1) O ano de 2011 foi o melhor da história dos quadrinhos brasileiros, com muitos lançamentos e incentivos governamentais.
2) Uma HQ brasileira vendeu 500 mil cópias, superando vendas de quadrinhos americanos.
3) Artistas brasileiros vêm ganhando prêmios importantes no exterior e emplacando suas histórias nos grandes mercados internacionais.
1. 10 ●
Segunda-feira, 19 de dezembro de 2011
SEGUNDOCADERNO
Logo A PÁGINA MÓVEL
Gibigbang
Imagens de divulgação
“HISTÓRIAS DO Clube da Esquina” (L.Ferreira e O.Viñole) bateu Sandman em algumas livrarias
Heitor Pitombo * Snyder e, pasmem, Stephen King), Me-
lhor Minissérie e Melhor Colorização
Especial para O GLOBO (ambos os prêmios para “Day tripper”,
● Aquele moleque que vai à banca e dos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá). O
compra uma edição da “Turma da Mô- curioso é que roteiros de brasileiros es-
nica jovem”, dos estúdios Mauricio de tão conseguindo emplacar nas revistas
Souza, pode não saber, mas está levan- americanas, espaço que parecia reser- “TURMA DA MÔNICA jovem nº 34”,
do a HQ que mais vende no planeta. Por vado apenas aos nossos desenhistas. 500 mil exemplares: a HQ mais
essa e outras, 2011 foi, sem dúvida, o Mas não é de hoje que o Brasil pode vendida em todo o mundo, sensação
melhor ano da história dos quadrinhos ser considerado um país especial para entre especialistas americanos
brasileiros. Nunca houve tantos lança- os quadrinhos. Numa reedição da dispu-
mentos, de autores novos e consagra- ta entre Santos Dumont e os Irmãos
dos. Os incentivos governamentais para Wright pela primazia da aviação, ex-
a produção de HQs seguem em alta. O perts dizem que a as- “ACHADOS E PERDIDOS” e a força dos independentes:
MEC já incluiu 225 títulos em seu Progra- sim chamada nona capa cartonada, papel cuchê e CD com trilha sonora
ma Nacional Biblioteca na Escola (PN- arte foi criada justa-
BE), para escolas públicas. mente em nosso país
Em algumas livrarias, quem diria, o pelo artista italiano Ân-
cultuado “Sandman edição definitiva
(Vol. 2)” de Neil Gaiman foi superado
gelo Agostini, nas páginas
da revista “Vida Premiada nos EUA,
por “Histórias do Clube da Esquina”, de Fluminense”,
Laudo Ferreira e Omar Viñole, adapta-
ção gráfica da saga da turma capitanea-
em 1869. Mui-
to antes, portanto,
HQ nacional é top de
da por Milton Nascimento, Lô Borges,
Beto Guedes e Toninho Horta.
do surgimento do “Yel-
low Kid” (1894) de Ri- vendas e de público
Outro sinal de que nada será como an- chard Outcoult, tido
tes vem, aliás, de Minas: quase todas as
capitais sediaram algum encontro em
como o pioneiro das
HQs nos Estados Uni-
em feiras em 2011 e
2011 (Rio Comicon, Fest Comix de SP, a
Gibicon curitibana), mas nenhum su-
dos.
Mesmo não possuindo atrai o governo
plantou o 7º Festival Internacional de uma tradição quadrinísti-
Quadrinhos de Belo Horizonte (FIQ). ca como a da Argentina,
O prestigiado site americano Bleeding a arte sequencial bra-
Cool decretou que a festa mineira foi o sileira vem marcando
evento de HQs de maior afluência do a cultura do país. Nos anos 1940 e 1950,
planeta ao longo do ano: 148 mil pes- quando educadores, jornalistas e escrito-
soas passaram pela Serraria Souza Pinto res questionavam o seu valor, editores co- “QUANDO MEU PAI se encontrou com o ET fazia um dia
em cinco dias, mais que as 130 mil que mo Adolfo Aizen, Assis Chateubriand e Ro- quente”: os “quadrões” de Lourenço Mutarelli fizeram frisson
foram à edição de 2011 da Feira de Qua- berto Marinho defendiam que ler quadri-
drinhos de San Diego, a maior do mun- nhos era um hábito saudável. Nos anos de
do. Além de contar com a participação chumbo, entre os artistas que mais nota-
de artistas de vários cantos do planeta, damente combatiam o regime no país es-
o FIQ abarcou fóruns que anteciparam tavam aqueles que se dedicavam aos qua-
novidades de editoras como a Marvel. drinhos, como Henfil, Ziraldo e Fortuna.
Sem contar a quantidade de lançamen-
tos de novos gibis: para lá de cem títu-
los, principalmente independentes. Viver de quadrinhos:
O espanto dos americanos com o qua-
drinho brasileiro em 2011 não se manifes- o sonho não acabou
tou apenas por conta desses números. A
poderosa DC Comics (casa editorial de ● Apesar disso, fazer quadrinhos no Brasil
personagens como Batman e Superman, nunca foi uma atividade capaz de sustentar
parte do conglomerado da Warner Bros.) artista algum. Com a exceção de Mauricio
chegou a divulgar que o gibi mais vendido de Souza, os gibizeiros do país, desde sem-
do ano havia sido a primeira edição da no- pre, vêm se dedicando a outras atividades
va “Liga da Justiça”, com 200 mil leitores. para poder pagar as contas. Oportunidades
Contudo, esse número empalidece em para romper com esse estado de coisas
comparação com as 500 mil cópias im- aparecem de quando em quando, como o
pressas da “Turma da Mônica jovem #34” advento dos quadrinhos eróticos e de ter-
(edição na qual Mônica e Cebolinha come- ror na virada dos anos 1970 para os 1980 —
çam a namorar). Tal informação chegou a representados por editoras como a Vecchi
boa parte do público americano graças ao e a Grafipar — ou a entrada de desenhistas
influente jornalista especializado local Ri- brasileiros no mercado norte-americano no
ch Johnston, que publicou uma nota no começo da década de 1990.
Bleeding Cool intitulada “This is what a Com a popularização da internet e
half-million-selling american comic book dos meios de produção editorial infor-
looks like” (na tradução, “Isto é como uma matizados nos últimos 20 anos, a produ-
HQ americana de meio milhão de vendas ção local ganhou um enorme incremen-
se parece”). to. Isso não só beneficiou as grandes
Artistas brasileiros não só colaboram editoras — que passaram a mirar muito
desde os anos 1990 para os maiores mais as livrarias do que as bancas de
mercados editoriais do mundo, como jornais — como também a produção in-
vêm ganhando prêmios importantes dependente, que tem revelado a nova
anualmente. Em 2011, mereceram gran- geração de talentos responsável por
de destaque nos Eisner Awards (o Oscar uma reviravolta de contornos inéditos
dos quadrinhos americanos) e levaram em se tratando da divulgação de nosso
todas as categorias nas quais foram in- quadrinho a nível mundial.
dicados: Melhor Série Nova (para “Ame-
rican vampire”, desenhada pelo gaúcho HEITOR PITOMBO é jornalista, tradutor
Rafael Albuquerque e escrita por Scott de quadrinhos e músico “DAY TRIPPER”, dos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá, premiada no Oscar HQ, emplacou no mercado dos EUA
● JOAQUIM FERREIRA DOS SANTOS: a coluna voltará a ser publicada na próxima segunda.