O documento discute o sistema prisional brasileiro, notando que: 1) Todos os estados brasileiros enfrentam déficit de vagas em prisões; 2) Há um déficit geral de 728.235 vagas no Brasil; 3) A superlotação viola os direitos dos presos e dificulta a ressocialização.
1. SISTEMA PRISIONAL
O sistema prisional é o meio pelo qual o Estado, em suas mais diversas atribuições de
poder, utiliza para punir aquele que agiu em desconformidade com a lei vigente no país. É
privado, então, de suas liberdades, todo aquele que praticar ato ilícito tipificado nos
dispositivos específicos1 criados pelo nosso Legislador.
O art. 32 do Código Penal nos coloca três tipos de penas, quais sejam, as penas
privativas de liberdades, as penas restritivas de direitos e as penas de multa. Como o intuito
do nosso trabalho é evidenciarmos a situação encontrada hoje em nosso país, analisaremos
melhor as penas privativas de liberdades e, dentro dessas, uma possível progressão de regime2
como auxiliar na ressocialização do apenado.
Nosso art. 33, do Código Penal, explicita onde deve ser cumprida a pena de reclusão:
"A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto" O § 1° do
art. 33 em suas alíneas a, b e c, determina os lugares específicos para cada tipo de regime, e é
o que trataremos agora.
As penitenciárias, para iniciarmos nosso tema proposto, são os estabelecimentos
penais destinados ao recolhimento de pessoas presas com condenação à pena privativa de
liberdade aplicadas em regime fechado3, executado em estabelecimento de segurança máxima
ou média. No regime fechado, que é o mais gravoso, o indivíduo permanece em celas
individuais ou coletivas, com direito a sair do isolamento carcerário apenas para banhos de
sol, receber visitas de amigos e familiares bem organizadas, estabelecidas pela direção do
presídio; fica o condenado, ainda, sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante
o repouso noturno, tal trabalho sendo compatível com as ocupações anteriores do condenado;
nesse regime o trabalho externo é admissível apenas em serviços ou obras públicas.
As colônias agrícolas, industriais ou similares são estabelecimentos penais destinados
a abrigar pessoas presas que cumprem pena em regime semiaberto4. No regime semiaberto,
menos gravoso que o regime fechado, o indivíduo fica sujeito ao trabalho em comum durante
o período diurno nos estabelecimentos citados acima; é admissível o trabalho externo, bem
como a frenquência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou
superior; nesse regime, ainda, são autorizadas saídas externas, sem vigilância, 28 vezes ao
ano. Ocorre, todavia, que as casas de albergado e as colônias agrícolas e/ou industriais não
1 Código Penal, de 1940; Código Civil, de 2002; Lei de Execução Penal (LEP), de 1984; e diversos outros
dispositivos.
2 Progressão de regime é a saída de um regime mais danoso e entrada emno regime menos danoso subsequente.
Essa progressão segue a critérios bemdelimitados pela Lei de execução Penal.
3 Art. 33, § 1°, alínea a, Código Penal.
4 Art. 33, § 1°, alínea b, Código Penal.
2. foram implementadas com eficiência no Brasil, embora a lei autorizadora seja de 1984.
Assim, os presos em regime semiaberto em quase totalidade cumprem pena juntamente com
os de regime fechado e os presos em regime aberto cumprem pena também em quase
totalidade em prisão domiciliar.
Há ainda, além da própria residência do apenado (ou estabelecimento adequado), as
casas do albergado, que são estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas que
cumprem pena privativa de liberdade em regime aberto5, ou pena de limitação de fins de
semana. Nesse regime, que é baseado na autodisciplina e senso de responsabilidade do
condenado, tal condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar,
frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o
período noturno e nos dias de folga; perderá tais benefícios do regime aberto, sendo
transferido ao regime subsequente mais gravoso, o indivíduo se praticar fato definido como
crime doloso ou não cumprir com as demais encargos atribuídos ao condenado pelo art. 36, §
2° do Código Penal.
Tais regimes tratados acima são determinados fundamentalmente pela espécie e
quantidade da pena e pela reincidência, aliadas ao mérito do condenado, num autêntico
sistema progressivo. Como afirma Moraes Pitombo6: "o regime torna-se, agora, o estado de
cumprimento de pena, em que se coloca o condenado, no tocante à intensidade modulada de
redução da liberdade". Por fim, a intenção do legislador, com a instauração de tais regimes,
foi possibilitar a gradual reabilitação de um apenado à sociedade.
SITUAÇÃO CARCERÁRIA NO BRASIL E UM BALANÇO DA CAPACIDADE DE
VAGAS EM PRESÍDIOS BRASILEIROS E O DÉFICIT DE VAGAS ATUAL NO PAÍS
O Brasil vive uma situação crítica em relação ao sistema prisional. Atualmente7 o
sistema prisional brasileiro conta com capacidade para 357.219 vagas divididas nos regimes
tratados acima. O Brasil, infelizmente, possui 711.463 presos condenados, isso somado aos
147.937 condenados em prisão domiciliar. Portanto, temos um déficit geral de 354.244 vagas
no Brasil, subtraídos os condenados em prisão domiciliar esse número cai para 206.307, o que
é, ainda, considerado um excedente alarmante. Esse número, por mais espantoso que seja, é
ainda agravado se somarmos o número de presos condenados ao número de mandados de
5 Art. 33, § 1°, alínea c, Código Penal.
6Antônio Sérgio Altieri de Moraes Pitombo, importante jurista e escritor no ramo penal.
7 CNJ: Diagnóstico de Pessoas Presas no Brasil, de junho de 2014. Disponível em:
http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/diagnostico_de_pessoas_presas_correcao.pdf; último acesso em
30/06/2015.
3. prisão cumpridos, totalizando 1.085.454 presos, chegando, por fim, ao incrível déficit geral de
vagas de 728.235.
Com esse número de 711.463 presos, o Brasil compõe o ranking dos países com maior
número de presos, perdendo apenas para EUA (1°) e China (2°). A falência do sistema
prisional brasileiro é tão notável que até mesmo em estudo de comparações com outros países
(que inclui Argentina, Alemanha, México e África do Sul) onde, a cada 100.000 habitantes, o
Brasil possui 358 presos, o que, aparentemente, não seria tão expressivo se o Brasil não
tivesse 200.000.000 de habitantes e não contasse com déficit da metade do número de presos.
Dos países citados, a Alemanha é o único que não ocupa toda a capacidade do sistema, tendo
apenas 62.632 presos, o que representa 82% da capacidade final (76.556).
Destaque importante cabível para verificarmos ainda melhor a falência do sistema
prisional é o fato de que, dos 27 Estados brasileiros, nenhum, exatamente isso, nenhum deles
possui o número de vagas em seus presídios maior do que o número de presos, ou seja, todos
encontram-se em déficit de vagas.
Para evidenciarmos ainda mais a falência do sistema prisional, utilizaremos agora a
Lei de Execução Penal (LEP)8.
Logo em seu primeiro artigo é exposto o objetivo da LEP. Segundo art. 1º: "A execução
penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar
condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. Destacamos ainda
o art. 88: "O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho
sanitário e lavatório. Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular: a)
salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e
condicionamento térmico adequado à existência humana; b) área mínima de 6,00m2 (seis
metros quadrados)".
Observado os artigos citados e a realidade atual de nosso sistema carcerário constatamos
que, além dos direitos fundamentais garantidos na Constituição da República, em seu art. 5°,
XLIX: "é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral", os direitos previstos
na LEP citados acima estão sendo descumpridos em sua totalidade. A falta de vagas nos
presídios, que abrigam mais de 20 presos em uma mesma cela, incompatível, portanto, com o
art. 88 da LEP, colabora para que haja desrespeito à integridade física e moral dos demais
presos, sendo, na maioria das vezes, violados e abusados sexualmente onde, nesse tipo de
situação, o mais fraco fica submisso ao mais forte. Tal superlotação contribui diretamente
8 Lei de Execução Penal, de 1984. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/leis/L7210.htm;
último acesso em 30/06/2015.
4. para o aumento no número de rebeliões e que, no fim, não contribui em nada com a
ressocialização do indivíduo apenado que, por estar inserido em um contexto desfavorável e
em condições subumanas, acaba ainda mais revoltado e aumenta estatisticamente o número de
reincidentes no país.
O problema da superlotação não é fácil de se resolver, mas um interessante começo seria
a conscientização da população em relação à aceitação da construção de novas penitenciárias
e cadeias que, por diversas vezes, são barradas pelo medo da população em estar ainda mais
exposta, uma vez que estariam mais perto dos apenados. A educação é a base para que um
país se torne bem desenvolvido e com boas condições para que o apenado seja ressocializado
e não venha a ser reincidente. É preciso, sim, de que se construa mais presídios para que se
garanta, primeiro, os direitos fundamentais aos presos e, a longo prazo, que haja investimento
pesado em educação para que, enfim, sanemos as desigualdades, o que implicaria diretamente
na redução do número de presos e de criminosos do país.