida, que exigiam pouco
  • 10. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 210 CONTEXTO e EDUCAÇÃO esforço na preparação de aulas, de forma que o professor passou a usar livros em que os alunos ficavam ocupados fazendo exercícios (Krasilchik, 1980). Já a pressão do vestibular fez com que os livros passassem a resumir as informa- ções restritas que eram cobradas na provas, com truques de memorização e o uso intensivo de questões estilizadas dos exames de vestibulares. Como caracterizam Loguercio, Del Pino e Souza (2002), o LD enquan- to mercadoria significou do ponto de vista econômico a manutenção de um texto padronizado, com poucas diferenciações e revisões, favorecendo a lu- cratividade fácil e segura. Nesse contexto, a definição do LD foi sendo molda- da por condições em que os critérios mercadológicos predominassem em rela- ção ao caráter pedagógico. Isso fez com que mesmo após o governo iniciar uma política de análise dos livros, eles continuassem sendo produzidos com qualidade inferior ao que se desejava. Serpa (1987), ao apresentar resultados de encontros sobre livros didáticos promovidos pela Universidade Federal da Bahia, comentava que a política de distribuição do PNLD, iniciada em 1985, privilegiava um pequeno grupo de editoras e produzia distorções com a inter- ferência dos interesses da indústria do livro sobre a escolha das obras. Esse processo de interferência continuou mesmo com as versões do PNLD na déca- da seguinte. Höfling (2000), ao discutir a política de instituição do PNLD até 1998, conclui: A acentuada participação e intervenção de um grupo de editoras no PNLD coloca em questão as perspectivas de descentralização do programa. Na medida em que, por sua posição no mercado, dispõem de mecanismos mais eficientes de divulgação, de marketing voltados aos setores compradores e consumidores de seus produtos, esses grupos editoriais alcançam grande poder de penetração e circulação entre seus “clientes”. Essa situação, associada a outros fatores, condiciona, em grande medida, a escolha feita pelo professor (p. 168). No mesmo sentido Megid Neto e Fracalanza (2006) referem que pes- quisadores acadêmicos vêm se dedicando há duas décadas a avaliar a qualidade dos livros didáticos de Ciências. Esses autores apresentam dados das avalia-
  • 11. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 211Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 ções dos livros do PNLD e concluem que as melhorias nos livros de Ciências têm se “localizado principalmente: no aspecto gráfico e visual; na correção conceitual; na eliminação de preconceitos e estereótipos de raça, de gênero ou de natureza socioeconômica; na supressão de informações ou ilustrações que possam propiciar riscos à integridade física do aluno” (p. 159). Em outro artigo, Fracalanza (2006b) destaca que todas as avaliações dos livros didáti- cos de Ciências continuam a mostrar a sua inadequação e excessiva padroni- zação. O que se constata é que o mercado editorial a partir da década de 70 do século passado acabou por transformar o LD em cadernos de exercícios, sim- plificando e reduzindo a quantidade de textos. Por outro lado, na década de 90 presenciamos outra mudança no uso de materiais didáticos nas salas de aula, ou seja, o aumento do número de empresas que se especializaram em produzir materiais didáticos apostilados destinados às escolas. Inicialmente o mercado de apostilas surgiu vinculado a cursos preparatórios para exames vestibulares. Aos poucos os donos desses cursos preparatórios começaram a criar escolas privadas que passaram a adotar as mesmas apostilas, porém adap- tadas para as três séries do Ensino Médio. A adoção de tais apostilas nessas escolas acabou por concretizar um modelo de ensino total e exclusivamente direcionado à preparação para o vestibular. Assim, em vez de os alunos serem treinados para a realização de provas em um semestre, eles passaram a ser preparados em três anos. Estratégias de marketing fizeram com que essas escolas atraíssem um número grande de alunos, e apesar da sua baixa qualidade pedagógica, apre- sentavam bons resultados no sentido de preparar seus alunos para o vestibular. Impulsionadas pela demanda da classe média em ingressar nas melhores uni- versidades, essas escolas, ao atraírem muitos alunos que se dedicavam ex- clusivamente à preparaçãoparaexamese aoarrebanharem uma grande quantidade de alunos, de fato conseguiram as condições para manter o seu índice de aprovação no vestibular. Esse índice, tomado com indicador de qualidade de ensino, fez com que o sistema se perpetuasse. Os donos das demais escolas
  • 12. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 212 CONTEXTO e EDUCAÇÃO privadas, ao perceberem que perdiam alunos para as escolas de sistemas pre- paratórios, começaram a adotar também o regime apostilado na tentativa de obter os mesmos resultados. Esse sistema começou então a gerar lucros finan- ceiros e foi aperfeiçoado de forma que vem se expandindo de maneira signifi- cativa desde o final do século passado. Assim, o mercado editorial das escolas privadas foi mudando de mão, das grandes indústrias de LD para as empresas dos sistemas de ensino que passaram a crescer por meio de franquias. Deve-se considerar que, à medida que o LD se transformou nas décadas de 60 e 70 de depositários do conhecimento para cadernos de exercícios, isso abriu espaço para o favorecimento dos sistemas de ensino. Na verdade, muitos autores de livros didáticos eram professores de cursinhos preparatórios para o vestibular e os seus livros foram adaptações de suas apostilas. Sem pagar direitos autorais e sem a necessidade de manter infra-estrutura de distribuição, o custo dos sistemas barateou o processo e com facilidade promoveu a substi- tuição. Afinal, a considerar os resultados das avaliações dos livros didáticos padronizados pelo mercado editorial, a sua qualidade já estava comprometi- da. Há de se ter emconta, todavia, que mesmo tendo perdido a sua qualidade ao longo dos tempos, os livros didáticos ainda contêm uma quantidade de informações maior que os as apostilas. Dados sobre o emprego do livro didático como caderno de exercícios Quando se afirma que o livro didático desempenha um papel central no processo de ensino e aprendizagem, esta declaração nos remete à análise das diferentes funções do LD. A primeira delas centra-se, normalmente, no uso que o professor faz desse recurso de ensino no momento de tomada de decisão quanto à definição, organização e dosagem dos conteúdos a serem ensinados. Nesse caso o LD assume a função, como diria Richaudeau (1979), de estrutu- ração e organização da aprendizagem. Os trabalhos por nós realizados, entre- tanto, têm evidenciado outro aspecto desse papel de organização de aprendi-
  • 13. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 213Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 zagem: o de “treinamento dos alunos”. Para comprovar essa “nova função” do LD analisaremos a seguir os resultados de algumas de nossas pesquisas sobre o uso do LD. Uma das investigações trata de um estudo de caso, realizado por Costa (2004), que observou durante um ano as aulas de um professor de uma escola privada, localizada em Brasília-DF. No primeiro semestre foram observadas 55 aulas de Química. Em 33 (60%) delas o professor reservava parte da aula para a resolução de exercícios, após uma rápida explanação do tema. Este jovem pro- fessor possuía na época da pesquisa, apenas cinco anos de experiência docente. Apesar de o professor utilizar outros recursos de ensino, como filmes, por exem- plo, a grande maioria das aulas centrava-se na exposição oral, sem participação mais efetiva dos alunos, e resolução e correção de exercícios. Além dos exercí- cios do próprio livro, o professor complementava com outras listas. Essa forma de emprego do livro, como caderno de exercício, parece ser coerente com a sua concepção linear do processo de ensino e aprendizagem, explicitada a partir da sua prática pedagógica, ainda muito centrada no pro- fessor. Para este professor existe uma relação direta e garantida entre “dar e receber” conhecimentos. Por outro lado, esse modelo pedagógico é também bastante coerente com os objetivos da escola na qual trabalha, ou seja, prepa- rar o aluno para entrar na universidade. O uso do livro didático para resolução de exercícios também foi iden- tificado em outro estudo de caso, desenvolvido por Bezerra Neto (2006) em uma escola privada localizada em Sobradinho-DF. Nesse caso, o uso do LD para resolução de exercícios em aulas foi bem menor do que na escola do estudo anterior: quatro em 35 aulas registradas. Ocorre que nesse estudo, Be- zerra Neto (2006) constatou que o LD foi utilizado em sala de aula exclusiva- mente para resolver exercícios, ou por alguns alunos para acompanhar as aulas expositivas do professor que seguiam a seqüência didática do manual. Em outro estudo de caso conduzido em uma escola pública localizada em Ceilândia-DF, Taveira (2004) revela que a preocupação com a resolução de exercícios também se fez presente nas aulas observadas, apesar de o profes-
  • 14. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 214 CONTEXTO e EDUCAÇÃO sor fazer uso de outras atividades de ensino. Como destaca a autora, as aulas eram basicamente: expositivas com exercícios; leitura de textos do livro si- lenciosa ou em grupo ou em voz alta por alunos selecionados ou voluntários, seguida ou não da resolução de exercícios; somente de exercícios ou alguma outra atividade como, por exemplo, uma dinâmica ou demonstração de expe- rimentos; somente correção de exercícios e leitura de textos da seção “tema em foco” do livro com resolução e debate da seção Pense, debata e entenda. A diferença desse estudo de caso está tanto na adoção de outras formas de uso do LD quanto no número de aulas: de 22 aulas acompanhadas, apenas sete (32%) envolveram resolução de exercícios do livro. Em outra pesquisa (Carneiro; Santos; Mól, 2005) que tinha como obje- tivo identificar a concepção de professores e alunos sobre um livro inovador,2 os usuários chamam atenção para um dos aspectos do livro didático, por eles considerado negativo: o número reduzido de exercícios. Ocorre que o livro inovador em questão “Química e Sociedade” (Mol et al, 2003), possui uma grande diversidade de atividades e exercícios, mas para os professores eles não correspondem ao padrão que estão acostumados a ver nos demais livros do mercado. Quando esses professores foram entrevistados, alguns, ao comentarem ou apresentarem sugestões sobre os exercícios do livro em questão, afirmaram: Prof. 5: Esse é o grande ponto. Não sei se é porque eu tô acostumado com outros materiais que trazem assim, 2000 exercícios, 3000 exercícios no material, então a gente faz muito exercício e no Química e Sociedade a gente já não tem tantos exercícios, sabe? Nós temos exercícios interessantes sim, temos atividades de pesquisa, temos outras atividades, mas eu sinto falta de mais, até de mais atividades mesmo, assim, mais propostas de debates. 2 O que se pode destacar na caracterização do que estamos chamando de livro didático inovador está na incorporação explícita na orientação metodológica do livro de princí- pios de ensino derivados da pesquisa em ensino de Química. Certamente é muito difícil julgar até em que extensão um LD incorpora ou não princípios inovadores, todavia deve-se ter como referência se a obra como um todo apresenta características marcantes que possam distingui-la dos livros padronizados pelo mercado editorial, denominados aqui de “livros tradicionais”.
  • 15. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 215Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 Prof. 25: Quantidade é mais, mais, enche de mais exercício. Sobre a teoria, mais exercício, mesmo que a teoria não aborde o nível que a gente quer, põe exercício de desafio, põe exercício mais puxado, põe exercício não só de vestibulares, mas, põe exercício mesmo assim, como dizem os alunos, ca- bulosos, coisa difícil aí, que daí a gente pode dar uma resgatada no livro, já em termos de resolver alguma coisa. Aí põe um exercício difícil, um resol- vido difícil e põe mais dois seguindo aquela mesma tendência é, pro aluno resolver, então dá uma povoada aí de exercício. Essa excessiva preocupação com a quantidade de exercícios nos indi- ca que tanto os alunos quanto os professores estão condicionados a um mode- lo de livro didático que vem se impondo no mercado brasileiro, e, naturalmen- te no sistema educacional e que se consolidou nas três últimas décadas do século passado. Em outra investigação, ao analisar as diferentes formas de uso do refe- rido livro, a partir de depoimentos dos alunos em questionários, Jesus (2006) relacionou duas atividades que envolvem a utilização dos LD em sala de aula: a primeira é a resolução de exercícios em grupos ou de forma individual e a segunda é o acompanhamento de leitura de textos. Quando questionados so- bre a forma de utilização do LD em outras situações de estudo fora de sala de aula, a maioria dos alunos destaca também a atividade de resolução de exercí- cios seguida de leitura de textos com o objetivo de revisar o tema explicado durante a aula. Os livros didáticos de Química hoje disponíveis no mercado seguem normalmente o mesmo padrão: primeiro apresentam o texto no qual desenvol- vem o conteúdo, seguido de uma lista de exercícios que por sua vez também obedecem a um padrão já estabelecido. Raramente encontramos livros que propõem atividades variadas, o que geralmente ocorre com o LD que estamos denominando aqui de inovador. Considerando esses dois modelos de livro, o tradicional e o inovador, e o pressuposto anteriormente definido de o LD desempenhar um papel cen- tral no ensino na medida em que é a referência no momento da definição e dosagem dos conteúdos, poderíamos levantar a hipótese de que um livro do
  • 16. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 216 CONTEXTO e EDUCAÇÃO tipo inovador pode descentralizar as atividades de ensino da lista de exercícios. Na expectativa de verificar essa hipótese Barreto (2006) analisa a prática docente de dois professores que utilizam LD com propostas metodológicas diferentes. Nessa pesquisa foram considerados livros didáticos “inovadores” aque- les caracterizados por terem sido produzidos a partir de projetos de pesquisa em Ensino de Ciências. Foram definidos como “tradicionais” aqueles caracte- rizados por seguirem um padrão que vem sendo adotado pelo mercado edito- rial nas últimas décadas. Na análise comparativa desenvolvida por Barreto (2006), pôde-se observar que a forma de utilização mais comum do LD em sala de aula, em ambos os casos, foi para a resolução de exercícios, sendo esse o contato mais freqüente que os alunos de ambos os casos tiveram com o livro. Barreto (2006), porém, constatou que o professor que adotava o LD inovador não o fazia em sala de aula apenas para realização de atividades, mas também para leitura e discussão de textos e realização de experimentos. Além disso, observou-se que esse professor empregava estratégias diferenciadas em suas aulas. Já o professor que adotava o LD tradicional, fez uso praticamente restri- to para a resolução de exercícios e as suas aulas, geralmente, se limitavam a exposições didáticas. Ainda em termos de hipótese de trabalho, admitimos que as diferentes formas de uso do LD durante o processo de ensino e aprendizagem de conhe- cimentos químicos estão relacionadas a uma trama de fatores difíceis de serem isolados. Esta primeira tentativa de identificar os elementos envolvidos nesse processo para melhor compreender as relações que se estabelecem entre eles nos levou, inicialmente, a concluir que existem três grandes fatores. O primei- ro diz respeito às condições de uso, como disponibilidade do material, carac- terísticas do livro, número de alunos na sala de aula, número de aulas, exten- são do programa a ser cumprido, etc. O segundo está relacionado ao modelo pedagógico desenvolvido pelo professor: tipo de atividade proposta para os alunos (leitura e interpretação de trechos de livros, solução de problemas, etc.), objetivos de ensino, etc. Finalmente, o terceiro relaciona-se às represen-
  • 17. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 217Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 tações que foram construídas pelos professores a respeito da ciência (ou da disciplina com a qual trabalha), do método científico, do processo ensino e aprendizagem, etc. A nossa hipótese é que o segundo e terceiro fatores são diretamente influenciados pelos LD usados pelos professores. Nesse sentido, as represen- tações dos professores sobre processo ensino e aprendizagem em aulas de Ciências, evidenciadas em sua prática pedagógica, na medida em que super- valorizam a atividade de resolução de exercícios, parecem ter sido modeladas pelo padrão de LD imposto pelo mercado editorial nas últimas décadas. As- sim, acreditamos, a partir da constatação de Barreto (2006), que o uso de LD inovadores pode ter um papel diferenciado na medida em que apresenta outras atividades e possibilita outras formas de uso do LD. A produção de livros didáticos inovadores de Ciências no Brasil vem ocorrendo desde a década de 50 do século passado, conforme destacam Barra e Lorenz (1986) e Krasilchik (1980). Fracalanza (2006a) identificou, no período de 1971 a 2000, que dentre os 76 trabalhos acadêmicos sobre LD por ele investigados, havia menção a 18 projetos de ensino de Ciências, que podem se caracterizar com o que denominamos de LD inovadores. No caso de Proje- tos de Ensino de Química, Schnetzler (2002)3 destaca cinco deles que foram criados na perspectiva de inovação, incorporando avanços da pesquisa em ensino de Química. Ocorre que apenas dois desses projetos foram publicados por editoras comerciais que possuem sistema de distribuição e divulgação nas escolas, de forma que os demais permaneceram desconhecidos pela maioria dos professores do Ensino Médio. Dentre as mudanças desses LD inovadores que os diferenciam dos li- vros convencionais padronizados pelo mercado editorial, está a diversidade de atividades e ruptura com o modelo de LD caracterizado como caderno de 3 Schnetzler (2002) menciona os projetos coordenados por Maldaner, Mól e Santos; Mortimer, Pitombo e Marcondes, e Romanelli e Justi. Além desses acrescentamos o coordenado por Ambrogi e por Schnetlzer, os quais foram desenvolvido em período anterior ao mencionado pela autora.
  • 18. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 218 CONTEXTO e EDUCAÇÃO exercícios. Como constataram Carneiro, Santos e Mól (2005), contudo, existe uma tensão entre os professores que adotam livros inovadores em superar o modelo de ensino imposto pelo mercado editorial de LD e o modelo de ensino dos livros inovadores. Nesse quadro, podemos dizer que mesmo nas escolas públicas em que o governo tem disponibilizado livros didáticos, ainda será necessário algum tempo para a construção de novas representações dos professores para uso do LD que não se limite à resolução de exercícios. Considerações Finais Os dados de nossas pesquisas comprovam que o LD continua sendo utilizado em sala de aula com função quase exclusiva de resolução de exercí- cios. Acreditamos, porém, que essa forma de uso pode ser mudada, a partir de uma reflexão do professor sobre a sua prática pedagógica. A adoção de novas estratégias de uso contribui para que os livros assumam o seu papel de fonte do saber sistematizado e de facilitador da aprendizagem. A produção e difusão de livros didáticos inovadores pode contribuir de forma significativa para a reversão desse quadro. É importante ressaltar, todavia, que não somos contra as atividades que envolvem resolução de exercícios. A sua presença no livro didático desempenha um papel importante na consolida- ção das aquisições dos alunos, desde que incentive a reflexão e não a mera memorização e aplicação mecânica de fórmulas. Além disso, tanto a resolução quanto a correção de exercícios fazem parte do processo de avaliação formativa das aquisições, desde que os “erros” dos alunos não sejam considerados incom- petência dos mesmos e sim um espaço pedagógico de análise do “erro” e, natu- ralmente, mais uma possibilidade de aprendizagem. A correção pela correção, com o objetivo de punição e/ou de premiação (atribuição de pontos que farão parte da média no final do bimestre) deixa de teruma função pedagógica.Assim, na verdade, o que estamos questionando é a centralização desse tipo de ativida- de proposta aos alunos em detrimento de outras formas de uso do livro e muitas vezes desconectada de seu papel pedagógico.
  • 19. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 219Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 Recuperar as funções referencial e documental do livro significa usá-lo de modo a explorar as informações por ele fornecidas. Isso pode ser feito em sala de aula por meio da leitura e discussão da propriedade de suas informa- ções; da análise e interpretação de suas imagens, evidenciando a sua relação com o texto e dos dados fornecidos em tabelas, diagramas, etc.; da exploração de seus diversos elementos físicos, apresentação, introdução, sumário; do esta- belecimento de situações que estimulem o aluno para a localização e avalia- ção de informações; da comparação com informações apresentadas em dife- rentes livros didáticos, etc. Em uma realidade em que o livro não é mais a única fonte de informação, ensinar a consultar e analisar essa fonte de conhe- cimento é preparar o cidadão para ser crítico em relação à natureza e às fontes das informações que lhe chegam pela mídia e especialmente pelos meios ele- trônicos. Talvez até mesmo precisemos recuperar as velhas práticas do uso do LD do século 19 e início do século 20 por meio da leitura oral, em que se ensinava postura de voz e interpretação de texto. Afinal, o cidadão moderno precisa saber apresentar e defender oralmente suas idéias em público, atitude essa que muitos de nossos alunos, acostumados a resolver exercícios comple- xos, não possuem. Para isso, mais do que ensinar os nossos alunos de cursos de Licencia- tura e os professores da educação básica a avaliar e selecionar livros, temos de ensiná-los a usar esses livros. Será que conseguiremos fazer isso antes que os sistemas de ensino apostilados adestrem também os professores de escolas públicas, como já começam a fazer por meio de convênios com Secretarias de Educação de vários municípios? Agradecimentos Este trabalho teve o apoio material e financeiro do Funpe-DPP/UnB e do CNPq – Projeto de Pesquisa.
  • 20. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 220 CONTEXTO e EDUCAÇÃO Referências ALBUQUERQUE, F. F. L. de. Que sabemos sobre o livro didático? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 61, n. 138, p. 218-223, jun. 1976. BARRETO, C. C. K. Uma análise comparativa entre o uso de um livro didático de Química inovador e um tradicional em sala de aula. Instituto de Química da Universi- dade de Brasília, 2006. (Monografia de Conclusão de Curso de Licenciatura). BARRA, V. M.; LORENZ, K. M. Produção de materiais didáticos de ciências no Brasil, período: 1950 a 1980. Ciência e Cultura, v. 38, n. 12, p. 1970-1983, 1986. BATISTA, A. A. G.; GALVÃO, A. M. de O.; KLINKE, K. Livros escolares de leitura: uma morfologia (1866-1956). Revista Brasileira de Educação, n. 20, p. 27-47, maio/ jun./jul./ago., 2002. BATISTA, A. A. G.; ROJO, R. Livros escolares no Brasil: a produção científica. Livros didáticos de língua portuguesa: letramento, inclusão e cidadania. In: VAL, M. G. C.; MARCUSCHI (Orgs.). Livros didáticos de Língua Portuguesa: letramento e cidadania. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2005. p. 13-45. BATISTA, A. A. G.; ROJO, R.; ZÚÑIGA, N. C. Produzindo livros didáticos em tem- pos de mudança (1999-2002). Livros didáticos de língua portuguesa: letramento, inclu- são e cidadania. In: VAL, M. G. C.; MARCUSCHI (Orgs.). Livros didáticos de Língua Portuguesa: letramento e cidadania. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2005. p. 47-72. BEZERRA NETO, M. L. O uso do livro didático de Química em sala de aula: buscando outras formas de uso. Instituto de Química da Universidade de Brasília, 2006. (Mono- grafia de Conclusão de Curso de Licenciatura). CACHAPUZ A. F.; PRAIA, J. F. Manuais escolares: que papéis para a escola do século XXI? Inovação, 11, p. 61-73, 1998. CARNEIRO, M. H. da S.; SANTOS, W. L. P. dos; MÓL, G. de S. Livro didático inovador e professores: uma tensão a ser vencida. Ensaio – Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v. 7, n. 2, dez. 2005. CHOPPIN, A. História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte. Educa- ção e Pesquisa, v. 30, n. 3, p. 549-566, set./dez., 2004. CIDADE ESCOLA APRENDIZ. Escolas privadas adotam sistemas de ensino estrutura- do. Notícia de 17 de março de 2006 da coluna Notícias de Educação. Disponível em: <http:/ /aprendiz.uol.com.br/content.view.action?uuid=099f14260af470100140984b13bea23e>. Acesso em: 25 maio 2007. COSTA, J. de A. O uso do livro Química e Sociedade como livro complementar em uma escola particular. Instituto de Química da Universidade de Brasília, 2004. (Monografia de Conclusão de Curso de Licenciatura).
  • 21. LIVRO DIDÁTICO DE CIÊNCIAS: Fonte de Informação ou Apostila de Exercícios? 221Ano 21 • nº 76 • Jul./Dez. • 2006 FERNANDES, A. T. de Calazans. Livros didáticos em dimensões materiais e simbóli- cas. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 3, p. 531-545, set./dez. 2004. FERREIRA, M. S.; SELLES, S. E. Análise de livros didáticos em ciências: entre as ciências de referência e as finalidades sociais da escolarização. Educação em foco, Juiz de Fora, v. 8, n. 1-2, p. 63-78, mar./ago. 2003, set./fev. 2003/2004. FRACALANZA, H. O ensino de Ciências no Brasil. In: FRACALANZA, H.; MEGID NETO, J. (Orgs.). O livro didático de Ciências no Brasil. Campinas: Editora Komedi, 2006a. p. 126-152. ______. Livro didático de Ciências: novas ou velhas perspectivas. In: FRACALANZA, H.; MEGID NETO, J. (Orgs.). O livro didático de Ciências no Brasil. Campinas: Editora Komedi, 2006b. p. 174-195. GÉRARD, F-M; ROEGIERS, X. Conceber e avaliar manuais escolares. Porto: Editora Porto, 1988. JESUS, C. E. de. O livro Química e sociedade: O que pensam os seus usuários? Instituto de Química da Universidade de Brasília, 2006. (Monografia de Conclusão de Curso de Licenciatura). KRASILCHIK, M. Inovação no ensino de ciências. In: GARCIA, W. Inovação educa- cional no Brasil: problemas e perspectivas. São Paulo: Cortez, 1980. LAJOLO, M. Livro didático: velho tema, revisitado. Em Aberto, Brasília, ano 6, n. 35, p. 1-9, jul./set. 1987. LOGUERCIO, R. de Q.; DEL PINO, J. C.; SOUZA, D. O. G. de. A Educação e o livro didático: implicações sociais. Educação, PortoAlegre, ano XXV, n. 48, p.183-193, out., 2002. LORENZ, K. M. Os livros didáticos e o ensino de ciências na escola secundária brasi- leira no século XIX. Ciência e Cultura, v. 38, n. 3, mar. 1986. MEGID NETO, J.; FRACALANZA, H. O Livro didático de Ciências: problemas e soluções. In: FRACALANZA, H.; MEGID NETO, J. (Orgs.). O livro didático de Ciências no Brasil. Campinas: Editora Komedi, 2006. p. 153-169. MÓL, G. S.; SANTOS, W. L. P. (Coords.); CASTRO, E. N. F.; SILVA, G. S.; MATSU- NAGA, R. T.; FARIAS, S. B.; SANTOS, S. M. O.; DIB, F. M. S. Química e sociedade: a ciência, os materiais e o lixo, módulo 1. São Paulo: Editora Nova Geração, 2003. MORTIMER, E. F. A evolução dos livros didáticos de Química destinados ao ensino secundário. Em aberto, Brasília, ano 7, n. 40, p. 25-41, 1988. RICHAUDEAU, F. Conception et production des manuels scolaires: guide pratique. Paris: Unesco, 1979.
  • 22. WILDSON LUIZ PEREIRA DOS SANTOS – MARIA HELENA DA SILVA CARNEIRO 222 CONTEXTO e EDUCAÇÃO SCHNETZLER, R. P. A pesquisa em ensino de Química no Brasil: Conquistas e Pers- pectivas. Química Nova, vol. 25, p. 14-24, 2002. SERPA, L. F. P. A questão do livro didático. Em Aberto, Brasília, ano 6, n. 35, p. 11-17, jul./set. 1987. TAVEIRA, M. C. Vivenciando Química e Sociedade na sala de aula. Instituto de Quími- ca da Universidade de Brasília, 2004. Monografia de Conclusão de Curso de Licencia- tura. Recebido em: 27/5/2007 Aceito em: 25/6/2007