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Ligas camponesas

As ligas camponesas constituíam uma entidade que organizava os camponeses em
torno da luta pela reforma agrária, no sertão pernambucano. Uma das grandes lideranças
da liga foi Francisco Julião Arruda de Paula.

Foi o movimento mais importante pela reforma agrária no Brasil até o golpe de 1964.

A origem das Ligas remonta às antigas Ligas Camponesas da década de 1930,
originárias da ação do Partido Comunista do Brasil no campo. Com a ilegalidade do
Partido Comunista esses embriões das ligas foram aos poucos dissolvidas.

Na década de 1950 houve uma refundação das Ligas Camponesas, com alcance em
vários estados brasileiros.

Em 1954 se formou no engenho Galiléia, da cidade de Vitória de Santo Antão, a
Sociedade Agrícola e Pecuária de Plantadores de Pernambuco (SAPPP), com três fins
específicos: auxiliar os camponeses com despesas funerárias — evitando que os
camponeses falecidos fossem literalmente despejados em covas de indigentes ("caixão
emprestado"); fornecer assistência médica, jurídica e educação aos camponeses; e
formar uma cooperativa de crédito capaz de livrar aos poucos o camponês do domínio
do latifundiário.

No engenho Galiléia trabalhavam cerca de 140 famílias de camponeses em regime de
foro: em troca de cultivar a terra, deviam pagar uma quantidade fixa em espécie ao
proprietário da terra. É importante frisar que esse engenho já se encontrava em "fogo
morto", ou seja, inadequado para plantio de cana-de-açúcar.

A SAPPP, a princípio, aceita o apoio do proprietário do Galiléia e o convida para
assumir um cargo de honra dentro do movimento. Advertido, entretanto, por outro
proprietário da região, de que o movimento, de proposta comunista, teria finalidade
política, o proprietário do engenho ordena que o movimento seja desfeito
imediatamente, ameaçando os foreiros de expulsão e até de aumentar o valor do foro.
Os camponeses decidem resistir, mas sabiam que isolados no campo não conseguiriam
resistir por muito tempo. Resolveram, então, buscar apoio na cidade, encontrando na
figura do advogado Francisco Julião o apoio e o respaldo jurídico que tanto precisavam.

Francisco Julião (que já havia se pronunciado a favor dos camponeses),
institucionalizou a associação. No dia 1 de janeiro de 1955 a SAPPP passou a funcionar
legalmente.

A imprensa rapidamente chamou a SAPPP de "liga", em associação aos movimentos da
década de 1940. Em 1959 a SAPPP conseguiu a desapropriação do engenho. Enquanto
isso, o movimento espalhava-se pelo interior do estado, e a vitória dos galileus
estimulou bastante as lideranças camponesas a sonhar com uma reforma agrária. No
início da década de 1960, as ligas já se espalhavam por 13 estados brasileiros, atigindo
repercussão nacional e internacional.
Porém, com a instalação do regime militar em 1964 a reforma agrária não foi
implementada, pois as principais lideranças das ligas foram presas e o movimento
deixou de existir.

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Ligas camponesas

  • 1. Ligas camponesas As ligas camponesas constituíam uma entidade que organizava os camponeses em torno da luta pela reforma agrária, no sertão pernambucano. Uma das grandes lideranças da liga foi Francisco Julião Arruda de Paula. Foi o movimento mais importante pela reforma agrária no Brasil até o golpe de 1964. A origem das Ligas remonta às antigas Ligas Camponesas da década de 1930, originárias da ação do Partido Comunista do Brasil no campo. Com a ilegalidade do Partido Comunista esses embriões das ligas foram aos poucos dissolvidas. Na década de 1950 houve uma refundação das Ligas Camponesas, com alcance em vários estados brasileiros. Em 1954 se formou no engenho Galiléia, da cidade de Vitória de Santo Antão, a Sociedade Agrícola e Pecuária de Plantadores de Pernambuco (SAPPP), com três fins específicos: auxiliar os camponeses com despesas funerárias — evitando que os camponeses falecidos fossem literalmente despejados em covas de indigentes ("caixão emprestado"); fornecer assistência médica, jurídica e educação aos camponeses; e formar uma cooperativa de crédito capaz de livrar aos poucos o camponês do domínio do latifundiário. No engenho Galiléia trabalhavam cerca de 140 famílias de camponeses em regime de foro: em troca de cultivar a terra, deviam pagar uma quantidade fixa em espécie ao proprietário da terra. É importante frisar que esse engenho já se encontrava em "fogo morto", ou seja, inadequado para plantio de cana-de-açúcar. A SAPPP, a princípio, aceita o apoio do proprietário do Galiléia e o convida para assumir um cargo de honra dentro do movimento. Advertido, entretanto, por outro proprietário da região, de que o movimento, de proposta comunista, teria finalidade política, o proprietário do engenho ordena que o movimento seja desfeito imediatamente, ameaçando os foreiros de expulsão e até de aumentar o valor do foro. Os camponeses decidem resistir, mas sabiam que isolados no campo não conseguiriam resistir por muito tempo. Resolveram, então, buscar apoio na cidade, encontrando na figura do advogado Francisco Julião o apoio e o respaldo jurídico que tanto precisavam. Francisco Julião (que já havia se pronunciado a favor dos camponeses), institucionalizou a associação. No dia 1 de janeiro de 1955 a SAPPP passou a funcionar legalmente. A imprensa rapidamente chamou a SAPPP de "liga", em associação aos movimentos da década de 1940. Em 1959 a SAPPP conseguiu a desapropriação do engenho. Enquanto isso, o movimento espalhava-se pelo interior do estado, e a vitória dos galileus estimulou bastante as lideranças camponesas a sonhar com uma reforma agrária. No início da década de 1960, as ligas já se espalhavam por 13 estados brasileiros, atigindo repercussão nacional e internacional.
  • 2. Porém, com a instalação do regime militar em 1964 a reforma agrária não foi implementada, pois as principais lideranças das ligas foram presas e o movimento deixou de existir.