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Boletim de Jurisprudência Fiscal
Edição n.º 6/2016 (Novembro/Dezembro)
Tributação da alienação de direitos reais menores
relativos a participações sociais, em sede de
Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas
Singulares (“IRS”) – Decisão do CAAD, no
processo n.º 223/2015-T, de 28 de Outubro de 2015
Na decisão arbitral em análise discutiu-se a
legalidade de liquidações adicionais de IRS
relativas à tributação de mais-valias realizadas
com a alienação de participações sociais no ano de
2013. No caso em apreço, os sujeitos passivos
adquiriram a nua propriedade de tais
participações sociais em 1988 – por via de doação
–, e em 2012 consolidaram, por via sucessória, a
propriedade com o usufruto.
Foram, deste modo, especificamente escrutinadas
na decisão arbitral questões de incidência objectiva,
de determinação da data e valor de aquisição e
ainda do respectivo valor de realização, para
efeitos de tributação em sede de IRS.
Incidência objectiva, data de aquisição relevante
e regime transitório previsto para os rendimentos
da categoria G
A alienação de participações sociais traduz-se num
incremento patrimonial sujeito a IRS, a título de
mais-valias, nos termos dos artigos 9.º e 10.º, n.º 1,
alínea b), do respectivo Código.
Na decisão arbitral em apreço, tendo a aquisição
da nua propriedade ocorrido antes da entrada em
vigor do Código do IRS, os sujeitos passivos
alegaram que as liquidações adicionais padeciam
de ilegalidade por violarem o disposto no regime
transitório previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º
442-A/88, de 30 de Novembro, que dispõe o
seguinte:
“Os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-
valias, criado pelo código aprovado pelo Decreto-Lei n.º
46 373, de 9 de Junho de 1965, (…) só ficam sujeitos ao
IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitam
tiver sido efectuada depois da entrada em vigor deste
Código” (sublinhados nossos).
O referido regime estabelece que, os ganhos que
não se encontravam sujeitos a imposto de mais-
valias anteriormente à entrada em vigor do Código
do IRS, só são tributados em sede deste imposto se
a sua aquisição tiver ocorrido após 1 de Janeiro de
1989.
Tal regime transitório implica que se determine
qual a data de aquisição relevante do bem ou
direito (direito de nua propriedade, na situação em
análise) e, em particular, se esta é anterior ou
posterior a 1 de Janeiro de 1989.
A aquisição gratuita (por doação) da nua
propriedade era regulada, em 1988, nos artigos 3.º,
§ 1.º, e 21.º do Código do Imposto Municipal de
Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações
(“CIMSISSD”), que se transcrevem:
“3.º, § 1.º - Só se considera transmissão, para efeitos
deste imposto, a transferência real e efectiva dos bens; e,
assim, não se verificará a transmissão nas disposições
sob condição suspensiva, sem se realizar a condição, nas
doações por morte e nas doações entre casados, enquanto
não falecer o doador ou, no último caso, o donatário não
alienar os bens, e nas sucessões ou doações de
propriedade separada do usufruto, sem este acabar ou
sem a propriedade ser alienada.
21.º - Quando a propriedade for transmitida
separadamente do usufruto, o imposto será liquidado
pelo valor que os bens tiverem na altura em que o
adquirente efectuar a consolidação da propriedade com o
usufruto” (sublinhados nossos).
No domínio do anterior CIMSISSD – em vigor até
31 de Dezembro de 2003 – apenas se atribuía
relevância fiscal às transmissões gratuitas reais e
efectivas, as quais só se tinham por verificadas no
momento da consolidação da propriedade plena.
Na esteira de jurisprudência assente do Supremo
Tribunal Administrativo (“STA”) –
nomeadamente do Acórdão correspondente ao
processo n.º 0201/11 –, a data de aquisição
relevante da propriedade de acções cuja nua
propriedade e usufruto tenham sido adquiridos
em momentos diferentes corresponde à data de
consolidação da propriedade plena, sendo
irrelevante a data em que a nua propriedade tenha
sido adquirida.
Assim o explicita a Decisão do CAAD, que
determina: “Do quadro normativo exposto,
interpretado à luz da jurisprudência citada, resulta que,
para efeitos do disposto no art.º 5.º, n.º 1 do DL n.º 442-
A/88, de 30 de Novembro, apenas se deverá considerar
como adquiridos anteriormente à entrada em vigor do
CIRS, no caso das aquisições gratuitas, os bens ou
direitos objecto de transmissões relevantes para efeitos
de imposto sobre sucessões ou doações, pelo que, estando
em causa doações separadas do usufruto, o que é o caso
(…) só ocorre transmissão com a consolidação da
propriedade com o usufruto”.
Concluíram os árbitros, deste modo, que o regime
transitório apenas impedia a tributação dos
ganhos derivados da alienação de bens ou direitos
adquiridos antes da entrada em vigor do Código
do IRS, o que não sucedeu no caso em apreço, em
que o facto tributário (consolidação da nua
propriedade com o usufruto) se verificou em 2012,
estando como tal a alienação de acções sujeita a
tributação em IRS.
Actualmente, e desde 1 de Janeiro de 2004, no
domínio do Código do Imposto do Selo (“IS”), a
aquisição da nua propriedade e a consolidação da
propriedade com o usufruto, por via gratuita, em
momentos diferentes, constituem factos tributários
distintos sujeitos a tributação.
Questão não analisada na decisão arbitral em
apreço (em que houve lugar à transmissão da
propriedade plena das participações sociais), mas
que se justifica ainda neste ponto referir, respeita à
ausência de previsão expressa no elenco constante
do artigo 10.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRS, à
alienação de direitos reais menores referentes a
participações sociais, contrariamente ao que
sucede relativamente à alienação de direitos reais
menores referentes a bens imóveis, nos termos da
respectiva alínea a):
“Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não
sendo considerados rendimentos empresariais e
profissionais, de capitais ou prediais, resultem de: a)
alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis
(…); b) alienação onerosa de partes sociais e de outros
valores mobiliários (…)”.
Ora, a diferença de redacção entre as duas alíneas
do artigo 10.º, n.º 1, do Código do IRS, gera
dúvidas quanto ao modo de tributação da
alienação de direitos reais menores relativos a
participações sociais em sede de IRS. O
rendimento decorrente da alienação definitiva de
um direito de usufruto, em nossa opinião, não
poderá ser enquadrado na Categoria E do IRS, nos
termos do artigo 5.º, n.º 1, do respectivo Código,
por força da sua natureza de ganho diferencial
(entre os momentos e os valores de aquisição e
alienação), não periódico, devendo considerar-se
que a previsão de “alienação de partes sociais” no
artigo 10.º, n.º 1, b), é suficiente para recobrir na
Categoria G quer a venda do todo, quer a venda da
parte (nua propriedade ou usufruto da parte social).
Em todo o caso, seria conveniente que o legislador
clarificasse, com natureza interpretativa, esta
matéria.
Determinação do valor de aquisição relevante
Na decisão arbitral os sujeitos passivos
contestaram também a legalidade da quantificação
da obrigação tributária, razão pela qual foram
também analisadas as normas de determinação
dos valores de aquisição e de realização relevantes
em sede de IRS.
Estabelece-se no artigo 45.º, n.º 1, do Código do IRS,
que se considera como valor de aquisição, no caso
de bens ou direitos adquiridos a título gratuito, “a)
O valor que tenha sido considerado para efeitos de
liquidação de imposto do selo; b) O valor que serviria de
base à liquidação de imposto do selo, caso este fosse
devido”.
Na decisão arbitral foi atribuída relevância às
normas de incidência em vigor no momento da
aquisição (gratuita) do direito de nua propriedade,
pelo que foi entendido que, tendo o facto tributário
(aquisição gratuita) ocorrido com a consolidação
da propriedade plena em 2012, o valor de
aquisição relevante, para efeitos de IRS, deveria
corresponder ao valor tributável considerado na
liquidação de IS referente a esse ano de 2012.
Não foram, todavia, concretamente analisadas na
decisão arbitral – porque estava apenas em questão
a legalidade das liquidações adicionais de IRS – as
normas aplicáveis à determinação do valor
tributável relevante em sede de IS.
Os árbitros frisaram apenas que a determinação do
valor de aquisição (gratuita) de direitos reais
menores relativos a participações sociais não podia
resultar da aplicação das regras especiais do
Código do Imposto Municipal sobre as
Transmissões Onerosas de Imóveis (“IMT”) por
remissão do artigo 21.º do Código do IS. Na
perspectiva dos árbitros, tal seria “manifestamente
desajustado” porque as normas do IMT só seriam
aplicáveis aos bens imóveis.
No entanto, se atendermos à inserção sistemática
do mencionado artigo 21.º (Secção II, do Capítulo
III, do Código do IS, na qual se estabelecem as
normas para a determinação do valor tributável
relevante nas transmissões gratuitas), afirmar que
a remissão nele prevista para o Código do IMT se
restringiria aos bens imóveis redundaria numa
interpretação abrogante, tornando esta norma
supérflua, atentos os artigos 9.º, n.º 4, e 13.º, n.º 4,
do Código do IS – que remetem já expressamente
para o Código do IMT e que respeitam apenas à
determinação dos valores tributáveis dos bens
imóveis.
Por conseguinte, a remissão do referido artigo 21.º
apenas poderá ter algum sentido útil, de acordo
com os cânones interpretativos consagrados no
artigo 9.º do Código Civil, se não se dirigir à
determinação do valor tributável de direitos reais
menores relativos a bens imóveis transmitidos
gratuitamente, mas sim de direitos referentes aos
outros bens elencados nos artigos 14.º a 17.º do
Código do IS.
Face ao anteriormente exposto, persistem dúvidas
quanto ao valor de aquisição a relevar para efeitos
de IRS, que derivam das incertezas relativas à
determinação do valor tributável de direitos reais
menores referentes a participações sociais
transmitidos gratuitamente, sobretudo quando
estejam em causa situações de facto que abranjam
períodos de vigência de diferentes impostos, como
sejam o IMSISSD e o IS, os quais, como vimos,
prevêem diferentes normas de incidência e,
consequentemente, diferentes factos tributários.
Numa situação como a que está em análise,
aquando da consolidação do usufruto com a
propriedade em 2012, existe facto tributário para
efeitos de IS, mas, conforme acima defendemos,
por remissão expressa para o Código do IMT,
existem regras especiais para determinação do
valor tributável do usufruto sujeito a tributação. E,
neste caso, como se deverá determinar o valor
tributável da nua propriedade adquirida em 1988?
Por aplicação das normas previstas no CIMSISSD
(vigente em 1988, aquando da aquisição da nua
propriedade)? Ou por aplicação das normas
previstas no Código do IS (que, por remissão para
o Código do IMT, contemplam regras especiais
para a determinação do valor tributável da nua
propriedade)?
E qual o valor de aquisição relevante para efeitos
de IRS? O valor da liquidação de IS em 2012, que
deverá considerar apenas o valor tributável do
usufruto? Ou o resultado da soma dos valores
tributáveis correspondentes à aquisição da nua
propriedade, num primeiro momento, e à
aquisição do usufruto, num segundo momento?
Entendemos que, neste caso, o valor de aquisição a
considerar para efeitos de IRS será compósito,
integrando quer o valor tributável da nua
propriedade, quer o valor tributável do usufruto
(os quais podem ser hoje determinados por via da
remissão estabelecida no Código do IS para as
regras especiais previstas no Código do IMT).
De referir que não obsta a este raciocínio o facto de
na vigência do CIMSISSD não ter sido liquidado
qualquer imposto pela aquisição da nua
propriedade. O legislador não precisou no artigo
45.º, n.º 1, do Código do IRS, o motivo pelo qual o
IS não seria devido, tendo optado por uma
estatuição abrangente. Não pode o intérprete, sem
mais, restringir a letra da lei aos casos de isenção
subjectiva previstos no Código do IS, porque caso
tivesse sido essa a intenção do legislador, poderia
tê-lo feito expressamente à semelhança do que
aconteceu no n.º 3 do mesmo preceito legal.
Face ao anteriormente exposto, não nos parece,
pois, resultar da lei que o valor de aquisição de
participações sociais seja constituído unicamente
pelo valor liquidado em sede de IS no momento da
extinção do usufruto e da consolidação da
propriedade plena. De acordo com a legislação
hoje em vigor, o valor de aquisição de bens cuja
nua propriedade e usufruto tenham sido
adquiridos em momentos distintos corresponde a
um valor compósito, sendo o resultado da soma
dos valores tributáveis que foram – artigo 45.º, n.º
1, a), do Código do IRS – ou deveriam/poderiam
ter sido – artigo 45.º, n.º 1, b), do Código do IRS –
considerados nas liquidações de imposto em cada
um desses momentos.
Determinação do valor de realização relevante
Relativamente ao valor de realização, a decisão
arbitral considerou que “nos termos do artigo 44/1/f),
deveria ser utilizado o valor da contraprestação obtida
pela venda das participações cujo usufruto se consolidou,
em 2012, na nua-propriedade adquirida em 1988”.
Os árbitros entenderam como errónea a forma de
cálculo utilizada pela Autoridade Tributária e
Aduaneira (“AT”) que “considerou como valor de
realização, 30% do valor recebido pelos Requerentes,
como contrapartida da alienação dos respectivos
direitos”. E prosseguiu a decisão arbitral afirmando
que “dentro das regras próprias do IRS, nada permite
determinar o valor de realização do modo que a AT fez”.
Esta fórmula de determinação dos valores de
realização utilizada pela AT já tinha sido
sancionada em sede de informação vinculativa, no
processo n.º 2168/2009, com despacho
concordante do Subdirector-Geral, de 24 de
Junho de 2009, referente à tributação em sede de
IRS da alienação de bens imóveis (e não de bens
móveis, como no caso em apreço), cujos direitos
reais menores tinham sido adquiridos em
momentos distintos.
Os árbitros concluíram, no entanto, pela
inaplicabilidade das regras especiais do Código do
IS (por remissão para o Código do IMT) ao
fraccionamento e alocação do valor de realização -
nos mesmos termos em que, como defendemos,
tais regras se aplicam à determinação dos valores
de aquisição relevantes -, pois entenderam que o
valor de realização deve ser determinado “(…) de
acordo com o disposto na supra referida al. [f]) do n.º 1
do artigo 44.º do CIRS, não se afigurando aceitável a
eleição de um critério abstracto, como o utilizado, (…)
sem qualquer fundamento legal”.
E efectivamente o artigo 44.º, n.º 1, alínea f), do
Código do IRS, limita-se a referir o valor da
respectiva contraprestação, não oferecendo uma
base clara para a repartição e alocação do valor de
realização relevante, nomeadamente quando tal
repartição não seja evidenciada pelas partes e
quando esteja em causa uma aquisição fraccionada
de direitos reais menores.
***
Tendo em conta as dificuldades e incertezas acima
enunciadas na determinação dos valores de
aquisição e de realização relevantes em sede de
tributação de mais-valias em IRS, numa situação
como a analisada, de aquisição fraccionada de
direitos reais menores correspondentes a
participações sociais, consideramos crucial que os
sujeitos passivos procurem prévio
aconselhamento jurídico-fiscal antes de
procederem à transmissão de participações sociais
que se encontrem nessas condições.
Ricardo da Palma Borges / Ana Rita Pereira /
Carlos Alcântara Neves
Para obter mais informações sobre este tema
contacte: Ana Rita Pereira / rita@rpba.pt
* * *
Embora a elaboração deste Boletim tenha sido objecto do
devido cuidado, a Ricardo da Palma Borges &
Associados (RPBA) - Sociedade de Advogados, R.L. não
se responsabiliza por quaisquer consequências
decorrentes do uso da informação nele contida. Ela é
fornecida apenas para fins genéricos e não pode ser
considerada aconselhamento jurídico ou de outro tipo.
Recomenda-se uma assessoria jurídica qualificada e
dirigida ao caso concreto, previamente à tomada de
decisão relativamente a estes assuntos.

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RPBA Boletim de Jurisprudência Fiscal n.º 6 de 2016 - Tributação da alienação de direitos reais menores relativos a participações sociais em sede de IRS

  • 1. Boletim de Jurisprudência Fiscal Edição n.º 6/2016 (Novembro/Dezembro) Tributação da alienação de direitos reais menores relativos a participações sociais, em sede de Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Singulares (“IRS”) – Decisão do CAAD, no processo n.º 223/2015-T, de 28 de Outubro de 2015 Na decisão arbitral em análise discutiu-se a legalidade de liquidações adicionais de IRS relativas à tributação de mais-valias realizadas com a alienação de participações sociais no ano de 2013. No caso em apreço, os sujeitos passivos adquiriram a nua propriedade de tais participações sociais em 1988 – por via de doação –, e em 2012 consolidaram, por via sucessória, a propriedade com o usufruto. Foram, deste modo, especificamente escrutinadas na decisão arbitral questões de incidência objectiva, de determinação da data e valor de aquisição e ainda do respectivo valor de realização, para efeitos de tributação em sede de IRS. Incidência objectiva, data de aquisição relevante e regime transitório previsto para os rendimentos da categoria G A alienação de participações sociais traduz-se num incremento patrimonial sujeito a IRS, a título de mais-valias, nos termos dos artigos 9.º e 10.º, n.º 1, alínea b), do respectivo Código. Na decisão arbitral em apreço, tendo a aquisição da nua propriedade ocorrido antes da entrada em vigor do Código do IRS, os sujeitos passivos alegaram que as liquidações adicionais padeciam de ilegalidade por violarem o disposto no regime transitório previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, que dispõe o seguinte: “Os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais- valias, criado pelo código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 373, de 9 de Junho de 1965, (…) só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitam tiver sido efectuada depois da entrada em vigor deste Código” (sublinhados nossos). O referido regime estabelece que, os ganhos que não se encontravam sujeitos a imposto de mais- valias anteriormente à entrada em vigor do Código do IRS, só são tributados em sede deste imposto se a sua aquisição tiver ocorrido após 1 de Janeiro de 1989. Tal regime transitório implica que se determine qual a data de aquisição relevante do bem ou direito (direito de nua propriedade, na situação em análise) e, em particular, se esta é anterior ou posterior a 1 de Janeiro de 1989. A aquisição gratuita (por doação) da nua propriedade era regulada, em 1988, nos artigos 3.º, § 1.º, e 21.º do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações (“CIMSISSD”), que se transcrevem: “3.º, § 1.º - Só se considera transmissão, para efeitos deste imposto, a transferência real e efectiva dos bens; e, assim, não se verificará a transmissão nas disposições sob condição suspensiva, sem se realizar a condição, nas doações por morte e nas doações entre casados, enquanto não falecer o doador ou, no último caso, o donatário não alienar os bens, e nas sucessões ou doações de propriedade separada do usufruto, sem este acabar ou sem a propriedade ser alienada. 21.º - Quando a propriedade for transmitida separadamente do usufruto, o imposto será liquidado pelo valor que os bens tiverem na altura em que o adquirente efectuar a consolidação da propriedade com o usufruto” (sublinhados nossos). No domínio do anterior CIMSISSD – em vigor até 31 de Dezembro de 2003 – apenas se atribuía relevância fiscal às transmissões gratuitas reais e efectivas, as quais só se tinham por verificadas no momento da consolidação da propriedade plena. Na esteira de jurisprudência assente do Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) – nomeadamente do Acórdão correspondente ao processo n.º 0201/11 –, a data de aquisição
  • 2. relevante da propriedade de acções cuja nua propriedade e usufruto tenham sido adquiridos em momentos diferentes corresponde à data de consolidação da propriedade plena, sendo irrelevante a data em que a nua propriedade tenha sido adquirida. Assim o explicita a Decisão do CAAD, que determina: “Do quadro normativo exposto, interpretado à luz da jurisprudência citada, resulta que, para efeitos do disposto no art.º 5.º, n.º 1 do DL n.º 442- A/88, de 30 de Novembro, apenas se deverá considerar como adquiridos anteriormente à entrada em vigor do CIRS, no caso das aquisições gratuitas, os bens ou direitos objecto de transmissões relevantes para efeitos de imposto sobre sucessões ou doações, pelo que, estando em causa doações separadas do usufruto, o que é o caso (…) só ocorre transmissão com a consolidação da propriedade com o usufruto”. Concluíram os árbitros, deste modo, que o regime transitório apenas impedia a tributação dos ganhos derivados da alienação de bens ou direitos adquiridos antes da entrada em vigor do Código do IRS, o que não sucedeu no caso em apreço, em que o facto tributário (consolidação da nua propriedade com o usufruto) se verificou em 2012, estando como tal a alienação de acções sujeita a tributação em IRS. Actualmente, e desde 1 de Janeiro de 2004, no domínio do Código do Imposto do Selo (“IS”), a aquisição da nua propriedade e a consolidação da propriedade com o usufruto, por via gratuita, em momentos diferentes, constituem factos tributários distintos sujeitos a tributação. Questão não analisada na decisão arbitral em apreço (em que houve lugar à transmissão da propriedade plena das participações sociais), mas que se justifica ainda neste ponto referir, respeita à ausência de previsão expressa no elenco constante do artigo 10.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRS, à alienação de direitos reais menores referentes a participações sociais, contrariamente ao que sucede relativamente à alienação de direitos reais menores referentes a bens imóveis, nos termos da respectiva alínea a): “Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de: a) alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis (…); b) alienação onerosa de partes sociais e de outros valores mobiliários (…)”. Ora, a diferença de redacção entre as duas alíneas do artigo 10.º, n.º 1, do Código do IRS, gera dúvidas quanto ao modo de tributação da alienação de direitos reais menores relativos a participações sociais em sede de IRS. O rendimento decorrente da alienação definitiva de um direito de usufruto, em nossa opinião, não poderá ser enquadrado na Categoria E do IRS, nos termos do artigo 5.º, n.º 1, do respectivo Código, por força da sua natureza de ganho diferencial (entre os momentos e os valores de aquisição e alienação), não periódico, devendo considerar-se que a previsão de “alienação de partes sociais” no artigo 10.º, n.º 1, b), é suficiente para recobrir na Categoria G quer a venda do todo, quer a venda da parte (nua propriedade ou usufruto da parte social). Em todo o caso, seria conveniente que o legislador clarificasse, com natureza interpretativa, esta matéria. Determinação do valor de aquisição relevante Na decisão arbitral os sujeitos passivos contestaram também a legalidade da quantificação da obrigação tributária, razão pela qual foram também analisadas as normas de determinação dos valores de aquisição e de realização relevantes em sede de IRS. Estabelece-se no artigo 45.º, n.º 1, do Código do IRS, que se considera como valor de aquisição, no caso de bens ou direitos adquiridos a título gratuito, “a) O valor que tenha sido considerado para efeitos de liquidação de imposto do selo; b) O valor que serviria de base à liquidação de imposto do selo, caso este fosse devido”. Na decisão arbitral foi atribuída relevância às normas de incidência em vigor no momento da aquisição (gratuita) do direito de nua propriedade, pelo que foi entendido que, tendo o facto tributário
  • 3. (aquisição gratuita) ocorrido com a consolidação da propriedade plena em 2012, o valor de aquisição relevante, para efeitos de IRS, deveria corresponder ao valor tributável considerado na liquidação de IS referente a esse ano de 2012. Não foram, todavia, concretamente analisadas na decisão arbitral – porque estava apenas em questão a legalidade das liquidações adicionais de IRS – as normas aplicáveis à determinação do valor tributável relevante em sede de IS. Os árbitros frisaram apenas que a determinação do valor de aquisição (gratuita) de direitos reais menores relativos a participações sociais não podia resultar da aplicação das regras especiais do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (“IMT”) por remissão do artigo 21.º do Código do IS. Na perspectiva dos árbitros, tal seria “manifestamente desajustado” porque as normas do IMT só seriam aplicáveis aos bens imóveis. No entanto, se atendermos à inserção sistemática do mencionado artigo 21.º (Secção II, do Capítulo III, do Código do IS, na qual se estabelecem as normas para a determinação do valor tributável relevante nas transmissões gratuitas), afirmar que a remissão nele prevista para o Código do IMT se restringiria aos bens imóveis redundaria numa interpretação abrogante, tornando esta norma supérflua, atentos os artigos 9.º, n.º 4, e 13.º, n.º 4, do Código do IS – que remetem já expressamente para o Código do IMT e que respeitam apenas à determinação dos valores tributáveis dos bens imóveis. Por conseguinte, a remissão do referido artigo 21.º apenas poderá ter algum sentido útil, de acordo com os cânones interpretativos consagrados no artigo 9.º do Código Civil, se não se dirigir à determinação do valor tributável de direitos reais menores relativos a bens imóveis transmitidos gratuitamente, mas sim de direitos referentes aos outros bens elencados nos artigos 14.º a 17.º do Código do IS. Face ao anteriormente exposto, persistem dúvidas quanto ao valor de aquisição a relevar para efeitos de IRS, que derivam das incertezas relativas à determinação do valor tributável de direitos reais menores referentes a participações sociais transmitidos gratuitamente, sobretudo quando estejam em causa situações de facto que abranjam períodos de vigência de diferentes impostos, como sejam o IMSISSD e o IS, os quais, como vimos, prevêem diferentes normas de incidência e, consequentemente, diferentes factos tributários. Numa situação como a que está em análise, aquando da consolidação do usufruto com a propriedade em 2012, existe facto tributário para efeitos de IS, mas, conforme acima defendemos, por remissão expressa para o Código do IMT, existem regras especiais para determinação do valor tributável do usufruto sujeito a tributação. E, neste caso, como se deverá determinar o valor tributável da nua propriedade adquirida em 1988? Por aplicação das normas previstas no CIMSISSD (vigente em 1988, aquando da aquisição da nua propriedade)? Ou por aplicação das normas previstas no Código do IS (que, por remissão para o Código do IMT, contemplam regras especiais para a determinação do valor tributável da nua propriedade)? E qual o valor de aquisição relevante para efeitos de IRS? O valor da liquidação de IS em 2012, que deverá considerar apenas o valor tributável do usufruto? Ou o resultado da soma dos valores tributáveis correspondentes à aquisição da nua propriedade, num primeiro momento, e à aquisição do usufruto, num segundo momento? Entendemos que, neste caso, o valor de aquisição a considerar para efeitos de IRS será compósito, integrando quer o valor tributável da nua propriedade, quer o valor tributável do usufruto (os quais podem ser hoje determinados por via da remissão estabelecida no Código do IS para as regras especiais previstas no Código do IMT). De referir que não obsta a este raciocínio o facto de na vigência do CIMSISSD não ter sido liquidado qualquer imposto pela aquisição da nua propriedade. O legislador não precisou no artigo 45.º, n.º 1, do Código do IRS, o motivo pelo qual o IS não seria devido, tendo optado por uma estatuição abrangente. Não pode o intérprete, sem
  • 4. mais, restringir a letra da lei aos casos de isenção subjectiva previstos no Código do IS, porque caso tivesse sido essa a intenção do legislador, poderia tê-lo feito expressamente à semelhança do que aconteceu no n.º 3 do mesmo preceito legal. Face ao anteriormente exposto, não nos parece, pois, resultar da lei que o valor de aquisição de participações sociais seja constituído unicamente pelo valor liquidado em sede de IS no momento da extinção do usufruto e da consolidação da propriedade plena. De acordo com a legislação hoje em vigor, o valor de aquisição de bens cuja nua propriedade e usufruto tenham sido adquiridos em momentos distintos corresponde a um valor compósito, sendo o resultado da soma dos valores tributáveis que foram – artigo 45.º, n.º 1, a), do Código do IRS – ou deveriam/poderiam ter sido – artigo 45.º, n.º 1, b), do Código do IRS – considerados nas liquidações de imposto em cada um desses momentos. Determinação do valor de realização relevante Relativamente ao valor de realização, a decisão arbitral considerou que “nos termos do artigo 44/1/f), deveria ser utilizado o valor da contraprestação obtida pela venda das participações cujo usufruto se consolidou, em 2012, na nua-propriedade adquirida em 1988”. Os árbitros entenderam como errónea a forma de cálculo utilizada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) que “considerou como valor de realização, 30% do valor recebido pelos Requerentes, como contrapartida da alienação dos respectivos direitos”. E prosseguiu a decisão arbitral afirmando que “dentro das regras próprias do IRS, nada permite determinar o valor de realização do modo que a AT fez”. Esta fórmula de determinação dos valores de realização utilizada pela AT já tinha sido sancionada em sede de informação vinculativa, no processo n.º 2168/2009, com despacho concordante do Subdirector-Geral, de 24 de Junho de 2009, referente à tributação em sede de IRS da alienação de bens imóveis (e não de bens móveis, como no caso em apreço), cujos direitos reais menores tinham sido adquiridos em momentos distintos. Os árbitros concluíram, no entanto, pela inaplicabilidade das regras especiais do Código do IS (por remissão para o Código do IMT) ao fraccionamento e alocação do valor de realização - nos mesmos termos em que, como defendemos, tais regras se aplicam à determinação dos valores de aquisição relevantes -, pois entenderam que o valor de realização deve ser determinado “(…) de acordo com o disposto na supra referida al. [f]) do n.º 1 do artigo 44.º do CIRS, não se afigurando aceitável a eleição de um critério abstracto, como o utilizado, (…) sem qualquer fundamento legal”. E efectivamente o artigo 44.º, n.º 1, alínea f), do Código do IRS, limita-se a referir o valor da respectiva contraprestação, não oferecendo uma base clara para a repartição e alocação do valor de realização relevante, nomeadamente quando tal repartição não seja evidenciada pelas partes e quando esteja em causa uma aquisição fraccionada de direitos reais menores. *** Tendo em conta as dificuldades e incertezas acima enunciadas na determinação dos valores de aquisição e de realização relevantes em sede de tributação de mais-valias em IRS, numa situação como a analisada, de aquisição fraccionada de direitos reais menores correspondentes a participações sociais, consideramos crucial que os sujeitos passivos procurem prévio aconselhamento jurídico-fiscal antes de procederem à transmissão de participações sociais que se encontrem nessas condições. Ricardo da Palma Borges / Ana Rita Pereira / Carlos Alcântara Neves Para obter mais informações sobre este tema contacte: Ana Rita Pereira / rita@rpba.pt * * *
  • 5. Embora a elaboração deste Boletim tenha sido objecto do devido cuidado, a Ricardo da Palma Borges & Associados (RPBA) - Sociedade de Advogados, R.L. não se responsabiliza por quaisquer consequências decorrentes do uso da informação nele contida. Ela é fornecida apenas para fins genéricos e não pode ser considerada aconselhamento jurídico ou de outro tipo. Recomenda-se uma assessoria jurídica qualificada e dirigida ao caso concreto, previamente à tomada de decisão relativamente a estes assuntos.