APELAÇÃO CÍVEL — AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS — MORTE DE DETENTO NO INTERIOR DE PRESÍDIO ESTADUAL — RESPONSABILIDADE SUBJETIVA — CONJUNTO PROBATÓRIO QUE APONTA A OCORRÊNCIA DE
SUICÍDIO — AUSÊNCIA DE NEXO ENTRE A SUPOSTA OMISSÃO DO ESTADO E O FALECIMENTO DO PRESO — MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO — RECURSO DESPROVIDO
Direito administrativo. apelação cível e reexame necessário. ms. edital de
Apelação cível — ação de reparação de danos
1. Apelação Cível n. 2008.072855-9, de Mafra
Relator: Des. Cláudio Barreto Dutra
APELAÇÃO CÍVEL — AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS
— MORTE DE DETENTO NO INTERIOR DE PRESÍDIO
ESTADUAL — RESPONSABILIDADE SUBJETIVA —
CONJUNTO PROBATÓRIO QUE APONTA A OCORRÊNCIA DE
SUICÍDIO — AUSÊNCIA DE NEXO ENTRE A SUPOSTA
OMISSÃO DO ESTADO E O FALECIMENTO DO PRESO —
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE JULGOU
IMPROCEDENTE O PEDIDO — RECURSO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2008.072855-9, da comarca de Mafra (2ª Vara Cível e Criminal), em que são
apelantes Cristiane Bueno e outro, e apelado o Estado de Santa Catarina:
ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Público, por votação
unânime, desprover o recurso. Custas legais.
RELATÓRIO
CRISTIANE BUENO E EDUARDA BUENO ajuizaram ação indenizatória
contra o ESTADO DE SANTA CATARINA, objetivando a reparação de dano causado
pela morte de seu esposo e genitor, respectivamente.
Asseveraram que Antonio Ferreira dos Santos, na data de 23 de
fevereiro de 2005, faleceu no interior do Presídio de Mafra, enquanto encontrava-se
preso. Disseram que a guarda pela integridade física e moral de detento é de
responsabilidade do Estado, motivo pelo qual vêm requerer indenização por danos
morais e pensionamento, uma vez que era o responsável pela manutenção da família.
Por fim, pleitearam a antecipação dos efeitos da tutela (fls. 02/10).
Citado, o Estado apresentou contestação alegando que: a) não praticou
qualquer ato arbitrário ou ilegal; b) a causa deve ser analisada sob o prisma da
responsabilidade subjetiva; c) o falecimento do preso foi por ele causado, não tendo
sido gerado pela administração. Questionou, ainda, os valores postulados (fls. 64/89).
Houve réplica (fls. 117/121).
2. Foi indeferida a antecipação dos efeitos da tutela e determinada a
produção de prova testemunhal (fl. 126).
Os embargos declaratórios opostos à fl. 129 foram rejeitados (fl. 131).
Após a oitiva de testemunhas (153/159 e 176/178), foram apresentadas
alegações finais (fls. 182/185 e 212/217).
Sobreveio a sentença, com a improcedência do pedido e a condenação
das autoras ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados em R$
1.000,00 (hum mil reais), suspensos em decorrência da Lei n. 1.060/50 (fls. 229/232).
Irresignadas, apelaram, sustentando que o Estado de Santa Catarina
deve ser responsabilizado com base na teoria subjetiva pela morte de seu esposo e
genitor, tendo em vista que, conforme inúmeros precedentes jurisprudenciais, é seu o
dever de guarda pela integridade física e moral de preso (fls. 236/241/verso).
Com as contrarrazões (fls. 245/270) ascenderam os autos a esta Corte,
tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça opinado pelo desprovimento (fls.
275/277).
VOTO
Cristiane Bueno e Eduarda Bueno ajuizaram ação visando a reparação
de danos morais e pensionamento, em decorrência do falecimento de seu esposo e
genitor, respectivamente, no interior do Presídio de Mafra, mantido pelo Estado de
Santa Catarina.
O artigo 37, § 6º, da Constituição Federal estabelece que “as pessoas
jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos
responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,
assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
Por outro lado, o caso em tela, deve ser analisado sob o prisma da
responsabilidade subjetiva, já que os danos alegados pela autora são atribuídos à
suposta omissão do Estado em velar pela integridade física e psíquica do detento no
interior de suas instalações.
Assim, é imprescindível a demonstração do elemento culpa para ser
comprovada.
É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus
prepostos é objetiva (art. 37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se se
verificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o
comportamento do preposto. Somente se afasta a responsabilidade se o evento
danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima. 3. Em
se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos
adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam a responsabilidade
subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a
só ser possível indenização quando houver culpa do preposto (REsp n. 738.833/RJ,
Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJU de 28.08.2006)
Em virtude dessas considerações, cumpre àquele que sofreu os efeitos
do fato danoso demonstrar que a Administração, por meio de seus agentes, incorreu
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3. em uma das modalidades de culpa: negligência, imprudência ou imperícia.
Na hipótese, os requisitos para configuração da responsabilidade civil
não estão preenchidos, uma vez que não se conseguiu comprovar que a morte de
Antonio Ferreira dos Santos foi decorrente da omissão do Estado em guardá-lo.
Dos documentos juntados aos autos retira-se que o falecimento de
Antonio foi por ele mesmo provocado.
As fotografias juntadas à inicial (fls. 38/40) mostram que o detento foi
encontrado dentro de sua cela já sem vida, em decorrência de enforcamento.
O laudo pericial de fls. 100/102 concluiu:
[...] haver ocorrido no local, objeto do presente Laudo, uma morte por asfixia. A
interpretação do quadro geral do local e do exame do cadáver, descrita nos itens
anteriores do presente indicam que a vítima fez uso de um pedaço do lençol o qual
foi confeccionado o laço, na sequência amarrado o laço ao pescoço e à barra de
ferro da janela sem a necessidade de utilização de um suporte para alcançá-la (a
janela) devido à baixa altura da janela (1,93 metro distante do piso) em relação à
estatura mediada da vítima (cerca de 1,70 metro de altura), ou então se escorou a
vítima com os pés na meia parede que separa a cela da latrina e com o corpo na
parede da janela (observar croqui anexo, local da posição do cadáver defronte para a
meia parede) vinda na sequência a realizar seu intento. [...] Face ao exposto
anteriormente concluir os Peritos que neste local ocorreu uma morte com
características de suicídio;[...]
Visto isso, não há como acomodar o pedido de danos morais e
pensionamento às autoras, porquanto o Estado de Santa Catarina, embora
responsável pela guarda do de cujus, não poderia montar vigilância a fim de impedir
que ceifasse sua própria vida, atitude que só a ele competia.
Neste sentido, diversos são os precedentes desta Corte:
Responsabilidade civil. Indenizatória. Danos morais e materiais. Prisão em
flagrante. Suicídio do conduzido. Pleito ajuizado pelos descendentes do detento.
Alegação de omissão do Estado. Inexistência de nexo de causalidade. Fato exclusivo
da vítima.
"Quando houver culpa da vítima, há que se distinguir se é sua culpa exclusiva
ou concorrente com a do poder público; no primeiro caso, o Estado não responde.
No segundo, atenua-se a sua responsabilidade, que se reparte com a da vítima (RTJ
55/50, RT 447/82 e 518/99)" (Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo.
18.ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 569).
O suicídio de detento não gera ao Poder Público, por si só, o dever de
indenizar os danos materiais e morais reclamados por seus dependentes.
Inexistentes elementos probatórios de que houve omissão específica ou culpa em
uma de suas modalidades, afasta-se a responsabilidade do Estado, ante o fato
exclusivo da vítima. (ACV n. 2008.070000-1, de Itá, Rel. Des. Pedro Manoel Abreu,
Terceira Câmara de Direito Público, julgada em 24.08.2010)
Nestes termos, deve ser mantida a sentença que julgou improcedente o
pedido formulado pelas autoras à inicial.
DECISÃO
Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.
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4. Participaram do julgamento, realizado no dia 24 de fevereiro de 2011, os
Exmos. Des. José Volpato de Souza e Rodrigo Collaço.
Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Dr.
Antenor Chinato Ribeiro.
Florianópolis, 28 de fevereiro de 2011.
Cláudio Barreto Dutra
PRESIDENTE E RELATOR
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