1. A igreja precisa ser reformada para atender às maiores necessidades espirituais e emocionais das pessoas, como amor, aceitação e compreensão.
2. A sociedade está cada vez mais doente, com o pecado sendo visto como virtude. Isso forçou a igreja a repensar como lidar com as pessoas.
3. Uma igreja UTI é necessária como uma resposta urgente para ajudar a sociedade que sofre sob o sistema opressor e oferecer esperança.
3. “Os sãos não precisam de médico, e sim os
doentes. Não vim chamar justos, e sim
pecadores, ao arrependimento”
Lucas 5.31,32.
“ igreja tem, por sua missão, restaurar almas e
A
apresentar cada homem a Deus, conforme a
“estatura completa de Cristo”. Esta busca de
completude sem dúvida abrange o reconhecimento
e o suprimento das necessidades emocionais das
pessoas. O papel da igreja é o de uma
“comunidade terapêutica”, um corpo que promove
cura e recuperação de pessoas em sofrimento.”
Denise Machado Duran Gutierrez,
psicóloga.
4.
5. Sumário
1 – Lista de figuras
2 – Colocando o assunto
3 – Uma resposta urgente de igreja
4 – Como ser igreja UTI?
5 – Aprendendo a entrar na frequência de Deus
6 – Educando crianças num mundo hostil
7 – Educar como oficina de caráter
8 – Modelos de educadores UTI
9 – Vencendo o desmancha-prazer da depressão
10 – Uma “alto-ajuda” que vem do alto
11 – Curando a si mesmo para um viver saudável
12 – Restaurando casamentos sem mitos
13 – Anjos do asfalto
14 – Vencendo o egoísmo e aprendendo a generosidade
15 – Desmistificando o mito do dinheiro
16 – Aprendendo a andar por cima das crises
17- Abrindo o jogo sobre as drogas e como sair da sua
dependência
18 – Exorcizando os maus espíritos sem reality show
19 – Deficientes físicos nos ensinam lições de eficiência
20 – A igreja UTI e a questão da homofobia
21 – Atendendo a chamadas de SOS
22 – Valorizando os que chegam à igreja UTI
23 – Conclusão
6. 1
Listas de figuras
Figura 1 : Cristo (o médico dos médicos)
Figura 2 : O templo (um hospital psicossomático)
Figura 3 : Os bancos do templo (leitos de restauração)
Figura 4 : Os membros da igreja (paramédicos de Cristo)
Figura 5 : O tratamento nesta igreja (O soro da Bíblia e do afeto)
7. 2
Colocando o Assunto
omecei os meus passos da carreira cristã numa igreja
C relativamente grande. E a primeira igreja que pastoreei tinha
menos de quarenta membros. Quando aceitei o desafio para
pastoreá-la, meu desejo era, igual ao de todo pastor, vê-la
crescer, conforme Atos 9:31: “Caminhando no temor do Senhor
e no conforto do Espírito Santo, crescia em número”. O grande
conflito em minha busca era encontrar uma forma de crescer
como igreja genuinamente saudável. Nos primeiros anos de
trabalho como comunidade cristã no bairro, arregaçamos as
mangas e entramos em ação. Tentamos células, evangelismo ao
ar livre com músicas, abrimos as portas para os problemas sociais
do bairro, oramos nas praças, distribuímos panfletos, tivemos
farmácia comunitária, assistimos o sanatório de doentes mentais,
oficiamos cultos fúnebres no velódromo do bairro, enviamos
centenas de correspondências e tantos outros projetos. Com o
passar do tempo, demos conta de que estávamos oferecendo o
que as pessoas queriam, não o que elas precisavam.
Estávamos na visão de conquistar popularidade ainda que
nos tornássemos impopulares aos olhos de Deus. Foi um choque
perceber que do lado de fora havia uma sociedade cada vez
mais pluralista, descrente, midiática e doente. E que nela o
pecado já não representava mais um grande problema. O pecado
chegava a ser glamourizado. O que no passado era socialmente
repudiado, hoje era visto até como virtude. Pior ainda, demos
conta de que, com o avanço da ciência, o pecado estava fugindo
da alçada teológica, transformando-se em enfermidades
psíquicas. Concluímos que precisávamos trabalhar no sentido
de convencer as pessoas que o pecado era uma transgressão a
8. 8 Igreja UTI, Uma Proposta Urgente
Deus. E que não se podia diagnosticá-lo com terapias e Prozac,
por tratar-se de um problema espiritual.
Outro fator agravante que nos forçou a repensar nosso
trabalho foi tentar descobrir as pessoas para poder lidar com
elas. O dramaturgo inglês William Shakespeare descreveu a vida
como um palco, onde todos nós somos atores. Nossa passagem
pelo palco da vida é nossa história real. Não existem
coadjuvantes para a história de cada um. Nós somos atores
principais e insubstituíveis. Quando nascemos, o script de cada
trama já está escrito por Deus, o Escritor da nossa vida. O grande
problema nesta trama é atinar que neste palco somos uma
trindade de pessoas. No cotidiano somos aquilo que as pessoas
imaginam que somos, mas que na verdade não somos. Uma
das premissas prediletas de Sócrates era: “Fala para que eu te
conheça”. Quantas vezes nós fazemos “pré-juízos” de uma
pessoa, e quando ela começa a falar descobrimos o quanto
estávamos enganados a respeito dela. É falando que conhecemos
e nos deixamos revelar aos outros. Já em nossas particularidades,
muitas vezes somos um ser de angústias. Isto ocorre quando
alguém deseja ser aquilo que não pode ser, mas que luta com
todas as suas forças para tentar. Quantas pessoas sofrem caladas
tentando imitar, ser igual e ter o que o outro tem. Mas quando
todos adentram suas portas e olham para o espelho sem
máscaras e sem maquiagens, deparam com sua realidade nua e
crua. Cremos que uma igreja para estar pronta a desempenhar
seu papel atualmente precisa compreender esta complexidade
humana. Precisa crer que o ser em que Deus deseja trabalhar é o
do espelho. Foi nesta particularidade que homens como Davi,
Jacó, Jó e tantos outros tiveram suas curas.
Como a igreja na pós-modernidade deve ver o homem? Do
ponto de vista da antropologia, conforme o antropólogo mineiro
Juvenal Arduini, ele é um mistério. Na sociedade atual o homem
é medido pela sua utilidade. Ele vale de acordo com o seu
aproveitamento utilitarista. É como um utensílio ou mercadoria.
O Dr. Victor Frankl, médico e psicanalista que viveu no campo
de concentração em Auschwitz, aconselhava seus companheiros
9. Colocando o Assunto 9
a se mostrarem sempre úteis. O homem está perdendo sua
humanidade consciente. Aos poucos foi se acostumando com o
horror. É capaz de tomar suas refeições assistindo a noticiários
de cenas reais de violências. Parece que a barbárie e o sangue
humano já não nos incomodam mais. Na definição de Nietzsche,
o homem deve lutar para dominar antes de ser dominado. Já
Adler o vê como um ser de desejos insaciáveis, e Nicolau
Maquiavel, um astuto para sobreviver. Os behavioristas Pavilov
e Skinner descrevem o homem como seres condicionáveis. Em
suas concepções no futuro breve, as palavras seriam substituídas
por símbolos. É interessante como já não precisamos mais de
letreiros para anunciar casas de lanches rápidos, supermercados,
comidas, lojas, bebidas etc. Basta olhar o símbolo para saber o
que se anuncia. O homem é um ser vulnerável tanto para o bem
como para o mal. São duas potencialidades intrínsecas em si
que podem se desenvolver. É neste grande desafio que a igreja
tem o papel de tornar o homem um ser comunitário e não
agregado. Os animais vivem agregados porque andam sempre
em bandos, mas quando surge o perigo, é cada um por si. O
homem precisa do outro, mas não protege o outro.
Houve uma grande reviravolta em nossa visão quando
percebemos que a igreja protestante precisava também de UTI
urgente, para ser novamente reformada. Confesso que tudo isso
foi válido como experiências e laboratórios vivos. Sinto que nossa
igreja só começou a fazer sentido quando fomos despertados
para as maiores necessidades espirituais e emocionais de
qualquer pessoa, assim como amor, aceitação, compreensão e
salvação. No chamado comportamento seletivo, toda pessoa
tenta sufocar seus complexos, relacionando-se com pessoas que
lhe ofereçam segurança, principalmente para sua personalidade
afetada pelas feridas abertas na alma. É grande o contingente
de pessoas correndo atrás de um tempo perdido com ilusões,
outras tentando perdoar ou conseguir o perdão de alguém. São
pais correndo atrás do amor dos filhos e filhos que jamais tiveram
o amor dos pais. É muito comum encontrarmos nas rodovias
alguns postos com balanças eletrônicas apenas para caminhões.
10. 10 Igreja UTI, Uma Proposta Urgente
Como ficamos aliviados quando a placa só diz caminhões, e
não temos que parar.
Mas nesta visão de pensar a igreja hoje, seus paramédicos
devem estar de plantão, para os que precisam de balanços
constantes. Ajudando seus pacientes a fazerem uma lista de suas
atitudes e comportamentos, trazendo-os de volta para Deus. Os
que tentam ignorar a placa do vinde de Cristo, para um balanço
emocional, irão continuar suas viagens carregado cargas
irregulares para uma vida nada saudável. A igreja UTI precisa
estar pronta para ajudar a sociedade a desacelerar as arrancadas
desumanas que seu próprio sistema opressor lhe impõe. Em
suas portas deve haver sempre a palavra esperança. Vidas não
são cifras, são como encomendas de presentes que Deus envia
às igrejas, e tudo vai depender de como cada igreja vai abrir
esses presentes. Você pode abrir um presente rasgando
impacientemente o embrulho, ou arrebentando rapidamente os
laços, como também lendo cuidadosamente a mensagem do
cartão, e, depois, abri-lo carinhosamente, valorizando o que você
recebeu. Lidar com vidas a partir da fé muitas vezes é como
rodar todos os pratos em cima de bastões, sem deixar nenhum
cair no chão. E como fazemos isto? O segredo é rodar um de
cada vez, colocando mais força naquele que no momento
precisar. Isto significa ser mais útil com aqueles que estão
perdendo todo o vigor.
Quantas vezes é preciso agir como equilibristas rodando
todos os pratos ao mesmo tempo. O grande desafio é mantê-los
sempre no alto. Quando alguns caem e se quebram, é hora de
ajuntar todos os caquinhos, colar e colocá-los novamente em
ação. A triste verdade é que pessoas doentes nem sempre são
presentes muito agradáveis para algumas igrejas instituídas. A
menos que se tenha a mesma paixão Daquele que amou tanto
esses presentes, e que pagou caro por eles. Será que sua igreja
está pronta para crescer naturalmente e saudável? Ou quem sabe
precisa de ambulância? “Os sãos não precisam de médico e, sim,
os doentes.”
11. 3
Igreja UTI como uma resposta urgente
Igreja re
a medida em que as civilizações evoluem, o mesmo também
N ocorre com os seus problemas. Mudam as civilizações, e
os problemas jamais deixarão de existir, contextualizados
à sua contemporaneidade. Isso ocorre por alguns motivos que
nos parecem biblicamente mais agravantes, por exemplo, as
implicações da ciência: “Porque na muita sabedoria há muito
enfado; e quem aumenta a ciência aumenta tristeza” (Ec 1.18).
O esfriamento do amor: “E, por se multiplicar a iniquidade, o
amor se esfriará de quase todo” (Mt 24.12). Na ausência do amor
imperam o medo e a síndrome do pânico.
Segundo Alexandro Secco, autor da matéria “A indústria do
medo”, o Brasil tornou-se o terceiro produtor de carros blindados
no mundo. Para se proteger hoje dos bandidos, as indústrias,
lojas e condomínios mantêm um exército de pessoas trabalhando
no país. O mercado de segurança cresce assustadoramente. Para
evitar assaltos e fraudes eletrônicas, os bancos gastam bilhões
em segurança. Nem todos estes aparatos de proteções têm
conseguido amenizar o medo da população. Neste exato
momento em que estou escrevendo esta página, ouço mais uma
lastimável notícia. Um casal de velejadores australianos que
acabava de dar uma meia-volta ao mundo navegando, decidiu
ancorar na cidade do Rio de Janeiro. Eles enfrentaram todos os
perigos dos mares, mas não conseguiram suportar um assalto
dentro do barco ancorado no porto. Outro casal de italianos,
seguindo as coordenadas do GPS do carro alugado, caiu no meio
de uma favela e foi metralhado. Em pouco tempo de
investigação, foi confirmado que os sinais daquele aparelho
estavam adulterados. Infelizmente, quando você vê as notícias
12. 12 Igreja UTI, Uma Proposta Urgente
da mídia, é isto: violência. “Provisoriamente não cantaremos o
amor que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos e cantaremos
o medo que esterilizou os abraços. Não cantaremos o ódio,
porque este não existe, existe apenas o medo, nosso pai e
companheiro. Medo dos sertões, medo dos mares, medo dos
desertos, dos ditadores, dos democratas, dos soldados, das mães,
das igrejas, da morte. E depois da morte, porque em nossos
túmulos nascerão flores amarelas de medo” (Carlos Drummond
de Andrade).
Escassez de alimentos. “E haverá fomes e terremotos em
vários lugares” (Mt 24.7). Não é preciso ser nenhum perito em
ciências sociais para perceber que a concentração do capital nos
países ricos é a causa da miséria social nos países emergentes.
Segundo as últimas informações da ONU, quase metade da
população do mundo vive abaixo da linha da pobreza. A lógica
é simples e desumana: cada criança que morre por inanição num
país emergente é o preço do padrão de vida daquelas que nascem
num país de primeiro mundo. A síndrome da incredulidade.
“Diz o insensato no seu coração: Não há Deus” (Sl 14.1). Tendo
em vista o tempo presente que já foi pretérito e que será futuro,
é possível que a igreja seja a alternativa de esperança social na
pós-modernidade. Mas para isto, seria necessário focar a sua
vocação em alicerces seguros. Quando Jesus disse a Pedro:
“Sobre esta pedra edificarei minha igreja e as portas do inferno
não prevalecerão contra ela” (Mt 16.8), Ele estava falando de
uma igreja que transcenderia a todas as épocas. Há quase dois
mil anos a Igreja de Cristo vem sendo censurada, dividida,
perseguida, mas continua sempre presente e atual, porque a
Igreja de Cristo pertencerá sempre ao futuro. Jesus disse: “Ide
por todo o mundo e pregai o Evangelho” (Mc 16.15). Esse
evangelho continua o mesmo, e sempre adequado aos problemas
de todas as épocas. A responsabilidade pessoal em nosso modelo
proposto de igreja é imprescindível, uma vez que só a ela foi
confiado esta tarefa. Examinando a raiz da palavra grega que
desafia a igreja a testemunhar, encontramos “8ññõî”, que forma
a base da palavra querigma (anúncio da mensagem cristã ao