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                          Fast-fashion: o encurtamento
                          do ciclo de vida de
                          produtos de moda.

                          Carolina Carpinelli Caetano
                          Maria Silvia Barros de Held
                          Ana Julia Melo Almeida
                          Escola de Artes, Ciências e Humanidades.
                          Universidade de São Paulo




ABSTRACT
Reflecting on the perspective in contemporary fashion, this article presents a
discussion of the deployments related to the cycle of current consumption and
the fast-fashion, in this new design creation process and the role of fashion
in this scenario.

KEYWORDS
  Fashion Design, Consumption, Fast-Fashion.

FAST-FASHION: O ENCURTAMENTO DO CICLO DE VIDA DE PRODUTOS DE MODA
Costumes, posturas, comportamentos, roupas, acessórios, não estão ligados
somente à aparência, mas também aos significados, a uma mensagem
visual. A moda, por si só, retrata uma época, tem valor simbólico e incita
desejos. Há um grande valor estético, ou seja, sensorial e emocional rela-
cionado com a vestimenta, onde a busca pelo belo (datado) e pela expressão
contemporânea, trazem a tona a incessante corrida atrás das inovações esté-
ticas. Uma sociedade sem moda é uma sociedade que não possui qualquer
memória social.
O fenômeno da moda vai além da simples manifestação artística e particular
da personalidade, é um fenômeno social que reflete as mudanças no mundo.
É uma mudança periódica de estilo, está ligada à força de expressão, ou seja,
principais gostos e atitudes dentro da sociedade. Resultado de uma transição
cultural, a moda “absorve”, em questão de pouco tempo, padrões estéticos
típicos de uma época em determinada cultura.
Dentro do design do vestuário as funções estéticas do produto confundem-se
com as práticas e as simbólicas. A criação de moda está ligada com a estética
                                                                                 79
desejada pelo consumidor e, a partir de tais idéias, pode-se afirmar que a
     roupa age como parte de um sistema sócio-cultural.
     A moda como sistema não esteve presente em todas as civilizações, durante
     muitos anos houve o culto à tradição em relação à vestimenta, as socie-
     dades se caracterizavam por serem conservadoras, impedindo o apareci-
     mento da moda por seguirem os comportamentos estéticos idênticos a seus
     ancestrais.
     A quebra com o passado e a depreciação de tal ordem eram peças essen-
     ciais para que o homem obtivesse autonomia e também para se tornarem
     agentes da moda e segundo Lipovetsky (1989), somente no final da Idade
     Média é possível reconhecer essa depreciação. A moda viveu aproximada-
     mente cinco séculos em função da era aristocrática, onde o vestuário era
     caracterizado pela obediência dos costureiros às criações e vontades de seus
     clientes.
     A moda ganha corpo através da chamada Alta Costura que monopolizou a
     inovação em relação ao vestuário e lançou tendências ano a ano. Nascida
     no século XIX, a Alta Costura é a criação de modelos exclusivos, únicos, feitos
     em poucas quantidades e de maneira artesanal e minuciosa, vendidos por
     altos preços e para clientes especiais.
     Durante os anos 50 e 60 grandes mudanças culturais ocorreram e a moda
     tomou um novo rumo em direção à sua significação social. Segundo Baudot
     (2008) a confecção tem inicio na metade do século XIX. Somente após duas
     Guerras a moda vive uma transformação que a sociedade nunca havia visto:
     as massas passam a ter acesso às criações de moda. O prêt-à-porter alterou
     o que parecia imutável: um sistema regido pelas aparências da Alta Costura.
     Com tal evolução o sistema conquistou novos objetivos criativos, produtivos
     e de processos.
     Lipovetsky (1989) afirma que “depois do sistema monopolístico e aristocrático
     da Alta Costura, a moda chegou ao pluralismo democrático das grifes.” Tais
     progressos contribuíram para que fosse possível tal democratização, através
     da produção em série de artigos, a preços acessíveis e com design sempre
     atualizado.
     Na contemporaneidade, fala-se de uma moda rápida. As bruscas mudanças
     nas tendências, o encurtamento do ciclo de vida dos produtos, ou seja, a acele-
     ração no ciclo de consumo de produtos de moda resultou um novo panorama
     dentro do mercado. O processo de criação sofreu inúmeras mudanças e a
     gerência da cadeia de criatividade passa a ser mais dinâmica: surge assim
     o sistema fast-fashion.
     O fast-fashion é antes de tudo um novo fenômeno transformador na
     indústria da moda. Trata-se de um sistema que vem crescendo, principal-
     mente a partir dos anos 80, que é uma alavanca competitiva para a moda em
     massa e pode ser considerado também um modelo de negócios.
     Segundo Barnes e Lea-Greenwoog (2006), o fast-fashion trata-se de uma
     estratégia, onde reduzem-se os processos ligados às compras e prazos,
     fazendo com que criem-se novos produtos de moda, com a finalidade de
     satisfazer ao extremo as exigências dos consumidores. Já para Sull e Turconi
     (2008), o fast-fashion é utilizado como uma estratégia de varejo, que adapta
     os produtos de acordo com as últimas tendências. Ele seria uma resposta
     do mercado de moda às constantes mudanças, que ocorrem em questão de

80
algumas semanas, ao contrário dos seis meses adotado normalmente pelas
empresas de moda.
Para Christopher et al. (2004), o mercado da moda é altamente competitivo
e há uma constante necessidade de atualizar os produtos nas lojas, o que
caracteriza o conceito, que trouxe um novo modelo de estratégia ao setor,
possibilitando o aumento no número de trocas de produtos na loja.
O principal objetivo das empresas de fast-fashion é fazer a coleção chegar
aos pontos de venda no momento correto, que se dá quando uma deter-
minada tendência de consumo esteja se apresentando e ganhando força
no mercado. O fast-fashion veio como resposta do mercado e tem como
característica principal a moda “acessível” e a renovação rápida dos estoques
das lojas.
Grandes redes de lojas conhecidas mundialmente, como H&M, C&A, Renner,
Riachuelo, Zara, etc possuem uma possibilidade de difusão de seus produtos,
além de um alto volume de produção e logística de distribuição. A empresa
Zara é a principal referência desse segmento de moda. Segundo Minadeo
(2008) a Zara “com seu fast-fashion, chegou a mudar formas de atuação de
marcas de luxo como Gucci, Burberry e Louis Vuitton, que passaram a trazer
novos artigos com maior freqüência.”
Para Cietta (2010) o modelo fast-fashion não tem o objetivo de produzir uma
moda de baixo valor e pouca criatividade, mas trata-se de um novo modelo
quanto a apresentação das coleções, num ciclo contínuo e criativo. Diante do
novo panorama na moda, o processo de criação sofreu inúmeras mudanças.
A gerência da cadeia de criatividade passa a ser mais dinâmica, pois precisa
apresentar resultados cada vez mais rapidamente. Cietta (2010) afirma que
“Neste negócio, velocidade é apenas um dos vários elementos de sucesso,
porque, acima de tudo, o que determina o êxito é a gerência da cadeia de
criatividade”.
O autor afirma ainda que na realidade o sistema fast-fashion não parece
ser diferente do prêt-à-porter, pois ambos são caracterizados pela rapidez
criativa, produtiva e logística. Os dois sistemas fazem a moda chegar na hora
correta e no lugar correto, entretanto existem diferenças pontuais na estru-
turação do trabalho de desenvolvimento de coleção de cada uma delas.
Tomando como verdade a de que a moda propriamente dita teve início no
final da Idade Média, o fenômeno da moda pode ser dividido em três grandes
movimentos: Alta-Costura, o Prêt-à-Porter e o Fast-Fashion.
A tabela abaixo, feita com base nos relatos e discussões de Cietta (2010) e de
diversos outros estudiosos abordados no decorrer da explanação histórica,
com adaptações da autora, ilustra as diferenças pontuais entre os movi-
mentos sistemas da moda nas últimas décadas: Alta-Costura, o Prêt-a-
Porter e o Fast-Fashion.




                                                                                 81
Alta Costura                          Prêt-a-Porter                      Fast-Fashion

              Tipo de       Artesanal                             Industrial                         Industrial
              Produção

              Sazonali-     Foi justamente com o surgimento       Em relação à sazonalidade,         O fast-fashion acabou por
              dade          da Alta Costura que se deu            o prêt-à-porter fez o mesmo        “desregrar” a sazonalidade da
                            início, através do estilista Worth,   trabalho dos estilistas da Alta    moda, pois o desenvolvimento
                            o desenvolvimento de coleções         Costura: as coleções eram          de coleção está sendo feito
                            e desfiles sazonais. Inicialmente     criadas para 4 estações, de 6      constantemente, ou seja, os
                            eram lançadas coleções de verão       em 6 meses.                        lançamentos, apesar de serem
                            e de inverno e, após alguns anos,                                        divididos pelas estações, não
                            estilista iniciaram o trabalho de                                        são mais realizados somente
                            desenvolvimento de coleções                                              de 6 em 6 meses. Com as con-
                            em 4 estações: verão, inverno,                                           stantes mudanças de mercado
                            primavera e outono.                                                      e tendências, existem empresas
                                                                                                     que criam coleções de 15 em
                                                                                                     15 dias.

              Nº de         De acordo com a Chambre               Cerca de 100 peças por             As empresas de fast-fashion
              modelos por   Syndicale de la Haute Couture,        coleção. O número de peças         desenvolvem em média de 500
              coleção       há um número mínimo de peças          por modelo varia entre as mais     a 1000 peças por mês. A Zara,
                            desfiladas em cada temporada          diversas marcas.                   por exemplo, desenvolve 70
                            que são 25. Normalmente são                                              produtos novos por dia, um total
                            feitas duas ou três peças por                                            de aproximadamente 1600 peças
                            modelo.                                                                  por mês.

              Harmonia da   Há uma grande preocupação,            O maior foco é o de lançar         Uma fast-fashion tem preocupa-
              coleção       por parte dos estilistas, a harmo-    peças que serão vendidas           ção com a harmonia da coleção,
                            nia entre as peças da coleção.        facilmente , ou seja, best-        dando ênfase na imagem da
                                                                  sellers, de acordo com cada        marca.
                                                                  estação.

              Marcas        Não há diversificação de marcas       Não há diversificação de           Uma fast-fashion tem constante
                                                                  marcas                             presença de marcas menores
                                                                                                     que possuem públicos difer-
                                                                                                     entes, a fim de atender melhor
                                                                                                     todos os tipos de clientes.



              Lojas         Maisons e ateliês                     Butiques, lojas de rua, lojas de   Lojas de departamento
                                                                  departamento



Tabela Comparativa          Por conseqüência da diversidade de marcas e da grande preocupação com a
dos principais pontos de    comunicação e imagem da marca, o fast-fashion acaba sendo muito mais
relação entre os movi-      orientado para um público específico, diferente da moda pronta.
mentos da moda: Alta-       O novo processo de criação dentro do design de moda atual conta com pouco
Costura, o Prêt-a-Porter    tempo, e o consumidor acaba norteando a criação através de suas respostas,
e o Fast-Fashion            tanto em relação às compras como em relação às tendências. Ou seja, o
                            consumidor ganhou um curioso e importante papel dentro do desenvolvi-
                            mento da coleção.
                            O fast-fashion acaba criando um vínculo da marca com o consumidor, o
                            qual almeja sempre por novidades (“inovações estéticas adequadas”) e visita
                            a loja continuamente, já que sempre há um lançamento ou novidade (busca
                            pelo design atualizado). Em termos de mercado, é uma estratégia interes-
                            sante e eficaz nos dias de hoje. Em relação ao processo de criação da moda,
                            há quem diga que o valor da criação está sumindo, pela reprodutividade
                            incessante, porém quem legitima a moda é, essencialmente, a sociedade.

                            REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
                              BARNES, L; GREENWOOD, Lea. Fast fashion. Journal of Fashion Marketing and
                              Management. Special edition. 2006.
                              BAUDOT, François. A moda do século. Edição: 3. Ed. Cosac Naify, 2008.



                  82
CHRISTOPHER, M; LOWSON, R. e PECK, H. Creating agile supply chains in the
fashion industry. International Journal of Retail & Distribution Management,
Vol. 32, 2004.
CIETTA, Enrico. A revolução do fast-fashion estratégias e modelos organizativos
para competir nas indústrias híbridas. São Paulo: Estação das Letras, 2010.
LIPOVETSKY, G. O império do efémero: a moda e seu destino nas sociedades
modernas. São Paulo: Ed.Companhia das Letras, 1989.
MINADEO, Roberto. Adoção do Just-in-time no Varejo: O Caso Zara. Rio de Janei-
ro, 2008. Disponível em < www.abepro.org.br > Acesso em 13 de março de 2011
SULL, D; TURCONI, S. Fast fashion lessons. Londres: Business Strategy Review.
Londres, 2008. Disponível em <http://executiveeducation.london.edu/insight/
downloads> Acesso em 22 de abril de 2011
SVENDSEN, Lars. Moda: Uma filosofia. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2010.




                                                                                  83
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Fast-fashion: o encurtamento do ciclo de vida

  • 1. ID32 Fast-fashion: o encurtamento do ciclo de vida de produtos de moda. Carolina Carpinelli Caetano Maria Silvia Barros de Held Ana Julia Melo Almeida Escola de Artes, Ciências e Humanidades. Universidade de São Paulo ABSTRACT Reflecting on the perspective in contemporary fashion, this article presents a discussion of the deployments related to the cycle of current consumption and the fast-fashion, in this new design creation process and the role of fashion in this scenario. KEYWORDS Fashion Design, Consumption, Fast-Fashion. FAST-FASHION: O ENCURTAMENTO DO CICLO DE VIDA DE PRODUTOS DE MODA Costumes, posturas, comportamentos, roupas, acessórios, não estão ligados somente à aparência, mas também aos significados, a uma mensagem visual. A moda, por si só, retrata uma época, tem valor simbólico e incita desejos. Há um grande valor estético, ou seja, sensorial e emocional rela- cionado com a vestimenta, onde a busca pelo belo (datado) e pela expressão contemporânea, trazem a tona a incessante corrida atrás das inovações esté- ticas. Uma sociedade sem moda é uma sociedade que não possui qualquer memória social. O fenômeno da moda vai além da simples manifestação artística e particular da personalidade, é um fenômeno social que reflete as mudanças no mundo. É uma mudança periódica de estilo, está ligada à força de expressão, ou seja, principais gostos e atitudes dentro da sociedade. Resultado de uma transição cultural, a moda “absorve”, em questão de pouco tempo, padrões estéticos típicos de uma época em determinada cultura. Dentro do design do vestuário as funções estéticas do produto confundem-se com as práticas e as simbólicas. A criação de moda está ligada com a estética 79
  • 2. desejada pelo consumidor e, a partir de tais idéias, pode-se afirmar que a roupa age como parte de um sistema sócio-cultural. A moda como sistema não esteve presente em todas as civilizações, durante muitos anos houve o culto à tradição em relação à vestimenta, as socie- dades se caracterizavam por serem conservadoras, impedindo o apareci- mento da moda por seguirem os comportamentos estéticos idênticos a seus ancestrais. A quebra com o passado e a depreciação de tal ordem eram peças essen- ciais para que o homem obtivesse autonomia e também para se tornarem agentes da moda e segundo Lipovetsky (1989), somente no final da Idade Média é possível reconhecer essa depreciação. A moda viveu aproximada- mente cinco séculos em função da era aristocrática, onde o vestuário era caracterizado pela obediência dos costureiros às criações e vontades de seus clientes. A moda ganha corpo através da chamada Alta Costura que monopolizou a inovação em relação ao vestuário e lançou tendências ano a ano. Nascida no século XIX, a Alta Costura é a criação de modelos exclusivos, únicos, feitos em poucas quantidades e de maneira artesanal e minuciosa, vendidos por altos preços e para clientes especiais. Durante os anos 50 e 60 grandes mudanças culturais ocorreram e a moda tomou um novo rumo em direção à sua significação social. Segundo Baudot (2008) a confecção tem inicio na metade do século XIX. Somente após duas Guerras a moda vive uma transformação que a sociedade nunca havia visto: as massas passam a ter acesso às criações de moda. O prêt-à-porter alterou o que parecia imutável: um sistema regido pelas aparências da Alta Costura. Com tal evolução o sistema conquistou novos objetivos criativos, produtivos e de processos. Lipovetsky (1989) afirma que “depois do sistema monopolístico e aristocrático da Alta Costura, a moda chegou ao pluralismo democrático das grifes.” Tais progressos contribuíram para que fosse possível tal democratização, através da produção em série de artigos, a preços acessíveis e com design sempre atualizado. Na contemporaneidade, fala-se de uma moda rápida. As bruscas mudanças nas tendências, o encurtamento do ciclo de vida dos produtos, ou seja, a acele- ração no ciclo de consumo de produtos de moda resultou um novo panorama dentro do mercado. O processo de criação sofreu inúmeras mudanças e a gerência da cadeia de criatividade passa a ser mais dinâmica: surge assim o sistema fast-fashion. O fast-fashion é antes de tudo um novo fenômeno transformador na indústria da moda. Trata-se de um sistema que vem crescendo, principal- mente a partir dos anos 80, que é uma alavanca competitiva para a moda em massa e pode ser considerado também um modelo de negócios. Segundo Barnes e Lea-Greenwoog (2006), o fast-fashion trata-se de uma estratégia, onde reduzem-se os processos ligados às compras e prazos, fazendo com que criem-se novos produtos de moda, com a finalidade de satisfazer ao extremo as exigências dos consumidores. Já para Sull e Turconi (2008), o fast-fashion é utilizado como uma estratégia de varejo, que adapta os produtos de acordo com as últimas tendências. Ele seria uma resposta do mercado de moda às constantes mudanças, que ocorrem em questão de 80
  • 3. algumas semanas, ao contrário dos seis meses adotado normalmente pelas empresas de moda. Para Christopher et al. (2004), o mercado da moda é altamente competitivo e há uma constante necessidade de atualizar os produtos nas lojas, o que caracteriza o conceito, que trouxe um novo modelo de estratégia ao setor, possibilitando o aumento no número de trocas de produtos na loja. O principal objetivo das empresas de fast-fashion é fazer a coleção chegar aos pontos de venda no momento correto, que se dá quando uma deter- minada tendência de consumo esteja se apresentando e ganhando força no mercado. O fast-fashion veio como resposta do mercado e tem como característica principal a moda “acessível” e a renovação rápida dos estoques das lojas. Grandes redes de lojas conhecidas mundialmente, como H&M, C&A, Renner, Riachuelo, Zara, etc possuem uma possibilidade de difusão de seus produtos, além de um alto volume de produção e logística de distribuição. A empresa Zara é a principal referência desse segmento de moda. Segundo Minadeo (2008) a Zara “com seu fast-fashion, chegou a mudar formas de atuação de marcas de luxo como Gucci, Burberry e Louis Vuitton, que passaram a trazer novos artigos com maior freqüência.” Para Cietta (2010) o modelo fast-fashion não tem o objetivo de produzir uma moda de baixo valor e pouca criatividade, mas trata-se de um novo modelo quanto a apresentação das coleções, num ciclo contínuo e criativo. Diante do novo panorama na moda, o processo de criação sofreu inúmeras mudanças. A gerência da cadeia de criatividade passa a ser mais dinâmica, pois precisa apresentar resultados cada vez mais rapidamente. Cietta (2010) afirma que “Neste negócio, velocidade é apenas um dos vários elementos de sucesso, porque, acima de tudo, o que determina o êxito é a gerência da cadeia de criatividade”. O autor afirma ainda que na realidade o sistema fast-fashion não parece ser diferente do prêt-à-porter, pois ambos são caracterizados pela rapidez criativa, produtiva e logística. Os dois sistemas fazem a moda chegar na hora correta e no lugar correto, entretanto existem diferenças pontuais na estru- turação do trabalho de desenvolvimento de coleção de cada uma delas. Tomando como verdade a de que a moda propriamente dita teve início no final da Idade Média, o fenômeno da moda pode ser dividido em três grandes movimentos: Alta-Costura, o Prêt-à-Porter e o Fast-Fashion. A tabela abaixo, feita com base nos relatos e discussões de Cietta (2010) e de diversos outros estudiosos abordados no decorrer da explanação histórica, com adaptações da autora, ilustra as diferenças pontuais entre os movi- mentos sistemas da moda nas últimas décadas: Alta-Costura, o Prêt-a- Porter e o Fast-Fashion. 81
  • 4. Alta Costura Prêt-a-Porter Fast-Fashion Tipo de Artesanal Industrial Industrial Produção Sazonali- Foi justamente com o surgimento Em relação à sazonalidade, O fast-fashion acabou por dade da Alta Costura que se deu o prêt-à-porter fez o mesmo “desregrar” a sazonalidade da início, através do estilista Worth, trabalho dos estilistas da Alta moda, pois o desenvolvimento o desenvolvimento de coleções Costura: as coleções eram de coleção está sendo feito e desfiles sazonais. Inicialmente criadas para 4 estações, de 6 constantemente, ou seja, os eram lançadas coleções de verão em 6 meses. lançamentos, apesar de serem e de inverno e, após alguns anos, divididos pelas estações, não estilista iniciaram o trabalho de são mais realizados somente desenvolvimento de coleções de 6 em 6 meses. Com as con- em 4 estações: verão, inverno, stantes mudanças de mercado primavera e outono. e tendências, existem empresas que criam coleções de 15 em 15 dias. Nº de De acordo com a Chambre Cerca de 100 peças por As empresas de fast-fashion modelos por Syndicale de la Haute Couture, coleção. O número de peças desenvolvem em média de 500 coleção há um número mínimo de peças por modelo varia entre as mais a 1000 peças por mês. A Zara, desfiladas em cada temporada diversas marcas. por exemplo, desenvolve 70 que são 25. Normalmente são produtos novos por dia, um total feitas duas ou três peças por de aproximadamente 1600 peças modelo. por mês. Harmonia da Há uma grande preocupação, O maior foco é o de lançar Uma fast-fashion tem preocupa- coleção por parte dos estilistas, a harmo- peças que serão vendidas ção com a harmonia da coleção, nia entre as peças da coleção. facilmente , ou seja, best- dando ênfase na imagem da sellers, de acordo com cada marca. estação. Marcas Não há diversificação de marcas Não há diversificação de Uma fast-fashion tem constante marcas presença de marcas menores que possuem públicos difer- entes, a fim de atender melhor todos os tipos de clientes. Lojas Maisons e ateliês Butiques, lojas de rua, lojas de Lojas de departamento departamento Tabela Comparativa Por conseqüência da diversidade de marcas e da grande preocupação com a dos principais pontos de comunicação e imagem da marca, o fast-fashion acaba sendo muito mais relação entre os movi- orientado para um público específico, diferente da moda pronta. mentos da moda: Alta- O novo processo de criação dentro do design de moda atual conta com pouco Costura, o Prêt-a-Porter tempo, e o consumidor acaba norteando a criação através de suas respostas, e o Fast-Fashion tanto em relação às compras como em relação às tendências. Ou seja, o consumidor ganhou um curioso e importante papel dentro do desenvolvi- mento da coleção. O fast-fashion acaba criando um vínculo da marca com o consumidor, o qual almeja sempre por novidades (“inovações estéticas adequadas”) e visita a loja continuamente, já que sempre há um lançamento ou novidade (busca pelo design atualizado). Em termos de mercado, é uma estratégia interes- sante e eficaz nos dias de hoje. Em relação ao processo de criação da moda, há quem diga que o valor da criação está sumindo, pela reprodutividade incessante, porém quem legitima a moda é, essencialmente, a sociedade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARNES, L; GREENWOOD, Lea. Fast fashion. Journal of Fashion Marketing and Management. Special edition. 2006. BAUDOT, François. A moda do século. Edição: 3. Ed. Cosac Naify, 2008. 82
  • 5. CHRISTOPHER, M; LOWSON, R. e PECK, H. Creating agile supply chains in the fashion industry. International Journal of Retail & Distribution Management, Vol. 32, 2004. CIETTA, Enrico. A revolução do fast-fashion estratégias e modelos organizativos para competir nas indústrias híbridas. São Paulo: Estação das Letras, 2010. LIPOVETSKY, G. O império do efémero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Ed.Companhia das Letras, 1989. MINADEO, Roberto. Adoção do Just-in-time no Varejo: O Caso Zara. Rio de Janei- ro, 2008. Disponível em < www.abepro.org.br > Acesso em 13 de março de 2011 SULL, D; TURCONI, S. Fast fashion lessons. Londres: Business Strategy Review. Londres, 2008. Disponível em <http://executiveeducation.london.edu/insight/ downloads> Acesso em 22 de abril de 2011 SVENDSEN, Lars. Moda: Uma filosofia. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2010. 83
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