1. UMA ANÁLISE DO LIVRO
DOM CASMURRO DE
MACHADO DE ASSIS:
Prof. Fernanda Pantoja
2. A crítica literária costuma dividir os romances Machadianos em dois grupos.
Em qual deles situa-se o romance?
Dom Casmurro situa-se na vertente realista de Machado da qual também
fazem parte às obras Memórias Póstuma de Brás Cubas e Quincas Borba.
As principais características realistas encontradas que o justificam fazer
parte desta escola são:
A contemporaneidade, pois traça um retrato fiel da época, dos costumes e
ambientes dando ênfase nesse caso a vida de uma família abastada e de
classe media alta no Rio de Janeiro do século XIX.
O retrato fiel também das personagens, fugindo assim das idealizações
românticas e dando-lhes aspectos concretos onde são expostos o caráter e
os motivos e intenções de suas ações.
A materialização do amor, fugindo deste modo dos aspectos românticos
onde o amor por vezes não concretizasse ou fica apenas no plano das
idéias.
O gosto pelos detalhes, dos quais Machado abusa tornado a narrativa lenta
e com pouca ação.
A análise psicológica constante de seus personagens revelando assim seus
conflitos internos, suas tensões, medo e uma extensa gama de sentimentos.
A análise dos valores sócios da época através de sacadas irônicas e da
descrição das personagens.
O pessimismo e as ironias demonstrados por toda a Obra caracterizando
não só o realismo contido em Dom Casmurro, mas também a visão do
próprio escritor Machado de Assis.
3. A indefinição, a dúvida eterna e a dissimulação constituem elementos
estruturais em Dom Casmurro. Em que sentido essa informação é valida?
Bento Santiago desde o principio mostra-se um personagem de caráter
ambíguo e indefinido que ora tem impulsos de tomar rédeas de sua própria
vida definido-se como homem atuante, ora entrega-se a completa
submissão deixando-se guiar pelas mãos dos outros sem questionamentos.
Bento é filho de uma mulher viúva, que vive este luto ate o fim de seus dias.
Religiosa e tradicionalista é a primeira personagem a dominar a vida de
Bento Santiago lhe definindo desde o nascimento a vida a ser seguida. É
extremada nas preocupações e cuidados com o garoto. Os outros habitantes
da casa seguem o exemplo da senhora dedicando também mimos e
proteções a Bentinho, destacando-se nesse conjunto principalmente a
figura do agregado José Dias que dispensa ao menino afeição quase
paternal. É uma figura de grande influencia sobre este sendo um dos
maiores contribuintes de sua neurotização mais tarde.
Crescendo neste mundo religioso, de extremos cuidados e formalidades tem
sua personalidade mal- formada e tolida tornando-se assim um homem
frágil, inseguro e de uma indefinição de caráter, sentimentos e ações que o
acompanham por toda a existência. Este sentimento de dualidade e
indefinição com certeza fora um dos maiores influenciadores do ciúme
doentio e avassalador que lhe surge posteriormente alimentado e
continuado por sua duvida eterna. Esta duvida persiste por todo o romance
encontrando como ponto de concentração a personagem Capitu.
Quase toda a narrativa do romance desenvolve-se pautada numa
desconfiança mórbida que angustia e corrói Bento Santiago. É a dúvida da
suposta traição de Capitu com o seu melhor amigo Escobar.
4. Bento ao narrar sua historia e ao tentar “atar as pontas da sua vida” revive
as lembranças de um passado e passa ao leitor todas as suas percepções e
convicções diante da vida e dos fatos que habitam sua mente: relembra
Capitu na infância, ainda aos quatorze anos, quando já era um a moça bela
e formada e apresenta-a com todas as usas características próprias e
definidas.
É aquela que arquiteta os planos para livrar Bentinho do seminário e quem
o orienta nas formas de agir e fingir. É a moça que domina suas feições,
sentimentos e expressões principalmente quando pega de surpresa. Muito
inteligente, astuta e por vezes atrevida colocando-se em posição de
igualdade com Bentinho mesmo sendo mulher e de uma classe inferior.
A personalidade de Capitu descrita por Bento, a principio encanta, mas
como o passar dos anos passa a amendontrá-lo chegando ao ponto de
causar-lhe repulsa. Estes fatos o levam a crer em quanto Capitu fora
dissimulada e falsa, afirmando o conceito sobre o olhar desta por José Dias:
“ olhos de cigana, oblíqua e dissimulada”. Enxerga-a como calculista,
enganadora e que desde sempre tencionava enganá-lo.
Todos os acontecimentos e situações que são reavivados por sua mente na
escrita o levam a crer cada vez mais na traição da esposa. Em sua cabeça é
construído o seguinte questionamento: se ele enganou e burlou na
juventude as pessoas porque agora não faria isso comigo?
5. Após o falecimento do amigo Escobar a duvida quanto ao caráter da
esposa intensifica-se de forma devastadora ao observar no velório os
olhos de Capitu que observavam o defunto tão desconsolada e fixa que
dá-lhe no ato a impressão de paixão por aquele. Com o crescimento do
filho Ezequiel e as semelhanças cada vez maiores deste com o amigo
morto, a convivência entre Capitu e bento torna-se insuportável e um
verdadeiro pesadelo. No desespero e neurose da duvida relacionada à
paternidade de Ezequiel, chaga ao ponto de preparar o veneno para
dar cabo de si. Sem coragem ao encontrar o filho deseja agora dar o
veneno a criança que em sua mente é a imagem concreta da traição da
esposa. Mais uma vez vacila e desiste da ação.
Os anos passam, mãe e filho morrem e Bento Santiago jamais
consegue a confirmação do ato de adultério. “Dessa forma a dúvida
permanece eterna e ele preso aqueles “olhos de ressaca” ou nos de
“cigana oblíqua e dissimulada”, opta assim por promover um
comportamento também dissimulado numa vida falsa escondendo-se
de tudo e de todos, revivendo fatos e alimentando-os. Remoendo o
eterno questionamento de sua existência.
6. Há na narrativa Machadiana a construção de uma visão pessimista da vida.
Quais são os alvos dessa visão e como conseqüência de suas criticas?
Machado apresenta uma visão trágica e amarga da vida humana através
principalmente do personagem Bento Santiago. O tédio e amargura
habitam-no por dentro e por fora e não há nada que o faça espairecer ou
descansar a alma.
Torna-se através dos anos na narrativa, um homem sorumbático,
ensimesmado e fechado em sis mesmo (provendo daí a alcunha Casmurro)
numa constante rede de lembranças e sensações distorcidas alimentadas
pela chama de seu ciúme.
Ressentido, amargurado, medrosamente paralisado e ambíguo por
natureza, Bento só consegue enxergar a vida através de uma perspectiva
altamente negativista e pessimista numa perseguição mental influenciada
por uma idéia cristalizada onde seus demônios interiores manisfestam-se
freqüentemente.
Seu pessimismo doentio serve-lhe também como uma proteção, uma casca
contra o mundo, contra os outros. Enxerga o mal antes que este o atinja
desprevenidamente. Suas idéias são pautadas nos parcos fundamentos que
obtém e tornam-se verdades absolutas que o paralisam e enfraquecem.
7. O pessimismo de Bento aliado a sua inércia e dúvida eterna, quase o levam
ao suicídio e ao assassinato pela cegueira e falta de confiança num amanha
melhor. É preciso, contudo, atentar para o fato de que seu pessimismo não
se apresenta lamurioso e nem queixoso de ilusões perdidas, pois sua
personalidade já não as tinha.
A existência amarga de Bento Santiago o leva a perder o que poderia
ganhar arrastando-o para o enfado e um pessimismo vulgar.
Não há em Bento nem em seu amor por Capitu nada de belo, espontâneo. A
tristeza e o pessimismo arrastam-se por toda a obra fortalecendo-se cada
vez mais com a maturidade e reclusão deste.
Outros personagens do livro, principalmente do núcleo familiar de Bento
apresentam características pessimistas podendo ser citadas D. Gloria, sua
própria mãe, que vive num luto eterno mantendo-se numa postura de
carola sem alegrias e satisfações numa tentativa de esconder sua
juventude e beleza através do luto e presa somente a figura do filho e a
promessa feita assumindo uma postura triste e obscura esquivando-se da
idéia de uma nova vida. Personagem Tia Justina é outra viúva amarga e
intrigue ira sendo companheira de D. Gloria apoiando-a na existência a
amarga e medíocre.
8. De acordo com o capitulo XXXII:
A noção de tempo é tratada em profundidade nesse capitulo, há três níveis de
temporalidade:
1- Um tempo de narrativa formado pelas memórias do passado.
2- Um tempo de ação determinando os fatos do passado.
3- Um tempo de sensações que é psicológico não marcado psicologicamente.
inicio e o termino e como se relacionam:
O tempo da narrativa e o tempo da ação confundem-se entre si e ocorrem desde o
inicio do capitulo ate o momento de reflexão de Bentinho dado pela RETÓRICA
DOS NAMORADOS. Mais tarde esta junção retorna já no fim do capitulo com o
começo de novo dialogo dos personagens.
Nesses dois primeiros tempos Bentinho motivado pelo passado e pela sua
lembrança (pelo o que Jose Dias havia exposto a respeito de Capitu) narra e
interage com a menina a fim de lhe ser retirada a duvida que lhe atormenta a
mente.
9. O terceiro tempo é o tempo das sensações, e começa com a RETÓRICA
DOS NAMORADOS, terminando com o retorno do dialogo entre os
personagens. Neste tempo, Bentinho vive seu universo particular,
torna-se cego a tudo o que é periférico enxergado somente os olhos da
amada e entrando em um processo de quase êxtase e arrebatamento
ao fitar aquele olhar.
Bentinho divaga, analisa, chega a conclusões, perturba-se e deleita-se
neste tempo relativo, “ infinito e breve”, como descrito por ele. Este é
o tempo interior do personagem que se manifesta e lhe provoca uma
serie de sensações e sentimentos estranhos e prazerosos ao mesmo
tempo.
Os três níveis temporais se inter-relacionam porque tudo ocorre em
meio ao dialogo e ações das personagens do livro.
10. Nota-se que o narrador interrompe a narrativa dirigindo-se ao leitor.
Como ocorre isto?
Isto ocorre justamente quando Bentinho entra neste tempo de
sensações e começa a explicar ao leitor tudo o que é sentido e pensado
por ele naquele momento. Ele pedi auxilio ao leitor logo no inicio:
„‟RETORICA DOS NAMORADOS, DÁ-ME UMA COMPARACAO EXTA E
POETICA PARA DIZER O QUE FORAM AQUELES OLHOS DE CAPITU.”
Como se definem os olhos de Capitu por Jose Dias e pelo narrador?
Jose Dias os define como “ olhos de cigana obliqua e dissimulada”.
Para Jose Dias enxerga-se no olhar de Capitu um veneno. Atribui ao
seu olhar uma gama de características negativas considerando-o falso,
dissimulado, traiçoeiro e traidor. Um olhar de soslaio difícil de ser lido
e decifrado. Olhar não confiável da mulher disfarçada e astuta.
Bentinho, ao contrario, não enxerga absolutamente nada do que Jose
Dias insinua com o seu comentário maldoso. Nada vê de extraordinário
a principio e somente enxerga a mesma doçura e encantamento que já
lhe eram velhos conhecidos. Depois os define como “olhos de ressaca”
remetendo-os metaforicamente ao mar com seus mistérios e
magnetismo profundo.
11. O narrador atribui aos olhos de Capitu a energia do mar violento. Isso é correto?
Nesta referencia metafórica ao mar, Bento lembra-nos da força e do movimento
das ondas nas ressacas que chegam e arrebatam carregando o que se encontra
pela frente. Este mar revolto é o mar hipnótico, intenso, enigmático e forte.
Bentinho tenta não ser sugado por ele desviando os seus olhos para as outras
partes do corpo de Capitu mas não resiste muito tempo sendo chamado ao
encontro do que lhe causa inquietação. É a força da mulher sobre ele, a
capacidade de sugar a este de arrastá-lo com a ressaca de seu olhar.
Releia o capitulo CXXIII e compare-o com o capitulo XXXII.
Como são caracterizados os olhos de Capitu nos dois capítulos?
Nos dois capítulos são utilizadas metáforas que ligam o olhar de Capitu ao mar.
No capítulo XXXII. Bentinho descreve a força e o hipnotismo que o olhar de
Capitu lhe causa arrastando-o para si. Ele enxerga beleza neste olhar, nota algo
prazeroso fixando-se a este.
No capítulo CXXIII Bento Santiago descreve que essa fixação agora muda de
lado. Desta vez Capitu que se torna estática, hipnotizada, apaixonadamente fixa
ao defunto. Seus olhos tornam-se os olhos da viúva, da mulher que perde o seu
grande amor. Os “ olhos de ressaca” desejam tragar a Escobar o seu nadador da
manhã.
12. Em algumas lágrimas poucas e caladas, o termo em
destaque é atribuído de “lágrimas” . existe alguma
forma de linguagem figurada? Justifique.
Sim, neste caso segundo a visão de Bento Santiago, Capitu
deixaria escapar lágrimas CALADAS porque seu choro teria
de ser baixo, contido, sem alardes ou grandes
demonstrações de desespero, justamente para não dar o
que falar, para não demonstrar para ele e para as pessoas
do velório o tamanho de seu sofrimento pela paixão
perdida com a morte de Escobar.
As lagrimas também seriam POUCAS pelos mesmos
motivos pois o derramamento de muitas lagrimas, na
cabeça de Bento, denunciaria por completo a traição da
esposa.
13. O narrador consegue resgatar a sua
adolescência e maturidade? Explique.
Não, o próprio Bento Santiago afirma no livro não
conseguir resgatar o que é e o que foi. O desejo
torna-se no fundo frustrado por um único motivo: a
obsessão por Capitu. Toda a história se volta para ela
e sobrevive em função dela, desde sua juventude em
Matacavalos até a maturidade onde tenta reproduzir
sua antiga casa para reavivar as memórias. No
desejo de encontrar-se, Bento só encontra a
lembrança da esposa e por fim se perde. A suposta
traição é o que norteia sua vida e sua história.