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Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS
E EPISTEMOLÓGICOS
DA EDUCAÇÃO E SUAS
IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA
PEDAGÓGICA
PÓS-GRADUAÇÃO
NÚCLEO COMUM CURSOS DE EDUCAÇÃO
MARINGÁ-PR
2012
Reitor: Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor: Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de Administração: Wilson de Matos Silva Filho
Presidente da Mantenedora: Cláudio Ferdinandi
NEAD - Núcleo de Educação a Distância
Diretoria do NEAD: Willian Victor Kendrick de Matos Silva
Coordenação Pedagógica: Gislene Miotto Catolino Raymundo
Coordenação de Marketing: Bruno Jorge
Coordenação Comercial: Helder Machado
Coordenação de Tecnologia: Fabrício Ricardo Lazilha
Coordenação de Curso: Márcia Maria Previato de Souza
Assessora Pedagógica: Fabiane Carniel
Supervisora do Núcleo de Produção de Materiais: Nalva Aparecida da Rosa Moura
Capa e Editoração: Daniel Fuverki Hey, Fernando Henrique Mendes, Luiz Fernando Rokubuiti e Thayla Daiany Guimarães Cripaldi
Supervisão de Materiais: Nádila de Almeida Toledo
Revisão Textual e Normas: Cristiane de Oliveira Alves, Gabriela Fonseca Tofanelo, Janaína Bicudo Kikuchi, Jaquelina Kutsunugi e Maria Fernanda
Canova Vasconcelos
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central - CESUMAR
“As imagens utilizadas neste livro foram obtidas a partir do site PHOTOS.COM”.
Av. Guedner, 1610 - Jd. Aclimação - (44) 3027-6360 - CEP 87050-390 - Maringá - Paraná - www.cesumar.br
NEAD - Núcleo de Educação a Distância - bl. 4 sl. 1 e 2 - (44) 3027-6363 - ead@cesumar.br - www.ead.cesumar.br
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS
E EPISTEMOLÓGICOS
DA EDUCAÇÃO E SUAS
IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA
PEDAGÓGICA
Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo
5FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
APRESENTAÇÃO DO REITOR
Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desafio para todos os cidadãos. A busca por
tecnologia, informação, conhecimento de qualidade, novas habilidades para liderança e solução de
problemas com eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho.
Cada um de nós tem uma grande responsabilidade: as escolhas que fizermos por nós e pelos nossos fará
grande diferença no futuro.
Com essa visão, o Cesumar – Centro Universitário de Maringá – assume o compromisso de democratizar
o conhecimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros.
Nocumprimentodesuamissão–“promoveraeducaçãodequalidadenasdiferentesáreasdoconhecimento,
formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e
solidária” –, o Cesumar busca a integração do ensino-pesquisa-extensão com as demandas institucionais
e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento da consciência
social e política e, por fim, a democratização do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração
com a sociedade.
Diante disso, o Cesumar almeja ser reconhecido como uma instituição universitária de referência regional
e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição de competências institucionais para
o desenvolvimento de linhas de pesquisa; consolidação da extensão universitária; qualidade da oferta dos
ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão
acadêmica e administrativa; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com
o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relacionamento permanente com os egressos,
incentivando a educação continuada.
Professor Wilson de Matos Silva
Reitor
6 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
Caro aluno, “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou
a sua construção” (FREIRE, 1996, p. 25). Tenho a certeza de que no Núcleo de Educação a Distância
do Cesumar, você terá à sua disposição todas as condições para se fazer um competente profissional e,
assim, colaborar efetivamente para o desenvolvimento da realidade social em que está inserido.
Todas as atividades de estudo presentes neste material foram desenvolvidas para atender o seu processo
de formação e contemplam as diretrizes curriculares dos cursos de graduação, determinadas pelo
Ministério da Educação (MEC). Desta forma, buscando atender essas necessidades, dispomos de uma
equipe de profissionais multidisciplinares para que, independente da distância geográfica que você esteja,
possamos interagir e, assim, fazer-se presentes no seu processo de ensino-aprendizagem-conhecimento.
Neste sentido, por meio de um modelo pedagógico interativo, possibilitamos que, efetivamente, você
construa e amplie a sua rede de conhecimentos. Essa interatividade será vivenciada especialmente no
ambiente virtual de aprendizagem – AVA – no qual disponibilizamos, além do material produzido em
linguagem dialógica, aulas sobre os conteúdos abordados, atividades de estudo, enfim, um mundo de
linguagens diferenciadas e ricas de possibilidades efetivas para a sua aprendizagem. Assim sendo, todas
as atividades de ensino, disponibilizadas para o seu processo de formação, têm por intuito possibilitar o
desenvolvimento de novas competências necessárias para que você se aproprie do conhecimento de
forma colaborativa.
Portanto, recomendo que durante a realização de seu curso, você procure interagir com os textos, fazer
anotações, responder às atividades de autoestudo, participar ativamente dos fóruns, ver as indicações
de leitura e realizar novas pesquisas sobre os assuntos tratados, pois tais atividades lhe possibilitarão
organizar o seu processo educativo e, assim, superar os desafios na construção de conhecimentos.
Para finalizar essa mensagem de boas-vindas, lhe estendo o convite para que caminhe conosco na
Comunidade do Conhecimento e vivencie a oportunidade de constituir-se sujeito do seu processo de
aprendizagem e membro de uma comunidade mais universal e igualitária.
Um grande abraço e ótimos momentos de construção de aprendizagem!
Professora Gislene Miotto Catolino Raymundo
Coordenadora Pedagógica do NEAD- CESUMAR
7FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
APRESENTAÇÃO
É necessário que os professores reflitam sobre as suas concepções de conhecimento
Livro: FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES
PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA
Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo
Prezado(a) acadêmico(a), fazer-se docente é um desafio! É reconhecer que somos seres culturais, afetiva
e socialmente construídos. Desta forma, com o objetivo de cooperar no processo de formação de um
profissional da educação, que possa a partir de sua prática pedagógica contribuir para a formação de um
cidadão pleno1
, compartilho com você as minhas indagações e reflexões sobre a formação de professores
e as possibilidades de construir, significativamente, o processo de ensinar e de aprender.
Compartilho a ideia apresentada por Gimeno Sacristán e Pérez Gómez (1998), de que qualquer tentativa
de mudança no sistema educativo, em busca da qualidade de ensino, deverá ter como uma das pedras
angulares a formação inicial e continuada de professores. No entanto, gostaria de enfatizar que acredito
que a melhoria da qualidade do ensino brasileiro não pode ser analisada exclusivamente sob a ótica
dos que conduzem o processo – os professores – mas deve ser refletida, considerando a influência
dos fatores históricos, políticos, sociais e econômicos que determinam as práticas educativas e seus
fundamentos no contexto da sala de aula.
Desta forma, o meu objetivo ao organizar a disciplina de “Fundamentos Históricos e Epistemológicos da
Educação e suas Implicaçõespara a Prática Pedagógica”épossibilitarmomentos deestudo einquietações
que certamente o conduzirá a reflexões teórico-práticas sobre o processo de ensinar e aprender.
Por conseguinte, recomendo que durante essa disciplina procure interagir com os textos, fazer anotações,
responder as atividades de autoestudo, anotar suas dúvidas, ver as indicações de leitura e realizar novas
1
Segundo Freire (1996), denomina-se cidadão pleno o indivíduo que tem acesso à educação e que por meio da aquisição do conhecimento científico
possa desvelar a complexidade das relações sociais do seu entorno.
Fonte:PHOTOS.COM
8 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
pesquisas sobre os assuntos tratados, pois com certeza não será possível esgotar essa temática nos
momentos de estudos que juntos compartilharemos nesta disciplina.
Para que você possa trilhar comigo esse processo de reflexão, apresento-lhe a forma como organizei
este material.
Na primeira unidade deste trabalho, verificaremos que historicamente os cursos de formação de
professores apresentaram concepções que expressam diferentes formas de conceber a organização
curricular e, consequentemente, o perfil dos profissionais que se formam para atuar na Educação Básica.
Neste estudo compreenderemos que as práticas nos cursos de formação ora se caracterizaram pelo
desenvolvimento de habilidades instrumentais, ora pela repetição de modelos descontextualizados.
Também conheceremos outra concepção que aponta as possibilidades para a construção de propostas
fundamentadas na concomitância da relação entre teoria e prática.
Dessa forma, a relevância em analisar as diferentes concepções no processo de formação docente
possibilitou questionar suas possíveis contribuições na formação de um profissional competente que seja
sujeito-ator da sua realidade profissional e social, contribuindo de fato para a formação de cidadãos.
Na sequência deste estudo, constataremos como as teorias epistemológicas que circundam a formação
docente determinam a concepção de ensinar e de aprender dos profissionais que se formam para atuar
na Educação Básica. Desta forma, discutiremos na segunda unidade o processo de apropriação do
conhecimento nas concepções epistemológicas empiristas, aprioristas e comportamentalistas e como
essas teorias sustentam as diferentes formas de representar a atuação do professor e a apropriação do
conhecimento pelo aluno.
E, finalmente, na terceira unidade, refletiremos sobre a epistemologia relacional e questionaremos as
suas possíveis contribuições para a atuação de um profissional competente que seja sujeito-ator da sua
realidade profissional e social, contribuindo de fato para a formação de cidadãos.
Portanto, durante o percurso que trilharemos, espero que possa compreender o quão importante é a
epistemologia na atuação do profissional da educação e que traduzidas didaticamente, fazem avançar,
retardar ou até impedir o processo de construção do conhecimento.
INTRODUZINDO A QUESTÃO
Fonte:PHOTOS.COM
9FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
A sociedade se submete a processos de aceleradas mudanças, avanços e disseminação de novas
tecnologias, globalização e ao dinamismo da sociedade de informação. A competitividade internacional
leva a modificações nos padrões de produção e consumo. Novas tecnologias de produção afetam a
organização do trabalho, modificando cada vez mais o perfil do trabalhador necessário para esse novo
tipo de produção. Surgem novas profissões, desaparecem outras. Há uma tendência de intelectualização
do processo de produção implicando mais conhecimentos, uso da informática e de outros meios de
comunicação, habilidades cognitivas e comunicativas, flexibilidade de raciocínio.
Para serem enfrentados os desafios do avanço acelerado da ciência e da tecnologia, da mundialização da
economia, da transformação dos processos de produção, do consumismo, do relativismo moral, é preciso
um maciço investimento na educação escolar em todos os níveis de ensino, para que assim seja possível
que todos os docentes, em específico, os professores da Educação Básica, desenvolvam habilidades
indispensáveis em seus alunos para a formação de sujeitos ativos que estabeleçam relações entre o
conhecimento e as formas como este conhecimento aparece na sociedade, bem como em desvelar a
complexidade das relações sociais, econômicas, políticas, culturais e educacionais do mundo em que
vivem.
Nesse contexto social acima descrito, comungamos com Apple (2006) quando defende a ideia de que o
problema do conhecimento educacional, do que se ensina nas escolas, especificamente na sociedade
atual, tem de ser considerado como uma forma de distribuição mais ampla de bens e serviços de uma
sociedade.Nãoconstituimeramenteumproblemaanalítico–oquedevemosconstruircomoconhecimento?
- Nem simplesmente um problema técnico – como organizar e guardar o conhecimento de forma que as
crianças possam ter acesso a ele e dominá-lo?- Nem puramente um problema psicológico - como fazer
com que os alunos aprendam? Em vez disso, o estudo do conhecimento educacional deve constituir-se
em estudo ideológico e epistemológico que possibilite aos professores romperem com as barreiras do
senso comum impostas pelo processo de naturalização e desvelar as condições reais de sua existência,
possibilitando o processo de humanização em uma sociedade essencialmente individualista e instável.
Destaforma,prezado(a)aluno(a),nestaunidadeiremosdiscutir:oqueéconhecimento?Comoconhecemos?
Como acreditamos que nossos alunos aprendem? Como acreditamos que devemos ensiná-los? E como
as teorias epistemológicas sustentam diferentes formas de representar a relação conhecimento/ensino/
aprendizagem escolar.
O conhecimento escolar é trabalhado de forma fragmentada e descontextualizada das relações que os
homens travam em sociedade, naturalizando as relações dominantes. Neste, impera o senso comum que
poderá levar todos os envolvidos no processo escolar (alunos, professores, diretores e outros) a uma visão
fragmentada do conhecimento e das relações sociais, contribuindo assim para alienação dos homens.
Segundo Becker (2005), o conhecimento constitui a matéria-prima do trabalho docente, no entanto os
professores trabalham com o conhecimento e não fundamentam criticamente a “matéria-prima” do seu
trabalho. São sujeitos de uma epistemologia inconsciente e, com alta probabilidade, de uma epistemologia
que não gostaria e não admitiria ser sua.
10 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
No entanto, acreditamos que o conhecimento não se configura de forma fragmentada constituindo um
meio neutro de transmissão, mas expressa a possibilidade de efetivar o processo de humanização do
indivíduo em sociedade, isto é, por meio do conhecimento podemos tornar o homem alguém digno e
agente social de sua comunidade. Nesta perspectiva, consideramos que a assimilação e apropriação
do conhecimento pelos alunos é considerada essencial para o desenvolvimento do indivíduo enquanto
sujeito-ator de sua prática profissional e social.
O homem na modernidade é um ser que somente se torna humano pela cultura, constituindo-se alguém
dignificado e membro de uma comunidade mais universal
Portanto, nesta disciplina, vamos juntamente refletir a necessidade do docente superar o senso comum
ao trabalhar com o conhecimento, buscando a consciência crítica do fazer pedagógico sem o qual é
impossível realizar uma verdadeira práxis, isto é, uma ação intencional fundada na relação dialética entre
teoria e prática que certamente contribuirá para a formação de um cidadão pleno.
Enfatizo,quenãotenhoapretensãodeesgotarcompletamenteossignificadosdasteoriasepistemológicas,
mas tentar caracterizá-las em suas diferentes manifestações, buscando apreender as implicações
decorrentes para a ação pedagógica do professor.
Bom estudo!!!
Fonte:PHOTOS.COM
11FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
SUMÁRIO
UNIDADE I
AS TEORIAS EPISTEMOLÓGICAS QUE CIRCUNDAM A FORMAÇÃO DOCENTE E DETERMINAM A
CONCEPÇÃO DE CONHECIMENTO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO
AS DIFERENTES CONCEPÇÕES PRESENTES NOS CURSOS DE FORMAÇÃO DOCENTE 15
A FORMAÇÃO DOCENTE COMO IMITAÇÃO DE MODELOS 17
A FORMAÇÃO DOCENTE COMO INSTRUMENTALIZAÇÃO TÉCNICA. 19
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A POSSIBILIDADE DE SUPERAÇÃO DA DICOTOMIA ENTRE O
SABER E O FAZER DOCENTE: UM DESAFIO 22
UNIDADE II
A FORMAÇÃO EPISTEMOLÓGICA DO PROFESSOR E SUA ATUAÇÃO NO PROCESSO DE
APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO
AS TEORIAS DO CONHECIMENTO 35
EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA  36
A EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR 37
EPISTEMOLOGIA INATISTA (APRIORISTA) 41
UNIDADE III
AFORMAÇÃOEPISTEMOLÓGICADOPROFESSORPARAUMAPRÁTICAPOSSÍVELESIGNIFICATIVA
A EPISTEMOLOGIA RELACIONAL E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR 56
A EPISTEMOLOGIA RELACIONAL E A POSSIBILIDADE DE UMA PRÁTICA INTERDISCIPLINAR 59
A EPISTEMOLOGIA RELACIONAL E O DESENVOLVIMENTO DE UMA POSTURA INVESTIGATIVA NO
PROCESSO DE ENSINAR E APRENDER 60
CONCLUSÃO 70
REFERÊNCIAS 72
13FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
UNIDADE I
AS TEORIAS EPISTEMOLÓGICAS QUE CIRCUNDAM
A FORMAÇÃO DOCENTE E DETERMINAM A CONCEPÇÃO DE
CONHECIMENTO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO
Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo
Objetivos de Aprendizagem
•	 Analisar e estudar as teorias epistemológicas que circundam a formação docente e determinam a
concepção de conhecimento dos profissionais da educação.
•	 Estudar os concepções epistemológicas que orientam a formação docente: imitação de modelos,
instrumentalização técnica e superação da dicotomia teoria e prática.
•	 Compreender como a superação da dicotomia teoria e prática se manifesta no fazer pedagógico dos
professores, permeando a sua concepção de conhecimento.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
•	 As diferentes concepções presentes nos cursos de formação docente
•	 A formação docente como imitação de modelos
•	 A formação docente como instrumentalização técnica
•	 A formação de professores e a possibilidade de superação da dicotomia entre o saber e o fazer
docente: um desafio
15FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
INTRODUÇÃO
Caro(a) aluno(a), nesta primeira unidade você estudará um assunto muito interessante que o levará a refletir
sobre o seu processo de formação inicial e continuada, especificamente na concepção epistemológica
que você vivenciou e ainda vivencia na sua caminhada para se fazer um competente profissional da
educação.
Oestudodasconcepçõespermitirácompreenderqueoraaconcepçãonocursodeformaçãosecaracteriza
pelo desenvolvimento de habilidades instrumentais, ora pela repetição de modelos descontextualizados
e que ambas sustentam a dicotomia entre teoria e prática no processo de formação docente. No entanto,
também conheceremos que existe outra concepção que apresenta por meio da concomitância da teoria
e da prática a possibilidade de formamos um docente que fará de sua prática pedagógica um processo
de reflexão e investigação.
Portanto, nesta unidade conheceremos as diferentes concepções que circundaram a formação de
professores e teremos condições de questionar as possíveis contribuições na formação de um profissional
competente que seja sujeito-ator da sua realidade profissional e social, contribuindo de fato para a
formação de alunos que terão a possibilidade de entender o funcionamento da sociedade e intervir em
sua orientação e estruturação.
AS DIFERENTES CONCEPÇÕES PRESENTES NOS CURSOS DE FORMAÇÃO
DOCENTE
No processo de formação, o professor deve constituir-se sujeito-ator de sua realidade profissional e social
Prezado(a) acadêmico(a), acredito que ser educadores não faz parte do nosso destino, isto é, não
constitui algo que estava predeterminado, mas constitui parte da nossa história e de cuja responsabilidade
não podemos nos eximir. Compor a nossa história, fazendo-se docente, significa comprometer-se com
processos sociais, políticos e educativos que contribuem concomitantemente para a nossa (trans)
Fonte:PHOTOS.COM
16 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
formação, como também da realidade na qual estamos inseridos. Neste sentido, Freire (1993, p. 87), com
seus escritos, faz-nos acreditar cada vez mais que:
Não nasci, porém marcado para ser um professor assim. Vim me tornando desta forma no corpo
das tramas, na reflexão sobre a ação, na observação atenta a outras formas práticas ou à prática
de outros sujeitos, na leitura persistente, crítica, de textos teóricos, não importa se com eles estava
de acordo ou não.
Dessa forma, caro(a)acadêmico(a), poracreditarna possibilidade de reflexão do professor, por meio do seu
processo de formação seja inicial ou continuada, apresento a você as três concepções epistemológicas
existentes historicamente que marcaram e ainda marcam a história da formação de professores e
determinam, em última instância, a atuação do professor na dinâmica interna da sala de aula.
Nesse sentido, Santomé (2003, p. 11) afirma:
Educar significa oferecer a cidadãos e cidadãs conhecimentos e habilidades para analisar o
funcionamento da sociedade, e para poder intervir em sua orientação e estruturação. Isso inclui
também gerar capacidades e possibilidades de obter informações para criticar esses modelos
produtivos e essas instituições do Estado quando não funcionam democraticamente e favorecem os
grupos sociais mais privilegiados.
A primeira concepção que permeia o processo de formação docente compreende o período de criação
do curso de Pedagogia, desde 1939 até o final da década de 1950. Nesse período, segundo Pimenta e
Lima (2004, p. 36), a formação de professores se “reduz a observar os professores em aula e imitar esses
modelos, sem proceder a uma análise crítica e fundamentada teoricamente e legitimada na realidade
social em que o ensino se processa”.
Entre 1962 até o final da década de 1970, vivencia-se a segunda concepção. Nessa, a formação de
professores é marcada pela racionalidade técnica, a partir da qual “o conceito de prática passa a ser
entendido, então, como o desenvolvimento de habilidades instrumentais necessárias ao desempenho da
ação docente ou, dito de outra forma, prática é o treinamento em situações experimentais” (CAIMI, 2004,
p. 87).
Esse tipo de preparação de professores constitui-se em tarefa aparentemente fácil que se desenvolve
rapidamente. No entanto, a minha experiência como docente nos cursos de licenciatura demonstra-me
que o processo de formação de professores não é estabelecido de um momento para o outro, mas
demanda tempo e necessita uma relação dialética entre teoria e prática que possibilite aos professores
uma nova dimensão de trabalho em sala de aula.
No início da década de 1980, o caráter instrumental da prática começa a ser intensamente questionado,
ocorrendo um processo de articulação principalmente das associações profissionais e entidades
representativas de professores que, por meio de um esforço conjunto, buscam a superação da dicotomia
entre teoria e prática no processo de formação de professores. Nessa concepção,
o papel das teorias é iluminar e oferecer instrumentos e esquemas para análise e investigação
que permitam questionar as práticas institucionalizadas e as ações dos sujeitos e, ao mesmo
tempo, colocar elas próprias em questionamento, uma vez que as teorias são explicações sempre
provisórias da realidade (PIMENTA; LIMA, 2004, p. 43).
17FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
Portanto, é imprescindível analisar as diferentes concepções no processo de formação de professores,
questionando as suas possíveis contribuições na formação de um profissional que seja sujeito-ator da sua
realidade profissional e social e, dessa forma, contribua efetivamente para o processo de construção de
conhecimento de seus alunos.
A FORMAÇÃO DOCENTE COMO IMITAÇÃO DE MODELOS
Processo de formação fundamentado na imitação de modelos não possibilita ao professor a reflexão
sobre o seu fazer pedagógico.
Entre o período de 1939 a 1950, no curso de Pedagogia, estava presente a dicotomia entre dois compo-
nentes do processo pedagógico: o conteúdo e o método, a teoria e a prática. Neste sentido, a formação
de professores estava fundamentada na observação e imitação dos modelos existentes de práticas bem-
-sucedidas. Lourenço Filho (2001, p. 55) explica “o que os alunos-mestres aprendem, nessa situação de
grosseiro empirismo, é a cópia de algumas qualidades, sem dúvida alguma, mas especialmente, a de
vícios e defeitos na direção da classe, por mais perfeito que fosse o modelo”.
Segundo Pimenta e Lima (2004), essa concepção não valoriza a formação intelectual do professor,
reduzindo o processo de formação docente a um fazer que se considerava bem-sucedido quando se
assemelhava aos modelos observados.
Nesse sentido, Saviani (1980, p. 60) adverte:
Por consciência aguda da realidade em que vão atuar, entendemos a necessidade de levar ao aluno
o conhecimento elaborado e a compreensão crítica desta realidade. Tal conhecimento deve permear
todo o processo de formação em grau crescente de complexidade e não se limitar a determinadas
disciplinas, a um determinado momento do curso. Ele se dá tanto de forma direta (observável
empiricamente) como de forma individual (através da fundamentação histórica, filosófica, sociológica,
psicológica, etc.), pois aquilo que aparece imediatamente não manifesta por si só a realidade em
toda a sua concreticidade. Existe oculta, subjacente ao dado observável, a essência do real, a sua
estrutura, que não se expressa diretamente e que necessita ser captada.
Fonte:PHOTOS.COM
18 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
Esse modelo de formação inicial remete-me à metáfora “Currículo do nadador”, de Jacques Busquet (1974
apud PEREIRA, 1999, p. 112), ao descrever o “curso de preparação de nadadores”:
Imagine uma escola de natação que se dedica um ano a ensinar anatomia e fisiologia da natação,
psicologia do nadador, química da água e formação dos oceanos, custos unitários das piscinas por
usuário, sociologia da natação (natação e classes sociais), antropologia da natação (o homem e a
água)e,ainda,ahistóriamundialdanatação,dosegípciosaosnossosdias.Tudoisso,evidentemente,
à base de cursos enciclopédicos, muitos livros, além de giz e quadro-negro, porém sem água. Em
uma segunda etapa, os alunos-nadadores seriam levados a observar, durante outros vários meses,
nadadores experientes; depois dessa sólida preparação, seriam lançados ao mar, em águas bem
profundas, em um dia de temporal.
Fazendo uma analogia entre o modelo de formação docente e o curso de preparação de nadadores,
realizada por Jacques Busquet (1974 apud PEREIRA, 1999), pode-se concluir que o futuro professor, ao
deparar-se com a realidade da sala de aula e ao buscar a resolução dos desafios existentes no cotidiano
da prática pedagógica, por meio da imitação dos modelos observados, ficará verdadeiramente sem
direção, pois muitas das situações existentes na prática pedagógica não são resolvidas simplesmente
pela imitação de metodologias observadas, mas sim pela investigação das possibilidades e necessidades
do contexto educacional e social.
Segundo Barreiro e Gedran (2006), a concepção que permeava a formação docente estava diretamente
vinculada à imitação, observação e reprodução do fazer pedagógico dos docentes nos ginásios de
aplicação2
, considerados modelos para a futura atuação profissional, sem qualquer preocupação com as
diferenças e desigualdades existentes entre os alunos.
Acredito que essa forma de encaminhar a formação de professores apresentava algumas limitações, pois
como afirmam Pimenta e Lima (2004, p. 35), “em que se pese a importância dessa forma de aprender, ela
não é suficiente e apresenta alguns limites. Nem sempre o futuro professor dispõe de elementos para essa
ponderação crítica e apenas tenta transpor os modelos em situações para as quais não são adequados”.
No entanto, considero importante enfatizar que essa transposição ainda constitui a concepção de alguns
cursos de formação de professores que não possibilitam ao futuro professor a reflexão sobre o seu fazer
pedagógico, resumindo a sua prática à transmissão de conteúdos sem pensar nas possibilidades e
condições de aprendizagens dos sujeitos envolvidos. Nesta perspectiva de formação, o professor não é
capacitado a desvelar a complexidade das relações escolares e sociais.
Dessa forma, essa concepção desconsiderava que para a formação de professores era necessário mobi-
lizar vários procedimentos e ampla fundamentação teórica, e que o conhecimento não se adquire olhando
ou contemplando a prática desenvolvida pela professora primária, para em seguida tentar imitá-la. Exige-
-se que se instrumentalize o olhar com teorias, estudos, que se conheça como a realidade foi gerada,
condição fundamental para conhecê-la e interpretá-la.
O pressuposto dessa concepção, que prioriza a imitação de modelos, é que a realidade do ensino
é imutável e os alunos que frequentam a escola também o são. Assim, ao priorizar as práticas e os
2
Conforme o artigo 1º do Decreto-Lei nº. 9053, “as Faculdades de Filosofia federais, reconhecidas ou autorizadas a funcionar no território nacional, ficam
obrigadas a manter um ginásio de aplicação destinado à prática docente dos alunos matriculados no curso de didática” (BRASIL, 1976, p. 1).
19FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
instrumentos consagrados tradicionalmente como modelos eficientes, a escola daquela época resume
seu papel a ensinar; se os alunos não aprendem, o problema é deles, de suas famílias, de sua cultura
diversa daquela tradicionalmente valorizada pela escola (PIMENTA; LIMA, 2004).
Assim, não são considerados os determinantes econômico-sociais, concebendo a escola como histórica,
neutra, e autônoma frente à realidade social. Todavia, esse tipo de formação que prioriza a reprodução de
prática modelar é insuficiente para subsidiar o professor para a resolução de situações de aprendizagem
de seus alunos, de casos únicos que fazem parte dos desafios do cotidiano escolar.
Portanto, por meio deste estudo foi possível verificar que essa concepção estava situada historicamente
entre as décadas de 1930 e 1950, momento peculiar da organização curricular do curso de Pedagogia
e, neste contexto, constituía-se “o modo de aprender a profissão, conforme a perspectiva da imitação,
será a partir da observação, imitação, reprodução e, às vezes, reelaboração dos modelos existentes na
prática consagrados como bons” (PIMENTA; LIMA, 2004, p. 35). Ainda que apresente alguns benefícios,
o processo de formação de professores não deve restringir-se a essa concepção, pois não possibilitava a
formação de um profissional da educação sujeito-ator de sua prática profissional e social.
A FORMAÇÃO DOCENTE COMO INSTRUMENTALIZAÇÃO TÉCNICA
A simples habilidade de aplicar técnicas não garante a resolução dos desafios do cotidiano escolar
A política educacional que os militares impuseram, a partir da década de 1960, em todos os níveis de
ensino, inspirada na assessoria americana pelos acordos do MEC-USAID, centrada na racionalidade,
eficiência e produtividade, criando-se a ideia de que o técnico em educação configurava-se em um
profissional imprescindível à realização da educação como fator de desenvolvimento nacional. Segundo
Lima (2004), essa ideia constituiu estratégia bem coerente com o modelo político-econômico do Brasil
naquele momento.
Brzezinski (1996) declara que essa prática autoritária transportou para a organização escolar formas
Fonte:PHOTOS.COM
20 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
fragmentadas de conceber o trabalho docente, visando atingir, cada vez mais, a produtividade ao
determinar as funções a serem desempenhadas pelo futuro professor: docência, administração,
supervisão, orientação educacional e inspeção escolar. Nesse sentido, as propostas de formação de
professores fundamentavam-se no aprendizado de técnicas de ensino, sem qualquer possibilidade de
pensar, criar ou inovar.
Segundo Barreta (2008, p.44):
O regime ditatorial implantado em 1964 influenciou a política educacional de forma profunda e
radical, inclusive nas propostas de formação docente. Vale destacar a forte influência que passou
a ter o ideário tecnicista na educação, que inseriu a escola nos modelos de racionalização dos
sistemas de produção capitalista.
Dessa forma, a formação de professores e, consequentemente, o conceito de prática, passaram a ser
concebidos como o desenvolvimento de habilidades instrumentais necessárias à boa atuação da ação
docente. Assim, para desempenhar a sua função, bastava que o professor escolhesse e executasse com
eficiência as técnicas de ensino. Caimi (2004) afirma que não há como negar que qualquer profissão
utiliza técnica, e a profissão de professor não é diferente. No entanto, a simples habilidade de aplicar
técnicas não garante a resolução dos problemas de uma área tão complexa e não permite ao professor
compreender a natureza dos saberes docentes e suas implicações no contexto escolar.
Schön (1992) afirma que a racionalidade técnica prevalece nas universidades que formam o docente e que
essa formação pressupõe que os problemas enfrentados pelos profissionais possam ser solucionados pela
aplicação de teorias e técnicas. Nesse sentido, o autor enfatiza que este tipo de formação é insuficiente
para munir o profissional para a resolução de situações problemáticas, de casos únicos, que não estão
nos livros e que certos profissionais enfrentam em sua prática.
A instrumentalização técnica se impõe sobre todos os outros momentos do processo de formação dos
professores. Nessa perspectiva, o processo de formação fica reduzido à hora da prática, ao como fazer,
às técnicas a serem empregadas em sala de aula, ao desenvolvimento de habilidades específicas do
manejo de classe, ao preenchimento de fichas de observação; diagramas; fluxogramas, à produção de
materiais didáticos e atividades sistematizadas que tinham por objetivo padronizar o comportamento dos
alunos e auxiliar os futuros professores no desempenho de suas atividades em sala de aula.
Essaconcepçãodeformaçãonãocapacitavaosfuturosprofessoresaenfrentaremosdesafiosquesurgem
no interior da sala de aula, pois os modelos e técnicas pedagógicas apreendidas constituíam regras
didáticas que deveriam ser aplicadas a qualquer situação de ensino, não possibilitando a compreensão e
a resolução dos problemas do cotidiano escolar.
No entanto, o processo educativo também inclui situações específicas de instrumentalização, no entanto,
não deve ser reduzido a isso. É necessário que o futuro professor, a partir do conhecimento teórico e da
realidade na qual atuará, tenha a “competência de selecionar quais técnicas são mais apropriadas para
as diversas e diferentes situações em que o processo ensino-aprendizagem ocorre” (PIMENTA; LIMA,
2004, pp. 38-39).
21FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
Nessaperspectiva,ainstrumentalizaçãotécnicaaserensinadaaofuturoprofessor,envolveoplanejamento,
a seleção de conteúdos, os procedimentos de ensino, as metodologias didáticas e instrumentos avaliativos.
Não se deve limitar ao campo específico da prática e perder as suas relações com os fundamentos
teóricos e o processo de reflexão.
Pérez Gómez (1992, p. 98) declara que “a lógica dos cursos de formação inicial de professores seguia a
base epistemológica da racionalidade técnica na qual a atividade do profissional é, sobretudo, instrumental
dirigida para a solução de problemas mediante a aplicação rigorosa de teorias e técnicas científicas”,
as quais se aprendiam supostamente com os que sabiam fazer. Assim, havia separação entre teoria
e prática, forma e conteúdo, configurando uma hierarquização das disciplinas denominadas teóricas,
ministradas nos primeiros anos do curso, e as disciplinas pedagógicas, também chamadas de práticas,
que visavam ensinar as habilidades ministradas nos últimos anos, constituindo-se em um currículo
normativo e prescritivo.
Analisando os currículos de formação de professores, a partir da década de 1960, Brzezinski (1996, p.
78) declara: “à medida que a tendência tecnicista se infiltrava nos currículos, o curso de Pedagogia e
os demais cursos que formavam professores foram marcados pela prática de atrofiar os conteúdos e
hipertrofiar técnicas”.
Dessa forma, o docente não necessitaria dominar conhecimentos científicos e poderia atuar apenas
dispondo do domínio das intervenções técnicas aplicáveis em qualquer contexto. Esse reducionismo à
prática, induz à compreensão de que a teoria reduz-se a um conjunto de regras, normas e conhecimentos
sistematizados e aplicáveis a quaisquer situações e a prática à execução de técnicas desenvolvidas a
partir de instrumentos sofisticados que garantem a eficiente transmissão de conhecimentos.
Freitas (1996, p. 93) confirma essa perspectiva na formação de professores ao afirmar:
Temos uma estrutura universitária que se organiza propedeuticamente, ou seja, toda nossa estrutura
de graduação está montada em cima de uma concepção curricular que tem, implicitamente, uma
noção de teoria e prática que aponta para o seguinte: primeiro, temos que dar a teoria para, depois,
ela ser aplicada a situações práticas. A nossa organização universitária está montada em cima desta
visão. Os cursos e aulas começam, em geral, com teoria e depois vão passando para aspectos
práticos.
Contreras (2002, pp. 90-91) contribui com a análise desta temática, destacando que está expresso nessa
perspectiva de formação o modelo da racionalidade técnica:
A idéia básica do modelo de racionalidade técnica é que a prática profissional consiste na solução
instrumental de problemas mediante a aplicação de um conhecimento teórico e técnico, previamente
disponível, que procede da pesquisa científica. É instrumental porque supõe a aplicação de técnicas
e procedimentos que se justificam por sua capacidade para conseguir os efeitos ou resultados
desejados.
Assim, nesta concepção, o processo de formação se limitava ao momento da prática em que a ação se
reduz à aplicação de técnicas, manejo de classe, preenchimento de planilhas, restringindo-se tão somente
a uma tarefa burocrática, que passa apenas pela determinação de uma carga horária a ser cumprida e
a produção de extensos relatórios sem fundamentos. Dessa forma, caracteriza-se em treinamento e,
22 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
portanto, não possibilita ao futuro professor uma reflexão fundamentada da relação teoria e prática, sobre
o fazer pedagógico.
Segundo essa visão pragmático-utilitarista, a teoria seria a garantia de resolução de qualquer tipo de
problema da prática, uma vez que na teoria estariam as “receitas” almejadas para a resolução de impasses
da prática do ensinar e do aprender.
Contudo, o conhecimento elaborado nos cursos de formação de professores adquire significado quando
de fato instrumentaliza o futuro docente a compreender e intervir na realidade social e escolar de modo
crítico e transformador. Desta forma, as vicissitudes decorrentes deste processo de formação revelaram
que nem a instrumentalização técnica, nem o exercício de dar aulas eram possíveis de ser realizados
pelo futuro professor, para delas auferir conhecimentos pedagógicos suficientes para o exercício pleno
da docência.
Diante desse quadro, ainda presenciamos comportamentos permeados de pressupostos tecnicistas nos
cursos de formação docente quando demonstram excessiva preocupação em conhecer novas técnicas e
as valorizam como se elas pudessem resolver todos os desafios inerentes à atuação do profissional da
educação.
A seguir, apresentarei a concepção de formação fundamentada na relação teoria e prática. Essa
concepção busca proporcionar ao futuro professor um profundo conhecimento da realidade para que
se possa desvelar a sua complexidade e posicionar-se criticamente perante os acontecimentos sociais
e escolares, bem como sólida fundamentação teórica, por meio da qual estabelecerá relações com a
dinâmica interna da sala de aula, permitindo-lhe interpretá-la e intervir de forma consciente e planejada.
Esse processo de formação, a partir da década de 80, passa a constituir o eixo estruturante da formação
de professores e visará primordialmente a integração do saber e o fazer.
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A POSSIBILIDADE DE SUPERAÇÃO DA
DICOTOMIA ENTRE O SABER E O FAZER DOCENTE: UM DESAFIO
Reconhecer a vinculação entre teoria e prática contribui para o desenvolvimento da autonomia intelectual do
professor
Fonte:PHOTOS.COM
23FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
Nesta unidade, apresento análises da concepção predominante nos cursos de formação de professores
no contexto da educação brasileira, a partir das quais se pode verificar que, historicamente, a formação
docente já foi concebida em alguns momentos como imitação de modelos bem-sucedidos, porém,
sem análise crítica fundamentada teoricamente e validada pela realidade na qual o processo ensino e
aprendizagem se efetivavam. Em outros contextos, passou a ser concebida como desenvolvimento de
habilidades instrumentais necessárias à boa atuação do fazer docente. No entanto, a simples habilidade
de aplicar técnicas ou seguir práticas modelares sem a devida reflexão não garantia ao professor
compreender a natureza dos saberes docentes e suas implicações no contexto escolar.
Segundo Caimi (2004), essas concepções formam um profissional intelectualmente desqualificado, com
poucas possibilidades de vir a ser um profissional que questione a realidade, que pergunte pelo sentido
da sua prática, enfim, que assuma uma atitude reflexiva diante da educação e da sociedade.
Nesta perspectiva, o desafio é romper com essas concepções cristalizadas e que muito pouco contribuíram
com a formação do professor. Porém, é possível romper com a histórica fragmentação curricular que
insiste na dicotomia entre teoria e prática na formação de professores? Houssaye (2004) corrobora com
a resposta, ao afirmar que somente formaremos um professor quando fizermos surgir no processo de
formação um plus na e pela articulação teoria e prática.
Nesse sentido, formar um professor pedagógica e politicamente competente significa torná-lo capaz de
estabelecer relações entre os conteúdos discutidos nas instituições formadoras e a prática vivenciada na
realidade escolar, possibilitando na vivência do fazer docente a concomitância teoria e prática.
Desta forma, a importância de estudar as concepções que a formação de professores assume no contexto
da educação brasileira está em questionar a possibilidade de formação do futuro professor que constrói e
fortalece sua identidade profissional por meio da relação teoria e prática.
Não obstante, estudos desenvolvidos por Behrens (1991), Schön (1992), Alarcão (1996), Nóvoa (1992),
Freitas (1996), Lima (2002), Pimenta e Lima (2004), Tardif (2005) entre outros, também têm contribuído
para que as práticas de formação de professores sejam repensadas e novas alternativas apontadas.
Nesse sentido, Mizukami e Reali (2002, p. 207) alertam que a formação de professor
não é portanto, tarefa que se conclua após estudos de um aparato de conteúdo e de técnicas para
transmissão deles. É uma aprendizagem que deve se dar por meio de situações práticas que sejam
efetivamente problemáticas, o que exige o desenvolvimento de uma prática reflexiva competente.
Exige ainda que, para além de conceitos e de procedimentos, sejam trabalhadas atitudes, sendo
estas consideradas tão importantes quanto aqueles.
Freitas (1996), ao analisar a relação teoria e prática, destaca que não se trata de responder “com mais
teoria” e “menos prática.” A questão é que os cursos de formação docente não formam adequadamente
porque são fracos teórica e praticamente, ou seja, não assumem a formação do profissional para atuar
na “prática social.” Nesse sentido,
a formação do professor é preferencialmente vista como algo prático. Com isso, a formação teórica
do educador corre sérios riscos. É importante salientar que muitos de nós colaboramos com esta
visão, quando simplesmente propomos a inversão da ênfase no currículo de formação do professor,
24 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
defendendo o predomínio da “prática”. A tendência de colocar a formação teórica na dependência
dos problemas práticos, do dia-a-dia, elimina a formação teórica (e política) do profissional,
convertendo-o em um practitioner, um “prático” (FREITAS, 1992, pp. 95-96).
Pimenta e Lima (2004, p. 33) também analisam essa temática e afirmam que os cursos de formação têm-
se estruturado como:
[...] um aglomerado de disciplinas isoladas entre si, sem qualquer explicitação de seus nexos com a
realidade que lhes deu origem. Assim, nem sequer se pode denominá-las teorias, pois são apenas
saberes disciplinares em cursos de formação, que em geral estão completamente desvinculados do
campo de atuação do profissional dos futuros formandos.
Percebo que a literatura sobre a formação inicial aponta a fragmentação quanto à relação teoria e prática
nos currículos dos cursos de licenciaturas, especificamente da Pedagogia. De forma geral, esses cursos
seguem o modelo da racionalidade técnica e trazem como representação a concepção de que a teoria se
comprova na prática, condicionando uma visão que a teoria precede a prática e esta se limita à execução
de tarefas. Dessa forma, o currículo constitui-se em um aglomerado de disciplinas isoladas entre si e que
não estabelece qualquer relação com a realidade educacional e social que lhe deu origem, constituindo-
-se apenas saberes disciplinares nos cursos de formação. Essa organização curricular fatalmente não
conduzirá os professores à produção de um saber realmente significativo para o exercício pleno da do-
cência.
Mizukami e Reali (2002, p. 125), em suas pesquisas sobre a formação de professores, constatam que na
organização do currículo nos cursos de formação de professores, a prática é realizada no final do curso,
expressando um “coroamento” dos estudos teóricos realizados no início deste.
Frequentemente, os cursos são organizados de maneira que as disciplinas teóricas de conteúdo
específico precedem às de conteúdo pedagógico e às chamadas prática de ensino. Nestas
circunstâncias é possível destacar que a relação teoria e prática torna-se comprometida pela pouca
vinculação existente entre as disciplinas teóricas e aquelas de conteúdo prático-pedagógico, além do
fato de a inserção do aluno/futuro professor nas situações reais de sala de aula ocorra tardiamente e
de pouco tempo destinado ao efetivo, exercício profissional sob supervisão.
A concomitância entre a teoria e a prática não é tarefa tão simples de ser realizada, pois as universidades,
conjuntamente com seus professores, ainda privilegiam e institucionalizam o modelo da lógica disciplinar
e conteudista. Nesta perspectiva, “[...] é preciso quebrar a lógica disciplinar universitária nos cursos de
formação profissional. Não estamos dizendo que é preciso fazer as disciplinas da formação de professores
desaparecerem; dizemos somente que é preciso fazer com que contribuam de outra maneira” (TARDIF,
2002, p. 275).
Nesse sentido, não podemos deixar de insistir que os currículos dos cursos de formação de professores,
organizados a partir de uma prática repetitiva, fragmentada e conteudista que dicotomiza teoria e prática,
precisam ser urgentemente repensados, tendo-se como pressuposto a ideia de que formar profissionais
não significa apenas formar pessoas dotadas de informações e de técnicas para o bem ensinar. É mais
do que isso!
Então, quais encaminhamentos formativos podem contribuir para uma formação docente que possibilite
25FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
ao professor vivenciar a concomitância entre o seu saber e o fazer?
Pimenta (1988) indica-nos esse caminho ao indagar: o que poderia contribuir mais para a formação de
um educador do que refletir sobre a realidade que observa e depois retornar a essa mesma realidade
para inová-la e transformá-la, reinterpretando-a? Reconhecer a vinculação entre teoria e prática contribui
para o desenvolvimento da autonomia intelectual do professor, qualidade necessária durante toda a
sua vida profissional, para que não seja resistente a mudanças, apegando-se a modelos conhecidos,
como também não seja influenciado por modismos que prometem revolucionar a educação escolar sem
promover uma prática em que o conteúdo seja ressignificado.
No entanto, Imbernón (2001) esclarece que se trata de um academicismo ingênuo pensar que o futuro
professor, em contato com uma série de fundamentos disciplinares, será capaz de, automaticamente,
transferir determinados conceitos, procedimentos, atitudes e habilidades do contexto acadêmico para
a realidade profissional. Desse modo, é necessária uma mudança da lógica que estrutura a concepção
curricular com maior aproximação entre a formação acadêmica e a prática escolar, possibilitando ao
professor compreender que a prática não se restringe ao fazer, ela se constitui em uma atividade de
reflexão que enriquece a teoria que lhe deu suporte, isto é, a prática não se explica por si mesma, ela
procede de fundamentos teóricos que, a partir de uma relação dialética, permite compreender a realidade
escolar.
Nesta perspectiva, o processo de formação de professores não é estabelecido de um momento para
o outro, mas demanda tempo e necessita de uma relação dialética entre as disciplinas do curso que
possibilitará aos professores uma nova dimensão da dinâmica interna da sala de aula, conduzindo à
reflexão crítica sobre o fazer docente.
Nesse sentido, Freire (1996, pp. 43-44) afirma que:
[...] na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre
a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima
prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto
que quase se confunda com a prática.
Quando se trabalha integralmente teoria e prática, permitindo que a primeira seja o ponto de reflexão crí-
tica sobre a realidade a fim de poder transformá-la, o processo de formação docente poderá constituir-se
um elo, que certamente culminará em uma proposta significativa de interferência com vistas à mudança
e à busca da qualidade de ensino. Assim, formaremos um profissional com domínio dos conhecimentos
específicos e pedagógicos, que fará de sua prática um processo de investigação.
Nessesentido,édesumaimportânciaqueoprofissionaldaeducaçãotenhasólidaformaçãoepistemológica
para refletir, analisar e entender sobre a concepção de aprendizagem e conhecimento que, em última
instância, determina o seu fazer pedagógico. É importante que entenda que a forma como se concebe o
aprender e o conhecer determina e orienta o seu trabalho em sala de aula.
Nestaperspectiva,MizukamieReali(2002,p.180)declaramque“asinvestigaçõessobreodesenvolvimento
26 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
profissional apontam para a necessidade de se explorar como os professores (re)elaboram suas formas
de pensar o processo de ensino e aprendizagem, bem como as condições que facilitam tal aprendizagem”.
Assim, durante o processo de formação, é necessário que o futuro professor tenha consciência de que
determinadas concepções de aprendizagem, traduzidas didaticamente, fazem avançar, retardar ou até
mesmo impedir o processo de construção do conhecimento (BECKER, 2005). Por exemplo, um professor
que investe em atividades que têm como objetivo a transmissão de definições é partidário da concepção
de que o aprendizado está diretamente ligado à prática de memorizar sem que o conhecimento “aprendido”
concorra para uma mudança conceitual por parte de quem memorizou. Mesmo que o aluno consiga
guardar esse conteúdo na memória, dificilmente irá estabelecer a relação existente entre o conteúdo
escolar e as formas como esse conteúdo é expresso nas relações sociais, políticas, econômicas e
culturais do contexto em que está inserido.
Sendo assim, uma das habilidades que deve ser desenvolvida no futuro professor é a capacidade de
reconhecer,pormeiodasatividadespedagógicasprivilegiadas,aconcepçãodeensinoeaprendizagemque
orienta o seu fazer pedagógico. Ser capaz de perceber que as atividades de ensino são intencionalmente
organizadas e desenvolvidas e que cada uma se justifica em função daquilo que se acredita ser aprender
e ensinar.
Compreender que a prática expressa uma teoria e constitui condição para que o professor, em sua prática
pedagógica, não faça questionamentos baseados no senso comum que não levaram à reflexão do fazer
docente, tais como: é correto corrigir o aluno? Posso realizar esta atividade? Por que é necessário fazer
planejamento? Que técnica devo utilizar para os alunos aprenderem ortografia?
Segundo Sforni e Galuch (1999), a relação entre teoria e prática faz com que preocupações desta natureza
percam o sentido, uma vez que o professor passará a ver a sala de aula não apenas como sucessão de
atividadesguiadaspelaaplicaçãode“novas”técnicaseprocedimentosdeensino,masdesseentendimento
resulta uma prática em que se busca dialogar com os fundamentos teóricos, perguntando-se: até onde um
conteúdo ou atividade são realmente adequados para a promoção de uma aprendizagem significativa?
Quais as possibilidades e necessidades de aprendizagens dos alunos? Como o aluno pensou para
elaborar essa resposta? Enfim, é necessário que o professor compreenda a dinâmica interna da sala de
aula, percebendo o que os alunos compreenderam do assunto trabalhado; o que não compreenderam;
por que se sabe que não compreenderam; e quais as intervenções a serem realizas para que realmente
aprendam.
No entanto, para que o futuro professor desenvolva a postura acima descrita, exige-se que durante o seu
processo de formação, além do conhecimento da realidade escolar, da instrumentalização técnica ele
receba sólida fundamentação teórica que lhe permita interpretar e direcionar a realidade para nela intervir
de forma consciente e planejada.
Desta forma, durante o processo de formação do professor é necessário um profundo conhecimento
da realidade para que ele possa desvelar a sua complexidade e posicionar-se criticamente perante os
27FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
acontecimentos sociais e escolares, bem como uma sólida fundamentação teórica, por meio da qual
estabelecerá relações com a dinâmica interna da sala de aula, permitindo-lhe interpretá-la e intervir de
forma consciente e planejada para a aprendizagem de seus alunos.
Nestesentido,concordocomPerrenoud(1999,p.57)aodeclararque“nocampodasaprendizagensgerais,
um estudante será levado a construir competências de alto nível, confrontando-se regular e intensamente,
com problemas numerosos, complexos e realistas, que mobilizem diversos tipos de recursos cognitivos”.
Desta forma, apreendo que é possível repensar novas formas de encaminhar a formação de professores,
de repensar novas maneiras de organizar os currículos para formação de professores que compreendam
a sua prática profissional, primeiramente, como prática social. No entanto, é necessário romper com as
barreiras existentes nos currículos dos cursos que os segmentam entre os blocos teóricos e práticos, bem
como com a dicotomia na relação entre teoria-prática.
Dessa forma, as diferentes propostas de formação de professores e, consequentemente, a valorização ou
desvalorização que lhes são atribuídas em determinado contexto social revelam, na verdade, diferentes
formas de pensar a escola em suas relações com o conhecimento e com a sociedade. Portanto, assim,
um dos objetivos desta unidade é refletir sobre concepções que permeiam a formação do profissional
da educação e como essas concepções se manifestam na forma do professor organizar a sua prática
pedagógica, especificamente a sua concepção de ensinar e de aprender.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verificamos que há várias concepções permeando o processo de formação docente. Analisar essas
diferentes concepções possibilitou-nos questionar as possíveis contribuições na formação de um
profissional competente que seja sujeito-ator da sua realidade profissional e social, contribuindo de fato
para a formação de cidadãos.
Consideramos o momento de formação muito importante, pois um período constituindo-se de fato um
espaçoparaaconstruçãodeaprendizagens.Esseespaçopossibilitaaoprofessornovosencaminhamentos
para resolução dos desafios existentes no cotidiano escolar, considerando que é na integração entre
teoria e prática que são construídos e/ou reelaborados.
Desvinculada e descomprometida com a realidade, a universidade em muitos momentos não se preocupa em
produzir um saber que revele e transforme essa realidade. Produz um “saber”, só que ele é ilusório, frágil. Saber
que não sabe; saber fragmentado e desatualizado na perspectiva teórica e sem qualquer ligação com a realidade
concreta. Os estudantes dessa universidade talvez consigam dizer que estudaram tais teorias, ou tais autores,
28 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
ou melhor, leram sobre eles, mas não sabem para que serve esse saber e muito menos o que a produção desse
“saber”	tem	a	ver	com	a	afi	rmação	ou	a	negação	de	interesses	e	necessidades	fundamentais	da	sociedade	
(FÁVERO, 2001, p. 59).
Entrevista: Eunice Durham
Fábrica de maus professores
Revista Veja. Edição 2088
26 de novembro de 2008
Uma das maiores especialistas em ensino superior brasileiro, a antropóloga não tem dúvida: os cursos de peda-
gogia perpetuam o péssimo ensino nas escolas
“Os cursos de pedagogia desprezam a prática da sala de aula e supervalorizam teorias supostamente mais
nobres. Os alunos saem de lá sem saber ensinar”.
Hoje há poucos estudiosos empenhados em produzir pesquisa de bom nível sobre a universidade brasileira.
Entre eles, a antropóloga Eunice Durham, 75 anos, vinte dos quais dedicados ao tema, tem o mérito de tratar do
assunto com rara objetividade. Seu trabalho representa um avanço, também, porque mostra, com clareza, como
as universidades têm relação direta com a má qualidade do ensino oferecido nas escolas do país. Ela diz: “Os
cursos de pedagogia são incapazes de formar bons professores”. Ex-secretária de política educacional do Minis-
tério da Educação (MEC) no governo Fernando Henrique, Eunice é do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas,
da Universidade de São Paulo – onde ingressou como professora há cinqüenta anos.
Sua	pesquisa	mostra	que	as	faculdades	de	pedagogia	estão	na	raiz	do	mau	ensino	nas	escolas	brasilei-
ras. Como?
As faculdades de pedagogia formam professores incapazes de fazer o básico, entrar na sala de aula e ensinar a
matéria.	Mais	grave	ainda,	muitos	desses	profi	ssionais	revelam	limitações	elementares:	não	conseguem	escre-
ver	sem	cometer	erros	de	ortografi	a	simples	nem	expor	conceitos	científi	cos	de	média	complexidade.	Chegam	
aos	cursos	de	pedagogia	com	defi	ciências	pedestres	e	saem	de	lá	sem	ter	se	livrado	delas.	Minha	pesquisa	
aponta as causas. A primeira, sem dúvida, é a mentalidade da universidade, que supervaloriza a teoria e me-
nospreza a prática. Segundo essa corrente acadêmica em vigor, o trabalho concreto em sala de aula é inferior a
refl	exões	supostamente	mais	nobres.
29FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
Essa filosofia é assumida abertamente pelas faculdades de pedagogia?
O objetivo declarado dos cursos é ensinar os candidatos a professor a aplicar conhecimentos filosóficos, antro-
pológicos, históricos e econômicos à educação. Pretensão alheia às necessidades reais das escolas – e absurda
diante de estudantes universitários tão pouco escolarizados.
O que, exatamente, se ensina aos futuros professores?
Fiz uma análise detalhada das diretrizes oficiais para os cursos de pedagogia. Ali é possível constatar, com nú-
meros, o que já se observa na prática. Entre catorze artigos, catorze parágrafos e 38 incisos, apenas dois itens
se referem ao trabalho do professor em sala de aula. Esse parece um assunto secundário, menos relevante do
que a ideologia atrasada que domina as faculdades de pedagogia.
Como essa ideologia se manifesta?
Por exemplo, na bibliografia adotada nesses cursos, circunscrita a autores da esquerda pedagógica. Eles con-
fundem pensamento crítico com falar mal do governo ou do capitalismo. Não passam de manuais com uma visão
simplificada, e por vezes preconceituosa, do mundo. O mesmo tom aparece nos programas dos cursos, que eu
ajudo a analisar no Conselho Nacional de Educação. Perdi as contas de quantas vezes estive diante da palavra
dialética, que, não há dúvida, a maioria das pessoas inclui sem saber do que se trata. Em vez de aprenderem
a dar aula, os aspirantes a professor são expostos a uma coleção de jargões. Tudo precisa ser democrático,
participativo, dialógico e, naturalmente, decidido em assembléia.
Quais os efeitos disso na escola?
Quando chegam às escolas para ensinar, muitos dos novatos apenas repetem esses bordões. Eles não sabem
nem como começar a executar suas tarefas mais básicas. A situação se agrava com o fato de os professores, de
modo geral, não admitirem o óbvio: o ensino no Brasil é ainda tão ruim, em parte, porque eles próprios não estão
preparados para desempenhar a função.
Por que os professores são tão pouco autocríticos?
Eles são corporativistas ao extremo. Podem até estar cientes do baixo nível do ensino no país, mas costumam
atribuir o fiasco a fatores externos, como o fato de o governo não lhes prover a formação necessária e de eles
ganharem pouco. É um cenário preocupante. Os professores se eximem da culpa pelo mau ensino – e, conse-
qüentemente, da responsabilidade. Nos sindicatos, todo esse corporativismo se exacerba.
Como os sindicatos prejudicam a sala de aula?
Está suficientemente claro que a ação fundamental desses movimentos é garantir direitos corporativos, e não
o bom ensino. Entenda-se por isso: lutar por greves, aumentos de salário e faltas ao trabalho sem nenhuma
espécie de punição. O absenteísmo dos professores é, afinal, uma das pragas da escola pública brasileira. O
índice de ausências é escandaloso. Um professor falta, em média, um mês de trabalho por ano e, o pior, não
perde um centavo por isso. Cenário de atraso num país em que é urgente fazer a educação avançar. Combater
o corporativismo dos professores e aprimorar os cursos de pedagogia, portanto, são duas medidas essenciais à
melhora dos indicadores de ensino.
A senhora estende suas críticas ao restante da universidade pública?
Há dois fenômenos distintos nas instituições públicas. O primeiro é o dos cursos de pós-graduação nas áreas de
ciências exatas, que, embora ainda atrás daqueles oferecidos em países desenvolvidos, estão sendo capazes
de fazer o que é esperado deles: absorver novos conhecimentos, conseguir aplicá-los e contribuir para sua evo-
lução. Nessas áreas, começa a surgir uma relação mais estreita entre as universidades e o mercado de trabalho.
Algo que, segundo já foi suficientemente mensurado, é necessário ao avanço de qualquer país. A outra realidade
da universidade pública a que me refiro é a das ciências humanas. Área que hoje, no Brasil, está prejudicada
pela ideologia e pelo excesso de críticas vazias. Nada disso contribui para elevar o nível da pesquisa acadêmica.
Um estudo da OCDE (organização que reúne os países mais industrializados) mostra que o custo de um
universitário no Brasil está entre os mais altos do mundo – e o país responde por apenas 2% das citações
nas melhores revistas científicas. Como a senhora explica essa ineficiência?
Sem dúvida, poderíamos fazer o mesmo, ou mais, sem consumir tanto dinheiro do governo. O problema é que
as universidades públicas brasileiras são pessimamente administradas. Sua versão de democracia, profunda-
30 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
mente assembleísta, só ajuda a aumentar a burocracia e os gastos públicos. Essa é uma situação que piorou,
sobretudo, no período de abertura política, na década de 80, quando, na universidade, democratização se tornou
sinônimo de formação de conselhos e multiplicação de instâncias. Na prática, tantas são as alçadas e as exi-
gências burocráticas que, parece inverossímil, um pesquisador com uma boa quantia de dinheiro na mão passa
mais tempo envolvido com prestação de contas do que com sua investigação científica. Para agravar a situação,
os maus profissionais não podem ser demitidos. Defino a universidade pública como a antítese de uma empresa
bem montada.
Muita gente defende a expansão das universidades públicas. E a senhora?
Sou contra. Nos países onde o ensino superior funciona, apenas um grupo reduzido de instituições concentra
a maior parte da pesquisa acadêmica, e as demais miram, basicamente, os cursos de graduação. O Brasil, ao
contrário, sempre volta à idéia de expandir esse modelo de universidade. É um erro. Estou convicta de que já
temos faculdades públicas em número suficiente para atender aqueles alunos que podem de fato vir a se tornar
Ph.Ds. ou profissionais altamente qualificados. Estes são, naturalmente, uma minoria. Isso não tem nada a ver
com o fato de o Brasil ser uma nação em desenvolvimento. É exatamente assim nos outros países.
As faculdades particulares são uma boa opção para os outros estudantes?
Freqüentemente, não. Aqui vale a pena chamar a atenção para um ponto: os cursos técnicos de ensino superior,
ainda desconhecidos da maioria dos brasileiros, formam gente mais capacitada para o mercado de trabalho do
que uma faculdade particular de ensino ruim. Esses cursos são mais curtos e menos pretensiosos, mas conse-
guem algo que muita universidade não faz: preparar para o mercado de trabalho. É estranho como, no meio aca-
dêmico, uma formação voltada para as necessidades das empresas ainda soa como pecado. As universidades
dizem, sem nenhum constrangimento, preferir “formar cidadãos”. Cabe perguntar: o que o cidadão vai fazer da
vida se ele não puder se inserir no mercado de trabalho?
Nos Estados Unidos, cerca de 60% dos alunos freqüentam essas escolas técnicas. No Brasil, são apenas
9%. Por quê?
Sempre houve preconceito no Brasil em relação a qualquer coisa que lembrasse o trabalho manual, caso desses
cursos. Vejo, no entanto, uma melhora no conceito que se tem das escolas técnicas, o que se manifesta no au-
mento da procura. O fato concreto é que elas têm conseguido se adaptar às demandas reais da economia. Daí
95% das pessoas, em média, saírem formadas com emprego garantido. O mercado, afinal, não precisa apenas
de pessoas pós-graduadas em letras que sejam peritas em crítica literária ou de estatísticos aptos a desenvolver
grandes sistemas. É simples, mas só o Brasil, vítima de certa arrogância, parece ainda não ter entendido a lição.
Faculdades particulares de baixa qualidade são, então, pura perda de tempo?
Essas faculdades têm o foco nos estudantes menos escolarizados – daí serem tão ineficientes. O objetivo núme-
ro 1 é manter o aluno pagante. Que ninguém espere entrar numa faculdade de mau ensino e concorrer a um bom
emprego, porque o mercado brasileiro já sabe discernir as coisas. É notório que tais instituições formam os piores
estudantes para se prestar às ocupações mais medíocres. Mas cabe observar que, mesmo mal formados, esses
jovens levam vantagem sobre os outros que jamais pisaram numa universidade, ainda que tenham aprendido
muito pouco em sala de aula. A lógica é típica de países em desenvolvimento, como o Brasil.
Por que num país em desenvolvimento o diploma universitário, mesmo sendo de um curso ruim, tem
tanto valor?
No Brasil, ao contrário do que ocorre em nações mais ricas, o diploma de ensino superior possui um valor inde-
pendente da qualidade. Quem tem vale mais no mercado. É a realidade de um país onde a maioria dos jovens
está ainda fora da universidade e o diploma ganha peso pela raridade. Numa seleção de emprego, entre dois
candidatos parecidos, uma empresa vai dar preferência, naturalmente, ao que conseguiu chegar ao ensino su-
perior. Mas é preciso que se repita: eles servirão a uma classe de empregos bem medíocres – jamais estarão na
disputa pelas melhores vagas ofertadas no mercado de trabalho.
A tendência é que o mercado se encarregue de eliminar as faculdades ruins?
A experiência mostra que, conforme a população se torna mais escolarizada e o mercado de trabalho mais
exigente, as faculdades ruins passam a ser menos procuradas e uma parte delas acaba desaparecendo do
mapa. Isso já foi comprovado num levantamento feito com base no antigo Provão. Ao jogar luz nas instituições
31FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
que haviam acumulado notas vermelhas, o exame contribuiu decisivamente para o seu fracasso. O fato de o
MEC intervir num curso que, testado mais de uma vez, não apresente sinais de melhora também é uma medida
sensata.	O	mau	ensino,	afi	nal,	é	um	grande	desserviço.	
A	senhora	fecharia	as	faculdades	de	pedagogia	se	pudesse?
Acho que elas precisam ser inteiramente reformuladas. Repensadas do zero mesmo. Não é preciso ir tão longe
para entender por quê. Basta consultar os rankings internacionais de ensino. Neles, o Brasil chama atenção por
uma razão para lá de negativa. Está sempre entre os piores países do mundo em educação.
Disponível em: http://veja.abril.com.br/261108/entrevista.shtml. Acesso em: 28 abr. 2011.
Tardif é o autor da obra “Saberes	Docentes	e	Formação	Profi	ssional” e professor universitário no Canadá e
suas pesquisas abrangem vários países, inclusive o Brasil, onde já realizou palestras e encontros com profes-
sores. É conhecedor da obra de Paulo Freire, enaltecendo-a no que tange à valorização do papel do professor
como agente de mudanças e como intelectual engajado.
Livro:	Saberes	Docentes	e	Formação	Profi	ssional
Autor: Maurice Tardif
Editora: Vozes
[...]	o	saber	não	é	uma	coisa	que	fl	utua	no	espaço:	o	saber	dos	professores	é	o	saber	deles	e	está	relacionado	
com	a	pessoa	e	a	identidade	deles,	com	a	sua	experiência	de	vida	e	com	a	sua	história	profi	ssional,	com	as	suas	
relações com aos alunos em sala de aula e com os outros atores escolares na escola etc. Por isso é necessário
estudá-lo relacionando-os com esses elementos constitutivos do trabalho docente (TARDIF, 2002, p.11).
Além dessa leitura recomendo também a entrevista do educador português e reitor da Universidade de Lisboa
Antonio Nóvoa, concedida à Revista Aprendizagem ano 1, n. 2, pp.13-26, set./out. 2007, sobre a “Formação
de professores e a qualidade do ensino,” disponível em: http://www.vithais.com.br/2010/02/antonio-novoa-e-
-importancia-de-rever.html.
32 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO
1)	A partir das ideias presentes nesta unidade expresse a sua opinião, fundamentada em dois argumen-
tos, sobre a formação de professores e a qualidade de ensino.
2)	Tardif, em sua obra intitulada “Saberes docentes e formação profissional”, afirma que “é preciso
quebrar a lógica disciplinar universitária nos cursos de formação profissional. Não estamos dizendo
que é preciso fazer as disciplinas da formação de professores desaparecerem; dizemos somente que
é preciso fazer com que contribuam de outra maneira” (2002, p. 275).
a)	Explique por que o autor canadense faz tal afirmação.
b)	Baseando-se nos fundamentos teóricos tratados nesta unidade, argumente quais seriam as conse-
quências para o processo de formação de professores se os cursos de licenciaturas acatassem a
orientação do autor.
3)	Nesta unidade, retratamos a metáfora do “Currículo do nadador”, de Jacques Busquet ao descrever
o “curso de preparação de nadadores”, nesta o autor afirma que “[...]depois dessa sólida preparação,
seriam lançados ao mar, em águas bem profundas, em um dia de temporal”.
	 Você considera que os cursos de formação de professores fornecem subsídios teóricos e práticos
para a resolução dos desafios encontrados na dinâmica interna da sala aula? Justifique a sua respos-
ta a partir da discussão realizada nesta unidade.
4)	Verificamos, nesta unidade, que a concepção na formação de professores determina em última ins-
tância a forma como o docente trabalhará com conhecimento. Neste sentido, descreva quatro enca-
minhamentos didáticos que um professor formado na concepção tecnicista teria para ensinar seus
alunos o processo da tabuada.
5)	Freire (1996, pp. 43-44) afirma que “na formação permanente dos professores, o momento fundamen-
tal é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que
se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de
ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática”.
	 Explique e cite duas situações nas quais você pode vivenciar esse momento de processo de reflexão
descrito por Freire.
UNIDADE II
A FORMAÇÃO EPISTEMOLÓGICA DO PROFESSOR E SUA
ATUAÇÃONOPROCESSODEAPROPRIAÇÃODOCONHECIMENTO
Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo
Objetivos de Aprendizagem
•	 Analisar as teorias do conhecimento e a partir das suas implicações na prática docente superar o
senso comum, buscando a consciência crítica do fazer pedagógico.
•	 Estudar o processo ensino-aprendizagem e os pressupostos epistemológicos que orientam a prática
docente.
•	 Analisar, compreender e avaliar as teorias epistemológicas que orientam o processo de construção do
conhecimento.
•	 Compreender os fundamentos das teorias empiristas, inatistas e comportamentalistas e como essas
teorias sustentam diferentes formas de representar a relação conhecimento/ensino/aprendizagem es-
colar.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
•	 As teorias do conhecimento
•	 Epistemologia empirista
•	 A epistemologia empirista e a prática pedagógica do professor
•	 Epistemologia apriorista (inatista)
•	 A epistemologia apriorista e a prática pedagógica do professor
•	 Abordagem comportamentalista
•	 Abordagem comportamentalista e a prática pedagógica do professor
35FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
INTRODUÇÃO
Nesta segunda unidade, caro(a) aluno(a), iremos estudar sobre as concepções epistemológicas
empiristas, apriorista e comportamentalista mostrando como essas teorias sustentam diferentes formas
de representar a relação conhecimento/ensino/aprendizagem escolar.
Neste sentido, é muito importante que você compreenda cada uma dessas concepções percebendo que
no momento em que seleciona o conteúdo da disciplina que vai ensinar, quando decide pelo método e
pelos procedimentos de ensino, quando enfrenta as dificuldades de aprendizagem dos seus alunos, está
pressupondo algumas questões epistemológicas.
Portanto, as opções didáticas que os professores fazem sobre qual conteúdo priorizará, qual método
empregar para desenvolver as atividades de ensino e aprendizagem, qual instrumento de avaliação utilizar,
não são neutros, sempre estão conduzidos por determinados valores, por determinadas concepções
epistemológicas que, traduzidas didaticamente, fazem avançar, retardar ou até impedir o processo de
construção do conhecimento.
AS TEORIAS DO CONHECIMENTO
O estudo da aquisição do Conhecimento ou a compreensão do processo em que ele se dá no ser humano
está inserido em uma Ciência secular, cujo nome é EPISTEMOLOGIA. Segundo Aranha (2006), o termo
epistemologia por ter adquirido um caráter mais crítico sobre o estudo do conhecimento, é também
denominada de Filosofia das Ciências ou de Teoria do Conhecimento Científico.
Aranha (2006, p.87) enfatiza:
A epistemologia, também chamada teoria do conhecimento, é o ramo da filosofia interessado na
investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento. Entre as questões principais que ela
tenta responder estão as seguintes. O que é o conhecimento? Como nós o alcançamos? Podemos
conseguir meios para defendê-lo contra o desafio cético?
Nesta unidade, iremos refletir sobre as teorias do conhecimento, especificamente enfatizaremos o
empirismo, o apriorismo e a epistemologia relacional. Estudaremos como que tais teorias sustentam as
três diferentes formas de representar a relação conhecimento/ensino/aprendizagem escolar.
Conhecer como ocorre a construção significativa do conhecimento no processo pedagógico é ajudar
a eliminar a determinação social dos alunos. Desta forma, para o professor este conhecimento é
imprescindível a fim de melhor saber como interagir com o educando e o conhecimento, no sentido de
favorecer seu desenvolvimento e sua emancipação humana na sociedade.
Becker (2005) declara que quando o professor seleciona o conteúdo da disciplina que vai ensinar, quando
decide pelo método e pelos procedimentos de ensino, quando enfrenta as dificuldades de aprendizagem
dos seus alunos está pressupondo algumas questões epistemológicas. Desta forma, as escolhas que
se façam, quer acerca de qual conteúdo priorizar, qual método utilizar para desenvolver as atividades de
36 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
ensino e aprendizagem, qual instrumento de avaliação utilizar, não são neutros, sempre estão conduzidos
por determinados valores, por determinadas concepções epistemológicas que, traduzidas didaticamente,
fazem avançar, retardar ou até impedir o processo de construção do conhecimento.
EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA
Quando refletimos sobre o conhecimento, podemos designar não só o ato de conhecer, mas a relação
entre o sujeito cognoscente (o sujeito que conhece) com um objeto cognoscível (objeto conhecido no ato
de conhecer). Nesta perspectiva, a epistemologia empirista tem como suporte o primado do objeto sobre
o sujeito:
S O
A aquisição do conhecimento se faz a partir do exterior. É uma aquisição exógena, que pode ocorrer por
meio da sensação e da reflexão. Segundo Locke (2006), a sensação é o resultado da modificação que
ocorre na mente, por meio dos sentidos, enquanto a reflexão é a percepção que a alma tem daquilo que
nela ocorre. Desta forma, toda ênfase é dada ao meio externo, daí, constitui-se fundamental a experiência
para a aquisição do conhecimento. Neste sentido, Becker (2003, p.90) afirma que “os empiristas são
aqueles que pensam que o conhecimento acontece porque nós vemos, ouvimos, tateamos e não porque
agimos”.
Becker (2001) afirma que o ponto alto do empirismo é o teste da experiência: nada aceitar que não
tenha passado pela experiência. Os empiristas são todos aqueles que pensam necessariamente de forma
consciente que o conhecimento se dá por força dos sentidos. Isso não quer dizer que eles desprezem a
razão, mas sim que a subordinem ao trabalho a priori da experiência.
Segundo Becker (2006) e Mizukami (2001), a epistemologia empirista não possibilita a apropriação
significativa, crítica, criativa e duradoura, por parte do conjunto dos educandos do conhecimento científico
acumulado pela humanidade, de tal forma que pudesse servir como instrumento de construção da
cidadania e de transformação da realidade.
Por conseguinte, o que estamos buscando discutir nesta disciplina é a possibilidade de pensarmos um
referencial teórico-metodológico que colabore para que o professor possa refletir sobre o seu trabalho
com o conhecimento em sala de aula. Pois, acreditamos que é possível o educador ressignificar a sua
prática pedagógica neste campo, tornando seu trabalho mais significativo, digno e realizador.
Nesta perspectiva, conhecer como se dá o conhecimento no processo pedagógico e suas implicações na
formação do indivíduo é instrumentalizar o professor a eliminar a determinação social dos destinos dos
alunos. Neste sentido, advogamos a importância deste conhecimento para o profissional da educação a
fim de melhor saber como interagir com o educando, no sentido de favorecer seu desenvolvimento e sua
emancipação.
37FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
Portanto, é com esse intuito, caro(a) acadêmico(a), que passaremos agora a refletir sobre a manifestação
da epistemologia empirista na prática pedagógica do professor, pois o professor que deseja ressignificar
o seu trabalho com o conhecimento, precisa de uma concepção de ensinar e de aprender que redirecione
o seu fazer pedagógico.
A EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR
Segundo Becker (2001), engana-se quem pensa que a transmissão do conhecimento foi superada,
está sob controle ou foi domado. A escola continua a professá-lo, soberanamente, inclusive utilizando,
com muita frequência, a linguagem da construção. Fala de construção de conhecimento e se pratica a
transmissão. Essa prática impõe ao aluno a repetição como única forma aceitável de aprendizagem.
E o papel do professor nesta abordagem, consiste em dominar e garantir a transmissão do conteúdo
que é predefinido e que constitui o próprio fim da existência escolar. Compete-lhe informar e conduzir
seus alunos em direção aos objetivos que lhe são externos, por serem os valores escolhidos pela escola
necessários para a sociedade em que vive.
Becker (2001, p. 97) declara que:
Na visão empirista de inteligência a ênfase está na conversão, ou seja, na transformação, pelos
benefícios da experiência, de nossa forma de aprender ou resolver problemas. Trata-se, portanto,
de criar hábitos, rotinas e procedimentos favoráveis à aprendizagem. Trata-se de criar um contexto
ou ambiente favorável que estimula o que é positivo, que afasta ou pune o que é negativo. O papel
do adulto ou das pessoas responsáveis, nesse caso, é o de criar regras ou normas que delimitam ou
definem o que deve ser feito em favor do que se quer realizar.
Apesar de no discurso haver rejeição a essa postura, no cotidiano da escola verifica-se que é a mais
presente, talvez nem tanto pela vontade dos educadores, mas por não se saber como efetivar uma prática
diferente: “a gente acaba caindo na aula expositiva”.
No entanto, nem sempre a aula expositiva apresenta-se de forma tão clara, explícita. Precisamos estar
atentos para as pseudossuperações que têm surgido, pois se trata de manifestações dissimuladas,
camufladas como, por exemplo:
•	 Justaposição Aluno x Professor ou Professor x Aluno.
•	 Falas (fala do professor - fala do aluno).
•	 Técnicas (Pesquisa x Exposição; Exposição x Dramatização).
•	 Substituição da exposição do professor pela exposição de um vídeo (ou do programa do computador).
•	 Cadeiras em círculo e manutenção do monopólio da palavra com o professor.
•	 Professor não adota livro didático, mas vive enchendo a lousa de matéria para alunos copiarem.
•	 Aula expositiva do aluno no lugar do professor (os famigerados “seminários”).
•	 Esvaziando o conteúdo: aula muito “gostosa”, “descontraída”, mas onde não se aprende nada.
•	 Para ser “inovador”, o professor começa a aula perguntando aos alunos o que sabem sobre o assunto.
38 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
Depois que os alunos apresentam, solicita a atenção para o ponto que vai dar: “muito bem, fizeram
a parte de vocês, agora é a minha vez”! Desta forma, verifica-se que os professores não consideram
o que foi colocado pelos alunos. Assim sendo, muitos professores se confundem, pois acham que
dando tempo para os alunos falarem, já significa uma metodologia nova. O problema, em si, não está
no aluno falar, mas em haver interação entre as falas (aluno-professor, professor-aluno, aluno-aluno).
Portanto, não se trata do professor não falar mais em sala de aula; trata-se de uma fala que se deve
ocorrer em um contexto interativo e, portanto, significativo.
Desta forma, é importante ficarmos atentos e refletirmos como estamos encaminhando o nosso trabalho
com o conhecimento, pois revelamos por meio da nossa prática docente: posturas pedagógicas; saberes
experienciais ou práticos, saberes curriculares, saberes da formação profissional, saberes didáticos e
pedagógicos; referenciais teóricos; concepção de avaliação e de planejamento; enfim, a nossa concepção
de ensinar e aprender.
Nesta concepção, ensina-se por meio de perguntas e respostas que devem ser elaboradas em nível
crescente de complexidade. Valoriza-se o produto, reforçando-se a repetição, cópia, memorização e
fixação de conteúdos. Nesse sentido, se tem como pressuposto que ensinar é transmitir tudo o que os
homens acumularam e aprender é incorporar esses conhecimentos. A aprendizagem é confundida com
memorização e fixação, seguidos de exercícios sistemáticos e repetitivos.
Segundo Paulo Freire (1996), nesta epistemologia o professor se torna um especialista em transferir
conhecimento. Sendo assim, o professor não desenvolve algumas das habilidades necessárias e
indispensáveis para possibilitar a produção do conhecimento: reflexão, crítica, curiosidade, inquietação,
incerteza, todas essas indispensáveis ao sujeito cognoscente.
Becker (2004, p. 270) explicita essa forma da escola empirista trabalhar com o conhecimento, afirmando
que:
por isso, a forma mais recorrente de a escola pensar o conhecimento é o conteúdo. Para a escola,
conhecimento é conhecimento-conteúdo que, como tal, é arrolado na grade curricular. E, como
convém ao modelo positivista, cuja base epistemológica é empirista, o conhecimento contemplado
pelo currículo é composto de microunidades que são ensinadas, uma a uma, em pretensa ordem
crescente de complexidade.
Desta forma, a escola trabalha com o conhecimento que é externo ao indivíduo e este irá apossando-se
gradativamente por meio de uma compreensão cada vez mais complexa e sofisticada. Nesta organização,
algumas matérias são consideradas mais importantes que outras. Essa constatação pode ser feita pela
diferença de carga horária entre as disciplinas do currículo. Privilegiam-se igualmente o verbal (escrita
e oral), as atividades intelectuais e o raciocínio abstrato. Nesta perspectiva, a avaliação é realizada
predominantemente visando à exatidão da produção do conteúdo comunicado em sala de aula, sendo
que a reprovação do aluno passa a ser necessária quando há a constatação de que o conhecimento
mínimo exigido para cada série não foi adquirido pelo aluno.
Na prática pedagógica, verificamos que, com frequência, a aula acaba se resumindo no seguinte:
•	 Apresentação do ponto.
39FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
•	 Resolução de um ou mais exercícios modelo.
•	 Proposição de uma série de exercícios para os alunos resolverem.
Esta abordagem considera o sujeito da aprendizagem passivo e receptivo ao conhecimento, que viria de
fora e só em um segundo momento seria incorporado pelo sujeito e transformado em conteúdo mental.
Desta forma, o professor exigirá, ainda, que seu aluno repita inúmeras vezes o conteúdo até memorizá-lo,
pois considera que o aluno é, originariamente, uma folha de papel em branco. Essa memorização con-
sistirá, necessariamente, em um empobrecimento da teoria, além de impedir que algo novo se constitua.
Infelizmente, é dessa forma que estão organizadas a quase totalidade de nossas salas de aula.
Becker em sua obra “Educação e Construção do Conhecimento” (2001, p.16), exemplifica muito bem
como é o cotidiano de um professor que assume uma postura empirista em sua prática pedagógica.
Vejamos: para conhecê-lo, basta entrarmos em uma sala de aula.
Na abordagem empirista o papel do professor consiste em dominar e garantir a transmissão do conteúdo que é
predefinido e que constitui o próprio fim da existência escolar
O que encontramos aí? Um professor que observa seus alunos entrarem na sala, aguardando que
sentem e que fiquem quietos e silenciosos. As carteiras estão devidamente enfileiradas e suficientemente
afastadas umas das outras para evitar que os alunos conversem. Se o silêncio e a quietude não se fizerem
logo, o professor chamará a atenção da sala até o monopólio da palavra ser seu. Quando isso acontece,
ele começa a dar a aula. Como é essa aula? O professor fala, e o aluno escuta. O professor dita, e o aluno
copia. O professor decide o que fazer, e o aluno executa. O professor ensina, e o aluno aprende.
Neste momento de reflexão, indagamos:
Fonte:PHOTOS.COM
40 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância
- Por que o professor assume esse fazer pedagógico?
Alguns responderiam:
- Porque aprendeu que é assim que se ensina.
Essa resposta esta correta, mas não suficiente. Então, por que mais?
O professor assume tal prática pedagógica porque acredita que o conhecimento pode ser transmitido para
o aluno. Ele acredita no mito da transmissão do conhecimento.
Dessa forma, a sua prática é legitimada, ou fundada teoricamente por uma epistemologia, segundo a
qual o sujeito é totalmente determinado pelo mundo ou pelos meios físicos e sociais. No caso do exemplo
acima citado, quem representa esse mundo na sala de aula é, por excelência, o professor.
Sobre essa abordagem, Freire (1996, p.25) exclama:
[...] se, na experiência de minha formação, que deve ser permanente, começo por aceitar que o for-
mador é o sujeito em relação a quem me considero o objeto, que ele é o sujeito que me forma eu, o
objeto por ele formado, me considero como um paciente que recebe os conhecimentos-conteúdos-
-acumulados pelo sujeito que sabe e que são a mim transferidos.
Nesse sentido, para Freire (1996), esse sistema de ensino está baseado na educação bancária (tipologia
mais aproximada do que se entende por ensino nessa abordagem), ou seja, uma educação que se
caracteriza por “depositar”, no aluno, conhecimentos, informações, dados, fatos.
Também para Becker (2003), nessa relação, o ensino e a aprendizagem são polos dicotômicos: o
professor jamais aprenderá e o aluno jamais ensinará. Está subjacente a esse tipo de abordagem, que o
conhecimento provém essencialmente do meio, e, dessa forma, é transmitido ao indivíduo na escola. O
indivíduo nada mais é do que um ser passivo, um receptáculo de conhecimentos escolhidos e elaborados
para que deles se apropriem. Mizukami (2005) declara que uma das consequências políticas das
aplicações empiristas na escola tem sido a formação de sujeitos passivos diante do conhecimento, dos
fatos e da sociedade.
Para o professor Fernando Becker, a tendência empirista é a que caracteriza mais amplamente a
epistemologia do professor. Ele constatou em sua pesquisa que o professor muitas vezes desconhece
esses pressupostos e, mesmo quando pensa estar partindo de fundamentos diferentes, destacam-se
características empiristas na sua verbalização. Talvez isso se deva ao fato de que a tendência empirista
é uma das características do ensino tradicional. Ele próprio afirma: “pouco esforço foi necessário para
detectar, nos depoimentos dos docentes, posições nitidamente empiristas. Pode-se afirmar que o
empirismo é a forma que mais amplamente caracteriza a epistemologia do professor” (BECKER, 2005,
p. 39).
Behrens (1996, p. 82), confirmando a conclusão de Becker, declara que a “primeira impressão que se tem
ao percorrer os corredores das instituições escolares, salvaguardando as exceções, é que o paradigma
tradicional de ensino nunca abandonou a sala de aula”.
41FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância
EPISTEMOLOGIA INATISTA (APRIORISTA)
A fundamentação epistemológica fundada no apriorismo ou inatismo, diferentemente do empirismo,
apresenta uma pedagogia centrada no aluno. Uma das ideias bem difundidas é aquela que concebe
a inteligência como uma capacidade, dom ou vocação que possuímos independentemente de nossos
esforços ou dos ensinamentos que recebemos na escola ou na vida (MACEDO, 2002).
Aconcepçãoinatistatemcomopressupostoqueasqualidadesecapacidadesbásicasdecadaserhumano,
sua personalidade, seus valores, hábitos e crenças, sua forma de pensar, suas reações emocionais e
mesmo sua conduta social, já se encontrariam basicamente prontas por ocasião do nascimento, sofrendo
pouca diferenciação qualitativa e quase nenhuma transformação ao longo da existência.
Nessa tendência, há preocupação com problemas psicológicos, estudo sobre o desenvolvimento
emocional, cognitivo e criativo. O sujeito é percebido como indivíduo único, com capacidades cognitivas
e emocionais subjetivas, um ser inacabado com necessidades individuais, mas pertencente a um meio
coletivo.
A concepção de conhecimento que acredita que se conhece porque já se traz algo, ou inato ou programado
na bagagem hereditária, para amadurecer mais tarde, em etapas previstas, chama-se apriorismo e pode
ser representada, como modelo, da seguinte fórmula:
S O
Becker (2003) declara que esta epistemologia acredita que o ser humano nasce com o conhecimento já
programado na sua herança genética. A interferência do meio – físico ou social – deve ser reduzida ao
mínimo. A partir dessa perspectiva, a educação surge como um processo de atualização, no sentido de
tornar presente o que cada um tem em potência.
A epistemologia apriorista e a prática pedagógica do professor
O papel do professor deve ser de investigador, orientador, levando o aluno a trabalhar o mais independente possível
Fonte:PHOTOS.COM
Fundamentos historiocos e epistemologicos
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Fundamentos historiocos e epistemologicos

  • 1. Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA PÓS-GRADUAÇÃO NÚCLEO COMUM CURSOS DE EDUCAÇÃO MARINGÁ-PR 2012
  • 2. Reitor: Wilson de Matos Silva Vice-Reitor: Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor de Administração: Wilson de Matos Silva Filho Presidente da Mantenedora: Cláudio Ferdinandi NEAD - Núcleo de Educação a Distância Diretoria do NEAD: Willian Victor Kendrick de Matos Silva Coordenação Pedagógica: Gislene Miotto Catolino Raymundo Coordenação de Marketing: Bruno Jorge Coordenação Comercial: Helder Machado Coordenação de Tecnologia: Fabrício Ricardo Lazilha Coordenação de Curso: Márcia Maria Previato de Souza Assessora Pedagógica: Fabiane Carniel Supervisora do Núcleo de Produção de Materiais: Nalva Aparecida da Rosa Moura Capa e Editoração: Daniel Fuverki Hey, Fernando Henrique Mendes, Luiz Fernando Rokubuiti e Thayla Daiany Guimarães Cripaldi Supervisão de Materiais: Nádila de Almeida Toledo Revisão Textual e Normas: Cristiane de Oliveira Alves, Gabriela Fonseca Tofanelo, Janaína Bicudo Kikuchi, Jaquelina Kutsunugi e Maria Fernanda Canova Vasconcelos Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central - CESUMAR “As imagens utilizadas neste livro foram obtidas a partir do site PHOTOS.COM”. Av. Guedner, 1610 - Jd. Aclimação - (44) 3027-6360 - CEP 87050-390 - Maringá - Paraná - www.cesumar.br NEAD - Núcleo de Educação a Distância - bl. 4 sl. 1 e 2 - (44) 3027-6363 - ead@cesumar.br - www.ead.cesumar.br
  • 3. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo
  • 4.
  • 5. 5FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância APRESENTAÇÃO DO REITOR Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desafio para todos os cidadãos. A busca por tecnologia, informação, conhecimento de qualidade, novas habilidades para liderança e solução de problemas com eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho. Cada um de nós tem uma grande responsabilidade: as escolhas que fizermos por nós e pelos nossos fará grande diferença no futuro. Com essa visão, o Cesumar – Centro Universitário de Maringá – assume o compromisso de democratizar o conhecimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros. Nocumprimentodesuamissão–“promoveraeducaçãodequalidadenasdiferentesáreasdoconhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” –, o Cesumar busca a integração do ensino-pesquisa-extensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento da consciência social e política e, por fim, a democratização do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade. Diante disso, o Cesumar almeja ser reconhecido como uma instituição universitária de referência regional e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição de competências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; consolidação da extensão universitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e administrativa; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relacionamento permanente com os egressos, incentivando a educação continuada. Professor Wilson de Matos Silva Reitor
  • 6. 6 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância Caro aluno, “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p. 25). Tenho a certeza de que no Núcleo de Educação a Distância do Cesumar, você terá à sua disposição todas as condições para se fazer um competente profissional e, assim, colaborar efetivamente para o desenvolvimento da realidade social em que está inserido. Todas as atividades de estudo presentes neste material foram desenvolvidas para atender o seu processo de formação e contemplam as diretrizes curriculares dos cursos de graduação, determinadas pelo Ministério da Educação (MEC). Desta forma, buscando atender essas necessidades, dispomos de uma equipe de profissionais multidisciplinares para que, independente da distância geográfica que você esteja, possamos interagir e, assim, fazer-se presentes no seu processo de ensino-aprendizagem-conhecimento. Neste sentido, por meio de um modelo pedagógico interativo, possibilitamos que, efetivamente, você construa e amplie a sua rede de conhecimentos. Essa interatividade será vivenciada especialmente no ambiente virtual de aprendizagem – AVA – no qual disponibilizamos, além do material produzido em linguagem dialógica, aulas sobre os conteúdos abordados, atividades de estudo, enfim, um mundo de linguagens diferenciadas e ricas de possibilidades efetivas para a sua aprendizagem. Assim sendo, todas as atividades de ensino, disponibilizadas para o seu processo de formação, têm por intuito possibilitar o desenvolvimento de novas competências necessárias para que você se aproprie do conhecimento de forma colaborativa. Portanto, recomendo que durante a realização de seu curso, você procure interagir com os textos, fazer anotações, responder às atividades de autoestudo, participar ativamente dos fóruns, ver as indicações de leitura e realizar novas pesquisas sobre os assuntos tratados, pois tais atividades lhe possibilitarão organizar o seu processo educativo e, assim, superar os desafios na construção de conhecimentos. Para finalizar essa mensagem de boas-vindas, lhe estendo o convite para que caminhe conosco na Comunidade do Conhecimento e vivencie a oportunidade de constituir-se sujeito do seu processo de aprendizagem e membro de uma comunidade mais universal e igualitária. Um grande abraço e ótimos momentos de construção de aprendizagem! Professora Gislene Miotto Catolino Raymundo Coordenadora Pedagógica do NEAD- CESUMAR
  • 7. 7FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância APRESENTAÇÃO É necessário que os professores reflitam sobre as suas concepções de conhecimento Livro: FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo Prezado(a) acadêmico(a), fazer-se docente é um desafio! É reconhecer que somos seres culturais, afetiva e socialmente construídos. Desta forma, com o objetivo de cooperar no processo de formação de um profissional da educação, que possa a partir de sua prática pedagógica contribuir para a formação de um cidadão pleno1 , compartilho com você as minhas indagações e reflexões sobre a formação de professores e as possibilidades de construir, significativamente, o processo de ensinar e de aprender. Compartilho a ideia apresentada por Gimeno Sacristán e Pérez Gómez (1998), de que qualquer tentativa de mudança no sistema educativo, em busca da qualidade de ensino, deverá ter como uma das pedras angulares a formação inicial e continuada de professores. No entanto, gostaria de enfatizar que acredito que a melhoria da qualidade do ensino brasileiro não pode ser analisada exclusivamente sob a ótica dos que conduzem o processo – os professores – mas deve ser refletida, considerando a influência dos fatores históricos, políticos, sociais e econômicos que determinam as práticas educativas e seus fundamentos no contexto da sala de aula. Desta forma, o meu objetivo ao organizar a disciplina de “Fundamentos Históricos e Epistemológicos da Educação e suas Implicaçõespara a Prática Pedagógica”épossibilitarmomentos deestudo einquietações que certamente o conduzirá a reflexões teórico-práticas sobre o processo de ensinar e aprender. Por conseguinte, recomendo que durante essa disciplina procure interagir com os textos, fazer anotações, responder as atividades de autoestudo, anotar suas dúvidas, ver as indicações de leitura e realizar novas 1 Segundo Freire (1996), denomina-se cidadão pleno o indivíduo que tem acesso à educação e que por meio da aquisição do conhecimento científico possa desvelar a complexidade das relações sociais do seu entorno. Fonte:PHOTOS.COM
  • 8. 8 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância pesquisas sobre os assuntos tratados, pois com certeza não será possível esgotar essa temática nos momentos de estudos que juntos compartilharemos nesta disciplina. Para que você possa trilhar comigo esse processo de reflexão, apresento-lhe a forma como organizei este material. Na primeira unidade deste trabalho, verificaremos que historicamente os cursos de formação de professores apresentaram concepções que expressam diferentes formas de conceber a organização curricular e, consequentemente, o perfil dos profissionais que se formam para atuar na Educação Básica. Neste estudo compreenderemos que as práticas nos cursos de formação ora se caracterizaram pelo desenvolvimento de habilidades instrumentais, ora pela repetição de modelos descontextualizados. Também conheceremos outra concepção que aponta as possibilidades para a construção de propostas fundamentadas na concomitância da relação entre teoria e prática. Dessa forma, a relevância em analisar as diferentes concepções no processo de formação docente possibilitou questionar suas possíveis contribuições na formação de um profissional competente que seja sujeito-ator da sua realidade profissional e social, contribuindo de fato para a formação de cidadãos. Na sequência deste estudo, constataremos como as teorias epistemológicas que circundam a formação docente determinam a concepção de ensinar e de aprender dos profissionais que se formam para atuar na Educação Básica. Desta forma, discutiremos na segunda unidade o processo de apropriação do conhecimento nas concepções epistemológicas empiristas, aprioristas e comportamentalistas e como essas teorias sustentam as diferentes formas de representar a atuação do professor e a apropriação do conhecimento pelo aluno. E, finalmente, na terceira unidade, refletiremos sobre a epistemologia relacional e questionaremos as suas possíveis contribuições para a atuação de um profissional competente que seja sujeito-ator da sua realidade profissional e social, contribuindo de fato para a formação de cidadãos. Portanto, durante o percurso que trilharemos, espero que possa compreender o quão importante é a epistemologia na atuação do profissional da educação e que traduzidas didaticamente, fazem avançar, retardar ou até impedir o processo de construção do conhecimento. INTRODUZINDO A QUESTÃO Fonte:PHOTOS.COM
  • 9. 9FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância A sociedade se submete a processos de aceleradas mudanças, avanços e disseminação de novas tecnologias, globalização e ao dinamismo da sociedade de informação. A competitividade internacional leva a modificações nos padrões de produção e consumo. Novas tecnologias de produção afetam a organização do trabalho, modificando cada vez mais o perfil do trabalhador necessário para esse novo tipo de produção. Surgem novas profissões, desaparecem outras. Há uma tendência de intelectualização do processo de produção implicando mais conhecimentos, uso da informática e de outros meios de comunicação, habilidades cognitivas e comunicativas, flexibilidade de raciocínio. Para serem enfrentados os desafios do avanço acelerado da ciência e da tecnologia, da mundialização da economia, da transformação dos processos de produção, do consumismo, do relativismo moral, é preciso um maciço investimento na educação escolar em todos os níveis de ensino, para que assim seja possível que todos os docentes, em específico, os professores da Educação Básica, desenvolvam habilidades indispensáveis em seus alunos para a formação de sujeitos ativos que estabeleçam relações entre o conhecimento e as formas como este conhecimento aparece na sociedade, bem como em desvelar a complexidade das relações sociais, econômicas, políticas, culturais e educacionais do mundo em que vivem. Nesse contexto social acima descrito, comungamos com Apple (2006) quando defende a ideia de que o problema do conhecimento educacional, do que se ensina nas escolas, especificamente na sociedade atual, tem de ser considerado como uma forma de distribuição mais ampla de bens e serviços de uma sociedade.Nãoconstituimeramenteumproblemaanalítico–oquedevemosconstruircomoconhecimento? - Nem simplesmente um problema técnico – como organizar e guardar o conhecimento de forma que as crianças possam ter acesso a ele e dominá-lo?- Nem puramente um problema psicológico - como fazer com que os alunos aprendam? Em vez disso, o estudo do conhecimento educacional deve constituir-se em estudo ideológico e epistemológico que possibilite aos professores romperem com as barreiras do senso comum impostas pelo processo de naturalização e desvelar as condições reais de sua existência, possibilitando o processo de humanização em uma sociedade essencialmente individualista e instável. Destaforma,prezado(a)aluno(a),nestaunidadeiremosdiscutir:oqueéconhecimento?Comoconhecemos? Como acreditamos que nossos alunos aprendem? Como acreditamos que devemos ensiná-los? E como as teorias epistemológicas sustentam diferentes formas de representar a relação conhecimento/ensino/ aprendizagem escolar. O conhecimento escolar é trabalhado de forma fragmentada e descontextualizada das relações que os homens travam em sociedade, naturalizando as relações dominantes. Neste, impera o senso comum que poderá levar todos os envolvidos no processo escolar (alunos, professores, diretores e outros) a uma visão fragmentada do conhecimento e das relações sociais, contribuindo assim para alienação dos homens. Segundo Becker (2005), o conhecimento constitui a matéria-prima do trabalho docente, no entanto os professores trabalham com o conhecimento e não fundamentam criticamente a “matéria-prima” do seu trabalho. São sujeitos de uma epistemologia inconsciente e, com alta probabilidade, de uma epistemologia que não gostaria e não admitiria ser sua.
  • 10. 10 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância No entanto, acreditamos que o conhecimento não se configura de forma fragmentada constituindo um meio neutro de transmissão, mas expressa a possibilidade de efetivar o processo de humanização do indivíduo em sociedade, isto é, por meio do conhecimento podemos tornar o homem alguém digno e agente social de sua comunidade. Nesta perspectiva, consideramos que a assimilação e apropriação do conhecimento pelos alunos é considerada essencial para o desenvolvimento do indivíduo enquanto sujeito-ator de sua prática profissional e social. O homem na modernidade é um ser que somente se torna humano pela cultura, constituindo-se alguém dignificado e membro de uma comunidade mais universal Portanto, nesta disciplina, vamos juntamente refletir a necessidade do docente superar o senso comum ao trabalhar com o conhecimento, buscando a consciência crítica do fazer pedagógico sem o qual é impossível realizar uma verdadeira práxis, isto é, uma ação intencional fundada na relação dialética entre teoria e prática que certamente contribuirá para a formação de um cidadão pleno. Enfatizo,quenãotenhoapretensãodeesgotarcompletamenteossignificadosdasteoriasepistemológicas, mas tentar caracterizá-las em suas diferentes manifestações, buscando apreender as implicações decorrentes para a ação pedagógica do professor. Bom estudo!!! Fonte:PHOTOS.COM
  • 11. 11FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância SUMÁRIO UNIDADE I AS TEORIAS EPISTEMOLÓGICAS QUE CIRCUNDAM A FORMAÇÃO DOCENTE E DETERMINAM A CONCEPÇÃO DE CONHECIMENTO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO AS DIFERENTES CONCEPÇÕES PRESENTES NOS CURSOS DE FORMAÇÃO DOCENTE 15 A FORMAÇÃO DOCENTE COMO IMITAÇÃO DE MODELOS 17 A FORMAÇÃO DOCENTE COMO INSTRUMENTALIZAÇÃO TÉCNICA. 19 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A POSSIBILIDADE DE SUPERAÇÃO DA DICOTOMIA ENTRE O SABER E O FAZER DOCENTE: UM DESAFIO 22 UNIDADE II A FORMAÇÃO EPISTEMOLÓGICA DO PROFESSOR E SUA ATUAÇÃO NO PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO AS TEORIAS DO CONHECIMENTO 35 EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA 36 A EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR 37 EPISTEMOLOGIA INATISTA (APRIORISTA) 41 UNIDADE III AFORMAÇÃOEPISTEMOLÓGICADOPROFESSORPARAUMAPRÁTICAPOSSÍVELESIGNIFICATIVA A EPISTEMOLOGIA RELACIONAL E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR 56 A EPISTEMOLOGIA RELACIONAL E A POSSIBILIDADE DE UMA PRÁTICA INTERDISCIPLINAR 59 A EPISTEMOLOGIA RELACIONAL E O DESENVOLVIMENTO DE UMA POSTURA INVESTIGATIVA NO PROCESSO DE ENSINAR E APRENDER 60 CONCLUSÃO 70 REFERÊNCIAS 72
  • 12.
  • 13. 13FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância UNIDADE I AS TEORIAS EPISTEMOLÓGICAS QUE CIRCUNDAM A FORMAÇÃO DOCENTE E DETERMINAM A CONCEPÇÃO DE CONHECIMENTO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo Objetivos de Aprendizagem • Analisar e estudar as teorias epistemológicas que circundam a formação docente e determinam a concepção de conhecimento dos profissionais da educação. • Estudar os concepções epistemológicas que orientam a formação docente: imitação de modelos, instrumentalização técnica e superação da dicotomia teoria e prática. • Compreender como a superação da dicotomia teoria e prática se manifesta no fazer pedagógico dos professores, permeando a sua concepção de conhecimento. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • As diferentes concepções presentes nos cursos de formação docente • A formação docente como imitação de modelos • A formação docente como instrumentalização técnica • A formação de professores e a possibilidade de superação da dicotomia entre o saber e o fazer docente: um desafio
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  • 15. 15FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância INTRODUÇÃO Caro(a) aluno(a), nesta primeira unidade você estudará um assunto muito interessante que o levará a refletir sobre o seu processo de formação inicial e continuada, especificamente na concepção epistemológica que você vivenciou e ainda vivencia na sua caminhada para se fazer um competente profissional da educação. Oestudodasconcepçõespermitirácompreenderqueoraaconcepçãonocursodeformaçãosecaracteriza pelo desenvolvimento de habilidades instrumentais, ora pela repetição de modelos descontextualizados e que ambas sustentam a dicotomia entre teoria e prática no processo de formação docente. No entanto, também conheceremos que existe outra concepção que apresenta por meio da concomitância da teoria e da prática a possibilidade de formamos um docente que fará de sua prática pedagógica um processo de reflexão e investigação. Portanto, nesta unidade conheceremos as diferentes concepções que circundaram a formação de professores e teremos condições de questionar as possíveis contribuições na formação de um profissional competente que seja sujeito-ator da sua realidade profissional e social, contribuindo de fato para a formação de alunos que terão a possibilidade de entender o funcionamento da sociedade e intervir em sua orientação e estruturação. AS DIFERENTES CONCEPÇÕES PRESENTES NOS CURSOS DE FORMAÇÃO DOCENTE No processo de formação, o professor deve constituir-se sujeito-ator de sua realidade profissional e social Prezado(a) acadêmico(a), acredito que ser educadores não faz parte do nosso destino, isto é, não constitui algo que estava predeterminado, mas constitui parte da nossa história e de cuja responsabilidade não podemos nos eximir. Compor a nossa história, fazendo-se docente, significa comprometer-se com processos sociais, políticos e educativos que contribuem concomitantemente para a nossa (trans) Fonte:PHOTOS.COM
  • 16. 16 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância formação, como também da realidade na qual estamos inseridos. Neste sentido, Freire (1993, p. 87), com seus escritos, faz-nos acreditar cada vez mais que: Não nasci, porém marcado para ser um professor assim. Vim me tornando desta forma no corpo das tramas, na reflexão sobre a ação, na observação atenta a outras formas práticas ou à prática de outros sujeitos, na leitura persistente, crítica, de textos teóricos, não importa se com eles estava de acordo ou não. Dessa forma, caro(a)acadêmico(a), poracreditarna possibilidade de reflexão do professor, por meio do seu processo de formação seja inicial ou continuada, apresento a você as três concepções epistemológicas existentes historicamente que marcaram e ainda marcam a história da formação de professores e determinam, em última instância, a atuação do professor na dinâmica interna da sala de aula. Nesse sentido, Santomé (2003, p. 11) afirma: Educar significa oferecer a cidadãos e cidadãs conhecimentos e habilidades para analisar o funcionamento da sociedade, e para poder intervir em sua orientação e estruturação. Isso inclui também gerar capacidades e possibilidades de obter informações para criticar esses modelos produtivos e essas instituições do Estado quando não funcionam democraticamente e favorecem os grupos sociais mais privilegiados. A primeira concepção que permeia o processo de formação docente compreende o período de criação do curso de Pedagogia, desde 1939 até o final da década de 1950. Nesse período, segundo Pimenta e Lima (2004, p. 36), a formação de professores se “reduz a observar os professores em aula e imitar esses modelos, sem proceder a uma análise crítica e fundamentada teoricamente e legitimada na realidade social em que o ensino se processa”. Entre 1962 até o final da década de 1970, vivencia-se a segunda concepção. Nessa, a formação de professores é marcada pela racionalidade técnica, a partir da qual “o conceito de prática passa a ser entendido, então, como o desenvolvimento de habilidades instrumentais necessárias ao desempenho da ação docente ou, dito de outra forma, prática é o treinamento em situações experimentais” (CAIMI, 2004, p. 87). Esse tipo de preparação de professores constitui-se em tarefa aparentemente fácil que se desenvolve rapidamente. No entanto, a minha experiência como docente nos cursos de licenciatura demonstra-me que o processo de formação de professores não é estabelecido de um momento para o outro, mas demanda tempo e necessita uma relação dialética entre teoria e prática que possibilite aos professores uma nova dimensão de trabalho em sala de aula. No início da década de 1980, o caráter instrumental da prática começa a ser intensamente questionado, ocorrendo um processo de articulação principalmente das associações profissionais e entidades representativas de professores que, por meio de um esforço conjunto, buscam a superação da dicotomia entre teoria e prática no processo de formação de professores. Nessa concepção, o papel das teorias é iluminar e oferecer instrumentos e esquemas para análise e investigação que permitam questionar as práticas institucionalizadas e as ações dos sujeitos e, ao mesmo tempo, colocar elas próprias em questionamento, uma vez que as teorias são explicações sempre provisórias da realidade (PIMENTA; LIMA, 2004, p. 43).
  • 17. 17FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância Portanto, é imprescindível analisar as diferentes concepções no processo de formação de professores, questionando as suas possíveis contribuições na formação de um profissional que seja sujeito-ator da sua realidade profissional e social e, dessa forma, contribua efetivamente para o processo de construção de conhecimento de seus alunos. A FORMAÇÃO DOCENTE COMO IMITAÇÃO DE MODELOS Processo de formação fundamentado na imitação de modelos não possibilita ao professor a reflexão sobre o seu fazer pedagógico. Entre o período de 1939 a 1950, no curso de Pedagogia, estava presente a dicotomia entre dois compo- nentes do processo pedagógico: o conteúdo e o método, a teoria e a prática. Neste sentido, a formação de professores estava fundamentada na observação e imitação dos modelos existentes de práticas bem- -sucedidas. Lourenço Filho (2001, p. 55) explica “o que os alunos-mestres aprendem, nessa situação de grosseiro empirismo, é a cópia de algumas qualidades, sem dúvida alguma, mas especialmente, a de vícios e defeitos na direção da classe, por mais perfeito que fosse o modelo”. Segundo Pimenta e Lima (2004), essa concepção não valoriza a formação intelectual do professor, reduzindo o processo de formação docente a um fazer que se considerava bem-sucedido quando se assemelhava aos modelos observados. Nesse sentido, Saviani (1980, p. 60) adverte: Por consciência aguda da realidade em que vão atuar, entendemos a necessidade de levar ao aluno o conhecimento elaborado e a compreensão crítica desta realidade. Tal conhecimento deve permear todo o processo de formação em grau crescente de complexidade e não se limitar a determinadas disciplinas, a um determinado momento do curso. Ele se dá tanto de forma direta (observável empiricamente) como de forma individual (através da fundamentação histórica, filosófica, sociológica, psicológica, etc.), pois aquilo que aparece imediatamente não manifesta por si só a realidade em toda a sua concreticidade. Existe oculta, subjacente ao dado observável, a essência do real, a sua estrutura, que não se expressa diretamente e que necessita ser captada. Fonte:PHOTOS.COM
  • 18. 18 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância Esse modelo de formação inicial remete-me à metáfora “Currículo do nadador”, de Jacques Busquet (1974 apud PEREIRA, 1999, p. 112), ao descrever o “curso de preparação de nadadores”: Imagine uma escola de natação que se dedica um ano a ensinar anatomia e fisiologia da natação, psicologia do nadador, química da água e formação dos oceanos, custos unitários das piscinas por usuário, sociologia da natação (natação e classes sociais), antropologia da natação (o homem e a água)e,ainda,ahistóriamundialdanatação,dosegípciosaosnossosdias.Tudoisso,evidentemente, à base de cursos enciclopédicos, muitos livros, além de giz e quadro-negro, porém sem água. Em uma segunda etapa, os alunos-nadadores seriam levados a observar, durante outros vários meses, nadadores experientes; depois dessa sólida preparação, seriam lançados ao mar, em águas bem profundas, em um dia de temporal. Fazendo uma analogia entre o modelo de formação docente e o curso de preparação de nadadores, realizada por Jacques Busquet (1974 apud PEREIRA, 1999), pode-se concluir que o futuro professor, ao deparar-se com a realidade da sala de aula e ao buscar a resolução dos desafios existentes no cotidiano da prática pedagógica, por meio da imitação dos modelos observados, ficará verdadeiramente sem direção, pois muitas das situações existentes na prática pedagógica não são resolvidas simplesmente pela imitação de metodologias observadas, mas sim pela investigação das possibilidades e necessidades do contexto educacional e social. Segundo Barreiro e Gedran (2006), a concepção que permeava a formação docente estava diretamente vinculada à imitação, observação e reprodução do fazer pedagógico dos docentes nos ginásios de aplicação2 , considerados modelos para a futura atuação profissional, sem qualquer preocupação com as diferenças e desigualdades existentes entre os alunos. Acredito que essa forma de encaminhar a formação de professores apresentava algumas limitações, pois como afirmam Pimenta e Lima (2004, p. 35), “em que se pese a importância dessa forma de aprender, ela não é suficiente e apresenta alguns limites. Nem sempre o futuro professor dispõe de elementos para essa ponderação crítica e apenas tenta transpor os modelos em situações para as quais não são adequados”. No entanto, considero importante enfatizar que essa transposição ainda constitui a concepção de alguns cursos de formação de professores que não possibilitam ao futuro professor a reflexão sobre o seu fazer pedagógico, resumindo a sua prática à transmissão de conteúdos sem pensar nas possibilidades e condições de aprendizagens dos sujeitos envolvidos. Nesta perspectiva de formação, o professor não é capacitado a desvelar a complexidade das relações escolares e sociais. Dessa forma, essa concepção desconsiderava que para a formação de professores era necessário mobi- lizar vários procedimentos e ampla fundamentação teórica, e que o conhecimento não se adquire olhando ou contemplando a prática desenvolvida pela professora primária, para em seguida tentar imitá-la. Exige- -se que se instrumentalize o olhar com teorias, estudos, que se conheça como a realidade foi gerada, condição fundamental para conhecê-la e interpretá-la. O pressuposto dessa concepção, que prioriza a imitação de modelos, é que a realidade do ensino é imutável e os alunos que frequentam a escola também o são. Assim, ao priorizar as práticas e os 2 Conforme o artigo 1º do Decreto-Lei nº. 9053, “as Faculdades de Filosofia federais, reconhecidas ou autorizadas a funcionar no território nacional, ficam obrigadas a manter um ginásio de aplicação destinado à prática docente dos alunos matriculados no curso de didática” (BRASIL, 1976, p. 1).
  • 19. 19FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância instrumentos consagrados tradicionalmente como modelos eficientes, a escola daquela época resume seu papel a ensinar; se os alunos não aprendem, o problema é deles, de suas famílias, de sua cultura diversa daquela tradicionalmente valorizada pela escola (PIMENTA; LIMA, 2004). Assim, não são considerados os determinantes econômico-sociais, concebendo a escola como histórica, neutra, e autônoma frente à realidade social. Todavia, esse tipo de formação que prioriza a reprodução de prática modelar é insuficiente para subsidiar o professor para a resolução de situações de aprendizagem de seus alunos, de casos únicos que fazem parte dos desafios do cotidiano escolar. Portanto, por meio deste estudo foi possível verificar que essa concepção estava situada historicamente entre as décadas de 1930 e 1950, momento peculiar da organização curricular do curso de Pedagogia e, neste contexto, constituía-se “o modo de aprender a profissão, conforme a perspectiva da imitação, será a partir da observação, imitação, reprodução e, às vezes, reelaboração dos modelos existentes na prática consagrados como bons” (PIMENTA; LIMA, 2004, p. 35). Ainda que apresente alguns benefícios, o processo de formação de professores não deve restringir-se a essa concepção, pois não possibilitava a formação de um profissional da educação sujeito-ator de sua prática profissional e social. A FORMAÇÃO DOCENTE COMO INSTRUMENTALIZAÇÃO TÉCNICA A simples habilidade de aplicar técnicas não garante a resolução dos desafios do cotidiano escolar A política educacional que os militares impuseram, a partir da década de 1960, em todos os níveis de ensino, inspirada na assessoria americana pelos acordos do MEC-USAID, centrada na racionalidade, eficiência e produtividade, criando-se a ideia de que o técnico em educação configurava-se em um profissional imprescindível à realização da educação como fator de desenvolvimento nacional. Segundo Lima (2004), essa ideia constituiu estratégia bem coerente com o modelo político-econômico do Brasil naquele momento. Brzezinski (1996) declara que essa prática autoritária transportou para a organização escolar formas Fonte:PHOTOS.COM
  • 20. 20 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância fragmentadas de conceber o trabalho docente, visando atingir, cada vez mais, a produtividade ao determinar as funções a serem desempenhadas pelo futuro professor: docência, administração, supervisão, orientação educacional e inspeção escolar. Nesse sentido, as propostas de formação de professores fundamentavam-se no aprendizado de técnicas de ensino, sem qualquer possibilidade de pensar, criar ou inovar. Segundo Barreta (2008, p.44): O regime ditatorial implantado em 1964 influenciou a política educacional de forma profunda e radical, inclusive nas propostas de formação docente. Vale destacar a forte influência que passou a ter o ideário tecnicista na educação, que inseriu a escola nos modelos de racionalização dos sistemas de produção capitalista. Dessa forma, a formação de professores e, consequentemente, o conceito de prática, passaram a ser concebidos como o desenvolvimento de habilidades instrumentais necessárias à boa atuação da ação docente. Assim, para desempenhar a sua função, bastava que o professor escolhesse e executasse com eficiência as técnicas de ensino. Caimi (2004) afirma que não há como negar que qualquer profissão utiliza técnica, e a profissão de professor não é diferente. No entanto, a simples habilidade de aplicar técnicas não garante a resolução dos problemas de uma área tão complexa e não permite ao professor compreender a natureza dos saberes docentes e suas implicações no contexto escolar. Schön (1992) afirma que a racionalidade técnica prevalece nas universidades que formam o docente e que essa formação pressupõe que os problemas enfrentados pelos profissionais possam ser solucionados pela aplicação de teorias e técnicas. Nesse sentido, o autor enfatiza que este tipo de formação é insuficiente para munir o profissional para a resolução de situações problemáticas, de casos únicos, que não estão nos livros e que certos profissionais enfrentam em sua prática. A instrumentalização técnica se impõe sobre todos os outros momentos do processo de formação dos professores. Nessa perspectiva, o processo de formação fica reduzido à hora da prática, ao como fazer, às técnicas a serem empregadas em sala de aula, ao desenvolvimento de habilidades específicas do manejo de classe, ao preenchimento de fichas de observação; diagramas; fluxogramas, à produção de materiais didáticos e atividades sistematizadas que tinham por objetivo padronizar o comportamento dos alunos e auxiliar os futuros professores no desempenho de suas atividades em sala de aula. Essaconcepçãodeformaçãonãocapacitavaosfuturosprofessoresaenfrentaremosdesafiosquesurgem no interior da sala de aula, pois os modelos e técnicas pedagógicas apreendidas constituíam regras didáticas que deveriam ser aplicadas a qualquer situação de ensino, não possibilitando a compreensão e a resolução dos problemas do cotidiano escolar. No entanto, o processo educativo também inclui situações específicas de instrumentalização, no entanto, não deve ser reduzido a isso. É necessário que o futuro professor, a partir do conhecimento teórico e da realidade na qual atuará, tenha a “competência de selecionar quais técnicas são mais apropriadas para as diversas e diferentes situações em que o processo ensino-aprendizagem ocorre” (PIMENTA; LIMA, 2004, pp. 38-39).
  • 21. 21FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância Nessaperspectiva,ainstrumentalizaçãotécnicaaserensinadaaofuturoprofessor,envolveoplanejamento, a seleção de conteúdos, os procedimentos de ensino, as metodologias didáticas e instrumentos avaliativos. Não se deve limitar ao campo específico da prática e perder as suas relações com os fundamentos teóricos e o processo de reflexão. Pérez Gómez (1992, p. 98) declara que “a lógica dos cursos de formação inicial de professores seguia a base epistemológica da racionalidade técnica na qual a atividade do profissional é, sobretudo, instrumental dirigida para a solução de problemas mediante a aplicação rigorosa de teorias e técnicas científicas”, as quais se aprendiam supostamente com os que sabiam fazer. Assim, havia separação entre teoria e prática, forma e conteúdo, configurando uma hierarquização das disciplinas denominadas teóricas, ministradas nos primeiros anos do curso, e as disciplinas pedagógicas, também chamadas de práticas, que visavam ensinar as habilidades ministradas nos últimos anos, constituindo-se em um currículo normativo e prescritivo. Analisando os currículos de formação de professores, a partir da década de 1960, Brzezinski (1996, p. 78) declara: “à medida que a tendência tecnicista se infiltrava nos currículos, o curso de Pedagogia e os demais cursos que formavam professores foram marcados pela prática de atrofiar os conteúdos e hipertrofiar técnicas”. Dessa forma, o docente não necessitaria dominar conhecimentos científicos e poderia atuar apenas dispondo do domínio das intervenções técnicas aplicáveis em qualquer contexto. Esse reducionismo à prática, induz à compreensão de que a teoria reduz-se a um conjunto de regras, normas e conhecimentos sistematizados e aplicáveis a quaisquer situações e a prática à execução de técnicas desenvolvidas a partir de instrumentos sofisticados que garantem a eficiente transmissão de conhecimentos. Freitas (1996, p. 93) confirma essa perspectiva na formação de professores ao afirmar: Temos uma estrutura universitária que se organiza propedeuticamente, ou seja, toda nossa estrutura de graduação está montada em cima de uma concepção curricular que tem, implicitamente, uma noção de teoria e prática que aponta para o seguinte: primeiro, temos que dar a teoria para, depois, ela ser aplicada a situações práticas. A nossa organização universitária está montada em cima desta visão. Os cursos e aulas começam, em geral, com teoria e depois vão passando para aspectos práticos. Contreras (2002, pp. 90-91) contribui com a análise desta temática, destacando que está expresso nessa perspectiva de formação o modelo da racionalidade técnica: A idéia básica do modelo de racionalidade técnica é que a prática profissional consiste na solução instrumental de problemas mediante a aplicação de um conhecimento teórico e técnico, previamente disponível, que procede da pesquisa científica. É instrumental porque supõe a aplicação de técnicas e procedimentos que se justificam por sua capacidade para conseguir os efeitos ou resultados desejados. Assim, nesta concepção, o processo de formação se limitava ao momento da prática em que a ação se reduz à aplicação de técnicas, manejo de classe, preenchimento de planilhas, restringindo-se tão somente a uma tarefa burocrática, que passa apenas pela determinação de uma carga horária a ser cumprida e a produção de extensos relatórios sem fundamentos. Dessa forma, caracteriza-se em treinamento e,
  • 22. 22 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância portanto, não possibilita ao futuro professor uma reflexão fundamentada da relação teoria e prática, sobre o fazer pedagógico. Segundo essa visão pragmático-utilitarista, a teoria seria a garantia de resolução de qualquer tipo de problema da prática, uma vez que na teoria estariam as “receitas” almejadas para a resolução de impasses da prática do ensinar e do aprender. Contudo, o conhecimento elaborado nos cursos de formação de professores adquire significado quando de fato instrumentaliza o futuro docente a compreender e intervir na realidade social e escolar de modo crítico e transformador. Desta forma, as vicissitudes decorrentes deste processo de formação revelaram que nem a instrumentalização técnica, nem o exercício de dar aulas eram possíveis de ser realizados pelo futuro professor, para delas auferir conhecimentos pedagógicos suficientes para o exercício pleno da docência. Diante desse quadro, ainda presenciamos comportamentos permeados de pressupostos tecnicistas nos cursos de formação docente quando demonstram excessiva preocupação em conhecer novas técnicas e as valorizam como se elas pudessem resolver todos os desafios inerentes à atuação do profissional da educação. A seguir, apresentarei a concepção de formação fundamentada na relação teoria e prática. Essa concepção busca proporcionar ao futuro professor um profundo conhecimento da realidade para que se possa desvelar a sua complexidade e posicionar-se criticamente perante os acontecimentos sociais e escolares, bem como sólida fundamentação teórica, por meio da qual estabelecerá relações com a dinâmica interna da sala de aula, permitindo-lhe interpretá-la e intervir de forma consciente e planejada. Esse processo de formação, a partir da década de 80, passa a constituir o eixo estruturante da formação de professores e visará primordialmente a integração do saber e o fazer. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A POSSIBILIDADE DE SUPERAÇÃO DA DICOTOMIA ENTRE O SABER E O FAZER DOCENTE: UM DESAFIO Reconhecer a vinculação entre teoria e prática contribui para o desenvolvimento da autonomia intelectual do professor Fonte:PHOTOS.COM
  • 23. 23FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância Nesta unidade, apresento análises da concepção predominante nos cursos de formação de professores no contexto da educação brasileira, a partir das quais se pode verificar que, historicamente, a formação docente já foi concebida em alguns momentos como imitação de modelos bem-sucedidos, porém, sem análise crítica fundamentada teoricamente e validada pela realidade na qual o processo ensino e aprendizagem se efetivavam. Em outros contextos, passou a ser concebida como desenvolvimento de habilidades instrumentais necessárias à boa atuação do fazer docente. No entanto, a simples habilidade de aplicar técnicas ou seguir práticas modelares sem a devida reflexão não garantia ao professor compreender a natureza dos saberes docentes e suas implicações no contexto escolar. Segundo Caimi (2004), essas concepções formam um profissional intelectualmente desqualificado, com poucas possibilidades de vir a ser um profissional que questione a realidade, que pergunte pelo sentido da sua prática, enfim, que assuma uma atitude reflexiva diante da educação e da sociedade. Nesta perspectiva, o desafio é romper com essas concepções cristalizadas e que muito pouco contribuíram com a formação do professor. Porém, é possível romper com a histórica fragmentação curricular que insiste na dicotomia entre teoria e prática na formação de professores? Houssaye (2004) corrobora com a resposta, ao afirmar que somente formaremos um professor quando fizermos surgir no processo de formação um plus na e pela articulação teoria e prática. Nesse sentido, formar um professor pedagógica e politicamente competente significa torná-lo capaz de estabelecer relações entre os conteúdos discutidos nas instituições formadoras e a prática vivenciada na realidade escolar, possibilitando na vivência do fazer docente a concomitância teoria e prática. Desta forma, a importância de estudar as concepções que a formação de professores assume no contexto da educação brasileira está em questionar a possibilidade de formação do futuro professor que constrói e fortalece sua identidade profissional por meio da relação teoria e prática. Não obstante, estudos desenvolvidos por Behrens (1991), Schön (1992), Alarcão (1996), Nóvoa (1992), Freitas (1996), Lima (2002), Pimenta e Lima (2004), Tardif (2005) entre outros, também têm contribuído para que as práticas de formação de professores sejam repensadas e novas alternativas apontadas. Nesse sentido, Mizukami e Reali (2002, p. 207) alertam que a formação de professor não é portanto, tarefa que se conclua após estudos de um aparato de conteúdo e de técnicas para transmissão deles. É uma aprendizagem que deve se dar por meio de situações práticas que sejam efetivamente problemáticas, o que exige o desenvolvimento de uma prática reflexiva competente. Exige ainda que, para além de conceitos e de procedimentos, sejam trabalhadas atitudes, sendo estas consideradas tão importantes quanto aqueles. Freitas (1996), ao analisar a relação teoria e prática, destaca que não se trata de responder “com mais teoria” e “menos prática.” A questão é que os cursos de formação docente não formam adequadamente porque são fracos teórica e praticamente, ou seja, não assumem a formação do profissional para atuar na “prática social.” Nesse sentido, a formação do professor é preferencialmente vista como algo prático. Com isso, a formação teórica do educador corre sérios riscos. É importante salientar que muitos de nós colaboramos com esta visão, quando simplesmente propomos a inversão da ênfase no currículo de formação do professor,
  • 24. 24 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância defendendo o predomínio da “prática”. A tendência de colocar a formação teórica na dependência dos problemas práticos, do dia-a-dia, elimina a formação teórica (e política) do profissional, convertendo-o em um practitioner, um “prático” (FREITAS, 1992, pp. 95-96). Pimenta e Lima (2004, p. 33) também analisam essa temática e afirmam que os cursos de formação têm- se estruturado como: [...] um aglomerado de disciplinas isoladas entre si, sem qualquer explicitação de seus nexos com a realidade que lhes deu origem. Assim, nem sequer se pode denominá-las teorias, pois são apenas saberes disciplinares em cursos de formação, que em geral estão completamente desvinculados do campo de atuação do profissional dos futuros formandos. Percebo que a literatura sobre a formação inicial aponta a fragmentação quanto à relação teoria e prática nos currículos dos cursos de licenciaturas, especificamente da Pedagogia. De forma geral, esses cursos seguem o modelo da racionalidade técnica e trazem como representação a concepção de que a teoria se comprova na prática, condicionando uma visão que a teoria precede a prática e esta se limita à execução de tarefas. Dessa forma, o currículo constitui-se em um aglomerado de disciplinas isoladas entre si e que não estabelece qualquer relação com a realidade educacional e social que lhe deu origem, constituindo- -se apenas saberes disciplinares nos cursos de formação. Essa organização curricular fatalmente não conduzirá os professores à produção de um saber realmente significativo para o exercício pleno da do- cência. Mizukami e Reali (2002, p. 125), em suas pesquisas sobre a formação de professores, constatam que na organização do currículo nos cursos de formação de professores, a prática é realizada no final do curso, expressando um “coroamento” dos estudos teóricos realizados no início deste. Frequentemente, os cursos são organizados de maneira que as disciplinas teóricas de conteúdo específico precedem às de conteúdo pedagógico e às chamadas prática de ensino. Nestas circunstâncias é possível destacar que a relação teoria e prática torna-se comprometida pela pouca vinculação existente entre as disciplinas teóricas e aquelas de conteúdo prático-pedagógico, além do fato de a inserção do aluno/futuro professor nas situações reais de sala de aula ocorra tardiamente e de pouco tempo destinado ao efetivo, exercício profissional sob supervisão. A concomitância entre a teoria e a prática não é tarefa tão simples de ser realizada, pois as universidades, conjuntamente com seus professores, ainda privilegiam e institucionalizam o modelo da lógica disciplinar e conteudista. Nesta perspectiva, “[...] é preciso quebrar a lógica disciplinar universitária nos cursos de formação profissional. Não estamos dizendo que é preciso fazer as disciplinas da formação de professores desaparecerem; dizemos somente que é preciso fazer com que contribuam de outra maneira” (TARDIF, 2002, p. 275). Nesse sentido, não podemos deixar de insistir que os currículos dos cursos de formação de professores, organizados a partir de uma prática repetitiva, fragmentada e conteudista que dicotomiza teoria e prática, precisam ser urgentemente repensados, tendo-se como pressuposto a ideia de que formar profissionais não significa apenas formar pessoas dotadas de informações e de técnicas para o bem ensinar. É mais do que isso! Então, quais encaminhamentos formativos podem contribuir para uma formação docente que possibilite
  • 25. 25FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância ao professor vivenciar a concomitância entre o seu saber e o fazer? Pimenta (1988) indica-nos esse caminho ao indagar: o que poderia contribuir mais para a formação de um educador do que refletir sobre a realidade que observa e depois retornar a essa mesma realidade para inová-la e transformá-la, reinterpretando-a? Reconhecer a vinculação entre teoria e prática contribui para o desenvolvimento da autonomia intelectual do professor, qualidade necessária durante toda a sua vida profissional, para que não seja resistente a mudanças, apegando-se a modelos conhecidos, como também não seja influenciado por modismos que prometem revolucionar a educação escolar sem promover uma prática em que o conteúdo seja ressignificado. No entanto, Imbernón (2001) esclarece que se trata de um academicismo ingênuo pensar que o futuro professor, em contato com uma série de fundamentos disciplinares, será capaz de, automaticamente, transferir determinados conceitos, procedimentos, atitudes e habilidades do contexto acadêmico para a realidade profissional. Desse modo, é necessária uma mudança da lógica que estrutura a concepção curricular com maior aproximação entre a formação acadêmica e a prática escolar, possibilitando ao professor compreender que a prática não se restringe ao fazer, ela se constitui em uma atividade de reflexão que enriquece a teoria que lhe deu suporte, isto é, a prática não se explica por si mesma, ela procede de fundamentos teóricos que, a partir de uma relação dialética, permite compreender a realidade escolar. Nesta perspectiva, o processo de formação de professores não é estabelecido de um momento para o outro, mas demanda tempo e necessita de uma relação dialética entre as disciplinas do curso que possibilitará aos professores uma nova dimensão da dinâmica interna da sala de aula, conduzindo à reflexão crítica sobre o fazer docente. Nesse sentido, Freire (1996, pp. 43-44) afirma que: [...] na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática. Quando se trabalha integralmente teoria e prática, permitindo que a primeira seja o ponto de reflexão crí- tica sobre a realidade a fim de poder transformá-la, o processo de formação docente poderá constituir-se um elo, que certamente culminará em uma proposta significativa de interferência com vistas à mudança e à busca da qualidade de ensino. Assim, formaremos um profissional com domínio dos conhecimentos específicos e pedagógicos, que fará de sua prática um processo de investigação. Nessesentido,édesumaimportânciaqueoprofissionaldaeducaçãotenhasólidaformaçãoepistemológica para refletir, analisar e entender sobre a concepção de aprendizagem e conhecimento que, em última instância, determina o seu fazer pedagógico. É importante que entenda que a forma como se concebe o aprender e o conhecer determina e orienta o seu trabalho em sala de aula. Nestaperspectiva,MizukamieReali(2002,p.180)declaramque“asinvestigaçõessobreodesenvolvimento
  • 26. 26 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância profissional apontam para a necessidade de se explorar como os professores (re)elaboram suas formas de pensar o processo de ensino e aprendizagem, bem como as condições que facilitam tal aprendizagem”. Assim, durante o processo de formação, é necessário que o futuro professor tenha consciência de que determinadas concepções de aprendizagem, traduzidas didaticamente, fazem avançar, retardar ou até mesmo impedir o processo de construção do conhecimento (BECKER, 2005). Por exemplo, um professor que investe em atividades que têm como objetivo a transmissão de definições é partidário da concepção de que o aprendizado está diretamente ligado à prática de memorizar sem que o conhecimento “aprendido” concorra para uma mudança conceitual por parte de quem memorizou. Mesmo que o aluno consiga guardar esse conteúdo na memória, dificilmente irá estabelecer a relação existente entre o conteúdo escolar e as formas como esse conteúdo é expresso nas relações sociais, políticas, econômicas e culturais do contexto em que está inserido. Sendo assim, uma das habilidades que deve ser desenvolvida no futuro professor é a capacidade de reconhecer,pormeiodasatividadespedagógicasprivilegiadas,aconcepçãodeensinoeaprendizagemque orienta o seu fazer pedagógico. Ser capaz de perceber que as atividades de ensino são intencionalmente organizadas e desenvolvidas e que cada uma se justifica em função daquilo que se acredita ser aprender e ensinar. Compreender que a prática expressa uma teoria e constitui condição para que o professor, em sua prática pedagógica, não faça questionamentos baseados no senso comum que não levaram à reflexão do fazer docente, tais como: é correto corrigir o aluno? Posso realizar esta atividade? Por que é necessário fazer planejamento? Que técnica devo utilizar para os alunos aprenderem ortografia? Segundo Sforni e Galuch (1999), a relação entre teoria e prática faz com que preocupações desta natureza percam o sentido, uma vez que o professor passará a ver a sala de aula não apenas como sucessão de atividadesguiadaspelaaplicaçãode“novas”técnicaseprocedimentosdeensino,masdesseentendimento resulta uma prática em que se busca dialogar com os fundamentos teóricos, perguntando-se: até onde um conteúdo ou atividade são realmente adequados para a promoção de uma aprendizagem significativa? Quais as possibilidades e necessidades de aprendizagens dos alunos? Como o aluno pensou para elaborar essa resposta? Enfim, é necessário que o professor compreenda a dinâmica interna da sala de aula, percebendo o que os alunos compreenderam do assunto trabalhado; o que não compreenderam; por que se sabe que não compreenderam; e quais as intervenções a serem realizas para que realmente aprendam. No entanto, para que o futuro professor desenvolva a postura acima descrita, exige-se que durante o seu processo de formação, além do conhecimento da realidade escolar, da instrumentalização técnica ele receba sólida fundamentação teórica que lhe permita interpretar e direcionar a realidade para nela intervir de forma consciente e planejada. Desta forma, durante o processo de formação do professor é necessário um profundo conhecimento da realidade para que ele possa desvelar a sua complexidade e posicionar-se criticamente perante os
  • 27. 27FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância acontecimentos sociais e escolares, bem como uma sólida fundamentação teórica, por meio da qual estabelecerá relações com a dinâmica interna da sala de aula, permitindo-lhe interpretá-la e intervir de forma consciente e planejada para a aprendizagem de seus alunos. Nestesentido,concordocomPerrenoud(1999,p.57)aodeclararque“nocampodasaprendizagensgerais, um estudante será levado a construir competências de alto nível, confrontando-se regular e intensamente, com problemas numerosos, complexos e realistas, que mobilizem diversos tipos de recursos cognitivos”. Desta forma, apreendo que é possível repensar novas formas de encaminhar a formação de professores, de repensar novas maneiras de organizar os currículos para formação de professores que compreendam a sua prática profissional, primeiramente, como prática social. No entanto, é necessário romper com as barreiras existentes nos currículos dos cursos que os segmentam entre os blocos teóricos e práticos, bem como com a dicotomia na relação entre teoria-prática. Dessa forma, as diferentes propostas de formação de professores e, consequentemente, a valorização ou desvalorização que lhes são atribuídas em determinado contexto social revelam, na verdade, diferentes formas de pensar a escola em suas relações com o conhecimento e com a sociedade. Portanto, assim, um dos objetivos desta unidade é refletir sobre concepções que permeiam a formação do profissional da educação e como essas concepções se manifestam na forma do professor organizar a sua prática pedagógica, especificamente a sua concepção de ensinar e de aprender. CONSIDERAÇÕES FINAIS Verificamos que há várias concepções permeando o processo de formação docente. Analisar essas diferentes concepções possibilitou-nos questionar as possíveis contribuições na formação de um profissional competente que seja sujeito-ator da sua realidade profissional e social, contribuindo de fato para a formação de cidadãos. Consideramos o momento de formação muito importante, pois um período constituindo-se de fato um espaçoparaaconstruçãodeaprendizagens.Esseespaçopossibilitaaoprofessornovosencaminhamentos para resolução dos desafios existentes no cotidiano escolar, considerando que é na integração entre teoria e prática que são construídos e/ou reelaborados. Desvinculada e descomprometida com a realidade, a universidade em muitos momentos não se preocupa em produzir um saber que revele e transforme essa realidade. Produz um “saber”, só que ele é ilusório, frágil. Saber que não sabe; saber fragmentado e desatualizado na perspectiva teórica e sem qualquer ligação com a realidade concreta. Os estudantes dessa universidade talvez consigam dizer que estudaram tais teorias, ou tais autores,
  • 28. 28 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância ou melhor, leram sobre eles, mas não sabem para que serve esse saber e muito menos o que a produção desse “saber” tem a ver com a afi rmação ou a negação de interesses e necessidades fundamentais da sociedade (FÁVERO, 2001, p. 59). Entrevista: Eunice Durham Fábrica de maus professores Revista Veja. Edição 2088 26 de novembro de 2008 Uma das maiores especialistas em ensino superior brasileiro, a antropóloga não tem dúvida: os cursos de peda- gogia perpetuam o péssimo ensino nas escolas “Os cursos de pedagogia desprezam a prática da sala de aula e supervalorizam teorias supostamente mais nobres. Os alunos saem de lá sem saber ensinar”. Hoje há poucos estudiosos empenhados em produzir pesquisa de bom nível sobre a universidade brasileira. Entre eles, a antropóloga Eunice Durham, 75 anos, vinte dos quais dedicados ao tema, tem o mérito de tratar do assunto com rara objetividade. Seu trabalho representa um avanço, também, porque mostra, com clareza, como as universidades têm relação direta com a má qualidade do ensino oferecido nas escolas do país. Ela diz: “Os cursos de pedagogia são incapazes de formar bons professores”. Ex-secretária de política educacional do Minis- tério da Educação (MEC) no governo Fernando Henrique, Eunice é do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas, da Universidade de São Paulo – onde ingressou como professora há cinqüenta anos. Sua pesquisa mostra que as faculdades de pedagogia estão na raiz do mau ensino nas escolas brasilei- ras. Como? As faculdades de pedagogia formam professores incapazes de fazer o básico, entrar na sala de aula e ensinar a matéria. Mais grave ainda, muitos desses profi ssionais revelam limitações elementares: não conseguem escre- ver sem cometer erros de ortografi a simples nem expor conceitos científi cos de média complexidade. Chegam aos cursos de pedagogia com defi ciências pedestres e saem de lá sem ter se livrado delas. Minha pesquisa aponta as causas. A primeira, sem dúvida, é a mentalidade da universidade, que supervaloriza a teoria e me- nospreza a prática. Segundo essa corrente acadêmica em vigor, o trabalho concreto em sala de aula é inferior a refl exões supostamente mais nobres.
  • 29. 29FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância Essa filosofia é assumida abertamente pelas faculdades de pedagogia? O objetivo declarado dos cursos é ensinar os candidatos a professor a aplicar conhecimentos filosóficos, antro- pológicos, históricos e econômicos à educação. Pretensão alheia às necessidades reais das escolas – e absurda diante de estudantes universitários tão pouco escolarizados. O que, exatamente, se ensina aos futuros professores? Fiz uma análise detalhada das diretrizes oficiais para os cursos de pedagogia. Ali é possível constatar, com nú- meros, o que já se observa na prática. Entre catorze artigos, catorze parágrafos e 38 incisos, apenas dois itens se referem ao trabalho do professor em sala de aula. Esse parece um assunto secundário, menos relevante do que a ideologia atrasada que domina as faculdades de pedagogia. Como essa ideologia se manifesta? Por exemplo, na bibliografia adotada nesses cursos, circunscrita a autores da esquerda pedagógica. Eles con- fundem pensamento crítico com falar mal do governo ou do capitalismo. Não passam de manuais com uma visão simplificada, e por vezes preconceituosa, do mundo. O mesmo tom aparece nos programas dos cursos, que eu ajudo a analisar no Conselho Nacional de Educação. Perdi as contas de quantas vezes estive diante da palavra dialética, que, não há dúvida, a maioria das pessoas inclui sem saber do que se trata. Em vez de aprenderem a dar aula, os aspirantes a professor são expostos a uma coleção de jargões. Tudo precisa ser democrático, participativo, dialógico e, naturalmente, decidido em assembléia. Quais os efeitos disso na escola? Quando chegam às escolas para ensinar, muitos dos novatos apenas repetem esses bordões. Eles não sabem nem como começar a executar suas tarefas mais básicas. A situação se agrava com o fato de os professores, de modo geral, não admitirem o óbvio: o ensino no Brasil é ainda tão ruim, em parte, porque eles próprios não estão preparados para desempenhar a função. Por que os professores são tão pouco autocríticos? Eles são corporativistas ao extremo. Podem até estar cientes do baixo nível do ensino no país, mas costumam atribuir o fiasco a fatores externos, como o fato de o governo não lhes prover a formação necessária e de eles ganharem pouco. É um cenário preocupante. Os professores se eximem da culpa pelo mau ensino – e, conse- qüentemente, da responsabilidade. Nos sindicatos, todo esse corporativismo se exacerba. Como os sindicatos prejudicam a sala de aula? Está suficientemente claro que a ação fundamental desses movimentos é garantir direitos corporativos, e não o bom ensino. Entenda-se por isso: lutar por greves, aumentos de salário e faltas ao trabalho sem nenhuma espécie de punição. O absenteísmo dos professores é, afinal, uma das pragas da escola pública brasileira. O índice de ausências é escandaloso. Um professor falta, em média, um mês de trabalho por ano e, o pior, não perde um centavo por isso. Cenário de atraso num país em que é urgente fazer a educação avançar. Combater o corporativismo dos professores e aprimorar os cursos de pedagogia, portanto, são duas medidas essenciais à melhora dos indicadores de ensino. A senhora estende suas críticas ao restante da universidade pública? Há dois fenômenos distintos nas instituições públicas. O primeiro é o dos cursos de pós-graduação nas áreas de ciências exatas, que, embora ainda atrás daqueles oferecidos em países desenvolvidos, estão sendo capazes de fazer o que é esperado deles: absorver novos conhecimentos, conseguir aplicá-los e contribuir para sua evo- lução. Nessas áreas, começa a surgir uma relação mais estreita entre as universidades e o mercado de trabalho. Algo que, segundo já foi suficientemente mensurado, é necessário ao avanço de qualquer país. A outra realidade da universidade pública a que me refiro é a das ciências humanas. Área que hoje, no Brasil, está prejudicada pela ideologia e pelo excesso de críticas vazias. Nada disso contribui para elevar o nível da pesquisa acadêmica. Um estudo da OCDE (organização que reúne os países mais industrializados) mostra que o custo de um universitário no Brasil está entre os mais altos do mundo – e o país responde por apenas 2% das citações nas melhores revistas científicas. Como a senhora explica essa ineficiência? Sem dúvida, poderíamos fazer o mesmo, ou mais, sem consumir tanto dinheiro do governo. O problema é que as universidades públicas brasileiras são pessimamente administradas. Sua versão de democracia, profunda-
  • 30. 30 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância mente assembleísta, só ajuda a aumentar a burocracia e os gastos públicos. Essa é uma situação que piorou, sobretudo, no período de abertura política, na década de 80, quando, na universidade, democratização se tornou sinônimo de formação de conselhos e multiplicação de instâncias. Na prática, tantas são as alçadas e as exi- gências burocráticas que, parece inverossímil, um pesquisador com uma boa quantia de dinheiro na mão passa mais tempo envolvido com prestação de contas do que com sua investigação científica. Para agravar a situação, os maus profissionais não podem ser demitidos. Defino a universidade pública como a antítese de uma empresa bem montada. Muita gente defende a expansão das universidades públicas. E a senhora? Sou contra. Nos países onde o ensino superior funciona, apenas um grupo reduzido de instituições concentra a maior parte da pesquisa acadêmica, e as demais miram, basicamente, os cursos de graduação. O Brasil, ao contrário, sempre volta à idéia de expandir esse modelo de universidade. É um erro. Estou convicta de que já temos faculdades públicas em número suficiente para atender aqueles alunos que podem de fato vir a se tornar Ph.Ds. ou profissionais altamente qualificados. Estes são, naturalmente, uma minoria. Isso não tem nada a ver com o fato de o Brasil ser uma nação em desenvolvimento. É exatamente assim nos outros países. As faculdades particulares são uma boa opção para os outros estudantes? Freqüentemente, não. Aqui vale a pena chamar a atenção para um ponto: os cursos técnicos de ensino superior, ainda desconhecidos da maioria dos brasileiros, formam gente mais capacitada para o mercado de trabalho do que uma faculdade particular de ensino ruim. Esses cursos são mais curtos e menos pretensiosos, mas conse- guem algo que muita universidade não faz: preparar para o mercado de trabalho. É estranho como, no meio aca- dêmico, uma formação voltada para as necessidades das empresas ainda soa como pecado. As universidades dizem, sem nenhum constrangimento, preferir “formar cidadãos”. Cabe perguntar: o que o cidadão vai fazer da vida se ele não puder se inserir no mercado de trabalho? Nos Estados Unidos, cerca de 60% dos alunos freqüentam essas escolas técnicas. No Brasil, são apenas 9%. Por quê? Sempre houve preconceito no Brasil em relação a qualquer coisa que lembrasse o trabalho manual, caso desses cursos. Vejo, no entanto, uma melhora no conceito que se tem das escolas técnicas, o que se manifesta no au- mento da procura. O fato concreto é que elas têm conseguido se adaptar às demandas reais da economia. Daí 95% das pessoas, em média, saírem formadas com emprego garantido. O mercado, afinal, não precisa apenas de pessoas pós-graduadas em letras que sejam peritas em crítica literária ou de estatísticos aptos a desenvolver grandes sistemas. É simples, mas só o Brasil, vítima de certa arrogância, parece ainda não ter entendido a lição. Faculdades particulares de baixa qualidade são, então, pura perda de tempo? Essas faculdades têm o foco nos estudantes menos escolarizados – daí serem tão ineficientes. O objetivo núme- ro 1 é manter o aluno pagante. Que ninguém espere entrar numa faculdade de mau ensino e concorrer a um bom emprego, porque o mercado brasileiro já sabe discernir as coisas. É notório que tais instituições formam os piores estudantes para se prestar às ocupações mais medíocres. Mas cabe observar que, mesmo mal formados, esses jovens levam vantagem sobre os outros que jamais pisaram numa universidade, ainda que tenham aprendido muito pouco em sala de aula. A lógica é típica de países em desenvolvimento, como o Brasil. Por que num país em desenvolvimento o diploma universitário, mesmo sendo de um curso ruim, tem tanto valor? No Brasil, ao contrário do que ocorre em nações mais ricas, o diploma de ensino superior possui um valor inde- pendente da qualidade. Quem tem vale mais no mercado. É a realidade de um país onde a maioria dos jovens está ainda fora da universidade e o diploma ganha peso pela raridade. Numa seleção de emprego, entre dois candidatos parecidos, uma empresa vai dar preferência, naturalmente, ao que conseguiu chegar ao ensino su- perior. Mas é preciso que se repita: eles servirão a uma classe de empregos bem medíocres – jamais estarão na disputa pelas melhores vagas ofertadas no mercado de trabalho. A tendência é que o mercado se encarregue de eliminar as faculdades ruins? A experiência mostra que, conforme a população se torna mais escolarizada e o mercado de trabalho mais exigente, as faculdades ruins passam a ser menos procuradas e uma parte delas acaba desaparecendo do mapa. Isso já foi comprovado num levantamento feito com base no antigo Provão. Ao jogar luz nas instituições
  • 31. 31FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância que haviam acumulado notas vermelhas, o exame contribuiu decisivamente para o seu fracasso. O fato de o MEC intervir num curso que, testado mais de uma vez, não apresente sinais de melhora também é uma medida sensata. O mau ensino, afi nal, é um grande desserviço. A senhora fecharia as faculdades de pedagogia se pudesse? Acho que elas precisam ser inteiramente reformuladas. Repensadas do zero mesmo. Não é preciso ir tão longe para entender por quê. Basta consultar os rankings internacionais de ensino. Neles, o Brasil chama atenção por uma razão para lá de negativa. Está sempre entre os piores países do mundo em educação. Disponível em: http://veja.abril.com.br/261108/entrevista.shtml. Acesso em: 28 abr. 2011. Tardif é o autor da obra “Saberes Docentes e Formação Profi ssional” e professor universitário no Canadá e suas pesquisas abrangem vários países, inclusive o Brasil, onde já realizou palestras e encontros com profes- sores. É conhecedor da obra de Paulo Freire, enaltecendo-a no que tange à valorização do papel do professor como agente de mudanças e como intelectual engajado. Livro: Saberes Docentes e Formação Profi ssional Autor: Maurice Tardif Editora: Vozes [...] o saber não é uma coisa que fl utua no espaço: o saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de vida e com a sua história profi ssional, com as suas relações com aos alunos em sala de aula e com os outros atores escolares na escola etc. Por isso é necessário estudá-lo relacionando-os com esses elementos constitutivos do trabalho docente (TARDIF, 2002, p.11). Além dessa leitura recomendo também a entrevista do educador português e reitor da Universidade de Lisboa Antonio Nóvoa, concedida à Revista Aprendizagem ano 1, n. 2, pp.13-26, set./out. 2007, sobre a “Formação de professores e a qualidade do ensino,” disponível em: http://www.vithais.com.br/2010/02/antonio-novoa-e- -importancia-de-rever.html.
  • 32. 32 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância ATIVIDADE DE AUTOESTUDO 1) A partir das ideias presentes nesta unidade expresse a sua opinião, fundamentada em dois argumen- tos, sobre a formação de professores e a qualidade de ensino. 2) Tardif, em sua obra intitulada “Saberes docentes e formação profissional”, afirma que “é preciso quebrar a lógica disciplinar universitária nos cursos de formação profissional. Não estamos dizendo que é preciso fazer as disciplinas da formação de professores desaparecerem; dizemos somente que é preciso fazer com que contribuam de outra maneira” (2002, p. 275). a) Explique por que o autor canadense faz tal afirmação. b) Baseando-se nos fundamentos teóricos tratados nesta unidade, argumente quais seriam as conse- quências para o processo de formação de professores se os cursos de licenciaturas acatassem a orientação do autor. 3) Nesta unidade, retratamos a metáfora do “Currículo do nadador”, de Jacques Busquet ao descrever o “curso de preparação de nadadores”, nesta o autor afirma que “[...]depois dessa sólida preparação, seriam lançados ao mar, em águas bem profundas, em um dia de temporal”. Você considera que os cursos de formação de professores fornecem subsídios teóricos e práticos para a resolução dos desafios encontrados na dinâmica interna da sala aula? Justifique a sua respos- ta a partir da discussão realizada nesta unidade. 4) Verificamos, nesta unidade, que a concepção na formação de professores determina em última ins- tância a forma como o docente trabalhará com conhecimento. Neste sentido, descreva quatro enca- minhamentos didáticos que um professor formado na concepção tecnicista teria para ensinar seus alunos o processo da tabuada. 5) Freire (1996, pp. 43-44) afirma que “na formação permanente dos professores, o momento fundamen- tal é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática”. Explique e cite duas situações nas quais você pode vivenciar esse momento de processo de reflexão descrito por Freire.
  • 33. UNIDADE II A FORMAÇÃO EPISTEMOLÓGICA DO PROFESSOR E SUA ATUAÇÃONOPROCESSODEAPROPRIAÇÃODOCONHECIMENTO Professora Dra. Gislene Miotto Catolino Raymundo Objetivos de Aprendizagem • Analisar as teorias do conhecimento e a partir das suas implicações na prática docente superar o senso comum, buscando a consciência crítica do fazer pedagógico. • Estudar o processo ensino-aprendizagem e os pressupostos epistemológicos que orientam a prática docente. • Analisar, compreender e avaliar as teorias epistemológicas que orientam o processo de construção do conhecimento. • Compreender os fundamentos das teorias empiristas, inatistas e comportamentalistas e como essas teorias sustentam diferentes formas de representar a relação conhecimento/ensino/aprendizagem es- colar. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • As teorias do conhecimento • Epistemologia empirista • A epistemologia empirista e a prática pedagógica do professor • Epistemologia apriorista (inatista) • A epistemologia apriorista e a prática pedagógica do professor • Abordagem comportamentalista • Abordagem comportamentalista e a prática pedagógica do professor
  • 34.
  • 35. 35FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância INTRODUÇÃO Nesta segunda unidade, caro(a) aluno(a), iremos estudar sobre as concepções epistemológicas empiristas, apriorista e comportamentalista mostrando como essas teorias sustentam diferentes formas de representar a relação conhecimento/ensino/aprendizagem escolar. Neste sentido, é muito importante que você compreenda cada uma dessas concepções percebendo que no momento em que seleciona o conteúdo da disciplina que vai ensinar, quando decide pelo método e pelos procedimentos de ensino, quando enfrenta as dificuldades de aprendizagem dos seus alunos, está pressupondo algumas questões epistemológicas. Portanto, as opções didáticas que os professores fazem sobre qual conteúdo priorizará, qual método empregar para desenvolver as atividades de ensino e aprendizagem, qual instrumento de avaliação utilizar, não são neutros, sempre estão conduzidos por determinados valores, por determinadas concepções epistemológicas que, traduzidas didaticamente, fazem avançar, retardar ou até impedir o processo de construção do conhecimento. AS TEORIAS DO CONHECIMENTO O estudo da aquisição do Conhecimento ou a compreensão do processo em que ele se dá no ser humano está inserido em uma Ciência secular, cujo nome é EPISTEMOLOGIA. Segundo Aranha (2006), o termo epistemologia por ter adquirido um caráter mais crítico sobre o estudo do conhecimento, é também denominada de Filosofia das Ciências ou de Teoria do Conhecimento Científico. Aranha (2006, p.87) enfatiza: A epistemologia, também chamada teoria do conhecimento, é o ramo da filosofia interessado na investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento. Entre as questões principais que ela tenta responder estão as seguintes. O que é o conhecimento? Como nós o alcançamos? Podemos conseguir meios para defendê-lo contra o desafio cético? Nesta unidade, iremos refletir sobre as teorias do conhecimento, especificamente enfatizaremos o empirismo, o apriorismo e a epistemologia relacional. Estudaremos como que tais teorias sustentam as três diferentes formas de representar a relação conhecimento/ensino/aprendizagem escolar. Conhecer como ocorre a construção significativa do conhecimento no processo pedagógico é ajudar a eliminar a determinação social dos alunos. Desta forma, para o professor este conhecimento é imprescindível a fim de melhor saber como interagir com o educando e o conhecimento, no sentido de favorecer seu desenvolvimento e sua emancipação humana na sociedade. Becker (2005) declara que quando o professor seleciona o conteúdo da disciplina que vai ensinar, quando decide pelo método e pelos procedimentos de ensino, quando enfrenta as dificuldades de aprendizagem dos seus alunos está pressupondo algumas questões epistemológicas. Desta forma, as escolhas que se façam, quer acerca de qual conteúdo priorizar, qual método utilizar para desenvolver as atividades de
  • 36. 36 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância ensino e aprendizagem, qual instrumento de avaliação utilizar, não são neutros, sempre estão conduzidos por determinados valores, por determinadas concepções epistemológicas que, traduzidas didaticamente, fazem avançar, retardar ou até impedir o processo de construção do conhecimento. EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA Quando refletimos sobre o conhecimento, podemos designar não só o ato de conhecer, mas a relação entre o sujeito cognoscente (o sujeito que conhece) com um objeto cognoscível (objeto conhecido no ato de conhecer). Nesta perspectiva, a epistemologia empirista tem como suporte o primado do objeto sobre o sujeito: S O A aquisição do conhecimento se faz a partir do exterior. É uma aquisição exógena, que pode ocorrer por meio da sensação e da reflexão. Segundo Locke (2006), a sensação é o resultado da modificação que ocorre na mente, por meio dos sentidos, enquanto a reflexão é a percepção que a alma tem daquilo que nela ocorre. Desta forma, toda ênfase é dada ao meio externo, daí, constitui-se fundamental a experiência para a aquisição do conhecimento. Neste sentido, Becker (2003, p.90) afirma que “os empiristas são aqueles que pensam que o conhecimento acontece porque nós vemos, ouvimos, tateamos e não porque agimos”. Becker (2001) afirma que o ponto alto do empirismo é o teste da experiência: nada aceitar que não tenha passado pela experiência. Os empiristas são todos aqueles que pensam necessariamente de forma consciente que o conhecimento se dá por força dos sentidos. Isso não quer dizer que eles desprezem a razão, mas sim que a subordinem ao trabalho a priori da experiência. Segundo Becker (2006) e Mizukami (2001), a epistemologia empirista não possibilita a apropriação significativa, crítica, criativa e duradoura, por parte do conjunto dos educandos do conhecimento científico acumulado pela humanidade, de tal forma que pudesse servir como instrumento de construção da cidadania e de transformação da realidade. Por conseguinte, o que estamos buscando discutir nesta disciplina é a possibilidade de pensarmos um referencial teórico-metodológico que colabore para que o professor possa refletir sobre o seu trabalho com o conhecimento em sala de aula. Pois, acreditamos que é possível o educador ressignificar a sua prática pedagógica neste campo, tornando seu trabalho mais significativo, digno e realizador. Nesta perspectiva, conhecer como se dá o conhecimento no processo pedagógico e suas implicações na formação do indivíduo é instrumentalizar o professor a eliminar a determinação social dos destinos dos alunos. Neste sentido, advogamos a importância deste conhecimento para o profissional da educação a fim de melhor saber como interagir com o educando, no sentido de favorecer seu desenvolvimento e sua emancipação.
  • 37. 37FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância Portanto, é com esse intuito, caro(a) acadêmico(a), que passaremos agora a refletir sobre a manifestação da epistemologia empirista na prática pedagógica do professor, pois o professor que deseja ressignificar o seu trabalho com o conhecimento, precisa de uma concepção de ensinar e de aprender que redirecione o seu fazer pedagógico. A EPISTEMOLOGIA EMPIRISTA E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR Segundo Becker (2001), engana-se quem pensa que a transmissão do conhecimento foi superada, está sob controle ou foi domado. A escola continua a professá-lo, soberanamente, inclusive utilizando, com muita frequência, a linguagem da construção. Fala de construção de conhecimento e se pratica a transmissão. Essa prática impõe ao aluno a repetição como única forma aceitável de aprendizagem. E o papel do professor nesta abordagem, consiste em dominar e garantir a transmissão do conteúdo que é predefinido e que constitui o próprio fim da existência escolar. Compete-lhe informar e conduzir seus alunos em direção aos objetivos que lhe são externos, por serem os valores escolhidos pela escola necessários para a sociedade em que vive. Becker (2001, p. 97) declara que: Na visão empirista de inteligência a ênfase está na conversão, ou seja, na transformação, pelos benefícios da experiência, de nossa forma de aprender ou resolver problemas. Trata-se, portanto, de criar hábitos, rotinas e procedimentos favoráveis à aprendizagem. Trata-se de criar um contexto ou ambiente favorável que estimula o que é positivo, que afasta ou pune o que é negativo. O papel do adulto ou das pessoas responsáveis, nesse caso, é o de criar regras ou normas que delimitam ou definem o que deve ser feito em favor do que se quer realizar. Apesar de no discurso haver rejeição a essa postura, no cotidiano da escola verifica-se que é a mais presente, talvez nem tanto pela vontade dos educadores, mas por não se saber como efetivar uma prática diferente: “a gente acaba caindo na aula expositiva”. No entanto, nem sempre a aula expositiva apresenta-se de forma tão clara, explícita. Precisamos estar atentos para as pseudossuperações que têm surgido, pois se trata de manifestações dissimuladas, camufladas como, por exemplo: • Justaposição Aluno x Professor ou Professor x Aluno. • Falas (fala do professor - fala do aluno). • Técnicas (Pesquisa x Exposição; Exposição x Dramatização). • Substituição da exposição do professor pela exposição de um vídeo (ou do programa do computador). • Cadeiras em círculo e manutenção do monopólio da palavra com o professor. • Professor não adota livro didático, mas vive enchendo a lousa de matéria para alunos copiarem. • Aula expositiva do aluno no lugar do professor (os famigerados “seminários”). • Esvaziando o conteúdo: aula muito “gostosa”, “descontraída”, mas onde não se aprende nada. • Para ser “inovador”, o professor começa a aula perguntando aos alunos o que sabem sobre o assunto.
  • 38. 38 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância Depois que os alunos apresentam, solicita a atenção para o ponto que vai dar: “muito bem, fizeram a parte de vocês, agora é a minha vez”! Desta forma, verifica-se que os professores não consideram o que foi colocado pelos alunos. Assim sendo, muitos professores se confundem, pois acham que dando tempo para os alunos falarem, já significa uma metodologia nova. O problema, em si, não está no aluno falar, mas em haver interação entre as falas (aluno-professor, professor-aluno, aluno-aluno). Portanto, não se trata do professor não falar mais em sala de aula; trata-se de uma fala que se deve ocorrer em um contexto interativo e, portanto, significativo. Desta forma, é importante ficarmos atentos e refletirmos como estamos encaminhando o nosso trabalho com o conhecimento, pois revelamos por meio da nossa prática docente: posturas pedagógicas; saberes experienciais ou práticos, saberes curriculares, saberes da formação profissional, saberes didáticos e pedagógicos; referenciais teóricos; concepção de avaliação e de planejamento; enfim, a nossa concepção de ensinar e aprender. Nesta concepção, ensina-se por meio de perguntas e respostas que devem ser elaboradas em nível crescente de complexidade. Valoriza-se o produto, reforçando-se a repetição, cópia, memorização e fixação de conteúdos. Nesse sentido, se tem como pressuposto que ensinar é transmitir tudo o que os homens acumularam e aprender é incorporar esses conhecimentos. A aprendizagem é confundida com memorização e fixação, seguidos de exercícios sistemáticos e repetitivos. Segundo Paulo Freire (1996), nesta epistemologia o professor se torna um especialista em transferir conhecimento. Sendo assim, o professor não desenvolve algumas das habilidades necessárias e indispensáveis para possibilitar a produção do conhecimento: reflexão, crítica, curiosidade, inquietação, incerteza, todas essas indispensáveis ao sujeito cognoscente. Becker (2004, p. 270) explicita essa forma da escola empirista trabalhar com o conhecimento, afirmando que: por isso, a forma mais recorrente de a escola pensar o conhecimento é o conteúdo. Para a escola, conhecimento é conhecimento-conteúdo que, como tal, é arrolado na grade curricular. E, como convém ao modelo positivista, cuja base epistemológica é empirista, o conhecimento contemplado pelo currículo é composto de microunidades que são ensinadas, uma a uma, em pretensa ordem crescente de complexidade. Desta forma, a escola trabalha com o conhecimento que é externo ao indivíduo e este irá apossando-se gradativamente por meio de uma compreensão cada vez mais complexa e sofisticada. Nesta organização, algumas matérias são consideradas mais importantes que outras. Essa constatação pode ser feita pela diferença de carga horária entre as disciplinas do currículo. Privilegiam-se igualmente o verbal (escrita e oral), as atividades intelectuais e o raciocínio abstrato. Nesta perspectiva, a avaliação é realizada predominantemente visando à exatidão da produção do conteúdo comunicado em sala de aula, sendo que a reprovação do aluno passa a ser necessária quando há a constatação de que o conhecimento mínimo exigido para cada série não foi adquirido pelo aluno. Na prática pedagógica, verificamos que, com frequência, a aula acaba se resumindo no seguinte: • Apresentação do ponto.
  • 39. 39FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância • Resolução de um ou mais exercícios modelo. • Proposição de uma série de exercícios para os alunos resolverem. Esta abordagem considera o sujeito da aprendizagem passivo e receptivo ao conhecimento, que viria de fora e só em um segundo momento seria incorporado pelo sujeito e transformado em conteúdo mental. Desta forma, o professor exigirá, ainda, que seu aluno repita inúmeras vezes o conteúdo até memorizá-lo, pois considera que o aluno é, originariamente, uma folha de papel em branco. Essa memorização con- sistirá, necessariamente, em um empobrecimento da teoria, além de impedir que algo novo se constitua. Infelizmente, é dessa forma que estão organizadas a quase totalidade de nossas salas de aula. Becker em sua obra “Educação e Construção do Conhecimento” (2001, p.16), exemplifica muito bem como é o cotidiano de um professor que assume uma postura empirista em sua prática pedagógica. Vejamos: para conhecê-lo, basta entrarmos em uma sala de aula. Na abordagem empirista o papel do professor consiste em dominar e garantir a transmissão do conteúdo que é predefinido e que constitui o próprio fim da existência escolar O que encontramos aí? Um professor que observa seus alunos entrarem na sala, aguardando que sentem e que fiquem quietos e silenciosos. As carteiras estão devidamente enfileiradas e suficientemente afastadas umas das outras para evitar que os alunos conversem. Se o silêncio e a quietude não se fizerem logo, o professor chamará a atenção da sala até o monopólio da palavra ser seu. Quando isso acontece, ele começa a dar a aula. Como é essa aula? O professor fala, e o aluno escuta. O professor dita, e o aluno copia. O professor decide o que fazer, e o aluno executa. O professor ensina, e o aluno aprende. Neste momento de reflexão, indagamos: Fonte:PHOTOS.COM
  • 40. 40 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA| Educação a Distância - Por que o professor assume esse fazer pedagógico? Alguns responderiam: - Porque aprendeu que é assim que se ensina. Essa resposta esta correta, mas não suficiente. Então, por que mais? O professor assume tal prática pedagógica porque acredita que o conhecimento pode ser transmitido para o aluno. Ele acredita no mito da transmissão do conhecimento. Dessa forma, a sua prática é legitimada, ou fundada teoricamente por uma epistemologia, segundo a qual o sujeito é totalmente determinado pelo mundo ou pelos meios físicos e sociais. No caso do exemplo acima citado, quem representa esse mundo na sala de aula é, por excelência, o professor. Sobre essa abordagem, Freire (1996, p.25) exclama: [...] se, na experiência de minha formação, que deve ser permanente, começo por aceitar que o for- mador é o sujeito em relação a quem me considero o objeto, que ele é o sujeito que me forma eu, o objeto por ele formado, me considero como um paciente que recebe os conhecimentos-conteúdos- -acumulados pelo sujeito que sabe e que são a mim transferidos. Nesse sentido, para Freire (1996), esse sistema de ensino está baseado na educação bancária (tipologia mais aproximada do que se entende por ensino nessa abordagem), ou seja, uma educação que se caracteriza por “depositar”, no aluno, conhecimentos, informações, dados, fatos. Também para Becker (2003), nessa relação, o ensino e a aprendizagem são polos dicotômicos: o professor jamais aprenderá e o aluno jamais ensinará. Está subjacente a esse tipo de abordagem, que o conhecimento provém essencialmente do meio, e, dessa forma, é transmitido ao indivíduo na escola. O indivíduo nada mais é do que um ser passivo, um receptáculo de conhecimentos escolhidos e elaborados para que deles se apropriem. Mizukami (2005) declara que uma das consequências políticas das aplicações empiristas na escola tem sido a formação de sujeitos passivos diante do conhecimento, dos fatos e da sociedade. Para o professor Fernando Becker, a tendência empirista é a que caracteriza mais amplamente a epistemologia do professor. Ele constatou em sua pesquisa que o professor muitas vezes desconhece esses pressupostos e, mesmo quando pensa estar partindo de fundamentos diferentes, destacam-se características empiristas na sua verbalização. Talvez isso se deva ao fato de que a tendência empirista é uma das características do ensino tradicional. Ele próprio afirma: “pouco esforço foi necessário para detectar, nos depoimentos dos docentes, posições nitidamente empiristas. Pode-se afirmar que o empirismo é a forma que mais amplamente caracteriza a epistemologia do professor” (BECKER, 2005, p. 39). Behrens (1996, p. 82), confirmando a conclusão de Becker, declara que a “primeira impressão que se tem ao percorrer os corredores das instituições escolares, salvaguardando as exceções, é que o paradigma tradicional de ensino nunca abandonou a sala de aula”.
  • 41. 41FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA | Educação a Distância EPISTEMOLOGIA INATISTA (APRIORISTA) A fundamentação epistemológica fundada no apriorismo ou inatismo, diferentemente do empirismo, apresenta uma pedagogia centrada no aluno. Uma das ideias bem difundidas é aquela que concebe a inteligência como uma capacidade, dom ou vocação que possuímos independentemente de nossos esforços ou dos ensinamentos que recebemos na escola ou na vida (MACEDO, 2002). Aconcepçãoinatistatemcomopressupostoqueasqualidadesecapacidadesbásicasdecadaserhumano, sua personalidade, seus valores, hábitos e crenças, sua forma de pensar, suas reações emocionais e mesmo sua conduta social, já se encontrariam basicamente prontas por ocasião do nascimento, sofrendo pouca diferenciação qualitativa e quase nenhuma transformação ao longo da existência. Nessa tendência, há preocupação com problemas psicológicos, estudo sobre o desenvolvimento emocional, cognitivo e criativo. O sujeito é percebido como indivíduo único, com capacidades cognitivas e emocionais subjetivas, um ser inacabado com necessidades individuais, mas pertencente a um meio coletivo. A concepção de conhecimento que acredita que se conhece porque já se traz algo, ou inato ou programado na bagagem hereditária, para amadurecer mais tarde, em etapas previstas, chama-se apriorismo e pode ser representada, como modelo, da seguinte fórmula: S O Becker (2003) declara que esta epistemologia acredita que o ser humano nasce com o conhecimento já programado na sua herança genética. A interferência do meio – físico ou social – deve ser reduzida ao mínimo. A partir dessa perspectiva, a educação surge como um processo de atualização, no sentido de tornar presente o que cada um tem em potência. A epistemologia apriorista e a prática pedagógica do professor O papel do professor deve ser de investigador, orientador, levando o aluno a trabalhar o mais independente possível Fonte:PHOTOS.COM