1. III Jornada de Estudos de Gênero do NUDERG
Bianca de Moura Wild
Rio de Janeiro
2. As transformações ocasionadas pelo “surgimento”
do que se convencionou chamar “ciberespaço”, as
diversas possibilidades, recursos, que emergem
nesse contexto, onde há um espaço de
comunicação que descarta a necessidade do
“físico” - nos expõe ao “outro” de uma forma nunca
antes vista, um novo contorno do que conhecemos
como “interação”, uma “renovada” alteridade.
Segundo o Ibope NetRatings, bem como o site
G1.globo.com,nós,brasileiros(as),ultrapassamos
a marca de 80 milhões de usuários ativos de
internet no primeiro trimestre de 2012, sendo o
Brasil o 5º país mais conectado do mundo.
3. Levando-se em consideração que a população
brasileira no ano de 2011 segundo dados do IBGE
era de 196.655.014 brasileiros e brasileiras,
ultrapassar a marca de 80 milhões de usuários
ativos é extremamente significativo, pois trata-se de
quase 42% da população total do país, isto levando-
se em consideração a questão da desigualdade
social. E, em se tratando de internet, é espantoso
pensarmos como os sites de relacionamento
assumiram um lugar de importância na vida de seus
usuários, mesmo que não tenham um computador
em suas casas. Sem possuir acesso à web, muitos
indivíduos utilizam esses sites, através lanhouses,
escolas, faculdades, internet comunitária etc.
A seguir dados do IBGE referentes ao ano de 2011
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5. A internet nos últimos tempos tem conectado milhões de
indivíduos por todo mundo. Essas novas formas de se
comunicar e informar, se relacionar e de interagir, apresentam
um “mundo novo”, original, nunca imaginado por muitas
pessoas.
Qualquer um, em qualquer lugar do mundo pode criar uma
“conta”, um “profile” em um dos diversos sites de
relacionamentos e/ou redes sociais como o facebook.com,
sônico.com, ning.com, myspace.com, secondlife, Orkut.com
dentre outros (as), e se comunicar com milhares de outros
indivíduos sem nunca os encontrar fora do ciberespaço, no
chamado “mundo físico”, “real”.
6. O objetivo principal desse estudo é compreender como se
processam neste “ambiente”, que não se opõe ao real, as
representações, convenções e performances de gênero.
Por tratar-se de um locus demasiadamente abrangente e
repleto de possibilidades, restringir-me-ei, neste momento, a
uma “pequena” parcela deste “mundo”, três “comunidades
virtuais” do site de relacionamentos e/ou rede social
orkut.com.
Privilegio neste estudo o referido site entre muitos outros
existentes por tratar-se de um canal de comunicação onde
seus usuários/membros, podem expressar gostos, hobbies,
opiniões, ideias e interesses, revelando seus pensamentos
com a “certeza” de que serão lidos por outros (as), além do
fato de que suas “comunidades” possuem centenas ou
milhares de membros, e qualquer um dos seus membros
pode criar outra sobre qualquer tema, artista, música, filmes,
profissão, oportunidades de emprego, autores, livros, enfim
qualquer coisa que desperte o interesse e suscite troca,
compartilhamento de informações e debate.
7. Pude perceber que mesmo no ciberespaço, existe
uma expectativa social em relação à maneira como
devemos nos comportar e expressar enquanto
indivíduos pertencentes ao gênero masculino ou
feminino.
Mesmo no mundo virtual, nos são designados
modos específicos de expressar opiniões, gostos,
manifestar ideias e até mesmo lugares que
devemos frequentar, e, claro, em se tratando do
ciberespaço e redes sociais/sites de
relacionamentos, ainda comunidades as quais
devemos adicionar e/ou aderir, dentre outras
atividades, o que de certa forma, confirma que o
virtual, o ciberespaço, pode ser interpretado como
uma extensão do “real”, do físico”.
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9. Três “comunidades virtuais” do site de relacionamentos ou
rede social Orkut.com foram observadas durante 2 meses: (1)
“Sou mais macho do que muito homem”, comunidade que
possuí 104917 membros (2) “odeio mulher fresca” que conta
com 83117 membros e (3) “Mulheres dizem: casamento não!”
que até o mês de agosto do ano de 2012 agregava 4045
membros.
As referidas comunidades possuem grande incidência de
discursos relacionados às performances e representações de
gênero. Acredito que as diversas formas de fazer-se mulher
ou homem, as muitas possibilidades de vivermos prazeres e
desejos corporais são sempre sugeridas, esperadas,
promovidas socialmente, o que não exclui o ciberespaço.
Justamente por esse motivo optei por este locus, imprevisível,
inconstante e repleto de diversidade e possibilidades de
descrição de si mesmo.
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11. “Conectados pela internet, sujeitos estabelecem relações
amorosas que desprezam dimensões de espaço, de tempo, de
gênero, de sexualidade e estabelecem jogos de identidade
múltipla nos quais o anonimato e a troca de identidade são
frequentemente utilizados”. (Kenway, 1998 apud Louro, 2000,
p.05)
O escopo basilar deste estudo é compreender o modo como
homens e mulheres se comportam em um ambiente virtual,
apreender o modo como algumas performances de gênero são
(re) negociadas.
Partirei da seguinte indagação: Como são percebidas e
desempenhadas as performances e representações de gênero
nas chamadas comunidades virtuais do site de
relacionamentos/rede social Orkut.com? Observando enquanto
elemento fundamental de análise o auto entendimento e a
autodescrição dos membros das “comunidades” escolhidas;
entendo esse “ambiente” como um “palanque”, onde seus
membros, sendo fakes ou não, “postam” suas opiniões sem
medo, proferem discursos sem temor de retaliação.
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14. E para responder a tal questionamento é imprescindível que outras
questões norteadoras sejam levadas em consideração para análise:
Como os membros das chamadas comunidades virtuais do site de
relacionamentos ou rede social Orkut.com se apropriam, vivenciam
ou mesmo rejeitam as representações e performances de gênero
apresentadas dentro e fora do ciberespaço, do mundo virtual? E, de
que forma os usuários/membros do Orkut.com o utilizam enquanto
“palanque” onde “postam” suas ideologias e visões de mundo, onde
expõe suas dúvidas, preconceitos, anseios e aflições? Como se
“fundam” as hierarquias no ciberespaço?
A diversidade é evidente ao percebermos os inúmeros ambientes de
sociabilidade existentes neste locus, onde se fundam as mais
variadas formas de intercâmbio. A certeza do anonimato dificulta
bastante a análise, pois nunca sabemos se estamos lidando com
uma pessoa “real” ou com um dos chamados “fakes”, muito embora
nessa pesquisa isso não tenha importância, pois justamente o que
interessa aqui é como os indivíduos utilizam esse “cenário” enquanto
“palanque”, falando o que realmente pensam, sem medo, ou como
disse Oscar Wilde, usando máscaras para dizer (escrever) a verdade.
15. Os sites de relacionamentos estão transformando o
comportamento humano. A partir do momento no qual o
indivíduo se introduz nesses sites ou redes, a sua
privacidade estará até certo ponto, aberta, ou seja, a sua
vida passa a ser pública e sem restrição de acesso, no
caso do usuário não utilizar as chamadas opções de
privacidade que esses sites/redes oferecem. Vale lembrar
que essas opções só se tornaram disponíveis há pouco
tempo atrás. O Orkut.com, o facebook.com etc., tornaram-
se “meios” para obter informações sobre a rotina, o estilo
de vida e as diferentes identidades através das
comunidades que seus usuários “aderem”. Hoje em dia,
algumas empresas se fazem valer dessa ferramenta para
conseguir informações sobre futuros funcionários, por
exemplo. Tudo isso ocasiona muitas vezes a criação de
fakes, pois uma vez que não podemos expor o que
realmente pensamos, nossos verdadeiros gostos,
encontramos alternativas inteligentes para que possamos
nos expressar como gostaríamos, sem véus, assim estes
perfis “falsos”(?) são criados, para que possamos ser “nós
mesmos”.
16. Já que o virtual e o real estão em sintonia, em um processo
de atualização e construção contínua torna-se indispensável
considerar os discursos proferidos no ciberespaço, uma vez
que, grande parte das práticas sociais em voga no
ciberespaço se estabelecem através da adequação e
ressignificação de práticas "off-line", ou seja, das práticas de
alçada territorial (Pierre Lévy), física.
Além disso, esses sites/redes são redes de comunicação e
disseminação de movimentos radicais, racistas,
discriminatórios e até mesmo de organizações criminosas;
atraem milhões de usuários, que têm agregado esses sites
em suas práticas diárias, os utilizando para obter
informações sobre diversos assuntos, e, claro, tornaram-se
um dos principais meios de comunicação entre os
internautas. Alguns sites de relacionamentos acolhem
determinado público, inclusive o próprio Orkut.com tem
perdido força no Brasil nos últimos anos para o
facebook.com, que vem se popularizando cada vez mais, e
segundo os internautas, deixando determinado público para
o Orkut.com. Quem é “cool” acaba indo para o
facebook.com, determinando assim uma espécie de
hierarquia entre usuários desses sites.
17. Partindo do pressuposto de que os usuários do
Orkut.com o utilizam como um “espaço democrático”,
onde podem “postar” comentários, críticas, réplicas,
compartilhar ideias e ideais, lanço a hipótese de que
este ambiente funciona como uma espécie de
palanque.
Explico-me: os usuários desse site/rede se fazem valer
dessa funcionalidade/ferramenta do site/rede para
exteriorizar seus pensamentos, indignação, dúvidas,
aflições e até mesmo seus rancores e preconceitos,
desejando ser ouvidos (lidos), por isso a analogia ao
“palanque”.
Devemos levar em consideração que de acordo com
Jungblut (2004, p.102) “falas digitalizadas que ocorram
no ciberespaço podem desaparecer como sinais
magnéticos momentaneamente armazenados em
alguns computadores, mas os efeitos concretos dessas
falas não desaparecem da mente dos interlocutores
que as mantiveram, nem as decisões no mundo offline
que possam ser tomadas em função delas.”
18. Pretendo evidenciar a partir dessa resumida apresentação, a
necessidade de uma maior compreensão deste fenômeno social,
uma vez que uma hierarquia de gênero ainda organiza as relações
sociais mesmo em um ambiente virtual, existe uma expectativa
social em relação à maneira como devemos nos comportar e
expressar enquanto indivíduos pertencentes ao gênero masculino
ou feminino e, nos são designados modos específicos de
expressar opiniões, gostos, manifestar ideias etc. além do fato de
mesmo no ciberespaço existirem regras organizacionais bem
como crivos comportamentais. As redes sociais normalmente, são
dominadas pelos mesmos males sociais do cotidiano não-virtual.
Às vezes até mais incisivos, pois, alguns se valem do não contato
do dia a dia para julgar as atividades alheias.
Alguns “pudores” em postar certos assuntos são de certa forma
“necessários” e/ou forçosos, pois pontuar os perfis pelo
preconceito habitual do cotidiano real ao cotidiano virtual é uma
realidade. Penso, que na verdade, o Ciberespaço, às vezes se
torna apenas uma extensão do comum, do ordinário, da vivência
do dia a dia com a “comodidade” do não encontro, sem riscos de
embate, de conflitos frente a frente.