Este documento descreve a vida e obra do Padre António Vieira, um jesuíta e escritor português do século XVII. Ele nasceu em Lisboa e emigrou para o Brasil aos 6 anos, onde estudou e ingressou na Companhia de Jesus aos 15 anos. Vieira teve uma carreira prolífica como pregador, missionário, diplomata e escritor, embora também enfrentou perseguições da Inquisição por suas ideias.
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Padre António Vieira nasceu em 6 de fevereiro de 1608 em Lisboa. Aos
6 anos (1614), emigrou para a Baía, no Brasil, com a sua família.
Estudou no Colégio dos Jesuítas da Baía onde teve um ensino rígido.
Com quinze anos, fugiu dos pais para ingressar na Companhia de Jesus.
Em 5 de maio desse ano (1623), inicia um noviciado. Passados três
anos, tomava uma posição importante na Companhia. Aos dezoito anos
foi convidado para escrever a anua, isto é, escrever o relatório anual dos
feitos do colégio, em latim, que seria enviado para o papa de Roma. Em
1633, com vinte e cinco anos, iniciou-se oficialmente como pregador.
Tornou-se sacerdote, passando a exercer a função de pregador em
algumas aldeias baianas durante cinco anos. Os sermões desta altura
tinham como temas principais a religião, política e os problemas da
época. Em 1641, partiu para Portugal acompanhando o filho do vice-rei
do Brasil com a intenção da colônia aderir ao novo rei e à restauração.
Este tornou-se amigo fiel de D. João IV e ainda inicia a sua carreira
pública e política. Iniciou, em 1646, várias missões diplomáticas oficiais
(tentou negociar com chefes políticos e comunidades judaicas a fim de
cativá-los para a fundação de companhias comerciais portuguesas) por
toda a Europa. Em 1649, formou uma política com novos ideais
constituídas pelos cristãos-novos de todo mundo.
5.
No ano de 1652, regressa ao Brasil como missionário
no estado de Maranhão, após vários conflitos na
companhia de Jesus, que quase lhe valeram a
expulsão. Torna-se ativo no secular antagonismo entre
jesuítas e colonos com o propósito de utilizar mão de
obra indígena. A 13 de junho de 1654, prega o Sermão
de Santo António e parte ilegalmente para Lisboa.
Volta ao Brasil, em 1655, com a lei que beneficiava a
autoridade dos jesuítas sobre os índios. Passado um
ano, redige a carta Esperanças de Portugal, Quinto
Império do Mundo, defendendo as trovas de Bandarra
e prevendo a ressurreição de D. João IV. Esta carta foi
a base do processo que o Santo Ofício levantou contra
ele, visto que constava as suas opiniões profanas. Com
cinquenta e três anos de vida, é, juntamente com todos
os jesuítas, expulso de Maranhão. Padre António
Vieira é desterrado no Porto.
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7.
Em 1663, após dois anos, entra na prisão do tribunal do Santo
Ofício em Coimbra.
Citando a sua sentença: “ (…) seja privado para sempre de voz
ativa e passiva e do poder de pregar, e recluso no colégio ou casa
de sua religião que o Santo Ofício lhe ordenar, e de onde, sem
ordem sua não sairá.”
Um tempo depois, foi perdoado e recomeçou com as suas pregações
em Lisboa. Em 1669, embarcou para Roma, onde obteve bastante
êxito. Realizou uma campanha de desmascaramento, contra o
tribunal do Santo Ofício, lutando a favor das missões no Brasil. Com
setenta e um anos, é publicado o primeiro volume dos seus Sermões.
Entre 1681 e 1688, retorna para a Baía, já que não encontrava um
bom ambiente em terras portuguesas. Lá é nomeado Visitador da
Província do Brasil. Morre, aos oitenta e nove anos, na Baía, após
ter revisto o décimo terceiro volume dos Sermões, sem conseguir
finalizar a obra Clavis Prophetarum.
8. As obras de Padre António Vieira podem ser divididas em
profecias, cartas e sermões. Este escreveu cerca de
quinhentas cartas que relatam assuntos acerca da relação
entre Portugal e Holanda, sobre a inquisição e os judeus
convertidos (cristãos-novos) e cerca de duzentos
sermões, com o estilo barroco brasileiro presente.
Algumas das suas obras são:
9.
“(…) Quando Cristo mandou pregar os Apóstolos pelo
Mundo, disse-lhes desta maneira: Euntes in mundum
universum, praedicate omni creaturae: «Ide, e pregai a
toda a criatura». Como assim, Senhor?! Os animais não são
criaturas?! As árvores não criaturas?! As pedras não são
criaturas?! Pois hão os Apóstolos de pregar às pedras?!
Hão-de pregar aos troncos?! Hão-de pregar aos animais?!
Sim, diz S.Gregório, depois de Santo Agostinho. Porque
como os Apóstolos iam pregar a todas as nações do Mundo,
muitas delas bárbaras e incultas, haviam de achar os
homens degenerados em todas as espécies de criaturas:
haviam de achas homens, haviam de achar homens brutos,
haviam de achar homens troncos, haviam de achar homens
pedras. (…)”
10.
“Com estas palavras piedosamente resolutas, mais protestando, que
orando, dá fim o Profeta Rei ao Salmo quarenta e três. Salmo, que desde o
princípio até o fim, não parece senão cortado para os tempos e ocasião
presente. O Doutor Máximo S. Jerónimo, e depois dele os outros
expositores, dizem que se entende à letra de qualquer reino ou província
católica, destruída e assolada por inimigos da Fé. Mas entre todos os reinos
do Mundo a nenhum lhe quadra melhor que ao nosso Reino de Portugal; e
entre todas as províncias de Portugal a nenhuma vem mais ao justo que à
miserável província do Brasil. Vamos lendo todo o Salmo, e em todas as
cláusulas dele veremos retratadas as da nossa fortuna: o que fomos e o que
somos. Deus, auribus nostris audivimus, Patres nostri annuntiaverunt
nobis, opus, quod operatus es in diebus eorum, et in diebus antiquis.
Ouvimos (começa o profeta) a nossos pais, lemos nas nossas histórias e
ainda os mais velhos viram, em parte, com seus olhos as obras
maravilhosas, as proezas, as vitórias, as conquistas, que por meio dos
portugueses obrou em tempos passados vossa omnipotência, Senhor.
Manus tua gentes disperdit, et plantasti eos; afflixisti populos et expulisti
eos. “
11.
“Vós, diz Cristo Senhor nosso, falando com os Pregadores, sois o
sal da terra: e chama-lhe sal da terra, porque quer que façam na
terra, o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção, mas
quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo
tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a
causa desta corrupção? Ou porque o sal não salga, ou porque a
terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os
Pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra
se não deixa salgar, e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina
que lhe dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e
os Pregadores dizem uma coisa e fazem outra; ou porque a terra
se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles
fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os
Pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não
deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a
seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal. (...)”
12.
“Ao Padre Francisco de Morais Do Maranhão, a 6V1653
Enfim, amigo, pôde mais Deus que os homens, e prevaleceram todos
os decretos divinos a todas as traças e disposições humanas. A
primeira vez vinha contra a vontade de Elrei; desta segunda vim até
contra a minha, para que nesta obra não houvesse vontade mais que
a de Deus. Seja ele bendito, que tanto caso faz de quem tão pouco
vale, e, tanto ama a quem tanto mal lho merece. Ajudaime, amigo, a
lhe dar infinitas graças, e a pedir a sua divina bondade ma dê, para
que ao menos neste último quartel da vida lhe não seja ingrato,
como fui tanto em toda. Ah! Quem pudera desfazer o passado, e
tornar atrás o tempo e alcançar o impossível, que o que foi não
houvera sido! Mas já que isto não pode ser, Deus meu, ao menos
seja o futuro emenda do passado, e o que há de ser emenda do que
foi. Estes são, amigo, hoje todos os meus cuidados, sem haver em
mim outro gosto mais que chorar o que tive, e conhecer quão
falsamente se dá este nome aos que, sobre tantos outros pesares, ou
hão de ter na vida o do arrependimento ou na eternidade o do
castigo.”