SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 3
Conhecimento
Descartes
Descartes pretende fundar em bases novas e seguras o edifício do saber. Este sistema é constituído
pelos primeiros princípios do conhecimento humano e pelas verdades que deles se deduzem em cada
ordem das ciências. Aos alicerces ou seja às bases que sustentam este edifício Descartes dá o nome de
metafisica.
A principal razão que leva Descartes a realizar este projeto é devido ao facto que a verificação de que
todo o saber do seu tempo é um saber desordenado e que isso deve-se a estar baseado em falsos
princípios. Ao encontrarmos os verdadeiros princípios de todo o saber estaremos ao mesmo tempo a
constitui-lo de forma ordenada, atribuindo a cada dimensão do saber o lugar que deve ocupar no
edifício científico. Devemos começar do princípio e, como a ciência que estuda os primeiros princípios é
a metafisica a investigação do saber começa com ela.
Para o fazer é necessário partir de um princípio que cumpre duas exigências:
 Deve ser de tal modo evidente que o pensamento não possa dele duvidar
 Dele dependerá o conhecimento do resto, de modo que nada pode ser conhecido sem ele, mas
não reciprocamente
Para chegar a uma certeza absoluta, Descartes decide-se a examinar todo o âmbito do saber. A forma
mais rigorosa e simples para descobrir o indubitável é duvidar. É inventariar antes de mais tudo aquilo
de que podemos duvidar.
Como só será verdadeiro o conhecimento que resistir completamente ao exame da dúvida, esta deve
ser hiperbólica. Esta dúvida pode ser interpretada tanto como um instrumento na procura de uma
verdade absolutamente indubitável onde é um ponto de partida cujo objetivo é chegar a uma verdade
que resista a qualquer tentativa de a pôr em causa, como um forma metódica de investigar a verdade
separando o verdadeiro do falso, em que a dúvida é um instrumento ao serviço do cumprimento da
regra metódica que considera falso tudo o que não é absolutamente verdadeiro. Só duvidando é que se
assegura que a crença que resistir será absolutamente verdadeira.
A conclusão que se retira disto é que pomos em causa que os sentidos sejam fonte de conhecimento
rejeitando-se uma teoria empirista, pomos em causa a existência de qualquer realidade física pois não
conseguimos encontrar uma forma de garantir que essa realidade não fosse uma realidade imaginária,
duvidamos de tudo aquilo que anteriormente considerámos um modelo do saber – os conhecimentos
matemáticos.
O sujeito põe em causa todos os objetos incluindo o próprio corpo. Duvida, logo existe.
Esta dúvida põe em causa as informações dos sentidos sobre as propriedades dos objetos físicos,
rejeitando o empirismo pois visto que por vezes os sentidos enganam-nos logo nunca poderemos
confiar nas informações sobre as qualidades dos objetos sensíveis.
Põe em causa a existência de realidades corpóreas pois visto que não há um critério absoluto, claro e
distinto para distinguir o sonho da realidade logo não se pode considerar verdadeira a crença nas
realidades físicas.
Põe também em causa a crença na veracidade das operações do entendimento. Baseado na hipótese de
um Deus enganador, lança a suspeita sobre os objetos inteligíveis. São postas em causa as conclusões
dos raciocínios matemáticos.
A dúvida põe assim em causa a realidade dos objetos sensíveis e inteligíveis. Ficamos a saber que ela
não está do lado dos objetos mas sim no sujeito.
Este sujeito que duvida dos objetos inteligíveis e sensíveis não pode duvidar que existe pois se não
existisse não podia duvidar. Como duvida, existe. O sujeito que duvida existe como substância pensante.
A alma é distinta do corpo porque existe mesmo que o corpo não exista. É a substância pensante.
Este sujeito é assim exclusivamente pensante.
Descartes afirma que é imperfeito. Ele só existe como substância pensante, conhecendo que existe e
que existe a distinção de alma e corpo, mas duvidando de tudo o resto.
É imperfeito pois sabe em que consiste a perfeição e comparando as suas qualidades com as que são
próprias do ser perfeito. Como não pode ser a causa dessa ideia e o efeito tem de ser causado por algo
perfeito conclui que Deus tem de existir. Ao concluir que Deus existe Descartes tem 2 objetivos. O de
conduzir o sujeito ao conhecimento de que existe uma outra realidade, superior a ele e recuperar a
validade dos conhecimentos matemáticos que foram postos em causa devido à suspeita de Deus ser
enganador. Se Deus é perfeito não há razão para desconfiar dele. Enganar é sinónimo de imperfeição.
Deus é perfeito logo não nos engana.
Conclui-se que para Descartes o conhecimento é possível. Embora a dúvida pareça conduzir à descrença
na existência de verdades Descartes não é um cético. A dúvida serve para separar o verdadeiro do falso.
O ceticismo cartesiano é meramente metodológico. Não há conhecimento se as nossas crenças não
forem justificadas mas elas podem ser justificadas.
Hume
Segundo Hume existe uma relação entre impressões e ideias. As ideias são imagens das impressões,
logo as impressões são anteriores às ideias e todas as ideias derivam de impressões.
As impressões são imagens ou sentimentos que derivam imediatamente da realidade. São perceções
vivas e fortes. Podem ser simples ou complexas.
As ideias são cópias débeis das impressões e também podem ser simples ou complexas.
Dizemos então que todos os conteúdos do nosso conhecimento derivam da experiência. As ideias só são
verdadeiras se procederem de impressões. Só são válidas se podermos indicar a impressão de que
derivam. Se não houver correspondência há falsidade. As impressões são não só o critério de verdade
mas também o seu limite. Não podemos afirmar nenhuma coisa da qual não temos qualquer impressão
sensível.
As relações de ideias são conhecimentos a priori. A verdade e a coerência dos argumentos que
combinam relações de ideias não dependem do confronto com os factos ou a experiencia. As relações
de ideias dão-nos verdades necessárias. “ o triangulo é um polígono de 3 ângulos”. É logicamente
impossível a sua negação. As proposições que exprimem e combinam relações de ideias não nos dão
qualquer conhecimento sobre o que se passa no mundo
Os conhecimentos de facto são conhecimentos a posteriori. A verdade de proposições que se referem a
factos depende de exame empírico. A verdade de proposições de facto é contingente. “ O sol vai nascer
amanhã.” Esta proposição é contingentemente verdadeira. Não é logicamente possível que o sol não
nasça amanhã apesar de ser muito pouco provável. As proposições que se referem a factos visam
descobrir coisas sobre o mundo e dar-nos conhecimento sobre o que neste existe e acontece.
Hume desfere um golpe profundo nas convicções racionalistas acerca do conhecimento e também na
convicção dos cientistas do seu tempo acerca da existência objetiva de leis da natureza.
Consideremos o seguinte enunciado: Um determinado aumento de temperatura A é a causa da
dilatação de certos corpos B. O efeito sucede à causa. Por relação causal entendemos uma conexão ou
ligação necessária entre acontecimentos. A é causa de B pois sempre que acontece A acontece
necessariamente B. A produz necessariamente B. Porém, não temos experiencia desta conexão visto
que quando dizemos que acontecendo A sempre acontecerá B estamos a falar de um facto futuro que
ainda não aconteceu. Não podemos ter qualquer impressão sensível do que ainda não aconteceu.
De tantas vezes observarmos que um corpo dilata apos um determinado aumento de temperatura,
sempre que vemos acontecer um aumento de temperatura concluímos que, devido ao habito, certos
corpos vão dilatar. A ideia de causalidade nada é mais que uma crença subjetiva, um produto do hábito.
Criticando a fé cega no poder da razão quanto ao conhecimento do mundo e do que transcende a
natureza, Hume argumenta que o conhecimento cientifico não é como o matemático na medida em que
não é puramente demonstrativo mas procede da experiencia. Quanto à objetividade das leis naturais o
filosofo escocês argumenta que qualquer generalização é incerta. Nada podemos saber acerca do futuro
porque nada nos garante que ele seja semelhante ao passado. O nosso conhecimento não é certo e
seguro. Mas uma coisa é o valor cientifico dos nossos conhecimentos e outra a sua utilidade pratica e
vital. Os conhecimentos científicos são mais pretensão e desejo de segurança do que saber.
Concluindo, o conhecimento entendido como relação de ideias é possível. As verdades logicas e
matemáticas provam-no. Contudo o conhecimento de factos não tem justificação empírica nem
racional.
A razão não nos dá conhecimentos da realidade independentemente da experiencia pois todo o
conhecimento que existe e acontece no mundo deriva da experiencia embora esta não nos possa
garantir objetividade aos nossos conhecimentos. O nosso conhecimento não pode estender-se para lá
da experiencia.
O conhecimento de facto seria, em principio, justificado pela experiencia dadas as bases empiristas da
filosofia de Hume. Contudo é em geral um conjunto de expetativas que mais tarde ou mais cedo podem
ser desmentidas não podendo ser justificadas.

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Filosofia do conhecimento; síntese
Filosofia do conhecimento; sínteseFilosofia do conhecimento; síntese
Filosofia do conhecimento; sínteseAna Felizardo
 
Popper_problema_demarcação
Popper_problema_demarcaçãoPopper_problema_demarcação
Popper_problema_demarcaçãoIsabel Moura
 
Provas da existência de Deus segundo Descartes
Provas da existência de Deus segundo DescartesProvas da existência de Deus segundo Descartes
Provas da existência de Deus segundo DescartesJoana Filipa Rodrigues
 
Jogo_Glória de Descartes_regras2
Jogo_Glória de Descartes_regras2Jogo_Glória de Descartes_regras2
Jogo_Glória de Descartes_regras2Isabel Moura
 
Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...
Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...
Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...Helena Serrão
 
Resumos de Filosofia- Racionalismo e Empirismo
Resumos de Filosofia- Racionalismo e EmpirismoResumos de Filosofia- Racionalismo e Empirismo
Resumos de Filosofia- Racionalismo e EmpirismoAna Catarina
 
Introdução à dúvida cartesiana
Introdução à dúvida cartesianaIntrodução à dúvida cartesiana
Introdução à dúvida cartesianaWilson Rodrigues
 
Jogo_Glória de Descartes_regras
Jogo_Glória de Descartes_regrasJogo_Glória de Descartes_regras
Jogo_Glória de Descartes_regrasIsabel Moura
 
Filosofia aula 7
Filosofia aula 7Filosofia aula 7
Filosofia aula 7Erica Frau
 
3ano 2bi filosofia_ex
3ano 2bi filosofia_ex3ano 2bi filosofia_ex
3ano 2bi filosofia_extakahico
 
Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume
Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume
Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume Sofia Yuna
 
Ppt david hume a
Ppt david hume aPpt david hume a
Ppt david hume aAnaKlein1
 

Mais procurados (18)

Filosofia do conhecimento; síntese
Filosofia do conhecimento; sínteseFilosofia do conhecimento; síntese
Filosofia do conhecimento; síntese
 
Popper_problema_demarcação
Popper_problema_demarcaçãoPopper_problema_demarcação
Popper_problema_demarcação
 
David hume
David humeDavid hume
David hume
 
Provas da existência de Deus segundo Descartes
Provas da existência de Deus segundo DescartesProvas da existência de Deus segundo Descartes
Provas da existência de Deus segundo Descartes
 
Jogo_Glória de Descartes_regras2
Jogo_Glória de Descartes_regras2Jogo_Glória de Descartes_regras2
Jogo_Glória de Descartes_regras2
 
Power point 1 o projeto de descartes
Power point  1   o projeto de descartesPower point  1   o projeto de descartes
Power point 1 o projeto de descartes
 
Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...
Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...
Como Descartes ultrapassao cepticismo 120217104847-phpapp02-130130123609-phpa...
 
Resumos de Filosofia- Racionalismo e Empirismo
Resumos de Filosofia- Racionalismo e EmpirismoResumos de Filosofia- Racionalismo e Empirismo
Resumos de Filosofia- Racionalismo e Empirismo
 
Introdução à dúvida cartesiana
Introdução à dúvida cartesianaIntrodução à dúvida cartesiana
Introdução à dúvida cartesiana
 
Jogo_Glória de Descartes_regras
Jogo_Glória de Descartes_regrasJogo_Glória de Descartes_regras
Jogo_Glória de Descartes_regras
 
Cogito_Descartes
Cogito_DescartesCogito_Descartes
Cogito_Descartes
 
Filosofia aula 7
Filosofia aula 7Filosofia aula 7
Filosofia aula 7
 
3ano 2bi filosofia_ex
3ano 2bi filosofia_ex3ano 2bi filosofia_ex
3ano 2bi filosofia_ex
 
Metodologia científica
Metodologia científicaMetodologia científica
Metodologia científica
 
Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume
Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume
Filosofia Origem e objetos do conhecimento segundo hume
 
Conhecimento 2
Conhecimento 2Conhecimento 2
Conhecimento 2
 
O empirismo de david hume
O empirismo de david humeO empirismo de david hume
O empirismo de david hume
 
Ppt david hume a
Ppt david hume aPpt david hume a
Ppt david hume a
 

Semelhante a Descartes e Hume sobre o conhecimento

Quadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartesQuadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartesIsabel Moura
 
Racionalismo - Filosofia
Racionalismo - FilosofiaRacionalismo - Filosofia
Racionalismo - FilosofiaCarson Souza
 
Racionalismo
RacionalismoRacionalismo
RacionalismoPelo Siro
 
Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01
Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01
Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01gildapirescosta
 
Filosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJ
Filosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJFilosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJ
Filosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJJoana Pinto
 
Resumo filosofia (3)
Resumo filosofia (3)Resumo filosofia (3)
Resumo filosofia (3)Mateus Ferraz
 
resumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdf
resumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdfresumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdf
resumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdfTamraSilva
 
Descartes - Trab grupo III
Descartes - Trab grupo IIIDescartes - Trab grupo III
Descartes - Trab grupo IIImluisavalente
 
Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02
Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02
Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02Helena Serrão
 
Ae ci11 prep_exame_nacional
Ae ci11 prep_exame_nacionalAe ci11 prep_exame_nacional
Ae ci11 prep_exame_nacionalj_sdias
 
Ppt o racionalismo de descartes
Ppt o racionalismo de descartesPpt o racionalismo de descartes
Ppt o racionalismo de descartesAnaKlein1
 
O racionalismo de Descartes.pptx
O racionalismo de Descartes.pptxO racionalismo de Descartes.pptx
O racionalismo de Descartes.pptxIaraCaldeira2
 
Contributo de Descartes
Contributo de DescartesContributo de Descartes
Contributo de DescartesJorge Barbosa
 
Descartes - Contributo para a Modernidade
Descartes - Contributo para a ModernidadeDescartes - Contributo para a Modernidade
Descartes - Contributo para a ModernidadeJorge Barbosa
 

Semelhante a Descartes e Hume sobre o conhecimento (20)

Quadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartesQuadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartes
 
Racionalismo - Filosofia
Racionalismo - FilosofiaRacionalismo - Filosofia
Racionalismo - Filosofia
 
Racionalismo
RacionalismoRacionalismo
Racionalismo
 
Filosofia 11ºano
Filosofia 11ºanoFilosofia 11ºano
Filosofia 11ºano
 
Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01
Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01
Unidade2 capiiteoriasexplicativasdoconhecimento-110227081909-phpapp01
 
Filosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJ
Filosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJFilosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJ
Filosofia - Ato de conhecer, Descartes, Ceticismo, CVJ
 
DESCARTES 11ANO
DESCARTES 11ANODESCARTES 11ANO
DESCARTES 11ANO
 
Resumo filosofia (3)
Resumo filosofia (3)Resumo filosofia (3)
Resumo filosofia (3)
 
resumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdf
resumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdfresumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdf
resumo_do_11º_ano_para_prepaprar_o_exame.pdf
 
Descartes - Trab grupo III
Descartes - Trab grupo IIIDescartes - Trab grupo III
Descartes - Trab grupo III
 
Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02
Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02
Comodescartesultrapassaocepticismo 120217104847-phpapp02
 
Ae ci11 prep_exame_nacional
Ae ci11 prep_exame_nacionalAe ci11 prep_exame_nacional
Ae ci11 prep_exame_nacional
 
Ppt o racionalismo de descartes
Ppt o racionalismo de descartesPpt o racionalismo de descartes
Ppt o racionalismo de descartes
 
Resumos filosofia 2
Resumos filosofia 2Resumos filosofia 2
Resumos filosofia 2
 
Comparando Descartes e Hume.doc
Comparando Descartes e Hume.docComparando Descartes e Hume.doc
Comparando Descartes e Hume.doc
 
O racionalismo de Descartes.pptx
O racionalismo de Descartes.pptxO racionalismo de Descartes.pptx
O racionalismo de Descartes.pptx
 
Contributo de Descartes
Contributo de DescartesContributo de Descartes
Contributo de Descartes
 
Descartes - Contributo para a Modernidade
Descartes - Contributo para a ModernidadeDescartes - Contributo para a Modernidade
Descartes - Contributo para a Modernidade
 
Aula 07 - Descartes e o Racionalismo
Aula 07 - Descartes e o RacionalismoAula 07 - Descartes e o Racionalismo
Aula 07 - Descartes e o Racionalismo
 
A Dúvida Cartesiana/metódica
A Dúvida Cartesiana/metódicaA Dúvida Cartesiana/metódica
A Dúvida Cartesiana/metódica
 

Descartes e Hume sobre o conhecimento

  • 1. Conhecimento Descartes Descartes pretende fundar em bases novas e seguras o edifício do saber. Este sistema é constituído pelos primeiros princípios do conhecimento humano e pelas verdades que deles se deduzem em cada ordem das ciências. Aos alicerces ou seja às bases que sustentam este edifício Descartes dá o nome de metafisica. A principal razão que leva Descartes a realizar este projeto é devido ao facto que a verificação de que todo o saber do seu tempo é um saber desordenado e que isso deve-se a estar baseado em falsos princípios. Ao encontrarmos os verdadeiros princípios de todo o saber estaremos ao mesmo tempo a constitui-lo de forma ordenada, atribuindo a cada dimensão do saber o lugar que deve ocupar no edifício científico. Devemos começar do princípio e, como a ciência que estuda os primeiros princípios é a metafisica a investigação do saber começa com ela. Para o fazer é necessário partir de um princípio que cumpre duas exigências:  Deve ser de tal modo evidente que o pensamento não possa dele duvidar  Dele dependerá o conhecimento do resto, de modo que nada pode ser conhecido sem ele, mas não reciprocamente Para chegar a uma certeza absoluta, Descartes decide-se a examinar todo o âmbito do saber. A forma mais rigorosa e simples para descobrir o indubitável é duvidar. É inventariar antes de mais tudo aquilo de que podemos duvidar. Como só será verdadeiro o conhecimento que resistir completamente ao exame da dúvida, esta deve ser hiperbólica. Esta dúvida pode ser interpretada tanto como um instrumento na procura de uma verdade absolutamente indubitável onde é um ponto de partida cujo objetivo é chegar a uma verdade que resista a qualquer tentativa de a pôr em causa, como um forma metódica de investigar a verdade separando o verdadeiro do falso, em que a dúvida é um instrumento ao serviço do cumprimento da regra metódica que considera falso tudo o que não é absolutamente verdadeiro. Só duvidando é que se assegura que a crença que resistir será absolutamente verdadeira. A conclusão que se retira disto é que pomos em causa que os sentidos sejam fonte de conhecimento rejeitando-se uma teoria empirista, pomos em causa a existência de qualquer realidade física pois não conseguimos encontrar uma forma de garantir que essa realidade não fosse uma realidade imaginária, duvidamos de tudo aquilo que anteriormente considerámos um modelo do saber – os conhecimentos matemáticos. O sujeito põe em causa todos os objetos incluindo o próprio corpo. Duvida, logo existe. Esta dúvida põe em causa as informações dos sentidos sobre as propriedades dos objetos físicos, rejeitando o empirismo pois visto que por vezes os sentidos enganam-nos logo nunca poderemos confiar nas informações sobre as qualidades dos objetos sensíveis. Põe em causa a existência de realidades corpóreas pois visto que não há um critério absoluto, claro e distinto para distinguir o sonho da realidade logo não se pode considerar verdadeira a crença nas realidades físicas.
  • 2. Põe também em causa a crença na veracidade das operações do entendimento. Baseado na hipótese de um Deus enganador, lança a suspeita sobre os objetos inteligíveis. São postas em causa as conclusões dos raciocínios matemáticos. A dúvida põe assim em causa a realidade dos objetos sensíveis e inteligíveis. Ficamos a saber que ela não está do lado dos objetos mas sim no sujeito. Este sujeito que duvida dos objetos inteligíveis e sensíveis não pode duvidar que existe pois se não existisse não podia duvidar. Como duvida, existe. O sujeito que duvida existe como substância pensante. A alma é distinta do corpo porque existe mesmo que o corpo não exista. É a substância pensante. Este sujeito é assim exclusivamente pensante. Descartes afirma que é imperfeito. Ele só existe como substância pensante, conhecendo que existe e que existe a distinção de alma e corpo, mas duvidando de tudo o resto. É imperfeito pois sabe em que consiste a perfeição e comparando as suas qualidades com as que são próprias do ser perfeito. Como não pode ser a causa dessa ideia e o efeito tem de ser causado por algo perfeito conclui que Deus tem de existir. Ao concluir que Deus existe Descartes tem 2 objetivos. O de conduzir o sujeito ao conhecimento de que existe uma outra realidade, superior a ele e recuperar a validade dos conhecimentos matemáticos que foram postos em causa devido à suspeita de Deus ser enganador. Se Deus é perfeito não há razão para desconfiar dele. Enganar é sinónimo de imperfeição. Deus é perfeito logo não nos engana. Conclui-se que para Descartes o conhecimento é possível. Embora a dúvida pareça conduzir à descrença na existência de verdades Descartes não é um cético. A dúvida serve para separar o verdadeiro do falso. O ceticismo cartesiano é meramente metodológico. Não há conhecimento se as nossas crenças não forem justificadas mas elas podem ser justificadas. Hume Segundo Hume existe uma relação entre impressões e ideias. As ideias são imagens das impressões, logo as impressões são anteriores às ideias e todas as ideias derivam de impressões. As impressões são imagens ou sentimentos que derivam imediatamente da realidade. São perceções vivas e fortes. Podem ser simples ou complexas. As ideias são cópias débeis das impressões e também podem ser simples ou complexas. Dizemos então que todos os conteúdos do nosso conhecimento derivam da experiência. As ideias só são verdadeiras se procederem de impressões. Só são válidas se podermos indicar a impressão de que derivam. Se não houver correspondência há falsidade. As impressões são não só o critério de verdade mas também o seu limite. Não podemos afirmar nenhuma coisa da qual não temos qualquer impressão sensível.
  • 3. As relações de ideias são conhecimentos a priori. A verdade e a coerência dos argumentos que combinam relações de ideias não dependem do confronto com os factos ou a experiencia. As relações de ideias dão-nos verdades necessárias. “ o triangulo é um polígono de 3 ângulos”. É logicamente impossível a sua negação. As proposições que exprimem e combinam relações de ideias não nos dão qualquer conhecimento sobre o que se passa no mundo Os conhecimentos de facto são conhecimentos a posteriori. A verdade de proposições que se referem a factos depende de exame empírico. A verdade de proposições de facto é contingente. “ O sol vai nascer amanhã.” Esta proposição é contingentemente verdadeira. Não é logicamente possível que o sol não nasça amanhã apesar de ser muito pouco provável. As proposições que se referem a factos visam descobrir coisas sobre o mundo e dar-nos conhecimento sobre o que neste existe e acontece. Hume desfere um golpe profundo nas convicções racionalistas acerca do conhecimento e também na convicção dos cientistas do seu tempo acerca da existência objetiva de leis da natureza. Consideremos o seguinte enunciado: Um determinado aumento de temperatura A é a causa da dilatação de certos corpos B. O efeito sucede à causa. Por relação causal entendemos uma conexão ou ligação necessária entre acontecimentos. A é causa de B pois sempre que acontece A acontece necessariamente B. A produz necessariamente B. Porém, não temos experiencia desta conexão visto que quando dizemos que acontecendo A sempre acontecerá B estamos a falar de um facto futuro que ainda não aconteceu. Não podemos ter qualquer impressão sensível do que ainda não aconteceu. De tantas vezes observarmos que um corpo dilata apos um determinado aumento de temperatura, sempre que vemos acontecer um aumento de temperatura concluímos que, devido ao habito, certos corpos vão dilatar. A ideia de causalidade nada é mais que uma crença subjetiva, um produto do hábito. Criticando a fé cega no poder da razão quanto ao conhecimento do mundo e do que transcende a natureza, Hume argumenta que o conhecimento cientifico não é como o matemático na medida em que não é puramente demonstrativo mas procede da experiencia. Quanto à objetividade das leis naturais o filosofo escocês argumenta que qualquer generalização é incerta. Nada podemos saber acerca do futuro porque nada nos garante que ele seja semelhante ao passado. O nosso conhecimento não é certo e seguro. Mas uma coisa é o valor cientifico dos nossos conhecimentos e outra a sua utilidade pratica e vital. Os conhecimentos científicos são mais pretensão e desejo de segurança do que saber. Concluindo, o conhecimento entendido como relação de ideias é possível. As verdades logicas e matemáticas provam-no. Contudo o conhecimento de factos não tem justificação empírica nem racional. A razão não nos dá conhecimentos da realidade independentemente da experiencia pois todo o conhecimento que existe e acontece no mundo deriva da experiencia embora esta não nos possa garantir objetividade aos nossos conhecimentos. O nosso conhecimento não pode estender-se para lá da experiencia. O conhecimento de facto seria, em principio, justificado pela experiencia dadas as bases empiristas da filosofia de Hume. Contudo é em geral um conjunto de expetativas que mais tarde ou mais cedo podem ser desmentidas não podendo ser justificadas.