SlideShare a Scribd company logo
1 of 3
Crônica: O Lixo –Luis Fernando Veríssimo
O lixo
Encontram-se na área de serviço. Cada um com seu pacote de lixo. É a primeira vez que se falam.
- Bom dia...
- Bom dia.
- A senhora é do 610.
- E o senhor do 612
- É.
- Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente...
- Pois é...
- Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo...
- O meu quê?
- O seu lixo.
- Ah...
- Reparei que nunca é muito. Sua família deve ser pequena...
- Na verdade sou só eu.
- Mmmm. Notei também que o senhor usa muito comida em lata.
- É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar...
- Entendo.
- A senhora também...
- Me chame de você.
- Você também perdoe a minha indiscrição, mas tenho visto alguns restos de comida em seu lixo.
Champignons, coisas assim...
- É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas, como moro sozinha, às vezes sobra...
- A senhora... Você não tem família?
- Tenho, mas não aqui.
- No Espírito Santo.
- Como é que você sabe?
- Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito Santo.
- É. Mamãe escreve todas as semanas.
- Ela é professora?
- Isso é incrível! Como foi que você adivinhou?
- Pela letra no envelope. Achei que era letra de professora.
- O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo.
- Pois é...
- No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado.
- É.
- Más notícias?
- Meu pai. Morreu.
- Sinto muito.
- Ele já estava bem velhinho. Lá no Sul. Há tempos não nos víamos.
- Foi por isso que você recomeçou a fumar?
- Como é que você sabe?
- De um dia para o outro começaram a aparecer carteiras de cigarro amassadas no seu lixo.
- É verdade. Mas consegui parar outra vez.
- Eu, graças a Deus, nunca fumei.
- Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo...
- Tranqüilizantes. Foi uma fase. Já passou.
- Você brigou com o namorado, certo?
- Isso você também descobriu no lixo?
- Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora. Depois, muito lenço de papel.
- É, chorei bastante, mas já passou.
- Mas hoje ainda tem uns lencinhos...
- É que eu estou com um pouco de coriza.
- Ah.
- Vejo muita revista de palavras cruzadas no seu lixo.
- É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é.
- Namorada?
- Não.
- Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha.
- Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga.
- Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte.
- Você já está analisando o meu lixo!
- Não posso negar que o seu lixo me interessou.
- Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia.
- Não! Você viu meus poemas?
- Vi e gostei muito.
- Mas são muito ruins!
- Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. Eles só estavam dobrados.
- Se eu soubesse que você ia ler...
- Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é
propriedade dela?
- Acho que não. Lixo é domínio público.
- Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra
com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?
- Bom, aí você já está indo fundo demais no lixo. Acho que...
- Ontem, no seu lixo...
- O quê?
- Me enganei, ou eram cascas de camarão?
- Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei.
- Eu adoro camarão.
- Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...
- Jantar juntos?
- É.
- Não quero dar trabalho.
- Trabalho nenhum.
- Vai sujar a sua cozinha?
- Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.
- No seu lixo ou no meu?
COMPREENDENDO O TEXTO
A crônica é um gênero textual que traz, explícita ou implicitamente, uma crítica a algum aspecto da vida em
sociedade. Em relação à crônica “O lixo” , de Veríssimo, qual a crítica presente?
3) Onde aconteceu o primeiro encontro dos personagens?
4) No início do diálogo, os personagens se cumprimentam e, em seguida, iniciam uma conversa.
a) Qual é a forma de tratamento usada por eles?
b) Que palavra representa essa forma de tratamento?
5) A conversa entre os personagens continua. A senhora do 610 diz: “Me chame de você”.
a) Qual foi a mudança ocorrida quanto a forma de tratamento?
b) Qual a palavra que aponta para essa mudança?
c) Quanto ao uso do pronome “me” na frase acima, ele está de acordo com a variedade padrão ou não?
Justifique sua resposta.
4) Qual a estratégia utilizada pela senhora do 610 para saber se o senhor do 612 tem família ou não?
5) Por meio dos objetos jogados no lixo pelos personagens podemos levantar hipóteses quanto à condição social
deles. Qual é a condição social de cada um? Justifique sua resposta com elementos do texto.
6) Como o senhor do 612 descobriu que a senhora do 610 tinha parentes no Espírito Santo? Quem é o parente
distante da senhora? O que mais ele descobriu sobre essa pessoa (parente)?
7) Em “Isso é incrível!! Como foi que você adivinhou?”, o elemento destacado retoma qual ideia?
8) De acordo com a crônica, os elementos abaixo fazem com que cada personagem chegue a uma conclusão.
Aponte a conclusão a que cada um chegou a partir dos elementos:
a) telegrama amassado:
b) carteira de cigarro amassadas:
c) vidrinhos de comprimidos
d) buquê de flores:
e) palavras cruzadas:
f) fotografia:
9) Em “Você brigou com o namorado, certo?”, o senhor do 612 conclui que a senhora do 610 havia terminado
com o namorado. Descreva os passos do raciocínio do homem para alcançar essa conclusão.
10) Toda a conversa revela um drama muito comum entre os habitantes das grandes cidades. Que drama é esse?
Produção textual
Releia o final da crônica “O lixo” de Veríssimo: Escreva um pequeno diálogo dando
continuidade deste encontro entre o senhor do 612 e a senhora do 610.
“- Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei.
- Eu adoro camarão.
- Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...
- Jantar juntos?
- É.
- Não quero dar trabalho.
- Trabalho nenhum.
- Vai sujar a sua cozinha?
- Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.
- No seu lixo ou no meu?”

More Related Content

What's hot

Gênero textual: Fabulas e contos
Gênero textual: Fabulas e contos Gênero textual: Fabulas e contos
Gênero textual: Fabulas e contos Mary Alvarenga
 
Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...
Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...
Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...Mary Alvarenga
 
Conto de suspense e atividade.
Conto  de suspense e  atividade.Conto  de suspense e  atividade.
Conto de suspense e atividade.Mary Alvarenga
 
Poema o menino azul de Cecília Meireles - Análise e entendimento
Poema  o menino azul de  Cecília Meireles - Análise e entendimento Poema  o menino azul de  Cecília Meireles - Análise e entendimento
Poema o menino azul de Cecília Meireles - Análise e entendimento Mary Alvarenga
 
Autobiografia: proposta de produção textual
Autobiografia: proposta de produção textualAutobiografia: proposta de produção textual
Autobiografia: proposta de produção textualMaria Cecilia Silva
 
III Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdf
III Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdfIII Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdf
III Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdfAndré Moraes
 
D7 (por descritores port 5º ano)
D7  (por descritores port  5º ano)D7  (por descritores port  5º ano)
D7 (por descritores port 5º ano)Cidinha Paulo
 
Gênero textual: Cardápio e bula de remédio
Gênero textual: Cardápio e bula de remédio Gênero textual: Cardápio e bula de remédio
Gênero textual: Cardápio e bula de remédio Mary Alvarenga
 
Atividade ortográfica - caçando erros
Atividade ortográfica - caçando erros Atividade ortográfica - caçando erros
Atividade ortográfica - caçando erros Mary Alvarenga
 
Frases para ordenar menino maluquinho
Frases para ordenar menino maluquinhoFrases para ordenar menino maluquinho
Frases para ordenar menino maluquinhoCláudia Borges
 
Atividade com noticias 2
Atividade com noticias 2Atividade com noticias 2
Atividade com noticias 2Dário Reis
 
Sequência didática poemas
Sequência didática poemasSequência didática poemas
Sequência didática poemasDário Reis
 
Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo -
Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo - Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo -
Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo - Renata Marani Dourado Marques
 

What's hot (20)

Gênero textual: Fabulas e contos
Gênero textual: Fabulas e contos Gênero textual: Fabulas e contos
Gênero textual: Fabulas e contos
 
Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...
Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...
Atividade ortográfica - Leitura e reescrita do poema A Porta de Vinicius de M...
 
Conto de suspense e atividade.
Conto  de suspense e  atividade.Conto  de suspense e  atividade.
Conto de suspense e atividade.
 
Poema o menino azul de Cecília Meireles - Análise e entendimento
Poema  o menino azul de  Cecília Meireles - Análise e entendimento Poema  o menino azul de  Cecília Meireles - Análise e entendimento
Poema o menino azul de Cecília Meireles - Análise e entendimento
 
Autobiografia: proposta de produção textual
Autobiografia: proposta de produção textualAutobiografia: proposta de produção textual
Autobiografia: proposta de produção textual
 
D12 (5º ano l.p.)
D12 (5º ano   l.p.)D12 (5º ano   l.p.)
D12 (5º ano l.p.)
 
III Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdf
III Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdfIII Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdf
III Atividade Avaliativa de História 4º e 5º ano pdf
 
D14 (5º ano l.p.)
D14 (5º ano   l.p.)D14 (5º ano   l.p.)
D14 (5º ano l.p.)
 
D7 (por descritores port 5º ano)
D7  (por descritores port  5º ano)D7  (por descritores port  5º ano)
D7 (por descritores port 5º ano)
 
Poemas visuais
Poemas visuaisPoemas visuais
Poemas visuais
 
AVALIAÇÃO DE HISTÓRIA - 5º ANO - PROCESSO DE REAVALIAÇAO 2017
AVALIAÇÃO DE HISTÓRIA - 5º ANO - PROCESSO DE REAVALIAÇAO  2017AVALIAÇÃO DE HISTÓRIA - 5º ANO - PROCESSO DE REAVALIAÇAO  2017
AVALIAÇÃO DE HISTÓRIA - 5º ANO - PROCESSO DE REAVALIAÇAO 2017
 
Gênero textual: Cardápio e bula de remédio
Gênero textual: Cardápio e bula de remédio Gênero textual: Cardápio e bula de remédio
Gênero textual: Cardápio e bula de remédio
 
Atividade ortográfica - caçando erros
Atividade ortográfica - caçando erros Atividade ortográfica - caçando erros
Atividade ortográfica - caçando erros
 
Frases para ordenar menino maluquinho
Frases para ordenar menino maluquinhoFrases para ordenar menino maluquinho
Frases para ordenar menino maluquinho
 
Atividade com noticias 2
Atividade com noticias 2Atividade com noticias 2
Atividade com noticias 2
 
Sequência didática poemas
Sequência didática poemasSequência didática poemas
Sequência didática poemas
 
Interpretaçao o sapo portugues
Interpretaçao o sapo portuguesInterpretaçao o sapo portugues
Interpretaçao o sapo portugues
 
Sequencia didatica a_princesa_e_a_ervilha
Sequencia didatica a_princesa_e_a_ervilhaSequencia didatica a_princesa_e_a_ervilha
Sequencia didatica a_princesa_e_a_ervilha
 
Pronomes Possessivos atividade portugues PLE
Pronomes Possessivos atividade portugues PLEPronomes Possessivos atividade portugues PLE
Pronomes Possessivos atividade portugues PLE
 
Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo -
Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo - Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo -
Avaliaçao 2 bimestre 5 ano - sobre Menino Maluquinho e Ziraldo -
 

Viewers also liked

A Descoberta - Luis Fernando Verissimo
A Descoberta - Luis Fernando VerissimoA Descoberta - Luis Fernando Verissimo
A Descoberta - Luis Fernando VerissimoAdilson P Motta Motta
 
Texto. Dois mais dois. Fernando Verissimo
Texto. Dois mais dois. Fernando VerissimoTexto. Dois mais dois. Fernando Verissimo
Texto. Dois mais dois. Fernando VerissimoAdilson P Motta Motta
 
Luis Fernando Verissimo O Santinho (Doc) (Rev)
Luis Fernando Verissimo   O Santinho (Doc) (Rev)Luis Fernando Verissimo   O Santinho (Doc) (Rev)
Luis Fernando Verissimo O Santinho (Doc) (Rev)Mara Virginia
 
Cronicas selecionadas da coluna do estadao
Cronicas selecionadas da coluna do estadaoCronicas selecionadas da coluna do estadao
Cronicas selecionadas da coluna do estadaoEducação Educar
 
Intertextualidade na Canção e Poesia
Intertextualidade na Canção e PoesiaIntertextualidade na Canção e Poesia
Intertextualidade na Canção e PoesiaAdilson P Motta Motta
 
Literatura: Primeira Geração Romântica Brasileira
Literatura: Primeira Geração Romântica BrasileiraLiteratura: Primeira Geração Romântica Brasileira
Literatura: Primeira Geração Romântica BrasileiraIngrit Silva Sampaio
 
Análise de i juca-pirama, de gonçalves dias
Análise de i juca-pirama, de gonçalves diasAnálise de i juca-pirama, de gonçalves dias
Análise de i juca-pirama, de gonçalves diasma.no.el.ne.ves
 
3° ano - Contos e crônicas
3° ano - Contos e crônicas3° ano - Contos e crônicas
3° ano - Contos e crônicasProfFernandaBraga
 
Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu.
Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu. Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu.
Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu. Helio de Sant'Anna
 

Viewers also liked (20)

A Descoberta - Luis Fernando Verissimo
A Descoberta - Luis Fernando VerissimoA Descoberta - Luis Fernando Verissimo
A Descoberta - Luis Fernando Verissimo
 
Linha cruzada - Luis Fernando Veríssimo
Linha cruzada - Luis Fernando VeríssimoLinha cruzada - Luis Fernando Veríssimo
Linha cruzada - Luis Fernando Veríssimo
 
Proposta extra 2
Proposta extra 2Proposta extra 2
Proposta extra 2
 
Texto. Dois mais dois. Fernando Verissimo
Texto. Dois mais dois. Fernando VerissimoTexto. Dois mais dois. Fernando Verissimo
Texto. Dois mais dois. Fernando Verissimo
 
Luis Fernando Verissimo O Santinho (Doc) (Rev)
Luis Fernando Verissimo   O Santinho (Doc) (Rev)Luis Fernando Verissimo   O Santinho (Doc) (Rev)
Luis Fernando Verissimo O Santinho (Doc) (Rev)
 
Portugues 5
Portugues 5Portugues 5
Portugues 5
 
Cronicas selecionadas da coluna do estadao
Cronicas selecionadas da coluna do estadaoCronicas selecionadas da coluna do estadao
Cronicas selecionadas da coluna do estadao
 
Intertextualidade na Canção e Poesia
Intertextualidade na Canção e PoesiaIntertextualidade na Canção e Poesia
Intertextualidade na Canção e Poesia
 
Literatura: Primeira Geração Romântica Brasileira
Literatura: Primeira Geração Romântica BrasileiraLiteratura: Primeira Geração Romântica Brasileira
Literatura: Primeira Geração Romântica Brasileira
 
Cronicas 2
Cronicas 2Cronicas 2
Cronicas 2
 
I Juca Pirama - Gonçalves Dias
I   Juca Pirama - Gonçalves DiasI   Juca Pirama - Gonçalves Dias
I Juca Pirama - Gonçalves Dias
 
Aval de leitura comédias para se ler na escola
Aval de leitura comédias para se ler na escolaAval de leitura comédias para se ler na escola
Aval de leitura comédias para se ler na escola
 
Crônicas
CrônicasCrônicas
Crônicas
 
Gonçalves Dias
Gonçalves DiasGonçalves Dias
Gonçalves Dias
 
Análise de i juca-pirama, de gonçalves dias
Análise de i juca-pirama, de gonçalves diasAnálise de i juca-pirama, de gonçalves dias
Análise de i juca-pirama, de gonçalves dias
 
3° ano - Contos e crônicas
3° ano - Contos e crônicas3° ano - Contos e crônicas
3° ano - Contos e crônicas
 
Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu.
Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu. Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu.
Leitura de Luis Fernando Verissimo, com base na teoria de Coseriu.
 
O diamante
O diamanteO diamante
O diamante
 
O homem trocado
O homem trocadoO homem trocado
O homem trocado
 
promotor de vendas
promotor de vendaspromotor de vendas
promotor de vendas
 

Similar to Crônica o lixo

Similar to Crônica o lixo (20)

Lp 8ano
Lp 8anoLp 8ano
Lp 8ano
 
Lp 8ano
Lp 8anoLp 8ano
Lp 8ano
 
Lixo - por Veríssimo
Lixo - por VeríssimoLixo - por Veríssimo
Lixo - por Veríssimo
 
O lixo1
O lixo1O lixo1
O lixo1
 
O lixo
O lixoO lixo
O lixo
 
Crônicas de Luis Fernando Veríssimo e Fernando Sabino
Crônicas de Luis Fernando Veríssimo e Fernando SabinoCrônicas de Luis Fernando Veríssimo e Fernando Sabino
Crônicas de Luis Fernando Veríssimo e Fernando Sabino
 
Vozes verbais 7a_serie
Vozes verbais 7a_serieVozes verbais 7a_serie
Vozes verbais 7a_serie
 
Vozes verbais 7a_serie
Vozes verbais 7a_serieVozes verbais 7a_serie
Vozes verbais 7a_serie
 
Missão 13 - Julho
Missão 13 - JulhoMissão 13 - Julho
Missão 13 - Julho
 
QU4RTO DESAMP4RO
QU4RTO DESAMP4ROQU4RTO DESAMP4RO
QU4RTO DESAMP4RO
 
Baile do interior - Livro de contos.
Baile do interior - Livro de contos.Baile do interior - Livro de contos.
Baile do interior - Livro de contos.
 
O amor é um falacia
O amor é um falaciaO amor é um falacia
O amor é um falacia
 
Direct and indirect speech through Literature in English
Direct and indirect speech through Literature in EnglishDirect and indirect speech through Literature in English
Direct and indirect speech through Literature in English
 
Prova oitavo
Prova oitavoProva oitavo
Prova oitavo
 
Revista subversa 6ª ed.
Revista subversa 6ª ed.Revista subversa 6ª ed.
Revista subversa 6ª ed.
 
Leonardo da Vinci de Rita Vilela
Leonardo da Vinci de Rita VilelaLeonardo da Vinci de Rita Vilela
Leonardo da Vinci de Rita Vilela
 
As moças pronto
As moças prontoAs moças pronto
As moças pronto
 
3º agro literatura tipo 02 pdf
3º agro   literatura tipo 02 pdf3º agro   literatura tipo 02 pdf
3º agro literatura tipo 02 pdf
 
Luigi pirandello "O Homem da Flor na Boca"
Luigi pirandello "O Homem da Flor na Boca"Luigi pirandello "O Homem da Flor na Boca"
Luigi pirandello "O Homem da Flor na Boca"
 
Luigi pirandello
Luigi pirandello Luigi pirandello
Luigi pirandello
 

Crônica o lixo

  • 1. Crônica: O Lixo –Luis Fernando Veríssimo O lixo Encontram-se na área de serviço. Cada um com seu pacote de lixo. É a primeira vez que se falam. - Bom dia... - Bom dia. - A senhora é do 610. - E o senhor do 612 - É. - Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente... - Pois é... - Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo... - O meu quê? - O seu lixo. - Ah... - Reparei que nunca é muito. Sua família deve ser pequena... - Na verdade sou só eu. - Mmmm. Notei também que o senhor usa muito comida em lata. - É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar... - Entendo. - A senhora também... - Me chame de você. - Você também perdoe a minha indiscrição, mas tenho visto alguns restos de comida em seu lixo. Champignons, coisas assim... - É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas, como moro sozinha, às vezes sobra... - A senhora... Você não tem família? - Tenho, mas não aqui. - No Espírito Santo. - Como é que você sabe? - Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito Santo. - É. Mamãe escreve todas as semanas. - Ela é professora? - Isso é incrível! Como foi que você adivinhou? - Pela letra no envelope. Achei que era letra de professora. - O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo. - Pois é... - No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado. - É. - Más notícias? - Meu pai. Morreu. - Sinto muito. - Ele já estava bem velhinho. Lá no Sul. Há tempos não nos víamos. - Foi por isso que você recomeçou a fumar? - Como é que você sabe? - De um dia para o outro começaram a aparecer carteiras de cigarro amassadas no seu lixo. - É verdade. Mas consegui parar outra vez. - Eu, graças a Deus, nunca fumei. - Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo... - Tranqüilizantes. Foi uma fase. Já passou. - Você brigou com o namorado, certo? - Isso você também descobriu no lixo? - Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora. Depois, muito lenço de papel. - É, chorei bastante, mas já passou.
  • 2. - Mas hoje ainda tem uns lencinhos... - É que eu estou com um pouco de coriza. - Ah. - Vejo muita revista de palavras cruzadas no seu lixo. - É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é. - Namorada? - Não. - Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha. - Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga. - Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte. - Você já está analisando o meu lixo! - Não posso negar que o seu lixo me interessou. - Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia. - Não! Você viu meus poemas? - Vi e gostei muito. - Mas são muito ruins! - Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. Eles só estavam dobrados. - Se eu soubesse que você ia ler... - Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é propriedade dela? - Acho que não. Lixo é domínio público. - Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso? - Bom, aí você já está indo fundo demais no lixo. Acho que... - Ontem, no seu lixo... - O quê? - Me enganei, ou eram cascas de camarão? - Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei. - Eu adoro camarão. - Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode... - Jantar juntos? - É. - Não quero dar trabalho. - Trabalho nenhum. - Vai sujar a sua cozinha? - Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora. - No seu lixo ou no meu? COMPREENDENDO O TEXTO A crônica é um gênero textual que traz, explícita ou implicitamente, uma crítica a algum aspecto da vida em sociedade. Em relação à crônica “O lixo” , de Veríssimo, qual a crítica presente? 3) Onde aconteceu o primeiro encontro dos personagens? 4) No início do diálogo, os personagens se cumprimentam e, em seguida, iniciam uma conversa. a) Qual é a forma de tratamento usada por eles? b) Que palavra representa essa forma de tratamento? 5) A conversa entre os personagens continua. A senhora do 610 diz: “Me chame de você”. a) Qual foi a mudança ocorrida quanto a forma de tratamento? b) Qual a palavra que aponta para essa mudança? c) Quanto ao uso do pronome “me” na frase acima, ele está de acordo com a variedade padrão ou não? Justifique sua resposta. 4) Qual a estratégia utilizada pela senhora do 610 para saber se o senhor do 612 tem família ou não?
  • 3. 5) Por meio dos objetos jogados no lixo pelos personagens podemos levantar hipóteses quanto à condição social deles. Qual é a condição social de cada um? Justifique sua resposta com elementos do texto. 6) Como o senhor do 612 descobriu que a senhora do 610 tinha parentes no Espírito Santo? Quem é o parente distante da senhora? O que mais ele descobriu sobre essa pessoa (parente)? 7) Em “Isso é incrível!! Como foi que você adivinhou?”, o elemento destacado retoma qual ideia? 8) De acordo com a crônica, os elementos abaixo fazem com que cada personagem chegue a uma conclusão. Aponte a conclusão a que cada um chegou a partir dos elementos: a) telegrama amassado: b) carteira de cigarro amassadas: c) vidrinhos de comprimidos d) buquê de flores: e) palavras cruzadas: f) fotografia: 9) Em “Você brigou com o namorado, certo?”, o senhor do 612 conclui que a senhora do 610 havia terminado com o namorado. Descreva os passos do raciocínio do homem para alcançar essa conclusão. 10) Toda a conversa revela um drama muito comum entre os habitantes das grandes cidades. Que drama é esse? Produção textual Releia o final da crônica “O lixo” de Veríssimo: Escreva um pequeno diálogo dando continuidade deste encontro entre o senhor do 612 e a senhora do 610. “- Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei. - Eu adoro camarão. - Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode... - Jantar juntos? - É. - Não quero dar trabalho. - Trabalho nenhum. - Vai sujar a sua cozinha? - Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora. - No seu lixo ou no meu?”