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MEMÓRIA, TRADIÇÃO ORAL E PUBLICIZAÇÃO: MANIFESTAÇÕES
CULTURAIS E PATRIMÔNIO IMATERIAL DE CONGADEIROS NO SUL DE
MINAS GERAIS
Marta Gouveia de Oliveira Rovai
Introdução
Este artigo tem como finalidade apresentar a pesquisa de pós-doutoramento
realizada na Universidade Federal Fluminense (UFF), que tem como objeto de estudo a
manifestação cultural e religiosa da Congada ou Congado, em cidades do extremo sul de
Minas Gerais. Como professora da Universidade Federal de Alfenas pude constatar a
presença de vários grupos ligados à Congada, ao Jongo, à Capoeira, ao Maracatu e à
Folia de Reis na região, alguns mais organizados, mas a maioria em processo de
enfraquecimento e de desaparecimento.
Em Alfenas, o Maracatu de baque virado e o Jongo são manifestações pouco
desenvolvidas ou mais recentes, que contam com a participação de jovens universitários
e apresentam um caráter singular. A cidade promove um evento, que ainda está em sua
segunda edição - o Encontro de Matrizes Africanas - procurando reunir esses e outros
grupos de municípios vizinhos, a fim de difundir ritmos e folguedos populares, mais
fortes em Machado, Poços de Caldas e Boa Esperança (Congada), e Guaxupé (Folia de
Reis). Em um de seus bairros mais pobres e violentos, o Pinheirinho, encontra-se,
ainda, uma extensa família ligada à umbanda, que também participa de eventos como
esse, muitas vezes promovidos por seus membros, com escassos recursos e falta de
apoio público. Nesta comunidade, as mulheres são a maioria, lideram as manifestações
e transmitem os elementos religiosos da cultura africana, além de manterem vínculos
com os grupos de Congada nos municípios ao redor.
As religiões afro-brasileiras - no caso de Alfenas, a umbanda - estão
estreitamente relacionadas à Congada na região sul. Suas práticas e saberes justificam
alguns dos códigos, da hierarquia e dos rituais próprios da manifestação, a ascensão de
muitos de seus “mestres” e a organização de cada terno1
, com seus capitães, benzedeiros
e benzedeiras, respeitados por seus conhecimentos e papel de mediadores entre o
sagrado e o profano.
Neste cenário foi possível perceber a desigualdade de forças entre grupos e a
existência de alguns, não tão evidentes e em processo de desaparecimento, em cidades
próximas, como em Serrania e Areado, pois não apenas a falta de apoio, mas o
desinteresse das novas gerações ameaçam a transmissão da tradição. Nesse sentido,
desenvolvi o interesse por fazer um levantamento dessas manifestações, a partir das
festas de São Benedito e de Nossa Senhora do Rosário em cidades como Poços de
Caldas, Alfenas, Boa Esperança, Areado e Machado – esta última como uma das mais
tradicionais e fortes da região – e buscar os grupos menores, compreendendo sua
dinâmica, sua ressonância nas comunidades, suas formas de transmissão, seus
significados para velhas e novas gerações. O fato de apenas algumas cidades
centralizarem as apresentações dos agrupamentos pode revelar dificuldades de
manutenção de certas tradições, ou ainda mostrar como o fortalecimento de algumas
regiões pode colaborar no enfraquecimento de comunidades menores.
Além disso, chamou-me a atenção as relações de gênero, tanto na performance
das apresentações quanto nas formas de tradição e de transmissão cultural, na medida
em que o número de mulheres é grande e, no caso do bairro do Pinheirinho (em
Alfenas), elas parecem exercer papel central na transmissão dos saberes e na
organização de eventos, embora nas atuações das apresentações não tenham grande
evidência. Chama atenção aí, ainda, a forte relação do Congado com a umbanda,
afastando-se da matriz católica de outros agrupamentos.
Assim, o projeto – que está sendo desenvolvido com a colaboração de dez
estudantes dos cursos de Graduação em História, Ciências Sociais e Biologia - pretende
fazer um levantamento dos diferentes grupos na região sul de Minas Gerais, percebendo
as práticas culturais próprias de cada lugar, as relações identitárias, de gênero, étnicas e
1
Segundo Silva (2009) os “ternos do Congado” são coletivos que realizam cortejos em algumas festas
organizadas em homenagem à Nossa Senhora do Rosário, por meio de cantos, danças e da manipulação
de objetos simbólicos, saudando santos não apenas católicos, os chamados Reis Congos e outros grupos
de congado.
geracionais, que envolvem a luta pela permanência de suas tradições. Por meio da
memória coletiva, das narrativas constantemente criadas e reinventadas pelas velhas e
novas gerações, por homens e mulheres, assim como a realização de seus rituais
performáticos e festas, pretendo perceber as representações que as comunidades ligadas
a essas manifestações fazem de si e como constituem sua visão religiosa e de mundo.
O Congado em Minas Gerais
Segundo a Federação dos Congados de Minas Gerais, o estado tem hoje a maior
concentração de congadeiros do Brasil, contando com cerca de 4 mil “guardas”. Porém,
permanece o desconhecimento de seu valor histórico e cultural, além do preconceito,
por parte da maioria da população. Apesar da presença maciça de afrodescendentes nos
cantos e danças, a leitura por parte de alguns setores sociais, é de que a Congada, assim
como o Maracatu e o Jongo, seriam manifestações ligadas às religiões de matrizes
africanas (e por isso “desviantes”) e a setores pobres da população. Por isso, muitas
vezes, são consideradas “expressões menores” da cultura popular.
Em municípios como Alfenas, Machado e Poços de Caldas, em que o número de
estudantes universitários cresce a cada dia2
, os grupos tradicionais passam a negociar
espaço público com as autoridades e com as novas gerações – a maioria formada por
estudantes vindos de fora – no sentido de ocupação da cidade (já que a urbanização e a
especulação imobiliária, devido ao crescimento das universidades na região, jogam
essas comunidades cada vez mais para a periferia) e também de valorização das festas e
reconhecimento social, quase numa suposta oposição entre o “arcaico” e o “moderno”3
.
Nesse sentido, como afirma Patrícia Costa, “a congada expressa uma forma de
resistência baseada antes, na negociação pela busca de reconhecimento social, do que no
confronto direto” (COSTA, 2006, p.13).
2
O número de universidades federais cresce na região, atraindo estudantes do interior de São Paulo e de
muitas cidades do estado de Minas Gerais, colaborando para o crescimento demográfico de forma
relevante.
3
As constantes festas realizadas pelos estudantes universitários atraem empresas que promovem shows
com cantores da moda (como sertanejos, funkeiros e pagodeiros) e tecnologia considerada “de ponta”,
transformando os eventos em verdadeiros espetáculos, em que se consome muita bebida e dessacraliza-se
qualquer relação humana.
Historicamente, a expressão Congada ou Congado vem do termo congo, que
significa congar, dançar, expressão própria dos festejos do Antigo Reino do Congo, na
África Central, para comemorar nascimentos de príncipes e colheitas bem sucedidas.
Segundo Marina de Mello Souza (2002), uma vez convertidos ao catolicismo, os negros
realizavam festejos em culto à Nossa Senhora do Rosário e também para “(...), a eleição
de reis negros e as celebrações a ela associadas que estiveram presentes em quase todos
os lugares que receberam escravos africanos.” (SOUZA, 2002, p.167).
Dúvidas permanecem quanto à ideia de origem e transposição dessas festas da
África para o Brasil. Para autores como Borges e Souza, os chamados ternos do
Congado ou Congada se originaram das irmandades de escravos e libertos já na colônia,
com variações ligadas às regiões para onde os grupos de escravos eram trazidos, suas
diferentes formações étnicas, misturadas forçosamente pelos senhores que separavam
nações e promoviam o sincretismo entre culturas provenientes de diversos lugares da
África.
O próprio regime escravista, preocupado com a possibilidade de revoltas teria,
então, estimulado diferentes apropriações e recriações por parte dos negros, que
forjaram novas formações culturais frente a dominação:
como essas associações eram meios do grupo instituir formas de
solidariedade, principalmente frente à morte e à doença, algumas
vezes facilitando a obtenção da liberdade dos que eram escravos. (...)
as confrarias funcionavam como sociedades de ajuda mútua, mas
também serviam como canais por meio dos quais era possível
controlar a vida dos africanos e com eles negociar” (SOUZA, 2003,
p.163)
A celebração dos reis e rainhas pelas irmandades religiosas permitia marcar a
resistência e evidenciava as hierarquias e distinções étnicas, assim como a interação dos
negros à vida social e religiosa da colônia, submetida à cultura e à política europeia por
meio de suas celebrações barrocas repletas de pompa. Segundo M. F. Monteiro,
Congadas são também tributárias das celebrações de vassalagem e
fidelidade dedicadas às realezas africanas naquele continente e suas
embaixadas, enquanto eficientes práticas parlamentares performáticas
de envio de mensagens, presentes, solicitações e tratados aos
soberanos de outras nações. Pela festa da congada acontece a
articulação de tradições políticas e religiosas africanas às formas
políticas e religiosas portuguesas, o que possibilitou a bricolagem dos
símbolos que concomitantemente promovem cultos públicos católicos
e reconstroem aspectos da cultura e religiosidade africana no interior
de instituições tipicamente europeias, por meio dos rituais de coroação
de reis e rainhas negras (Monteiro, 2004).
Os desfiles que aconteciam nos festejos eram chamados de congadas, congo,
cucumbis ou reinados de congos, espalhando-se por várias províncias, dentre elas o Rio
de Janeiro, São Paulo, Goiás, Rio Grande do Sul. Em Minas Gerais, a Congada ou
Congado, em especial, nasceu das festas realizadas em homenagem à Nossa Senhora do
Rosário que, segundo a tradição, teria sido responsabilizada por Santa Ifigênia – uma das
responsáveis pela difusão do cristianismo na Etiópia – a cuidar dos escravos. As irmandades
católicas, formadas por libertos e escravos, teriam criado os rituais em louvor aos chamados
“santos pretos”, como São Bendito e São Elesbão, além das santas. Ali realizavam a
coroação da corte negra, negociando com as autoridades o espaço público para os cortejos,
prática que apesar de rarear-se a cada dia, permanece ainda, com festejos realizados entre
agosto e outubro nos municípios ao sul de Minas.
Hoje ainda os “ternos de congado” realizam cortejos nas festas organizadas em
homenagem à Nossa Senhora do Rosário ou São Benedito e nas apresentações em
celebrações locais, ou a convite de seus pares, em cidades vizinhas. Nos festejos,
celebram santos católicos e entidades afro-brasileiras, coroam os reis congos e se
confraternizam com outros congadeiros. Suas características variam quanto às
indumentárias, os ritmos e toques, os instrumentos, os cantos e gingados, mas mantêm
elementos em comum, o que lhes garante a identidade partilhada, lançando mão de
sinais diacríticos e reafirmando as relações entre si, com a comunidade externa e entre a
Igreja e a religiosidade popular.
Nesse processo de organização dos grupos de Congada e de promoção de encontros
entre as demais manifestações afrodescendentes – Jongo, Umbanda, Folia de Reis - ocorrem
inúmeras negociações com as autoridades municipais e escassos financiamentos, além de
tentativas de interação entre o espaço rural e urbano (a maioria dos congadeiros é formada
por trabalhadores rurais), a religiosidade de origem africana (principalmente a umbanda),
ligados à Congada, e a Igreja católica, entre as cidades maiores e as menores que se
convidam, assim como entre os grupos conhecidos e os menos visíveis.
Essas relações são capazes de revelar o constante diálogo, por vezes tenso e
conflituoso, que caracterizam a existência desses grupos e seus rituais, tanto do ponto de
vista interno como externo. As negociações internas implicam em entender o que José
Reginaldo Gonçalves (2005) chamou de ressonância dos símbolos e práticas na
comunidade, ou seja, a identificação coletiva em torno de referências relacionadas a
uma memória coletiva e a uma tradição que vai sendo transmitida entre as gerações e
que, na luta pela permanência, vai sendo repensada e reconstruída contra o tempo
presente, racionalizado, que dessacraliza das relações sociais.
Externamente, realizar o levantamento desses grupos - mais conhecidos e
também aqueles menores e sem evidência - pode permitir a compreensão da polissemia
de significados, assim como de permanências e comunhão cultural, além da percepção
em torno das relações de força e de resistência – étnicas, de gênero, geracional e de
classe - numa região em que há pouco reconhecimento dessas manifestações e em que a
possibilidade do festejo também pode contribuir, no presente, para que os congadeiros
ocupem uma posição de destaque e sejam vistos socialmente.
Esse caráter místico permanece significando e justificando os festejos dos
diferentes grupos de Congado, não apenas em Machado – onde existe há mais de 90
anos - mas nas cidades vizinhas. Para Carlos Rodrigues Brandão (1985), quanto mais
próximo a São Paulo, no entanto, mais pode se observar o apagamento ou a
transformação das tradições da Congada, com a introdução de novos instrumentos,
como o sopro, o saxofone, a clarineta e o trompete, que se misturam aos tradicionais
tambores, pandeiros e caixas que, no passado, davam um tom mais marcado, cadenciado
e harmonioso aos ternos do congo. A introdução, inclusive, de apitos e tambores de
alumínio, próprios de escolas de samba, teriam dado às apresentações um caráter mais
“barulhento”, diferente das marcas ritualísticas, registradas das congadas.
Para ele também as cores utilizadas pelos ternos foram sendo modificadas, como
a diversidade de cores misturadas aos tradicionais branco e azul das roupas. A
gestualidade também estaria sofrendo transformações em cada agremiação, em
diferentes cidades, principalmente pelo desinteresse das novas gerações que pouco
guardam as toadas. Esse último aspecto foi percebido por mim na observação das
performances dos congadeiros em Alfenas, quando jovens pouco se envolveram nas
danças e demonstravam desconhecimento das letras, além de manifestarem pouca
devoção, em gestos mecânicos e quase sem sentido. Para Brandão
existem festas onde as equipes guardam ainda um conheicmento
suficiente de seus cantos e passos da marcha e dança. Mas os gestos
finos da reciprocidade, da deferência e da devoção foram apagados.
Essa poderia ser a diferença entre o que se vê ainda em Oliveira e o
que se encontra em Machado, também em Minas Gerais, mais ao sul
em direção a São Paulo (BRANDÃO, s.d., p. 185/186).
A perda de significado para as novas gerações e para a sociedade voltada ao
consumo, influenciadas por uma temporalidade mais dessacralizada e competitiva, tem
contribuído para que as práticas do Congado sejam valorizadas apenas como folclórica
(no sentido de exótica, de estranha ou curiosidade), ou pelo volume e quantidade de
instrumentos ou apresentações performáticas, atendendo a interesses por espetáculos.
Isso tem preocupado os membros mais velhos, que procuram, incansavelmente, reunir
os diferentes grupos, contra o tempo diluidor do capitalismo e a ideia da constituição de
comunidades estéticas4
, como chamou Zigmunt Bauman (2005).
Desta forma, torna-se relevante para os estudos sobre tradição oral, memória e
identidade (ligados efetivamente às preocupações com o patrimônio imaterial5
) e para o
debate e o reconhecimento público, evidenciar as relações, as preocupações e as
demandas dessas comunidades culturais e religiosas, que procuram sobreviver e resistir
às transformações em suas vidas cotidianas, marcadas pela pobreza, pela exclusão e
desmerecimento no contexto urbano e de mundialização cultural.
Por meio das celebrações e de seus rituais mais cotidianos, em especial a
umbanda na cidade de Alfenas, os membros das Congadas procuram tornar visíveis as
relações étnicas, culturais, míticas e sociais, expressando suas críticas a um mundo
racionalizado e fragmentado. Procuram defender-se dos problemas que os afligem em
seus bairros, lutam contra a quase invisibilidade social, objetivando tornar suas
4
Comunidades estéticas ou “guarda-roupa” são aquelas cuja existência é efêmera, dada pela necessidade
de se pertencer a um grupo e cuja identidade se constitui por marcas e símbolos relacionados à aparência,
estéticos e vazios de sentido.
5
Patrimônio imaterial ou intangível, segundo definição do IPHAN, diz respeito àquelas práticas e
domínios da vida social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de fazer; celebrações; formas de
expressão cênicas, plásticas, musicais ou lúdicas; e nos lugares
manifestações em denúncia contínua, muitas vezes, da discriminação social. As famílias
ligadas aos ternos são detentoras de saberes e fazeres, sabem as razões de sua existência,
conhecem as sequências ritualísticas, seus segredos, fundamentos, conceitos, gestos,
cantos e palavras sagradas. Importante salientar que nem sempre os “donos” dos ternos
são homens – capitães e presidentes – pois em certos casos, como no bairro Pinheirinho,
em Alfenas, são as mulheres as “mestres”, articuladoras e mediadoras da comunidade.
Maria Dalva Soares (2010), que pesquisou sobre a participação feminina no Congado de
Belo Horizonte, afirma que
Na organização dos festejos e em todas as outras possibilidades de
participação no Reinado, a mulher sempre esteve presente, porém
ocupando espaços diferenciados dos homens. Durante muitos anos, só
era permitido às mulheres participar como rainhas, princesas,
zeladoras, juízas, bandeireiras, responsáveis pelos enfeites e pela
preparação da comida que é servida durante os rituais — posições de
menor visibilidade, espaços menos valorizados na hierarquia do ritual
— mas nunca como caixeiras ou dançantes.
Atualmente, pela capital e pelo interior do estado, constata-se a
presença de mulheres em funções que, até algum tempo atrás, eram
exclusivamente dos homens. Hoje já é possível encontrar mulheres
caixeiras, dançantes e até capitãs comandando os grupos.(SOARES,
2010, p.18)
A transmissão de conhecimentos demarca prestígio e posições no interior dos
grupos de Congado, como na Umbanda, no Jongo e na Folia de Reis. São os “mestres”
que orientam, expõem os preceitos a serem seguidos, em nome de santos e entidades,
que se expressam nos cantos, nas danças, símbolos e na bênção concedida aos
membros, acompanhada pela toada dos congadeiros.
Santos como Nossa Senhora do Rosário, ou as entidades nas religiões afro-
brasileiras significam e representam símbolos, gestualidade e crenças que constituem a
construção de identidade coletiva, contra olhares pejorativos - sejam produzidos por
valores religiosos, étnicos, de força ou meramente mercadológicos. A memória
transmitida entre as gerações e entre os próprios grupos contemporâneos de
congadeiros, nesse sentido, funciona como afirmação identitária e desejo de preservação
de um patrimônio, entendido como posse e recriação coletiva constante.
O trabalho tem sido desenvolvido, acompanhando as festas que acontecem entre
maio e setembro, variando em cada cidade. Ali, o grupo de pesquisadores busca realizar
um levantamento de diferentes grupos de cultura afrodescendente – especialmente a
Congada – nas cidades do sul de Minas Gerais, em direção a São Paulo (Alfenas,
Machado, Areado, Poços de Caldas e Boa Esperança), sobre os quais há pouco registro
e estudo, observando, conhecendo e registrando os mitos, os festejos e a dinâmica de
transmissão da tradição ligada à Congada, nessas cidades, entendendo o trâmite entre o
cristianismo e as religiões de matrizes africanas.
Também são objetivos da pesquisa compreender a organização interna das
comunidades religiosas/culturais, com seus conflitos e relações de gênero, classe e
intergeracionais; observar as relações entre os grupos das diferentes cidades, procurando
entender as relações de sociabilidade e/ou poder entre elas, assim como a
recepção/discriminação das comunidades locais, fortemente ligadas pelo cristianismo;
acompanhar os principais festejos, as permanências e recriações simbólicas de adereços,
instrumentos e simbologias, utilizados na composição coreográfica, cenográfica e
religiosa da festa; perceber como a memória e a oralidade contribuem na transmissão da
tradição oral entre as gerações, identificando as dificuldades de permanência e as
reinvenções; identificar e entender a memória e a tradição enquanto campos de força,
nos quais se estabelece o jogo social de esquecer e lembrar, assim como espaços
simbólicos de construção identitária.
A oralidade e a memória coletiva
É importante pensar a memória coletiva e individual, a tradição e sua
transmissão, como fundamentais para entender as apropriações do passado e seus usos
sociais pelas comunidades no presente. A produção, a permanência e a recriação do
passado, presentificado constantemente pelos membros do Congado e de outras
manifestações afro-brasileiras, devem ser entendidas como formas de gestão e
representação do passado, expresso na cena pública pelas performances musicais e pelos
festejos religiosos.
Segundo Maurice Halbwachs (2006), a memória coletiva é essencial para a
coesão social em meio à sociedade em que a experiência é desvalorizada. A memória é
o sustento da tradição oral, por meio de mecanismos de acumulação, conservação,
reinvenção, atualização e reconhecimento de elementos simbólicos que contribuem para
a elaboração da identidade coletiva.
Nesse sentido, entende-se as Congadas como manifestações e representações
sociais que se constituem a partir do compartilhamento de memória em diferentes
localidades e temporalidades, contra formas de discriminação e exclusão social. Para
Elizabeth Kiddy, que estudou a Congada na cidade de Oliveira, região central de Minas
Gerais, o Congado é uma tradição polissêmica que se mantém viva pela forma como os
rituais religiosos e performáticos se adaptam ao tempo presente, pois “projeta-se nas
acomodações das práticas ritualísticas uma força espiritual, baseada nos ‘preto-véios’ e
ancestrais, expressa na devoção à santa” (KIDDY, 2005, p.45-60). A oralidade e a
habilidade de adaptação realizam o processo de esquecimento e inovação constantes,
necessários à sobrevivência dos grupos culturais.
Carlos Rodrigues Brandão (1985) escreveu sobre a festa do Congado em Catalão
(Goiás) e percebeu as diversas facetas da sociabilidade que os seus membros constituem
como formas de sobrevivência identitária e resistência negra, tendo sua origem nas
irmandades e nas práticas sociais e religiosas dos ternos.
Para Patrícia Costa, que analisou a Congada na Serra do Salitre, oeste de Minas
Gerais (2006), a escravidão e a coroação dos reis congos, celebrados nos rituais atuais
“promovem a reconciliação com esse passado traumático, na medida em que diversos
ternos atualizam durante os festejos a aparição de N. Sra. do Rosário para os cativos,
evento transformador da imagem e do valor do escravo perante os senhores” (COSTA,
2006, p.12).
Sobre as Congadas localizadas mais ao sul de Minas Gerais existem poucos
trabalhos desenvolvidos e não é possível, ainda, afirmar sobre seus significados, sejam
culturais ou políticos, diante de um mundo cada vez mais rápido, dessacralizado e
superficial. É possível encontrar pesquisas em torno das congadas em Belo Horizonte
(SOARES, 2010), Sete Lagoas (GARONE, 2008) e São João Del Rei (SILVA, 2009).
Ao sul do estado, porém, em que os grupos religiosos e culturais parecem ser menos
evidentes e reconhecidos, há dificuldades em encontrar estudos historiográficos ou
mesmo de caráter antropológico.
Cabe destaque ao trabalho de Carlos Rodrigues Brandão (1985) que, de forma
mais genérica, fala das manifestações em Minas Gerais, e à obra de Lilian S.Cézar
(2012) sobre a Congada realizada na cidade de São Sebastião do Paraíso, há cerca de
200 km de Alfenas. Há também um pequeno livro sobre a cidade de Machado, onde há
a realização de folguedos, numa prática das mais antigas e que se realiza todo ano, no
mês de outubro. Esta cidade, junto com Poços de Caldas e São Sebastião do Paraíso,
permanece insistindo nas apresentações de seus grupos, embora haja notícias de que as
dificuldades são cada vez maiores e que as novas gerações tenham apresentado pouco
interesse em sua difusão e prática, enfraquecendo alguns ternos.
Considerações finais
Pretendeu-se, aqui, apresentar a pesquisa que se desenvolve no sul de Minas,
juntamente a alunos da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL), por meio da
observação participante, a história oral dos membros das Congadas e o registro das
Festas do Rosário e São Benedito e as manifestações da Congada, realizadas pelos
grupos no sul de Minas Gerais. Procura-se perceber o registro de suas variações,
nominações e recriações, assim como das permanências entre comunidades de cidades e
famílias diferentes, ou mesmo de congadeiros dentro de uma mesma cidade, ligados a
uma mesma família, como é o caso das mulheres do bairro Pinheirinho, em Alfenas.
A partir do registro de seus festejos – e também de seu cotidiano na comunidade
– será possível perceber a constituição de diferentes ternos, com suas roupagens,
instrumentos, danças, cantos, ritmos, santos e mitos (seu patrimônio material e
imaterial); os diferentes papéis assumidos por homens e mulheres, velhos e jovens, no
processo de manutenção ou reconstituição das práticas religiosas ou de interação social.
A fim de entender a transmissão de saberes e fazeres, torna-se importante
também a realização de entrevistas orais, procurando ouvir as narrativas dos chamados
“mestres” e membros de cada manifestação a ser identificada, sobre as transformações
no tempo e no espaço das práticas coletivas. Por meio de questionário semiestruturados
e também conversas informais, espero abordar a tradição oral, entendida como a
capacidade dos congadeiros de repetir/memorizar/preservar os elementos da cultura
religiosa, aliada à improvisação/recriação/inventividade em sua transmissão às novas
gerações, inseridos no processo de mercantilização da cultura. Parto aqui das mesmas
premissas apresentadas por Verena Alberti sobre tradição oral:
Os objetos transmitidos pela tradição oral não são imutáveis. Canções,
ditos populares, rezas, mitos etc não são, digamos, produtos intactos
disponíveis em prateleira, os quais podemos escolher.
(...) A tradição oral, como as tradições de modo geral, está calcada na
repetição. (ALBERTI, 2005, p.18)
Além das entrevistas e da observação, serão registradas em vídeo e fotografia as
performances dos grupos de Congado. A produção de um filme sobre os participantes
da Congada pode se transformar num processo importante de colaboração e devolução
às comunidades, assim como tem valor fundamental para a constituição de identidade,
para o autorreconhecimento de seus membros. Mais do que isso, as relações entre
conhecimento acadêmico e os saberes comunitários, entre universidade e congadeiros,
deve contribuir para a publicização das culturas populares, para seu empoderamento
quanto à questão não apenas no sentido do registro de seu patrimônio imaterial, mas na
elaboração de políticas públicas que resultem em melhoria de suas vidas.
Acredita-se que a memória coletiva e a oralidade, preservadas pelos velhos
como “reservatórios”, tenham papel fundamental na tentativa de coesão e resistência
desses grupos diante das ameaças de dissolução da identidade cultural e religiosa dessas
comunidades. Como crenças, práticas, símbolos, cantos e danças não são registrados na
forma escrita, a repetição deles no cotidiano e nas trocas geracionais contribuem para a
continuidade e fortalecimento dos grupos. Isso não significa, no entanto, que identificar,
conhecer, reconhecer e registrá-los na forma escrita ou nas mídias tenha o sentido de
congelá-los e perpetuá-los, pois, como afirma José Reginaldo Gonçalves (2005), a
tradição é patrimônio vivo que só pode continuar a existir no jogo da lembrança e do
esquecimento, da conservação e da inovação, a partir do desejo de quem o constrói
cotidianamente, na busca da sobrevivência étnico-cultural.
Referências bibliográficas
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  • 1. MEMÓRIA, TRADIÇÃO ORAL E PUBLICIZAÇÃO: MANIFESTAÇÕES CULTURAIS E PATRIMÔNIO IMATERIAL DE CONGADEIROS NO SUL DE MINAS GERAIS Marta Gouveia de Oliveira Rovai Introdução Este artigo tem como finalidade apresentar a pesquisa de pós-doutoramento realizada na Universidade Federal Fluminense (UFF), que tem como objeto de estudo a manifestação cultural e religiosa da Congada ou Congado, em cidades do extremo sul de Minas Gerais. Como professora da Universidade Federal de Alfenas pude constatar a presença de vários grupos ligados à Congada, ao Jongo, à Capoeira, ao Maracatu e à Folia de Reis na região, alguns mais organizados, mas a maioria em processo de enfraquecimento e de desaparecimento. Em Alfenas, o Maracatu de baque virado e o Jongo são manifestações pouco desenvolvidas ou mais recentes, que contam com a participação de jovens universitários e apresentam um caráter singular. A cidade promove um evento, que ainda está em sua segunda edição - o Encontro de Matrizes Africanas - procurando reunir esses e outros grupos de municípios vizinhos, a fim de difundir ritmos e folguedos populares, mais fortes em Machado, Poços de Caldas e Boa Esperança (Congada), e Guaxupé (Folia de Reis). Em um de seus bairros mais pobres e violentos, o Pinheirinho, encontra-se, ainda, uma extensa família ligada à umbanda, que também participa de eventos como esse, muitas vezes promovidos por seus membros, com escassos recursos e falta de apoio público. Nesta comunidade, as mulheres são a maioria, lideram as manifestações e transmitem os elementos religiosos da cultura africana, além de manterem vínculos com os grupos de Congada nos municípios ao redor. As religiões afro-brasileiras - no caso de Alfenas, a umbanda - estão estreitamente relacionadas à Congada na região sul. Suas práticas e saberes justificam alguns dos códigos, da hierarquia e dos rituais próprios da manifestação, a ascensão de
  • 2. muitos de seus “mestres” e a organização de cada terno1 , com seus capitães, benzedeiros e benzedeiras, respeitados por seus conhecimentos e papel de mediadores entre o sagrado e o profano. Neste cenário foi possível perceber a desigualdade de forças entre grupos e a existência de alguns, não tão evidentes e em processo de desaparecimento, em cidades próximas, como em Serrania e Areado, pois não apenas a falta de apoio, mas o desinteresse das novas gerações ameaçam a transmissão da tradição. Nesse sentido, desenvolvi o interesse por fazer um levantamento dessas manifestações, a partir das festas de São Benedito e de Nossa Senhora do Rosário em cidades como Poços de Caldas, Alfenas, Boa Esperança, Areado e Machado – esta última como uma das mais tradicionais e fortes da região – e buscar os grupos menores, compreendendo sua dinâmica, sua ressonância nas comunidades, suas formas de transmissão, seus significados para velhas e novas gerações. O fato de apenas algumas cidades centralizarem as apresentações dos agrupamentos pode revelar dificuldades de manutenção de certas tradições, ou ainda mostrar como o fortalecimento de algumas regiões pode colaborar no enfraquecimento de comunidades menores. Além disso, chamou-me a atenção as relações de gênero, tanto na performance das apresentações quanto nas formas de tradição e de transmissão cultural, na medida em que o número de mulheres é grande e, no caso do bairro do Pinheirinho (em Alfenas), elas parecem exercer papel central na transmissão dos saberes e na organização de eventos, embora nas atuações das apresentações não tenham grande evidência. Chama atenção aí, ainda, a forte relação do Congado com a umbanda, afastando-se da matriz católica de outros agrupamentos. Assim, o projeto – que está sendo desenvolvido com a colaboração de dez estudantes dos cursos de Graduação em História, Ciências Sociais e Biologia - pretende fazer um levantamento dos diferentes grupos na região sul de Minas Gerais, percebendo as práticas culturais próprias de cada lugar, as relações identitárias, de gênero, étnicas e 1 Segundo Silva (2009) os “ternos do Congado” são coletivos que realizam cortejos em algumas festas organizadas em homenagem à Nossa Senhora do Rosário, por meio de cantos, danças e da manipulação de objetos simbólicos, saudando santos não apenas católicos, os chamados Reis Congos e outros grupos de congado.
  • 3. geracionais, que envolvem a luta pela permanência de suas tradições. Por meio da memória coletiva, das narrativas constantemente criadas e reinventadas pelas velhas e novas gerações, por homens e mulheres, assim como a realização de seus rituais performáticos e festas, pretendo perceber as representações que as comunidades ligadas a essas manifestações fazem de si e como constituem sua visão religiosa e de mundo. O Congado em Minas Gerais Segundo a Federação dos Congados de Minas Gerais, o estado tem hoje a maior concentração de congadeiros do Brasil, contando com cerca de 4 mil “guardas”. Porém, permanece o desconhecimento de seu valor histórico e cultural, além do preconceito, por parte da maioria da população. Apesar da presença maciça de afrodescendentes nos cantos e danças, a leitura por parte de alguns setores sociais, é de que a Congada, assim como o Maracatu e o Jongo, seriam manifestações ligadas às religiões de matrizes africanas (e por isso “desviantes”) e a setores pobres da população. Por isso, muitas vezes, são consideradas “expressões menores” da cultura popular. Em municípios como Alfenas, Machado e Poços de Caldas, em que o número de estudantes universitários cresce a cada dia2 , os grupos tradicionais passam a negociar espaço público com as autoridades e com as novas gerações – a maioria formada por estudantes vindos de fora – no sentido de ocupação da cidade (já que a urbanização e a especulação imobiliária, devido ao crescimento das universidades na região, jogam essas comunidades cada vez mais para a periferia) e também de valorização das festas e reconhecimento social, quase numa suposta oposição entre o “arcaico” e o “moderno”3 . Nesse sentido, como afirma Patrícia Costa, “a congada expressa uma forma de resistência baseada antes, na negociação pela busca de reconhecimento social, do que no confronto direto” (COSTA, 2006, p.13). 2 O número de universidades federais cresce na região, atraindo estudantes do interior de São Paulo e de muitas cidades do estado de Minas Gerais, colaborando para o crescimento demográfico de forma relevante. 3 As constantes festas realizadas pelos estudantes universitários atraem empresas que promovem shows com cantores da moda (como sertanejos, funkeiros e pagodeiros) e tecnologia considerada “de ponta”, transformando os eventos em verdadeiros espetáculos, em que se consome muita bebida e dessacraliza-se qualquer relação humana.
  • 4. Historicamente, a expressão Congada ou Congado vem do termo congo, que significa congar, dançar, expressão própria dos festejos do Antigo Reino do Congo, na África Central, para comemorar nascimentos de príncipes e colheitas bem sucedidas. Segundo Marina de Mello Souza (2002), uma vez convertidos ao catolicismo, os negros realizavam festejos em culto à Nossa Senhora do Rosário e também para “(...), a eleição de reis negros e as celebrações a ela associadas que estiveram presentes em quase todos os lugares que receberam escravos africanos.” (SOUZA, 2002, p.167). Dúvidas permanecem quanto à ideia de origem e transposição dessas festas da África para o Brasil. Para autores como Borges e Souza, os chamados ternos do Congado ou Congada se originaram das irmandades de escravos e libertos já na colônia, com variações ligadas às regiões para onde os grupos de escravos eram trazidos, suas diferentes formações étnicas, misturadas forçosamente pelos senhores que separavam nações e promoviam o sincretismo entre culturas provenientes de diversos lugares da África. O próprio regime escravista, preocupado com a possibilidade de revoltas teria, então, estimulado diferentes apropriações e recriações por parte dos negros, que forjaram novas formações culturais frente a dominação: como essas associações eram meios do grupo instituir formas de solidariedade, principalmente frente à morte e à doença, algumas vezes facilitando a obtenção da liberdade dos que eram escravos. (...) as confrarias funcionavam como sociedades de ajuda mútua, mas também serviam como canais por meio dos quais era possível controlar a vida dos africanos e com eles negociar” (SOUZA, 2003, p.163) A celebração dos reis e rainhas pelas irmandades religiosas permitia marcar a resistência e evidenciava as hierarquias e distinções étnicas, assim como a interação dos negros à vida social e religiosa da colônia, submetida à cultura e à política europeia por meio de suas celebrações barrocas repletas de pompa. Segundo M. F. Monteiro, Congadas são também tributárias das celebrações de vassalagem e fidelidade dedicadas às realezas africanas naquele continente e suas embaixadas, enquanto eficientes práticas parlamentares performáticas de envio de mensagens, presentes, solicitações e tratados aos soberanos de outras nações. Pela festa da congada acontece a articulação de tradições políticas e religiosas africanas às formas
  • 5. políticas e religiosas portuguesas, o que possibilitou a bricolagem dos símbolos que concomitantemente promovem cultos públicos católicos e reconstroem aspectos da cultura e religiosidade africana no interior de instituições tipicamente europeias, por meio dos rituais de coroação de reis e rainhas negras (Monteiro, 2004). Os desfiles que aconteciam nos festejos eram chamados de congadas, congo, cucumbis ou reinados de congos, espalhando-se por várias províncias, dentre elas o Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, Rio Grande do Sul. Em Minas Gerais, a Congada ou Congado, em especial, nasceu das festas realizadas em homenagem à Nossa Senhora do Rosário que, segundo a tradição, teria sido responsabilizada por Santa Ifigênia – uma das responsáveis pela difusão do cristianismo na Etiópia – a cuidar dos escravos. As irmandades católicas, formadas por libertos e escravos, teriam criado os rituais em louvor aos chamados “santos pretos”, como São Bendito e São Elesbão, além das santas. Ali realizavam a coroação da corte negra, negociando com as autoridades o espaço público para os cortejos, prática que apesar de rarear-se a cada dia, permanece ainda, com festejos realizados entre agosto e outubro nos municípios ao sul de Minas. Hoje ainda os “ternos de congado” realizam cortejos nas festas organizadas em homenagem à Nossa Senhora do Rosário ou São Benedito e nas apresentações em celebrações locais, ou a convite de seus pares, em cidades vizinhas. Nos festejos, celebram santos católicos e entidades afro-brasileiras, coroam os reis congos e se confraternizam com outros congadeiros. Suas características variam quanto às indumentárias, os ritmos e toques, os instrumentos, os cantos e gingados, mas mantêm elementos em comum, o que lhes garante a identidade partilhada, lançando mão de sinais diacríticos e reafirmando as relações entre si, com a comunidade externa e entre a Igreja e a religiosidade popular. Nesse processo de organização dos grupos de Congada e de promoção de encontros entre as demais manifestações afrodescendentes – Jongo, Umbanda, Folia de Reis - ocorrem inúmeras negociações com as autoridades municipais e escassos financiamentos, além de tentativas de interação entre o espaço rural e urbano (a maioria dos congadeiros é formada por trabalhadores rurais), a religiosidade de origem africana (principalmente a umbanda), ligados à Congada, e a Igreja católica, entre as cidades maiores e as menores que se convidam, assim como entre os grupos conhecidos e os menos visíveis.
  • 6. Essas relações são capazes de revelar o constante diálogo, por vezes tenso e conflituoso, que caracterizam a existência desses grupos e seus rituais, tanto do ponto de vista interno como externo. As negociações internas implicam em entender o que José Reginaldo Gonçalves (2005) chamou de ressonância dos símbolos e práticas na comunidade, ou seja, a identificação coletiva em torno de referências relacionadas a uma memória coletiva e a uma tradição que vai sendo transmitida entre as gerações e que, na luta pela permanência, vai sendo repensada e reconstruída contra o tempo presente, racionalizado, que dessacraliza das relações sociais. Externamente, realizar o levantamento desses grupos - mais conhecidos e também aqueles menores e sem evidência - pode permitir a compreensão da polissemia de significados, assim como de permanências e comunhão cultural, além da percepção em torno das relações de força e de resistência – étnicas, de gênero, geracional e de classe - numa região em que há pouco reconhecimento dessas manifestações e em que a possibilidade do festejo também pode contribuir, no presente, para que os congadeiros ocupem uma posição de destaque e sejam vistos socialmente. Esse caráter místico permanece significando e justificando os festejos dos diferentes grupos de Congado, não apenas em Machado – onde existe há mais de 90 anos - mas nas cidades vizinhas. Para Carlos Rodrigues Brandão (1985), quanto mais próximo a São Paulo, no entanto, mais pode se observar o apagamento ou a transformação das tradições da Congada, com a introdução de novos instrumentos, como o sopro, o saxofone, a clarineta e o trompete, que se misturam aos tradicionais tambores, pandeiros e caixas que, no passado, davam um tom mais marcado, cadenciado e harmonioso aos ternos do congo. A introdução, inclusive, de apitos e tambores de alumínio, próprios de escolas de samba, teriam dado às apresentações um caráter mais “barulhento”, diferente das marcas ritualísticas, registradas das congadas. Para ele também as cores utilizadas pelos ternos foram sendo modificadas, como a diversidade de cores misturadas aos tradicionais branco e azul das roupas. A gestualidade também estaria sofrendo transformações em cada agremiação, em diferentes cidades, principalmente pelo desinteresse das novas gerações que pouco guardam as toadas. Esse último aspecto foi percebido por mim na observação das performances dos congadeiros em Alfenas, quando jovens pouco se envolveram nas
  • 7. danças e demonstravam desconhecimento das letras, além de manifestarem pouca devoção, em gestos mecânicos e quase sem sentido. Para Brandão existem festas onde as equipes guardam ainda um conheicmento suficiente de seus cantos e passos da marcha e dança. Mas os gestos finos da reciprocidade, da deferência e da devoção foram apagados. Essa poderia ser a diferença entre o que se vê ainda em Oliveira e o que se encontra em Machado, também em Minas Gerais, mais ao sul em direção a São Paulo (BRANDÃO, s.d., p. 185/186). A perda de significado para as novas gerações e para a sociedade voltada ao consumo, influenciadas por uma temporalidade mais dessacralizada e competitiva, tem contribuído para que as práticas do Congado sejam valorizadas apenas como folclórica (no sentido de exótica, de estranha ou curiosidade), ou pelo volume e quantidade de instrumentos ou apresentações performáticas, atendendo a interesses por espetáculos. Isso tem preocupado os membros mais velhos, que procuram, incansavelmente, reunir os diferentes grupos, contra o tempo diluidor do capitalismo e a ideia da constituição de comunidades estéticas4 , como chamou Zigmunt Bauman (2005). Desta forma, torna-se relevante para os estudos sobre tradição oral, memória e identidade (ligados efetivamente às preocupações com o patrimônio imaterial5 ) e para o debate e o reconhecimento público, evidenciar as relações, as preocupações e as demandas dessas comunidades culturais e religiosas, que procuram sobreviver e resistir às transformações em suas vidas cotidianas, marcadas pela pobreza, pela exclusão e desmerecimento no contexto urbano e de mundialização cultural. Por meio das celebrações e de seus rituais mais cotidianos, em especial a umbanda na cidade de Alfenas, os membros das Congadas procuram tornar visíveis as relações étnicas, culturais, míticas e sociais, expressando suas críticas a um mundo racionalizado e fragmentado. Procuram defender-se dos problemas que os afligem em seus bairros, lutam contra a quase invisibilidade social, objetivando tornar suas 4 Comunidades estéticas ou “guarda-roupa” são aquelas cuja existência é efêmera, dada pela necessidade de se pertencer a um grupo e cuja identidade se constitui por marcas e símbolos relacionados à aparência, estéticos e vazios de sentido. 5 Patrimônio imaterial ou intangível, segundo definição do IPHAN, diz respeito àquelas práticas e domínios da vida social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de fazer; celebrações; formas de expressão cênicas, plásticas, musicais ou lúdicas; e nos lugares
  • 8. manifestações em denúncia contínua, muitas vezes, da discriminação social. As famílias ligadas aos ternos são detentoras de saberes e fazeres, sabem as razões de sua existência, conhecem as sequências ritualísticas, seus segredos, fundamentos, conceitos, gestos, cantos e palavras sagradas. Importante salientar que nem sempre os “donos” dos ternos são homens – capitães e presidentes – pois em certos casos, como no bairro Pinheirinho, em Alfenas, são as mulheres as “mestres”, articuladoras e mediadoras da comunidade. Maria Dalva Soares (2010), que pesquisou sobre a participação feminina no Congado de Belo Horizonte, afirma que Na organização dos festejos e em todas as outras possibilidades de participação no Reinado, a mulher sempre esteve presente, porém ocupando espaços diferenciados dos homens. Durante muitos anos, só era permitido às mulheres participar como rainhas, princesas, zeladoras, juízas, bandeireiras, responsáveis pelos enfeites e pela preparação da comida que é servida durante os rituais — posições de menor visibilidade, espaços menos valorizados na hierarquia do ritual — mas nunca como caixeiras ou dançantes. Atualmente, pela capital e pelo interior do estado, constata-se a presença de mulheres em funções que, até algum tempo atrás, eram exclusivamente dos homens. Hoje já é possível encontrar mulheres caixeiras, dançantes e até capitãs comandando os grupos.(SOARES, 2010, p.18) A transmissão de conhecimentos demarca prestígio e posições no interior dos grupos de Congado, como na Umbanda, no Jongo e na Folia de Reis. São os “mestres” que orientam, expõem os preceitos a serem seguidos, em nome de santos e entidades, que se expressam nos cantos, nas danças, símbolos e na bênção concedida aos membros, acompanhada pela toada dos congadeiros. Santos como Nossa Senhora do Rosário, ou as entidades nas religiões afro- brasileiras significam e representam símbolos, gestualidade e crenças que constituem a construção de identidade coletiva, contra olhares pejorativos - sejam produzidos por valores religiosos, étnicos, de força ou meramente mercadológicos. A memória transmitida entre as gerações e entre os próprios grupos contemporâneos de congadeiros, nesse sentido, funciona como afirmação identitária e desejo de preservação de um patrimônio, entendido como posse e recriação coletiva constante. O trabalho tem sido desenvolvido, acompanhando as festas que acontecem entre maio e setembro, variando em cada cidade. Ali, o grupo de pesquisadores busca realizar
  • 9. um levantamento de diferentes grupos de cultura afrodescendente – especialmente a Congada – nas cidades do sul de Minas Gerais, em direção a São Paulo (Alfenas, Machado, Areado, Poços de Caldas e Boa Esperança), sobre os quais há pouco registro e estudo, observando, conhecendo e registrando os mitos, os festejos e a dinâmica de transmissão da tradição ligada à Congada, nessas cidades, entendendo o trâmite entre o cristianismo e as religiões de matrizes africanas. Também são objetivos da pesquisa compreender a organização interna das comunidades religiosas/culturais, com seus conflitos e relações de gênero, classe e intergeracionais; observar as relações entre os grupos das diferentes cidades, procurando entender as relações de sociabilidade e/ou poder entre elas, assim como a recepção/discriminação das comunidades locais, fortemente ligadas pelo cristianismo; acompanhar os principais festejos, as permanências e recriações simbólicas de adereços, instrumentos e simbologias, utilizados na composição coreográfica, cenográfica e religiosa da festa; perceber como a memória e a oralidade contribuem na transmissão da tradição oral entre as gerações, identificando as dificuldades de permanência e as reinvenções; identificar e entender a memória e a tradição enquanto campos de força, nos quais se estabelece o jogo social de esquecer e lembrar, assim como espaços simbólicos de construção identitária. A oralidade e a memória coletiva É importante pensar a memória coletiva e individual, a tradição e sua transmissão, como fundamentais para entender as apropriações do passado e seus usos sociais pelas comunidades no presente. A produção, a permanência e a recriação do passado, presentificado constantemente pelos membros do Congado e de outras manifestações afro-brasileiras, devem ser entendidas como formas de gestão e representação do passado, expresso na cena pública pelas performances musicais e pelos festejos religiosos. Segundo Maurice Halbwachs (2006), a memória coletiva é essencial para a coesão social em meio à sociedade em que a experiência é desvalorizada. A memória é o sustento da tradição oral, por meio de mecanismos de acumulação, conservação,
  • 10. reinvenção, atualização e reconhecimento de elementos simbólicos que contribuem para a elaboração da identidade coletiva. Nesse sentido, entende-se as Congadas como manifestações e representações sociais que se constituem a partir do compartilhamento de memória em diferentes localidades e temporalidades, contra formas de discriminação e exclusão social. Para Elizabeth Kiddy, que estudou a Congada na cidade de Oliveira, região central de Minas Gerais, o Congado é uma tradição polissêmica que se mantém viva pela forma como os rituais religiosos e performáticos se adaptam ao tempo presente, pois “projeta-se nas acomodações das práticas ritualísticas uma força espiritual, baseada nos ‘preto-véios’ e ancestrais, expressa na devoção à santa” (KIDDY, 2005, p.45-60). A oralidade e a habilidade de adaptação realizam o processo de esquecimento e inovação constantes, necessários à sobrevivência dos grupos culturais. Carlos Rodrigues Brandão (1985) escreveu sobre a festa do Congado em Catalão (Goiás) e percebeu as diversas facetas da sociabilidade que os seus membros constituem como formas de sobrevivência identitária e resistência negra, tendo sua origem nas irmandades e nas práticas sociais e religiosas dos ternos. Para Patrícia Costa, que analisou a Congada na Serra do Salitre, oeste de Minas Gerais (2006), a escravidão e a coroação dos reis congos, celebrados nos rituais atuais “promovem a reconciliação com esse passado traumático, na medida em que diversos ternos atualizam durante os festejos a aparição de N. Sra. do Rosário para os cativos, evento transformador da imagem e do valor do escravo perante os senhores” (COSTA, 2006, p.12). Sobre as Congadas localizadas mais ao sul de Minas Gerais existem poucos trabalhos desenvolvidos e não é possível, ainda, afirmar sobre seus significados, sejam culturais ou políticos, diante de um mundo cada vez mais rápido, dessacralizado e superficial. É possível encontrar pesquisas em torno das congadas em Belo Horizonte (SOARES, 2010), Sete Lagoas (GARONE, 2008) e São João Del Rei (SILVA, 2009). Ao sul do estado, porém, em que os grupos religiosos e culturais parecem ser menos evidentes e reconhecidos, há dificuldades em encontrar estudos historiográficos ou mesmo de caráter antropológico.
  • 11. Cabe destaque ao trabalho de Carlos Rodrigues Brandão (1985) que, de forma mais genérica, fala das manifestações em Minas Gerais, e à obra de Lilian S.Cézar (2012) sobre a Congada realizada na cidade de São Sebastião do Paraíso, há cerca de 200 km de Alfenas. Há também um pequeno livro sobre a cidade de Machado, onde há a realização de folguedos, numa prática das mais antigas e que se realiza todo ano, no mês de outubro. Esta cidade, junto com Poços de Caldas e São Sebastião do Paraíso, permanece insistindo nas apresentações de seus grupos, embora haja notícias de que as dificuldades são cada vez maiores e que as novas gerações tenham apresentado pouco interesse em sua difusão e prática, enfraquecendo alguns ternos. Considerações finais Pretendeu-se, aqui, apresentar a pesquisa que se desenvolve no sul de Minas, juntamente a alunos da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL), por meio da observação participante, a história oral dos membros das Congadas e o registro das Festas do Rosário e São Benedito e as manifestações da Congada, realizadas pelos grupos no sul de Minas Gerais. Procura-se perceber o registro de suas variações, nominações e recriações, assim como das permanências entre comunidades de cidades e famílias diferentes, ou mesmo de congadeiros dentro de uma mesma cidade, ligados a uma mesma família, como é o caso das mulheres do bairro Pinheirinho, em Alfenas. A partir do registro de seus festejos – e também de seu cotidiano na comunidade – será possível perceber a constituição de diferentes ternos, com suas roupagens, instrumentos, danças, cantos, ritmos, santos e mitos (seu patrimônio material e imaterial); os diferentes papéis assumidos por homens e mulheres, velhos e jovens, no processo de manutenção ou reconstituição das práticas religiosas ou de interação social. A fim de entender a transmissão de saberes e fazeres, torna-se importante também a realização de entrevistas orais, procurando ouvir as narrativas dos chamados “mestres” e membros de cada manifestação a ser identificada, sobre as transformações no tempo e no espaço das práticas coletivas. Por meio de questionário semiestruturados e também conversas informais, espero abordar a tradição oral, entendida como a capacidade dos congadeiros de repetir/memorizar/preservar os elementos da cultura religiosa, aliada à improvisação/recriação/inventividade em sua transmissão às novas
  • 12. gerações, inseridos no processo de mercantilização da cultura. Parto aqui das mesmas premissas apresentadas por Verena Alberti sobre tradição oral: Os objetos transmitidos pela tradição oral não são imutáveis. Canções, ditos populares, rezas, mitos etc não são, digamos, produtos intactos disponíveis em prateleira, os quais podemos escolher. (...) A tradição oral, como as tradições de modo geral, está calcada na repetição. (ALBERTI, 2005, p.18) Além das entrevistas e da observação, serão registradas em vídeo e fotografia as performances dos grupos de Congado. A produção de um filme sobre os participantes da Congada pode se transformar num processo importante de colaboração e devolução às comunidades, assim como tem valor fundamental para a constituição de identidade, para o autorreconhecimento de seus membros. Mais do que isso, as relações entre conhecimento acadêmico e os saberes comunitários, entre universidade e congadeiros, deve contribuir para a publicização das culturas populares, para seu empoderamento quanto à questão não apenas no sentido do registro de seu patrimônio imaterial, mas na elaboração de políticas públicas que resultem em melhoria de suas vidas. Acredita-se que a memória coletiva e a oralidade, preservadas pelos velhos como “reservatórios”, tenham papel fundamental na tentativa de coesão e resistência desses grupos diante das ameaças de dissolução da identidade cultural e religiosa dessas comunidades. Como crenças, práticas, símbolos, cantos e danças não são registrados na forma escrita, a repetição deles no cotidiano e nas trocas geracionais contribuem para a continuidade e fortalecimento dos grupos. Isso não significa, no entanto, que identificar, conhecer, reconhecer e registrá-los na forma escrita ou nas mídias tenha o sentido de congelá-los e perpetuá-los, pois, como afirma José Reginaldo Gonçalves (2005), a tradição é patrimônio vivo que só pode continuar a existir no jogo da lembrança e do esquecimento, da conservação e da inovação, a partir do desejo de quem o constrói cotidianamente, na busca da sobrevivência étnico-cultural. Referências bibliográficas ALBERTI, Verena. Tradição oral e história oral: proximidades e fronteiras. História Oral. v.8, n.1, p.11-28, jan-jun, 2005. BAUMAN, Zygmunt. Comunidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.
  • 13. BORGES, C. M. Escravos e libertos nas irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas Gerais – séc. XVIII e XIX. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2005. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A festa do Santo Preto. 2° Ed. Rio de Janeiro: Funarte/ UFGO, 1985. CEZAR, Lilian Sagio. Saberes contados, saberes guardados: a polissemia da congada de São Sebastião do Paraíso, Minas Gerais. Horizontes Antropológicos. vol.18 no.38 Porto Alegre July/Dec. 2012 COSTA, Patrícia Trindade Maranhão. As raízes da Congada: a renovação do presente pelos filhos do rosário. Tese de doutorado em Antropologia Social. Universidade de Brasília. Brasília, 2006. GARONE, Taís Diniz. Uma poética da mediação: historia, mito e ritual no Congado Setelagoano (MG). Dissertação.Universidade de Brasília, 2008. GONÇALVES, José Reginaldo S. Ressonância, materialidade e subjetividade: as culturas como patrimônio. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 11, n. 23, p. 15-36, jan/jun 2005 HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Ed. Centauro, 2004. MONTEIRO, M. F. M. Onde tem fumaça: Reis Congos e resistência cultural afro- brasileira. Reunião Brasileira de Antropologia. Olinda: Associação Brasileira de Antropologia, 2004. p. 322. RABAÇAL, Alfredo. As congadas no Brasil. São Paulo: Secretaria de Cultura, Ciência e Tecnologia. Conselho Estadual de Cultura, 1976. SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 16, n. 2, p. 5-22, jul./dez., 1990. SILVA, Daniel Albergaria. O Ritual da Congada e o “estar no rosário”: um estudo etnográfico acerca da festa e das mediações em São João del Rei. Dissertação de Mestrado.Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora, 2009. SOARES, Maria Dalva; LOPES, Maria de Fátima. Gênero e Poder na tradição do Congado em Belo Horizonte, MG. Fazendo Gênero 9. Diásporas, Diversidades, Deslocamentos. 23 a 26 de agosto de 2010.
  • 14. SOUZA, Marina de Mello e. Reis Negros no Brasil Escravista. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.