O documento descreve como o Guaíba, apesar de ser considerado um lago, teve um papel fundamental no desenvolvimento de Porto Alegre ao longo dos séculos, servindo como via de transporte e abastecimento. A proximidade com o Guaíba atraiu os primeiros povoadores e possibilitou o estabelecimento do porto e de atividades comerciais que impulsionaram o crescimento da cidade. Apesar de também ter trazido enchentes e problemas de saúde pública, o Guaíba esteve no cerne da história
1. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Janete da Rocha Machado
Historiadora e professora de História
GUAÍBA:
UM FALSO RIO CONTA A HISTÓRIA DA CIDADE
2. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
“Heródoto que me perdoe o plágio, mas Porto Alegre é uma dádiva do
Guaíba, tanto quanto o Egito é um presente do Nilo. O povo o chama de rio Guaíba, e
ninguém anulará esse registro errado, mas os geógrafos concordam em que ele seja um
lago. Graças a seu falso rio, a cidade estabeleceu suas ligações com o mundo, gerando
marujos e mercadores, construindo barcos, importando e exportando. Em função dele e
de sua bacia, Porto Alegre tornou-se entreposto de uma vasta região agrícola e
industrial”.
FRANCO, Sérgio da Costa. A velha Porto Alegre: crônicas e ensaios. Porto Alegre, 2008
3. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Porto Alegre: século XVIII
Fonte: Herrmann Wendroth. Aquarela.
4. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
CONDICIONANTE PARA O DESENVOLVIMENTO
Fatores geográficos sempre influíram na formação das cidades. Sob este aspecto, a
proximidade da água, seja por meio dos rios, oceanos ou lagos, se configurou, ao
longo dos tempos, em um condicionante para o desenvolvimento dos povoados.
A presença da água sempre foi considerada valiosa, não só pela questão do
abastecimento, mas também por servir como meio de transporte. E foi isso,
exatamente, o que aconteceu com a cidade de Porto Alegre.
5. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Porto Alegre: primeira metade do século XIX
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu de Porto Alegre
6. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
SANHUDO, Ary Veiga. Porto Alegre: crônicas da minha cidade. 1961
“Por volta de 1760, o brigadeiro José Marcelino de Figueiredo observou que o
arraial dos açorianos era de fato o lugar ideal para transformar-se na cabeça
política das terras do Rio Grande do São Pedro”.
“O Guaíba por aquele tempo tinha seus braços líquidos da margem ocidental,
particularmente o famoso Riacho ao se arrastar como cobra pela Sesmaria de
Jerônimo de Ornellas”.
7. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
OLIVEIRA, Clovis. Porto Alegre, a cidade e sua formação. 1993.
8. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Arroio Dilúvio (Antigo Riacho) antes da canalização
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu de Porto Alegre
9. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
OS PRIMÓRDIOS:
índios, sesmarias e açorianos
Em tempos bem remotos, a região
onde hoje se encontra a cidade de
Porto Alegre era habitada por grupos
indígenas Guaranis, Charruas,
Minuanos e Tapes.
Tempos mais tarde vieram os
primeiros sesmeiros e logo em
seguida chegaram os 60 casais
açorianos.
A seguir A fundação da cidade
está inserida no processo de
conquista e expansão dos domínios
portugueses ao sul do Brasil em
direção ao rio da Prata.
10. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Mapa do Tratado de Tordesilhas/1494
Fonte: Site do Brasil Escola - http://www.brasilescola.com/
11. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Região entre Laguna e a Bacia do Prata.
Fonte: MELLO, Bruno.2010.
12. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
“A sesmaria era uma área de terra
devoluta, com mais ou menos três
léguas de comprimento por uma de
largura, ou 18 km por 6 km de largura”.
(Moacyr Flores, 2004)
Porto de Dorneles: Centro, Cidade Baixa,
Bom Fim, Moinhos de Vento, Passo d’Areia e
Navegantes.
Sesmaria de Chaves: Teresópolis, Santa
Teresa, Cristal, Partenon, Azenha,
Menino Deus, Santana, Medianeira,
Glória e Praia de Belas.
Sesmaria de Dionísio: Ipanema, Tristeza,
Cristal, Vila Nova, Belém Novo, Belém
Velho., Serraria, Guarujá.
SESMARIAS: as raízes da cidade
13. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Primeiros tempos da nova cidade : século XVIII
1752
Chegam os primeiros casais açorianos.
Iniciam o povoamento do Porto de Dorneles.
Organizam suas lavouras e edificam a primeira capela.
O local passa a ser conhecido como Porto de São Francisco dos Casais.
1768
Jerônimo de Ornellas vende sua propriedade para Ignácio Francisco.
1772
Desapropriação das terras pelo governador José Marcelino de Figueiredo.
Demarcação das ruas do povoado.
Lotes entregues aos colonos açorianos.
Definição do lugar da igreja Matriz e da sede do governo.
26 de março de 1772 : data oficial da fundação de Porto Alegre .
Dia em que foi fundada a Freguesia de São Francisco do Porto dos Casais.
1773
Capital da Província
14. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
A Ponta da Península: primeiro núcleo de povoação
Fonte: OLIVEIRA, Clovis. Porto Alegra, a cidade e sua formação. 1993.
15. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Primeiros tempos da nova cidade : século XVIII
1778:
Fortificações (muralhas) : limites entre o urbano e o rural
Largas trincheiras compostas de troncos grossos cobertos com terra socada e de
fossos escavados do lado de fora para dificultar a escalada, tomando o aspecto de
uma cidade fortaleza.
Fora dos muros situava-se o subúrbio com chácaras e olarias.
Dentro da fortaleza ficava o que é hoje o Centro Histórico com as 3 ruas principais:
Rua da Praia (Andradas), Rua da Ponte ou Cotovelo (Riachuelo) e Rua da Igreja
(Duque). No local ficava a sede do governo, a igreja Matriz, a Câmara, o Arsenal , a
cadeia e o porto.
E os caminhos: Caminho Novo (Voluntários), Caminho do Meio (Protásio), Caminho
da Azenha (Azenha) e Estrada do Mato Grosso (Bento Gonçalves).
16. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
As muralhas de Porto Alegre
Fonte: OLIVEIRA, Clovis. Porto Alegre, a cidade e sua formação. 1993.
17. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Nesse primeiro momento
da cidade, o abastecimento
de água era feito direto do
Guaíba, e não havia ruas
calçadas, esgoto
canalizado, limpeza urbana
ou iluminação pública.
A água potável do Guaíba
era possível somente
depois de 20 metros de sua
margem. Daí a construção
dos trapiches.
Trapiche da Ponta do Melo no Cristal
Fonte: PELLIN, Revelando a Tristeza, 1979
18. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Trapiches no Guaíba
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu Joaquim José Felizardo
19. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
1808: vila
1822: cidade
Atividade comercial intensa
Exportação de trigo e couros.
Construtores de barcos (os estaleiros se espalhavam pela orla do Guaíba) .
Porto de bom calado
Ampla malha de caminhos navegáveis pelos rios e pela Lagoa dos Patos.
Porto Alegre, uma cidade para os negócios
20. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Estrada do Caminho Novo. DREBET. Aquarela.
21. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Porto Alegre, Esquina da Província: século XIX
Largos: espaços por excelência de reunião e de atualização
das sociabilidades públicas.
Largo da Quitanda ou do Comércio (Atual Praça da Alfândega)
Largo dos Ferreiros/Paraíso (Atual Mercado)
Largo do Pelourinho/Forca/Harmonia (Em frente a Igreja das Dores)
Largo do Arsenal (Volta do Gasômetro)
Largo da Matriz (Atual Praça da Matriz)
22. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Fonte: OLIVEIRA, Clovis. Porto Alegra, a cidade e sua formação. 1993.
23. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Largo da Quitanda
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu de Porto Alegre
24. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Largo dos Ferreiros/Paraiso
Fonte: : Herrmann Wendroth. Aquarela.
25. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Largo da Matriz
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu de Porto Alegre
26. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Porto Alegre das chácaras e dos arraiais
Situados além dos muros da cidade (Ponta da Península), as chácaras eram responsáveis
pela produção agrícola (trigo) e pelo abastecimento da população.
As famílias de colonos aproveitavam a força das águas do arroio Riacho para mover seus
moinhos e fazer a farinha.
O núcleo se constituía em torno de:
Estrada
Capela
Moinho
Olaria
matadouro
Os arraiais (Menino Deus, Azenha, Teresópolis, Tristeza - veraneio), surgem a partir do
desenvolvimento dessas chácaras.
27. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Arraial da Baronesa: entre o Centro e o Menino Deus.
A chácara, de propriedade de João Batista da Silva Pereira (1797-1853), o Barão
de Gravataí, ficava a beira do Guaíba e foi loteada pela Baronesa do Gravataí, sra.
Maria Emília em 1879. Nascia assim o Bairro Cidade Baixa.
Vista do Arraial da Baronesa / século XIX
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu de Porto Alegre
28. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Arraial do Menino Deus.
Fonte: BUCCELLI. Vitorio. 1906.
29. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Arraial da Tristeza/1900
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu de Porto Alegre
.
30. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Crescimento urbano, econômico e turístico de Porto Alegre
Serviços públicos:
Asseio
Água
Veraneio e lazer
Século XX
31. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
1850:
Remoção do lixo e matérias fecais .
Despejos dentro do Guaíba : Ponta do Dionísio, do Melo, Praia de Belas e Navegantes.
Uso dos trapiches, dos carroções e do Trenzinho da Tristeza.
Cabungos: de 1879 à 1962.
Porto Alegre cria o serviço de assinantes.
1896:
5 mil assinantes.
1914:
Mais de 8 mil assinantes.
1932:
Iniciam os projetos para implantar a rede de esgotos na cidade.
Asseio Público
32. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Ponta do Melo ou Volta do Asseio
Fonte: ALVES, Hélio. Porto Alegre foi assim. 2001.
33. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Estabelecidos à margem de um lago com grande fartura de água, os primeiros povoadores de
Porto Alegre não tiveram problemas com o abastecimento . Porém, ao longo dos anos, isso
iria mudar.
1780: Primeira fonte pública (rua da Fonte - atual rua Avaí).
1830: Uso de poços (rua do Poço – atual rua Jerônimo Coelho).
1838: Trapiches para coletar água potável direto do Guaíba (200 palmos).
1855/56: Epidemia de cólera em Porto Alegre. (mais de 1.400 mortes).
Captação das águas do arroio Riacho.
1860: Cia Hidráulica Porto-Alegrense.
Sistemas de chafarizes públicos e canalizações domiciliares com água captada das cabeceiras do
Arroio Riacho.
1885: Cia Hidráulica Guaibense.
1928: Tratamento da água servida a população pela Cia Hidráulica 24 de Outubro.
Mas a água não era boa e por isso os pipeiros, fornecedores de água límpida direto das
vertentes localizadas na periferia urbana, eram muito solicitados.
1960: Criação do DMAE.
Água/abastecimento da cidade:
34. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Pipa puxada por mula/século XIX
Fonte: Fototeca Sioma Breitman/Museu de Porto Alegre
35. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Inseparáveis
“Porto Alegre é inseparável do Guaíba. A ele deve a existência. Dele
lhe provêm as maiores catástrofes: este enlace de paz e de guerra
determina a fisionomia de prazer e de luto, alternando sobre a
paisagem do delta fluvial”.
RAMBO, Balduino. A fisionomia do Rio Grande do Sul.
36. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
A cidade conquista o lago: os aterros no Guaíba
37. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
A enchente de 1941: o rio se vinga
Entre abril e maio de 1941, choveu sem parar em Porto Alegre. As águas do Guaíba
subiram mais de 4 metros, resultado também do deságue de 4 rios extensos e
caudalosos (Jacuí, Caí, Gravataí e Sinos). Alguns bairros de Porto Alegre como Menino
Deus, Azenha, Santana, Floresta e Navegantes, além do Centro, ficaram inundados. A
enchente deixou cerca de 70 mil pessoas desabrigadas e mais de 600 empresas
fechadas por meses.
38. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
Centro de Porto Alegre/1941
Fonte: Guimaraens. A enchente de 41.
39. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
O veraneio nas margens do Guaíba possui registros fotográficos desde o início do século XX. Os locais
escolhidos pelo Porto-Alegrense desde a primeira metade do século XX para atenuar o forte calor do
verão eram a Pedra Redonda e a Tristeza, praias localizadas na zona sul da cidade. Posteriormente o
fluxo maior de banhistas se deu na praia vizinha, o Ipanema. Revistas e jornais da época relembram
os banhos de rio em uma época que era difícil o deslocamento até o litoral.
VERANEIO E LAZER
40. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
O VERANEIO NAS PRAIAS DO GUAÍBA
Imagens do veraneio em Ipanema
Fonte: Acervos familiares
41. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
A importância do rio para os moradores de Porto Alegre manifestou-se desde início da
ocupação. Representou o direito de permanência em suas margens, a solução para
garantir a sobrevivência através da pesca e, finalmente, oportunizou o alargamento do
universo conhecido pelo acesso a outras vias fluviais que o Guaíba dava acesso. Desta
forma, fica fácil entender porque foi ali que começou o povoamento e dali partiu a
planificação urbana e demarcação da cidade. Por isso, o Guaíba e sua cidade marcam,
fortemente, a sensibilidade e a memória dos porto-alegrenses. Indissociáveis, lago e
cidade, vivem juntos, há séculos, mesmo depois da modernidade. O rio-lago está
presente na história da cidade e de seu povo. Pelo Guaíba chegaram os primeiros
colonizadores, os viajantes, forasteiros e imigrantes. Através de seus afluentes e lagoas,
fez-se a comunicação permanente com as fronteiras além mar, desenvolvendo toda a
Província do Rio Grande do Sul.
42. GUAÍBA: Um falso rio conta a história da cidade
FRANCO, Sérgio da Costa. Porto Alegre: guia histórico. Porto Alegre: Editora da
Universidade/UFRGS, 1998.
_______. Os viajantes olham Porto Alegre. Santa Maria: Anaterra, 2004.
_______. A velha Porto Alegre. Porto Alegre: Canadá, 2008.
MACEDO, Francisco Riopardense. Porto Alegre: origem e crescimento. Porto Alegre: Livraria
Sulina, 1968.
MONTEIRO, Charles. Breve História de Porto Alegre. 2012.
MUSEU DE PORTO ALEGRE JOAQUIM JOSÉ FELIZARDO. História de Porto Alegre. Porto
Alegre, 2012.
OLIVEIRA, Clovis. Porto Alegre a cidade e sua formação. 1993.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. O imaginário da cidade: visões do urbano. Paris, Rio de Janeiro
e Porto Alegre. Editora da Universidade, UFRGS, 1999.
PORTO ALEGRE, Achilles. Noutros tempos. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1922.
PRATI. Fotos Antigas RS. http://fotosantigas.prati.com.br
WOLFF, Carolina. O caso da canalização do arroio Dilúvio em Porto Alegre. 2008
REFERÊNCIAS