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TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 1
Apresentação......................................................................................................................... 4
Aula 1: Teoria da Constituição............................................................................................... 5
.......................................................................................................................... 5Introdução
............................................................................................................................ 7Conteúdo
O neoconstitucionalismo na perspectiva pós-positivista.................................................7
O pós-positivismo como corrente não positivista...............................................................7
O deslocamento da agenda.......................................................................................................... 9
A busca pela superação teórica das escolas juspositivista e jusnaturalista...........10
A mitigação da dicotomia descrição/prescrição ................................................................11
Juspositivismo e sua relação com casos difíceis...............................................................12
A importância dos casos difíceis............................................................................................... 13
O neoconstitucionalismo e a constitucionalização do direito....................................14
Principais aspectos do neoconstitucionalismo..................................................................14
A onipresença da constituição ..................................................................................................15
Onipresença judicial.......................................................................................................................16
Coerência sistêmica do neoconstitucionalismo................................................................18
Regras neoconstitucionais...........................................................................................................18
Discussões necessárias sobre a ponderação e a subsunção .......................................20
Resumo - Neoconstitucionalismo............................................................................................20
A teoria do neoconstitucionalismo..........................................................................................21
Neoconstitucionalismo como nova concepção jurídica...............................................22
Atividade proposta...........................................................................................................................24
.................................................................................................................................. 26Notas
................................................................................................................... 26Aprenda Mais
....................................................................................................................... 26Referências
..................................................................................................... 28Exercícios de fixação
........................................................................................................ 33Chaves de resposta
Aula 2: Interpretação constitucional................................................................................... 36
........................................................................................................................ 36Introdução
.......................................................................................................................... 38Conteúdo
O mundo globalizado e a aproximação de sistemas................................................ 38
O sistema jurídico brasileiro e a common law...................................................................38
Emenda Constitucional nº 45/2004 ........................................................................................39
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 2
Transconstitucionalismo e a cross fertilization..................................................................39
Aproximação da civil law e common law – algumas notas introdutórias.............40
Sistema jurídico brasileiro e o sistema de common law................................................41
Civil Law...............................................................................................................................................42
Fatores condicionantes na organização dos fatores jurídicos brasileiro................43
A aproximação do sistema jurídico brasileiro ao sistema de common law..........44
Sistema de common law..............................................................................................................46
Súmula vinculante...........................................................................................................................49
Poder Judiciário brasileiro ...........................................................................................................51
O transconstitucionalismo e as fertilizações cruzadas entre sistemas....................52
Transconstitucionalismo e interconstitucionalidade ......................................................54
As formas de transconstitucionalidade entre ordens jurídicas...................................55
Entre direito estatal e direito internacional público.........................................................57
Fatores de ordem judicial.............................................................................................................58
Atividade proposta...........................................................................................................................60
.................................................................................................................................. 60Notas
................................................................................................................... 61Aprenda Mais
....................................................................................................................... 61Referências
..................................................................................................... 63Exercícios de fixação
........................................................................................................ 69Chaves de resposta
Aula 3: A teoria dos direitos fundamentais......................................................................... 73
........................................................................................................................ 73Introdução
.......................................................................................................................... 75Conteúdo
Princípio da proporcionalidade .................................................................................................75
Conceito de proporcionalidade.................................................................................................75
Noção de proporção ......................................................................................................................76
Direito público...................................................................................................................................76
Ordenamentos .................................................................................................................................. 77
Setor do direito público e o conceito de proporcionalidade.......................................78
Ensinamentos doutrinários de Luís Roberto Barroso......................................................78
A proporcionalidade na jurisprudência do Supremo.......................................................80
Proporcionalidade e linguagem................................................................................................81
Proporcionalidade no direito......................................................................................................82
A proporcionalidade como postulado....................................................................................82
Critérios do postulado ...................................................................................................................85
Subprincípios......................................................................................................................................86
Proporcionalidade em sentido estrito ....................................................................................89
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 3
Conclusão............................................................................................................................................90
Atividade proposta...........................................................................................................................91
................................................................................................................... 92Aprenda Mais
....................................................................................................................... 92Referências
..................................................................................................... 93Exercícios de fixação
........................................................................................................ 98Chaves de resposta
Aula 4: Controle de Constitucionalidade........................................................................... 101
...................................................................................................................... 101Introdução
........................................................................................................................ 103Conteúdo
A “constitucionalização” do direito europeu e um novo paradigma jurídico ....103
Características expressas por Jónatas Machado..............................................................103
As pretensões constitucionais do direito da União Europeia ................................... 104
Atribuição de competência...................................................................................................... 105
Direito europeu e direito Constitucional............................................................................ 105
A relação entre o direito da UE e o direito constitucional segundo as principais
cortes constitucionais................................................................................................................. 106
Uma outra perspectiva de análise: a influência do direito nacional ao direito da
UE..........................................................................................................................................................110
Os interesses nacionais e os limites dos direitos da UE ...............................................110
Estrutura normativa do direito (parte 1) – direito primário......................................... 111
Direito primário...............................................................................................................................112
Tratados instituidores e de revisão........................................................................................112
Protocolos adicionais, declarações e atos de complementação .............................115
Princípios gerais do direito da UE...........................................................................................116
Princípios gerais do direito ........................................................................................................ 117
Conclusão..........................................................................................................................................118
Atividade proposta.........................................................................................................................119
................................................................................................................................ 119Notas
................................................................................................................. 121Aprenda Mais
..................................................................................................................... 121Referências
................................................................................................... 124Exercícios de fixação
...................................................................................................... 126Chaves de resposta
Conteudista.......................................................................................................................................128
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 4
Nesta disciplina, estudaremos os temas dos novos paradigmas de interpretação
constitucional, do pós-positivismo e da normatividade dos princípios
constitucionais, da teoria dos direitos fundamentais, do controle de
constitucionalidade e das ações constitucionais.
Analisaremos o eixo “força normativa da Constituição e paradigmas pós-
positivistas de interpretação constitucional”, e atualizaremos a visão da
Constituição como um sistema de regras e princípios.
Sendo assim, esta disciplina tem como objetivos:
1. Reconhecer a força normativa da constituição, bem como os novos
paradigmas de interpretação constitucional;
2. Definir e explicar a jurisdição constitucional brasileira.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 5
Introdução
Esta aula traz como tema central o neoconstitucionalismo. Esse é um termo que
explica um fenômeno relativamente recente dentro do Estado constitucional
contemporâneo e que hoje tem se desenvolvido grandemente, principalmente
no Brasil, na esteira do que acontece em grandes tradições jurídicas europeia e
sul-americana.
Esse frenético desenvolvimento é devido ao crescimento das vertentes pós-
positivistas, na razão proporcional em que se intensificam os problemas de
ordem teórico-jurídica suscitados pelas insuficiências do positivismo jurídico
como concepção jusfilosófica, nos dias atuais.
Como resultado de seu desenvolvimento, esse fenômeno vem gerando uma
evidente alteração no processo de compreensão da ordem jurídica. Na base
fulcral do que estamos considerando ser um processo de valorização dos
ideários neoconstitucionais no âmbito jurídico-constitucional brasileiro, temos
como premissas que o mesmo não surge em nosso ambiente jurídico como um
modismo inconsequente e passageiro.
Pelo contrário, temos motivos para acreditar que o mesmo encontra
fundamentos não apenas em bases mais remotas de uma tradição do
pensamento ocidental, mas também, em bases profundas da própria formação
histórica e mental do pensamento jurídico brasileiro, que sempre questionou a
dificuldade do positivismo de relacionar direito e justiça.
Assim, devemos analisar que na base de fenômenos facilmente perceptíveis na
realidade jurídica brasileira hodierna, como a redescoberta dos princípios
jurídicos, (em especial a dignidade da pessoa humana), a expansão da
jurisdição constitucional com ênfase no surgimento de tribunais constitucionais
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 6
(na esteira da judicialização da política) e o desenvolvimento de novos métodos
e princípios na hermenêutica constitucional, encontra-se o fenômeno
neoconstitucional, como concepção pós-positivista. É o que veremos a seguir.
Objetivos:
1. Mostrar a relação existente entre o desenvolvimento econômico dos países e
a dependência motivada pelo aumento de demanda energética: problemas e
desafios;
2. Ressaltar as dificuldades enfrentadas por países que dependem de uma
única fonte energética para suprir as crescentes demandas energéticas.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 7
Conteúdo
O neoconstitucionalismo na perspectiva pós-positivista
Para iniciar a primeira aula, pense: em quais momentos ou quais autores
deixaram de apresentar de forma clara uma diferenciação entre os conceitos
pós-positivismo e neoconstitucionalismo? Na maioria das vezes, quando
estudamos esses dois termos e seus conceitos, buscamos sempre entendê-los
como fenômenos distintos, porém estão sempre interligados. Vejamos:
Pós-positivismo
Tem por ideia central o ataque a algumas concepções positivistas (e nesse
sentido é uma corrente jusfilosófica não positivista).
Neoconstitucionalismo
Tem por concepção teórica central conceder às normas constitucionais o papel
de vetores axiológicos do sistema jurídico, irradiando seus valores para todas as
áreas do Direito, principalmente aquelas que enaltecem a dignidade humana.
O pós-positivismo como corrente não positivista
Para que você entenda melhor o que foi dito anteriormente, vamos conhecer
um pouco de cada uma dessas linhas de pensamento, apontando suas relações.
Até porque, não nos parece possível compreender o que seja o
neoconstitucionalismo, como concepção filosófico-jurídica, sem o pressuposto
entendimento do que venha a ser pós-positivismo.
De qualquer forma, a verdade é que o que estamos chamando de pós-
positivista não é uma doutrina pura. Trata-se de diversas doutrinas
heterogêneas em sua inspiração e alcance, mas que têm como objetivo comum
fundamental responder às questões que determinaram a crise do positivismo
jurídico.
Entre essas diversas versões denominadas por pós-positivistas, temos aquelas
que são elaboradas a partir de sofisticados argumentos que procuram fazer
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 8
com que a validade das normas jurídicas dependam, também, de considerações
de natureza moral, tendo por base a dignidade humana.
A terceira via (?)
Sobre a possibilidade de ser ou não o pós-positivismo uma terceira via aos
discursos das mais tradicionais escolas filosóficas do Direito – jusnaturalista e
juspositivista –, algumas ideias emergem no cenário acadêmico. Três se
destacam:
• A primeira entende que o pós-positivismo vem se apresentando, cada
vez mais, como uma terceira via às escolas jusnaturalistas e do
positivismo jurídico, porque tem por propósito ultrapassar as limitações e
reduções que, no decorrer da história, essas duas correntes centrais
apresentaram;
• Uma segunda visão sobre o tema é daqueles que entendem que seria
uma nova etapa, uma nova geração do positivismo jurídico, mitigada
pelo reconhecimento da normatividade dos princípios;
• A terceira corrente é aquela seguida por quem entende que o pós-
positivismo deve ser considerado uma vertente fraca do jusnaturalismo.
Neste sentido, a ênfase está em um jusnaturalismo enfraquecido pela
inevitável influência histórica positivista.
A posição por nós assumida, neste curso, é aquela que defende ser uma
terceira via. Mesmo cientes de que se trata de uma questão complexa, na qual
todas as vertentes apresentam argumentos de grande densidade, a primeira
visão apresentada, a nosso ver, é aquela que melhor acentua a necessidade de
superação das deficiências das duas escolas tradicionais, jusnaturalismo e o
positivismo jurídico, que em seus fundamentos teóricos já não mais possibilitam
uma fundamentação mais efetiva do direito contemporâneo em meio às suas
dificuldades que emergem no plano histórico.
Devido a isso, se por um lado, as concepções pós-positivistas afastam-se de
qualquer consideração metafísica que vislumbre a possibilidade de um direito
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 9
natural, por outro lado, temos que a tese da clássica separação entre direito e
moral, levada a cabo de forma contundente pelas correntes positivistas, e tidas
por essa como uma questão central e essencial, não são recebidas pelas novas
correntes, que chamamos de pós-positivistas, mas que poderiam ser chamadas,
como o fez Robert Alexy, de não positivistas.
Dentro dessa perspectiva, vale analisar algumas características que costumam
especificar a linha pós-positivista, tendo em vista que acabam, por via de
consequência, servindo de base para o que chamamos de
neoconstitucionalismo.
O deslocamento da agenda
Agora que já conhecemos um pouco sobre o pós-positivista, vamos estudar
sobre o deslocamento da agenda que diz respeito à mudança do temário e dos
compromissos assumidos pelos autores pós-positivistas que, afastando-se da
agenda estabelecida por juristas positivistas, passam a se referenciar pelas
seguintes vertentes:
1. A importância fundamental dos princípios do direito na organização do
sistema.
2. A relevância da dimensão argumentativa na compreensão do direito nas
sociedades democráticas contemporâneas.
3. Reflexão profunda sobre o papel a ser desempenhado pela hermenêutica
jurídica.
Nesse sentido, o jurista aponta seu olhar não apenas para o presente, mas
também para o futuro, com preocupações evidentes de criar uma metodologia
de análise que dê conta de compreender o fenômeno jurídico em um mundo
essencialmente mutante, plural e dinâmico.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 10
A busca pela superação teórica das escolas juspositivista e
jusnaturalista
O pós-positivismo, como corrente teórica, surge fundamentalmente como
resistência à hegemonia do positivismo jurídico, pois neste se encontrariam
algumas teses vitais consideradas incompatíveis com as formulações pós-
positivistas.
Neste sentido, não se deve deixar de ressaltar o trabalho desenvolvido por dois
grande teóricos jurídicos, que se notabilizaram no mundo filosófico-jurídico por
intermédio de trabalhos claramente fundamentados na chamada corrente pós-
positivista.
Robert Alexy – é reconhecido como representante do debate no âmbito do
direito continental.
Ronald Dworkin – é reconhecido no âmbito do debate do direito anglo-
americano.
Aliás, segundo juristas de relevo, somente pode ser considerado pós-positivista
aquele que contraria algumas das teses fundamentais do positivismo jurídico,
ou seja, aqueles que atacam, principalmente, a separação entre as esferas
moral, política e jurídica.
Para os pós-positivistas, o reconhecimento da centralidade do papel exercido
pelos princípios jurídicos inter-relaciona, inevitavelmente, essas três esferas da
vida social. Daí que haja uma reaproximação entre direito e moral no
neoconstitucionalismo, como vertente pós-positivista que é.
Ressalte-se que a visão pós-positivista segue acreditando no projeto da
racionalidade, iniciado na Modernidade. Nesta via, observamos que adotar uma
visão pós-positivista não significa recusar a racionalidade que está na gênese
do pensamento positivista, mas sim ir mais avante, acreditando também em
critérios de justiciabilidade (estabelecidos a partir de argumentos também
racionais). Enquanto o preenchimento das lacunas normativas é resolvido pela
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 11
“discricionariedade” do juiz, o pós-positivismo entende que as lacunas são
apenas aparentes, pois o sistema possui uma inteligência implícita que produz
norma para qualquer situação, não dependendo de “bom senso” ou “visões
particulares” do magistrado.
Conclusão inevitável é que o pós-positivismo afasta-se do positivismo jurídico
quando reestabelece uma aproximação entre as esferas ético-moral, política e
jurídica e, principalmente, trazendo para dentro da esfera da juridicidade, por
meio dos princípios jurídicos, os elementos de natureza ético-morais que
circunstanciam a questão concreta em análise.
A mitigação da dicotomia descrição/prescrição
Para autores pós-positivistas, uma das questões fundamentais é recusar o
paradigma positivista que defende como axioma a distinção entre descrição e
prescrição. Tendo sido este ponto largamente trabalhado por Hans Kelsen,
segundo este, a prescrição refere-se ao trabalho do legislador quando este
produz a norma jurídica.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 12
Já a descrição vincula-se ao trabalho do teórico, do doutrinador, que procura
municiar os operadores do Direito, dando-lhes instrumentos capazes de
conduzi-los a respostas corretas para complexos problemas jurídicos,
principalmente nos casos difíceis (hard cases).
Juspositivismo e sua relação com casos difíceis
De acordo com todas as informações que estudamos até este momento, o pós-
positivismo oferece um forte amparo conceitual ao que diz respeito às decisões
a serem tomadas e também as doutrinas judiciais, principalmente ao se tratar
de casos difíceis. Para ampliar ainda mais nossos conhecimentos, veja mais
algumas informações:
Para um juspositivista, o papel da doutrina é bastante limitado em relação ao
que pensariam os pós-positivistas. Estes, ao contrário, entendem que na
solução de casos difíceis, a doutrina acaba por ser uma ferramenta essencial,
auxiliando fortemente a pensar racionalmente a ordem jurídica. Não se trata de
afastar o papel fundamental do legislador, mas valorizar as produções
doutrinárias e jurisprudenciais, quebrando o monopólio concedido àquele.
É ao que temos assistido, cada vez em maior profusão, principalmente no
interior das supremas cortes espalhadas pelo mundo (o STF, inclusive, e de
forma intensa). Nestas, evidencia-se a impossibilidade de produção de normas
específicas para os diferentes problemas que diariamente são expostos aos
poderes judiciários espalhados pelo mundo, sem que haja previsão normativa
específica para suas soluções.
Neste caso, a tendência é que, cada vez, com maior frequência, os juízes
(principalmente aqueles atrelados a cortes superiores) fundamentem suas
decisões com base em conhecimentos produzidos pelos estudiosos,
reconhecendo-se, nesses estudos, base jurídica para alicerçar suas decisões.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 13
A importância dos casos difíceis
Outra mudança trazida pelo paradigma pós-positivista é a maior preocupação
com os chamados casos difíceis (hard cases) em detrimento dos casos fáceis
(soft cases). Isto se explica pela nova realidade experimentada no mundo
contemporâneo que, como já dito anteriormente, não apenas sofre mudanças
em uma velocidade jamais experimentada no percurso histórico da
humanidade, como também tende a respeitar e valorizar a pluralidade de
concepções.
Assim, as questões que exigem solução pelo poder público apresentam, nos
dias de hoje, um grau de complexidade que um modelo estático de sistema
jurídico - marcado pela rigidez do sistema norma-regra - não pode oferecer.
Casos difíceis
Os casos difíceis se caracterizam por trazerem à baila a controvérsia incomum,
rara e infrequente, que as práticas legais existentes não são capazes de
resolver de forma definitiva. Atienza, baseado em MacCormick, estabelece
quatro possíveis tipos de problemas jurídicos que ensejam os denominados
“casos difíceis”. São eles:
1. Quando nos deparamos com o problema de não haver dispositivo
normativo para solucionar o caso em questão (problema de relevância);
2. Quando há dúvidas acerca da ocorrência ou não de um determinado fato
(problemas de prova);
3. Quando nos deparamos com o problema de como entender uma norma
(problema de interpretação);
4. Quando se discute se um dado fato deve ou não ingressar no espectro
de aplicação de um conceito contido na hipótese de incidência ou
consequência jurídica da norma (problema de qualificação).
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 14
Atenção
Como já pode ver, a cada dia é mais comum que nos
deparemos com estes tipos de problemas no processo de
solução das questões jurídicas. Daí que tenhamos a
necessidade de uma formulação teórica que apresente
instrumentais para superar esse tipo de dificuldade. No Brasil,
uma concepção teórica cada vez mais prestigiada é a que está
sendo denominada por neoconstitucionalismo.
O neoconstitucionalismo e a constitucionalização do direito
Agora que você já conheceu sobre o pós-positivismo, chegou então a hora de
tratarmos do neoconstitucionalismo mais especificamente, embora tudo que
tenha sido dito anteriormente complemente o que agora será tratado. A rigor,
devemos ter em conta que por “constitucionalização” deve ser entendida a
passagem do chamado Estado Legislativo do século XIX ao Estado
Constitucional do século XX, mais precisamente a partir do momento em que se
sobressaem institutos como a rigidez constitucional e controle de
constitucionalidade da lei.
É só neste sentido, quando o sistema passa a ser filtrado por esta lei maior,
que podemos e devemos falar deste fenômeno. Assim, quando afirmamos que
não podemos considerar o direito do século XIX – e por maior razão o direito
dos séculos precedentes – como constitucionalizados, devemos fazê-lo em
virtude de que a conexão necessária entre direito e moral, ou entre direito e
princípios constitucionais não era, portanto, necessária, mas contingencial.
Principais aspectos do neoconstitucionalismo
Em tempos cada vez mais relacionados a um Estado Constitucional de Direito, a
verdade é que se reclama uma nova teorização, uma nova explicação que se
afaste dos esquemas do chamado positivismo jurídico. Nesse sentido,
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 15
apresentamos, então, de forma sintética, os principais aspectos do
neoconstitucionalismo:
 Onipresença da constituição em todas as áreas do direito e em todos
os conflitos minimamente relevantes, ao invés de espaços livres em favor
da opção legislativa ou regulamentadora;
 Onipresença judicial no lugar de autonomia do legislador ordinário;
 Coexistência de uma constelação de valores tendencialmente
contraditórios em lugar da homogeneidade ideológica em torno de um
punhado de princípios coerentes entre si;
 Mais princípios do que regras;
 Mais ponderação que subsunção.
Agora que você conhece os principais aspectos, faremos, logo na sequência,
uma análise de cada uma dessas características.
A onipresença da constituição
As constituições hodiernas, e a brasileira de 1988 em especial, oferece denso
conteúdo material composto de valores, direitos fundamentais, diretrizes aos
poderes públicos, de maneira que é bastante difícil conceber um problema
jurídico medianamente sério que não encontre alguma orientação no texto
constitucional. O problema é que, por trás de cada preceito legal, adivinha-se
sempre uma norma constitucional confirmadora ou contraditória.
Porém, há de se ressaltar que o fato de ser nossa Constituição, de 1988,
analítica (prolixa). Embora gere problemas no que diz respeito à pretensão de
filtrar todas as normas do sistema, ela traz consigo a vantagem de abarcar um
sem número de valores, que muito dificilmente, no processo de manuseio
interpretativo, deixam de fora do processo de ponderação algum valor que
represente grupo minoritário.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 16
Onipresença judicial
Sendo a Constituição composta de normas que potencialmente podem estar
presentes em todos os conflitos gerados no âmbito do sistema, acaba por gerar
um fenômeno que é a onipresença judicial. Isto não ocorreria se a
constituição tivesse, como único objeto, a regulação das fontes ou, no máximo,
estabelecesse alguns poucos direitos fundamentais, pois em tal caso a
normatização constitucional e, por consequência, sua garantia constitucional, só
entrariam em jogo quando se violasse alguma condição de produção normativa
ou se restringisse algumas áreas de imunidade garantida.
No que se refere à citada onipresença judicial, esta é, então, uma decorrência
natural da onipresença constitucional. Isto porque, na medida em que a
Constituição oferece orientações nas mais heterogêneas esferas, e
considerando que estas esferas estão confiadas à garantia judicial, o legislador
perde com o neoconstitucionalismo, natural e logicamente, sua autonomia.
O fato é que não há norma infraconstitucional que não seja, nestas
“circunstâncias neoconstitucionais”, impregnada pela normatividade
constitucional.
A decisão correta, então, é aquela que maior coerência apresenta com o
sistema jurídico em sua totalidade. Para os defensores das teses
neoconstitucionais, o juiz não atua como legislador, pois, ao submeter sua
decisão a critérios racionais, limita-se ele, tão somente, a reconhecer direitos e
obrigações preexistentes à sua vontade.
Veja, por exemplo, trecho do voto-vista do Min. Luiz Fux, no âmbito da Adin nº
1923/DF, cujo teor pode ser lido no Informativo STF nª 628, quando faz
referência à obra de Gustavo Binenbojm:
No cenário do neoconstitucionalismo, portanto, o exercício da
discricionariedade não escapa do respeito aos princípios
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 17
constitucionais, e isso, veja-se bem, mesmo quando a lei seja omissa,
já que a legislação infraconstitucional não pode represar, conter ou de
qualquer forma mitigar a eficácia irradiante das normas
constitucionais (BINENBOJM, 2006. p. 307-8)1
De toda maneira, não podemos deixar de apontar algumas das mais ácidas
críticas que vêm sofrendo o neoconstitucionalismo e que decorrem exatamente
dessa ampliação do papel do Poder Judiciário. Fala-se, cada vez mais e em todo
o mundo, de uma judicialização da política, já que o papel alargardo concedido
aos juízes, com seus discursos mais técnicos, tende a reduzir o alcance do
discurso político expresso pelas classes políticas tradicionais.
A atuação contundente dos juízes em determinadas causas acaba por definir o
que vem sendo chamado de ativismo judicial, por muitos considerado uma
infringência ao princípio da separação de poderes.
Neste sentido, embora as críticas não possam ser desprezadas, o que vem
ocorrendo é uma reconfiguração estrutural na forma de organização do poder
e, por decorrência, do direito como instrumentalizador do exercício deste. De
toda forma, acredita-se que experiência reprimirá os excessos, havendo uma
natural acomodação no processo de separação de poderes e competências.
Todavia, vale ressaltar, a ascensão do neoconstitucionalismo pós-positivista não
parece ser um movimento passageiro, mas sim uma tendência no processo de
reconfiguração por que passa todo o sistema jurídico brasileiro.
1
(BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo – direitos fundamentais,
democracia e constitucionalização. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 307-8).
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 18
Coerência sistêmica do neoconstitucionalismo
Ao que se refere à discussão acerca da coerência sistêmica, o
neoconstitucionalismo não representa, como no constitucionalismo tradicional,
um pacto em torno de alguns poucos princípios comuns e coerentes,
mas sim um pacto em torno de princípios e postulados distintos e, por
vezes, contraditórios, adequados às sociedades pluriculturais.
Assim, como temos dito, as constituições, ainda que garantam a chamada
igualdade jurídica ou formal, tendem, cada vez mais, a preocupar-se em
garantir a igualdade substancial ou material, principalmente em países como o
Brasil, onde as desigualdades sociais conduzem a uma maior preocupação com
esta vertente da igualdade que estabelece a necessidade de diferenciar os
diferentes na proporção de suas diferenças.
Esse panorama faz com que alguns críticos afirmem que a concepção
neoconstitucional incentiva o aparecimento de antinomias, representando a
constituição um conjunto de normas contraditórias entre si que se superpõem
permanentemente e, por isso, concedem lugar a soluções díspares e, por via de
consequência, ensejam insegurança jurídica.
Regras neoconstitucionais
A mencionada crítica teria maior consistência se as regras constitucionais
fossem do tipo norma-regra. Mas como em um sistema neoconstitucional os
princípios predominam sobre as regras, a lógica que vigora é outra, já que
proposta neoconstitucional ao revitalizar a eficácia principiológica, tida como
verdadeira base da inteligência sistêmica, justifica a presença da dimensão
valor na análise jurídica e se coliga em maior proporção a um ideal de justiça.
De toda sorte, como entre normas constitucionais não é possível aplicar os
critérios hierárquico ou cronológico (já que não pode se imaginar a existência
norma constitucional inválida e, portanto, inconstitucional), quando o conflito
entre normas regras se apresenta, tem-se preferencialmente a aplicação do
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 19
critério da especialidade, sendo que a norma é aplicada em sua máxima
dimensão normativa (o famoso “tudo ou nada” dworkiniano).
Diferentemente, quando as contradições se dão entre normas principiológicas,
ambas seguem simultaneamente válidas, por mais que no caso concreto (dadas
as circunstâncias específicas deste) uma triunfe sobre a outra. Neste caso, cabe
buscar uma relação de preponderância relativa, de uma sobre outra, que só
pode ser definida no âmbito do caso concreto.
Na verdade, uma das principais tarefas realizadas pelo neoconstitucionalismo
foi a de recolocar os princípios jurídicos em um lugar de centralidade no
processo interpretativo. Principalmente se consideramos que a concepção
clássica que unia direito e moral sempre foi ligada às concepções
jusnaturalistas, cuja perspectiva valorativa eram providas, porém, de baixa
normatividade e eficácia jurídica.
Nesse sentido, é o princípio que estabelece essa ponte de rearticulação entre
direito e moral. Para Robert Alexy, os princípios constituem mandados de
otimização que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível,
enquanto Dworkin entende que os princípios são fonte de justificação moral e
política vigente em uma determinada comunidade.
Assim, segundo autores neoconstitucionalistas, um sistema que possui tão
somente normas-regras não está habilitado a solucionar todas as questões que
exsurgem no dia a dia dos tribunais. Para esses, é absolutamente necessário o
reconhecimento da normatividade do princípio, já que possui o mesmo uma
capacidade muito superior em relação às regras de transferir valor ao sistema
jurídico e, principalmente, de produzir juízos para uma sociedade tão plural e
sofisticada, no que diz respeito às suas demandas.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 20
Discussões necessárias sobre a ponderação e a subsunção
Quanto à apontada característica de maior utilização da ponderação do
que subsunção, veja alguns dados importantes:
Faz-se necessário que expliquemos, antes de tudo, o que estamos chamando
de ponderação. Trata-se de um tipo de juízo que se usa para resolver
antinomias de normas constitucionais, quando não é possível usar o critério da
especialidade (como dissemos anteriormente, o outro critério para solução de
antinomias constitucionais).
É um juízo complexo que deságua em uma declaração de preferência
condicionada, estabelecendo o triunfo de uma das normas em conflito no caso
concreto específico, mas sem pretensão de definitividade.
A ponderação requer uma argumentação complexa, sendo que o núcleo central
do juízo de ponderação consiste em conceder preferência à solução que,
evitando o referido “tudo ou nada” utilizado no juízo que trata sobre o conflito
entre regras, enfrente o conflito sopesando dos valores em colisão naquela
situação específica.
Atente-se que se deve procurar a solução que estabeleça menor lesão a uma
das normas em conflito, já que in abstrato (referindo-nos às normas
constitucionais prima facie), todas ostentariam igual valor. Porém, no caso
concreto, a situação é diversa e, como já intuíam os gregos há mais de vinte e
cinco séculos, a ideia de proporção vincula-se à busca pela solução mais justa.
Mas nos aprofundaremos sobre esses conceitos nas próximas aulas.
Resumo - Neoconstitucionalismo
O neoconstitucionalismo, como concepção jurídica, quer a submissão de
todo o ordenamento (incluindo o legislador democrático) à constituição,
embora tenha que admitir, em situações especiais, a possibilidade de diálogos e
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 21
autorrestrições de suas normas em face de normas advindas de outras ordens
jurídicas.
De toda forma, não há dúvidas de que esse “comando constitucional” gera
a abertura ao judicialismo, ao menos na perspectiva que vem sendo adotada no
Brasil, que segue uma linha vinculada às tendências europeias com as quais o
direito brasileiro mantém maior vínculo e é mais fortemente contaminado.
A teoria do neoconstitucionalismo
Neste sentido, esta linha de pensamento pressupõe uma depurada teoria
argumentativa, capaz de garantir a racionalidade e suscitar o consenso em
torno das decisões judiciais. Não é sem motivos que o neoconstitucionalismo se
propõe, como uma vertente pós-positivista, a superar uma visão positivista do
Direito.
Estabelece ele um novo paradigma teórico, ao colocar uma razão
destranscendentalizada (como diria Habermas) como ferramenta indispensável
à própria construção do Direito, inclusive nas situações em que o ordenamento
legal não prevê soluções para a resolução dos casos concretos (observe-se que
usou-se a expressão “ordenamento legal” e “não ordenamento jurídico”).
A ideia de uma destranscendentalização também rejeita uma lógica jusnatural,
que fundava sua justiça ou na religião, ou em um sistema de justiça que,
embora de grande beleza e logicidade, não encontra qualquer suporte na
experiência ou nos fatos da vida.
Aliás, cuidado! Os neoconstitucionalistas não defendem que suas concepções
possam ser consideradas vertentes antiformalistas do Direito, já que entendem
que suas respostas encontram-se no interior do próprio campo da juridicidade -
dentro das fronteiras do Direito.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 22
Neoconstitucionalismo como nova concepção jurídica
Ainda que consigam alcançar o mundo do valor e da moral, o fazem por meio
dos princípios jurídicos, que são normas positivas. Há quem considere que os
princípios são valores positivados. Embora essa afirmativa possa gerar algumas
críticas, a figura auxilia o entendimento.
Por fim, como diz o grande constitucionalista espanhol, Prieto Sanchís, parece
evidente que o neoconstitucionalismo requer:
 Uma nova teoria das fontes, afastada do legalismo positivista;
 Uma nova teoria da norma que possibilite maior relevância aos princípios
jurídicos;
 Uma nova teoria da interpretação que, afastando-se de um
procedimento mecanicista não seja, por outro lado, puramente
discricionária, de forma que a interpretação constitucional possa ser
alcançada a partir de um esquema plausível e racional de argumentação
jurídica.
Neoconstitucionalismo no contexto brasileiro
No Brasil, há de se ter em vista que o pensamento neoconstitucional vem sendo
cada vez mais aceito, sendo sua teorização cada vez mais observada não
apenas pela doutrina, mas também pela jurisprudência. Até mesmo os cursos
de graduação em Direito têm dado maior destaque às teorias
neoconstitucionais no estudo das disciplinas de Direito Constitucional, exaltando
a necessidade de uma leitura de todas as áreas do direito pela lente
constitucional.
Isso se reflete fortemente no papel exercido pelo Supremo Tribunal Federal,
principalmente no contexto da analítica Carta de 1988. É dificil imaginar que
exista matéria minimamente relevante que, em tese, não encontre sua
fundamentação na Constituição. Até mesmo porque, a plasticidade e
elasticidade inerentes aos princípios acaba por extender os limites semânticos
da Carta, de maneira a atingir uma enorme gama de possibilidades fáticas.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 23
Nessa direção, é normal que ocorram divergências entre os poderes Legislativo
e Judiciário, mais precisamente o STF, já que o poder de legislar do Congresso
Nacional é mitigado pelo poder de controlar a constitucionalidade dos atos
produzidos, que em última instância é da Corte Maior. Esse fenômeno exaltado
por uns, criticados por outros, vem recebendo a alcunha de “judicialização da
política”, já que a atividade política é fortemente controlada pela tecnicidade
jurídica.
Todavia, concomitantemente, observam-se críticas que apontam para o lado
inverso, ou seja, o fenômeno da “politização do Judiciário”, já que a abertura
semântica das normas parece oferecer um espaço exacerbado de escolha aos
magistrados.
Trata-se, porém, de uma questão de busca pela legitimidade da produção
normativa. Afinal, quem faz a norma: quem define seu texto ou quem
interpreta seu sentido? A ocupação de determinados espaços no processo de
elaboração da norma, que no direito brasileiro tradicionalmente foi dado ao
Poder Legislativo, não o é em tradições de common law, nas quais a confiança
no juiz é maior do que a confiança no político. Essa é uma questão sensível e
será o tema de nossa próxima aula. Por isso não cabe adiantarmo-nos.
De toda forma, a uma possível crítica de judicialização da política e
deslocamento do poder (com repercussões de um possível déficit democrático),
o próprio sistema antecipa-se e procura mitigar introduzindo “novos” institutos
como a súmula vinculante (no âmbito da aproximação do sistema brasileiro ao
sistema de common law) e o amicus curiae que juntamente com as audiências
públicas reforçam a ideia de busca por uma racionalidade jurídico/constitucional
que satisfaça à ampliação e o aperfeiçoamento do regime democrático.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 24
Atividade proposta
Leia a reportagem, da Veja, sobre a prisão de envolvidos no esquema do
mensalão, a seguir:
Marco Maia não descarta dar abrigo para impedir prisão de
mensaleiros
Depois de sucessivas declarações sugerindo que a Câmara deveria descumprir a
decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de cassar os mandatos de
deputados mensaleiros condenados, o petista Marco Maia (RS) foi além nesta
quinta-feira e não descartou abrir os portões da Casa para impedir a prisão dos
parlamentares. Como a Polícia Federal não tem autorização para entrar no
Congresso, os três deputados condenados - Valdemar Costa Neto (PR-SP), João
Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT) - ficariam asilados no local.
A possibilidade foi aventada durante perguntas de jornalistas na entrevista
concedida pelo presidente da Câmara nesta quarta. O petista afirmou que a
prisão dos parlamentares, na sua opinião, seria inconstitucional. "Uma das
coisas que a Constituição previu de forma sábia é que nenhum parlamentar
pode ser preso a não ser em flagrante delito ou depois de condenação
transitada em julgado, o que significa que a Constituição é muito clara em
relação à impossibilidade da prisão de parlamentares. Nós temos que aguardar
os acontecimentos para ver qual o impacto e o que isto vai significar do ponto
de vista do posicionamento que o Parlamento e a Câmara dos Deputados irão
tomar em relação a essa situação", disse.
A prisão imediata dos mensaleiros será decidida nesta sexta-feira pelo
presidente do STF, Joaquim Barbosa, em resposta ao pedido feito pelo
procurador-geral da República, Roberto Gurgel. "É uma suposição tão vaga que
nem acredito que isso possa acontecer. (E se acontecer), aí teremos que
pensar no que fazer", afirmou Marco Maia.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 25
Maia disse ainda que "se não houver decisão definitiva até dia 1º de fevereiro
sobre a prisão dos condenados, o deputado José Genoíno (PT) terá direito de
reassumir seu mandato". "À Casa caberá apenas cumprir a Constituição", disse.
O presidente da Câmara também rebateu a afirmação do decano do STF,
ministro Celso de Mello, que criticou a resistência do petista em cumprir a
determinação da corte para cassar os mandatos dos mensaleiros. "Não é
razoável e eu nem acredito que nenhum ministro teria a vontade ou a condição
de tentar intimidar o presidente da Câmara ou o próprio Parlamento com
qualquer tipo de ameaça. Até mesmo, porque a decisão sobre quem vira
ministro do STF é do Parlamento. É o Senado que toma essa decisão. Até
porque quem cassa ministro do STF é o Parlamento", disse.
Fonte: <http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/marco-maia-nao-descarta-dar-abrigo-para-
impedir-prisao-de-mensaleiros>.
Agora, analise se há no fato político relatado alguma das características
observáveis em sistemas jurídicos que têm por linha teórico-filosófica o
neoconstitucionalismo.
Chave de resposta: A ideia, nesse sentido, é analisar uma das possíveis e
mais importantes repercussões das teorizações do neoconstitucionalismo, ou
seja, o acirramento da disputa de poder entre o Poder Judiciário (que vê
aumentar sua esfera de poder) e o Poder Legislativo (que entende esse
acréscimo de poder do Judiciário como invasão ilegítima às suas naturais
prerrogativas).
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 26
Judicialismo: Detrimento de uma linha mais legalista, relacionada à teoria da
soberania popular.
Aprenda Mais
Material complementar
Para saber mais sobre Neoconstitucionalismo, leia o artigo,
disponível em nossa biblioteca virtual, que traz um interessante
texto sobre o tema do ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz
Roberto Barroso.
Referências
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007.
ALEXY, Robert. Los derechos fundamentales en el Estado constitucional. In:
Neoconstitucionalismo(s). (Editor Miguel Carbonell). Madri: Trotta, 2003.
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BARBERIS, Mauro. El neoconstitucionalismo. Third Theory of Law. In:
Neoconstitucionalismo, derecho y derechos. (Ed. POZZOLO, Suzanna).
Lima: Palestra, 2011.
BARBERIS, Mauro. Breve storia della filosofia del diritto. Bologna: Mulino,
2004.
CARBONELL, Miguel. El neoconstitucionalismo: significado y niveles de analisis.
In: El canon neoconstitucional. Madri: Trotta, 2010.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 27
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo:Martins Fontes,
1998.
DWORKIN, Ronald. O império do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
MAZZAREZE. T. Neoconstituzionalismo e tutela (sovra) nazionale dei
diritti fondamentali. Torino Giapichelli, 2002.
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neoconstitucionalismo. In: Neoconstitucionalismo, derecho y derechos.
(Ed. POZZOLO, Suzanna). Lima: Palestra, 2011.
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SANCHÍS, Luís Prieto. Neoconstitucionalismo y ponderación judicial. In:
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SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito
Constitucional. Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte:
Fórum, 2013.
SOBREVIVILLA, David. La filosofia del derecho alemana actual
deorientación racionalista. Estudios sobre R. Alexy, K.Günther, J. Habermas
y O.Höffe. Cidade do México: Fontamara, 2008.
STRECK, Lenio Luiz. Reflexión hermenêutica sobre la relación
“neoconstitucionalismo-positivismo jurídico”. In: Neoconstitucionalismo,
derecho y derechos. (Ed. POZZOLO, Suzanna). Lima: Palestra, 2011.
STRECK, Lenio Luiz. Hermeneutica e applicatio jurídica: a concreta
realização normativa do direito como superação da interpretação jurídico-
metafísico-objetificante. Coimbra: Coimbra, [s/d].
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 28
Exercícios de fixação
Questão 1
São características marcantes no pós-positivismo:
I. A compreensão de que a validade jurídica da norma se define exclusivamente
pelo respeito ao correto procedimento de produção normativa.
II. A existência de hard cases como situações fáticas complexas, pendentes de
intervenção pelo julgador, que constrói a regra de solução com base na
racionalidade jurídica, em razão da ausência de previsão explícita no
ordenamento legal.
III. O importante papel desenvolvido pelos princípios jurídicos, como espécie
normativa.
IV. Completa rejeição à ideia de valores no âmbito do direito.
a) I e II
b) Apenas II
c) III e IV
d) I e IV
Questão 2
Leia as frases e assinale a alternativa na qual há uma opção que contenha duas
assertivas incorretas para uma visão pós-positivista do direito:
I. Busca pela superação teórica das escolas juspositivista e jusnaturalista.
II. A ideia de que o pós-positivismo é apenas um aperfeiçoamento do
positivismo jurídico, mantendo, porém, suas linhas-mestras.
III. Mitigação da dicotomia descrição/prescrição.
IV. O reconhecimento de que direito e moral jamais se encontram.
a) I e II
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 29
b) I e III
c) II e IV
d) I e IV
Questão 3
Leia as assertivas abaixo e marque a opção que corretamente exprime a
correção, ou não, das duas afirmações, a partir de uma visão pós-positivista:
I. Os princípios jurídicos ganham grande importância, principalmente na solução
dos hard cases.
II. As regras jurídicas, segundo os pós-positivistas, não são mais capazes de
resolver os problemas na contemporaneidade, devendo ser o seu uso abdicado
pelo direito.
a) A primeira assertiva está correta e a segunda incorreta.
b) A primeira assertiva está incorreta e a segunda correta.
c) As duas assertivas estão corretas.
d) As duas assertivas estão erradas.
Questão 4
Leia as assertivas abaixo e marque a opção que corretamente exprime a
correção, ou não, das duas afirmações, a partir de uma visão pós-positivista:
I. O pós-positivismo representa um reforço tanto para as posições
jusnaturalistas quanto para as positivistas.
II. O pós-positivismo, por intermédio de seus teóricos, apresenta-se como uma
teoria que surge a partir da necessidade de se produzir soluções complexas
para um mundo cada vez mais complexo.
a) A primeira assertiva está correta e a segunda incorreta.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 30
b) A primeira assertiva está incorreta e a segunda correta.
c) As duas assertivas estão corretas.
d) As duas assertivas estão erradas.
Questão 5
Analise as assertivas abaixo:
I. O neoconstitucionalismo é uma vertente jurídico-filosófica de cariz pós-
positivista, havendo entre as propostas uma relação interna.
II. Embora a similitude dos termos possa transparecer uma aproximação
conceitual, o neoconstitucionalismo não guarda absolutamente nenhum ponto
de contato com o fenômeno constitucionalista surgido no século XVIII e
desenvolvido no decorrer do século seguinte.
Estão corretas:
a) A primeira assertiva está correta e a segunda incorreta.
b) A primeira assertiva está incorreta e a segunda correta.
c) As duas assertivas estão corretas.
d) As duas assertivas estão erradas.
Questão 6
O Neoconstitucionalismo vem se firmando como uma teoria cada vez mais forte
no Brasil. Abaixo, apresentamos duas assertivas. Após lê-las, marque a
alternativa que melhor define a correção ou incorreção das mesmas.
I. Caracteriza-se por defender, sob uma perspectiva teórica, o governo da
vontade das maiorias representada pela lei.
II. Assumindo uma posição pós-positivista, para o neoconstitucionalismo direito
e moral, deve possuir uma conexão interna.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 31
a) As duas assertivas estão corretas.
b) As duas assertivas estão incorretas.
c) A assertiva I está correta, mas a assertiva II está incorreta.
d) A assertiva I está incorreta, mas a assertiva II está correta.
Questão 7
São características da chamada Escola Neoconstitucionalista do Direito, as que
seguem, exceto:
a) O ideal político do governo do direito, em contraposição à ideia de
governo dos homens.
b) Defende o governo do direito por meio de uma constituição, de forma a
limitar os poderes dos governantes.
c) No Estado Constitucional, direito e moral seriam conexos por meio de
uma Constituição.
d) Defende que só a Constituição pode promover comandos à sociedade,
sendo que as leis não estariam aptas a fazê-lo.
Questão 8
São características essenciais do neoconstitucionalismo:
I. A utilização exclusiva de normas-regra para a solução de casos concretos.
II. A utilização de um método mecânico e positivista de interpretação.
III. O uso da principiologia no processo interpretativo como método subsidiário.
IV. A valorização dos princípios no processo interpretativo das normas jurídicas.
Está(ão) correta(s):
a) Somente a assertiva III
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 32
b) Somente a assertiva IV
c) As assertivas III e IV
d) As assertivas II e IV
e) As assertivas II, III e IV
Questão 9
Como características típicas do neoconstitucionalismo, é possível apontar:
I. Mais subsunção do que ponderação.
II. Onipresença da constituição em todas as áreas do direito.
III. Onipresença legislativa, com ampliação da representação democrática.
IV. Pluralidade valorativa amplíssima e contraditória.
a) I e II
b) II e III
c) III e IV
d) II e IV
Questão 10
O neoconstitucionalismo traz à tona o debate sobre a “judicialização da
política”. Sobre essa questão, é correto afirmar:
a) Já há a superação do problema, com a acomodação do Poder Judiciário
em face do Poder Legislativo.
b) Trata-se de um problema vivenciado na Europa, mas não observado no
Brasil.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 33
c) É um problema que ocorre no Brasil, como decorrência natural da maior
intervenção do Poder Judiciário em uma esfera de atuação
tradicionalmente destinada ao Poder Legislativo.
d) É o fenômeno que faz com que o Poder Legislativo mitigue o papel típico
de julgar do poder Judiciário.
Exercícios de fixação
Questão 1 - B
Justificativa: Estão erradas as assertivas I e III. É no positivismo jurídico
(principalmente nos mais exacerbados) que se compreende que a validade
jurídica da norma se define exclusivamente pelo respeito ao correto
procedimento de produção normativa. O pós-positivismo, pelo contrário,
entende que os valores auxiliam no julgamento sobre a validade normativa,
principalmente pela via principiológica. Daí, que também a assertiva IV esteja
completamente equivocada.
Questão 2 - C
Justificativa: A assertiva II está equivocada por considerar o pós-positivismo
como uma continuidade do positivismo jurídico. Trata-se de uma outra
concepção (3ª via) que entra em conflito com as teses positivistas,
principalmente em um ponto essencial, ou seja, o reconhecimento de que
direito e moral devem, sim, manter pontos de contato (o que invalida a
possibilidade de considerarmos correta a assertiva IV).
Questão 3 - A
Justificativa: Apenas a assertiva B está equivocada, pois o pós-positivismo,
embora enalteça e valorize o uso dos princípios na resolução de casos, não
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 34
abdica do uso das regras jurídicas. Na verdade, entende que tanto os princípios
como as regras são duas faces do mesmo fenômeno: o fenômeno normativo.
Questão 4 - B
Justificativa: Como terceira via, o pós-positivismo recusa tanto a rejeição da
relação entre direito e moral do positivismo, mas também não concorda com os
pressupostos jusnaturais de uma justiça apoiada em razões religiosas ou razões
transcendentais. O pós-positivismo, nesse sentido, busca um tipo de
racionalidade destranscendentalizada, mais fundada na capacidade discursiva
que o entendimento dialógico propicia.
Questão 5 - A
Justificativa: A segunda assertiva está incorreta já que o neoconstitucionalismo
guarda com o fenômeno constitucionalista dos séculos XVIII e XIX ao menos
uma ideia fundamental: a de que a constituição é a norma central do sistema
jurídico, e não as leis, que àquela estão submetidas.
Questão 6 - D
Justificativa: O neoconstitucionalismo separa-se das perspectivas legalistas por
entender que a vontade das maiorias, expressa na lei, submete-se à vontade
constitucional. Daí, por exemplo, extrair-se a possibilidade de existência do
controle de constitucionalidade.
Questão 7 - D
Justificativa: O erro da assertiva D decorre do fato de que a existência de uma
Constituição como norma maior não tem por consequência que os demais
diplomas normativos sejam prescindíveis, principalmente as leis. Para que o
sistema possa funcionar, é necessário todo um arcabouço formal. Neste
sentido, a visão sistêmico-jurídica kelseniana está longe de ser superada.
Questão 8 - B
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 35
Justificativa: É característica, entre outras, do neoconstitucionalismo, a
valorização do princípio como tipo normativo, assumindo este um lugar de
destaque no processo de definição da norma concreta pelo judiciário bem como
nos processos interpretativos. Por isso, embora as normas-regra tenham papel
de grande importância, o papel de maior relevância (e não meramente
subsidiário) é aquele exercido pela norma princípio. Na assertiva III, se em vez
do termo “subsidiário” fosse usado o termo “complementar”, poderíamos
considerá-la correta. Outra questão que vale a pena reforçar é que a
principiologia não possui maior destaque nas concepções positivistas de direito.
Questão 9 - D
Justificativa: Com o destaque maior para as normas-princípio em relação às
normas-regra, a ponderação ganha, igualmente, mais destaque que o processo
de subsunção. Por outro lado, é observada a onipresença judiciária, com
mitigação do espaço do legislador e, consequentemente, do Poder Legislativo, o
mais democrático dos poderes, segundo a tradição.
Questão 10 - C
Justificativa: Acredita-se que as posições teóricas neoconstitucionais dão
suporte à força crescente do Poder Judiciário, especialmente o Supremo
Tribunal Federal (STF), que tomaria decisões que escapam de seu domínio,
enquanto o Poder Legislativo enfraquece-se na medida em que suas
competências legislativas estariam supostamente sendo usurpadas.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 36
Introdução
À medida que a globalização se expande, cresce igualmente a necessidade de
interação entre sistemas. Há muito tempo, discute-se a oposição antitética
entre o sistema anglo-saxão da common law e o sistema continental, também
chamado pelos common lawyers de sistema da civil law (ou sistema românico-
germânico, como também denominamos entre nós). Essa virtual oposição
teórica fazia parecer que estávamos diante de sistemas absolutamente
antagônicos e opostos.
Hoje, as posições que observam os dois sistemas a partir de uma summa divisio
são cada vez mais raras. A percepção de aproximação dos dois sistemas
fundamentais ocidentais trouxe à tona a necessidade de aprofundar, sob a
perspectiva teórica, quais os motivos que nos levam a essa direção e qual a
consequência dessa situação para o constitucionalismo.
No Brasil, as influências entre sistemas jurídicos vão sendo observadas não
apenas por essa aproximação entre common law e civil law, mas, também,
pelos recentes estudos de fenômenos como o da transconstitucionalização e o
da cross fertilization.
Todos apontam para uma tendência de influências recíprocas entre sistemas
jurídicos, principalmente a partir da ascensão do paradigma jusfilosófico
neoconstitucional, conforme vimos na aula 1. Tratemos de enfrentar, então, a
temática, fazendo as devidas conexões! Boa aula!
Objetivos:
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 37
1. Analisar as características das escolas jurídicas da common law e da civil law
e suas formas de aproximação com os sistemas constitucionais ocidentais, o
brasileiro em especial;
2. Estabelecer as características fundamentais da transconstitucionalização
como fenômeno que conecta a constituição à uma visão necessariamente
global, plural e interconectável entre sistemas.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 38
Conteúdo
O mundo globalizado e a aproximação de sistemas
Na aula anterior, você conheceu o neoconstitucionalismo. Nesta aula,
aprofundaremos sobre o termo transconstitucionalidade. Vamos lá!
O crescimento da globalização e da internacionalização tem evidentes
consequências no mundo hodierno. Não era razoável considerar que o mundo
jurídico escapasse a essa lógica. Dois fenômenos de aproximação entre as
diversas ordens parecem ser objeto de maior estudo por parte dos estudiosos
do direito, em particular dos constitucionalistas: a aproximação entre a common
law e a civil law (sistemas há pouco considerados antagônicos entre si) e o
crescente diálogo mantido entre as ordens constitucionais.
O tema é vasto, e, neste momento, a pretensão é não somente apontar para as
novas discussões surgidas no campo jurídico, mas, também, inspirar novos e
enriquecedores debates. Começaremos pelo tema menos original, mas ainda
pouco analisado (proximidade entre common law e civil law), para depois
adentrarmos na temática que começa a ganhar maior fôlego no país, que é o
da transconstitucionalidade (para alguns, interconstitucionalidade).
O sistema jurídico brasileiro e a common law
Como vimos, no fim dos anos 90, começam a ser disseminadas no Brasil,
principalmente no âmbito acadêmico, as correntes teóricas de autores
neoconstitucionalistas (classificação atualmente concedida por grande parte da
doutrina). Ao defenderem a natureza normativa dos princípios, acabaram por
incentivar uma revolução no processo de interpretação das normas jurídicas,
incumbindo os juízes de tarefas de preenchimento de lacunas legais cada vez
mais frequentes em um ambiente social cada vez mais complexo.
A ausência de estudos mais aprofundados das linhas metodológicas utilizadas
por esses autores provocou uma onda interpretacionista um tanto caótica,
gerando um ambiente de grande insegurança jurídica. Concomitantemente, por
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 39
seu lado, seguiam os tribunais brasileiros abarrotados de processos, que, com a
mesma causa de pedir e com o mesmo pedido, tinham as mais díspares
decisões, ainda em situações nas quais o Supremo Tribunal Federal já havia
cristalizado posição em relação ao tema.
Emenda Constitucional nº 45/2004
Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 45/2004, a qual acrescentou
ao texto constitucional o Artigo 103-A, conferiu-se poderes ao Supremo
Tribunal Federal para aprovar súmulas contendo eficácia vinculante (e não
apenas persuasivas) sobre decisões futuras, acirrando, no âmbito do direito
pátrio, a discussão sobre uma possível aproximação do sistema jurídico
brasileiro – historicamente construído na tradição da civil law (germânico-
romana) – com o sistema da common law (anglo-americano).
Por outro lado, igualmente relacionado ao fenômeno de aproximação de
sistemas em um mundo globalizado, vem sendo frequentemente observado nas
sessões do STF, não apenas a menção a institutos típicos de sistemas jurídicos
estrangeiros, mas também a construção de linhas de fundamentação de
decisões que utilizam base jurisprudencial do direito alienígena ou, ao menos,
em rationes decidendi estabelecidas por cortes estrangeiras. É a chamada
racionalidade transversal entre sistemas jurídicos, fenômeno cada vez mais
percebido e naturalizado.
Transconstitucionalismo e a cross fertilization
Sobre essas temáticas, surgem algumas questões que servem como guia para
um maior aprofundamento sobre o tema. São elas:
Procede tal afirmação de que existe uma aproximação do sistema brasileiro às
características que tradicionalmente se julgavam típicas dos sistemas vinculados
à common law? O instituto da súmula vinculante pode ser considerado uma
consequência direta de tal aproximação?
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 40
Existindo tal aproximação do nosso sistema com a common law, isto
aperfeiçoaria o sistema jurídico brasileiro ou, ao contrário, criaria um
antagonismo com sua linha tradicional?
O que representam o transconstitucionalismo e a cross fertilization em um
contexto de racionalidade transversal entre sistemas jurídicos?
Para fins didáticos, entendemos que seja mais adequado iniciar nossa
abordagem pelo estudo de aproximação entre a civil law e a common law, não
apenas por ser um tema já apontado pelos estudiosos no Brasil (embora, sem
aprofundar os fundamentos), mas, principalmente, por estar ele relacionado a
uma temática analisada na aula anterior, o que facilita o caminho a ser
percorrido. Logo após, partiremos para análise do transconstitucionalismo,
fenômeno que só agora parece ser percebido pelos estudiosos e que vem
ganhando destaque no universo jurídico-constitucional brasileiro.
Aproximação da civil law e common law – algumas notas
introdutórias
Sob uma perspectiva teórica e para fins cognitivos, é possível estabelecer linhas
que distinguem os modelos common law e civil law. O intuito aqui não é discutir
todas as diferenças, mas focar naquelas que mais dados podem nos oferecer
para responder às questões acima formuladas.
Segundo os comparatistas, as características a seguir são pontos
tradicionalmente tidos como de afastamento e distinção entre as duas grandes
famílias.
Se, por um lado, a civil law (que traduz ius civile do latim) descende do direito
romano, o direito da common law deita raízes em uma tradição autóctone.
Se, na civil law, há uma longa tradição de codificação e de lei (em seu sentido
estrito) como fonte do direito – recusando-se a ideia de ser a jurisprudência
(precedentes) como fonte autônoma do direito –, por outro lado, a tradição
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 41
anglo-americana, mesmo quando se utiliza da codificação, como em vários
Estados americanos (statutes), apresenta-a como consolidação jurisprudencial.
Se, por um lado, na civil law, prevalece o pensamento abstrato-dedutivo,
tipicamente logicista, por outro, na common law, prevalece um raciocínio mais
concreto, ligado a uma tradição empiricista (e mesmo pragmática), própria da
cultura anglo-saxã.
Se, por um lado, para a maior parte dos autores, a civil law identifica como
característica típica o primado do público sobre o privado, na common law, ao
contrário, entende-se que há o primado da perspectiva privada sobre a pública.
Se, por um lado, o tipo de racionalidade utilizada na civil law é
predominantemente de tipo lógico, na common law, utiliza-se
predominantemente aquela de natureza pragmática.
Se, por um lado, o tipo de sistema de direito utilizado pela civil law é
predominantemente legislado, não judicialista, o da common law é
preponderantemente judicialista, de forma que, nos sistemas irmãos, os juízes
tradicionalmente exercem papéis bastante diferenciados.
Sistema jurídico brasileiro e o sistema de common law
Mesmo reconhecendo a importância de todas perspectivas de análise acima
apresentadas, parece-nos que o ponto cardeal da discussão para tratar de uma
aproximação do sistema jurídico brasileiro com o sistema de common law se
refere não necessariamente a todas as características citadas (embora se possa
verificar também, em algumas delas, um certo movimento de aproximação por
parte do sistema brasileiro com a common law), mas, principalmente, no que
diz respeito à última das características mencionadas, ou seja, o papel
desenvolvido pelos juízes e pela jurisprudência no processo de produção do
direito.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 42
Essa posição baseia-se não apenas por ser a questão de maior relevância do
problema, mas, principalmente, devido às repercussões que esse ângulo de
análise tem suscitado atualmente no Brasil, a partir da ascensão das
concepções jurídico-filosóficas neoconstitucionais no nosso país e em diversos
sistemas jurídicos, como já falamos. Dessa forma, até campos do conhecimento
estranhos ao direito já começam a perceber o fenômeno a ponto de entrarem
nas discussões acerca de temas como ativismo judicial e judicialização da
política.
Civil Law
Como se pode ver, é uma questão de natureza cultural. Em grande parte dos
estados que adotam a civil law, antes da passagem de uma ordem tradicional
para uma ordem pós-tradicional, mais precisamente antes da ascensão do
Estado de Direito em substituição aos Estados Absolutistas, o Poder Judiciário
sempre foi exercido por uma elite nobre extremamente ligada por fortes laços
de confiança e lealdade aos reis.
Aliás, não há de se pensar em um contexto como esse em separação de
poderes, já que esta é uma formulação típica do Estado de Direito e só surge
no contexto da afirmação deste e como uma de suas principais características.
Por outro lado, cabe lembrar que, embora a monarquia inglesa possa ser
considerada, até os dias de hoje, uma instituição política bastante sólida, não
devemos esquecer que a própria ideia de divisão de poderes e consequente
mitigação dos poderes reais sempre teve na Inglaterra um terreno fértil.
Desde a Magna Charta, o exercício do poder político pelo monarca inglês foi
sendo paulatinamente mitigado, sendo ele exercido, pouco a pouco, de forma
cada vez mais descentralizada se compararmos com seus congêneres
continentais. Isso explica a razão pela qual o fenômeno da desconfiança
exacerbada na figura dos juízes, ocorrida nos países de tradição da civil law,
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 43
não encontrou na Inglaterra um ambiente propício para se desenvolver, sendo
que esta pôde, assim, exportar às suas colônias seu modelo de common law.
Nessa perspectiva e se essas considerações de ordem cultural estão corretas
como cremos estar, é possível que tenhamos, inclusive, uma possível releitura
acerca da própria ideia de legitimidade para o exercício do poder de produzir
normas no Brasil.
É mesmo possível enxergar que esteja em curso um processo que estabelece
importantes alterações de rumo no tradicional sistema desenvolvido no Brasil
Por isso, cabe ressaltar que o fenômeno brasileiro não é algo isolado. Esses
supostos distanciamentos teóricos e práticos vêm cedendo espaço a cada dia,
perdendo força no interior das ordens jurídicas de tradição ocidental. Por isso,
essa tendência de aproximação observada entre as duas grandes famílias do
Direito repercute de forma indiscutível na organização do sistema jurídico
brasileiro.
Fatores condicionantes na organização dos fatores jurídicos
brasileiro
Dentro do que foi dito anteriormente, percebe-se que dois motivos nascidos do
âmbito da dinâmica de reconfiguração da ordem mundial aparecem de forma
mais evidente (tal qual fatores condicionantes externos para a citada
aproximação, mas que se projetam de forma inequívoca também no Brasil).
São eles:
 Uma primeira motivação a ser apontada é a globalização. As diferentes
matrizes teóricas vivenciadas pelas duas experiências sistêmicas
acabaram por se reduzir em grande escala quando comparadas a
matrizes de outras famílias do direito, principalmente se levarmos em
conta temas como direitos fundamentais e humanos. Nesse sentido,
diferenças epistêmicas, que antes pareciam insuperáveis, já podem ser
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 44
analisadas, como de raízes comuns, sendo que as aproximações já são
claramente observáveis.
 Em um segundo plano, com especial relevância para uma tradição
jurídico-filosófica ocidental como a brasileira, não há como imunizar-se
da influência de importantes e grandiosos esforços realizados em uma
Europa unificada, que agora procura encontrar as bases jurídicas nas
quais se apoiarão as unidades econômica e política. Nesse sentido, é
imperativo o esforço para encontrar os pontos comuns dessas duas
tradições (civil e common law).
Atenção
Aliás, a União Europeia, unificada normativamente em várias
áreas, é um excelente laboratório para demonstrar essa
aproximação. Há bem pouco tempo, consideravam-se modelos
jurídico-constitucionais específicos, com características de
evidente singularidade, por exemplo, pós-modelos alemão,
francês e inglês. Hoje, por força do processo de unificação, os
países da União Europeia mantêm, entre si, diálogo
permanente e, mais do que isso, bases e fontes comuns para
formação de suas inteligências.
A aproximação do sistema jurídico brasileiro ao sistema de
common law
Pelo o que já vimos até aqui, parece claro que a resposta aparentemente
adequada para responder a primeira das questões apresentadas é da
existência inequívoca de aproximação do sistema brasileiro às
características que tradicionalmente se julgavam típicas dos sistemas
jurídicos vinculados à common law. Esclarecemos que não se trata de uma
mera referência ao reconhecimento de que as súmulas vinculantes acabaram
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 45
por institucionalizar o precedente como fonte primária do direito, sob a base da
regra do stare decisis.
Para que você possa entender melhor, Stare decisis é uma expressão em
latim que se traduz como "ficar com as coisas decididas". Esta frase vem de
uma locução mais extensa, "stare decisis et non quieta movere", utilizada no
direito para se referir à doutrina segundo a qual as decisões de um órgão
judicial criam precedente (jurisprudência) e vinculam as que serão emitidas no
futuro. É doutrina típica do common law e não tão forte em sistemas de direito
continental, onde a jurisprudência tende a ser meramente persuasiva.
De toda forma, a maioria dos sistemas, no entanto, reconhecem que a
jurisprudência deve ligar, de alguma forma, os juízes, evitando a total
independência de suas linhas de decisão e que as suas decisões sejam
totalmente imprevisíveis ou contraditórias entre si. A doutrina fala do stare
decisis nas perspectivas horizontal e vertical.
O stare decisis horizontal corresponde à modalidade em que os tribunais e
outros órgãos do Poder Judiciário devem respeitar os seus próprios
precedentes, internamente, sendo vinculante, portanto, para o próprio órgão,
que não pode mais rediscutir a matéria, o que também é denominado de
binding efect (efeito vinculante).
No que se refere ao stare decisis vertical, significa que as decisões vinculam
externamente, também a todos, sendo obrigatória para os demais órgãos do
Poder Judiciário, para a Administração Pública Direta e Indireta, e demais
poderes.
Mais do que isso, é necessário ir adiante. A recepção pelo sistema brasileiro do
precedente vinculante como fonte primária do direito pátrio é apenas uma das
consequências de uma alteração paradigmática no sistema jurídico brasileiro, a
partir da Constituição de 1988. Assim, é possível afirmar que o constituinte
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 46
originário, independentemente das inovações de ordem conteudísticas que, sob
várias perspectivas, possibilitou a superação dos modelos anteriores,
efetivamente alargou o papel a ser desenvolvido pelos juízes.
Sistema de common law
De acordo com o que foi afirmado anteriormente, se pararmos para pensar que
o sistema de common law é judicialista e que a decisão judicial é a principal
fonte de sua organização judiciária, não parece ser um raciocínio exagerado
afirmar que o sistema de civil law, que, em razão de determinados processos
históricos, sempre mostrou desconfiança das reais intenções dos juízes no
processo de distribuição da justiça (lembrar da Escola da Exegese, que entendia
que o juiz era um mero aplicador de normas jurídicas) ao conceder maiores
espaços de atuação ao juiz, tende a flexibilizar seus dogmas.
Nesse sentido, o constituinte derivado (e mesmo o legislador ordinário), ciente
dos espaços semânticos deixados pela Constituição e do vácuo político deixado
pelos poderes representativos, vem trabalhando pela ampliação não apenas do
papel de legislador negativo exercido pelo juiz (papel típico), mas,
principalmente e, nesse caso, de forma a mais se aproximar das características
do juiz de common law, do de legislador positivo (este mais propenso a críticas
e reflexões).
Assim, partindo de uma premissa teórica largamente difundida, que afirma que,
na civil law, o juiz tão somente deve aplicar a legislação (principalmente aquela
produzida pelo Parlamento), a assunção dessas ideias acima apresentadas
parecem colocar em questão este “dogma”, aproximando-se nosso sistema, ao
menos em alguns aspectos importantes, aos preceitos da common law.
Aliás, esse é um ponto que deve ser explorado de forma mais aguda pelos
estudiosos comparatistas, principalmente no que diz respeito à utilização,
também, de uma racionalidade pragmática, calculadora e consequencialista em
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 47
oposição a um modelo em que há predominância de uma racionalidade lógico-
matemática.
Partindo para a segunda questão deste primeiro ponto, já nos adiantamos no
sentido de não nos parecer que tenha sido a Súmula Vinculante anteriormente
referida, que, ao adentrar no sistema jurídico sob o argumento da necessidade
de conceder maior segurança jurídica e prover celeridade à tutela jurisdicional,
e que tem como inspiração a regra do stare decisis, o ponto inicial desse
processo.
É, sem dúvida, um dos pontos mais evidentes e contundentes de aproximação.
Todavia, reiterando o anteriormente exposto, a afirmação do Poder Judiciário e
dos juízes no Brasil é produto de muitos fatores que acabam por colaborar com
essa mudança paradigmática.
Conheça agora esses fatores, relacionados às regras de stare decisis:
I) Incapacidade dos poderes legislativos parlamentares de preverem todas as
hipóteses em uma sociedade hipercomplexa (fator comum ao mundo
globalizado);
II) Baixo grau de confiabilidade dos parlamentares brasileiros perante os
cidadãos, sempre incrementado pelas contínuas denúncias de corrupção;
III) Abertura semântica propiciada pela Constituição de 1988, que, em um
quadro doutrinário que privilegia a hegemonia de teorias neoconstitucionalistas
e de hermenêutica jurídica – e que, por esta razão, situa-se em um quadro
teórico de substancialização do conceito de Estado Democrático de Direito –,
acabam por propiciar um intenso trabalho de interpretação normativa pelo
Judiciário, com o propósito de maior alinhamento do direito às especificidades
do caso concreto;
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 48
IV) Grande receptividade de linhas teóricas denominadas neoconstitucionalistas,
principalmente de autores com Ronald Dworkin (tradição anglo-americana),
Robert Alexy (tradição românico-germânica), Atienza (tradição civil law
espanhola) e Carbonell (civil law mexicana), que acabam por conceder
sustentação teórica a uma perspectiva pós-positivista e incentivando o juiz a
exercer o papel de intérprete do sistema;
V) Surgimento de institutos jurídicos estranhos às constituições anteriores a
1988, que, aos poucos, vão sendo criados e que ampliam, em larga escala, o
papel de legislador (negativo e positivo) dos juízes, tais como, a título
exemplificativo, apresentamos abaixo:
a) Ampliação do quadro instrumental para o controle de constitucionalidade –
com ADI por Omissão, ADC e, principalmente, ADPF (Ação por Descumprimento
de Preceito Fundamental);
b) Instrumentos como “interpretação conforme a Constituição”, “declaração de
inconstitucionalidade sem redução de texto” e “modulação temporal dos efeitos
da constitucionalidade” (que permitem que normas inconstitucionais tenham
seus efeitos reconhecidos);
c) O mandado de injunção, em sua posição concretista;
d) A súmula vinculante, instituto que introduziu a regra do stare decisis no
Brasil, mas que é parte do processo e não o seu deflagrador.
Dito isso, seguimos para o enfrentamento da última questão formulada, ou
seja, se a aproximação a uma das principais características do sistema anglo-
americano aperfeiçoaria ou não o sistema jurídico brasileiro. A tendência deste
trabalho é filiar-se àqueles que escolhem a segunda opção, porém, é necessário
ter em conta que essa aproximação deve ocorrer em uma justa medida, pois
somente assim terá o condão de trazer benefícios de várias ordens, como
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 49
prover maior capacidade de obtenção de justiça nas decisões, conceder maior
racionalidade ao sistema, proporcionar maior efetividade dos direitos, colmatar
os vazios legais, preenchendo, assim, as lacunas da lei (já que direito é
integridade), etc.
Súmula vinculante
No que se refere à súmula vinculante, por exemplo, não se pode esquecer que
se os países de tradição na common law lutaram para construir, no decorrer
de suas histórias, estruturas e mecanismos de controle a possíveis
desequilíbrios no exercício do poder. Há, portanto, a necessidade de adaptar
aos moldes do nosso sistema institutos como o distinguished e o overruling,
a fim de que haja a cristalização de uma perspectiva.
No Brasil, houve a criação de institutos que parecem poder substituir os acima
citados distinguished e overruling. No caso de overruling, podemos pensar em
sugerir a revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante. O
problema aqui é a competência para solicitar, sendo que não poderá ser o
cidadão/jurisdicionado, pois há indicação legal dos agentes legitimados.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 50
Atenção
Lei nº 11.417/2006
Artigo 3º – São legitimados a propor a edição, a revisão ou o
cancelamento de enunciado de súmula vinculante: I – o
Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a
Mesa da Câmara dos Deputados; IV – o Procurador-Geral da
República; V – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil; VI – o Defensor Público-Geral da União; VII – partido
político com representação no Congresso Nacional; VIII –
confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional;
IX – a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa
do Distrito Federal; X – o Governador de Estado ou do Distrito
Federal; XI – os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de
Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais
Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os
Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.
Já no caso do distinguished, a jurisprudência não definiu se seria o caso de uso
do instituto da reclamação (utilizado fundamentalmente em casos de não
aplicação) e, mais ainda, não confirmado se há possibilidade de utilização deste
em caso de aplicação inoportuna. De toda sorte, embora tenhamos em vista o
que estabelece o Artigo 518, § 1º, do Código de Processo Civil (que trata da
Súmula Impeditiva de Recursos), há quem entenda existirem algumas
alternativas para afastar este requisito, de forma a se admitir o recurso nos
casos em que se possa mostrar razoáveis indícios de inaplicabilidade da súmula
ao caso concreto, de demonstrar a superação do entendimento sumular ou
mesmo, no limite, apresentar argumentos inovadores para aquela discussão.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 51
Atenção
O Artigo 518, § 1º, do CPC dispõe que o juiz não receberá a
apelação quando a sentença estiver em conformidade com
súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal
Federal.
Poder Judiciário brasileiro
Dando continuidade ao conteúdo, vamos conhecer um pouco mais do poder
judiciário.
Atenção
Ainda dentro desse contexto, outro problema em relação a
essa crescente posição proativa do Poder Judiciário brasileiro é
aquele que diz respeito a um possível déficit democrático.
Como se sabe, no decorrer de sua história, o Brasil não foi um
país que tenha logrado construir uma tradição democrática
que lhe permita abrir mão do forte simbolismo que representa
a ideia de legitimidade das normas criadas por representantes
votados pelo povo.
De toda forma, deve-se ter em vista que a legitimidade exige outros requisitos
além daqueles tradicionalmente postos, tal como o reconhecimento pelos
destinatários das normas (titular da soberania popular) de que seus
representantes exercem seu papel de forma adequada. Infelizmente essa não
tem sido uma realidade percebida pela população brasileira.
Porém, como bem alerta Boaventura de Souza Santos, há de se ter cuidado
com um tipo de ativismo judicial conservador, que consiste em neutralizar, por
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 52
via judicial, muito dos avanços democráticos que foram conquistados ao longo
de duas últimas décadas. No Brasil, não foi pensado modelos democráticos que
ausentem as escolhas pelos cidadãos no processo de exercício e organização do
poder.
Nesse sentido, uma aproximação com a common law, particularmente no que
se refere a essa confiança no Judiciário como fonte de normas jurídicas, deve
ter como limite o modelo de democracia que não suprima o forte simbolismo
que é aquele que, estabelecido por Rousseau no Século XVVIII e hoje é
apregoado fortemente pelo procedimentalismo habermasiano, defende que as
leis devem ser produzidas pelos seus próprios destinatários, sob pena de se
colocar em risco a própria legitimidade do sistema.
De toda maneira, e isso deve ficar claro, somos ainda um sistema de civil law,
aonde predominam, de forma marcante, as técnicas de solução deste sistema.
O que existe é um movimento de aproximação, antes impensável, mas que a
ocorrência dos fatores acima evidenciados foram, pouco a pouco, tornando
possível.
Se, por um lado, a aproximação entre as duas tradições irmãs é irreversível, por
outro, ela oferece oportunidades grandiosas de aperfeiçoamento dos sistemas a
partir de um diálogo permanente, cooperando com um equilíbrio necessário em
técnicas que cada uma das tradições melhor desenvolver no decorrer da
história. Somente assim a Democracia Constitucional, que se pretende construir
no Brasil e que jamais teve tantas oportunidades de se desenvolver,
amadurecerá.
O transconstitucionalismo e as fertilizações cruzadas entre
sistemas
Transconstitucionalismo, o que será?
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 53
É a denominação dada a um fenômeno que reconhece a existência de
problemas de índole constitucional que, em tempos de aprofundamento do
fenômeno da globalização, faz com que o conceito de soberania estatal seja
repensado (superando o antigo conceito vestefaliano), legitimando as
influências inevitavelmente recíprocas entre os diversos sistemas jurídico-
constitucionais.
Ou seja...
A ideia é de que, em tempos de sociedades de risco, extremamente complexas,
os sistemas jurídicos inevitavelmente devem dialogar entre si, buscando
soluções e racionalidades que, encontradas em sistemas diversos, tendem a
aperfeiçoá-los. Se o constitucionalismo está relacionado à limitação do poder
estatal, à tutela dos direitos fundamentais e à ideia de supremacia da
Constituição em face da força da Lei Maior, o transconstitucionalismo aparece
como uma ponte de diálogo entre o direito internacional e o direito
constitucional interno.
Esse fenômeno se explicita no âmbito de um profundo processo de
transformação por que passam antigos dogmas do direito internacional público
ao, cada vez mais, abdicarem do princípio do domestic affair (que defende a
tese da não intromissão, da não intercessão) para adotar, de forma crescente,
o princípio do international concern, que, em linhas gerais, procura robustecer a
efetividade dos direitos e liberdades fundamentais de todos os Estados
partícipes de um sistema mínimo de proteção internacional dos direitos
humanos.
Nessa linha, em círculos acadêmicos cada vez mais ampliados, o fenômeno da
transconstitucionalidade vem sendo analisado de forma mais aprofundada no
Brasil pelo Prof. Marcelo Neves. Porém, a questão da terminologia vem
acompanhada de polêmicas. Embora receba também as denominações de
constitucionalismo de níveis múltiplos, ou constitucionalismo multiplex, o
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 54
problema está centrado na terminologia utilizada por determinados autores,
como os portugueses Lucas Pires, Gomes Canotilho e Paulo Rangel, que
preferem a denominação “interconstitucionalidade”.
Transconstitucionalismo e interconstitucionalidade
Se, por um lado, Marcelo Neves entende que o emprego da locução “inter”
transmite a ideia de que a transconstitucionalidade não se limita a analisar as
aproximações entre ordens jurídicas homólogas e iguais, correlacionadas
apenas às visões eurocêntricas, mas busca enxergar aproximação entre ordens
díspares, há quem entenda que, quando a temática foi pensada sob a
perspectiva de “interconstitucionalidade”, ela já possuía todo um arsenal teórico
para tratar com temas de pluralidade intensa das sociedades hodiernas,
também típicas no quadro europeu.
Na verdade, o objetivo a que visam os estudiosos da temática é não apenas
analisar o fenômeno, mas, a partir do quadro estabelecido, elaborar teorizações
que reconstruam essa transconstitucionalidade (as novas realidades jurídico-
constitucionais exigem um novo instrumental teórico) por meio da utilização de
uma racionalidade (transversal) que atravesse as racionalidades específicas de
cada ordem jurídica e que possa inter-relacionar suas inteligências específicas.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 55
Atenção
O sistema jurídico brasileiro, por intermédio da cláusula aberta
estabelecida pelos §§ 2º e 3º do Artigo 5º da Constituição
Brasileira de 1988, parece já ter nascido com a propensão à
abertura hermenêutica e aos diálogos inter-sistêmicos. Ao
utilizarmo-nos da aula anterior, buscamos um paralelo
(possível) para concluir que o transconstitucionalismo pode, ao
menos in tesi, servir como um novo aparato instrumental
neoconstitucional para o controle das decisões judiciais. Isso
porque os limites jurídicos não se encontrariam somente na
inteligência proporcionada pelo sistema interno, mas em uma
razão constitucional aberta para um efetivo diálogo entre
fontes advindas de sistemas diversos.
As formas de transconstitucionalidade entre ordens jurídicas
Conheça agora as formas de transconstitucionalidade existentes entre ordens
jurídicas:
Entre ordens jurídicas estatais qualitativas
Talvez, a mais óbvia de todas as formas de transconstitucionalidade seja aquela
estabelecida entre ordens jurídicas estatais. Trata-se principalmente de
referências recíprocas a decisões entre tribunais de diferentes países. Há uma
crescente utilização da técnica denominada por alguns estudiosos como cross
fertilization e, embora seja cada vez mais comum que as principais Cortes se
citem mutuamente, é ainda mais comezinho que, em países juridicamente
periféricos (como é o nosso caso), referenciem dispositivos, jurisprudências e
doutrinas constitucionais estrangeiras, não apenas na chamada obter dictum,
mas, também, na ratio decidendi.
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 56
No caso brasileiro, embora sejam mais comuns as referências às decisões e
argumentações estabelecidas pelas cortes americana e alemã, no caso
específico do julgamento histórico do HC nº 82.424/RS, de 17/11/2003, no STF,
a questão do racismo foi amplamente discutida, menos a partir da
jurisprudência nacional e internacional, mas muito mais pelos precedentes,
legislação e dispositivos constitucionais estrangeiros.
Entre ordens jurídicas estatais e ordens locais extraestatais
Esse talvez seja um dos casos mais complexos e gerador das maiores polêmicas
no âmbito do transconstitucionalismo. Isso porque, no caso em análise, se está
dentro de um espaço territorial que, em princípio, deveria estar vigendo a
ordem jurídica estatal “oficial” (e, neste ponto, é que o transconstitucionalismo
aponta para a fragilização de uma perspectiva territorial de aplicação de uma
dada ordem). A América Latina é rica em problemas jurídico-constitucionais
dessa natureza, e o Brasil, com sua riqueza cultural indígena, apresenta
problemas de alto grau de complexidade.
Para entender melhor sobre o âmbito do transconstitucionalismo, temos o
exemplo, que é mais contundente nessa perspectiva de análise. Ele se refere a
tribos que, em algumas circunstâncias específicas, praticam o infanticídio,
suscitando um acalorado debate entre grupos que se polarizam entre o relativismo
cultural e a universalização dos Direitos Humanos, mais especificamente, neste caso,
o direito à vida.
Deve-se, porém, atentar que o infanticídio é praticado fundado em práticas
ancestrais que afastam qualquer juízo de “indecência” ou “maldade”, mas
ligado a aspectos de sobrevivência em uma lógica comunitária, profundamente
diversa da nossa, mas tão digna quanto.
Nesse caso, é possível observar que a aplicação de uma ordem única, de forma
inflexível, pode determinar violação grave à autonomia coletiva de uma
comunidade. Trata-se de confronto de perspectivas fundadas em visões
TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 57
culturais tão diversas que a imposição da regra estatal implica na morte de uma
cultura que, embora diferente (às vezes, bastante diversa!), estabelece uma
lógica de solução de problemas sofisticada e complexa.
Por isso, já existem posições que entendem que o Estado Constitucional exige
uma postura de self-restraint à sua pretensão de concretizar suas normas
específicas quando estas entrem em colisão com normas de comunidades
nativas fundadas em bases culturais essencialmente diversas daquela em que
está alicerçada a ordem constitucional dominante.
Entre direito estatal e direito internacional público
A relação entre o direito estatal e as normas de direito constitucional é
cada vez mais constante, seja pela presença de cláusulas constitucionais nas
próprias constituições estatais (que, assim, acabam por recepcionar o direito
internacional para sua própria ordem jurídica), mas, também, pela crescente
incorporação das questões constitucionais pelos tribunais internacionais que
arrogam para si a pretensão de decidir, com caráter vinculatório, situações que
envolvem agentes e cidadãos dos Estados nacionais.
No caso brasileiro, o Brasil tem sido réu em muitas ações movidas na Corte
Interamericana de Direitos Humanos, sendo que algumas interpretações
de dispositivos constitucionais pelo STF vêm levando em conta, cada vez mais,
não apenas os dispositivos constantes na Convenção Americana de Direitos
Humanos, mas a própria interpretação que a Corte Interamericana faz deste
documento. É a busca por um diálogo que tende a se intensificar.
No caso brasileiro, o Brasil tem sido réu em muitas ações movidas na Corte
Interamericana de Direitos Humanos, sendo que algumas interpretações de
dispositivos constitucionais pelo STF vêm levando em conta, cada vez mais, não
apenas os dispositivos constantes na Convenção Americana de Direitos
Humanos, mas a própria interpretação que a Corte Interamericana faz deste
documento. É a busca por um diálogo que tende a se intensificar.
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  • 1.
  • 2. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 1 Apresentação......................................................................................................................... 4 Aula 1: Teoria da Constituição............................................................................................... 5 .......................................................................................................................... 5Introdução ............................................................................................................................ 7Conteúdo O neoconstitucionalismo na perspectiva pós-positivista.................................................7 O pós-positivismo como corrente não positivista...............................................................7 O deslocamento da agenda.......................................................................................................... 9 A busca pela superação teórica das escolas juspositivista e jusnaturalista...........10 A mitigação da dicotomia descrição/prescrição ................................................................11 Juspositivismo e sua relação com casos difíceis...............................................................12 A importância dos casos difíceis............................................................................................... 13 O neoconstitucionalismo e a constitucionalização do direito....................................14 Principais aspectos do neoconstitucionalismo..................................................................14 A onipresença da constituição ..................................................................................................15 Onipresença judicial.......................................................................................................................16 Coerência sistêmica do neoconstitucionalismo................................................................18 Regras neoconstitucionais...........................................................................................................18 Discussões necessárias sobre a ponderação e a subsunção .......................................20 Resumo - Neoconstitucionalismo............................................................................................20 A teoria do neoconstitucionalismo..........................................................................................21 Neoconstitucionalismo como nova concepção jurídica...............................................22 Atividade proposta...........................................................................................................................24 .................................................................................................................................. 26Notas ................................................................................................................... 26Aprenda Mais ....................................................................................................................... 26Referências ..................................................................................................... 28Exercícios de fixação ........................................................................................................ 33Chaves de resposta Aula 2: Interpretação constitucional................................................................................... 36 ........................................................................................................................ 36Introdução .......................................................................................................................... 38Conteúdo O mundo globalizado e a aproximação de sistemas................................................ 38 O sistema jurídico brasileiro e a common law...................................................................38 Emenda Constitucional nº 45/2004 ........................................................................................39
  • 3. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 2 Transconstitucionalismo e a cross fertilization..................................................................39 Aproximação da civil law e common law – algumas notas introdutórias.............40 Sistema jurídico brasileiro e o sistema de common law................................................41 Civil Law...............................................................................................................................................42 Fatores condicionantes na organização dos fatores jurídicos brasileiro................43 A aproximação do sistema jurídico brasileiro ao sistema de common law..........44 Sistema de common law..............................................................................................................46 Súmula vinculante...........................................................................................................................49 Poder Judiciário brasileiro ...........................................................................................................51 O transconstitucionalismo e as fertilizações cruzadas entre sistemas....................52 Transconstitucionalismo e interconstitucionalidade ......................................................54 As formas de transconstitucionalidade entre ordens jurídicas...................................55 Entre direito estatal e direito internacional público.........................................................57 Fatores de ordem judicial.............................................................................................................58 Atividade proposta...........................................................................................................................60 .................................................................................................................................. 60Notas ................................................................................................................... 61Aprenda Mais ....................................................................................................................... 61Referências ..................................................................................................... 63Exercícios de fixação ........................................................................................................ 69Chaves de resposta Aula 3: A teoria dos direitos fundamentais......................................................................... 73 ........................................................................................................................ 73Introdução .......................................................................................................................... 75Conteúdo Princípio da proporcionalidade .................................................................................................75 Conceito de proporcionalidade.................................................................................................75 Noção de proporção ......................................................................................................................76 Direito público...................................................................................................................................76 Ordenamentos .................................................................................................................................. 77 Setor do direito público e o conceito de proporcionalidade.......................................78 Ensinamentos doutrinários de Luís Roberto Barroso......................................................78 A proporcionalidade na jurisprudência do Supremo.......................................................80 Proporcionalidade e linguagem................................................................................................81 Proporcionalidade no direito......................................................................................................82 A proporcionalidade como postulado....................................................................................82 Critérios do postulado ...................................................................................................................85 Subprincípios......................................................................................................................................86 Proporcionalidade em sentido estrito ....................................................................................89
  • 4. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 3 Conclusão............................................................................................................................................90 Atividade proposta...........................................................................................................................91 ................................................................................................................... 92Aprenda Mais ....................................................................................................................... 92Referências ..................................................................................................... 93Exercícios de fixação ........................................................................................................ 98Chaves de resposta Aula 4: Controle de Constitucionalidade........................................................................... 101 ...................................................................................................................... 101Introdução ........................................................................................................................ 103Conteúdo A “constitucionalização” do direito europeu e um novo paradigma jurídico ....103 Características expressas por Jónatas Machado..............................................................103 As pretensões constitucionais do direito da União Europeia ................................... 104 Atribuição de competência...................................................................................................... 105 Direito europeu e direito Constitucional............................................................................ 105 A relação entre o direito da UE e o direito constitucional segundo as principais cortes constitucionais................................................................................................................. 106 Uma outra perspectiva de análise: a influência do direito nacional ao direito da UE..........................................................................................................................................................110 Os interesses nacionais e os limites dos direitos da UE ...............................................110 Estrutura normativa do direito (parte 1) – direito primário......................................... 111 Direito primário...............................................................................................................................112 Tratados instituidores e de revisão........................................................................................112 Protocolos adicionais, declarações e atos de complementação .............................115 Princípios gerais do direito da UE...........................................................................................116 Princípios gerais do direito ........................................................................................................ 117 Conclusão..........................................................................................................................................118 Atividade proposta.........................................................................................................................119 ................................................................................................................................ 119Notas ................................................................................................................. 121Aprenda Mais ..................................................................................................................... 121Referências ................................................................................................... 124Exercícios de fixação ...................................................................................................... 126Chaves de resposta Conteudista.......................................................................................................................................128
  • 5. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 4 Nesta disciplina, estudaremos os temas dos novos paradigmas de interpretação constitucional, do pós-positivismo e da normatividade dos princípios constitucionais, da teoria dos direitos fundamentais, do controle de constitucionalidade e das ações constitucionais. Analisaremos o eixo “força normativa da Constituição e paradigmas pós- positivistas de interpretação constitucional”, e atualizaremos a visão da Constituição como um sistema de regras e princípios. Sendo assim, esta disciplina tem como objetivos: 1. Reconhecer a força normativa da constituição, bem como os novos paradigmas de interpretação constitucional; 2. Definir e explicar a jurisdição constitucional brasileira.
  • 6. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 5 Introdução Esta aula traz como tema central o neoconstitucionalismo. Esse é um termo que explica um fenômeno relativamente recente dentro do Estado constitucional contemporâneo e que hoje tem se desenvolvido grandemente, principalmente no Brasil, na esteira do que acontece em grandes tradições jurídicas europeia e sul-americana. Esse frenético desenvolvimento é devido ao crescimento das vertentes pós- positivistas, na razão proporcional em que se intensificam os problemas de ordem teórico-jurídica suscitados pelas insuficiências do positivismo jurídico como concepção jusfilosófica, nos dias atuais. Como resultado de seu desenvolvimento, esse fenômeno vem gerando uma evidente alteração no processo de compreensão da ordem jurídica. Na base fulcral do que estamos considerando ser um processo de valorização dos ideários neoconstitucionais no âmbito jurídico-constitucional brasileiro, temos como premissas que o mesmo não surge em nosso ambiente jurídico como um modismo inconsequente e passageiro. Pelo contrário, temos motivos para acreditar que o mesmo encontra fundamentos não apenas em bases mais remotas de uma tradição do pensamento ocidental, mas também, em bases profundas da própria formação histórica e mental do pensamento jurídico brasileiro, que sempre questionou a dificuldade do positivismo de relacionar direito e justiça. Assim, devemos analisar que na base de fenômenos facilmente perceptíveis na realidade jurídica brasileira hodierna, como a redescoberta dos princípios jurídicos, (em especial a dignidade da pessoa humana), a expansão da jurisdição constitucional com ênfase no surgimento de tribunais constitucionais
  • 7. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 6 (na esteira da judicialização da política) e o desenvolvimento de novos métodos e princípios na hermenêutica constitucional, encontra-se o fenômeno neoconstitucional, como concepção pós-positivista. É o que veremos a seguir. Objetivos: 1. Mostrar a relação existente entre o desenvolvimento econômico dos países e a dependência motivada pelo aumento de demanda energética: problemas e desafios; 2. Ressaltar as dificuldades enfrentadas por países que dependem de uma única fonte energética para suprir as crescentes demandas energéticas.
  • 8. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 7 Conteúdo O neoconstitucionalismo na perspectiva pós-positivista Para iniciar a primeira aula, pense: em quais momentos ou quais autores deixaram de apresentar de forma clara uma diferenciação entre os conceitos pós-positivismo e neoconstitucionalismo? Na maioria das vezes, quando estudamos esses dois termos e seus conceitos, buscamos sempre entendê-los como fenômenos distintos, porém estão sempre interligados. Vejamos: Pós-positivismo Tem por ideia central o ataque a algumas concepções positivistas (e nesse sentido é uma corrente jusfilosófica não positivista). Neoconstitucionalismo Tem por concepção teórica central conceder às normas constitucionais o papel de vetores axiológicos do sistema jurídico, irradiando seus valores para todas as áreas do Direito, principalmente aquelas que enaltecem a dignidade humana. O pós-positivismo como corrente não positivista Para que você entenda melhor o que foi dito anteriormente, vamos conhecer um pouco de cada uma dessas linhas de pensamento, apontando suas relações. Até porque, não nos parece possível compreender o que seja o neoconstitucionalismo, como concepção filosófico-jurídica, sem o pressuposto entendimento do que venha a ser pós-positivismo. De qualquer forma, a verdade é que o que estamos chamando de pós- positivista não é uma doutrina pura. Trata-se de diversas doutrinas heterogêneas em sua inspiração e alcance, mas que têm como objetivo comum fundamental responder às questões que determinaram a crise do positivismo jurídico. Entre essas diversas versões denominadas por pós-positivistas, temos aquelas que são elaboradas a partir de sofisticados argumentos que procuram fazer
  • 9. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 8 com que a validade das normas jurídicas dependam, também, de considerações de natureza moral, tendo por base a dignidade humana. A terceira via (?) Sobre a possibilidade de ser ou não o pós-positivismo uma terceira via aos discursos das mais tradicionais escolas filosóficas do Direito – jusnaturalista e juspositivista –, algumas ideias emergem no cenário acadêmico. Três se destacam: • A primeira entende que o pós-positivismo vem se apresentando, cada vez mais, como uma terceira via às escolas jusnaturalistas e do positivismo jurídico, porque tem por propósito ultrapassar as limitações e reduções que, no decorrer da história, essas duas correntes centrais apresentaram; • Uma segunda visão sobre o tema é daqueles que entendem que seria uma nova etapa, uma nova geração do positivismo jurídico, mitigada pelo reconhecimento da normatividade dos princípios; • A terceira corrente é aquela seguida por quem entende que o pós- positivismo deve ser considerado uma vertente fraca do jusnaturalismo. Neste sentido, a ênfase está em um jusnaturalismo enfraquecido pela inevitável influência histórica positivista. A posição por nós assumida, neste curso, é aquela que defende ser uma terceira via. Mesmo cientes de que se trata de uma questão complexa, na qual todas as vertentes apresentam argumentos de grande densidade, a primeira visão apresentada, a nosso ver, é aquela que melhor acentua a necessidade de superação das deficiências das duas escolas tradicionais, jusnaturalismo e o positivismo jurídico, que em seus fundamentos teóricos já não mais possibilitam uma fundamentação mais efetiva do direito contemporâneo em meio às suas dificuldades que emergem no plano histórico. Devido a isso, se por um lado, as concepções pós-positivistas afastam-se de qualquer consideração metafísica que vislumbre a possibilidade de um direito
  • 10. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 9 natural, por outro lado, temos que a tese da clássica separação entre direito e moral, levada a cabo de forma contundente pelas correntes positivistas, e tidas por essa como uma questão central e essencial, não são recebidas pelas novas correntes, que chamamos de pós-positivistas, mas que poderiam ser chamadas, como o fez Robert Alexy, de não positivistas. Dentro dessa perspectiva, vale analisar algumas características que costumam especificar a linha pós-positivista, tendo em vista que acabam, por via de consequência, servindo de base para o que chamamos de neoconstitucionalismo. O deslocamento da agenda Agora que já conhecemos um pouco sobre o pós-positivista, vamos estudar sobre o deslocamento da agenda que diz respeito à mudança do temário e dos compromissos assumidos pelos autores pós-positivistas que, afastando-se da agenda estabelecida por juristas positivistas, passam a se referenciar pelas seguintes vertentes: 1. A importância fundamental dos princípios do direito na organização do sistema. 2. A relevância da dimensão argumentativa na compreensão do direito nas sociedades democráticas contemporâneas. 3. Reflexão profunda sobre o papel a ser desempenhado pela hermenêutica jurídica. Nesse sentido, o jurista aponta seu olhar não apenas para o presente, mas também para o futuro, com preocupações evidentes de criar uma metodologia de análise que dê conta de compreender o fenômeno jurídico em um mundo essencialmente mutante, plural e dinâmico.
  • 11. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 10 A busca pela superação teórica das escolas juspositivista e jusnaturalista O pós-positivismo, como corrente teórica, surge fundamentalmente como resistência à hegemonia do positivismo jurídico, pois neste se encontrariam algumas teses vitais consideradas incompatíveis com as formulações pós- positivistas. Neste sentido, não se deve deixar de ressaltar o trabalho desenvolvido por dois grande teóricos jurídicos, que se notabilizaram no mundo filosófico-jurídico por intermédio de trabalhos claramente fundamentados na chamada corrente pós- positivista. Robert Alexy – é reconhecido como representante do debate no âmbito do direito continental. Ronald Dworkin – é reconhecido no âmbito do debate do direito anglo- americano. Aliás, segundo juristas de relevo, somente pode ser considerado pós-positivista aquele que contraria algumas das teses fundamentais do positivismo jurídico, ou seja, aqueles que atacam, principalmente, a separação entre as esferas moral, política e jurídica. Para os pós-positivistas, o reconhecimento da centralidade do papel exercido pelos princípios jurídicos inter-relaciona, inevitavelmente, essas três esferas da vida social. Daí que haja uma reaproximação entre direito e moral no neoconstitucionalismo, como vertente pós-positivista que é. Ressalte-se que a visão pós-positivista segue acreditando no projeto da racionalidade, iniciado na Modernidade. Nesta via, observamos que adotar uma visão pós-positivista não significa recusar a racionalidade que está na gênese do pensamento positivista, mas sim ir mais avante, acreditando também em critérios de justiciabilidade (estabelecidos a partir de argumentos também racionais). Enquanto o preenchimento das lacunas normativas é resolvido pela
  • 12. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 11 “discricionariedade” do juiz, o pós-positivismo entende que as lacunas são apenas aparentes, pois o sistema possui uma inteligência implícita que produz norma para qualquer situação, não dependendo de “bom senso” ou “visões particulares” do magistrado. Conclusão inevitável é que o pós-positivismo afasta-se do positivismo jurídico quando reestabelece uma aproximação entre as esferas ético-moral, política e jurídica e, principalmente, trazendo para dentro da esfera da juridicidade, por meio dos princípios jurídicos, os elementos de natureza ético-morais que circunstanciam a questão concreta em análise. A mitigação da dicotomia descrição/prescrição Para autores pós-positivistas, uma das questões fundamentais é recusar o paradigma positivista que defende como axioma a distinção entre descrição e prescrição. Tendo sido este ponto largamente trabalhado por Hans Kelsen, segundo este, a prescrição refere-se ao trabalho do legislador quando este produz a norma jurídica.
  • 13. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 12 Já a descrição vincula-se ao trabalho do teórico, do doutrinador, que procura municiar os operadores do Direito, dando-lhes instrumentos capazes de conduzi-los a respostas corretas para complexos problemas jurídicos, principalmente nos casos difíceis (hard cases). Juspositivismo e sua relação com casos difíceis De acordo com todas as informações que estudamos até este momento, o pós- positivismo oferece um forte amparo conceitual ao que diz respeito às decisões a serem tomadas e também as doutrinas judiciais, principalmente ao se tratar de casos difíceis. Para ampliar ainda mais nossos conhecimentos, veja mais algumas informações: Para um juspositivista, o papel da doutrina é bastante limitado em relação ao que pensariam os pós-positivistas. Estes, ao contrário, entendem que na solução de casos difíceis, a doutrina acaba por ser uma ferramenta essencial, auxiliando fortemente a pensar racionalmente a ordem jurídica. Não se trata de afastar o papel fundamental do legislador, mas valorizar as produções doutrinárias e jurisprudenciais, quebrando o monopólio concedido àquele. É ao que temos assistido, cada vez em maior profusão, principalmente no interior das supremas cortes espalhadas pelo mundo (o STF, inclusive, e de forma intensa). Nestas, evidencia-se a impossibilidade de produção de normas específicas para os diferentes problemas que diariamente são expostos aos poderes judiciários espalhados pelo mundo, sem que haja previsão normativa específica para suas soluções. Neste caso, a tendência é que, cada vez, com maior frequência, os juízes (principalmente aqueles atrelados a cortes superiores) fundamentem suas decisões com base em conhecimentos produzidos pelos estudiosos, reconhecendo-se, nesses estudos, base jurídica para alicerçar suas decisões.
  • 14. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 13 A importância dos casos difíceis Outra mudança trazida pelo paradigma pós-positivista é a maior preocupação com os chamados casos difíceis (hard cases) em detrimento dos casos fáceis (soft cases). Isto se explica pela nova realidade experimentada no mundo contemporâneo que, como já dito anteriormente, não apenas sofre mudanças em uma velocidade jamais experimentada no percurso histórico da humanidade, como também tende a respeitar e valorizar a pluralidade de concepções. Assim, as questões que exigem solução pelo poder público apresentam, nos dias de hoje, um grau de complexidade que um modelo estático de sistema jurídico - marcado pela rigidez do sistema norma-regra - não pode oferecer. Casos difíceis Os casos difíceis se caracterizam por trazerem à baila a controvérsia incomum, rara e infrequente, que as práticas legais existentes não são capazes de resolver de forma definitiva. Atienza, baseado em MacCormick, estabelece quatro possíveis tipos de problemas jurídicos que ensejam os denominados “casos difíceis”. São eles: 1. Quando nos deparamos com o problema de não haver dispositivo normativo para solucionar o caso em questão (problema de relevância); 2. Quando há dúvidas acerca da ocorrência ou não de um determinado fato (problemas de prova); 3. Quando nos deparamos com o problema de como entender uma norma (problema de interpretação); 4. Quando se discute se um dado fato deve ou não ingressar no espectro de aplicação de um conceito contido na hipótese de incidência ou consequência jurídica da norma (problema de qualificação).
  • 15. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 14 Atenção Como já pode ver, a cada dia é mais comum que nos deparemos com estes tipos de problemas no processo de solução das questões jurídicas. Daí que tenhamos a necessidade de uma formulação teórica que apresente instrumentais para superar esse tipo de dificuldade. No Brasil, uma concepção teórica cada vez mais prestigiada é a que está sendo denominada por neoconstitucionalismo. O neoconstitucionalismo e a constitucionalização do direito Agora que você já conheceu sobre o pós-positivismo, chegou então a hora de tratarmos do neoconstitucionalismo mais especificamente, embora tudo que tenha sido dito anteriormente complemente o que agora será tratado. A rigor, devemos ter em conta que por “constitucionalização” deve ser entendida a passagem do chamado Estado Legislativo do século XIX ao Estado Constitucional do século XX, mais precisamente a partir do momento em que se sobressaem institutos como a rigidez constitucional e controle de constitucionalidade da lei. É só neste sentido, quando o sistema passa a ser filtrado por esta lei maior, que podemos e devemos falar deste fenômeno. Assim, quando afirmamos que não podemos considerar o direito do século XIX – e por maior razão o direito dos séculos precedentes – como constitucionalizados, devemos fazê-lo em virtude de que a conexão necessária entre direito e moral, ou entre direito e princípios constitucionais não era, portanto, necessária, mas contingencial. Principais aspectos do neoconstitucionalismo Em tempos cada vez mais relacionados a um Estado Constitucional de Direito, a verdade é que se reclama uma nova teorização, uma nova explicação que se afaste dos esquemas do chamado positivismo jurídico. Nesse sentido,
  • 16. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 15 apresentamos, então, de forma sintética, os principais aspectos do neoconstitucionalismo:  Onipresença da constituição em todas as áreas do direito e em todos os conflitos minimamente relevantes, ao invés de espaços livres em favor da opção legislativa ou regulamentadora;  Onipresença judicial no lugar de autonomia do legislador ordinário;  Coexistência de uma constelação de valores tendencialmente contraditórios em lugar da homogeneidade ideológica em torno de um punhado de princípios coerentes entre si;  Mais princípios do que regras;  Mais ponderação que subsunção. Agora que você conhece os principais aspectos, faremos, logo na sequência, uma análise de cada uma dessas características. A onipresença da constituição As constituições hodiernas, e a brasileira de 1988 em especial, oferece denso conteúdo material composto de valores, direitos fundamentais, diretrizes aos poderes públicos, de maneira que é bastante difícil conceber um problema jurídico medianamente sério que não encontre alguma orientação no texto constitucional. O problema é que, por trás de cada preceito legal, adivinha-se sempre uma norma constitucional confirmadora ou contraditória. Porém, há de se ressaltar que o fato de ser nossa Constituição, de 1988, analítica (prolixa). Embora gere problemas no que diz respeito à pretensão de filtrar todas as normas do sistema, ela traz consigo a vantagem de abarcar um sem número de valores, que muito dificilmente, no processo de manuseio interpretativo, deixam de fora do processo de ponderação algum valor que represente grupo minoritário.
  • 17. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 16 Onipresença judicial Sendo a Constituição composta de normas que potencialmente podem estar presentes em todos os conflitos gerados no âmbito do sistema, acaba por gerar um fenômeno que é a onipresença judicial. Isto não ocorreria se a constituição tivesse, como único objeto, a regulação das fontes ou, no máximo, estabelecesse alguns poucos direitos fundamentais, pois em tal caso a normatização constitucional e, por consequência, sua garantia constitucional, só entrariam em jogo quando se violasse alguma condição de produção normativa ou se restringisse algumas áreas de imunidade garantida. No que se refere à citada onipresença judicial, esta é, então, uma decorrência natural da onipresença constitucional. Isto porque, na medida em que a Constituição oferece orientações nas mais heterogêneas esferas, e considerando que estas esferas estão confiadas à garantia judicial, o legislador perde com o neoconstitucionalismo, natural e logicamente, sua autonomia. O fato é que não há norma infraconstitucional que não seja, nestas “circunstâncias neoconstitucionais”, impregnada pela normatividade constitucional. A decisão correta, então, é aquela que maior coerência apresenta com o sistema jurídico em sua totalidade. Para os defensores das teses neoconstitucionais, o juiz não atua como legislador, pois, ao submeter sua decisão a critérios racionais, limita-se ele, tão somente, a reconhecer direitos e obrigações preexistentes à sua vontade. Veja, por exemplo, trecho do voto-vista do Min. Luiz Fux, no âmbito da Adin nº 1923/DF, cujo teor pode ser lido no Informativo STF nª 628, quando faz referência à obra de Gustavo Binenbojm: No cenário do neoconstitucionalismo, portanto, o exercício da discricionariedade não escapa do respeito aos princípios
  • 18. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 17 constitucionais, e isso, veja-se bem, mesmo quando a lei seja omissa, já que a legislação infraconstitucional não pode represar, conter ou de qualquer forma mitigar a eficácia irradiante das normas constitucionais (BINENBOJM, 2006. p. 307-8)1 De toda maneira, não podemos deixar de apontar algumas das mais ácidas críticas que vêm sofrendo o neoconstitucionalismo e que decorrem exatamente dessa ampliação do papel do Poder Judiciário. Fala-se, cada vez mais e em todo o mundo, de uma judicialização da política, já que o papel alargardo concedido aos juízes, com seus discursos mais técnicos, tende a reduzir o alcance do discurso político expresso pelas classes políticas tradicionais. A atuação contundente dos juízes em determinadas causas acaba por definir o que vem sendo chamado de ativismo judicial, por muitos considerado uma infringência ao princípio da separação de poderes. Neste sentido, embora as críticas não possam ser desprezadas, o que vem ocorrendo é uma reconfiguração estrutural na forma de organização do poder e, por decorrência, do direito como instrumentalizador do exercício deste. De toda forma, acredita-se que experiência reprimirá os excessos, havendo uma natural acomodação no processo de separação de poderes e competências. Todavia, vale ressaltar, a ascensão do neoconstitucionalismo pós-positivista não parece ser um movimento passageiro, mas sim uma tendência no processo de reconfiguração por que passa todo o sistema jurídico brasileiro. 1 (BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo – direitos fundamentais, democracia e constitucionalização. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 307-8).
  • 19. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 18 Coerência sistêmica do neoconstitucionalismo Ao que se refere à discussão acerca da coerência sistêmica, o neoconstitucionalismo não representa, como no constitucionalismo tradicional, um pacto em torno de alguns poucos princípios comuns e coerentes, mas sim um pacto em torno de princípios e postulados distintos e, por vezes, contraditórios, adequados às sociedades pluriculturais. Assim, como temos dito, as constituições, ainda que garantam a chamada igualdade jurídica ou formal, tendem, cada vez mais, a preocupar-se em garantir a igualdade substancial ou material, principalmente em países como o Brasil, onde as desigualdades sociais conduzem a uma maior preocupação com esta vertente da igualdade que estabelece a necessidade de diferenciar os diferentes na proporção de suas diferenças. Esse panorama faz com que alguns críticos afirmem que a concepção neoconstitucional incentiva o aparecimento de antinomias, representando a constituição um conjunto de normas contraditórias entre si que se superpõem permanentemente e, por isso, concedem lugar a soluções díspares e, por via de consequência, ensejam insegurança jurídica. Regras neoconstitucionais A mencionada crítica teria maior consistência se as regras constitucionais fossem do tipo norma-regra. Mas como em um sistema neoconstitucional os princípios predominam sobre as regras, a lógica que vigora é outra, já que proposta neoconstitucional ao revitalizar a eficácia principiológica, tida como verdadeira base da inteligência sistêmica, justifica a presença da dimensão valor na análise jurídica e se coliga em maior proporção a um ideal de justiça. De toda sorte, como entre normas constitucionais não é possível aplicar os critérios hierárquico ou cronológico (já que não pode se imaginar a existência norma constitucional inválida e, portanto, inconstitucional), quando o conflito entre normas regras se apresenta, tem-se preferencialmente a aplicação do
  • 20. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 19 critério da especialidade, sendo que a norma é aplicada em sua máxima dimensão normativa (o famoso “tudo ou nada” dworkiniano). Diferentemente, quando as contradições se dão entre normas principiológicas, ambas seguem simultaneamente válidas, por mais que no caso concreto (dadas as circunstâncias específicas deste) uma triunfe sobre a outra. Neste caso, cabe buscar uma relação de preponderância relativa, de uma sobre outra, que só pode ser definida no âmbito do caso concreto. Na verdade, uma das principais tarefas realizadas pelo neoconstitucionalismo foi a de recolocar os princípios jurídicos em um lugar de centralidade no processo interpretativo. Principalmente se consideramos que a concepção clássica que unia direito e moral sempre foi ligada às concepções jusnaturalistas, cuja perspectiva valorativa eram providas, porém, de baixa normatividade e eficácia jurídica. Nesse sentido, é o princípio que estabelece essa ponte de rearticulação entre direito e moral. Para Robert Alexy, os princípios constituem mandados de otimização que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, enquanto Dworkin entende que os princípios são fonte de justificação moral e política vigente em uma determinada comunidade. Assim, segundo autores neoconstitucionalistas, um sistema que possui tão somente normas-regras não está habilitado a solucionar todas as questões que exsurgem no dia a dia dos tribunais. Para esses, é absolutamente necessário o reconhecimento da normatividade do princípio, já que possui o mesmo uma capacidade muito superior em relação às regras de transferir valor ao sistema jurídico e, principalmente, de produzir juízos para uma sociedade tão plural e sofisticada, no que diz respeito às suas demandas.
  • 21. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 20 Discussões necessárias sobre a ponderação e a subsunção Quanto à apontada característica de maior utilização da ponderação do que subsunção, veja alguns dados importantes: Faz-se necessário que expliquemos, antes de tudo, o que estamos chamando de ponderação. Trata-se de um tipo de juízo que se usa para resolver antinomias de normas constitucionais, quando não é possível usar o critério da especialidade (como dissemos anteriormente, o outro critério para solução de antinomias constitucionais). É um juízo complexo que deságua em uma declaração de preferência condicionada, estabelecendo o triunfo de uma das normas em conflito no caso concreto específico, mas sem pretensão de definitividade. A ponderação requer uma argumentação complexa, sendo que o núcleo central do juízo de ponderação consiste em conceder preferência à solução que, evitando o referido “tudo ou nada” utilizado no juízo que trata sobre o conflito entre regras, enfrente o conflito sopesando dos valores em colisão naquela situação específica. Atente-se que se deve procurar a solução que estabeleça menor lesão a uma das normas em conflito, já que in abstrato (referindo-nos às normas constitucionais prima facie), todas ostentariam igual valor. Porém, no caso concreto, a situação é diversa e, como já intuíam os gregos há mais de vinte e cinco séculos, a ideia de proporção vincula-se à busca pela solução mais justa. Mas nos aprofundaremos sobre esses conceitos nas próximas aulas. Resumo - Neoconstitucionalismo O neoconstitucionalismo, como concepção jurídica, quer a submissão de todo o ordenamento (incluindo o legislador democrático) à constituição, embora tenha que admitir, em situações especiais, a possibilidade de diálogos e
  • 22. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 21 autorrestrições de suas normas em face de normas advindas de outras ordens jurídicas. De toda forma, não há dúvidas de que esse “comando constitucional” gera a abertura ao judicialismo, ao menos na perspectiva que vem sendo adotada no Brasil, que segue uma linha vinculada às tendências europeias com as quais o direito brasileiro mantém maior vínculo e é mais fortemente contaminado. A teoria do neoconstitucionalismo Neste sentido, esta linha de pensamento pressupõe uma depurada teoria argumentativa, capaz de garantir a racionalidade e suscitar o consenso em torno das decisões judiciais. Não é sem motivos que o neoconstitucionalismo se propõe, como uma vertente pós-positivista, a superar uma visão positivista do Direito. Estabelece ele um novo paradigma teórico, ao colocar uma razão destranscendentalizada (como diria Habermas) como ferramenta indispensável à própria construção do Direito, inclusive nas situações em que o ordenamento legal não prevê soluções para a resolução dos casos concretos (observe-se que usou-se a expressão “ordenamento legal” e “não ordenamento jurídico”). A ideia de uma destranscendentalização também rejeita uma lógica jusnatural, que fundava sua justiça ou na religião, ou em um sistema de justiça que, embora de grande beleza e logicidade, não encontra qualquer suporte na experiência ou nos fatos da vida. Aliás, cuidado! Os neoconstitucionalistas não defendem que suas concepções possam ser consideradas vertentes antiformalistas do Direito, já que entendem que suas respostas encontram-se no interior do próprio campo da juridicidade - dentro das fronteiras do Direito.
  • 23. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 22 Neoconstitucionalismo como nova concepção jurídica Ainda que consigam alcançar o mundo do valor e da moral, o fazem por meio dos princípios jurídicos, que são normas positivas. Há quem considere que os princípios são valores positivados. Embora essa afirmativa possa gerar algumas críticas, a figura auxilia o entendimento. Por fim, como diz o grande constitucionalista espanhol, Prieto Sanchís, parece evidente que o neoconstitucionalismo requer:  Uma nova teoria das fontes, afastada do legalismo positivista;  Uma nova teoria da norma que possibilite maior relevância aos princípios jurídicos;  Uma nova teoria da interpretação que, afastando-se de um procedimento mecanicista não seja, por outro lado, puramente discricionária, de forma que a interpretação constitucional possa ser alcançada a partir de um esquema plausível e racional de argumentação jurídica. Neoconstitucionalismo no contexto brasileiro No Brasil, há de se ter em vista que o pensamento neoconstitucional vem sendo cada vez mais aceito, sendo sua teorização cada vez mais observada não apenas pela doutrina, mas também pela jurisprudência. Até mesmo os cursos de graduação em Direito têm dado maior destaque às teorias neoconstitucionais no estudo das disciplinas de Direito Constitucional, exaltando a necessidade de uma leitura de todas as áreas do direito pela lente constitucional. Isso se reflete fortemente no papel exercido pelo Supremo Tribunal Federal, principalmente no contexto da analítica Carta de 1988. É dificil imaginar que exista matéria minimamente relevante que, em tese, não encontre sua fundamentação na Constituição. Até mesmo porque, a plasticidade e elasticidade inerentes aos princípios acaba por extender os limites semânticos da Carta, de maneira a atingir uma enorme gama de possibilidades fáticas.
  • 24. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 23 Nessa direção, é normal que ocorram divergências entre os poderes Legislativo e Judiciário, mais precisamente o STF, já que o poder de legislar do Congresso Nacional é mitigado pelo poder de controlar a constitucionalidade dos atos produzidos, que em última instância é da Corte Maior. Esse fenômeno exaltado por uns, criticados por outros, vem recebendo a alcunha de “judicialização da política”, já que a atividade política é fortemente controlada pela tecnicidade jurídica. Todavia, concomitantemente, observam-se críticas que apontam para o lado inverso, ou seja, o fenômeno da “politização do Judiciário”, já que a abertura semântica das normas parece oferecer um espaço exacerbado de escolha aos magistrados. Trata-se, porém, de uma questão de busca pela legitimidade da produção normativa. Afinal, quem faz a norma: quem define seu texto ou quem interpreta seu sentido? A ocupação de determinados espaços no processo de elaboração da norma, que no direito brasileiro tradicionalmente foi dado ao Poder Legislativo, não o é em tradições de common law, nas quais a confiança no juiz é maior do que a confiança no político. Essa é uma questão sensível e será o tema de nossa próxima aula. Por isso não cabe adiantarmo-nos. De toda forma, a uma possível crítica de judicialização da política e deslocamento do poder (com repercussões de um possível déficit democrático), o próprio sistema antecipa-se e procura mitigar introduzindo “novos” institutos como a súmula vinculante (no âmbito da aproximação do sistema brasileiro ao sistema de common law) e o amicus curiae que juntamente com as audiências públicas reforçam a ideia de busca por uma racionalidade jurídico/constitucional que satisfaça à ampliação e o aperfeiçoamento do regime democrático.
  • 25. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 24 Atividade proposta Leia a reportagem, da Veja, sobre a prisão de envolvidos no esquema do mensalão, a seguir: Marco Maia não descarta dar abrigo para impedir prisão de mensaleiros Depois de sucessivas declarações sugerindo que a Câmara deveria descumprir a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de cassar os mandatos de deputados mensaleiros condenados, o petista Marco Maia (RS) foi além nesta quinta-feira e não descartou abrir os portões da Casa para impedir a prisão dos parlamentares. Como a Polícia Federal não tem autorização para entrar no Congresso, os três deputados condenados - Valdemar Costa Neto (PR-SP), João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT) - ficariam asilados no local. A possibilidade foi aventada durante perguntas de jornalistas na entrevista concedida pelo presidente da Câmara nesta quarta. O petista afirmou que a prisão dos parlamentares, na sua opinião, seria inconstitucional. "Uma das coisas que a Constituição previu de forma sábia é que nenhum parlamentar pode ser preso a não ser em flagrante delito ou depois de condenação transitada em julgado, o que significa que a Constituição é muito clara em relação à impossibilidade da prisão de parlamentares. Nós temos que aguardar os acontecimentos para ver qual o impacto e o que isto vai significar do ponto de vista do posicionamento que o Parlamento e a Câmara dos Deputados irão tomar em relação a essa situação", disse. A prisão imediata dos mensaleiros será decidida nesta sexta-feira pelo presidente do STF, Joaquim Barbosa, em resposta ao pedido feito pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. "É uma suposição tão vaga que nem acredito que isso possa acontecer. (E se acontecer), aí teremos que pensar no que fazer", afirmou Marco Maia.
  • 26. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 25 Maia disse ainda que "se não houver decisão definitiva até dia 1º de fevereiro sobre a prisão dos condenados, o deputado José Genoíno (PT) terá direito de reassumir seu mandato". "À Casa caberá apenas cumprir a Constituição", disse. O presidente da Câmara também rebateu a afirmação do decano do STF, ministro Celso de Mello, que criticou a resistência do petista em cumprir a determinação da corte para cassar os mandatos dos mensaleiros. "Não é razoável e eu nem acredito que nenhum ministro teria a vontade ou a condição de tentar intimidar o presidente da Câmara ou o próprio Parlamento com qualquer tipo de ameaça. Até mesmo, porque a decisão sobre quem vira ministro do STF é do Parlamento. É o Senado que toma essa decisão. Até porque quem cassa ministro do STF é o Parlamento", disse. Fonte: <http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/marco-maia-nao-descarta-dar-abrigo-para- impedir-prisao-de-mensaleiros>. Agora, analise se há no fato político relatado alguma das características observáveis em sistemas jurídicos que têm por linha teórico-filosófica o neoconstitucionalismo. Chave de resposta: A ideia, nesse sentido, é analisar uma das possíveis e mais importantes repercussões das teorizações do neoconstitucionalismo, ou seja, o acirramento da disputa de poder entre o Poder Judiciário (que vê aumentar sua esfera de poder) e o Poder Legislativo (que entende esse acréscimo de poder do Judiciário como invasão ilegítima às suas naturais prerrogativas).
  • 27. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 26 Judicialismo: Detrimento de uma linha mais legalista, relacionada à teoria da soberania popular. Aprenda Mais Material complementar Para saber mais sobre Neoconstitucionalismo, leia o artigo, disponível em nossa biblioteca virtual, que traz um interessante texto sobre o tema do ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Roberto Barroso. Referências ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. ALEXY, Robert. Los derechos fundamentales en el Estado constitucional. In: Neoconstitucionalismo(s). (Editor Miguel Carbonell). Madri: Trotta, 2003. ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. São Paulo: Landy, 2001. BARBERIS, Mauro. El neoconstitucionalismo. Third Theory of Law. In: Neoconstitucionalismo, derecho y derechos. (Ed. POZZOLO, Suzanna). Lima: Palestra, 2011. BARBERIS, Mauro. Breve storia della filosofia del diritto. Bologna: Mulino, 2004. CARBONELL, Miguel. El neoconstitucionalismo: significado y niveles de analisis. In: El canon neoconstitucional. Madri: Trotta, 2010.
  • 28. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 27 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo:Martins Fontes, 1998. DWORKIN, Ronald. O império do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999. MAZZAREZE. T. Neoconstituzionalismo e tutela (sovra) nazionale dei diritti fondamentali. Torino Giapichelli, 2002. POZZOLO, Suzanna. Notas al margen para uma historia del neoconstitucionalismo. In: Neoconstitucionalismo, derecho y derechos. (Ed. POZZOLO, Suzanna). Lima: Palestra, 2011. PULIDO, Carlos Bernal. El neoconstitucionalismo y la normatividad del derecho. Bogotà: Universidad Externado de Colombia, 2009. SANCHÍS, Luís Prieto. Neoconstitucionalismo y ponderación judicial. In: Neoconstitucionalismo(s). (Editor Miguel Carbonell). Madri: Trotta, 2003. SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional. Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2013. SOBREVIVILLA, David. La filosofia del derecho alemana actual deorientación racionalista. Estudios sobre R. Alexy, K.Günther, J. Habermas y O.Höffe. Cidade do México: Fontamara, 2008. STRECK, Lenio Luiz. Reflexión hermenêutica sobre la relación “neoconstitucionalismo-positivismo jurídico”. In: Neoconstitucionalismo, derecho y derechos. (Ed. POZZOLO, Suzanna). Lima: Palestra, 2011. STRECK, Lenio Luiz. Hermeneutica e applicatio jurídica: a concreta realização normativa do direito como superação da interpretação jurídico- metafísico-objetificante. Coimbra: Coimbra, [s/d].
  • 29. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 28 Exercícios de fixação Questão 1 São características marcantes no pós-positivismo: I. A compreensão de que a validade jurídica da norma se define exclusivamente pelo respeito ao correto procedimento de produção normativa. II. A existência de hard cases como situações fáticas complexas, pendentes de intervenção pelo julgador, que constrói a regra de solução com base na racionalidade jurídica, em razão da ausência de previsão explícita no ordenamento legal. III. O importante papel desenvolvido pelos princípios jurídicos, como espécie normativa. IV. Completa rejeição à ideia de valores no âmbito do direito. a) I e II b) Apenas II c) III e IV d) I e IV Questão 2 Leia as frases e assinale a alternativa na qual há uma opção que contenha duas assertivas incorretas para uma visão pós-positivista do direito: I. Busca pela superação teórica das escolas juspositivista e jusnaturalista. II. A ideia de que o pós-positivismo é apenas um aperfeiçoamento do positivismo jurídico, mantendo, porém, suas linhas-mestras. III. Mitigação da dicotomia descrição/prescrição. IV. O reconhecimento de que direito e moral jamais se encontram. a) I e II
  • 30. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 29 b) I e III c) II e IV d) I e IV Questão 3 Leia as assertivas abaixo e marque a opção que corretamente exprime a correção, ou não, das duas afirmações, a partir de uma visão pós-positivista: I. Os princípios jurídicos ganham grande importância, principalmente na solução dos hard cases. II. As regras jurídicas, segundo os pós-positivistas, não são mais capazes de resolver os problemas na contemporaneidade, devendo ser o seu uso abdicado pelo direito. a) A primeira assertiva está correta e a segunda incorreta. b) A primeira assertiva está incorreta e a segunda correta. c) As duas assertivas estão corretas. d) As duas assertivas estão erradas. Questão 4 Leia as assertivas abaixo e marque a opção que corretamente exprime a correção, ou não, das duas afirmações, a partir de uma visão pós-positivista: I. O pós-positivismo representa um reforço tanto para as posições jusnaturalistas quanto para as positivistas. II. O pós-positivismo, por intermédio de seus teóricos, apresenta-se como uma teoria que surge a partir da necessidade de se produzir soluções complexas para um mundo cada vez mais complexo. a) A primeira assertiva está correta e a segunda incorreta.
  • 31. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 30 b) A primeira assertiva está incorreta e a segunda correta. c) As duas assertivas estão corretas. d) As duas assertivas estão erradas. Questão 5 Analise as assertivas abaixo: I. O neoconstitucionalismo é uma vertente jurídico-filosófica de cariz pós- positivista, havendo entre as propostas uma relação interna. II. Embora a similitude dos termos possa transparecer uma aproximação conceitual, o neoconstitucionalismo não guarda absolutamente nenhum ponto de contato com o fenômeno constitucionalista surgido no século XVIII e desenvolvido no decorrer do século seguinte. Estão corretas: a) A primeira assertiva está correta e a segunda incorreta. b) A primeira assertiva está incorreta e a segunda correta. c) As duas assertivas estão corretas. d) As duas assertivas estão erradas. Questão 6 O Neoconstitucionalismo vem se firmando como uma teoria cada vez mais forte no Brasil. Abaixo, apresentamos duas assertivas. Após lê-las, marque a alternativa que melhor define a correção ou incorreção das mesmas. I. Caracteriza-se por defender, sob uma perspectiva teórica, o governo da vontade das maiorias representada pela lei. II. Assumindo uma posição pós-positivista, para o neoconstitucionalismo direito e moral, deve possuir uma conexão interna.
  • 32. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 31 a) As duas assertivas estão corretas. b) As duas assertivas estão incorretas. c) A assertiva I está correta, mas a assertiva II está incorreta. d) A assertiva I está incorreta, mas a assertiva II está correta. Questão 7 São características da chamada Escola Neoconstitucionalista do Direito, as que seguem, exceto: a) O ideal político do governo do direito, em contraposição à ideia de governo dos homens. b) Defende o governo do direito por meio de uma constituição, de forma a limitar os poderes dos governantes. c) No Estado Constitucional, direito e moral seriam conexos por meio de uma Constituição. d) Defende que só a Constituição pode promover comandos à sociedade, sendo que as leis não estariam aptas a fazê-lo. Questão 8 São características essenciais do neoconstitucionalismo: I. A utilização exclusiva de normas-regra para a solução de casos concretos. II. A utilização de um método mecânico e positivista de interpretação. III. O uso da principiologia no processo interpretativo como método subsidiário. IV. A valorização dos princípios no processo interpretativo das normas jurídicas. Está(ão) correta(s): a) Somente a assertiva III
  • 33. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 32 b) Somente a assertiva IV c) As assertivas III e IV d) As assertivas II e IV e) As assertivas II, III e IV Questão 9 Como características típicas do neoconstitucionalismo, é possível apontar: I. Mais subsunção do que ponderação. II. Onipresença da constituição em todas as áreas do direito. III. Onipresença legislativa, com ampliação da representação democrática. IV. Pluralidade valorativa amplíssima e contraditória. a) I e II b) II e III c) III e IV d) II e IV Questão 10 O neoconstitucionalismo traz à tona o debate sobre a “judicialização da política”. Sobre essa questão, é correto afirmar: a) Já há a superação do problema, com a acomodação do Poder Judiciário em face do Poder Legislativo. b) Trata-se de um problema vivenciado na Europa, mas não observado no Brasil.
  • 34. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 33 c) É um problema que ocorre no Brasil, como decorrência natural da maior intervenção do Poder Judiciário em uma esfera de atuação tradicionalmente destinada ao Poder Legislativo. d) É o fenômeno que faz com que o Poder Legislativo mitigue o papel típico de julgar do poder Judiciário. Exercícios de fixação Questão 1 - B Justificativa: Estão erradas as assertivas I e III. É no positivismo jurídico (principalmente nos mais exacerbados) que se compreende que a validade jurídica da norma se define exclusivamente pelo respeito ao correto procedimento de produção normativa. O pós-positivismo, pelo contrário, entende que os valores auxiliam no julgamento sobre a validade normativa, principalmente pela via principiológica. Daí, que também a assertiva IV esteja completamente equivocada. Questão 2 - C Justificativa: A assertiva II está equivocada por considerar o pós-positivismo como uma continuidade do positivismo jurídico. Trata-se de uma outra concepção (3ª via) que entra em conflito com as teses positivistas, principalmente em um ponto essencial, ou seja, o reconhecimento de que direito e moral devem, sim, manter pontos de contato (o que invalida a possibilidade de considerarmos correta a assertiva IV). Questão 3 - A Justificativa: Apenas a assertiva B está equivocada, pois o pós-positivismo, embora enalteça e valorize o uso dos princípios na resolução de casos, não
  • 35. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 34 abdica do uso das regras jurídicas. Na verdade, entende que tanto os princípios como as regras são duas faces do mesmo fenômeno: o fenômeno normativo. Questão 4 - B Justificativa: Como terceira via, o pós-positivismo recusa tanto a rejeição da relação entre direito e moral do positivismo, mas também não concorda com os pressupostos jusnaturais de uma justiça apoiada em razões religiosas ou razões transcendentais. O pós-positivismo, nesse sentido, busca um tipo de racionalidade destranscendentalizada, mais fundada na capacidade discursiva que o entendimento dialógico propicia. Questão 5 - A Justificativa: A segunda assertiva está incorreta já que o neoconstitucionalismo guarda com o fenômeno constitucionalista dos séculos XVIII e XIX ao menos uma ideia fundamental: a de que a constituição é a norma central do sistema jurídico, e não as leis, que àquela estão submetidas. Questão 6 - D Justificativa: O neoconstitucionalismo separa-se das perspectivas legalistas por entender que a vontade das maiorias, expressa na lei, submete-se à vontade constitucional. Daí, por exemplo, extrair-se a possibilidade de existência do controle de constitucionalidade. Questão 7 - D Justificativa: O erro da assertiva D decorre do fato de que a existência de uma Constituição como norma maior não tem por consequência que os demais diplomas normativos sejam prescindíveis, principalmente as leis. Para que o sistema possa funcionar, é necessário todo um arcabouço formal. Neste sentido, a visão sistêmico-jurídica kelseniana está longe de ser superada. Questão 8 - B
  • 36. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 35 Justificativa: É característica, entre outras, do neoconstitucionalismo, a valorização do princípio como tipo normativo, assumindo este um lugar de destaque no processo de definição da norma concreta pelo judiciário bem como nos processos interpretativos. Por isso, embora as normas-regra tenham papel de grande importância, o papel de maior relevância (e não meramente subsidiário) é aquele exercido pela norma princípio. Na assertiva III, se em vez do termo “subsidiário” fosse usado o termo “complementar”, poderíamos considerá-la correta. Outra questão que vale a pena reforçar é que a principiologia não possui maior destaque nas concepções positivistas de direito. Questão 9 - D Justificativa: Com o destaque maior para as normas-princípio em relação às normas-regra, a ponderação ganha, igualmente, mais destaque que o processo de subsunção. Por outro lado, é observada a onipresença judiciária, com mitigação do espaço do legislador e, consequentemente, do Poder Legislativo, o mais democrático dos poderes, segundo a tradição. Questão 10 - C Justificativa: Acredita-se que as posições teóricas neoconstitucionais dão suporte à força crescente do Poder Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal (STF), que tomaria decisões que escapam de seu domínio, enquanto o Poder Legislativo enfraquece-se na medida em que suas competências legislativas estariam supostamente sendo usurpadas.
  • 37. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 36 Introdução À medida que a globalização se expande, cresce igualmente a necessidade de interação entre sistemas. Há muito tempo, discute-se a oposição antitética entre o sistema anglo-saxão da common law e o sistema continental, também chamado pelos common lawyers de sistema da civil law (ou sistema românico- germânico, como também denominamos entre nós). Essa virtual oposição teórica fazia parecer que estávamos diante de sistemas absolutamente antagônicos e opostos. Hoje, as posições que observam os dois sistemas a partir de uma summa divisio são cada vez mais raras. A percepção de aproximação dos dois sistemas fundamentais ocidentais trouxe à tona a necessidade de aprofundar, sob a perspectiva teórica, quais os motivos que nos levam a essa direção e qual a consequência dessa situação para o constitucionalismo. No Brasil, as influências entre sistemas jurídicos vão sendo observadas não apenas por essa aproximação entre common law e civil law, mas, também, pelos recentes estudos de fenômenos como o da transconstitucionalização e o da cross fertilization. Todos apontam para uma tendência de influências recíprocas entre sistemas jurídicos, principalmente a partir da ascensão do paradigma jusfilosófico neoconstitucional, conforme vimos na aula 1. Tratemos de enfrentar, então, a temática, fazendo as devidas conexões! Boa aula! Objetivos:
  • 38. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 37 1. Analisar as características das escolas jurídicas da common law e da civil law e suas formas de aproximação com os sistemas constitucionais ocidentais, o brasileiro em especial; 2. Estabelecer as características fundamentais da transconstitucionalização como fenômeno que conecta a constituição à uma visão necessariamente global, plural e interconectável entre sistemas.
  • 39. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 38 Conteúdo O mundo globalizado e a aproximação de sistemas Na aula anterior, você conheceu o neoconstitucionalismo. Nesta aula, aprofundaremos sobre o termo transconstitucionalidade. Vamos lá! O crescimento da globalização e da internacionalização tem evidentes consequências no mundo hodierno. Não era razoável considerar que o mundo jurídico escapasse a essa lógica. Dois fenômenos de aproximação entre as diversas ordens parecem ser objeto de maior estudo por parte dos estudiosos do direito, em particular dos constitucionalistas: a aproximação entre a common law e a civil law (sistemas há pouco considerados antagônicos entre si) e o crescente diálogo mantido entre as ordens constitucionais. O tema é vasto, e, neste momento, a pretensão é não somente apontar para as novas discussões surgidas no campo jurídico, mas, também, inspirar novos e enriquecedores debates. Começaremos pelo tema menos original, mas ainda pouco analisado (proximidade entre common law e civil law), para depois adentrarmos na temática que começa a ganhar maior fôlego no país, que é o da transconstitucionalidade (para alguns, interconstitucionalidade). O sistema jurídico brasileiro e a common law Como vimos, no fim dos anos 90, começam a ser disseminadas no Brasil, principalmente no âmbito acadêmico, as correntes teóricas de autores neoconstitucionalistas (classificação atualmente concedida por grande parte da doutrina). Ao defenderem a natureza normativa dos princípios, acabaram por incentivar uma revolução no processo de interpretação das normas jurídicas, incumbindo os juízes de tarefas de preenchimento de lacunas legais cada vez mais frequentes em um ambiente social cada vez mais complexo. A ausência de estudos mais aprofundados das linhas metodológicas utilizadas por esses autores provocou uma onda interpretacionista um tanto caótica, gerando um ambiente de grande insegurança jurídica. Concomitantemente, por
  • 40. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 39 seu lado, seguiam os tribunais brasileiros abarrotados de processos, que, com a mesma causa de pedir e com o mesmo pedido, tinham as mais díspares decisões, ainda em situações nas quais o Supremo Tribunal Federal já havia cristalizado posição em relação ao tema. Emenda Constitucional nº 45/2004 Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 45/2004, a qual acrescentou ao texto constitucional o Artigo 103-A, conferiu-se poderes ao Supremo Tribunal Federal para aprovar súmulas contendo eficácia vinculante (e não apenas persuasivas) sobre decisões futuras, acirrando, no âmbito do direito pátrio, a discussão sobre uma possível aproximação do sistema jurídico brasileiro – historicamente construído na tradição da civil law (germânico- romana) – com o sistema da common law (anglo-americano). Por outro lado, igualmente relacionado ao fenômeno de aproximação de sistemas em um mundo globalizado, vem sendo frequentemente observado nas sessões do STF, não apenas a menção a institutos típicos de sistemas jurídicos estrangeiros, mas também a construção de linhas de fundamentação de decisões que utilizam base jurisprudencial do direito alienígena ou, ao menos, em rationes decidendi estabelecidas por cortes estrangeiras. É a chamada racionalidade transversal entre sistemas jurídicos, fenômeno cada vez mais percebido e naturalizado. Transconstitucionalismo e a cross fertilization Sobre essas temáticas, surgem algumas questões que servem como guia para um maior aprofundamento sobre o tema. São elas: Procede tal afirmação de que existe uma aproximação do sistema brasileiro às características que tradicionalmente se julgavam típicas dos sistemas vinculados à common law? O instituto da súmula vinculante pode ser considerado uma consequência direta de tal aproximação?
  • 41. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 40 Existindo tal aproximação do nosso sistema com a common law, isto aperfeiçoaria o sistema jurídico brasileiro ou, ao contrário, criaria um antagonismo com sua linha tradicional? O que representam o transconstitucionalismo e a cross fertilization em um contexto de racionalidade transversal entre sistemas jurídicos? Para fins didáticos, entendemos que seja mais adequado iniciar nossa abordagem pelo estudo de aproximação entre a civil law e a common law, não apenas por ser um tema já apontado pelos estudiosos no Brasil (embora, sem aprofundar os fundamentos), mas, principalmente, por estar ele relacionado a uma temática analisada na aula anterior, o que facilita o caminho a ser percorrido. Logo após, partiremos para análise do transconstitucionalismo, fenômeno que só agora parece ser percebido pelos estudiosos e que vem ganhando destaque no universo jurídico-constitucional brasileiro. Aproximação da civil law e common law – algumas notas introdutórias Sob uma perspectiva teórica e para fins cognitivos, é possível estabelecer linhas que distinguem os modelos common law e civil law. O intuito aqui não é discutir todas as diferenças, mas focar naquelas que mais dados podem nos oferecer para responder às questões acima formuladas. Segundo os comparatistas, as características a seguir são pontos tradicionalmente tidos como de afastamento e distinção entre as duas grandes famílias. Se, por um lado, a civil law (que traduz ius civile do latim) descende do direito romano, o direito da common law deita raízes em uma tradição autóctone. Se, na civil law, há uma longa tradição de codificação e de lei (em seu sentido estrito) como fonte do direito – recusando-se a ideia de ser a jurisprudência (precedentes) como fonte autônoma do direito –, por outro lado, a tradição
  • 42. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 41 anglo-americana, mesmo quando se utiliza da codificação, como em vários Estados americanos (statutes), apresenta-a como consolidação jurisprudencial. Se, por um lado, na civil law, prevalece o pensamento abstrato-dedutivo, tipicamente logicista, por outro, na common law, prevalece um raciocínio mais concreto, ligado a uma tradição empiricista (e mesmo pragmática), própria da cultura anglo-saxã. Se, por um lado, para a maior parte dos autores, a civil law identifica como característica típica o primado do público sobre o privado, na common law, ao contrário, entende-se que há o primado da perspectiva privada sobre a pública. Se, por um lado, o tipo de racionalidade utilizada na civil law é predominantemente de tipo lógico, na common law, utiliza-se predominantemente aquela de natureza pragmática. Se, por um lado, o tipo de sistema de direito utilizado pela civil law é predominantemente legislado, não judicialista, o da common law é preponderantemente judicialista, de forma que, nos sistemas irmãos, os juízes tradicionalmente exercem papéis bastante diferenciados. Sistema jurídico brasileiro e o sistema de common law Mesmo reconhecendo a importância de todas perspectivas de análise acima apresentadas, parece-nos que o ponto cardeal da discussão para tratar de uma aproximação do sistema jurídico brasileiro com o sistema de common law se refere não necessariamente a todas as características citadas (embora se possa verificar também, em algumas delas, um certo movimento de aproximação por parte do sistema brasileiro com a common law), mas, principalmente, no que diz respeito à última das características mencionadas, ou seja, o papel desenvolvido pelos juízes e pela jurisprudência no processo de produção do direito.
  • 43. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 42 Essa posição baseia-se não apenas por ser a questão de maior relevância do problema, mas, principalmente, devido às repercussões que esse ângulo de análise tem suscitado atualmente no Brasil, a partir da ascensão das concepções jurídico-filosóficas neoconstitucionais no nosso país e em diversos sistemas jurídicos, como já falamos. Dessa forma, até campos do conhecimento estranhos ao direito já começam a perceber o fenômeno a ponto de entrarem nas discussões acerca de temas como ativismo judicial e judicialização da política. Civil Law Como se pode ver, é uma questão de natureza cultural. Em grande parte dos estados que adotam a civil law, antes da passagem de uma ordem tradicional para uma ordem pós-tradicional, mais precisamente antes da ascensão do Estado de Direito em substituição aos Estados Absolutistas, o Poder Judiciário sempre foi exercido por uma elite nobre extremamente ligada por fortes laços de confiança e lealdade aos reis. Aliás, não há de se pensar em um contexto como esse em separação de poderes, já que esta é uma formulação típica do Estado de Direito e só surge no contexto da afirmação deste e como uma de suas principais características. Por outro lado, cabe lembrar que, embora a monarquia inglesa possa ser considerada, até os dias de hoje, uma instituição política bastante sólida, não devemos esquecer que a própria ideia de divisão de poderes e consequente mitigação dos poderes reais sempre teve na Inglaterra um terreno fértil. Desde a Magna Charta, o exercício do poder político pelo monarca inglês foi sendo paulatinamente mitigado, sendo ele exercido, pouco a pouco, de forma cada vez mais descentralizada se compararmos com seus congêneres continentais. Isso explica a razão pela qual o fenômeno da desconfiança exacerbada na figura dos juízes, ocorrida nos países de tradição da civil law,
  • 44. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 43 não encontrou na Inglaterra um ambiente propício para se desenvolver, sendo que esta pôde, assim, exportar às suas colônias seu modelo de common law. Nessa perspectiva e se essas considerações de ordem cultural estão corretas como cremos estar, é possível que tenhamos, inclusive, uma possível releitura acerca da própria ideia de legitimidade para o exercício do poder de produzir normas no Brasil. É mesmo possível enxergar que esteja em curso um processo que estabelece importantes alterações de rumo no tradicional sistema desenvolvido no Brasil Por isso, cabe ressaltar que o fenômeno brasileiro não é algo isolado. Esses supostos distanciamentos teóricos e práticos vêm cedendo espaço a cada dia, perdendo força no interior das ordens jurídicas de tradição ocidental. Por isso, essa tendência de aproximação observada entre as duas grandes famílias do Direito repercute de forma indiscutível na organização do sistema jurídico brasileiro. Fatores condicionantes na organização dos fatores jurídicos brasileiro Dentro do que foi dito anteriormente, percebe-se que dois motivos nascidos do âmbito da dinâmica de reconfiguração da ordem mundial aparecem de forma mais evidente (tal qual fatores condicionantes externos para a citada aproximação, mas que se projetam de forma inequívoca também no Brasil). São eles:  Uma primeira motivação a ser apontada é a globalização. As diferentes matrizes teóricas vivenciadas pelas duas experiências sistêmicas acabaram por se reduzir em grande escala quando comparadas a matrizes de outras famílias do direito, principalmente se levarmos em conta temas como direitos fundamentais e humanos. Nesse sentido, diferenças epistêmicas, que antes pareciam insuperáveis, já podem ser
  • 45. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 44 analisadas, como de raízes comuns, sendo que as aproximações já são claramente observáveis.  Em um segundo plano, com especial relevância para uma tradição jurídico-filosófica ocidental como a brasileira, não há como imunizar-se da influência de importantes e grandiosos esforços realizados em uma Europa unificada, que agora procura encontrar as bases jurídicas nas quais se apoiarão as unidades econômica e política. Nesse sentido, é imperativo o esforço para encontrar os pontos comuns dessas duas tradições (civil e common law). Atenção Aliás, a União Europeia, unificada normativamente em várias áreas, é um excelente laboratório para demonstrar essa aproximação. Há bem pouco tempo, consideravam-se modelos jurídico-constitucionais específicos, com características de evidente singularidade, por exemplo, pós-modelos alemão, francês e inglês. Hoje, por força do processo de unificação, os países da União Europeia mantêm, entre si, diálogo permanente e, mais do que isso, bases e fontes comuns para formação de suas inteligências. A aproximação do sistema jurídico brasileiro ao sistema de common law Pelo o que já vimos até aqui, parece claro que a resposta aparentemente adequada para responder a primeira das questões apresentadas é da existência inequívoca de aproximação do sistema brasileiro às características que tradicionalmente se julgavam típicas dos sistemas jurídicos vinculados à common law. Esclarecemos que não se trata de uma mera referência ao reconhecimento de que as súmulas vinculantes acabaram
  • 46. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 45 por institucionalizar o precedente como fonte primária do direito, sob a base da regra do stare decisis. Para que você possa entender melhor, Stare decisis é uma expressão em latim que se traduz como "ficar com as coisas decididas". Esta frase vem de uma locução mais extensa, "stare decisis et non quieta movere", utilizada no direito para se referir à doutrina segundo a qual as decisões de um órgão judicial criam precedente (jurisprudência) e vinculam as que serão emitidas no futuro. É doutrina típica do common law e não tão forte em sistemas de direito continental, onde a jurisprudência tende a ser meramente persuasiva. De toda forma, a maioria dos sistemas, no entanto, reconhecem que a jurisprudência deve ligar, de alguma forma, os juízes, evitando a total independência de suas linhas de decisão e que as suas decisões sejam totalmente imprevisíveis ou contraditórias entre si. A doutrina fala do stare decisis nas perspectivas horizontal e vertical. O stare decisis horizontal corresponde à modalidade em que os tribunais e outros órgãos do Poder Judiciário devem respeitar os seus próprios precedentes, internamente, sendo vinculante, portanto, para o próprio órgão, que não pode mais rediscutir a matéria, o que também é denominado de binding efect (efeito vinculante). No que se refere ao stare decisis vertical, significa que as decisões vinculam externamente, também a todos, sendo obrigatória para os demais órgãos do Poder Judiciário, para a Administração Pública Direta e Indireta, e demais poderes. Mais do que isso, é necessário ir adiante. A recepção pelo sistema brasileiro do precedente vinculante como fonte primária do direito pátrio é apenas uma das consequências de uma alteração paradigmática no sistema jurídico brasileiro, a partir da Constituição de 1988. Assim, é possível afirmar que o constituinte
  • 47. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 46 originário, independentemente das inovações de ordem conteudísticas que, sob várias perspectivas, possibilitou a superação dos modelos anteriores, efetivamente alargou o papel a ser desenvolvido pelos juízes. Sistema de common law De acordo com o que foi afirmado anteriormente, se pararmos para pensar que o sistema de common law é judicialista e que a decisão judicial é a principal fonte de sua organização judiciária, não parece ser um raciocínio exagerado afirmar que o sistema de civil law, que, em razão de determinados processos históricos, sempre mostrou desconfiança das reais intenções dos juízes no processo de distribuição da justiça (lembrar da Escola da Exegese, que entendia que o juiz era um mero aplicador de normas jurídicas) ao conceder maiores espaços de atuação ao juiz, tende a flexibilizar seus dogmas. Nesse sentido, o constituinte derivado (e mesmo o legislador ordinário), ciente dos espaços semânticos deixados pela Constituição e do vácuo político deixado pelos poderes representativos, vem trabalhando pela ampliação não apenas do papel de legislador negativo exercido pelo juiz (papel típico), mas, principalmente e, nesse caso, de forma a mais se aproximar das características do juiz de common law, do de legislador positivo (este mais propenso a críticas e reflexões). Assim, partindo de uma premissa teórica largamente difundida, que afirma que, na civil law, o juiz tão somente deve aplicar a legislação (principalmente aquela produzida pelo Parlamento), a assunção dessas ideias acima apresentadas parecem colocar em questão este “dogma”, aproximando-se nosso sistema, ao menos em alguns aspectos importantes, aos preceitos da common law. Aliás, esse é um ponto que deve ser explorado de forma mais aguda pelos estudiosos comparatistas, principalmente no que diz respeito à utilização, também, de uma racionalidade pragmática, calculadora e consequencialista em
  • 48. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 47 oposição a um modelo em que há predominância de uma racionalidade lógico- matemática. Partindo para a segunda questão deste primeiro ponto, já nos adiantamos no sentido de não nos parecer que tenha sido a Súmula Vinculante anteriormente referida, que, ao adentrar no sistema jurídico sob o argumento da necessidade de conceder maior segurança jurídica e prover celeridade à tutela jurisdicional, e que tem como inspiração a regra do stare decisis, o ponto inicial desse processo. É, sem dúvida, um dos pontos mais evidentes e contundentes de aproximação. Todavia, reiterando o anteriormente exposto, a afirmação do Poder Judiciário e dos juízes no Brasil é produto de muitos fatores que acabam por colaborar com essa mudança paradigmática. Conheça agora esses fatores, relacionados às regras de stare decisis: I) Incapacidade dos poderes legislativos parlamentares de preverem todas as hipóteses em uma sociedade hipercomplexa (fator comum ao mundo globalizado); II) Baixo grau de confiabilidade dos parlamentares brasileiros perante os cidadãos, sempre incrementado pelas contínuas denúncias de corrupção; III) Abertura semântica propiciada pela Constituição de 1988, que, em um quadro doutrinário que privilegia a hegemonia de teorias neoconstitucionalistas e de hermenêutica jurídica – e que, por esta razão, situa-se em um quadro teórico de substancialização do conceito de Estado Democrático de Direito –, acabam por propiciar um intenso trabalho de interpretação normativa pelo Judiciário, com o propósito de maior alinhamento do direito às especificidades do caso concreto;
  • 49. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 48 IV) Grande receptividade de linhas teóricas denominadas neoconstitucionalistas, principalmente de autores com Ronald Dworkin (tradição anglo-americana), Robert Alexy (tradição românico-germânica), Atienza (tradição civil law espanhola) e Carbonell (civil law mexicana), que acabam por conceder sustentação teórica a uma perspectiva pós-positivista e incentivando o juiz a exercer o papel de intérprete do sistema; V) Surgimento de institutos jurídicos estranhos às constituições anteriores a 1988, que, aos poucos, vão sendo criados e que ampliam, em larga escala, o papel de legislador (negativo e positivo) dos juízes, tais como, a título exemplificativo, apresentamos abaixo: a) Ampliação do quadro instrumental para o controle de constitucionalidade – com ADI por Omissão, ADC e, principalmente, ADPF (Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental); b) Instrumentos como “interpretação conforme a Constituição”, “declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto” e “modulação temporal dos efeitos da constitucionalidade” (que permitem que normas inconstitucionais tenham seus efeitos reconhecidos); c) O mandado de injunção, em sua posição concretista; d) A súmula vinculante, instituto que introduziu a regra do stare decisis no Brasil, mas que é parte do processo e não o seu deflagrador. Dito isso, seguimos para o enfrentamento da última questão formulada, ou seja, se a aproximação a uma das principais características do sistema anglo- americano aperfeiçoaria ou não o sistema jurídico brasileiro. A tendência deste trabalho é filiar-se àqueles que escolhem a segunda opção, porém, é necessário ter em conta que essa aproximação deve ocorrer em uma justa medida, pois somente assim terá o condão de trazer benefícios de várias ordens, como
  • 50. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 49 prover maior capacidade de obtenção de justiça nas decisões, conceder maior racionalidade ao sistema, proporcionar maior efetividade dos direitos, colmatar os vazios legais, preenchendo, assim, as lacunas da lei (já que direito é integridade), etc. Súmula vinculante No que se refere à súmula vinculante, por exemplo, não se pode esquecer que se os países de tradição na common law lutaram para construir, no decorrer de suas histórias, estruturas e mecanismos de controle a possíveis desequilíbrios no exercício do poder. Há, portanto, a necessidade de adaptar aos moldes do nosso sistema institutos como o distinguished e o overruling, a fim de que haja a cristalização de uma perspectiva. No Brasil, houve a criação de institutos que parecem poder substituir os acima citados distinguished e overruling. No caso de overruling, podemos pensar em sugerir a revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante. O problema aqui é a competência para solicitar, sendo que não poderá ser o cidadão/jurisdicionado, pois há indicação legal dos agentes legitimados.
  • 51. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 50 Atenção Lei nº 11.417/2006 Artigo 3º – São legitimados a propor a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante: I – o Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – o Procurador-Geral da República; V – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VI – o Defensor Público-Geral da União; VII – partido político com representação no Congresso Nacional; VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; IX – a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; X – o Governador de Estado ou do Distrito Federal; XI – os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares. Já no caso do distinguished, a jurisprudência não definiu se seria o caso de uso do instituto da reclamação (utilizado fundamentalmente em casos de não aplicação) e, mais ainda, não confirmado se há possibilidade de utilização deste em caso de aplicação inoportuna. De toda sorte, embora tenhamos em vista o que estabelece o Artigo 518, § 1º, do Código de Processo Civil (que trata da Súmula Impeditiva de Recursos), há quem entenda existirem algumas alternativas para afastar este requisito, de forma a se admitir o recurso nos casos em que se possa mostrar razoáveis indícios de inaplicabilidade da súmula ao caso concreto, de demonstrar a superação do entendimento sumular ou mesmo, no limite, apresentar argumentos inovadores para aquela discussão.
  • 52. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 51 Atenção O Artigo 518, § 1º, do CPC dispõe que o juiz não receberá a apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. Poder Judiciário brasileiro Dando continuidade ao conteúdo, vamos conhecer um pouco mais do poder judiciário. Atenção Ainda dentro desse contexto, outro problema em relação a essa crescente posição proativa do Poder Judiciário brasileiro é aquele que diz respeito a um possível déficit democrático. Como se sabe, no decorrer de sua história, o Brasil não foi um país que tenha logrado construir uma tradição democrática que lhe permita abrir mão do forte simbolismo que representa a ideia de legitimidade das normas criadas por representantes votados pelo povo. De toda forma, deve-se ter em vista que a legitimidade exige outros requisitos além daqueles tradicionalmente postos, tal como o reconhecimento pelos destinatários das normas (titular da soberania popular) de que seus representantes exercem seu papel de forma adequada. Infelizmente essa não tem sido uma realidade percebida pela população brasileira. Porém, como bem alerta Boaventura de Souza Santos, há de se ter cuidado com um tipo de ativismo judicial conservador, que consiste em neutralizar, por
  • 53. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 52 via judicial, muito dos avanços democráticos que foram conquistados ao longo de duas últimas décadas. No Brasil, não foi pensado modelos democráticos que ausentem as escolhas pelos cidadãos no processo de exercício e organização do poder. Nesse sentido, uma aproximação com a common law, particularmente no que se refere a essa confiança no Judiciário como fonte de normas jurídicas, deve ter como limite o modelo de democracia que não suprima o forte simbolismo que é aquele que, estabelecido por Rousseau no Século XVVIII e hoje é apregoado fortemente pelo procedimentalismo habermasiano, defende que as leis devem ser produzidas pelos seus próprios destinatários, sob pena de se colocar em risco a própria legitimidade do sistema. De toda maneira, e isso deve ficar claro, somos ainda um sistema de civil law, aonde predominam, de forma marcante, as técnicas de solução deste sistema. O que existe é um movimento de aproximação, antes impensável, mas que a ocorrência dos fatores acima evidenciados foram, pouco a pouco, tornando possível. Se, por um lado, a aproximação entre as duas tradições irmãs é irreversível, por outro, ela oferece oportunidades grandiosas de aperfeiçoamento dos sistemas a partir de um diálogo permanente, cooperando com um equilíbrio necessário em técnicas que cada uma das tradições melhor desenvolver no decorrer da história. Somente assim a Democracia Constitucional, que se pretende construir no Brasil e que jamais teve tantas oportunidades de se desenvolver, amadurecerá. O transconstitucionalismo e as fertilizações cruzadas entre sistemas Transconstitucionalismo, o que será?
  • 54. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 53 É a denominação dada a um fenômeno que reconhece a existência de problemas de índole constitucional que, em tempos de aprofundamento do fenômeno da globalização, faz com que o conceito de soberania estatal seja repensado (superando o antigo conceito vestefaliano), legitimando as influências inevitavelmente recíprocas entre os diversos sistemas jurídico- constitucionais. Ou seja... A ideia é de que, em tempos de sociedades de risco, extremamente complexas, os sistemas jurídicos inevitavelmente devem dialogar entre si, buscando soluções e racionalidades que, encontradas em sistemas diversos, tendem a aperfeiçoá-los. Se o constitucionalismo está relacionado à limitação do poder estatal, à tutela dos direitos fundamentais e à ideia de supremacia da Constituição em face da força da Lei Maior, o transconstitucionalismo aparece como uma ponte de diálogo entre o direito internacional e o direito constitucional interno. Esse fenômeno se explicita no âmbito de um profundo processo de transformação por que passam antigos dogmas do direito internacional público ao, cada vez mais, abdicarem do princípio do domestic affair (que defende a tese da não intromissão, da não intercessão) para adotar, de forma crescente, o princípio do international concern, que, em linhas gerais, procura robustecer a efetividade dos direitos e liberdades fundamentais de todos os Estados partícipes de um sistema mínimo de proteção internacional dos direitos humanos. Nessa linha, em círculos acadêmicos cada vez mais ampliados, o fenômeno da transconstitucionalidade vem sendo analisado de forma mais aprofundada no Brasil pelo Prof. Marcelo Neves. Porém, a questão da terminologia vem acompanhada de polêmicas. Embora receba também as denominações de constitucionalismo de níveis múltiplos, ou constitucionalismo multiplex, o
  • 55. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 54 problema está centrado na terminologia utilizada por determinados autores, como os portugueses Lucas Pires, Gomes Canotilho e Paulo Rangel, que preferem a denominação “interconstitucionalidade”. Transconstitucionalismo e interconstitucionalidade Se, por um lado, Marcelo Neves entende que o emprego da locução “inter” transmite a ideia de que a transconstitucionalidade não se limita a analisar as aproximações entre ordens jurídicas homólogas e iguais, correlacionadas apenas às visões eurocêntricas, mas busca enxergar aproximação entre ordens díspares, há quem entenda que, quando a temática foi pensada sob a perspectiva de “interconstitucionalidade”, ela já possuía todo um arsenal teórico para tratar com temas de pluralidade intensa das sociedades hodiernas, também típicas no quadro europeu. Na verdade, o objetivo a que visam os estudiosos da temática é não apenas analisar o fenômeno, mas, a partir do quadro estabelecido, elaborar teorizações que reconstruam essa transconstitucionalidade (as novas realidades jurídico- constitucionais exigem um novo instrumental teórico) por meio da utilização de uma racionalidade (transversal) que atravesse as racionalidades específicas de cada ordem jurídica e que possa inter-relacionar suas inteligências específicas.
  • 56. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 55 Atenção O sistema jurídico brasileiro, por intermédio da cláusula aberta estabelecida pelos §§ 2º e 3º do Artigo 5º da Constituição Brasileira de 1988, parece já ter nascido com a propensão à abertura hermenêutica e aos diálogos inter-sistêmicos. Ao utilizarmo-nos da aula anterior, buscamos um paralelo (possível) para concluir que o transconstitucionalismo pode, ao menos in tesi, servir como um novo aparato instrumental neoconstitucional para o controle das decisões judiciais. Isso porque os limites jurídicos não se encontrariam somente na inteligência proporcionada pelo sistema interno, mas em uma razão constitucional aberta para um efetivo diálogo entre fontes advindas de sistemas diversos. As formas de transconstitucionalidade entre ordens jurídicas Conheça agora as formas de transconstitucionalidade existentes entre ordens jurídicas: Entre ordens jurídicas estatais qualitativas Talvez, a mais óbvia de todas as formas de transconstitucionalidade seja aquela estabelecida entre ordens jurídicas estatais. Trata-se principalmente de referências recíprocas a decisões entre tribunais de diferentes países. Há uma crescente utilização da técnica denominada por alguns estudiosos como cross fertilization e, embora seja cada vez mais comum que as principais Cortes se citem mutuamente, é ainda mais comezinho que, em países juridicamente periféricos (como é o nosso caso), referenciem dispositivos, jurisprudências e doutrinas constitucionais estrangeiras, não apenas na chamada obter dictum, mas, também, na ratio decidendi.
  • 57. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 56 No caso brasileiro, embora sejam mais comuns as referências às decisões e argumentações estabelecidas pelas cortes americana e alemã, no caso específico do julgamento histórico do HC nº 82.424/RS, de 17/11/2003, no STF, a questão do racismo foi amplamente discutida, menos a partir da jurisprudência nacional e internacional, mas muito mais pelos precedentes, legislação e dispositivos constitucionais estrangeiros. Entre ordens jurídicas estatais e ordens locais extraestatais Esse talvez seja um dos casos mais complexos e gerador das maiores polêmicas no âmbito do transconstitucionalismo. Isso porque, no caso em análise, se está dentro de um espaço territorial que, em princípio, deveria estar vigendo a ordem jurídica estatal “oficial” (e, neste ponto, é que o transconstitucionalismo aponta para a fragilização de uma perspectiva territorial de aplicação de uma dada ordem). A América Latina é rica em problemas jurídico-constitucionais dessa natureza, e o Brasil, com sua riqueza cultural indígena, apresenta problemas de alto grau de complexidade. Para entender melhor sobre o âmbito do transconstitucionalismo, temos o exemplo, que é mais contundente nessa perspectiva de análise. Ele se refere a tribos que, em algumas circunstâncias específicas, praticam o infanticídio, suscitando um acalorado debate entre grupos que se polarizam entre o relativismo cultural e a universalização dos Direitos Humanos, mais especificamente, neste caso, o direito à vida. Deve-se, porém, atentar que o infanticídio é praticado fundado em práticas ancestrais que afastam qualquer juízo de “indecência” ou “maldade”, mas ligado a aspectos de sobrevivência em uma lógica comunitária, profundamente diversa da nossa, mas tão digna quanto. Nesse caso, é possível observar que a aplicação de uma ordem única, de forma inflexível, pode determinar violação grave à autonomia coletiva de uma comunidade. Trata-se de confronto de perspectivas fundadas em visões
  • 58. TÓPICOS DE DIREITO CONSTITUCIONAL 57 culturais tão diversas que a imposição da regra estatal implica na morte de uma cultura que, embora diferente (às vezes, bastante diversa!), estabelece uma lógica de solução de problemas sofisticada e complexa. Por isso, já existem posições que entendem que o Estado Constitucional exige uma postura de self-restraint à sua pretensão de concretizar suas normas específicas quando estas entrem em colisão com normas de comunidades nativas fundadas em bases culturais essencialmente diversas daquela em que está alicerçada a ordem constitucional dominante. Entre direito estatal e direito internacional público A relação entre o direito estatal e as normas de direito constitucional é cada vez mais constante, seja pela presença de cláusulas constitucionais nas próprias constituições estatais (que, assim, acabam por recepcionar o direito internacional para sua própria ordem jurídica), mas, também, pela crescente incorporação das questões constitucionais pelos tribunais internacionais que arrogam para si a pretensão de decidir, com caráter vinculatório, situações que envolvem agentes e cidadãos dos Estados nacionais. No caso brasileiro, o Brasil tem sido réu em muitas ações movidas na Corte Interamericana de Direitos Humanos, sendo que algumas interpretações de dispositivos constitucionais pelo STF vêm levando em conta, cada vez mais, não apenas os dispositivos constantes na Convenção Americana de Direitos Humanos, mas a própria interpretação que a Corte Interamericana faz deste documento. É a busca por um diálogo que tende a se intensificar. No caso brasileiro, o Brasil tem sido réu em muitas ações movidas na Corte Interamericana de Direitos Humanos, sendo que algumas interpretações de dispositivos constitucionais pelo STF vêm levando em conta, cada vez mais, não apenas os dispositivos constantes na Convenção Americana de Direitos Humanos, mas a própria interpretação que a Corte Interamericana faz deste documento. É a busca por um diálogo que tende a se intensificar.