1. Curso: Licenciatura em Educação Socioprofissional
Unidade Curricular: Técnicas de Animação de Grupo
Professor: Carlos Jorge De Sá Pinto Correia
Estudante: Sandrina Mendes Pereira Valente, n.º 43518
Obra cinematográfica: La Guerre du Feu - A Guerra do Fogo
Grelha de Observação e Análise de Sequências Fílmicas
Considere as sequências de imagens como…
uma linguagem; um produto histórico e um veículo de comunicação
Ficha Técnica
Director: Jean-Jacques Annaud
Elenco: Everett McGill, Rae Dayn Chong, Ron Perlman, Nameer El-Kadi, Gary Schwartz, Kurt Schiegl, Frank Olivier
Bonnet, Brian Gill.
Produção: Michael Gruskoff, Denis Heroux, John Kemeny
Argumento: Gérard Brach a partir de uma obra de J.H. Rosny Sr
Fotografia: Claude Agostini
Banda Sonora: Philippe Sarde
Duração: 97 min.
Ano: 1981
País: França/ Canadá
Género: Aventura histórica
Análise Globalizante
Exposição das O mero divertimento que habitualmente se associa a um filme é largamente ultrapassado em A Guerra do
ideias
principais Fogo. Aqui, uma perspectiva histórica e antropológica toma um lugar de destaque, apresentando a forma
de vida dos antepassados do Homem há 80.000 anos, por altura do
Paleolítico Médio. Caracterizada pela evolução social do Homo Sapiens
e pela sua descoberta de meios que lhe permitem uma interacção mais
efectiva com o meio que o envolve, terá sido também neste período que
o uso da linguagem se desenvolve, inclusive pelo facto de viver em
grupos que obrigam à comunicação. Assim, e no geral, podemos afirmar que esta obra cinematográfica
apresenta como objectivo principal a caracterização da pré-história do Homem (mais do que a do Homem
pré-histórico), aquando da descoberta da utilidade do fogo, e os condicionalismos que tal provoca nas
relações humanas entre indivíduos e entre grupos sociais. Assim, encontramos neste filme a génese das
relações do homem com o seu semelhante enquanto ser social e com o meio natural onde se move e a
importância de se viver em comunidade com a protecção inerente à vivência em grupo.
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2. Apresentação A visualização deste filme em pleno séc. XXI, após décadas de desenvolvimento de efeitos especiais,
dos aspectos
positivos / guarda-roupa e técnicas de representação, poderia desiludir-nos. No entanto, arriscamos afirmar estarmos
negativos
na presença de uma obra-prima intemporal, dada originalidade do tema (devidamente mesclado com
simplicidade), a arrebatadora linguagem corporal dos actores e a componente pedagógica que lhe está
inerente. E é nesse sentido que não se torna fácil apontarmos aspectos negativos. Importará neste âmbito
acrescentar o facto da necessidade de visualização repetida do filme, pois só assim conseguirmos abarcar
a magnitude dos pormenores de qualidade que o mesmo comporta.
Ainda como aspecto positivo salienta-se a aprendizagem resultante da socialização entre os diferentes
grupos, que possibilitou melhorarem a qualidade de vida que tinham até então e, consequentemente, o
aumento das suas probabilidades da sua sobrevivência. É ainda de destacar a reflexão a que este filme
nos obriga, ajudando-nos a perceber a evolução das dinâmicas grupais e da necessidade que temos uns
dos outros para a sobrevivência da nossa própria espécie.
Pertinência Conforme já foi referido, o filme aqui em análise comporta uma perspectiva antropológica e histórica que
pedagógica
parece dominar qualquer outra. O intervalo entre o domínio do fogo e a sua própria criação foi aproveitado
com mestria para apresentar a origem das relações sociais, do sistema comunicacional que lhe é
subjacente e a interacção efectiva do Homem com o meio natural. Inicialmente, e olhando meramente
para o título, poder-se-ia entender a pertinência pedagógica do tema como sendo reduzida, mas a forma
como o mesmo foi abordado e tudo o que foi apresentado (e atrás descrito) como lhe sendo inerente
confere a esta obra um carácter pedagógico acima do que estamos habituados a assistir na sétima arte,
muito mais quando falamos de aspectos como a origem / desenvolvimento das relações sociais e da
comunicação na espécie humana, ou a utilização de símbolos e a manifestação de ritos.
Exemplos mais concretos do elevado grau de pedagogia existente são a apresentação de evidências que
permitem inferir a existência de:
- Desenvolvimento das emoções intragrupo e intergrupos, como o riso, o choro, o afecto e a passagem da
sexualidade com o intuito meramente reprodutor para ser “aprendido” como uma forma de transmissão de
afecto, ficando os parceiros face a face (reconhecendo com quem praticam a cópula, o que reforça os
laços de envolvimento);
- Líder por cada um dos grupos, e de os elementos constituintes destes terem tarefas definidas, com
objectivos específicos, como o caso da protecção do fogo, da vigilância para manterem em segurança o
grupo;
- Técnicas de camuflagem e de engodo (para o grupo de canibais com a utilização de carcaças de
animais mortos para que os elementos deste grupo se desconcentrassem da vigilância do fogo);
- Capacidade de utilizarem estratégias de ataque e de defesa, sempre com o objectivo último de zelar pela
integridade do grupo.
Palavras-chave Comunicação; grupos; fogo; sobrevivência.
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3. Análise Concentrada
Descrição do Iniciando com o domínio do fogo por indivíduos de uma determinada tribo, entende-se a importância que
contexto e das
situações/ esse elemento possui não só para essa comunidade mas como para todas as que se encontram próximo
reconstrução
da temática e, subentende-se, para todas as existentes (aquela importância era de tal ordem que havia dento do grupo
(história)
um elemento cuja responsabilidade era única e exclusivamente proteger a brasa, o fogo em potência). Tal
relevância deriva, numa primeira análise, da incapacidade, nessa fase inicial, de provocar fogo, daí a
necessidade de o manter quando o mesmo aparece por causas naturais. Após uma disputa com
elementos de outra tribo por tão precioso bem, a chama “original” é roubada, pelo que são enviados, pelo
ancião, três elementos na busca de nova chama (note-se que os elementos do grupo que ficaram feridos
durante o ataque não foram abandonados, o que já é revelador
da importância de que os elementos dos grupos se revestiam).
Tal procura conduz os viajantes a situações como a falta de
alimentos e o encontro com animais ferozes. Salienta-se a
conclusão sobre a antropofagia de outra tribo tirada quando
um dos elementos viajantes encontra restos de ossos e percebe que os mesmos são humanos. Nesta
situação, e não obstante a fome que sentiam, o respeito pela condição humana leva a não ingerirem o que
encontram, existindo mesmo repugnância por tal achado.
Após detectarem nova localização de fogo, procedem ao ataque que permite a libertação de uma mulher
de tribo diferente, mais desenvolvida, e que consegue a aproximação ao grupo “salvador” após aplicação
de um tipo de erva num ferimento causado pelo ataque. O conhecimento da comunidade de origem da
mulher permite aos viajantes ter contacto com formas mais avançadas de comunicação (entre elas o riso),
com uma forma mais adiantada de vida em sociedade (aceitação do outro; convivência com as
diferenças), com a utilização de artefactos com representações gráficas (o que revela que já tinham
capacidade de pensamento abstracto) e com técnicas que permitem a criação de objectos úteis para a
sobrevivência – para a caça, habitação, etc - e também com a criação do fogo através do atrito.
É de salientar a necessidade de os grupos permanecerem unidos para assim se tornarem mais fortes na
luta pela sobrevivência - a relevância do facto da cultura ser aprendida e transmitida.
No final do filme, tal como no início, a imagem centra-se no fogo. No entanto, enquanto que inicialmente o
mesmo tem que ser preservado constantemente sob pena de extinção, no final já se verificou o domínio e
o conhecimento necessário para criar o próprio elemento, interagindo assim de uma forma absolutamente
marcante com o meio natural.
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4. Auto- A análise de qualquer obra que escape aos trâmites normais dos circuitos comerciais terá, na minha
avaliação
opinião, dificuldades de análise acrescidas, até por ter tido menos contacto com a mesma. Neste caso
concreto, a complexidade de interpretação adensa-se pela inexistência de diálogos falados, resumindo-se
os mesmos a vocalizações sem sentido aparente (ainda que subjacente), acrescentando a estas últimas a
comunicação gestual, passível de confusões de interpretação acrescidas. No entanto, e graças às já
referidas qualidade dos actores e pertinência do tema, parece-me que a análise realizada terá conseguido
atingir o propósito essencial desta actividade, que entendo ser uma análise suficientemente completa e
objectiva, ainda que concisa.
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