1. INSTITUTO FEDERAL BAIANO – CAMPUS SANTA INÊS
Curso: Licenciatura em Geografia Semestre: VI
Disciplina: Organização do Espaço Brasileiro Data: 09/10/2014
Docente: Edney Conceição Discente: Jairo Bonfim
Atividade de filmografia – NARRADORES DE JAVÉ
Narradores de Javé, o filme dirigido por Eliane Caffé e lançado em 2003, suscita o
debate, porque confronta o público que o assiste com uma variedade de significados
que emergem das vivências de seus personagens.
O povoado de Javé, no interior da Bahia, passa por um momento decisivo em sua
história. O Estado está tomando as primeiras medidas para a construção de uma
barragem. A rotina pacata do pequeno vilarejo é abalada por uma notícia que
mudaria definitivamente a vida dos moradores: o povoado seria extinto com a
implantação de uma barragem. O “progresso” chegaria ao sertão baiano, trazendo
consigo as águas, inundando as ruas daquela cidadezinha, destruindo as casas, a
igreja - o espaço de toda a gente que lá estava.
Os moradores, todos eles pessoas simples do sertão, reúnem-se na pequena igreja
central, com o objetivo de discutir o que podem fazer para salvar o seu território e os
seus lares da destruição e salvarem-se a si mesmos do êxodo. O desespero é geral.
Na tentativa desesperada de salvar a cidade da destruição, os moradores decidem
preservar sua história, com recurso à memória oral, registrando em um documento
escrito “a grande história de Javé”, como se referem alguns à empreitada de colocar
no papel os grandes feitos e os grandes personagens que dariam importância
histórica à cidade. Essa estratégia é mobilizada com a meta de que as narrativas de
Javé sejam consideradas “patrimônio” e recebam a sanção positiva da autoridade
estatal que detém o poder de salvar ou destruir o lugar.
A realidade imaginária de Javé não é exatamente uma ficção no âmbito do Brasil. O
Estado impõe sobre a sociedade o controle com a finalidade de atingir seus
objetivos econômicos, estratégia que desenvolve o capitalismo no Brasil. Uma
realidade comum no país, onde vários projetos para a criação de usinas hidrelétricas
têm tornado necessária a destruição de povoados e municípios ribeirinhos,
colocando em risco a preservação da memória e, conseqüentemente, da identidade
dos moradores desses lugares. O Ministério de Minas e Energia, em parceria com
grandes empresas, tem amparado projetos de produção de energia hidrelétrica por
meio da construção de barragens fornecedoras.
2. Seguindo esse mesmo raciocínio, Becker, Bertha K. e Claudio A. G. Egler (1993,
p.146), destacam que, “[...] havia planos setoriais para grandes investimentos em
capital fixo, representados por projetos hidroelétricos, aeroportos, barragens, usinas,
portos, etc.”
E os moradores dessas regiões são transferidos para um novo espaço, em troca da
destruição de seus lares pelo governo e/ou por grandes empresas interessadas nas
usinas hidrelétricas.
Também gostaria de destacar outro aspecto forte que o filme suscita e que remete à
história do Brasil: o acesso à terra, o direito ancestral dos povos americanos, direito
que é continuamente usurpado por outra forma de relação com a terra introduzida
nesse continente pelos europeus desde os primórdios da colonização. Desde então
ocorrem contínuas migrações como a mostrada pelo filme e forjam uma legião
infinita de sem-terras.
Enfim, foi um trabalho em vão, o sertão acabou sendo destruído pela modernidade,
pela hidrelétrica. A população assistiu aos prantos a transformação do sertão em
mar e, com isso, junto com a destruição foi-se embora a memória, a cultura, o local e
os antepassados. Uma triste história de um povo sem cultura perante a escrita, mas
de uma imaginação fértil capaz de superar todos os obstáculos e dar a volta por
cima para construir em conjunto a própria história que desapareceu como palavras
ao vento.
O povo lutou contra a decisão do Estado em levar o “progresso” para a pequena
cidade do sertão, porém, o Estado é autoritário e reage contra o movimento social.
Conforme, Becker, Bertha K. e Claudio A. G. Egler (1993, p.127),
No novo autoritarismo, os militares dominaram como instituições e não
ao nível individual, e com enfoque tecno-burocrático na formulação
política. [...] o Estado interviu contra os movimentos populares garantindo
o “progresso” continuando o “desenvolvimento” a ideologia da Segurança
Nacional da moderna doutrina militar.
A população de Javé é vitima de uma imposição que as leva a ver a própria terra, a
cidade, a vida e as suas recordações, tudo desaparecendo debaixo da água da
represa, sem nenhuma possibilidade de defesa.
A hidrelétrica foi construída e o novo espaço significa também a reconstrução das
memórias sobre o passado.
3. BIBLIOGRAFIA
BECKER, Bertha K & EGLER, Claudio A. G. “A Incorporação do Brasil na Economia-Mundo: da
Colônia à Industrialização Nacional”, capítulo VI e V. Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil S.A. pp.
123-213, 1993.
NARRADORES DE JAVÉ. Direção de Eliane Caffé. Produção de Vânia Catani. 2003. DVD.
Narradores de Javé: uma análise semiolingüística do discurso fílmico. Dissertação de Mestrado. Belo
Horizonte: Universidade federal de Minas Gerais, 2006. Disponível em:
<http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/1843/ALDR6V4HJ5/1/disserta__o_car
ol.pdf>. Acesso em: 12 out.2014.