A coletânea de contos aborda histórias de diferentes épocas e lugares, incluindo uma sobre uma mulher no Rio de Janeiro em 1933 que tem uma experiência estranha após participar de testes científicos e outra sobre um jovem metalúrgico de São Paulo que é assaltado e morto no metrô. O último conto fala sobre uma jovem cujos dentes misteriosamente ficam iguais aos de nativos após uma viagem de barco turbulento e o encontro com sua prima falecida.
1. Contos Pechosos
Sinopse: Contos Pechosos é uma coletânea de contos curtos sobre diversificados
assuntos. Você poderá ler sobre diferentes assuntos, em diferentes épocas, em diferentes
lugares.
Classificação: História Curta; Científica; Ficcional; Violência; Linguagem Imprópria;
Ação; Drama; Mistério; Suspense;
Faixa Etária: +13
Nota da Autora: Contos Pechosos é uma coletânea de contos curtos sobre
diversificados assuntos. Você poderá ler sobre diferentes assuntos, em diferentes
épocas, em diferentes lugares. Você poderá se encontrar com Aimée, uma jovem do Rio
de Janeiro; Ernani, um jovem paulista trabalhador. Você irá rir, chorar, se assustar e se
apaixonar. Espero que se divirta lendo tanto quanto eu me diverti escrevendo.
Dedico essa coletânea a Ernani Valente e Marcella Alcantara. Obrigada por me
inspirarem.
Paranoia
Estávamos em 1933, Getúlio Vargas estava na presidência. Apesar das boas coisas que
Vargas criou, não estava fácil para muita gente. O presidente bom e mal, mas não
vamos falar de política. Iremos falar do que ocorreu comigo há uns dias.
Li em um jornal que uma empresa científica precisava de dois cavalheiros e três damas
para alguns testes. Os voluntários receberiam poucos cruzeiros, mas o suficiente para eu
pagar o aluguel e comprar algum brioche. Segui para o endereço anotado no guardanapo
– único lugar que eu conseguiria para anota-lo. Era um prédio alto, conservado e
moderno. Entrei no local e falei com um cavalheiro o qual me direcionou a sala 358, no
quarto andar. Uns cavalheiros, com jalecos brancos, fizeram-me esperar em uma sala
que continha apenas um sofá branco e revistas sobre evolução científica e o futuro.
Horas se passaram e eu continuava no mesmo cômodo branco. Já estava tarde, mas eu
realmente precisava dos cruzeiros. Retirei minhas sapatilhas e estiquei minhas pernas no
sofá, mantendo-as cobertas pelo vestido. Eu não queria ser deselegante. Mas algo
aconteceu, pois acordei em um lugar diferente. Os cavalheiros e as damas usavam trajes
unificados, calças de um tecido diferente e camisas com mangas curtas. As pessoas
trajavam pequenas roupas íntimas em público, expostas para todas. O que mais me
impressionou foi o fato de que todas as mulheres trabalhavam, andavam sem a
companhia de um homem e não eram paradas por policiais ou olhadas como vulgares.
Olhei para uma foto em uma parede que mostrava o ano de 2014.
- Século XXI? – sussurrei enquanto arrancava a folha do muro.
- Sim, em que época pensou que estamos moça? – perguntou um senhor que passava
dando uma bela gargalhada.
Logo depois, tudo ficou escuro e acordei na sala branca novamente. Continuava a vestir
o meu vestido longo. Fui liberada pelos cientistas que falaram que já tinham do que
precisavam. Voltei à casa um pouco aturdida, mas com o dinheiro de que tanto
precisava.
Século XXI? Ri sozinha jogando as moedas para o alto e pagando-as no ar. Eu estava
2. ficando paranoica. Nunca que as mulheres teriam tanta liberdade e poder assim. O
cansaço estava definitivamente afetando a minha mente.
Aspirina Para Toda Obra
Não importa em qual lugar do país você mora – a não ser que more em uma fazenda,
sítio ou algo semelhante – você irá sofrer com o caos causado pelas obras públicas.
Barulho das máquinas aqui, homens trabalhando ali e engarrafamento por todo lado.
Pegue um trânsito congestionando e olhe para o lado, provavelmente, verá alguém
tentando distrair-se ou querendo matar-se por causa de um enorme dor de cabeça
causada pelo barulho.
Há poucos dias venho lendo alguns relatos de pessoas, geralmente trabalhadores, mas
um em especial chamou-me a atenção.
Uma bela moça estava em seu carro tentando distrair-se com um jornal do dia anterior
enquanto sua dor de cabeça aumentava. Como saberia que não sairia dali tão cedo,
avistara um canteiro de obra que seria perfeito para estacionar o carro e esperar o
congestionamento diminuir. Encostara o carro na obra e voltara a ler o jornal. Sua dor
de cabeça aumentara tanto que sua visão estava turva. Encostou a cabeça no volante e
fechou os olhos. Alguém batendo na janela de seu carro a acordou de seu transe.
- Está se sentindo bem, senhora? – perguntou um operador de obra assim que ela
abaixou o vidro.
- Apenas com dor de cabeça, mas já estou controlando-a – mentiu dando o seu sorriso
mais convincente.
- A senhora quer Aspirina? Eu sempre carrego alguns comprimidos comigo por causa
desse barulho infernal – perguntou retirando algumas cartelas do bolso da calça.
Aceitou e tomou os comprimidos com água que também foi lhe oferecida. Logo sua
dor de cabeça passou e pode seguir para casa. Quando se vive em uma cidade grande,
umas cartelas de Aspirina é sempre pau para toda obra.
A Morte Me Assaltou
Levantar da cama, tomar café da manhã e ir trabalhar. Um cotidiano comum de muitos
brasileiros, ainda mais daqueles que vivem na cidade grande, como São Paulo. Ernani,
um jovem no auge de seus vinte e cinco anos, tinha acabado de sair da faculdade de
Metalurgia. Trabalha na empresa de seu pai, não mais como empresário, e, sim como
metalúrgico. Tudo estava ocorrendo como ele desejava.
Outro dia, estava o jovem ido ganhar a vida, todo sorridente, como só ele. Seu emprego
ficava no outro lado da cidade. Então, pegou o metro lotado e, em alguns minutos já
estava em seu destino. Trabalhou o dia todo, incansavelmente como um bom
empregado. Ele era o filho do chefe, precisava dar o exemplo. Quando o dia acabara,
Ernani se direcionou a estação de metro, mas próxima para poder descansar em sua
residência. Só que morar em capitais tem um grande problema, os inúmeros assaltos.
- Qual é tio? Passa tudo. Isso é um assalto – falou um adolescente segurando uma arma
calibre trinta e seis.
- Desculpa meninos, estou sem nada – respondeu o trabalhador.
O assaltante, não conformado, revistou o jovem e percebeu que ele só tinha alguns
3. trocados para a passagem de volta a casa. O trombadinha empurrou os pertences contra
o peito de Ernani fazendo-o cair.
- Ainda posso roubar-te uma coisa – vociferou o garoto atirando logo em seguida contra
o corpo do metalúrgico – A vida.
O adolescente correu deixando o corpo do rapaz ensanguentado ali, em praça pública
até o dia seguinte, quando policiais avistaram o cadáver no chão. Um jovem inocente
que mal começara a vida morreu. Entre muitos pensamentos, o último de Ernani foi: - A
vida passou tão rápida.
Abantesma
Bem, o meu nome é Aimée e preciso contar uma coisa a vocês. É muito ruim quando
você tem um dia estragado por uma coisa, certo? Então imagine que duas coisas acabam
com o seu dia. Horrível não? Ok, vocês devem estar se perguntando onde eu quero
chegar ou pedindo para que eu vá logo para a ação.
Eu tinha viajado para um desses locais no litoral, que só são conhecidos por causa das
praias, com a minha mãe. A viagem foi ótima, o problema foi a volta. Minha mãe tinha
planejado tudo perfeitamente até que o barco onde voltaríamos sumiu e o piloto estava
com as mãos abanando. Não podendo ficar nem um dia a mais naquele lugar,
arrumamos um jeito de voltar com uns nativos da praia que tinham um barco de
pequeno porte.
Já não bastasse o fato de os nativos me assustarem com seus dentes serem pontiagudos
e dourado sujo, ainda teria que voltar a casa em uma canoa. Durante o percurso, me
mantive a certa distância daqueles homens exóticos. Eu tinha uma vasta sensação de que
a qualquer momento eles amaldiçoariam minha família e me comeriam viva. Os meus
problemas passaram de inconvenientes a péssimos quando uma tempestade forte
começou. Ondas fortes foram formadas e estava prestes a ver a canoa embaixo de mim
se desfazer.
Enquanto minha mãe e eu segurávamos na borda da canoa esperando não sermos
levadas pelas ondas temerosas. E os nativos sumiram. Estávamos sozinhas no meio do
mar debaixo de uma tempestade, que poderia perfeitamente imitar a do filme Poseidon.
Uma onda enorme – ela não era enorme, mas grande o suficiente para aquela canoa –
virou o barco pequeno. Tentei me segurar em alguma coisa, mas tudo já tinha virado
nada. Minha mãe ergueu-me para que pudesse voltar a respirar.
Fomos atingidas por uma corrente de ferro que era presa a um poste no meio do mar.
Ela continha triângulos metálicos enormes que semelhavam aos dentes dos nativos. Um
tremor passou por todo meu corpo. Não sei o que aconteceu em seguida, não sei se
adormeci ou desmaiei, porém quando acordei, estava jogada na areia da praia da minha
cidade com os meus pertences ao meu lado.
Madre e eu decidimos não discutir sobre o ocorrido, acontecimentos demais para um
dia só. Seguimos para casa andando, já que não era tão longe dali. Eu morava com meus
pais e minha irmã em um apartamento pequeno em um bairro requintado do Rio de
Janeiro.
Entrei no banheiro e sorri na frente do espelho por finalmente estar em casa e sem mais
problemas. Olhei meu sorriso e gritei. Manchas pretas, que faziam meus dentes
parecerem pontiagudos e conterem um buraco em forma cilíndrica, dominavam minha
arcada dentária. Não sei o que tinha acontecido, mas meus dentes estavam idênticos ao
dos nativos estranhos da praia.
Minha mãe com a maior simplicidade do mundo falou apenas para que eu escovasse os
4. dentes. Ela não percebia tudo que podia estar atrás disso? O sumiço dos nativos, a nossa
aparição na praia da capital sem mais nem menos e, agora, meus dentes de repente
estarem assim? Não sabia o que fazer. Uma parte de mim desejava chorar em posição
fetal até virar pó e a outra queria pegar uma lupa e investigar o caso ala Sherlock
Holmes. Entretanto, fiz a escolha mais sensata, escovei os dentes.
Olhei para o lado e, então, lembrei-me dela. Madeleine estava lá me fitando com
aqueles olhos vazios. Madeleine era a filha da irmã da minha mãe. Como os meus tios
não tinham tempo para cuidar dela, deixavam-na com a gente. Até hoje não entendi o
motivo de ela sempre ficar no banheiro, era desconfortante. Madeleine era pequena,
parecia ter uns três anos, olhos grandes como um filhote de gato e cabelo preto
escorrido sempre preso de lado.
A minha prima, que eu não considerava ser prima, estava sempre lá fitando o nada,
como em um estado vegetativo. Não tinha escutado a voz dela em momento nenhum
desde que veio para cá, há cinco anos. Certas vezes ela me assustava, pois algo nela me
passava terror. Ela tinha um ar demoníaco.
- Por que mesmo a gente ainda cuida da Madeleine? – gritei à minha mãe indo à sala
onde ela estava.
- Você sabe que seus tios não têm condição e tempo para cuidar dela, Aimée – lançoume um olhar repreendendo-me por falar tão alto.
- Não tem como devolvê-la? Eu poderia dizer que ela só ocupa espaço, mas nem isso.
Ela está lá quando eu olho, mas quando viro novamente, ela sumiu. Parece um
fantasma, é assustador. Por favor, Mãe, eu não quero fazer parte de algum filme de
exorcismo – sussurrei.
- Aimée, não seja boba. Sua prima só gosta de ficar sozinha – respondeu voltando ao
quarto.
Segui-a até o cômodo onde minha irmã também se encontrava. Olhei para porta do
banheiro esperando a garota sair de lá girando a cabeça em 360º e andando como uma
aranha.
- Mãe, eu também acho que você devia devolvê-la aos meus tios. Já se passaram cinco
anos, eles empurraram o encosto para gente – cortou minha irmã levantando-se da
cama.
Ouvi um barulho no banheiro, porém a conversa paralela de minha madre e minha irmã
continuaram como se os ouvidos delas estivessem inercies ao ruído. A luz acendeu e a
porta do banheiro caiu como se estivesse fechando o cômodo erroneamente. Minha
respiração sumiu e eu só conseguia apontar e gaguejar. Os barulhos continuavam como
se todo o banheiro estivesse sendo destruído então começou um grito agudo que fazia
todo o meu corpo estremecer.
Madeleine tinha feito alguma coisa e isso seria impossível por causa dos problemas de
saúde dela. Pude, pelo canto do olho, ver as expressões chocadas de minha genitora e
minha irmã. Em um supetão, a luz apagou e a porta voltou à posição inicial, como se
nada tivesse acontecido.
A porta da sala abriu avisando a chegada do meu pai. Nós três corremos até o homem
robusto que mal pisara o pé dentro de casa. Gritávamos contando o ocorrido naquele dia
enquanto ele tentava absorver toda a informação que compreendia. Após muito tempo,
meu pai conseguiu nos acalmar e pudemos contar exatamente o que aconteceu.
- Do que vocês falando? – ele indagou unindo as sobrancelhas – Os tais nativos não
existem desde a chegada das caravelas portuguesas no solo brasileiro, e Madeleine
morreu há três anos.
5. Tão Longe Com Você
Os dois estavam ali, se amando, após uma daquelas discussões constantes. Aquela
paixão resplandecente e um amor eminente. Os seus lábios se tocavam com volúpia e as
mãos bobas que acariciavam o corpo um do outro, à procura de saciar o fogo do desejo.
Léo e Bela, enamorados, se adoravam em um quarto escuro da casa da menina.
- Amo-te – falou Léo assim que descolou os lábios de sua amada, e assim, novamente –
Por todo o sempre.
- Não diga isso – retrucou Bela interrompendo os atos de seu namorado, ainda com os
olhos fechados.
- Por quê? Tu não me amas mais? – gaguejou o garoto, com olhar inocente, temendo a
resposta da garota em seus braços.
- Oh não, Léo – respondeu dando um sorriso puro e apreciando a ingenuidade do garoto
a sua frente – Eu o amo. Amo-te mais do que qualquer outro alguém.
- Então o que há? - indagou Leonardo, sentando na cama, confuso com as palavras de
sua querida.
- Sempre é tempo demais - replicou Isabela sentando ao lado de seu adorado e
segurando sua mão - Um dia você irá encontrar alguém que vai te amar tanto quanto eu
- sua voz ficou embargada mostrando que aquilo era tão difícil para ela quanto para ele O que sentes por mim é algo passageiro.
- Não é possível. Meu sentimento por você é algo que jamais senti antes. Nem o tempo
e nem outro alguém poderá amenizar o que eu sinto por você - cortou segurando o resto
de Isabela com suas duas mãos.
- Que seja infinito enquanto dure - suplicou após balançar a cabeça negativamente
desistindo daquela breve discussão.
- E que dure para sempre - completou Léo tomando os lábios de Bela.
O amor e a paixão alcançou o casal novamente. Os dois se completavam com duas
peças de um quebra-cabeça. Léo e Bela. Uma atração que iria além do "até que a morte
os separe".
Soberano
Uma lembrança que vem como uma nuvem mágica ou um correr ligeiro de uma fita de filme
antigo. Cores, cheiro, sons e pensamentos vindos um de cada vez, respectivamente, como em
uma marcha lenta de lesmas. Então, quase de supetão, o sorriso nostálgico aparece
juntamente com as sensações calorosas e o arrepio inebriante.
Amplo espaço com idas e vindas, voltas e retas, paradas e contínuas. Número avantajado de
pessoas falando aqui e ali, respirando para lá e vivendo mais para cá. Livros amontoados e
enfileirados por todos os cantos, de todas as formas, tamanhos e cores. Autores brasileiros,
6. estrangeiros e aqueles que não podem ser considerados autores, mas escrevem seus
versinhos. Uma brilhante tirada de fôlego para qualquer leitor nato, viciado e apaixonado.
Entretanto não é deste lugar esplêndido que venho lembrar, talvez em partes, mas sim, do
abraço apertado, dos olhos incandescentes e o sorriso terno. Abraços que poderiam quebrarlhe as costelas, porém completamente aconchegantes. Olhos que sorriam e brilhavam como
um amanhecer. Sorriso que transparecia a alma feliz e elegante. Dois conhecidos se
encontrando pela primeira vez em atos e sentimentos de saudade que a outros olhos parecem
impossíveis. Um cheiro estranhamente bom e uma textura suave que serão lembradas até
quando o tempo e a idade brincarão de amnésia comigo.
A primeira vista de dois estranhos no que parecia ser o melhor lugar do mundo. A quase
perfeição em pessoa, o meu príncipe. Não há mente criativa o suficiente para tornar o dia mais
especial da minha vida em algo melhor. Ah, esse espetáculo de 2013 vai deixar saudades.