1. Conhecimento
Descartes
Descartes pretende fundar em bases novas e seguras o edifício do saber. Este sistema é constituído
pelos primeiros princípios do conhecimento humano e pelas verdades que deles se deduzem em cada
ordem das ciências. Aos alicerces ou seja às bases que sustentam este edifício Descartes dá o nome de
metafisica.
A principal razão que leva Descartes a realizar este projeto é devido ao facto que a verificação de que
todo o saber do seu tempo é um saber desordenado e que isso deve-se a estar baseado em falsos
princípios. Ao encontrarmos os verdadeiros princípios de todo o saber estaremos ao mesmo tempo a
constitui-lo de forma ordenada, atribuindo a cada dimensão do saber o lugar que deve ocupar no
edifício científico. Devemos começar do princípio e, como a ciência que estuda os primeiros princípios é
a metafisica a investigação do saber começa com ela.
Para o fazer é necessário partir de um princípio que cumpre duas exigências:
Deve ser de tal modo evidente que o pensamento não possa dele duvidar
Dele dependerá o conhecimento do resto, de modo que nada pode ser conhecido sem ele, mas
não reciprocamente
Para chegar a uma certeza absoluta, Descartes decide-se a examinar todo o âmbito do saber. A forma
mais rigorosa e simples para descobrir o indubitável é duvidar. É inventariar antes de mais tudo aquilo
de que podemos duvidar.
Como só será verdadeiro o conhecimento que resistir completamente ao exame da dúvida, esta deve
ser hiperbólica. Esta dúvida pode ser interpretada tanto como um instrumento na procura de uma
verdade absolutamente indubitável onde é um ponto de partida cujo objetivo é chegar a uma verdade
que resista a qualquer tentativa de a pôr em causa, como um forma metódica de investigar a verdade
separando o verdadeiro do falso, em que a dúvida é um instrumento ao serviço do cumprimento da
regra metódica que considera falso tudo o que não é absolutamente verdadeiro. Só duvidando é que se
assegura que a crença que resistir será absolutamente verdadeira.
A conclusão que se retira disto é que pomos em causa que os sentidos sejam fonte de conhecimento
rejeitando-se uma teoria empirista, pomos em causa a existência de qualquer realidade física pois não
conseguimos encontrar uma forma de garantir que essa realidade não fosse uma realidade imaginária,
duvidamos de tudo aquilo que anteriormente considerámos um modelo do saber – os conhecimentos
matemáticos.
O sujeito põe em causa todos os objetos incluindo o próprio corpo. Duvida, logo existe.
Esta dúvida põe em causa as informações dos sentidos sobre as propriedades dos objetos físicos,
rejeitando o empirismo pois visto que por vezes os sentidos enganam-nos logo nunca poderemos
confiar nas informações sobre as qualidades dos objetos sensíveis.
Põe em causa a existência de realidades corpóreas pois visto que não há um critério absoluto, claro e
distinto para distinguir o sonho da realidade logo não se pode considerar verdadeira a crença nas
realidades físicas.
2. Põe também em causa a crença na veracidade das operações do entendimento. Baseado na hipótese de
um Deus enganador, lança a suspeita sobre os objetos inteligíveis. São postas em causa as conclusões
dos raciocínios matemáticos.
A dúvida põe assim em causa a realidade dos objetos sensíveis e inteligíveis. Ficamos a saber que ela
não está do lado dos objetos mas sim no sujeito.
Este sujeito que duvida dos objetos inteligíveis e sensíveis não pode duvidar que existe pois se não
existisse não podia duvidar. Como duvida, existe. O sujeito que duvida existe como substância pensante.
A alma é distinta do corpo porque existe mesmo que o corpo não exista. É a substância pensante.
Este sujeito é assim exclusivamente pensante.
Descartes afirma que é imperfeito. Ele só existe como substância pensante, conhecendo que existe e
que existe a distinção de alma e corpo, mas duvidando de tudo o resto.
É imperfeito pois sabe em que consiste a perfeição e comparando as suas qualidades com as que são
próprias do ser perfeito. Como não pode ser a causa dessa ideia e o efeito tem de ser causado por algo
perfeito conclui que Deus tem de existir. Ao concluir que Deus existe Descartes tem 2 objetivos. O de
conduzir o sujeito ao conhecimento de que existe uma outra realidade, superior a ele e recuperar a
validade dos conhecimentos matemáticos que foram postos em causa devido à suspeita de Deus ser
enganador. Se Deus é perfeito não há razão para desconfiar dele. Enganar é sinónimo de imperfeição.
Deus é perfeito logo não nos engana.
Conclui-se que para Descartes o conhecimento é possível. Embora a dúvida pareça conduzir à descrença
na existência de verdades Descartes não é um cético. A dúvida serve para separar o verdadeiro do falso.
O ceticismo cartesiano é meramente metodológico. Não há conhecimento se as nossas crenças não
forem justificadas mas elas podem ser justificadas.
Hume
Segundo Hume existe uma relação entre impressões e ideias. As ideias são imagens das impressões,
logo as impressões são anteriores às ideias e todas as ideias derivam de impressões.
As impressões são imagens ou sentimentos que derivam imediatamente da realidade. São perceções
vivas e fortes. Podem ser simples ou complexas.
As ideias são cópias débeis das impressões e também podem ser simples ou complexas.
Dizemos então que todos os conteúdos do nosso conhecimento derivam da experiência. As ideias só são
verdadeiras se procederem de impressões. Só são válidas se podermos indicar a impressão de que
derivam. Se não houver correspondência há falsidade. As impressões são não só o critério de verdade
mas também o seu limite. Não podemos afirmar nenhuma coisa da qual não temos qualquer impressão
sensível.
3. As relações de ideias são conhecimentos a priori. A verdade e a coerência dos argumentos que
combinam relações de ideias não dependem do confronto com os factos ou a experiencia. As relações
de ideias dão-nos verdades necessárias. “ o triangulo é um polígono de 3 ângulos”. É logicamente
impossível a sua negação. As proposições que exprimem e combinam relações de ideias não nos dão
qualquer conhecimento sobre o que se passa no mundo
Os conhecimentos de facto são conhecimentos a posteriori. A verdade de proposições que se referem a
factos depende de exame empírico. A verdade de proposições de facto é contingente. “ O sol vai nascer
amanhã.” Esta proposição é contingentemente verdadeira. Não é logicamente possível que o sol não
nasça amanhã apesar de ser muito pouco provável. As proposições que se referem a factos visam
descobrir coisas sobre o mundo e dar-nos conhecimento sobre o que neste existe e acontece.
Hume desfere um golpe profundo nas convicções racionalistas acerca do conhecimento e também na
convicção dos cientistas do seu tempo acerca da existência objetiva de leis da natureza.
Consideremos o seguinte enunciado: Um determinado aumento de temperatura A é a causa da
dilatação de certos corpos B. O efeito sucede à causa. Por relação causal entendemos uma conexão ou
ligação necessária entre acontecimentos. A é causa de B pois sempre que acontece A acontece
necessariamente B. A produz necessariamente B. Porém, não temos experiencia desta conexão visto
que quando dizemos que acontecendo A sempre acontecerá B estamos a falar de um facto futuro que
ainda não aconteceu. Não podemos ter qualquer impressão sensível do que ainda não aconteceu.
De tantas vezes observarmos que um corpo dilata apos um determinado aumento de temperatura,
sempre que vemos acontecer um aumento de temperatura concluímos que, devido ao habito, certos
corpos vão dilatar. A ideia de causalidade nada é mais que uma crença subjetiva, um produto do hábito.
Criticando a fé cega no poder da razão quanto ao conhecimento do mundo e do que transcende a
natureza, Hume argumenta que o conhecimento cientifico não é como o matemático na medida em que
não é puramente demonstrativo mas procede da experiencia. Quanto à objetividade das leis naturais o
filosofo escocês argumenta que qualquer generalização é incerta. Nada podemos saber acerca do futuro
porque nada nos garante que ele seja semelhante ao passado. O nosso conhecimento não é certo e
seguro. Mas uma coisa é o valor cientifico dos nossos conhecimentos e outra a sua utilidade pratica e
vital. Os conhecimentos científicos são mais pretensão e desejo de segurança do que saber.
Concluindo, o conhecimento entendido como relação de ideias é possível. As verdades logicas e
matemáticas provam-no. Contudo o conhecimento de factos não tem justificação empírica nem
racional.
A razão não nos dá conhecimentos da realidade independentemente da experiencia pois todo o
conhecimento que existe e acontece no mundo deriva da experiencia embora esta não nos possa
garantir objetividade aos nossos conhecimentos. O nosso conhecimento não pode estender-se para lá
da experiencia.
O conhecimento de facto seria, em principio, justificado pela experiencia dadas as bases empiristas da
filosofia de Hume. Contudo é em geral um conjunto de expetativas que mais tarde ou mais cedo podem
ser desmentidas não podendo ser justificadas.