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artciencia.com (ISSN 1646-3463)                  Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006




                      CARTEL FANTASMA
                                  Alexandre Figueiredo




                                   Novembro de 1995




                                                                                          1
Cartel Fantasma                                                             Alexandre Figueiredo




                                        Capítulo 1



         - Jorge?!...
         - Sim, sou eu... Cheguei em má altura, foi? - começou o jovem entrando na espaçosa
sala em que a sua prima Ana e um rapaz que ele desconhecia, estavam sentados, vendo um
filme.
         - Não, claro que não - respondeu a rapariga um pouco atrapalhada - chega aqui por
favor - pediu - quero apresentar-te o meu namorado, o Rui Pedro.
         - Ela fala muito de ti - disse o outro, estendendo-lhe a mão direita, enquanto que
mantinha a esquerda sobre os ombros de Ana, acariciando-lhe suavemente o cabelo
castanho ondulado.
         - Bom, foi um prazer conhecer-te, ... - declarou Jorge encaminhando-se para a saída
da sala de estar - mas fiquem à vontade que eu vou só ao quarto buscar umas coisas e saio
já...
         - Vais-te já embora? - inquiriu a prima, com um brilho nos olhos castanhos que não
enganava ninguém; ela estava ansiosa para se livrar do recém-chegado, para poder ficar de
novo a sós com o companheiro.
         - Sim, prometi à Isabel que chegava antes das nove, e já são sete e cinco! Estive com
a Rita, a Joana e a Sofia no salão de jogos e atrasei-me um pouco - concluiu, abandonando
aquela divisão e dirigindo-se ao quarto que ocupava e que ficava ao fundo do enorme
corredor.
         Alguns minutos mais tarde, voltou a entrar na sala de estar, no intuito de se despedir
da prima.
         - Bom fim-de-semana! - exclamou, beijando Ana na face, e apertando a mão a Rui
Pedro - Portem-se bem! - recomendou, sorrindo maliciosamente pegando nos dois sacos de
viagem que deixara à entrada da sala, e encaminhando-se para a porta de entrada, enquanto
que a rapariga e o seu namorado se voltavam a sentar muito juntinhos no confortável sofá.
         Por fim, saiu, fechando a porta atrás de si. Depois de cruzar o portão lançou um rápido
olhar sobre a rua deserta, iluminada apenas pelos escassos candeeiros de iluminação
pública. Soprava uma ligeira brisa que lhe levantava os cabelos louros. Caminhou
tranquilamente alguns metros no passeio, e atravessou a estrada ainda molhada em
consequência da chuva que caíra na manhã daquele dia de Dezembro, dirigindo-se ao seu
automóvel que estava estacionado do outro lado da rua. Abriu em primeiro lugar o porta-
bagagens , onde colocou os dois sacos de viagem que transportava, entrando de seguida no

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Rover preto. Rodou a chave na ignição e arrancou calmamente, logo que o motor começou a
funcionar. Após ter percorrido alguns metros, tomou a estrada que conduzia a Coimbra...
       Jorge, era estudante do primeiro ano do curso de Direito da Universidade de Coimbra,
e partilhava com a sua prima Ana uma habitação que pertencia aos pais da rapariga. Ele,
contava com vinte anos de idade, tinha cabelos louros, e olhos azuis. Era bastante alto, e
fisicamente muito forte, e para além disso praticava também karaté, o que fazia qualquer um
pensar duas vezes antes de o desafiar para alguma luta...
       Naquele momento, o jovem cruzava uma das principais avenidas da cidade de
Coimbra, e que dava acesso à auto-estrada. Contudo, aguardava-o uma surpresa
desagradável...
       - Grande merda! Só faltava mais isto! - desabafou, muito pouco satisfeito, quando
alguns metros mais adiante foi forçado a parar atrás de uma interminável fila de trânsito.
       Jorge aguardou serenamente até que os automóveis que estavam parados à sua
frente começassem a andar. Contudo, estes permaneceram imóveis, e ele resolveu ligar o
auto-rádio no intuito de se distrair. Alguns minutos mais tarde, porém, a música foi
interrompida pela voz de um locutor que anunciou:
       “ - Em Lisboa e Porto , o trânsito processa-se com normalidade e não existam filas... A
situação mais complicada regista-se em Coimbra nos acessos ao IP1 e à auto-estrada, onde
o embate entre dois pesados provocou um engarrafamento enorme, impedindo assim a
fluidez do tráfego... Também em... “
       Ele, colocou uma cassete no auto-rádio e ao som da música que esta continha
esperou pacientemente que a circulação fosse restabelecida, o que aconteceu cerca de
quarenta e cinco minutos mais tarde, quando por fim o veículo que se encontrava imobilizado
à sua frente retomou a marcha aumentando progressivamente de velocidade. Porém,
somente alguns instantes mais tarde, o jovem estudante conseguiu entrar na via de acesso à
auto-estrada, constatando que de facto haviam colidido dois veículos pesados, e que apesar
de terem sido já retirados para a berma continuavam a obstruir uma boa parte da estrada,
dificultando a passagem ao intenso trânsito.
       “ - Agora é sempre a andar! “ - pensou aliviado, quando parou na portagem para retirar
o titulo que deveria apresentar à saída, e olhando para os ponteiros do seu relógio de pulso,
acrescentou ainda - porra, já são oito e dez! A Isabel não vai ficar nada satisfeita!
       Jorge, efectuou ainda uma curta paragem na Área de Serviço de Pombal, de modo a
encher o depósito de combustível do seu automóvel, retomando a viagem não muito tempo
depois...
       Alguns instantes após ter saído da auto-estrada, já no acesso a Santarém, o telefone
que estava instalado no veículo tocou, e ele apressou-se a responder:



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Cartel Fantasma                                                            Alexandre Figueiredo


        - Ah, és tu, Isabel!? - inquiriu quando identificou a voz da personagem que do outro
lado da linha lhe falava - Não,... não me demoro muito... acabei agora mesmo de sair da
portagem - explicou, fazendo uma breve pausa para escutar aquilo que a rapariga lhe dizia -
Pronto, está descansada, eu estou quase aí,... depois falamos, o.k.? - concluiu, voltando a
pousar o auscultador do aparelho, e centrando de novo a sua a tenção na condução.
        Cerca de quinze minutos mais tarde, já no interior da cidade de Santarém, entrou
numa rua deserta, olhando atentamente para a sua frente. Lá ao fundo, erguia-se o edifício
onde habitava com a sua irmã. O automóvel contornou o prédio de apartamentos, e nas
traseiras do mesmo, dirigiu-se para uma entrada que dava acesso à cave, que servia
simultaneamente de garagem e arrecadação.
        Jorge, estacionou o Rover preto que conduzia, ao lado do BMW amarelo que também
lhe pertencia, e depois de ter aberto o porta-bagagens, retirando do seu interior os dois sacos
de viagem que trouxera de Coimbra, deu alguns passos para a direita, encaminhando-se para
o elevador...
        No momento em que pousou a bagagem no chão, à entrada do seu apartamento para
abrir a porta, deu uma rápida olhadela para o seu relógio de pulso. Faltavam então cinco
minutos para as dez horas da noite. Rodou a chave na fechadura e entrou, fechando a porta
atrás de si.
        - És tu, Jorge? - perguntou uma voz do interior da habitação.
        - Sim, Isabel, sou eu... - respondeu ele, carregando os sacos até à entrada de um
espaçoso e comprido corredor - Onde estás - inquiriu ainda.
        - Estou na cozinha - gritou Isabel, enquanto o irmão se dirigia para aquela divisão -
Nunca mais chegavas e eu já estava a ficar preocupada. Pensei que te tivesse acontecido
alguma coisa. Porque é que te atrasaste tanto?... - questionou a rapariga colocando dois
pratos sobre a mesa.
        - O trânsito em Coimbra estava infernal - justificou-se o jovem, aproximando-se da
irmã puxando-lhe os longos cabelos dourados e apanhando-os, fazendo um rabo-de-cavalo,
enquanto a beijava suavemente na face - Como é que te correu o dia?
        - Bem,... - respondeu ela, beijando-o igualmente no rosto, e olhando-o fixamente
através dos seus lindos e intensamente brilhantes olhos azuis - Então e a Ana, como é que
está?
        - Ela está óptima! - principiou ele rindo-se - Na verdade deve estar na maior. Quando
eu me vim embora ficou sozinha com o namorado, por isso, deve estar radiante. Ainda por
cima eu não estou lá para atrapalhar... - concluiu com um sorriso malandro.
        - Já entendi,... não precisas de dizer mais nada! - disse, sorrindo, o que deu origem a
que no seu rosto angelical aparecesse uma covinha muito original - Vocês homens, são todos



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iguais! Bom, senta-te que o jantar está pronto - anunciou ela, pegando num tabuleiro que
pousou sobre a mesa, sentando-se em seguida.
       - Bacalhau com Natas! - exclamou Jorge, satisfeitíssimo - És um amor!...
       Ambos saborearam tranquilamente aquela esplêndida refeição, enquanto relatavam
um ao outro os acontecimentos mais significativos da semana que estava prestes a terminar.
Após o final do jantar, os dois irmãos lavaram e secaram a louça em conjunto, sentando-se
depois ambos no confortável sofá da sala de estar, perto da lareira onde ardiam alguns
pedaços de lenha, que aqueciam o ambiente, tornando-o bastante mais acolhedor. Ainda
ligaram o televisor porém, como nenhum dos programas lhes agradou, Isabel dirigiu-se ao
fundo da sala e ligou a excelente aparelhagem de som, que se encontrava arrumada entre os
dois pequenos sofás individuais. Ambos permaneceram naquela divisão ouvindo música, até
que no relógio de parede baterem as zero horas...
       - Vou-me deitar! - anunciou ele, e passando com a sua mão sobre os longos cabelos
louros da irmã - Também vens? - inquiriu por fim, pondo-se de pé.
       - Não,... acho que ainda vou ficar mais um pouco - respondeu a rapariga com uma voz
doce e meiga - não tenho sono, por isso, talvez vá ler um pouco...
       - Então não fiques levantada até muito tarde - recomendou o rapaz aproximando-se
dela - Até amanhã! Dorme bem! - acrescentou, beijando-a com ternura na testa, ao que ela
respondeu com um boa-noite, envolvendo com os seus braços frágeis e delicados os ombros
fortes e musculados do irmão, num gesto de apreço e amizade.
       Assim Jorge, abandonou aquele espaço, e encaminhou-se para o quarto de dormir
que habitualmente ocupava, enquanto que Isabel se dirigiu até à magnífica estante da sala
de onde retirou um livro, que instantes mais tarde folheava serenamente. Contudo, não muito
tempo depois os seus olhos começaram progressivamente mais pesados, e as letras
impressas no livro desfocavam... O cansaço vencera, e a jovem adormecera profundamente,
confortavelmente enroscada no acolhedor sofá de pele...
       - Isabel!... - chamou Jorge baixinho, quase sussurrando ao ouvido da irmã, e
abanando suavemente o seu corpo adormecido - Isabel!... Que fazes tu aqui? - questionou,
quando por fim ela abriu os olhos.
       - Isso pergunto eu, - respondeu a rapariga, afastando os cabelos que entretanto lhe
tinham caído sobre o rosto, e bocejando longamente - deixa-me dormir!- pediu ainda, virando-
se para o outro lado.
       - Então,... vá lá, vai-te deitar - continuou ele pacientemente.
       - Mas,... mas,... onde estou eu? - interrogou-se, compreendendo finalmente que não
estava deitada na sua cama, mas sim no sofá da sala de estar - Devo ter adormecido! -
concluiu, pegando no livro que havia caído no chão.



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       - Eu vim beber água, e fiquei admirado quando ainda vi luz aqui - esclareceu o rapaz -
Depois, quando te vi, percebi logo que te tinhas deixado dormir... Bom, vamos lá deitar-nos...
       - Desculpa lá,... não foi com intenção...
       Jorge conduziu a irmã até ao quarto dela, e em seguida regressou ao seu, deitando-se
sem mais delongas. Cinco minutos, foi o tempo que Isabel demorou até se encontrar enrolada
no meio dos lençóis e cobertores, adormecendo quase de imediato. Em breve aquele
magnífico apartamento voltou a ficar mergulhado num silêncio quase absoluto...
       A manhã de Sábado surgiu bastante luminosa, com o sol a brilhar intensamente no
azul do céu, aqui e ali salpicado por uma ou outra nuvem mais persistente. a temperatura
estava amena, e na rua uma fresca e agradável brisa. Passavam apenas alguns minutos das
dez e meia da manhã quando Jorge acordou, encaminhando-se em seguida para o quarto de
banho. Tomou um prolongado duche, surgindo algum tempo depois com um toalhão enrolado
à volta da cintura. Vestiu-se, e dirigiu--se para o quarto da irmã. Deu três pancadinhas suaves
na porta e, não obtendo qualquer resposta rodou a maçaneta, entrando silenciosamente.
Aproximou-se da cama onde Isabel descansava tranquilamente e ajoelhou-se no chão,
observando fascinado a beleza angelical do rosto adormecido da irmã. Alguns dos compridos
louros da rapariga pendiam-lhe sobre a face, brilhando intensamente devido à incidência da
luz solar que irrompia pelas frinchas da janela fechada, iluminando palidamente o quarto
ainda mergulhado na escuridão. Jorge não resistiu e passou suavemente a sua mão, primeiro
pelos cabelos, e depois pelo rosto sereno e tranquilo da jovem, o que deu origem a ela
despertasse quebrando aquele momento de magia.
       - Olá, bom dia! - saudou a rapariga na sua voz doce e ternurenta.
       - Bom dia, dormiste bem? - indagou ele, beijando-a suavemente na face.
       - Sim, foi óptimo. Há já muito tempo que não acordava e me sentia assim,...,...tão
bem! - respondeu, bocejando longamente e beijando o irmão no rosto.
       - Então arranja-te, e vem ter comigo à sala, o.k.? - pediu ele, com um ar muito
misterioso, e abandonando o quarto a fim de a deixar à vontade...
       Cerca de trinta minutos mais tarde após Jorge se ter confortavelmente sentado no
sofá da sala, surgiu por fim Isabel, usando um elegante vestido preto.
       - Estás linda! - observou o rapaz, observando-a atentamente - Mas falta qualquer
coisa,... - acrescentou, abrindo uma pequena caixinha de onde retirou um reluzente fio de
ouro - ... talvez um fio não ficasse mal no teu pescoço.
       - É tão lindo! - exclamou ela surpreendida - Lembraste-te? - perguntou, olhando para
ele fixamente, através dos seus magníficos olhos azuis.
       - Feliz aniversário! - começou o jovem dando alguns passos na da rapariga,
mostrando-lhe o seu presente - Segura os cabelos, por favor... - pediu, colocando-lhe o fio à



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volta do pescoço - pronto, já está, podes largar os cabelos - anunciou ele, enquanto ela se
aproximava do espelho que estava pendurado numa das paredes.
       - Obrigado!... És um amor!... Eu,... não tenho palavras! Desde que te conheci tens sido
tão bom para mim, e eu nunca te conseguirei mostrar o quanto gosto de ti. Tu és
maravilhoso!... Obrigado... - acrescentou, não conseguindo com a emoção evitar uma lágrima
mais teimosa que lhe surgira ao canto do olho.
       - Bom, é quase meio-dia, por isso é melhor irmos... - anunciou ele, olhando para os
ponteiros do seu relógio de pulso.
       - Onde vamos? - perguntou Isabel, ardendo em curiosidade, e tentando descobrir
através da expressão de Jorge descobrir qual seria a sua ideia.
       - Já vais ver! - respondeu ele, mantendo o mesmo ar enigmático e sorridente...
       O jovem conduziu a irmã até à porta e saíram ambos, entrando em seguida para
elevador, que os levou até à cave do majestoso edifício. Aí, dirigiram-se ambos para o BMW
M3 amarelo que estava estacionado ao lado do Rover, e entraram. Jorge, rodou a chave na
ignição, e aguardou que o ruído do motor em funcionamento se fizesse ouvir. Depois,
engrenou a primeira velocidade, e abandonou calmamente a garagem subterrânea daquele
prédio de apartamentos...
       - Onde é que queres almoçar? - inquiriu o rapaz, quando cerca de vinte minutos após
terem saído de casa se encontravam numa das mais movimentadas avenidas de Almeirim.
       - Ali! - respondeu de pronto a jovem, apontando com o indicador direito para uma
construção de dois pisos que se situava uns quantos metros mais à frente, na esquina do
cruzamento entre duas ruas. caminharam alguns metros, e entraram ambos no restaurante.
Já no interior do estabelecimento, escolheram uma mesa próxima da janela, e sentaram-se
aguardando que um funcionário lhes trouxesse a ementa.
       Cerca de meia hora mais tarde, o empregado deixou em cima da mesa duas travessa
com aquilo que tinham pedido; Carne de Porco à Alentejana, acompanhada de batatas fritas
e amêijoas que ambos saborearam, enquanto conversavam animadamente. Terminaram a
refeição bebendo um cremoso café, tendo-se ainda deliciado com uma esplêndida
sobremesa, que comeram entre o prato principal e o café. Em seguida, Jorge pagou a
despesa, e os dois irmãos abandonaram aquele restaurante, encaminhando-se para o BMW
amarelo que ficara estacionado não muito longe daquele local.
       - Onde é que vamos? - perguntou Isabel, quando concluiu que o irmão não tomara a
estrada que conduzia a Santarém.
       - Eu espero não me enganar... - principiou ele, olhando receoso para as muitas
nuvens que entretanto haviam coberto o céu azul - ... a ideia, seria irmos ver o pôr-do-sol à
Nazaré, e jantarmos lá - esclareceu por fim, virando-se para a irmã, que sorria radiante - mas



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Cartel Fantasma                                                            Alexandre Figueiredo


se as coisas continuarem como estão, palpita-me que o que vamos ver é uma bela chuvada.
       - Então queres dizer que não vamos? - questionou Isabel, olhando para ele com uma
expressão triste nos seus brilhantes olhos azuis.
       - Não, claro que vamos! - esclareceu ele peremptoriamente passando a palma da mão
com ternura sobre os ombros de Isabel - É evidente que vamos, quanto mais não seja para
vermos as ondas do mar, que nesta altura do ano são espectaculares - acrescentou por fim,
voltando a colocar a sua mão direita no volante.
       ...
       - Lindo, não é? - perguntou Jorge, virando-se para a irmã que continuava sentada a
seu lado, observando as monstruosas muralhas água que se desfaziam em enormes
manchas de espuma de encontro aos rochedos que ficavam dentro do mar, não muito longe
do extenso areal, que do local onde se encontravam facilmente podiam ver.
       - Se pelo menos parasse de chover, poderíamos sair e ver melhor - lamentou-se
Isabel com uma expressão cabisbaixa.
       - Tem calma, - tranquilizou-a ele - temos muito tempo, ainda é tão cedo, são... -
continuou o jovem fazendo uma breve pausa para consultar o seu relógio de pulso - ... seis
menos um quarto, por isso.
       - Mas depois começa a anoitecer, e aí é que não vemos mesmo nada - replicou ela.
       Porém, alguns minutos mais tarde, a chuva parou de cair, e ambos puderam então
sair do automóvel, aproximando-se uma falésia, embora muito cuidadosamente, pois, o
pavimento estava muito escorregadio devido à chuva que caíra momentos antes, e por isso o
risco de quedas era bastante grande.
       - Vê! - exclamou Jorge de súbito, apontando para o horizonte - ali,... - acrescentou,
indicando com o dedo à irmã aquilo que vira - Afinal parece que sempre vamos ver o pôr-do-
sol! - concluiu sorridente, quando lá ao longe se começavam a vislumbrar alguns raios de sol,
que tentavam irromper pelas espessas e numerosas nuvens, que continuavam a cobrir
ameaçadoramente o céu, prometendo chuva.
       - É maravilhoso! - observou a rapariga, radiante - Repara,... nos sítios onde os raios
brilham parece que existe uma espécie de nevoeiro amarelo,... é lindo...
       Os dois jovens, ficaram ainda por mais algum tempo a observar maravilhados aquele
cenário deslumbrantemente belo, tendo ainda oportunidade de assistir ao pôr-do-sol. Porém,
depois do último raio de sol ter desaparecido no horizonte, não demorou muito tempo até que
silenciosamente a noite chegasse, envolvendo tudo ao redor numa penumbra cada vez mais
escura, sendo acompanhada por uma acentuada descida de temperatura...
       - Tenho frio! - anunciou Isabel, abotoando mais alguns botões no casaco que trazia
vestido.



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       - Tens razão, - concordou o irmão - arrefeceu bastante... - prosseguiu, deitando um
último olhar para o mar, antes de conduzir a rapariga até ao automóvel em que haviam
chegado até ali - Bom, vamos procurar um restaurante para jantarmos - concluiu por fim,
usando o controle remoto para destrancar as portas do veículo, vestindo também ele o
casaco que trouxera consigo, entrando no interior do BMW coupé logo em seguida.
       Dirigiram-se para o centro daquela pitoresca vila do litoral , e depois de deixarem o
carro parado num parque de estacionamento, percorreram tranquilamente a pé algumas
centenas de metros na avenida marginal. Finalmente, encontraram um restaurante com o
qual simpatizaram de imediato, por causa da sua fachada tipicamente tradicional, e
resolveram entrar. Sentaram-se numa mesa perto de uma das janelas, e optaram por
experimentar um prato de Caldeirada, que algum tempo depois ambos saboreavam com
satisfação, enquanto conversavam animadamente. Como sobremesa, escolheram um
delicioso Doce de Amêndoa, e terminaram aquela refeição bebendo o habitual café,
abandonando o sossegado restaurante logo após Jorge ter liquidado a despesa. Em ritmo de
passeio turístico percorreram calmamente em sentido contrário a avenida marginal, que
naquele momento se encontrava quase deserta, sendo apenas iluminadas pela lua, e pelos
candeeiros de iluminação pública. De súbito, o ruído da rebentação das ondas na praia foi
abafado por um outro; começara a chover naquele preciso instante, intensificando-se muito
rapidamente.
       - Corre! - pediu Jorge a Isabel, que acelerou o passo, colocando-se ao seu lado - Vá
lá, mais depressa, senão vamos ficar totalmente encharcados - insistiu o jovem.
       - Encharcados já nós estamos! - replicou a rapariga, sorrindo satisfeita, começando a
correr, enquanto passava as mãos pelos longos cabelos louros que estavam já bastante
molhados - É maravilhoso! - exclamou radiante, quando por fim chegaram próximo do BMW
amarelo, entrando ambos rapidamente no interior do mesmo, a fim de se abrigarem da chuva,
que caía em grande quantidade lá fora...
       - Atchiiiim! - começou o rapaz, rodando a chave na ignição, e colocando o potente
motor do automóvel em funcionamento - Porra, de certeza que me vou constipar! - lamentou-
se, acrescentando ainda - Burro, porque é que não trouxeste o chapéu-de-chuva?
       - Deixa lá, respondeu Isabel confortando-o, enquanto passava a sua mão pelos
cabelos molhados do irmão - quando chegarmos a casa, tomamos um bom banho, bebemos
qualquer coisa bem quente, e vamos logo deitarmo-nos, o.k.?...
       Aproximadamente hora e meia depois de terem deixado a pitoresca vila de Nazaré,
entraram na cave do prédio em que habitavam. Jorge, estacionou o automóvel no local
habitual, e ambos subiram apressadamente até ao apartamento deles, de modo a poderem
trocar aquelas roupas molhadas que provocavam arrepios de frio em ambos. Tomaram um



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prolongado e reconfortante banho, e após terem vestido os pijamas e robes de chambre,
encaminharam-se para a cozinha, onde Isabel preparou um cacau bem quente, que beberam
ambos, acompanhando a bebida com alguns biscoitos de chocolate.
       - Bom, vou-me deitar - anunciou Isabel, bocejando longamente - Também vens? -
inquiriu ainda, passando as mãos pelo largos e robustos ombros do irmão.
       - Sim, também estou cheio de sono - respondeu o rapaz, conduzindo a irmã para o
compridíssimo corredor que dava acesso aos quartos de dormir, desligando os interruptores
de luz à medida que ia passando por eles.
       - Obrigado, Jorge!... Foi um dia maravilhoso!... - começou Isabel, já à porta do seu
quarto - És um amor... - continuou a rapariga, tentando encontrar as palavras certas para
exprimir aquilo que sentia - és,... estupendo,..., e foste a melhor coisa que me aconteceu...
       - Ainda bem que gostaste - respondeu ele, satisfeito por ter agradado à irmã - Boa
noite, e bons sonhos! - exclamou o jovem por fim.
       - Para ti também! - acrescentou a irmã, beijando-o suavemente na face, e tentando
através daquele ternurento beijo exprimir toda a alegria e gratidão que sentia naquele
momento - Até amanhã! - concluiu ela sorrindo radiante...
       Jorge passou ainda a sua mão delicadamente pela pele macia do rosto dela,
abraçando-a também de encontro a si, encaminhando-se depois para o seu quarto de dormir,
enquanto que Isabel fechava a porta. Deitaram-se ambos quase de imediato, e não demorou
muito tempo até que estivessem os dois mergulhados num tranquilo e profundo sono.
Contrastando com o ambiente calmo e silencioso que se verificava no interior daquele
magnífico apartamento, lá fora, no entanto, recomeçara a chover, com uma intensidade
apreciável, acompanhada por algumas rajadas de vento que de vez em quando se faziam
sentir com alguma violência...
       A manhã seguinte surgiu bastante desagradável. Para além da chuva que teimara em
ficar, associaram-se-lhe ainda um frio intenso, e o vento forte, que já se havia feito sentir
durante a noite, mas que agora marcava a sua presença de uma forma mais vigorosa e
regular.
       Passavam já alguns minutos do meio-dia, quando Isabel, que fora a primeira a
levantar-se, se sentou no sofá de sala de estar, entretendo-se com uma revista. Não tardou
muito até que a cabeça de Jorge assomasse à entrada da porta da espaçosa divisão.
       - Bom dia! - cumprimentou ele.
       - Olá, então, dormiste bem? - inquiriu a rapariga, enquanto trocavam um beijo.
       - Sim, foi uma noite óptima - respondeu o jovem sentando-se ao lado da irmã, no
confortável sofá de pele - Bem, vou comer qualquer coisa, porque tenho aí uns apontamentos
que a Sofia me emprestou, e tenho também que rever algumas matérias, por isso, não posso



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perder muito tempo.
       - A que horas é que voltas para Coimbra? - indagou Isabel pousando a revista sobre a
pequena e elegante mesa de madeira escura que se encontrava no meio da sala.
       - Não sei bem, mas não é muito conveniente sair muito depois das oito, porque senão
só lá chego à uma e tal, como aconteceu na semana passada, e amanhã tenho aulas às oito
e meia... - esclareceu o rapaz, levantando-se, e encaminhando-se para o corredor - Vou
almoçar, vens comigo? - pediu ainda.
       Os dois jovens dirigiram-se então para a cozinha. Jorge, foi ao congelador do
frigorífico, retirando de lá uma embalagem de pizza congelada, que a irmã colocou dentro do
forno de micro-ondas. Alguns minutos mais tarde saboreavam ambos com prazer aquela
refeição rápida, que acompanharam com sumo de laranja. Em seguida Jorge, foi ao seu
quarto de dormir, pegou nos seus livros e nuns quantos cadernos de apontamentos, e fechou-
se no magnífico e espaçoso escritório da habitação, que tinha igualmente a função de
biblioteca. Isabel, pelo contrário, depois de ter colocado os pratos e a restante louça de que
se haviam servido ao almoço na máquina de lavar louça, regressou à sala de estar, e sentou-
se num dos mapples lendo um livro e ouvindo música em simultâneo.
       Os dois irmãos, permaneceram totalmente absorvidos nas suas ocupações, até cerca
das cinco da tarde. A essa hora Jorge, fez uma pausa nos estudos, e foi até à cozinha no
intuito de lanchar. Porém, passou em primeiro lugar pela divisão, onde Isabel continuavam
totalmente absorvida pela leitura.
       - Queres vir lanchar? - perguntou, enquanto carinhosamente fazia um rabo-de-cavalo
com os longos cabelos da irmã.
       - Não, agora não me apetece. Mas quando acabar sou capaz de ir trincar qualquer
coisa - respondeu ela, olhando-o através dos seus expressivos e brilhantes olhos azuis - Já
só faltam quarenta páginas, por isso agora quero ficar a saber qual é o final da história -
rematou, voltando a centrar a sua atenção no livro.
       Jorge, dirigiu-se para a cozinha, e pegou numa maçã que mastigou rapidamente,
regressando logo depois ao escritório. Isabel por seu lado, continuou entretida com a leitura
durante mais uns quantos minutos. Quando por fim terminou, levantou-se e foi até à cozinha.
Comeu alguns biscoitos, que acompanhou com um copo de sumo de laranja. Em seguida,
começou calmamente a preparar o jantar.
       Passavam alguns minutos das seis e meia, quando o irmão se juntou a ela na
cozinha...
       - Queres ajuda? - perguntou aproximando-se dela, que observava atentamente o
jantar que cozinhava no forno.
       - Não, não é preciso. Mas, se quiseres ir arrumar as tuas coisas, sempre é trabalho



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que adiantas, que o jantar ainda deve levar aí uns vinte minutos.
           O jovem deixou a cozinha, e entrando no espaçoso corredor subiu as escadas que
conduziam ao andar superior, onde se situava o seu quarto de dormir, assim como o de
Isabel, e ainda um terceiro. Após ter entrado nos seus aposentos, colocou cuidadosamente
algumas roupas dentro de um dos sacos de viagem que trouxera de Coimbra, enquanto que
reservou o outro para guardar os seus livros e cadernos de apontamentos. Em seguida,
retornou ao piso inferior, deixando a bagagem no hall de entrada junto à porta,
encaminhando-se posteriormente para a cozinha.
           - Queres que ponha a mesa? - ofereceu, abrindo uma gaveta pegando numa toalha
que estendeu sobre a mesa.
           - Sim, o jantar está pronto, por isso se não te importas... - respondeu a rapariga,
enquanto abria o forno, puxando para fora um tabuleiro onde se podia observar um apetitoso
peixe assado com pequeninas batatas igualmente assadas.
           Jorge, espalhou ainda sobre a toalha de linho branca os pratos e talheres, bem como
os guardanapos e os copos. Em seguida, sentaram-se ambos nas cadeiras, e principiaram a
saborear aquela refeição preparada por Isabel.
           - A que horas te vais embora? - perguntou Isabel, olhando para os ponteiros do relógio
que estava pendurado na parede por cima da cabeça do irmão, que indicavam passarem
exactamente dezasseis minutos das sete da tarde, levando o garfo à boca.
           - Vamos beber café, e quando voltarmos eu deixo-te lá em baixo na entrada, e sigo -
esclareceu ele, passando o guardanapo pelos lábios, e terminando a sua bebida...
           ...
           - Guia com cuidado... - recomendou Isabel, quando cerca de quarenta minutos mais
tarde, ambos se encontravam nos degraus que davam acesso à entrada principal do edifício
onde habitavam.
           - Não te preocupes, serei prudente - descansou-a ele, sorrindo, no momento em que
um pingo de água caiu em cima dela - Vá, vai para dentro que está a começar a chover...
           - Está bem - concordou a rapariga, abraçando o irmão uma última vez, antes de este
entrar para o BMW amarelo que estava estacionado ali mesmo junto a eles - Faz boa viagem
- acrescentou por fim , subindo depois apressadamente os degraus até se encontrar
protegida da chuva, que entretanto aumentara de intensidade, vendo ainda o automóvel que
Jorge conduzia, afastar-se rapidamente, até desaparecer totalmente, na sinistra escuridão da
noite...
           A chuva que caía com abundância não impediu no entanto que o jovem efectuasse a
sua viagem. Alguns minutos depois de ter saído de Santarém, parou na portagem da auto-
estrada de modo a retirar o título que aproximadamente duas horas mais tarde entregou ao



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portageiro, na saída da via rápida em que circulara.
         Eram quase dez e meia, quando o veículo que o rapaz conduzia estacionou em frente
da casa dos pais de Ana, a prima com quem dividia a habitação. Após ter retirado do porta-
bagagens as duas malas, trancou o carro, usando o comando à distância, e dirigiu-se de
imediato para a porta de entrada da vivenda, entrando sem mais delongas.
         - Ana! - chamou, avançando às escuras pelo corredor, e constatando com alguma
surpresa que não havia qualquer divisão iluminada - Ana! - insistiu o jovem, ligando o
interruptor, e atirando as chaves do BMW para cima da pequena mesa da entrada, sobre a
qual se encontrava o telefone - Ana, onde estás? - chamou de novo, percorrendo todo o
comprido corredor, e concluindo por fim que não se encontrava ninguém em casa...
         Após ter transportado a bagagem até ao seu quarto de dormir, entrou na ampla sala
de estar da habitação, e sentou-se confortavelmente no sofá. Quando esticou a mão até à
mesinha que se encontrava no centro daquela dependência, para agarrar no controlo remoto
do televisor, reparou num pequeno envelope endereçado a si. Abriu-o, e desdobrou o papel
que estava no seu interior, reconhecendo de imediato a letra da prima:


         “Jorge, vou passar as férias de Natal ao Brasil! Eu sei que deves ficar surpreendido, mas quem nos convidou
foi a mãe da minha madrasta. A princípio ainda hesitei, mas depois acabei por aceitar, quando o meu pai me disse que o
Rui Pedro também podia ir.
         Partirei amanhã Domingo), e só voltarei no início de Janeiro para os exames.
         Agora que estás sozinho em casa, vê lá o que fazes. Porta-te bem!...
         Mil beijinhos da tua prima:
                                                                                                                 Ana”
         Jorge, estava de facto surpreendido. Rapidamente voltou a ler a carta, não
acreditando naquilo que lia.
         - “ Não pode ser! “ - pensava, enquanto pousava a carta sobre a mesa, e pegava no
comando do televisor - “ Sortuda!... Ao Brasil hem!?... Que pinta!... “ - disse em voz alta,
passando os pés por cima da pequena mesa de madeira, ao mesmo tempo que se esticava
no sofá, de modo a encontrar uma posição o mais cómoda possível - “ Afinal, vendo bem as
coisas a viagem dela até tem algumas vantagens, senão vejamos; a casa é toda minha
durante três semanas, que óptimo!... “ - acrescentou ainda, sorrindo radiante.
         Permaneceu estendido no sofá com os pés assentes na mesa durante mais alguns
momentos. contudo, e como a programação televisiva não lhe agradava, optou por ir dormir,
até porque na manhã seguinte as aulas começavam bem cedo. Assim, dirigiu-se ao seu
quarto de dormir, deitando-se breves instantes depois. Ao contrário daquilo que era habitual,
Jorge, demorou bastante tempo até adormecer. Porém, o cansaço acabou por vencer, e
quando no mostrador digital do relógio despertador, apareceram as zero horas, já o jovem

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estava mergulhado num profundo e tranquilo sono...



                                 Fim do 1º Capítulo




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                                          Capítulo 2



       - “ Antena 3,... bom dia,... são sete horas!... Vamos às notícias com...”
       Jorge despertou, e ainda bastante ensonado esticou o braço e desligou o rádio. Em
seguida, levantou-se e bocejando bastante encaminhou-se para o quarto de banho., tomando
o seu habitual prolongado duche matinal. Após se ter vestido, dirigiu-se à cozinha e bebendo
um iogurte líquido, pegou nos livros, vestiu o blusão, e abriu a porta de entrada da
habitação...
       - “ Que frio!... “ - exclamou arrepiado - fechando a porta atrás de si, e percorrendo
apressadamente a curta distância que o separava do BMW M3 coupé amarelo.
       Entrou no automóvel, atirando os livros para o assento do lado, e logo após ter ouvido
o ruído característico do motor em funcionamento, engrenou a primeira velocidade, e
arrancou bruscamente, fazendo patinar os pneus no asfalto húmido. Já em Coimbra, deixou o
veículo num parque de estacionamento próximo da Universidade, cruzando os portões da sua
faculdade às oito e meia em ponto. Por isso, não perdeu tempo, encaminhando-se logo para
a sala de aulas...
       ...
       - Jorge!... - chamou uma voz feminina, quando o jovem percorria tranquilamente o
extenso corredor do edifício, dirigindo-se para o anfiteatro onde teria a aula seguinte.
       - Rita..., olá! - exclamou, virando-se para trás e reconhecendo a cara sorridente da
rapariga que se aproximava dele - Onde estão a Sofia e a Joana? - inquiriu surpreendido por
encontrar a colega sozinha.
       - Só vêm para a próxima semana. Tinham uns trabalhos para fazer, e por isso
resolveram ficar mais uns dias no Porto... - esclareceu a jovem beijando-o na face.
       - Já se resolveram a aceitar o meu convite? - perguntou ansioso
       - Acerca do fim-de-semana? - indagou a rapariga, fazendo uma breve pausa, e
prosseguindo após um sinal afirmativo de Jorge - Elas dão-te a resposta quando voltarem,
pode ser?...
       - Sim, claro - anuiu ele, olhando de repente para o relógio de pulso - Porra, já estou
atrasado! - exclamou muito pouco satisfeito - Tenho que ir,... - anunciou, - almoças comigo? -
propôs ainda.
       - Não posso, tenho que preparar uns apontamentos, - respondeu a colega - mas se
quiseres podemos jantar juntos, podes ir lá ter..., às... oito! - sugeriu ela.
       - Está bem, - concordou o jovem - então até logo, ...às oito - concluiu por fim, dirigindo-


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se apressadamente para a porta do anfiteatro que ficava um pouco mais à frente...
       Duas horas e meia mais tarde o espantoso BMW amarelo parava a alguns metros de
distância da habitação que Jorge ocupava com Ana, sua prima, e que pertencia aos pais da
rapariga. O rapaz, pegou nos seus livros, atravessou rapidamente a estrada, e entrou em
casa, depois de ter rodado a chave na fechadura, fechando a porta logo em seguida. Atirou
os livros para cima da secretária do escritório, e foi à cozinha buscar uma lata de cerveja para
acompanhar com a pizza que trouxera de Coimbra. Sentou-se descontraídamente no sofá da
sala de estar, descansando as pernas sobre a pequena mesa de madeira, que para ele tinha
outra utilidade para além da de decoração. Serenamente foi trincando as fatias da pizza
bebendo também a cerveja, enquanto assistia na televisão às noticias da uma hora. Mais
tarde, instalou-se confortavelmente na cadeira do escritório, ligou o computador, e entreteve-
se durante bastante tempo a jogar um simulador de corridas de Fórmula 1. Quando
finalmente se fartou do jogo, pegou nos cadernos de apontamentos, e após ter ido buscar o
seu walkman, releu atentamente as notas que tirara das aulas daquela mesma manhã, ao
som do seu grupo musical favorito.
       Por volta das cinco e meia da tarde, deu por fim o estudo, dirigindo-se à cozinha a fim
de lanchar, sentando-se depois em frente do televisor, vendo um filme que a prima gravara na
semana anterior...
       Jorge, fechou a porta atrás de si, e deu alguns passou em direcção ao automóvel que
estava estacionado do outro lado da rua deserta. Ao entrar no BMW M3 coupé, uma ligeira
brisa desagradável soprou, levantando-lhe os cabelos louros, e causando-lhe um pequeno
arrepio. Por fim, pôs o veículo em marcha, tomando a estrada que levava a Coimbra,
deixando o carro estacionado quase em frente ao prédio em que Rita dividia um apartamento
com Sofia e Joana. Cruzou serenamente a porta de entrada do edifício, e subiu as escadas,
dando depois três leves pancadinhas na porta de madeira, que a colega lhe veio abrir quase
de imediato, convidando-o a entrar:
       - Vens cedo! - observou, voltando a fechar a porta, e conduzindo o amigo para a sala
de estar - O jantar ainda vai demorar um pouco, por isso senta-te aqui! - convidou, apontando
para o sofá que estava encostado a uma das paredes daquele espaço um tanto ou quanto
apertado.
       - Não obrigada, eu quero ajudar em qualquer coisa... - respondeu o jovem num tom
decidido.
       - Bem, se fazes tanta questão nisso,... - começou Rita, dirigindo-se para a cozinha, -
...podes pôr a mesa aí mesmo - acrescentou por fim, regressando com uma toalha branca na
mão que entregou ao colega...
       ...



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           - Passa-me a salada, por favor - quando ambos estavam já sentados à mesa,
saboreando um delicioso prato de carne assada, acompanhada por batatas fritas.
           - Quando acabarmos, queres ir dar uma volta? - propôs Jorge, pousando os talheres e
terminando a sua refeição - Conheci um sítio, que não fica muito longe, e é lindíssimo à
noite...
           - Está bem... - concordou a rapariga, limpando os seus doces e suaves lábios ao seu
guardanapo, dirigindo-se posteriormente à cozinha e levando consigo os pratos que ambos
haviam utilizado - ...mas antes, quero que proves isto, - anunciou ela, regressando momentos
depois, apresentando-lhe um esplêndido bolo, decorado com natas e algumas pepitas de
chocolate.
           - É óptimo! - elogiou Jorge, provando um pouco do cremoso bolo...
           Alguns minutos mais tarde, os dois jovens sentaram-se no interior do automóvel
amarelo que pertencia a Jorge, e que arrancou quase de seguida...
           - Afinal, aonde é que vamos? - inquiriu a rapariga, ardendo em curiosidade, e
recebendo apenas como resposta um sorriso misterioso do companheiro, que a deixou ainda
mais intrigada.
           - Estamos quase a chegar!... - anunciou Jorge, cerca de dez minutos depois, virando-
se para a atraente rapariga que seguia a seu lado - É ali à frente - concluiu por fim, quando o
automóvel que guiava acabava de descrever uma curva apertada - Vem! - acrescentou,
abrindo a porta do veículo logo após este se ter imobilizado completamente.
           - Que lindo! - exclamou Rita, saindo igualmente do carro e aproximando-se do colega,
passando o seu braço sobre os robustos ombros dele.
           - Repara,... - principiou Jorge, fazendo uma breve pausa, enquanto procurava as
palavras que mais adequadamente exprimissem aquilo que sentia - ...as luzes da cidade, ...o
rio, ...o movimento dos carros, e ...este silêncio e tranquilidade cá em cima. Não achas que é
harmoniosamente belo?...
           - Sim, é maravilhoso,... - concordou a jovem - ...e olha as estrelas,... vê como
cintilam... Aquela é a Estrela Polar, não é? - perguntou ela, apontando para um minúsculo
ponto de luz que brilhava ao lado de muitos outros na negra escuridão do céu...
           - Não sei bem, - respondeu Jorge - Quem gostava muito de observar as estrelas era o
meu pai, até chegou a comprar um telescópio... - esclareceu ele, em voz baixa e deixando
escapar uma lágrima mais teimosa, sem que no entanto Rita se apercebesse.
           - Então, agora já não tem tempo para isso?
           - Não... - começou ele suspirando, enquanto outra lágrima lhe correu pela face triste -
Na verdade..., o meu pai,... e a minha mãe,... morreram num acidente de carro à cerca de um
ano e meio... - disse por fim, limpando o rosto húmido por causa das lágrimas que acabaram



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por vencer e corriam abundantemente pela face ensombrada por memórias tão dolorosas
como eram as do desaparecimento dos pais.
       - Desculpa se,..., eu não sabia,..., nunca pensei,..., que,... bem,... - começou a
rapariga, simultaneamente surpreendida e confusa, tentando, embora um pouco embaraçada,
confortar o colega - Tu és sempre tão alegre e divertido, que,... a,... bem,... eu não queria,...
       - Não tens que pedir desculpa,... Afinal, tu não sabias de nada, por isso,... não tens
culpa... - interrompeu ele com uma voz trémula, quando se apercebeu da atrapalhação de
Rita, passando a sua mão pelo cabelo castanho da jovem...
       - Como é que..., como é que os teus pais,...?
       - Como é que eles..., como é que foi, é isso que queres saber...? - questionou Jorge,
continuando logo após um sinal afirmativo da colega - Morreram num acidente de carro... -
respondeu vagamente, fazendo uma pausa, e continuando em seguida - Foi numa noite,
quando vinham de Lisboa..., o meu pai não mediu bem uma ultrapassagem, e quando
percebeu que não dava, já estavam debaixo de um camião,... o carro explodiu, eles tiveram
morte imediata, e o condutor do camião morreu dois dias depois no hospital... - esclareceu
por fim com alguma dificuldade, enxugando as lágrimas com um lenço que a rapariga lhe
emprestara.
       - E a Isabel, como é que reagiu?
       - A principio,... ficou mais perturbada que eu, mas ela acabou por se recompor muito
mais rapidamente que eu. Ela conseguiu aceitar os factos, e eu ainda não fui capaz de
enfrentar essa situação... - respondeu Jorge, aproximando-se da beira do miradouro,
observando atentamente as luzes da cidade, que brilhavam lá ao longe - Bom..., mas se não
te importas eu preferia mudar de assunto... - pediu, envolvendo com um braço os ombros
delicados da companheira - ...falar disto ainda me é muito difícil... - concluiu por fim,
sentando-se numa enorme pedra uma pouco mais recuada em relação ao precipício.
       - Eu compreendo... - anuiu Rita, sentando-se a seu lado - Responde-me só a uma
pergunta; porque é que queres ser advogado?
       - Para ser sincero, eu até nem gosto muito disto...
       - Porquê? - insistiu a companheira interrompendo-o, surpreendida com tal revelação -
Se não gostas deste curso, porque razão o escolheste?
       - No fundo, eu não gosto da advocacia, porque acho que não é um jogo limpo. Não é a
verdade que está em causa, mas tudo se resume ao ganhar ou perder o caso. Não interessa
que o réu seja culpado ou inocente; o que interessa para todos, é ganhar a qualquer preço,
entendes?
       - Sim, mas continuo sem compreender; se não concordas com o sistema porque é que
queres ser advogado? - inquiriu Rita um tanto confusa.



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       - Porque o maior desejo dos meus pais, era que eu me licenciasse em Direito, e um
dia mais tarde ficasse eu como dono da firma de advogados que eles tinham em Lisboa... -
esclareceu ele, demonstrando com a sua atitude o quanto respeitava os pais - ... por isso,
jurei sobre a campa deles que iria fazer aquilo que eles sempre haviam desejado, mas que
por outro lado, iria combater o sistema com todas as armas que tivesse.
       - Então, qual era o curso que gostavas realmente de tirar? - perguntou Rita de novo.
       - Tens frio...? - interrogou Jorge, reparando que a companheira tremia - Queres ir
embora?... - sugeriu, despindo o blusão, e colocando-o sobre os ombros da colega.
       - Não..., podemos ficar mais um pouco...
       - Bem, eu gostava de ter podido estudar Engenharia Mecânica, ou então Informática,
que foi o meu curso no secundário, mas...
       - Mecânica?!... - exclamou a rapariga surpreendida - Tu gostas de mecânica...?
       - Sim..., adoro... - respondeu ele sorrindo, e sem alterar o tom de voz - ... na verdade,
até tenho um Volkswagen Carocha de 1969, que comprei num ferro-velho, e que estou a
restaurar para oferecer à Isabel... Já comprei um motor de um Porsche em segunda mão, e
adaptei-o para o Carocha; vai ficar com quase 3000 cm3 de cilindrada, e mais de 200 cavalos
de potência. Também pedi a um amigo que tem uma grande oficina perto de Lisboa, para me
reforçar a estrutura do carro, de modo a aguentar com aquele motor, e agora ando a arranjar
os travões, porque quero instalar ABS, e umas jantes de alumínio com 20 ou 22 polegadas de
largura. Depois, vou mandar pintá-lo de cor-de-rosa, ou então bordeaux.
       - Uaaaaauuu!... Nunca pela ideia me passou que fosses tão engenhoso!... - exclamou
Rita, não conseguindo disfarçar a simpatia e admiração que sentia pelo colega - Então, e
como é que vai ficar; coupé ou cabriolet?
       - Cabrio..., aliás, quando o levei ao meu amigo em Lisboa, ele deixou-mo logo
descapotável, e pronto a levar uma capota em tecido impermeável... - esclareceu Jorge,
satisfeito com o interesse demonstrado pela companheira - ...mas estou a ver que também
percebes disto, muito bem, estou a gostar de ver!... Vem cá... - pediu ele levantando-se, e
dirigindo-se para o espectacular BMW M3, que estava parado alguns metros mais acima - ...
quero mostrar-te uma coisa... - acrescentou, esperando que a colega chegasse junto dele -
Este carro tem de série...
       - É um belo carro... - observou alguém, intrometendo-se na conversa - Talvez mo
queiras emprestar para eu ir dar uma volta... - continuou o indivíduo do rabo-de-cavalo,
aproximando-se dos dois jovens.
       - Não me parece... - respondeu o rapaz, sem se mostrar muito impressionado com a
enorme e reluzente lâmina que acabara de surgir na mão direita do intruso, apesar de Rita ter
ficado petrificada - Bom..., vou dar-te um conselho; pira-te daqui, imediatamente. Estou-te a



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avisar!...
          - Ouviram...!? - recomeçou o outro, falando para os dois homens que acabavam de
sair de entre um arbusto - Ele está-me a avisar... - prosseguiu em tom irónico, dando alguns
passos na direcção de ambos, enquanto brandia com destreza a enorme faca - ... quem te
avisa, sou eu; tenham juízinho, e nada vos acontecerá..., só queremos verificar um pequeno
pormenor, e depois soltamo-vos...
          - Marco,... - chamou o indivíduo que vestia fato e gravata, usando uma gabardina por
cima - ...tem calma,... não nos precipitemos... Tu,... - disse, falando para Rita, que
permanecia imóvel - ...vem cá...
          - Lamento desiludir-vos, mas infelizmente não me parece que ela vá a lugar algum... -
respondeu de pronto Jorge, continuando muito pouco impressionado com o ambiente hostil
criado pelos três malfeitores.
          - Marco,... - insistiu o outro - ... trá-la cá, e se aí o nosso amigo fala-barato se
manifestar trata-lhe da saúde!... - concluiu com cara de poucos amigos.
          - Não é preciso Dr.,... - disse o terceiro homem, falando para o do fato, que parecia ser
o chefe do grupo - ... não é ela...
          - Tens a certeza do que estás a dizer? - insistiu o outro.
          - Absoluta... - prosseguiu ele - não é ela, a outra miúda não tinha sardas, era mais
baixa, e o cabelo era mais escuro do que o desta... - esclareceu por fim.
          - Vê lá, não te precipites, o chefe não quer perder mais tempo com esta história -
insistiu o homem do fato.
          - Eu tenho a certeza, não é ela, ...garanto-lhe Dr. -
          - Marco,... deixa-os,... vamos embora... - ordenou o tal Dr. ao fulano do rabo-de-
cavalo.
          Porém, Marco não parecia estar pelos ajustes, e antes de se afastar presenteou o
desprevenido Jorge com um soco na cara, que de imediato ripostou, agredindo o outro com
um pontapé violentíssimo no baixo ventre, e depois com dois murros na cara, que deixaram o
tipo que se chamava Marco estendido no chão sangrando do nariz e dos lábios.
          - Toma lá filho da puta!... Para a próxima toma atenção aos conselhos que te dão -
comentou o jovem, quando o outro com alguma dificuldade se começou a levantar.
          - Agora é que vais ver como elas te mordem!... - gritou Marco de cabeça perdida,
avançando furioso para o rapaz.
          - Tu não aprendes!?... - ironizou Jorge - Queres levar outra vez?...
          - Marco!... - chamou o indivíduo que tratavam por Dr. - Vamos embora..., já... é uma
ordem!... - ordenou o tipo que vestia fato, num tom de voz que não deixou dúvidas ao homem
do rabo-de-cavalo.



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          - Fica para a próxima,... não te esqueças da minha cara!... - ameaçou por fim, antes
de se juntar aos outros dois, que desapareceram rapidamente pela colina acima.
          Alguns segundos depois, ouviu-se um automóvel arrancar a grande velocidade, não
muito longe dali...
          - Pronto..., já se foram embora!... - observou Jorge aliviado - Estás bem? - perguntou à
colega.
          - Sim... - principiou ela, tentando enxugar as lágrimas que entretanto começaram a
cair - ... mas tenho medo..., não gostei muito das últimas palavras do gajo do rabo-de-
cavalo...
          - Não te preocupes..., não ligues..., aqueles gajos só são duros com uma arma na
mão..., são uns cobardolas, jamais terão coragem de nos chatear outra vez... - comentou o
jovem, tentando tranquilizar a colega, que agora tremia de medo.
          - Achas!?...
          - Tenho a certeza... - esclareceu o rapaz não deixando lugar a qualquer tipo de
dúvidas - Só não entendi bem o que queriam..., ...é óbvio que se enganaram, pelo menos foi
o que percebi das palavras do gajo que estava com o “ fato “, devem andar atrás de alguém.
É melhor prevenirmos a polícia...
          - Eu trato disso amanhã... - ofereceu-se Rita de imediato, já mais calma.
          - Está bem... - concordou o companheiro - ...mas agora, o melhor é irmos embora, já
chega de surpresas por uma noite...
          Jorge conduziu a colega ao magnífico BMW M3 coupé amarelo, e abriu a porta para
que ela entrasse. Depois, deu a volta ao veículo, e entrou também. Em seguida, rodou a
chave na ignição, engrenou a primeira velocidade, e arrancou em direcção à estrada que
conduzia a Coimbra.
          - Queres ir dormir lá a casa? - sugeriu o rapaz, reparando que a colega estava muito
nervosa.
          - E a Ana? - lembrou a rapariga com a voz trémula...
          - A Ana não está lá..., foi passar o natal ao Brasil com os pais e o namorado... Ontem
quando cheguei de Santarém, já ela não estava. Deixou-me um bilhete a explicar tudo.
Então..., ficas no teu apartamento, ou queres vir comigo... - insistiu ele
          - Se não te importares, eu preferia ir contigo...
          - Bom..., então vamos...
          Cerca de dez minutos mais tarde, o espectacular automóvel conduzido por pelo jovem
estudante, parou em frente à habitação que pertencia aos pais de Ana, e que ele dividia com
a prima. Depois, Jorge, conduziu Rita até à porta da casa, e após ambos entraram, fechou a
porta com cuidado. Em seguida, encaminhou a colega até ao quarto de dormir que



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habitualmente estava vago, e foi procurar um pijama da prima que entregou a Rita.
        - Estás tão tensa... - observou, reparando que a rapariga continuava a tremer - ...
queres um calmante para te ajudar a dormir? - sugeriu, tentando confortá-la apertando-a de
encontro ao seu peito robusto.
        - Sim,... se não te der muito trabalho.
        O jovem, dirigiu-se para a cozinha, e voltou alguns minutos mais tarde, trazendo um
copo de água, e o calmante que deixou sobre a mesa-de-cabeceira do quarto.
        - Se precisares de alguma coisa,... seja o que for, é só chamares, está bem? -
recomendou, encaminhando-se para o corredor - Vá, vai descansar, e esquece aquilo que se
passou. Tudo não passou de um engano, foi só um grande susto... Até amanhã!... - concluiu
por fim, saindo e fechando simultaneamente a porta do quarto.
        - Jorge!?... - chamou Rita.
        - Sim,... - respondeu ele de pronto abrindo de novo a porta.
        - Nada,... só... obrigado!... - disse, aproximando-se dele, e apanhando-o desprevenido,
beijou-o com ternura nos lábios - Boa noite!...
        O jovem, puxou mais uma vez a porta, e afastou-se em direcção ao seu quarto de
dormir, pensando surpreendido no prémio que acabara de receber. Após ter tomado um
duche rápido, o rapaz vestiu o pijama, e enrolou-se confortavelmente no meio dos quentes e
acolhedores cobertores, recordando confuso os acontecimentos daquela mesma noite no
miradouro; “ Quem seriam aqueles indivíduos? Quem procuravam? Porque razão perseguiam
alguém? “ A única coisa que ele compreendia, é que obviamente os três malfeitores haviam
confundido Rita com a outra pessoa que por algum motivo perseguiam.
        Apesar de entretido com aqueles pensamentos, não demorou muito porém até que
adormecesse, embora o sono fosse muito pouco tranquilo. No quarto ao lado, pelo contrário,
Rita, com a ajuda do calmante rapidamente se encontrou mergulhada num tranquilo e
profundo sono, mexendo-se de quando em vez na cama...
        ...
        - Bom dia! - cumprimentou Jorge, entrando na cozinha - Já estás levantada!?... -
exclamou surpreendido, apertando o cinto do roupão - São oito e meia, não me disseste que
hoje não tinhas aulas de manhã?
        - Olá! - saudou a colega, sorrindo - Sim..., não tenho aulas, mas tenho que ir ao Porto.
- prosseguiu ela bebendo um gole de café - Só hoje quando acordei é que me lembrei que
tenho uma consulta no médico.
        - E como é que passaste a noite? Dormiste bem? Estás mais calma? - questionou
Jorge atenciosamente, pegando numa chávena e servindo-se igualmente de um pouco de
café.



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       - Sim, graças ao calmante que me deste, dormi bem, e já me convenci que apesar dos
tipos de ontem serem perigosos, não nos vão chatear nunca mais. Mas ontem tinha tanto
medo!... Obrigado!... Foste bestial, um verdadeiro amigo!...
       - Ainda bem que já estás mais calma... - observou Jorge satisfeito - Queres que te vá
pôr à estação para apanhares o comboio? - ofereceu-se o rapaz.
       - Isso era óptimo! - agradeceu Rita, terminando o pequeno-almoço - Mas antes de
irmos, queria pedir-te que não dissesses a ninguém o que aconteceu ontem, porque eu não
quero que os meus pais descubram isso..., senão há logo sarilho.
       - Nem mesmo à polícia?
       - Não, está descansado que eu vou lá apresentar queixa... Só não quero que mais
alguém saiba disto... Posso contar contigo? - inquiriu, aguardando ansiosa pelo voto de
silêncio do colega.
       - De acordo. Prometo que nada direi a ninguém... - garantiu ele, acrescentando depois
- Então, dá-me um quarto de hora, enquanto vou tomar um banho e vestir-me... - pediu
abandonando apressadamente a dependência onde ambos se encontravam.
       Alguns minutos mais tarde, Jorge entrou na sala de estar, pegou nas chaves do BMW
amarelo, e conduziu Rita até à saída. Depois de fechar a porta, dirigiram-se os dois para o
espectacular automóvel que estava estacionado do outro lado da estrada. Logo que se fez
sentir o ruído do potente motor do veículo em funcionamento, o rapaz engrenou a primeira
velocidade, e iniciou a marcha suavemente, tomando a estrada que conduzia a Coimbra...
       - Voltas a que horas? - indagou, quando já no interior da cidade avistou ao longe o
edifício da estação ferroviária.
       - Ainda não sei. Possivelmente até ficarei esta noite em casa da Joana... - respondeu
falando quase em surdina, no momento em que o automóvel parou em frente da velha
construção - Até amanhã! - disse, despedindo-se do colega, com um beijo na face - Obrigado
pela boleia, e obrigado por ontem... - concluiu por fim, fechando a porta do BMW, e dirigindo-
se para a entrada da estação.
       - Faz boa viagem!... - respondeu Jorge, ficando por mais uns instantes a observar a
rapariga que se afastava.
       Em seguida, arrancou bruscamente, tomando o caminho de regresso a casa, onde
chegou aproximadamente dez minutos mais tarde, entrando na habitação sem mais
delongas. Como era ainda muito cedo, passavam alguns minutos das nove e meia da manhã,
pegou no seu walkman e sentou-se no escritório em frente do computador, entretendo-se
com alguns jogos, enquanto recordava de novo os estranhos acontecimentos da noite
anterior.
       - “ Há aqui qualquer coisa que não bate certo!... “ - pensou, desviando



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momentaneamente a sua atenção do jogo, suspeitando que a colega lhe escondia algo - “
Está-me a escapar algo!... A Rita deve saber de alguma coisa!... Tenho que apertar um pouco
mais com ela!... “ - concluiu, voltando a centrar a sua atenção no monitor do computador, e no
simulador de futebol que estava a jogar.
         Aquela viagem súbita era no mínimo bizarra, e a tentativa de ocultar a situação da
polícia, ainda que velada, bem como o ocorrido na noite anterior alimentavam de
sobremaneira as suspeitas do jovem...
         ...
         - Good Afternoon!... - saudou amavelmente o professor de Inglês, rodando a maçaneta
da porta da sala de aulas - How was the week-end?...
         - Short... - começou um colega de Jorge que seguia mesmo atrás do altíssimo
indivíduo britânico - ...as usually, it was very short!... - acrescentou depois no meio da
gargalhada geral.
         - Sir... - principiou um outro, rindo divertido - ...this morning a little bird told me that
Liverpool have lost, ...again!...
         - No comments, please... - respondeu bem humorado o professor, que numa das aulas
anteriores havia cometido o erro de revelar aos seus alunos ser associado daquele clube
inglês, tendo alguma dificuldade em se fazer ouvir perante a gargalhada bem-disposta que
surgiu após aquela perspicaz observação - Okay, now... please, ...enough!... - pediu - Now...,
lets go to work! - disse por fim, aguardando que todos se sentassem de modo a poder
principiar a leccionar a matéria para aquela aula...
         - Vou-me “ baldar “ a Direito! - anunciou Jorge, quando cerca de duas horas mais tarde
cruzou os portões da faculdade, acompanhado por um grupo de colegas.
         - Isso é que é falar! - aprovou uma rapariga, dando-lhe uma palmada amigável nas
costas - Vou para o salão jogar, querem vir? - convidou ainda.
         - Que se lixe,... também vou - concordou um outro, acendendo o seu cigarro, e
oferecendo um à jovem que os acompanhava - Estou farto daquela merda!... - disse por fim
pontapeando furioso uma lata de cerveja que fora deixada no passeio.
         - Vamos jogar o quê, Marta? - perguntou alguém quando o grupo entrou no salão de
jogos.
         - Snooker a quatro! - sugeriu Jorge, pegando num taco, e dirigindo-se para a
esplêndida mesa que se encontrava a um canto daquele espaço de diversão.
         - Vamos tornar as coisas mais interessantes... - começou um dos rapazes sorrindo -
...quem perder, ...paga, o.k.?
         - De acordo, André! - aprovou Marta, pegando também num taco - Vocês podem jogar
juntos, que eu fico com ele - disse, apontando para Jorge, que se aproximava trazendo as



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bolas do jogo.
         - Está no papo! - comentou o outro rindo - Preparem a “ massa “, que aqui o mestre
vai dar uma aula de bem jogar isto ao pessoal, ... e à borla... - anunciou, virando-se para
Jorge e Marta, que permaneciam quietos a um canto da mesa...
         - Convencido... - principiou Marta, aproximando-se discretamente do parceiro, e
perguntando-lhe em surdina - Percebes alguma coisa disto?
         - Talvez... - respondeu vagamente o jovem, esquivando-se à pergunta, e não
revelando os seus verdadeiros conhecimentos acerca do jogo.
         Meia hora mais tarde...
         - Falas demais! - observou o colega de André, olhando acusadoramente para este - Tu
e as tuas ideias! Devias pagar isto sozinho, ...animal! - continuou, puxando da carteira muito
pouco satisfeito, para pagar a despesa do jogo, uma vez que Jorge e Marta haviam levado a
melhor - As miúdas não percebem nada de snooker, ...aqui o grande mestre dá bem conta
deles - repetiu, imitando de uma forma irónica a voz e os gestos do parceiro.
         - Foi sorte de principiante! - defendeu-se o outro, lamentando-se da sua pouca sorte.
         - Queres repetir?... - desafiou Marta, pegando de novo no seu taco e aproximando-se
da mesa, perante o olhar atento dos três rapazes.
         - Não... - desculpou-se o outro um tanto atrapalhado enquanto se afastava com o
parceiro para pagar a despesa - Tenho que me ir embora, senão ...era já!...
         - E eu também! Foi fixe, mas tenho que me pirar! - anunciou Jorge, pegando nos seus
livros, e despedindo-se dos colegas, encaminhando-se depois para a saída do salão de
jogos.
         Tranquilamente percorreu as cerca de duas centenas de metros que o separavam do
parque de estacionamento em que deixara o seu BMW. Por fim, avistou o espantoso coupé
amarelo, usando o controle remoto para destrancar as portas do automóvel, logo que chegou
a uma distância suficientemente perto para que o pequeno aparelho funcionasse
adequadamente. Já sentando ao volante do veículo, atirou os livros para o assento traseiro,
arrancando bruscamente logo em seguida.
         Alguns minutos volvidos, o jovem encontrava-se já à entrada da habitação que
ocupava, a mesma que pertencia aos pais da prima com quem a dividia. Entrou, fechando a
porta atrás de si deixando as chaves do BMW e os livros em cima da pequena mesa sobre a
qual se encontrava também o telefone.
         Não demorou muito tempo até que Jorge se instalou confortavelmente no acolhedor
sofá da sala de estar, saboreando umas sanduíches de pastéis de bacalhau, que ele mesmo
preparara instantes antes, enquanto assistia ao noticiário na televisão. De súbito, porém,
lembrou-se de ir à cozinha buscar uma bebida para acompanhar a refeição.



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       - “ Porra, ...já não há cerveja! “ - exclamou desiludido, quando abriu a porta do
frigorífico, e constatou que apenas restavam algumas latas de refrigerantes - “ Bom, ...lá terá
de ser!... “ - pensou conformado, pegando numa lata de cola, e voltando a sentar-se em
frente ao televisor, aproveitando, como era hábito, o tampo da pequena mesa de madeira
escura que se encontrava ao centro daquela divisão...
       Após a refeição, esperou ainda pelo programa desportivo, que era transmitido noutro
canal, entretendo-se depois com um livro que começara a ler há bastante tempo, ouvindo
música em simultâneo. Contudo, não demorou até que se começasse a sentir sonolento, e
embora fosse ainda muito cedo, optou por ir dormir, pelo que, desligou a potente
aparelhagem sonora, dirigindo-se em seguida para o seu quarto. Assim, quando nos dígitos
vermelhos do rádio relógio apareceram as zero horas, já o jovem estava mergulhado num
tranquilo e profundo sono...
       - “ ... Antena 3, falta um minuto para as nove da manhã... Vamos entrar na próxima
hora com... ‘ Crazy ’ dos Aerosmith, depois ...‘ About a Girl ‘ do álbum ‘ Unplugged in New
Yorq ‘ dos Nirvana, e no final da sequência..., ‘ Tudo o que te dou ‘ de Pedro Abrunhosa,...
Deixem-se ficar..., esta é a Antena 3, a partir de Lisboa para todo o país...”
       Jorge deu meia volta na cama, e ficou mais um pouco deitado, ouvindo com atenção
os temas musicais que o locutor anunciara alguns instantes antes. A muito custo, lá se
resolveu por fim a levantar, encaminhando-se apressadamente para o quarto de banho, não
sem antes ter aumentado o volume ao rádio, de modo a continuar a ouvir música, enquanto
se aprontava para mais um longo dia de aulas, como ele muitas vezes gostava de referir...
       Depois de trancar as portas do vistoso BMW M3 coupé amarelo, Jorge deu uma
rápida mirada aos ponteiros do seu relógio de pulso. Eram então exactamente dez e um
quarto da manhã... O jovem, olhou ainda receoso para as muitas e ameaçadoras nuvens que
cobriam totalmente o habitual azul do céu, atravessando em seguida a estrada ainda molhada
pela chuva que caíra com persistência durante quase toda a madrugada. Por fim, cruzou a
entrada da sua faculdade, dirigindo--se de imediato para o edifício principal, para se proteger
melhor do intenso frio que se fazia sentir...
       - Hei,... então... - chamou uma voz feminina quando Jorge entrou no enorme corredor
que dava acesso às salas do 2º piso - Já não ligas às colegas - insistiu a voz, quando ele
finalmente se voltou para trás, deparando-se com três caras conhecidas.
       - Sofia!?... Joana!?... - exclamou surpreendido - Não era suposto ficarem no Porto até
segunda? - inquiriu, cumprimentando as três raparigas com um beijo na face.
       - Bom, resolvemos voltar mais cedo - respondeu a atraente jovem dos cabelos louros,
que inicialmente o chamara, sem no entanto revelar o motivo pelo qual haviam decidido
antecipar o regresso.



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        - Ainda bem que voltaram mais cedo... - começou Jorge com uma expressão grave -
...estou preocupado com a Rita...
        - Nós sabemos... - principiou a outra, olhando o colega fixamente através dos seus
lindos olhos, que não tinham uma cor definida, embora se situassem algures entre o azul e o
verde - ...a Rita quando ontem nos visitou pôs-nos a par da história toda - esclareceu por fim.
        - Fico mais tranquilo, agora que sei que vocês regressaram - observou Jorge aliviado,
olhando para o relógio de pulso.
        - Tens alguma aula agora? - indagou Rita, apercebendo-se da insistência com que o
colega olhava para o relógio.
        - Sim. Na verdade, já estou atrasado quase um quarto de hora, e hoje era conveniente
chegar a horas...
        - Tu..., chegares a horas..., a uma aula!? - exclamou rindo a bela e atraente jovem dos
cabelos louros - Estiveste a beber? - perguntou brincando.
        - Não! - respondeu Jorge, compreendendo que a rapariga estava a entrar com ele -
Agora a sério, a aula de hoje é muito importante... Além disso, ontem dei folga ao professor,
por isso...
        - Ó Sofia, vai chamar um médico!... - insistiu a outra, interrompendo-o de novo - Ele
está mesmo doente!... Agora até já quer ir às aulas! - prosseguiu dando-lhe uma palmada
amigável nas costas - Desde quando é que há aulas importantes? - inquiriu indignada,
estendendo os braços em sinal de reprovação...
        - É um brincalhão este Jorge! - exclamou divertida a colega, cujos olhos de uma cor
indefinida tanto fascinavam o rapaz, fingindo não o levar a sério.
        - Bom, tenho mesmo que ir andando... - concluiu, suspirando longamente, dando dois
passos na direcção do corredor.
        - Queres jantar connosco? - convidou ainda Rita.
        - Aaaaaa... - principiou, fazendo uma pausa para pensar - Hoje jantamos em minha
casa! - Vou buscá-las às sete, o.k.? - terminou, encaminhando-se apressadamente para a
sala de aulas, deixando as três raparigas conversando animadamente à entrada do
corredor...
        Alguns minutos depois do meio-dia, Jorge, abandonou o recinto da faculdade,
despedindo-se da colega, logo após ambos terem cruzado o enorme portão. Ela, seguiu para
uma estreita e pouco movimentada travessa, enquanto que o jovem estudante continuou em
frente, descendo até uma ampla praça, que se encontrava quase deserta àquela hora. Em
seguida, atravessou a estrada entrando no snack-bar, onde almoçava sempre que não tinha
tempo para ir a casa, e que não ficava muito longe da sua faculdade...
        Optou por um hambúrguer com batatas fritas e salada, que lhe puseram à frente



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poucos instantes depois, bem como a cerveja que tinha pedido para acompanhar o prato
principal. Para terminar, saboreou uma deliciosa sobremesa, bebendo ainda o habitual café.
Por fim, pegou nos livros, pagou a despesa, saindo de imediato.
       Como lhe restava ainda bastante tempo antes da aula seguinte, foi caminhando
tranquilamente até ao seu espectacular BMW, sentando-se descontraídamente no assento do
condutor. Inclinou um pouco as costas do banco, de modo a ficar mais confortavelmente
instalado, ligando também o potente auto-rádio que se encontrava montado na consola
central do automóvel. Depois, fechou os olhos, ficando a ouvir a excelente música que estava
a ser transmitida pela estação de rádio que sintonizara. Contudo, alguns minutos mais tarde o
jovem dormia profundamente, totalmente alheado do intenso movimento naquela rua. De
súbito, porém, um veículo que circulava próximo travou bruscamente, buzinando com
insistência. O irritante ruído da buzina, depressa chegou aos ouvidos de Jorge, que despertou
de imediato, compreendendo instintivamente que se deixara dormir...
       - Merda!... Já estou atrasado, ...que porra!... - disse, enquanto olhava muito pouco
satisfeito para o seu relógio de pulso, e pegando precipitadamente nos livros que estavam
sobre o assento ali mesmo ao seu lado abriu a porta do BMW sem perder mais tempo.
       Depois, encaminhou-se apressadamente para a faculdade que não ficava muito longe
do local em que se encontrava...
       ...
       - Uaaaaaaauuuu!!!... - exclamou Jorge surpreendido, quando Joana lhe abriu a porta
de entrada do apartamento que dividia com Rita e Sofia - Tu estás..., a... um... espanto! -
concluiu observando boquiaberto a colega que, estava de facto deslumbrante...
       - Não queres entrar enquanto elas não vêm? - convidou a jovem dos cabelos louros,
que naquela noite usava um lindo vestido negro, que não só realçava o sensual corpo da
jovem, como também os seus magníficos cabelos.
       - Elas não demoram muito, pois não? - indagou Jorge, algo inquieto.
       - Acho que não... - principiou a rapariga - ... mas há algum problema?
       - Bem..., é que..., deixei o carro estacionado à balda, e estou com medo, não apareça
a bófia e se ponha a implicar. - esclareceu ele, encostando-se ao corrimão de madeira da
escada - A última vez, avisaram-me que não me voltavam a perdoar uma multa de
estacionamento... - acrescentou ainda.
       - Eu vou ver se elas ainda demoram... - anunciou Joana, desaparecendo no interior da
habitação, perante o olhar atento de Jorge.
       - Que corpo espectacular..., ufa!... Qual das três a melhor... - desabafou entredentes,
sorrindo-se cumplicemente dos seus pensamentos mais ousados...
       - Vamos?... - inquiriu Joana, regressando acompanhada por Sofia e Rita que vinham



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logo atrás de si.
          - É só um jantar garotas!... Não era preciso tanto!... - comentou, enquanto desciam os
quatro as escadas que conduziam à saída daquele prédio de apartamentos - Bem..., assim
sendo, ...tenho uma ideia melhor... - acrescentou, abrindo a porta da frente para que Sofia e
Joana pudessem entrar para os lugares traseiros.
          - Em que é que estás a pensar? - inquiriu Rita ardendo em curiosidade, enquanto
Jorge dava a volta para entrar do outro lado.
          - Surpresa... - respondeu ele vagamente com um sorriso misterioso, sentando-se ao
volante, e rodando a chave na ignição.
          Logo que o ruído do potente motor do BMW M3 coupé se fez ouvir, Jorge engrenou a
primeira velocidade, iniciando suavemente a marcha logo em seguida. Alguns instantes mais
tarde, circulavam numa estrada pouco movimentada em direcção ao sul...
          - Não sejas chato... - recomeçou Rita pela milionésima vez - ..diz lá onde vamos!...
          - Já não precisas de esperar muito... - respondeu o jovem pacientemente - ...estamos
a chegar - concluiu, apontando para uma construção de um piso único, que se erguia um
pouco mais à frente...
          ...
          - Já escolheram?... - inquiriu delicadamente o empregado daquele restaurante
aproximando-se da mesa que Sofia escolhera.
          - Sim... - principiou Jorge, dando uma última vista de olhos pela ementa - ...queremos
quatro doses de Bacalhau com Natas...
          - E para beber?... - prosseguiu o outro, enquanto tomava nota daquilo que o rapaz
pedira.
          - Para mim uma imperial... - respondeu o jovem, fazendo um sinal às companheiras
para que pedissem a bebida que queriam.
          - Pensava que os caloiros só bebiam leite!... - comentou Joana, logo que o empregado
se retirou...
          - Ah!... Ah!... Ah!... Que piada!... - brincou Jorge, fingindo-se ofendido pela observação
da colega - E, em relação ao meu convite, já tomaram alguma decisão?
          - Bem..., nós estivemos a pensar, e... - começou Sofia, fazendo uma breve pausa,
enquanto bebia um gole do sumo de laranja que o empregado havia acabado de lhe pôr à
frente.
          - E...?... - insistiu o companheiro, mostrando-se bastante impaciente.
          - Resolvemos aceitar!... - esclareceu por fim, passando os seus finos e doces lábios
pelo guardanapo, terminando finalmente com aquele momento de suspense, para gáudio do
colega que sorria satisfeitíssimo com a notícia - Mas... - acrescentou ainda - tem que ser



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antes das férias de Natal.
       - Se quiserem, pode até ser já neste fim-de-semana... Que dizem?... - propôs ele,
pedindo mais uma bebida ao empregado.
       - De acordo! - anuíram as três raparigas, após uma breve troca de olhares - Mas tens
a certeza de que não há nenhum inconveniente? - indagaram, ainda hesitantes.
       - Absolutamente nenhum! - respondeu o colega decididamente, começando a servir-se
do esplêndido Bacalhau com Natas que o empregado acabara de trazer naquele mesmo
instante. - Só preciso de prevenir a Isabel. Mas quanto a isso, não há problema, ...amanhã
telefono-lhe.
       - Então, está combinado. Na sexta, vamos contigo para Santarém...
       ...
       - Vêmo-nos amanhã? - perguntou Jorge, quando o vistoso BMW amarelo parou por
alguns instantes em frente ao edifício em que habitavam as três jovens.
       - Não queres subir só por um bocadinho? - convidou Rita, libertando o fecho do cinto
de segurança.
       - Sinto muito, mas não posso. Tenho umas tretas para ler, e uns apontamentos para
reler, por isso, não dá - lamentou-se o rapaz, com tristeza, dando um murro no volante do
automóvel.
       - Então, vemo-nos amanhã! - concluiu a companheira, despedindo-se dele com um
beijo na face, e abrindo a porta da viatura, deixando que as duas raparigas que seguiam no
assento traseiro pudessem igualmente sair.
       - Até amanhã! - disseram simultaneamente Sofia e Joana, que se juntaram no passeio
a Rita, vendo o potente veículo desaparecer rapidamente na curva que ficava algumas
dezenas de metros mais abaixo.
       Jorge, após uma noite bem passada na companhia das colegas com quem travara
conhecimento através da prima Ana, dirigiu-se para casa, conduzindo velozmente o
espantoso BMW M3 coupé, que deixou estacionado como habitualmente em frente da
habitação que partilhava com a prima, agora de férias no Brasil. Atravessou tranquilamente a
estrada, olhando fixamente para o céu estrelado, que era iluminado pela luz intensa da lua
cheia, que naquele momento brilhava a descoberto de umas quantas nuvens que se podiam
igualmente observar. Passavam apenas alguns minutos das dez e meia da noite, quando o
jovem rodou a chave na fechadura da porta de entrada da habitação, entrando logo em
seguida...




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                                  Fim do 2º Capítulo




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                                           Capítulo 3



           - Olá, bom dia! - cumprimentou o jovem estudante, chegando junto dos seus colegas
de turma, que aguardavam junto da entrada da sala de aula a chegada do professor de
Direito.
           - Chamas bom dia, ...a isto!?... - exclamou uma rapariga, protestando contra o tempo
cinzento, húmido, desagradável e frio que se fazia sentir naquela manhã de Dezembro.
           - Não deviam existir aulas de manhã! - prosseguiu um outro, terminando
disfarçadamente um cigarro que acendera poucos tempo antes, visto que não era permitido
fumar nos corredores da faculdade, e naquele momento aproximava-se um funcionário.
           - Aulas só um dia por semana, e com férias pagas treze meses por ano! - comentou
de súbito alguém dando origem a uma gargalhada bem-disposta, que fez esquecer por
breves instantes aquela manhã fria e chuvosa.
           Em seguida, chegou o professor, cumprimentando delicadamente os seus alunos, e
abrindo a porta, de modo a que todos pudessem entrar.
           À aula de Direito, seguiu-se uma outra de Economia, tendo existido de permeio entre
ambas um curto intervalo com uma duração de quinze minutos, que o jovem aproveitou para
rapidamente tomar o pequeno-almoço, num simpático café, que embora minúsculo, não
deixava de ser bastante acolhedor, e que ficava próximo, regressando depois à faculdade, a
fim de assistir à aula de Economia...
           Por volta da uma da tarde, quando finalmente terminaram as aulas daquele dia
sombrio, Jorge, dirigia-se apressadamente para o seu automóvel, quando foi interpelado
pelas três raparigas com quem jantara na noite anterior.
           - Não queres ir à aula de Inglês por mim? - principiou Rita, brincando com ele,
enquanto se cumprimentavam trocando alguns beijos.
           - Não..., ...não me parece que esteja muito interessado na tua extraordinária oferta... -
declarou o jovem rindo, enquanto abria a porta do espantoso BMW M3 coupé, atirando com
os livros que segurava na mão direita para cima do assento contíguo ao do condutor - Não sei
como, nem porquê, mas a verdade, é que recentemente auto-diagnostiquei-me como
extremamente alérgico a aulas, prejudicam seriamente a saúde, especialmente a minha -
prosseguiu, encostando por momentos a porta para que o veículo que surgiu de frente
pudesse passar sem problemas - Mas se quiserem, podemos ir beber qualquer coisa, antes
de eu ir embora, que dizem?...
           - Se tu pagares, aceitamos, ...não é? - prontificou-se imediato Joana, trocando um


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olhar cúmplice com as duas companheiras.
       - Pago pois!... Vamos!... - propôs ele, pegando nas chaves do automóvel para o voltar
a fechar.
       - Ela está a brincar! - explicou Sofia, apontando de imediato para o mostrador do seu
relógio de pulso - Já estamos atrasadas mais de dez minutos, e faltámos às duas primeiras
aulas da semana, por isso temos mesmo que ir - esclareceu por fim.
       - Têm a certeza?... - insistiu Jorge, desistindo logo em seguida, quando as raparigas
acenaram com a cabeça, indicando que não podiam mesmo - E que tal jantarmos?
       - Hoje não dá... - respondeu Rita muito vagamente, escusando-se a revelar mais
pormenores.
       - Porquê? - indagou o jovem não ficando satisfeito com aquela recusa aparentemente
sem justificação.
       - Amanhã falamos... - concluiu a colega, fechando-se num enigmático sorriso, e
afastando-se rapidamente com Joana e Sofia - Agora temos que ir... - acrescentou ainda,
encaminhando-se depois as três para o interior do recinto da faculdade, deixando Jorge junto
do seu carro, que apesar de não ter compreendido muito bem a estranha atitude das três
raparigas, entrou no automóvel, não dando demasiada importância ao ocorrido.
       - “ Provavelmente devem ter algum trabalho para fazer, e como também já estavam
atrasadas... ” - pensou, rodando a chave na ignição do BMW coupé, e arrancando velozmente
sem perder mais tempo, dirigindo-se para casa.
       Depois do almoço, o jovem resolveu telefonar à irmã, para a pôr ao corrente do
convite que fizera às colegas, e que as mesmas haviam aceite. Por isso, pegou no telefone, e
marcou nas teclas correspondentes ao seu número em Santarém. Esperou alguns instantes
até que do outro lado da linha soasse a voz conhecida da irmã, que de imediato disse:
       - Ainda bem que telefonas... - principiou a rapariga, com uma voz trémula -
...recebeste a minha mensagem?
       - Que mensagem!?... - inquiriu Jorge surpreendido.
       - Eu telefonei-te anteontem, e ontem, mas como não estavas, deixei recado no
gravador de chamadas, ...não o ouviste? - insistiu ela.
       - Não, mas... passou-se alguma coisa? - perguntou Jorge inquieto, depreendendo pela
voz insegura da Isabel, que algo sucedera.
       - Sim... - recomeçou a irmã a medo - Bem, a... eu... tive um acidente com o Ford, na
terça... - concluiu por fim soluçando.
       - O quê!?... - exclamou o rapaz, um tanto confuso pela revelação que a irmã acabara
de lhe fazer - Mas..., e estás bem..., isto..., quer dizer, ...tu estás bem? - indagou preocupado
- Não te aconteceu nada?...



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       - Não... - disse, soluçando cada vez mais, e começando também a chorar - Não..., não
me aconteceu nada..., mas o carro ficou sem o pára-choques, os vidros dos faróis, e... os
piscas ficaram partidos. Desculpa, ...está bem...?
       - Acalma-te... - pediu o jovem, verificando que ela ainda não recuperara do susto -
escuta, ...isso não interessa. O que interessa é que estás bem... Então, ...acalma-te, ...não há
razão para isso... - prosseguiu, tentando confortar e descansar a irmã, minimizando o
problema - Então, ...como é que isso aconteceu?
       - Anteontem, quando ia a caminho da escola, ia a parar atrás de uns carro que
estavam parados nos semáforos, ... e quando carreguei no travão o carro continuou a
deslizar, ...e eu para não bater nos que estavam à minha frente, dei uma guinada no volante,
e fui bater de frente num muro... - esclareceu a rapariga um pouco mais serena.
       - E depois, ...o que fizeste?
       - Depois, ...peguei no telemóvel, e telefonei aos tipos da oficina para irem lá buscar o
carro. Disse-lhes onde estava, e esperei que eles lá chegassem para me vir embora...
       - E eles disseram o que foi?
       - Sim..., foi falta de travões, ...ao que parece, uma das mangueirinhas do óleo tinha
uma fuga, e o nível estava no zero. Desculpa, ...está bem? - esclareceu Isabel ainda um
pouco perturbada.
       - Ouve, já te disse que não há problema nenhum. O que me importa, é que a ti não te
aconteceu nada. Por isso, esquece esse assunto, ...já faz parte do passado, o.k.? - pediu o
irmão, não se preocupando muito com o sucedido - E, a propósito, ...quando é que te
devolvem o carro?
       - Já cá o tenho. Vieram-no entregar hoje de manhã, e até já paguei o arranjo. Antes do
almoço fui dar uma volta com ele, e fiquei contente porque tiraram aquele baralho que eu te
disse, e tiraram aquele risco que tu fizeste na porta.
       - Ainda bem. Pronto, ...então podes esquecer isso duma vez por todas. Tiveste um
acidente, e daí?
       - Sim, vou fazer como dizes... - respondeu a irmã muito mais calma - Mas, diz-me uma
coisa, ...se não recebeste o meu recado, porque razão telefonaste?
       - Ah! É verdade, ainda bem que me lembras, que eu com esta história já me estava a
esquecer!... A Rita, a Sofia, e a Joana resolveram finalmente aceitar o meu convite para
passarem o fim-de-semana connosco, e eu queria prevenir-te que elas amanhã vão comigo -
explicou Jorge, esperando que a irmã não visse qualquer inconveniente em relação àquele
assunto - Não te importas, pois não?
       - Não, claro que não! Na verdade, ainda bem que as trazes... Estou ansiosa para as
conhecer...



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         - Pronto, está assente. Obrigada! - agradeceu Jorge contente pelo anuimento pronto
da irmã - Bem, então posso ficar descansado que tu estás bem, ...certo? - insistiu de novo o
rapaz, querendo certificar-se que de facto Isabel não sofrera quaisquer danos físicos.
         - Sim, ...podes ficar descansado, que eu estou óptima. Só tenho uma nódoa negra no
joelho direito, e ontem doía-me um bocadinho a barriga... - respondeu a rapariga
convictamente.
         - E foste ao médico? - indagou o irmão
         - Não, ...não é necessário... Isto foi só o susto, e aquilo do carro, portanto fica
tranquilo... - esclareceu ela - E, ...mudando de assunto, a que horas chegas amanhã?
         - Não sei bem...
         - Mas, ...não estás a contar chegar tão tarde como na semana passada, pois não?
         - Livra!... Espero bem que não!... Já me chegou uma vez, porra!... Não estou muito... -
principiou, interrompendo-se logo em seguida - Olha, vou ter que desligar, está alguém a
tocar à campainha... Vemo-nos amanhã, está bem? Um beijinho... - concluiu, pousando
rapidamente o auscultador do telefone e, precipitando-se para a porta de entrada, quando
uma vez mais o ruído da campainha ecoou pelo corredor...
         - Boa tarde! - cumprimentou o carteiro, quando Jorge abriu finalmente a porta,
recebendo das mãos do indivíduo um pequeno volume e duas cartas.
         - Obrigado!... - agradeceu o jovem delicadamente, voltando a entrar em casa, e dando
uma vista de olhos pelo correio, constatando com alguma surpresa que a única
correspondência que lhe era dirigida, tinha o remetente do Rio de Janeiro, Brasil...
         Espantado, abriu rapidamente o envelope, desdobrando de imediato o papel que este
trazia no seu interior... De imediato reconheceu a letra de Ana...


         “Jorge, espero que esteja tudo bem por aí. Isto aqui é espectacular. O Rio de Janeiro é uma cidade enorme, e
igualmente linda. As praias são maravilhosas, com areais longuíssimos, e águas límpidas e cristalinas. A vida
nocturna é agitadíssima e as discotecas muito animadas, estão sempre cheias. Eu e o Rui estamos óptimos, e temo-nos
divertido imenso. Espero que tu estejas a aproveitar a minha ausência para fazeres o mesmo.
         ‘Quem disse que a vida não é bela?’
         Um beijo meu e da Paula, e um abraço do meu pai, e outro do Rui.
         Mil beijinhos da tua prima:


                                                                                                               Ana “


         Jorge, sentou-se confortavelmente na cadeira do escritório, e após ter ligado o
computador foi observando com atenção a restante correspondência que era dirigida à prima,
enquanto esperava que o jogo que escolhera entrasse, e com o qual se ocupou durante

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bastante tempo. Por volta das cinco e meia da tarde, o jovem entrou na cozinha, e depois de
beber um copo de água, dirigiu-se para a sala de estar, levando consigo uma apetitosa maçã.
Pegou no livro que começara a ler há já algumas semanas, instalando-se no acolhedor sofá
de pele, trincando descontraidamente a suculenta maçã e lendo em simultâneo. A leitura
ocupou-o por completo até próximo das oito horas, quando por fim ficou a conhecer o
desenlace da história. Nessa altura, voltou a dirigir-se para a cozinha, a fim de preparar o
jantar. No congelador do frigorífico encontrou uma embalagem de lasanha, que apenas teria
de aquecer no forno micro-ondas, para que esta estivesse pronta a comer. Quando por fim
aquela refeição rápida ficou pronta, Jorge abriu o forno e usando uma luva para não se
queimar, pegou no prato em que espalhara a lasanha, pousando-o sobre a mesa.
       - Porra..., esqueci-me outra vez de comprar cerveja! - exclamou, pegando desiludido
numa lata de sumo de laranja, continuando a lamentar-se pelo seu esquecimento, sentando-
se finalmente à mesa.
       A seguir à refeição o jovem juntou toda a louça que utilizara e arrumou-a
cuidadosamente no interior da máquina de lavar, onde já se encontrava também uma
quantidade apreciável de louça suja. Por isso, Jorge decidiu-se a premir o botão que fazia
funcionar o aparelho de modo a que este pudesse lavar tudo aquilo que ele fora acumulando
às refeições durante vários dias. Mais tarde, voltou a sentar-se comodamente no confortável
sofá da sala de estar, descansando as pernas, como era hábito em cima da pequena e
elegante mesa de madeira escura que se encontrava ao centro da dependência, enquanto
esperava pelo filme que ia ser transmitido por um dos canais de televisão naquela noite...
       A manhã seguinte surgiu de novo escura e fria à semelhança do dia anterior, e
embora não chovesse, a verdade é que o intenso nevoeiro que se formara durante a noite,
tornava mais desolador um cenário que era por si só suficientemente sombrio. Por sorte,
Jorge não tinha qualquer aula naquela manhã, pelo que já passavam alguns minutos do
meio-dia, quando por fim ele se decidiu a sair debaixo do aconchego que lhe era
proporcionado pelos inúmeros cobertores que tinha na sua cama, dirigindo-se de imediato
para o quarto de banho a fim de tomar o seu habitual duche matinal, que tanto apreciava.
       Logo após terem soado as treze horas no antiquíssimo relógio da sala de estar, Jorge,
terminou o almoço, e precipitando-se para a entrada da habitação, pegou apressadamente
nos seus livros, saindo rapidamente, e fechando a porta atrás de si com um provocando um
estrondo enorme. Depois, em passo de corrida, encaminhou-se para o espantoso BMW M3
coupé, que permanecia estacionado em frente da habitação. Já no interior do automóvel,
rodou a chave na ignição, arrancando de uma maneira um tanto brusca, o que provocou que
os pneus do veículo tivessem deixado alguma borracha agarrada ao asfalto irregular daquela
estrada. Um pouco mais à frente, o jovem virou à direita num cruzamento, tomando o



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  • 1. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 CARTEL FANTASMA Alexandre Figueiredo Novembro de 1995 1
  • 2. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo Capítulo 1 - Jorge?!... - Sim, sou eu... Cheguei em má altura, foi? - começou o jovem entrando na espaçosa sala em que a sua prima Ana e um rapaz que ele desconhecia, estavam sentados, vendo um filme. - Não, claro que não - respondeu a rapariga um pouco atrapalhada - chega aqui por favor - pediu - quero apresentar-te o meu namorado, o Rui Pedro. - Ela fala muito de ti - disse o outro, estendendo-lhe a mão direita, enquanto que mantinha a esquerda sobre os ombros de Ana, acariciando-lhe suavemente o cabelo castanho ondulado. - Bom, foi um prazer conhecer-te, ... - declarou Jorge encaminhando-se para a saída da sala de estar - mas fiquem à vontade que eu vou só ao quarto buscar umas coisas e saio já... - Vais-te já embora? - inquiriu a prima, com um brilho nos olhos castanhos que não enganava ninguém; ela estava ansiosa para se livrar do recém-chegado, para poder ficar de novo a sós com o companheiro. - Sim, prometi à Isabel que chegava antes das nove, e já são sete e cinco! Estive com a Rita, a Joana e a Sofia no salão de jogos e atrasei-me um pouco - concluiu, abandonando aquela divisão e dirigindo-se ao quarto que ocupava e que ficava ao fundo do enorme corredor. Alguns minutos mais tarde, voltou a entrar na sala de estar, no intuito de se despedir da prima. - Bom fim-de-semana! - exclamou, beijando Ana na face, e apertando a mão a Rui Pedro - Portem-se bem! - recomendou, sorrindo maliciosamente pegando nos dois sacos de viagem que deixara à entrada da sala, e encaminhando-se para a porta de entrada, enquanto que a rapariga e o seu namorado se voltavam a sentar muito juntinhos no confortável sofá. Por fim, saiu, fechando a porta atrás de si. Depois de cruzar o portão lançou um rápido olhar sobre a rua deserta, iluminada apenas pelos escassos candeeiros de iluminação pública. Soprava uma ligeira brisa que lhe levantava os cabelos louros. Caminhou tranquilamente alguns metros no passeio, e atravessou a estrada ainda molhada em consequência da chuva que caíra na manhã daquele dia de Dezembro, dirigindo-se ao seu automóvel que estava estacionado do outro lado da rua. Abriu em primeiro lugar o porta- bagagens , onde colocou os dois sacos de viagem que transportava, entrando de seguida no 2
  • 3. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 Rover preto. Rodou a chave na ignição e arrancou calmamente, logo que o motor começou a funcionar. Após ter percorrido alguns metros, tomou a estrada que conduzia a Coimbra... Jorge, era estudante do primeiro ano do curso de Direito da Universidade de Coimbra, e partilhava com a sua prima Ana uma habitação que pertencia aos pais da rapariga. Ele, contava com vinte anos de idade, tinha cabelos louros, e olhos azuis. Era bastante alto, e fisicamente muito forte, e para além disso praticava também karaté, o que fazia qualquer um pensar duas vezes antes de o desafiar para alguma luta... Naquele momento, o jovem cruzava uma das principais avenidas da cidade de Coimbra, e que dava acesso à auto-estrada. Contudo, aguardava-o uma surpresa desagradável... - Grande merda! Só faltava mais isto! - desabafou, muito pouco satisfeito, quando alguns metros mais adiante foi forçado a parar atrás de uma interminável fila de trânsito. Jorge aguardou serenamente até que os automóveis que estavam parados à sua frente começassem a andar. Contudo, estes permaneceram imóveis, e ele resolveu ligar o auto-rádio no intuito de se distrair. Alguns minutos mais tarde, porém, a música foi interrompida pela voz de um locutor que anunciou: “ - Em Lisboa e Porto , o trânsito processa-se com normalidade e não existam filas... A situação mais complicada regista-se em Coimbra nos acessos ao IP1 e à auto-estrada, onde o embate entre dois pesados provocou um engarrafamento enorme, impedindo assim a fluidez do tráfego... Também em... “ Ele, colocou uma cassete no auto-rádio e ao som da música que esta continha esperou pacientemente que a circulação fosse restabelecida, o que aconteceu cerca de quarenta e cinco minutos mais tarde, quando por fim o veículo que se encontrava imobilizado à sua frente retomou a marcha aumentando progressivamente de velocidade. Porém, somente alguns instantes mais tarde, o jovem estudante conseguiu entrar na via de acesso à auto-estrada, constatando que de facto haviam colidido dois veículos pesados, e que apesar de terem sido já retirados para a berma continuavam a obstruir uma boa parte da estrada, dificultando a passagem ao intenso trânsito. “ - Agora é sempre a andar! “ - pensou aliviado, quando parou na portagem para retirar o titulo que deveria apresentar à saída, e olhando para os ponteiros do seu relógio de pulso, acrescentou ainda - porra, já são oito e dez! A Isabel não vai ficar nada satisfeita! Jorge, efectuou ainda uma curta paragem na Área de Serviço de Pombal, de modo a encher o depósito de combustível do seu automóvel, retomando a viagem não muito tempo depois... Alguns instantes após ter saído da auto-estrada, já no acesso a Santarém, o telefone que estava instalado no veículo tocou, e ele apressou-se a responder: 3
  • 4. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo - Ah, és tu, Isabel!? - inquiriu quando identificou a voz da personagem que do outro lado da linha lhe falava - Não,... não me demoro muito... acabei agora mesmo de sair da portagem - explicou, fazendo uma breve pausa para escutar aquilo que a rapariga lhe dizia - Pronto, está descansada, eu estou quase aí,... depois falamos, o.k.? - concluiu, voltando a pousar o auscultador do aparelho, e centrando de novo a sua a tenção na condução. Cerca de quinze minutos mais tarde, já no interior da cidade de Santarém, entrou numa rua deserta, olhando atentamente para a sua frente. Lá ao fundo, erguia-se o edifício onde habitava com a sua irmã. O automóvel contornou o prédio de apartamentos, e nas traseiras do mesmo, dirigiu-se para uma entrada que dava acesso à cave, que servia simultaneamente de garagem e arrecadação. Jorge, estacionou o Rover preto que conduzia, ao lado do BMW amarelo que também lhe pertencia, e depois de ter aberto o porta-bagagens, retirando do seu interior os dois sacos de viagem que trouxera de Coimbra, deu alguns passos para a direita, encaminhando-se para o elevador... No momento em que pousou a bagagem no chão, à entrada do seu apartamento para abrir a porta, deu uma rápida olhadela para o seu relógio de pulso. Faltavam então cinco minutos para as dez horas da noite. Rodou a chave na fechadura e entrou, fechando a porta atrás de si. - És tu, Jorge? - perguntou uma voz do interior da habitação. - Sim, Isabel, sou eu... - respondeu ele, carregando os sacos até à entrada de um espaçoso e comprido corredor - Onde estás - inquiriu ainda. - Estou na cozinha - gritou Isabel, enquanto o irmão se dirigia para aquela divisão - Nunca mais chegavas e eu já estava a ficar preocupada. Pensei que te tivesse acontecido alguma coisa. Porque é que te atrasaste tanto?... - questionou a rapariga colocando dois pratos sobre a mesa. - O trânsito em Coimbra estava infernal - justificou-se o jovem, aproximando-se da irmã puxando-lhe os longos cabelos dourados e apanhando-os, fazendo um rabo-de-cavalo, enquanto a beijava suavemente na face - Como é que te correu o dia? - Bem,... - respondeu ela, beijando-o igualmente no rosto, e olhando-o fixamente através dos seus lindos e intensamente brilhantes olhos azuis - Então e a Ana, como é que está? - Ela está óptima! - principiou ele rindo-se - Na verdade deve estar na maior. Quando eu me vim embora ficou sozinha com o namorado, por isso, deve estar radiante. Ainda por cima eu não estou lá para atrapalhar... - concluiu com um sorriso malandro. - Já entendi,... não precisas de dizer mais nada! - disse, sorrindo, o que deu origem a que no seu rosto angelical aparecesse uma covinha muito original - Vocês homens, são todos 4
  • 5. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 iguais! Bom, senta-te que o jantar está pronto - anunciou ela, pegando num tabuleiro que pousou sobre a mesa, sentando-se em seguida. - Bacalhau com Natas! - exclamou Jorge, satisfeitíssimo - És um amor!... Ambos saborearam tranquilamente aquela esplêndida refeição, enquanto relatavam um ao outro os acontecimentos mais significativos da semana que estava prestes a terminar. Após o final do jantar, os dois irmãos lavaram e secaram a louça em conjunto, sentando-se depois ambos no confortável sofá da sala de estar, perto da lareira onde ardiam alguns pedaços de lenha, que aqueciam o ambiente, tornando-o bastante mais acolhedor. Ainda ligaram o televisor porém, como nenhum dos programas lhes agradou, Isabel dirigiu-se ao fundo da sala e ligou a excelente aparelhagem de som, que se encontrava arrumada entre os dois pequenos sofás individuais. Ambos permaneceram naquela divisão ouvindo música, até que no relógio de parede baterem as zero horas... - Vou-me deitar! - anunciou ele, e passando com a sua mão sobre os longos cabelos louros da irmã - Também vens? - inquiriu por fim, pondo-se de pé. - Não,... acho que ainda vou ficar mais um pouco - respondeu a rapariga com uma voz doce e meiga - não tenho sono, por isso, talvez vá ler um pouco... - Então não fiques levantada até muito tarde - recomendou o rapaz aproximando-se dela - Até amanhã! Dorme bem! - acrescentou, beijando-a com ternura na testa, ao que ela respondeu com um boa-noite, envolvendo com os seus braços frágeis e delicados os ombros fortes e musculados do irmão, num gesto de apreço e amizade. Assim Jorge, abandonou aquele espaço, e encaminhou-se para o quarto de dormir que habitualmente ocupava, enquanto que Isabel se dirigiu até à magnífica estante da sala de onde retirou um livro, que instantes mais tarde folheava serenamente. Contudo, não muito tempo depois os seus olhos começaram progressivamente mais pesados, e as letras impressas no livro desfocavam... O cansaço vencera, e a jovem adormecera profundamente, confortavelmente enroscada no acolhedor sofá de pele... - Isabel!... - chamou Jorge baixinho, quase sussurrando ao ouvido da irmã, e abanando suavemente o seu corpo adormecido - Isabel!... Que fazes tu aqui? - questionou, quando por fim ela abriu os olhos. - Isso pergunto eu, - respondeu a rapariga, afastando os cabelos que entretanto lhe tinham caído sobre o rosto, e bocejando longamente - deixa-me dormir!- pediu ainda, virando- se para o outro lado. - Então,... vá lá, vai-te deitar - continuou ele pacientemente. - Mas,... mas,... onde estou eu? - interrogou-se, compreendendo finalmente que não estava deitada na sua cama, mas sim no sofá da sala de estar - Devo ter adormecido! - concluiu, pegando no livro que havia caído no chão. 5
  • 6. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo - Eu vim beber água, e fiquei admirado quando ainda vi luz aqui - esclareceu o rapaz - Depois, quando te vi, percebi logo que te tinhas deixado dormir... Bom, vamos lá deitar-nos... - Desculpa lá,... não foi com intenção... Jorge conduziu a irmã até ao quarto dela, e em seguida regressou ao seu, deitando-se sem mais delongas. Cinco minutos, foi o tempo que Isabel demorou até se encontrar enrolada no meio dos lençóis e cobertores, adormecendo quase de imediato. Em breve aquele magnífico apartamento voltou a ficar mergulhado num silêncio quase absoluto... A manhã de Sábado surgiu bastante luminosa, com o sol a brilhar intensamente no azul do céu, aqui e ali salpicado por uma ou outra nuvem mais persistente. a temperatura estava amena, e na rua uma fresca e agradável brisa. Passavam apenas alguns minutos das dez e meia da manhã quando Jorge acordou, encaminhando-se em seguida para o quarto de banho. Tomou um prolongado duche, surgindo algum tempo depois com um toalhão enrolado à volta da cintura. Vestiu-se, e dirigiu--se para o quarto da irmã. Deu três pancadinhas suaves na porta e, não obtendo qualquer resposta rodou a maçaneta, entrando silenciosamente. Aproximou-se da cama onde Isabel descansava tranquilamente e ajoelhou-se no chão, observando fascinado a beleza angelical do rosto adormecido da irmã. Alguns dos compridos louros da rapariga pendiam-lhe sobre a face, brilhando intensamente devido à incidência da luz solar que irrompia pelas frinchas da janela fechada, iluminando palidamente o quarto ainda mergulhado na escuridão. Jorge não resistiu e passou suavemente a sua mão, primeiro pelos cabelos, e depois pelo rosto sereno e tranquilo da jovem, o que deu origem a ela despertasse quebrando aquele momento de magia. - Olá, bom dia! - saudou a rapariga na sua voz doce e ternurenta. - Bom dia, dormiste bem? - indagou ele, beijando-a suavemente na face. - Sim, foi óptimo. Há já muito tempo que não acordava e me sentia assim,...,...tão bem! - respondeu, bocejando longamente e beijando o irmão no rosto. - Então arranja-te, e vem ter comigo à sala, o.k.? - pediu ele, com um ar muito misterioso, e abandonando o quarto a fim de a deixar à vontade... Cerca de trinta minutos mais tarde após Jorge se ter confortavelmente sentado no sofá da sala, surgiu por fim Isabel, usando um elegante vestido preto. - Estás linda! - observou o rapaz, observando-a atentamente - Mas falta qualquer coisa,... - acrescentou, abrindo uma pequena caixinha de onde retirou um reluzente fio de ouro - ... talvez um fio não ficasse mal no teu pescoço. - É tão lindo! - exclamou ela surpreendida - Lembraste-te? - perguntou, olhando para ele fixamente, através dos seus magníficos olhos azuis. - Feliz aniversário! - começou o jovem dando alguns passos na da rapariga, mostrando-lhe o seu presente - Segura os cabelos, por favor... - pediu, colocando-lhe o fio à 6
  • 7. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 volta do pescoço - pronto, já está, podes largar os cabelos - anunciou ele, enquanto ela se aproximava do espelho que estava pendurado numa das paredes. - Obrigado!... És um amor!... Eu,... não tenho palavras! Desde que te conheci tens sido tão bom para mim, e eu nunca te conseguirei mostrar o quanto gosto de ti. Tu és maravilhoso!... Obrigado... - acrescentou, não conseguindo com a emoção evitar uma lágrima mais teimosa que lhe surgira ao canto do olho. - Bom, é quase meio-dia, por isso é melhor irmos... - anunciou ele, olhando para os ponteiros do seu relógio de pulso. - Onde vamos? - perguntou Isabel, ardendo em curiosidade, e tentando descobrir através da expressão de Jorge descobrir qual seria a sua ideia. - Já vais ver! - respondeu ele, mantendo o mesmo ar enigmático e sorridente... O jovem conduziu a irmã até à porta e saíram ambos, entrando em seguida para elevador, que os levou até à cave do majestoso edifício. Aí, dirigiram-se ambos para o BMW M3 amarelo que estava estacionado ao lado do Rover, e entraram. Jorge, rodou a chave na ignição, e aguardou que o ruído do motor em funcionamento se fizesse ouvir. Depois, engrenou a primeira velocidade, e abandonou calmamente a garagem subterrânea daquele prédio de apartamentos... - Onde é que queres almoçar? - inquiriu o rapaz, quando cerca de vinte minutos após terem saído de casa se encontravam numa das mais movimentadas avenidas de Almeirim. - Ali! - respondeu de pronto a jovem, apontando com o indicador direito para uma construção de dois pisos que se situava uns quantos metros mais à frente, na esquina do cruzamento entre duas ruas. caminharam alguns metros, e entraram ambos no restaurante. Já no interior do estabelecimento, escolheram uma mesa próxima da janela, e sentaram-se aguardando que um funcionário lhes trouxesse a ementa. Cerca de meia hora mais tarde, o empregado deixou em cima da mesa duas travessa com aquilo que tinham pedido; Carne de Porco à Alentejana, acompanhada de batatas fritas e amêijoas que ambos saborearam, enquanto conversavam animadamente. Terminaram a refeição bebendo um cremoso café, tendo-se ainda deliciado com uma esplêndida sobremesa, que comeram entre o prato principal e o café. Em seguida, Jorge pagou a despesa, e os dois irmãos abandonaram aquele restaurante, encaminhando-se para o BMW amarelo que ficara estacionado não muito longe daquele local. - Onde é que vamos? - perguntou Isabel, quando concluiu que o irmão não tomara a estrada que conduzia a Santarém. - Eu espero não me enganar... - principiou ele, olhando receoso para as muitas nuvens que entretanto haviam coberto o céu azul - ... a ideia, seria irmos ver o pôr-do-sol à Nazaré, e jantarmos lá - esclareceu por fim, virando-se para a irmã, que sorria radiante - mas 7
  • 8. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo se as coisas continuarem como estão, palpita-me que o que vamos ver é uma bela chuvada. - Então queres dizer que não vamos? - questionou Isabel, olhando para ele com uma expressão triste nos seus brilhantes olhos azuis. - Não, claro que vamos! - esclareceu ele peremptoriamente passando a palma da mão com ternura sobre os ombros de Isabel - É evidente que vamos, quanto mais não seja para vermos as ondas do mar, que nesta altura do ano são espectaculares - acrescentou por fim, voltando a colocar a sua mão direita no volante. ... - Lindo, não é? - perguntou Jorge, virando-se para a irmã que continuava sentada a seu lado, observando as monstruosas muralhas água que se desfaziam em enormes manchas de espuma de encontro aos rochedos que ficavam dentro do mar, não muito longe do extenso areal, que do local onde se encontravam facilmente podiam ver. - Se pelo menos parasse de chover, poderíamos sair e ver melhor - lamentou-se Isabel com uma expressão cabisbaixa. - Tem calma, - tranquilizou-a ele - temos muito tempo, ainda é tão cedo, são... - continuou o jovem fazendo uma breve pausa para consultar o seu relógio de pulso - ... seis menos um quarto, por isso. - Mas depois começa a anoitecer, e aí é que não vemos mesmo nada - replicou ela. Porém, alguns minutos mais tarde, a chuva parou de cair, e ambos puderam então sair do automóvel, aproximando-se uma falésia, embora muito cuidadosamente, pois, o pavimento estava muito escorregadio devido à chuva que caíra momentos antes, e por isso o risco de quedas era bastante grande. - Vê! - exclamou Jorge de súbito, apontando para o horizonte - ali,... - acrescentou, indicando com o dedo à irmã aquilo que vira - Afinal parece que sempre vamos ver o pôr-do- sol! - concluiu sorridente, quando lá ao longe se começavam a vislumbrar alguns raios de sol, que tentavam irromper pelas espessas e numerosas nuvens, que continuavam a cobrir ameaçadoramente o céu, prometendo chuva. - É maravilhoso! - observou a rapariga, radiante - Repara,... nos sítios onde os raios brilham parece que existe uma espécie de nevoeiro amarelo,... é lindo... Os dois jovens, ficaram ainda por mais algum tempo a observar maravilhados aquele cenário deslumbrantemente belo, tendo ainda oportunidade de assistir ao pôr-do-sol. Porém, depois do último raio de sol ter desaparecido no horizonte, não demorou muito tempo até que silenciosamente a noite chegasse, envolvendo tudo ao redor numa penumbra cada vez mais escura, sendo acompanhada por uma acentuada descida de temperatura... - Tenho frio! - anunciou Isabel, abotoando mais alguns botões no casaco que trazia vestido. 8
  • 9. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 - Tens razão, - concordou o irmão - arrefeceu bastante... - prosseguiu, deitando um último olhar para o mar, antes de conduzir a rapariga até ao automóvel em que haviam chegado até ali - Bom, vamos procurar um restaurante para jantarmos - concluiu por fim, usando o controle remoto para destrancar as portas do veículo, vestindo também ele o casaco que trouxera consigo, entrando no interior do BMW coupé logo em seguida. Dirigiram-se para o centro daquela pitoresca vila do litoral , e depois de deixarem o carro parado num parque de estacionamento, percorreram tranquilamente a pé algumas centenas de metros na avenida marginal. Finalmente, encontraram um restaurante com o qual simpatizaram de imediato, por causa da sua fachada tipicamente tradicional, e resolveram entrar. Sentaram-se numa mesa perto de uma das janelas, e optaram por experimentar um prato de Caldeirada, que algum tempo depois ambos saboreavam com satisfação, enquanto conversavam animadamente. Como sobremesa, escolheram um delicioso Doce de Amêndoa, e terminaram aquela refeição bebendo o habitual café, abandonando o sossegado restaurante logo após Jorge ter liquidado a despesa. Em ritmo de passeio turístico percorreram calmamente em sentido contrário a avenida marginal, que naquele momento se encontrava quase deserta, sendo apenas iluminadas pela lua, e pelos candeeiros de iluminação pública. De súbito, o ruído da rebentação das ondas na praia foi abafado por um outro; começara a chover naquele preciso instante, intensificando-se muito rapidamente. - Corre! - pediu Jorge a Isabel, que acelerou o passo, colocando-se ao seu lado - Vá lá, mais depressa, senão vamos ficar totalmente encharcados - insistiu o jovem. - Encharcados já nós estamos! - replicou a rapariga, sorrindo satisfeita, começando a correr, enquanto passava as mãos pelos longos cabelos louros que estavam já bastante molhados - É maravilhoso! - exclamou radiante, quando por fim chegaram próximo do BMW amarelo, entrando ambos rapidamente no interior do mesmo, a fim de se abrigarem da chuva, que caía em grande quantidade lá fora... - Atchiiiim! - começou o rapaz, rodando a chave na ignição, e colocando o potente motor do automóvel em funcionamento - Porra, de certeza que me vou constipar! - lamentou- se, acrescentando ainda - Burro, porque é que não trouxeste o chapéu-de-chuva? - Deixa lá, respondeu Isabel confortando-o, enquanto passava a sua mão pelos cabelos molhados do irmão - quando chegarmos a casa, tomamos um bom banho, bebemos qualquer coisa bem quente, e vamos logo deitarmo-nos, o.k.?... Aproximadamente hora e meia depois de terem deixado a pitoresca vila de Nazaré, entraram na cave do prédio em que habitavam. Jorge, estacionou o automóvel no local habitual, e ambos subiram apressadamente até ao apartamento deles, de modo a poderem trocar aquelas roupas molhadas que provocavam arrepios de frio em ambos. Tomaram um 9
  • 10. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo prolongado e reconfortante banho, e após terem vestido os pijamas e robes de chambre, encaminharam-se para a cozinha, onde Isabel preparou um cacau bem quente, que beberam ambos, acompanhando a bebida com alguns biscoitos de chocolate. - Bom, vou-me deitar - anunciou Isabel, bocejando longamente - Também vens? - inquiriu ainda, passando as mãos pelo largos e robustos ombros do irmão. - Sim, também estou cheio de sono - respondeu o rapaz, conduzindo a irmã para o compridíssimo corredor que dava acesso aos quartos de dormir, desligando os interruptores de luz à medida que ia passando por eles. - Obrigado, Jorge!... Foi um dia maravilhoso!... - começou Isabel, já à porta do seu quarto - És um amor... - continuou a rapariga, tentando encontrar as palavras certas para exprimir aquilo que sentia - és,... estupendo,..., e foste a melhor coisa que me aconteceu... - Ainda bem que gostaste - respondeu ele, satisfeito por ter agradado à irmã - Boa noite, e bons sonhos! - exclamou o jovem por fim. - Para ti também! - acrescentou a irmã, beijando-o suavemente na face, e tentando através daquele ternurento beijo exprimir toda a alegria e gratidão que sentia naquele momento - Até amanhã! - concluiu ela sorrindo radiante... Jorge passou ainda a sua mão delicadamente pela pele macia do rosto dela, abraçando-a também de encontro a si, encaminhando-se depois para o seu quarto de dormir, enquanto que Isabel fechava a porta. Deitaram-se ambos quase de imediato, e não demorou muito tempo até que estivessem os dois mergulhados num tranquilo e profundo sono. Contrastando com o ambiente calmo e silencioso que se verificava no interior daquele magnífico apartamento, lá fora, no entanto, recomeçara a chover, com uma intensidade apreciável, acompanhada por algumas rajadas de vento que de vez em quando se faziam sentir com alguma violência... A manhã seguinte surgiu bastante desagradável. Para além da chuva que teimara em ficar, associaram-se-lhe ainda um frio intenso, e o vento forte, que já se havia feito sentir durante a noite, mas que agora marcava a sua presença de uma forma mais vigorosa e regular. Passavam já alguns minutos do meio-dia, quando Isabel, que fora a primeira a levantar-se, se sentou no sofá de sala de estar, entretendo-se com uma revista. Não tardou muito até que a cabeça de Jorge assomasse à entrada da porta da espaçosa divisão. - Bom dia! - cumprimentou ele. - Olá, então, dormiste bem? - inquiriu a rapariga, enquanto trocavam um beijo. - Sim, foi uma noite óptima - respondeu o jovem sentando-se ao lado da irmã, no confortável sofá de pele - Bem, vou comer qualquer coisa, porque tenho aí uns apontamentos que a Sofia me emprestou, e tenho também que rever algumas matérias, por isso, não posso 10
  • 11. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 perder muito tempo. - A que horas é que voltas para Coimbra? - indagou Isabel pousando a revista sobre a pequena e elegante mesa de madeira escura que se encontrava no meio da sala. - Não sei bem, mas não é muito conveniente sair muito depois das oito, porque senão só lá chego à uma e tal, como aconteceu na semana passada, e amanhã tenho aulas às oito e meia... - esclareceu o rapaz, levantando-se, e encaminhando-se para o corredor - Vou almoçar, vens comigo? - pediu ainda. Os dois jovens dirigiram-se então para a cozinha. Jorge, foi ao congelador do frigorífico, retirando de lá uma embalagem de pizza congelada, que a irmã colocou dentro do forno de micro-ondas. Alguns minutos mais tarde saboreavam ambos com prazer aquela refeição rápida, que acompanharam com sumo de laranja. Em seguida Jorge, foi ao seu quarto de dormir, pegou nos seus livros e nuns quantos cadernos de apontamentos, e fechou- se no magnífico e espaçoso escritório da habitação, que tinha igualmente a função de biblioteca. Isabel, pelo contrário, depois de ter colocado os pratos e a restante louça de que se haviam servido ao almoço na máquina de lavar louça, regressou à sala de estar, e sentou- se num dos mapples lendo um livro e ouvindo música em simultâneo. Os dois irmãos, permaneceram totalmente absorvidos nas suas ocupações, até cerca das cinco da tarde. A essa hora Jorge, fez uma pausa nos estudos, e foi até à cozinha no intuito de lanchar. Porém, passou em primeiro lugar pela divisão, onde Isabel continuavam totalmente absorvida pela leitura. - Queres vir lanchar? - perguntou, enquanto carinhosamente fazia um rabo-de-cavalo com os longos cabelos da irmã. - Não, agora não me apetece. Mas quando acabar sou capaz de ir trincar qualquer coisa - respondeu ela, olhando-o através dos seus expressivos e brilhantes olhos azuis - Já só faltam quarenta páginas, por isso agora quero ficar a saber qual é o final da história - rematou, voltando a centrar a sua atenção no livro. Jorge, dirigiu-se para a cozinha, e pegou numa maçã que mastigou rapidamente, regressando logo depois ao escritório. Isabel por seu lado, continuou entretida com a leitura durante mais uns quantos minutos. Quando por fim terminou, levantou-se e foi até à cozinha. Comeu alguns biscoitos, que acompanhou com um copo de sumo de laranja. Em seguida, começou calmamente a preparar o jantar. Passavam alguns minutos das seis e meia, quando o irmão se juntou a ela na cozinha... - Queres ajuda? - perguntou aproximando-se dela, que observava atentamente o jantar que cozinhava no forno. - Não, não é preciso. Mas, se quiseres ir arrumar as tuas coisas, sempre é trabalho 11
  • 12. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo que adiantas, que o jantar ainda deve levar aí uns vinte minutos. O jovem deixou a cozinha, e entrando no espaçoso corredor subiu as escadas que conduziam ao andar superior, onde se situava o seu quarto de dormir, assim como o de Isabel, e ainda um terceiro. Após ter entrado nos seus aposentos, colocou cuidadosamente algumas roupas dentro de um dos sacos de viagem que trouxera de Coimbra, enquanto que reservou o outro para guardar os seus livros e cadernos de apontamentos. Em seguida, retornou ao piso inferior, deixando a bagagem no hall de entrada junto à porta, encaminhando-se posteriormente para a cozinha. - Queres que ponha a mesa? - ofereceu, abrindo uma gaveta pegando numa toalha que estendeu sobre a mesa. - Sim, o jantar está pronto, por isso se não te importas... - respondeu a rapariga, enquanto abria o forno, puxando para fora um tabuleiro onde se podia observar um apetitoso peixe assado com pequeninas batatas igualmente assadas. Jorge, espalhou ainda sobre a toalha de linho branca os pratos e talheres, bem como os guardanapos e os copos. Em seguida, sentaram-se ambos nas cadeiras, e principiaram a saborear aquela refeição preparada por Isabel. - A que horas te vais embora? - perguntou Isabel, olhando para os ponteiros do relógio que estava pendurado na parede por cima da cabeça do irmão, que indicavam passarem exactamente dezasseis minutos das sete da tarde, levando o garfo à boca. - Vamos beber café, e quando voltarmos eu deixo-te lá em baixo na entrada, e sigo - esclareceu ele, passando o guardanapo pelos lábios, e terminando a sua bebida... ... - Guia com cuidado... - recomendou Isabel, quando cerca de quarenta minutos mais tarde, ambos se encontravam nos degraus que davam acesso à entrada principal do edifício onde habitavam. - Não te preocupes, serei prudente - descansou-a ele, sorrindo, no momento em que um pingo de água caiu em cima dela - Vá, vai para dentro que está a começar a chover... - Está bem - concordou a rapariga, abraçando o irmão uma última vez, antes de este entrar para o BMW amarelo que estava estacionado ali mesmo junto a eles - Faz boa viagem - acrescentou por fim , subindo depois apressadamente os degraus até se encontrar protegida da chuva, que entretanto aumentara de intensidade, vendo ainda o automóvel que Jorge conduzia, afastar-se rapidamente, até desaparecer totalmente, na sinistra escuridão da noite... A chuva que caía com abundância não impediu no entanto que o jovem efectuasse a sua viagem. Alguns minutos depois de ter saído de Santarém, parou na portagem da auto- estrada de modo a retirar o título que aproximadamente duas horas mais tarde entregou ao 12
  • 13. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 portageiro, na saída da via rápida em que circulara. Eram quase dez e meia, quando o veículo que o rapaz conduzia estacionou em frente da casa dos pais de Ana, a prima com quem dividia a habitação. Após ter retirado do porta- bagagens as duas malas, trancou o carro, usando o comando à distância, e dirigiu-se de imediato para a porta de entrada da vivenda, entrando sem mais delongas. - Ana! - chamou, avançando às escuras pelo corredor, e constatando com alguma surpresa que não havia qualquer divisão iluminada - Ana! - insistiu o jovem, ligando o interruptor, e atirando as chaves do BMW para cima da pequena mesa da entrada, sobre a qual se encontrava o telefone - Ana, onde estás? - chamou de novo, percorrendo todo o comprido corredor, e concluindo por fim que não se encontrava ninguém em casa... Após ter transportado a bagagem até ao seu quarto de dormir, entrou na ampla sala de estar da habitação, e sentou-se confortavelmente no sofá. Quando esticou a mão até à mesinha que se encontrava no centro daquela dependência, para agarrar no controlo remoto do televisor, reparou num pequeno envelope endereçado a si. Abriu-o, e desdobrou o papel que estava no seu interior, reconhecendo de imediato a letra da prima: “Jorge, vou passar as férias de Natal ao Brasil! Eu sei que deves ficar surpreendido, mas quem nos convidou foi a mãe da minha madrasta. A princípio ainda hesitei, mas depois acabei por aceitar, quando o meu pai me disse que o Rui Pedro também podia ir. Partirei amanhã Domingo), e só voltarei no início de Janeiro para os exames. Agora que estás sozinho em casa, vê lá o que fazes. Porta-te bem!... Mil beijinhos da tua prima: Ana” Jorge, estava de facto surpreendido. Rapidamente voltou a ler a carta, não acreditando naquilo que lia. - “ Não pode ser! “ - pensava, enquanto pousava a carta sobre a mesa, e pegava no comando do televisor - “ Sortuda!... Ao Brasil hem!?... Que pinta!... “ - disse em voz alta, passando os pés por cima da pequena mesa de madeira, ao mesmo tempo que se esticava no sofá, de modo a encontrar uma posição o mais cómoda possível - “ Afinal, vendo bem as coisas a viagem dela até tem algumas vantagens, senão vejamos; a casa é toda minha durante três semanas, que óptimo!... “ - acrescentou ainda, sorrindo radiante. Permaneceu estendido no sofá com os pés assentes na mesa durante mais alguns momentos. contudo, e como a programação televisiva não lhe agradava, optou por ir dormir, até porque na manhã seguinte as aulas começavam bem cedo. Assim, dirigiu-se ao seu quarto de dormir, deitando-se breves instantes depois. Ao contrário daquilo que era habitual, Jorge, demorou bastante tempo até adormecer. Porém, o cansaço acabou por vencer, e quando no mostrador digital do relógio despertador, apareceram as zero horas, já o jovem 13
  • 14. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo estava mergulhado num profundo e tranquilo sono... Fim do 1º Capítulo 14
  • 15. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 Capítulo 2 - “ Antena 3,... bom dia,... são sete horas!... Vamos às notícias com...” Jorge despertou, e ainda bastante ensonado esticou o braço e desligou o rádio. Em seguida, levantou-se e bocejando bastante encaminhou-se para o quarto de banho., tomando o seu habitual prolongado duche matinal. Após se ter vestido, dirigiu-se à cozinha e bebendo um iogurte líquido, pegou nos livros, vestiu o blusão, e abriu a porta de entrada da habitação... - “ Que frio!... “ - exclamou arrepiado - fechando a porta atrás de si, e percorrendo apressadamente a curta distância que o separava do BMW M3 coupé amarelo. Entrou no automóvel, atirando os livros para o assento do lado, e logo após ter ouvido o ruído característico do motor em funcionamento, engrenou a primeira velocidade, e arrancou bruscamente, fazendo patinar os pneus no asfalto húmido. Já em Coimbra, deixou o veículo num parque de estacionamento próximo da Universidade, cruzando os portões da sua faculdade às oito e meia em ponto. Por isso, não perdeu tempo, encaminhando-se logo para a sala de aulas... ... - Jorge!... - chamou uma voz feminina, quando o jovem percorria tranquilamente o extenso corredor do edifício, dirigindo-se para o anfiteatro onde teria a aula seguinte. - Rita..., olá! - exclamou, virando-se para trás e reconhecendo a cara sorridente da rapariga que se aproximava dele - Onde estão a Sofia e a Joana? - inquiriu surpreendido por encontrar a colega sozinha. - Só vêm para a próxima semana. Tinham uns trabalhos para fazer, e por isso resolveram ficar mais uns dias no Porto... - esclareceu a jovem beijando-o na face. - Já se resolveram a aceitar o meu convite? - perguntou ansioso - Acerca do fim-de-semana? - indagou a rapariga, fazendo uma breve pausa, e prosseguindo após um sinal afirmativo de Jorge - Elas dão-te a resposta quando voltarem, pode ser?... - Sim, claro - anuiu ele, olhando de repente para o relógio de pulso - Porra, já estou atrasado! - exclamou muito pouco satisfeito - Tenho que ir,... - anunciou, - almoças comigo? - propôs ainda. - Não posso, tenho que preparar uns apontamentos, - respondeu a colega - mas se quiseres podemos jantar juntos, podes ir lá ter..., às... oito! - sugeriu ela. - Está bem, - concordou o jovem - então até logo, ...às oito - concluiu por fim, dirigindo- 15
  • 16. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo se apressadamente para a porta do anfiteatro que ficava um pouco mais à frente... Duas horas e meia mais tarde o espantoso BMW amarelo parava a alguns metros de distância da habitação que Jorge ocupava com Ana, sua prima, e que pertencia aos pais da rapariga. O rapaz, pegou nos seus livros, atravessou rapidamente a estrada, e entrou em casa, depois de ter rodado a chave na fechadura, fechando a porta logo em seguida. Atirou os livros para cima da secretária do escritório, e foi à cozinha buscar uma lata de cerveja para acompanhar com a pizza que trouxera de Coimbra. Sentou-se descontraídamente no sofá da sala de estar, descansando as pernas sobre a pequena mesa de madeira, que para ele tinha outra utilidade para além da de decoração. Serenamente foi trincando as fatias da pizza bebendo também a cerveja, enquanto assistia na televisão às noticias da uma hora. Mais tarde, instalou-se confortavelmente na cadeira do escritório, ligou o computador, e entreteve- se durante bastante tempo a jogar um simulador de corridas de Fórmula 1. Quando finalmente se fartou do jogo, pegou nos cadernos de apontamentos, e após ter ido buscar o seu walkman, releu atentamente as notas que tirara das aulas daquela mesma manhã, ao som do seu grupo musical favorito. Por volta das cinco e meia da tarde, deu por fim o estudo, dirigindo-se à cozinha a fim de lanchar, sentando-se depois em frente do televisor, vendo um filme que a prima gravara na semana anterior... Jorge, fechou a porta atrás de si, e deu alguns passou em direcção ao automóvel que estava estacionado do outro lado da rua deserta. Ao entrar no BMW M3 coupé, uma ligeira brisa desagradável soprou, levantando-lhe os cabelos louros, e causando-lhe um pequeno arrepio. Por fim, pôs o veículo em marcha, tomando a estrada que levava a Coimbra, deixando o carro estacionado quase em frente ao prédio em que Rita dividia um apartamento com Sofia e Joana. Cruzou serenamente a porta de entrada do edifício, e subiu as escadas, dando depois três leves pancadinhas na porta de madeira, que a colega lhe veio abrir quase de imediato, convidando-o a entrar: - Vens cedo! - observou, voltando a fechar a porta, e conduzindo o amigo para a sala de estar - O jantar ainda vai demorar um pouco, por isso senta-te aqui! - convidou, apontando para o sofá que estava encostado a uma das paredes daquele espaço um tanto ou quanto apertado. - Não obrigada, eu quero ajudar em qualquer coisa... - respondeu o jovem num tom decidido. - Bem, se fazes tanta questão nisso,... - começou Rita, dirigindo-se para a cozinha, - ...podes pôr a mesa aí mesmo - acrescentou por fim, regressando com uma toalha branca na mão que entregou ao colega... ... 16
  • 17. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 - Passa-me a salada, por favor - quando ambos estavam já sentados à mesa, saboreando um delicioso prato de carne assada, acompanhada por batatas fritas. - Quando acabarmos, queres ir dar uma volta? - propôs Jorge, pousando os talheres e terminando a sua refeição - Conheci um sítio, que não fica muito longe, e é lindíssimo à noite... - Está bem... - concordou a rapariga, limpando os seus doces e suaves lábios ao seu guardanapo, dirigindo-se posteriormente à cozinha e levando consigo os pratos que ambos haviam utilizado - ...mas antes, quero que proves isto, - anunciou ela, regressando momentos depois, apresentando-lhe um esplêndido bolo, decorado com natas e algumas pepitas de chocolate. - É óptimo! - elogiou Jorge, provando um pouco do cremoso bolo... Alguns minutos mais tarde, os dois jovens sentaram-se no interior do automóvel amarelo que pertencia a Jorge, e que arrancou quase de seguida... - Afinal, aonde é que vamos? - inquiriu a rapariga, ardendo em curiosidade, e recebendo apenas como resposta um sorriso misterioso do companheiro, que a deixou ainda mais intrigada. - Estamos quase a chegar!... - anunciou Jorge, cerca de dez minutos depois, virando- se para a atraente rapariga que seguia a seu lado - É ali à frente - concluiu por fim, quando o automóvel que guiava acabava de descrever uma curva apertada - Vem! - acrescentou, abrindo a porta do veículo logo após este se ter imobilizado completamente. - Que lindo! - exclamou Rita, saindo igualmente do carro e aproximando-se do colega, passando o seu braço sobre os robustos ombros dele. - Repara,... - principiou Jorge, fazendo uma breve pausa, enquanto procurava as palavras que mais adequadamente exprimissem aquilo que sentia - ...as luzes da cidade, ...o rio, ...o movimento dos carros, e ...este silêncio e tranquilidade cá em cima. Não achas que é harmoniosamente belo?... - Sim, é maravilhoso,... - concordou a jovem - ...e olha as estrelas,... vê como cintilam... Aquela é a Estrela Polar, não é? - perguntou ela, apontando para um minúsculo ponto de luz que brilhava ao lado de muitos outros na negra escuridão do céu... - Não sei bem, - respondeu Jorge - Quem gostava muito de observar as estrelas era o meu pai, até chegou a comprar um telescópio... - esclareceu ele, em voz baixa e deixando escapar uma lágrima mais teimosa, sem que no entanto Rita se apercebesse. - Então, agora já não tem tempo para isso? - Não... - começou ele suspirando, enquanto outra lágrima lhe correu pela face triste - Na verdade..., o meu pai,... e a minha mãe,... morreram num acidente de carro à cerca de um ano e meio... - disse por fim, limpando o rosto húmido por causa das lágrimas que acabaram 17
  • 18. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo por vencer e corriam abundantemente pela face ensombrada por memórias tão dolorosas como eram as do desaparecimento dos pais. - Desculpa se,..., eu não sabia,..., nunca pensei,..., que,... bem,... - começou a rapariga, simultaneamente surpreendida e confusa, tentando, embora um pouco embaraçada, confortar o colega - Tu és sempre tão alegre e divertido, que,... a,... bem,... eu não queria,... - Não tens que pedir desculpa,... Afinal, tu não sabias de nada, por isso,... não tens culpa... - interrompeu ele com uma voz trémula, quando se apercebeu da atrapalhação de Rita, passando a sua mão pelo cabelo castanho da jovem... - Como é que..., como é que os teus pais,...? - Como é que eles..., como é que foi, é isso que queres saber...? - questionou Jorge, continuando logo após um sinal afirmativo da colega - Morreram num acidente de carro... - respondeu vagamente, fazendo uma pausa, e continuando em seguida - Foi numa noite, quando vinham de Lisboa..., o meu pai não mediu bem uma ultrapassagem, e quando percebeu que não dava, já estavam debaixo de um camião,... o carro explodiu, eles tiveram morte imediata, e o condutor do camião morreu dois dias depois no hospital... - esclareceu por fim com alguma dificuldade, enxugando as lágrimas com um lenço que a rapariga lhe emprestara. - E a Isabel, como é que reagiu? - A principio,... ficou mais perturbada que eu, mas ela acabou por se recompor muito mais rapidamente que eu. Ela conseguiu aceitar os factos, e eu ainda não fui capaz de enfrentar essa situação... - respondeu Jorge, aproximando-se da beira do miradouro, observando atentamente as luzes da cidade, que brilhavam lá ao longe - Bom..., mas se não te importas eu preferia mudar de assunto... - pediu, envolvendo com um braço os ombros delicados da companheira - ...falar disto ainda me é muito difícil... - concluiu por fim, sentando-se numa enorme pedra uma pouco mais recuada em relação ao precipício. - Eu compreendo... - anuiu Rita, sentando-se a seu lado - Responde-me só a uma pergunta; porque é que queres ser advogado? - Para ser sincero, eu até nem gosto muito disto... - Porquê? - insistiu a companheira interrompendo-o, surpreendida com tal revelação - Se não gostas deste curso, porque razão o escolheste? - No fundo, eu não gosto da advocacia, porque acho que não é um jogo limpo. Não é a verdade que está em causa, mas tudo se resume ao ganhar ou perder o caso. Não interessa que o réu seja culpado ou inocente; o que interessa para todos, é ganhar a qualquer preço, entendes? - Sim, mas continuo sem compreender; se não concordas com o sistema porque é que queres ser advogado? - inquiriu Rita um tanto confusa. 18
  • 19. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 - Porque o maior desejo dos meus pais, era que eu me licenciasse em Direito, e um dia mais tarde ficasse eu como dono da firma de advogados que eles tinham em Lisboa... - esclareceu ele, demonstrando com a sua atitude o quanto respeitava os pais - ... por isso, jurei sobre a campa deles que iria fazer aquilo que eles sempre haviam desejado, mas que por outro lado, iria combater o sistema com todas as armas que tivesse. - Então, qual era o curso que gostavas realmente de tirar? - perguntou Rita de novo. - Tens frio...? - interrogou Jorge, reparando que a companheira tremia - Queres ir embora?... - sugeriu, despindo o blusão, e colocando-o sobre os ombros da colega. - Não..., podemos ficar mais um pouco... - Bem, eu gostava de ter podido estudar Engenharia Mecânica, ou então Informática, que foi o meu curso no secundário, mas... - Mecânica?!... - exclamou a rapariga surpreendida - Tu gostas de mecânica...? - Sim..., adoro... - respondeu ele sorrindo, e sem alterar o tom de voz - ... na verdade, até tenho um Volkswagen Carocha de 1969, que comprei num ferro-velho, e que estou a restaurar para oferecer à Isabel... Já comprei um motor de um Porsche em segunda mão, e adaptei-o para o Carocha; vai ficar com quase 3000 cm3 de cilindrada, e mais de 200 cavalos de potência. Também pedi a um amigo que tem uma grande oficina perto de Lisboa, para me reforçar a estrutura do carro, de modo a aguentar com aquele motor, e agora ando a arranjar os travões, porque quero instalar ABS, e umas jantes de alumínio com 20 ou 22 polegadas de largura. Depois, vou mandar pintá-lo de cor-de-rosa, ou então bordeaux. - Uaaaaauuu!... Nunca pela ideia me passou que fosses tão engenhoso!... - exclamou Rita, não conseguindo disfarçar a simpatia e admiração que sentia pelo colega - Então, e como é que vai ficar; coupé ou cabriolet? - Cabrio..., aliás, quando o levei ao meu amigo em Lisboa, ele deixou-mo logo descapotável, e pronto a levar uma capota em tecido impermeável... - esclareceu Jorge, satisfeito com o interesse demonstrado pela companheira - ...mas estou a ver que também percebes disto, muito bem, estou a gostar de ver!... Vem cá... - pediu ele levantando-se, e dirigindo-se para o espectacular BMW M3, que estava parado alguns metros mais acima - ... quero mostrar-te uma coisa... - acrescentou, esperando que a colega chegasse junto dele - Este carro tem de série... - É um belo carro... - observou alguém, intrometendo-se na conversa - Talvez mo queiras emprestar para eu ir dar uma volta... - continuou o indivíduo do rabo-de-cavalo, aproximando-se dos dois jovens. - Não me parece... - respondeu o rapaz, sem se mostrar muito impressionado com a enorme e reluzente lâmina que acabara de surgir na mão direita do intruso, apesar de Rita ter ficado petrificada - Bom..., vou dar-te um conselho; pira-te daqui, imediatamente. Estou-te a 19
  • 20. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo avisar!... - Ouviram...!? - recomeçou o outro, falando para os dois homens que acabavam de sair de entre um arbusto - Ele está-me a avisar... - prosseguiu em tom irónico, dando alguns passos na direcção de ambos, enquanto brandia com destreza a enorme faca - ... quem te avisa, sou eu; tenham juízinho, e nada vos acontecerá..., só queremos verificar um pequeno pormenor, e depois soltamo-vos... - Marco,... - chamou o indivíduo que vestia fato e gravata, usando uma gabardina por cima - ...tem calma,... não nos precipitemos... Tu,... - disse, falando para Rita, que permanecia imóvel - ...vem cá... - Lamento desiludir-vos, mas infelizmente não me parece que ela vá a lugar algum... - respondeu de pronto Jorge, continuando muito pouco impressionado com o ambiente hostil criado pelos três malfeitores. - Marco,... - insistiu o outro - ... trá-la cá, e se aí o nosso amigo fala-barato se manifestar trata-lhe da saúde!... - concluiu com cara de poucos amigos. - Não é preciso Dr.,... - disse o terceiro homem, falando para o do fato, que parecia ser o chefe do grupo - ... não é ela... - Tens a certeza do que estás a dizer? - insistiu o outro. - Absoluta... - prosseguiu ele - não é ela, a outra miúda não tinha sardas, era mais baixa, e o cabelo era mais escuro do que o desta... - esclareceu por fim. - Vê lá, não te precipites, o chefe não quer perder mais tempo com esta história - insistiu o homem do fato. - Eu tenho a certeza, não é ela, ...garanto-lhe Dr. - - Marco,... deixa-os,... vamos embora... - ordenou o tal Dr. ao fulano do rabo-de- cavalo. Porém, Marco não parecia estar pelos ajustes, e antes de se afastar presenteou o desprevenido Jorge com um soco na cara, que de imediato ripostou, agredindo o outro com um pontapé violentíssimo no baixo ventre, e depois com dois murros na cara, que deixaram o tipo que se chamava Marco estendido no chão sangrando do nariz e dos lábios. - Toma lá filho da puta!... Para a próxima toma atenção aos conselhos que te dão - comentou o jovem, quando o outro com alguma dificuldade se começou a levantar. - Agora é que vais ver como elas te mordem!... - gritou Marco de cabeça perdida, avançando furioso para o rapaz. - Tu não aprendes!?... - ironizou Jorge - Queres levar outra vez?... - Marco!... - chamou o indivíduo que tratavam por Dr. - Vamos embora..., já... é uma ordem!... - ordenou o tipo que vestia fato, num tom de voz que não deixou dúvidas ao homem do rabo-de-cavalo. 20
  • 21. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 - Fica para a próxima,... não te esqueças da minha cara!... - ameaçou por fim, antes de se juntar aos outros dois, que desapareceram rapidamente pela colina acima. Alguns segundos depois, ouviu-se um automóvel arrancar a grande velocidade, não muito longe dali... - Pronto..., já se foram embora!... - observou Jorge aliviado - Estás bem? - perguntou à colega. - Sim... - principiou ela, tentando enxugar as lágrimas que entretanto começaram a cair - ... mas tenho medo..., não gostei muito das últimas palavras do gajo do rabo-de- cavalo... - Não te preocupes..., não ligues..., aqueles gajos só são duros com uma arma na mão..., são uns cobardolas, jamais terão coragem de nos chatear outra vez... - comentou o jovem, tentando tranquilizar a colega, que agora tremia de medo. - Achas!?... - Tenho a certeza... - esclareceu o rapaz não deixando lugar a qualquer tipo de dúvidas - Só não entendi bem o que queriam..., ...é óbvio que se enganaram, pelo menos foi o que percebi das palavras do gajo que estava com o “ fato “, devem andar atrás de alguém. É melhor prevenirmos a polícia... - Eu trato disso amanhã... - ofereceu-se Rita de imediato, já mais calma. - Está bem... - concordou o companheiro - ...mas agora, o melhor é irmos embora, já chega de surpresas por uma noite... Jorge conduziu a colega ao magnífico BMW M3 coupé amarelo, e abriu a porta para que ela entrasse. Depois, deu a volta ao veículo, e entrou também. Em seguida, rodou a chave na ignição, engrenou a primeira velocidade, e arrancou em direcção à estrada que conduzia a Coimbra. - Queres ir dormir lá a casa? - sugeriu o rapaz, reparando que a colega estava muito nervosa. - E a Ana? - lembrou a rapariga com a voz trémula... - A Ana não está lá..., foi passar o natal ao Brasil com os pais e o namorado... Ontem quando cheguei de Santarém, já ela não estava. Deixou-me um bilhete a explicar tudo. Então..., ficas no teu apartamento, ou queres vir comigo... - insistiu ele - Se não te importares, eu preferia ir contigo... - Bom..., então vamos... Cerca de dez minutos mais tarde, o espectacular automóvel conduzido por pelo jovem estudante, parou em frente à habitação que pertencia aos pais de Ana, e que ele dividia com a prima. Depois, Jorge, conduziu Rita até à porta da casa, e após ambos entraram, fechou a porta com cuidado. Em seguida, encaminhou a colega até ao quarto de dormir que 21
  • 22. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo habitualmente estava vago, e foi procurar um pijama da prima que entregou a Rita. - Estás tão tensa... - observou, reparando que a rapariga continuava a tremer - ... queres um calmante para te ajudar a dormir? - sugeriu, tentando confortá-la apertando-a de encontro ao seu peito robusto. - Sim,... se não te der muito trabalho. O jovem, dirigiu-se para a cozinha, e voltou alguns minutos mais tarde, trazendo um copo de água, e o calmante que deixou sobre a mesa-de-cabeceira do quarto. - Se precisares de alguma coisa,... seja o que for, é só chamares, está bem? - recomendou, encaminhando-se para o corredor - Vá, vai descansar, e esquece aquilo que se passou. Tudo não passou de um engano, foi só um grande susto... Até amanhã!... - concluiu por fim, saindo e fechando simultaneamente a porta do quarto. - Jorge!?... - chamou Rita. - Sim,... - respondeu ele de pronto abrindo de novo a porta. - Nada,... só... obrigado!... - disse, aproximando-se dele, e apanhando-o desprevenido, beijou-o com ternura nos lábios - Boa noite!... O jovem, puxou mais uma vez a porta, e afastou-se em direcção ao seu quarto de dormir, pensando surpreendido no prémio que acabara de receber. Após ter tomado um duche rápido, o rapaz vestiu o pijama, e enrolou-se confortavelmente no meio dos quentes e acolhedores cobertores, recordando confuso os acontecimentos daquela mesma noite no miradouro; “ Quem seriam aqueles indivíduos? Quem procuravam? Porque razão perseguiam alguém? “ A única coisa que ele compreendia, é que obviamente os três malfeitores haviam confundido Rita com a outra pessoa que por algum motivo perseguiam. Apesar de entretido com aqueles pensamentos, não demorou muito porém até que adormecesse, embora o sono fosse muito pouco tranquilo. No quarto ao lado, pelo contrário, Rita, com a ajuda do calmante rapidamente se encontrou mergulhada num tranquilo e profundo sono, mexendo-se de quando em vez na cama... ... - Bom dia! - cumprimentou Jorge, entrando na cozinha - Já estás levantada!?... - exclamou surpreendido, apertando o cinto do roupão - São oito e meia, não me disseste que hoje não tinhas aulas de manhã? - Olá! - saudou a colega, sorrindo - Sim..., não tenho aulas, mas tenho que ir ao Porto. - prosseguiu ela bebendo um gole de café - Só hoje quando acordei é que me lembrei que tenho uma consulta no médico. - E como é que passaste a noite? Dormiste bem? Estás mais calma? - questionou Jorge atenciosamente, pegando numa chávena e servindo-se igualmente de um pouco de café. 22
  • 23. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 - Sim, graças ao calmante que me deste, dormi bem, e já me convenci que apesar dos tipos de ontem serem perigosos, não nos vão chatear nunca mais. Mas ontem tinha tanto medo!... Obrigado!... Foste bestial, um verdadeiro amigo!... - Ainda bem que já estás mais calma... - observou Jorge satisfeito - Queres que te vá pôr à estação para apanhares o comboio? - ofereceu-se o rapaz. - Isso era óptimo! - agradeceu Rita, terminando o pequeno-almoço - Mas antes de irmos, queria pedir-te que não dissesses a ninguém o que aconteceu ontem, porque eu não quero que os meus pais descubram isso..., senão há logo sarilho. - Nem mesmo à polícia? - Não, está descansado que eu vou lá apresentar queixa... Só não quero que mais alguém saiba disto... Posso contar contigo? - inquiriu, aguardando ansiosa pelo voto de silêncio do colega. - De acordo. Prometo que nada direi a ninguém... - garantiu ele, acrescentando depois - Então, dá-me um quarto de hora, enquanto vou tomar um banho e vestir-me... - pediu abandonando apressadamente a dependência onde ambos se encontravam. Alguns minutos mais tarde, Jorge entrou na sala de estar, pegou nas chaves do BMW amarelo, e conduziu Rita até à saída. Depois de fechar a porta, dirigiram-se os dois para o espectacular automóvel que estava estacionado do outro lado da estrada. Logo que se fez sentir o ruído do potente motor do veículo em funcionamento, o rapaz engrenou a primeira velocidade, e iniciou a marcha suavemente, tomando a estrada que conduzia a Coimbra... - Voltas a que horas? - indagou, quando já no interior da cidade avistou ao longe o edifício da estação ferroviária. - Ainda não sei. Possivelmente até ficarei esta noite em casa da Joana... - respondeu falando quase em surdina, no momento em que o automóvel parou em frente da velha construção - Até amanhã! - disse, despedindo-se do colega, com um beijo na face - Obrigado pela boleia, e obrigado por ontem... - concluiu por fim, fechando a porta do BMW, e dirigindo- se para a entrada da estação. - Faz boa viagem!... - respondeu Jorge, ficando por mais uns instantes a observar a rapariga que se afastava. Em seguida, arrancou bruscamente, tomando o caminho de regresso a casa, onde chegou aproximadamente dez minutos mais tarde, entrando na habitação sem mais delongas. Como era ainda muito cedo, passavam alguns minutos das nove e meia da manhã, pegou no seu walkman e sentou-se no escritório em frente do computador, entretendo-se com alguns jogos, enquanto recordava de novo os estranhos acontecimentos da noite anterior. - “ Há aqui qualquer coisa que não bate certo!... “ - pensou, desviando 23
  • 24. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo momentaneamente a sua atenção do jogo, suspeitando que a colega lhe escondia algo - “ Está-me a escapar algo!... A Rita deve saber de alguma coisa!... Tenho que apertar um pouco mais com ela!... “ - concluiu, voltando a centrar a sua atenção no monitor do computador, e no simulador de futebol que estava a jogar. Aquela viagem súbita era no mínimo bizarra, e a tentativa de ocultar a situação da polícia, ainda que velada, bem como o ocorrido na noite anterior alimentavam de sobremaneira as suspeitas do jovem... ... - Good Afternoon!... - saudou amavelmente o professor de Inglês, rodando a maçaneta da porta da sala de aulas - How was the week-end?... - Short... - começou um colega de Jorge que seguia mesmo atrás do altíssimo indivíduo britânico - ...as usually, it was very short!... - acrescentou depois no meio da gargalhada geral. - Sir... - principiou um outro, rindo divertido - ...this morning a little bird told me that Liverpool have lost, ...again!... - No comments, please... - respondeu bem humorado o professor, que numa das aulas anteriores havia cometido o erro de revelar aos seus alunos ser associado daquele clube inglês, tendo alguma dificuldade em se fazer ouvir perante a gargalhada bem-disposta que surgiu após aquela perspicaz observação - Okay, now... please, ...enough!... - pediu - Now..., lets go to work! - disse por fim, aguardando que todos se sentassem de modo a poder principiar a leccionar a matéria para aquela aula... - Vou-me “ baldar “ a Direito! - anunciou Jorge, quando cerca de duas horas mais tarde cruzou os portões da faculdade, acompanhado por um grupo de colegas. - Isso é que é falar! - aprovou uma rapariga, dando-lhe uma palmada amigável nas costas - Vou para o salão jogar, querem vir? - convidou ainda. - Que se lixe,... também vou - concordou um outro, acendendo o seu cigarro, e oferecendo um à jovem que os acompanhava - Estou farto daquela merda!... - disse por fim pontapeando furioso uma lata de cerveja que fora deixada no passeio. - Vamos jogar o quê, Marta? - perguntou alguém quando o grupo entrou no salão de jogos. - Snooker a quatro! - sugeriu Jorge, pegando num taco, e dirigindo-se para a esplêndida mesa que se encontrava a um canto daquele espaço de diversão. - Vamos tornar as coisas mais interessantes... - começou um dos rapazes sorrindo - ...quem perder, ...paga, o.k.? - De acordo, André! - aprovou Marta, pegando também num taco - Vocês podem jogar juntos, que eu fico com ele - disse, apontando para Jorge, que se aproximava trazendo as 24
  • 25. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 bolas do jogo. - Está no papo! - comentou o outro rindo - Preparem a “ massa “, que aqui o mestre vai dar uma aula de bem jogar isto ao pessoal, ... e à borla... - anunciou, virando-se para Jorge e Marta, que permaneciam quietos a um canto da mesa... - Convencido... - principiou Marta, aproximando-se discretamente do parceiro, e perguntando-lhe em surdina - Percebes alguma coisa disto? - Talvez... - respondeu vagamente o jovem, esquivando-se à pergunta, e não revelando os seus verdadeiros conhecimentos acerca do jogo. Meia hora mais tarde... - Falas demais! - observou o colega de André, olhando acusadoramente para este - Tu e as tuas ideias! Devias pagar isto sozinho, ...animal! - continuou, puxando da carteira muito pouco satisfeito, para pagar a despesa do jogo, uma vez que Jorge e Marta haviam levado a melhor - As miúdas não percebem nada de snooker, ...aqui o grande mestre dá bem conta deles - repetiu, imitando de uma forma irónica a voz e os gestos do parceiro. - Foi sorte de principiante! - defendeu-se o outro, lamentando-se da sua pouca sorte. - Queres repetir?... - desafiou Marta, pegando de novo no seu taco e aproximando-se da mesa, perante o olhar atento dos três rapazes. - Não... - desculpou-se o outro um tanto atrapalhado enquanto se afastava com o parceiro para pagar a despesa - Tenho que me ir embora, senão ...era já!... - E eu também! Foi fixe, mas tenho que me pirar! - anunciou Jorge, pegando nos seus livros, e despedindo-se dos colegas, encaminhando-se depois para a saída do salão de jogos. Tranquilamente percorreu as cerca de duas centenas de metros que o separavam do parque de estacionamento em que deixara o seu BMW. Por fim, avistou o espantoso coupé amarelo, usando o controle remoto para destrancar as portas do automóvel, logo que chegou a uma distância suficientemente perto para que o pequeno aparelho funcionasse adequadamente. Já sentando ao volante do veículo, atirou os livros para o assento traseiro, arrancando bruscamente logo em seguida. Alguns minutos volvidos, o jovem encontrava-se já à entrada da habitação que ocupava, a mesma que pertencia aos pais da prima com quem a dividia. Entrou, fechando a porta atrás de si deixando as chaves do BMW e os livros em cima da pequena mesa sobre a qual se encontrava também o telefone. Não demorou muito tempo até que Jorge se instalou confortavelmente no acolhedor sofá da sala de estar, saboreando umas sanduíches de pastéis de bacalhau, que ele mesmo preparara instantes antes, enquanto assistia ao noticiário na televisão. De súbito, porém, lembrou-se de ir à cozinha buscar uma bebida para acompanhar a refeição. 25
  • 26. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo - “ Porra, ...já não há cerveja! “ - exclamou desiludido, quando abriu a porta do frigorífico, e constatou que apenas restavam algumas latas de refrigerantes - “ Bom, ...lá terá de ser!... “ - pensou conformado, pegando numa lata de cola, e voltando a sentar-se em frente ao televisor, aproveitando, como era hábito, o tampo da pequena mesa de madeira escura que se encontrava ao centro daquela divisão... Após a refeição, esperou ainda pelo programa desportivo, que era transmitido noutro canal, entretendo-se depois com um livro que começara a ler há bastante tempo, ouvindo música em simultâneo. Contudo, não demorou até que se começasse a sentir sonolento, e embora fosse ainda muito cedo, optou por ir dormir, pelo que, desligou a potente aparelhagem sonora, dirigindo-se em seguida para o seu quarto. Assim, quando nos dígitos vermelhos do rádio relógio apareceram as zero horas, já o jovem estava mergulhado num tranquilo e profundo sono... - “ ... Antena 3, falta um minuto para as nove da manhã... Vamos entrar na próxima hora com... ‘ Crazy ’ dos Aerosmith, depois ...‘ About a Girl ‘ do álbum ‘ Unplugged in New Yorq ‘ dos Nirvana, e no final da sequência..., ‘ Tudo o que te dou ‘ de Pedro Abrunhosa,... Deixem-se ficar..., esta é a Antena 3, a partir de Lisboa para todo o país...” Jorge deu meia volta na cama, e ficou mais um pouco deitado, ouvindo com atenção os temas musicais que o locutor anunciara alguns instantes antes. A muito custo, lá se resolveu por fim a levantar, encaminhando-se apressadamente para o quarto de banho, não sem antes ter aumentado o volume ao rádio, de modo a continuar a ouvir música, enquanto se aprontava para mais um longo dia de aulas, como ele muitas vezes gostava de referir... Depois de trancar as portas do vistoso BMW M3 coupé amarelo, Jorge deu uma rápida mirada aos ponteiros do seu relógio de pulso. Eram então exactamente dez e um quarto da manhã... O jovem, olhou ainda receoso para as muitas e ameaçadoras nuvens que cobriam totalmente o habitual azul do céu, atravessando em seguida a estrada ainda molhada pela chuva que caíra com persistência durante quase toda a madrugada. Por fim, cruzou a entrada da sua faculdade, dirigindo--se de imediato para o edifício principal, para se proteger melhor do intenso frio que se fazia sentir... - Hei,... então... - chamou uma voz feminina quando Jorge entrou no enorme corredor que dava acesso às salas do 2º piso - Já não ligas às colegas - insistiu a voz, quando ele finalmente se voltou para trás, deparando-se com três caras conhecidas. - Sofia!?... Joana!?... - exclamou surpreendido - Não era suposto ficarem no Porto até segunda? - inquiriu, cumprimentando as três raparigas com um beijo na face. - Bom, resolvemos voltar mais cedo - respondeu a atraente jovem dos cabelos louros, que inicialmente o chamara, sem no entanto revelar o motivo pelo qual haviam decidido antecipar o regresso. 26
  • 27. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 - Ainda bem que voltaram mais cedo... - começou Jorge com uma expressão grave - ...estou preocupado com a Rita... - Nós sabemos... - principiou a outra, olhando o colega fixamente através dos seus lindos olhos, que não tinham uma cor definida, embora se situassem algures entre o azul e o verde - ...a Rita quando ontem nos visitou pôs-nos a par da história toda - esclareceu por fim. - Fico mais tranquilo, agora que sei que vocês regressaram - observou Jorge aliviado, olhando para o relógio de pulso. - Tens alguma aula agora? - indagou Rita, apercebendo-se da insistência com que o colega olhava para o relógio. - Sim. Na verdade, já estou atrasado quase um quarto de hora, e hoje era conveniente chegar a horas... - Tu..., chegares a horas..., a uma aula!? - exclamou rindo a bela e atraente jovem dos cabelos louros - Estiveste a beber? - perguntou brincando. - Não! - respondeu Jorge, compreendendo que a rapariga estava a entrar com ele - Agora a sério, a aula de hoje é muito importante... Além disso, ontem dei folga ao professor, por isso... - Ó Sofia, vai chamar um médico!... - insistiu a outra, interrompendo-o de novo - Ele está mesmo doente!... Agora até já quer ir às aulas! - prosseguiu dando-lhe uma palmada amigável nas costas - Desde quando é que há aulas importantes? - inquiriu indignada, estendendo os braços em sinal de reprovação... - É um brincalhão este Jorge! - exclamou divertida a colega, cujos olhos de uma cor indefinida tanto fascinavam o rapaz, fingindo não o levar a sério. - Bom, tenho mesmo que ir andando... - concluiu, suspirando longamente, dando dois passos na direcção do corredor. - Queres jantar connosco? - convidou ainda Rita. - Aaaaaa... - principiou, fazendo uma pausa para pensar - Hoje jantamos em minha casa! - Vou buscá-las às sete, o.k.? - terminou, encaminhando-se apressadamente para a sala de aulas, deixando as três raparigas conversando animadamente à entrada do corredor... Alguns minutos depois do meio-dia, Jorge, abandonou o recinto da faculdade, despedindo-se da colega, logo após ambos terem cruzado o enorme portão. Ela, seguiu para uma estreita e pouco movimentada travessa, enquanto que o jovem estudante continuou em frente, descendo até uma ampla praça, que se encontrava quase deserta àquela hora. Em seguida, atravessou a estrada entrando no snack-bar, onde almoçava sempre que não tinha tempo para ir a casa, e que não ficava muito longe da sua faculdade... Optou por um hambúrguer com batatas fritas e salada, que lhe puseram à frente 27
  • 28. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo poucos instantes depois, bem como a cerveja que tinha pedido para acompanhar o prato principal. Para terminar, saboreou uma deliciosa sobremesa, bebendo ainda o habitual café. Por fim, pegou nos livros, pagou a despesa, saindo de imediato. Como lhe restava ainda bastante tempo antes da aula seguinte, foi caminhando tranquilamente até ao seu espectacular BMW, sentando-se descontraídamente no assento do condutor. Inclinou um pouco as costas do banco, de modo a ficar mais confortavelmente instalado, ligando também o potente auto-rádio que se encontrava montado na consola central do automóvel. Depois, fechou os olhos, ficando a ouvir a excelente música que estava a ser transmitida pela estação de rádio que sintonizara. Contudo, alguns minutos mais tarde o jovem dormia profundamente, totalmente alheado do intenso movimento naquela rua. De súbito, porém, um veículo que circulava próximo travou bruscamente, buzinando com insistência. O irritante ruído da buzina, depressa chegou aos ouvidos de Jorge, que despertou de imediato, compreendendo instintivamente que se deixara dormir... - Merda!... Já estou atrasado, ...que porra!... - disse, enquanto olhava muito pouco satisfeito para o seu relógio de pulso, e pegando precipitadamente nos livros que estavam sobre o assento ali mesmo ao seu lado abriu a porta do BMW sem perder mais tempo. Depois, encaminhou-se apressadamente para a faculdade que não ficava muito longe do local em que se encontrava... ... - Uaaaaaaauuuu!!!... - exclamou Jorge surpreendido, quando Joana lhe abriu a porta de entrada do apartamento que dividia com Rita e Sofia - Tu estás..., a... um... espanto! - concluiu observando boquiaberto a colega que, estava de facto deslumbrante... - Não queres entrar enquanto elas não vêm? - convidou a jovem dos cabelos louros, que naquela noite usava um lindo vestido negro, que não só realçava o sensual corpo da jovem, como também os seus magníficos cabelos. - Elas não demoram muito, pois não? - indagou Jorge, algo inquieto. - Acho que não... - principiou a rapariga - ... mas há algum problema? - Bem..., é que..., deixei o carro estacionado à balda, e estou com medo, não apareça a bófia e se ponha a implicar. - esclareceu ele, encostando-se ao corrimão de madeira da escada - A última vez, avisaram-me que não me voltavam a perdoar uma multa de estacionamento... - acrescentou ainda. - Eu vou ver se elas ainda demoram... - anunciou Joana, desaparecendo no interior da habitação, perante o olhar atento de Jorge. - Que corpo espectacular..., ufa!... Qual das três a melhor... - desabafou entredentes, sorrindo-se cumplicemente dos seus pensamentos mais ousados... - Vamos?... - inquiriu Joana, regressando acompanhada por Sofia e Rita que vinham 28
  • 29. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 logo atrás de si. - É só um jantar garotas!... Não era preciso tanto!... - comentou, enquanto desciam os quatro as escadas que conduziam à saída daquele prédio de apartamentos - Bem..., assim sendo, ...tenho uma ideia melhor... - acrescentou, abrindo a porta da frente para que Sofia e Joana pudessem entrar para os lugares traseiros. - Em que é que estás a pensar? - inquiriu Rita ardendo em curiosidade, enquanto Jorge dava a volta para entrar do outro lado. - Surpresa... - respondeu ele vagamente com um sorriso misterioso, sentando-se ao volante, e rodando a chave na ignição. Logo que o ruído do potente motor do BMW M3 coupé se fez ouvir, Jorge engrenou a primeira velocidade, iniciando suavemente a marcha logo em seguida. Alguns instantes mais tarde, circulavam numa estrada pouco movimentada em direcção ao sul... - Não sejas chato... - recomeçou Rita pela milionésima vez - ..diz lá onde vamos!... - Já não precisas de esperar muito... - respondeu o jovem pacientemente - ...estamos a chegar - concluiu, apontando para uma construção de um piso único, que se erguia um pouco mais à frente... ... - Já escolheram?... - inquiriu delicadamente o empregado daquele restaurante aproximando-se da mesa que Sofia escolhera. - Sim... - principiou Jorge, dando uma última vista de olhos pela ementa - ...queremos quatro doses de Bacalhau com Natas... - E para beber?... - prosseguiu o outro, enquanto tomava nota daquilo que o rapaz pedira. - Para mim uma imperial... - respondeu o jovem, fazendo um sinal às companheiras para que pedissem a bebida que queriam. - Pensava que os caloiros só bebiam leite!... - comentou Joana, logo que o empregado se retirou... - Ah!... Ah!... Ah!... Que piada!... - brincou Jorge, fingindo-se ofendido pela observação da colega - E, em relação ao meu convite, já tomaram alguma decisão? - Bem..., nós estivemos a pensar, e... - começou Sofia, fazendo uma breve pausa, enquanto bebia um gole do sumo de laranja que o empregado havia acabado de lhe pôr à frente. - E...?... - insistiu o companheiro, mostrando-se bastante impaciente. - Resolvemos aceitar!... - esclareceu por fim, passando os seus finos e doces lábios pelo guardanapo, terminando finalmente com aquele momento de suspense, para gáudio do colega que sorria satisfeitíssimo com a notícia - Mas... - acrescentou ainda - tem que ser 29
  • 30. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo antes das férias de Natal. - Se quiserem, pode até ser já neste fim-de-semana... Que dizem?... - propôs ele, pedindo mais uma bebida ao empregado. - De acordo! - anuíram as três raparigas, após uma breve troca de olhares - Mas tens a certeza de que não há nenhum inconveniente? - indagaram, ainda hesitantes. - Absolutamente nenhum! - respondeu o colega decididamente, começando a servir-se do esplêndido Bacalhau com Natas que o empregado acabara de trazer naquele mesmo instante. - Só preciso de prevenir a Isabel. Mas quanto a isso, não há problema, ...amanhã telefono-lhe. - Então, está combinado. Na sexta, vamos contigo para Santarém... ... - Vêmo-nos amanhã? - perguntou Jorge, quando o vistoso BMW amarelo parou por alguns instantes em frente ao edifício em que habitavam as três jovens. - Não queres subir só por um bocadinho? - convidou Rita, libertando o fecho do cinto de segurança. - Sinto muito, mas não posso. Tenho umas tretas para ler, e uns apontamentos para reler, por isso, não dá - lamentou-se o rapaz, com tristeza, dando um murro no volante do automóvel. - Então, vemo-nos amanhã! - concluiu a companheira, despedindo-se dele com um beijo na face, e abrindo a porta da viatura, deixando que as duas raparigas que seguiam no assento traseiro pudessem igualmente sair. - Até amanhã! - disseram simultaneamente Sofia e Joana, que se juntaram no passeio a Rita, vendo o potente veículo desaparecer rapidamente na curva que ficava algumas dezenas de metros mais abaixo. Jorge, após uma noite bem passada na companhia das colegas com quem travara conhecimento através da prima Ana, dirigiu-se para casa, conduzindo velozmente o espantoso BMW M3 coupé, que deixou estacionado como habitualmente em frente da habitação que partilhava com a prima, agora de férias no Brasil. Atravessou tranquilamente a estrada, olhando fixamente para o céu estrelado, que era iluminado pela luz intensa da lua cheia, que naquele momento brilhava a descoberto de umas quantas nuvens que se podiam igualmente observar. Passavam apenas alguns minutos das dez e meia da noite, quando o jovem rodou a chave na fechadura da porta de entrada da habitação, entrando logo em seguida... 30
  • 31. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 Fim do 2º Capítulo 31
  • 32. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo Capítulo 3 - Olá, bom dia! - cumprimentou o jovem estudante, chegando junto dos seus colegas de turma, que aguardavam junto da entrada da sala de aula a chegada do professor de Direito. - Chamas bom dia, ...a isto!?... - exclamou uma rapariga, protestando contra o tempo cinzento, húmido, desagradável e frio que se fazia sentir naquela manhã de Dezembro. - Não deviam existir aulas de manhã! - prosseguiu um outro, terminando disfarçadamente um cigarro que acendera poucos tempo antes, visto que não era permitido fumar nos corredores da faculdade, e naquele momento aproximava-se um funcionário. - Aulas só um dia por semana, e com férias pagas treze meses por ano! - comentou de súbito alguém dando origem a uma gargalhada bem-disposta, que fez esquecer por breves instantes aquela manhã fria e chuvosa. Em seguida, chegou o professor, cumprimentando delicadamente os seus alunos, e abrindo a porta, de modo a que todos pudessem entrar. À aula de Direito, seguiu-se uma outra de Economia, tendo existido de permeio entre ambas um curto intervalo com uma duração de quinze minutos, que o jovem aproveitou para rapidamente tomar o pequeno-almoço, num simpático café, que embora minúsculo, não deixava de ser bastante acolhedor, e que ficava próximo, regressando depois à faculdade, a fim de assistir à aula de Economia... Por volta da uma da tarde, quando finalmente terminaram as aulas daquele dia sombrio, Jorge, dirigia-se apressadamente para o seu automóvel, quando foi interpelado pelas três raparigas com quem jantara na noite anterior. - Não queres ir à aula de Inglês por mim? - principiou Rita, brincando com ele, enquanto se cumprimentavam trocando alguns beijos. - Não..., ...não me parece que esteja muito interessado na tua extraordinária oferta... - declarou o jovem rindo, enquanto abria a porta do espantoso BMW M3 coupé, atirando com os livros que segurava na mão direita para cima do assento contíguo ao do condutor - Não sei como, nem porquê, mas a verdade, é que recentemente auto-diagnostiquei-me como extremamente alérgico a aulas, prejudicam seriamente a saúde, especialmente a minha - prosseguiu, encostando por momentos a porta para que o veículo que surgiu de frente pudesse passar sem problemas - Mas se quiserem, podemos ir beber qualquer coisa, antes de eu ir embora, que dizem?... - Se tu pagares, aceitamos, ...não é? - prontificou-se imediato Joana, trocando um 32
  • 33. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 olhar cúmplice com as duas companheiras. - Pago pois!... Vamos!... - propôs ele, pegando nas chaves do automóvel para o voltar a fechar. - Ela está a brincar! - explicou Sofia, apontando de imediato para o mostrador do seu relógio de pulso - Já estamos atrasadas mais de dez minutos, e faltámos às duas primeiras aulas da semana, por isso temos mesmo que ir - esclareceu por fim. - Têm a certeza?... - insistiu Jorge, desistindo logo em seguida, quando as raparigas acenaram com a cabeça, indicando que não podiam mesmo - E que tal jantarmos? - Hoje não dá... - respondeu Rita muito vagamente, escusando-se a revelar mais pormenores. - Porquê? - indagou o jovem não ficando satisfeito com aquela recusa aparentemente sem justificação. - Amanhã falamos... - concluiu a colega, fechando-se num enigmático sorriso, e afastando-se rapidamente com Joana e Sofia - Agora temos que ir... - acrescentou ainda, encaminhando-se depois as três para o interior do recinto da faculdade, deixando Jorge junto do seu carro, que apesar de não ter compreendido muito bem a estranha atitude das três raparigas, entrou no automóvel, não dando demasiada importância ao ocorrido. - “ Provavelmente devem ter algum trabalho para fazer, e como também já estavam atrasadas... ” - pensou, rodando a chave na ignição do BMW coupé, e arrancando velozmente sem perder mais tempo, dirigindo-se para casa. Depois do almoço, o jovem resolveu telefonar à irmã, para a pôr ao corrente do convite que fizera às colegas, e que as mesmas haviam aceite. Por isso, pegou no telefone, e marcou nas teclas correspondentes ao seu número em Santarém. Esperou alguns instantes até que do outro lado da linha soasse a voz conhecida da irmã, que de imediato disse: - Ainda bem que telefonas... - principiou a rapariga, com uma voz trémula - ...recebeste a minha mensagem? - Que mensagem!?... - inquiriu Jorge surpreendido. - Eu telefonei-te anteontem, e ontem, mas como não estavas, deixei recado no gravador de chamadas, ...não o ouviste? - insistiu ela. - Não, mas... passou-se alguma coisa? - perguntou Jorge inquieto, depreendendo pela voz insegura da Isabel, que algo sucedera. - Sim... - recomeçou a irmã a medo - Bem, a... eu... tive um acidente com o Ford, na terça... - concluiu por fim soluçando. - O quê!?... - exclamou o rapaz, um tanto confuso pela revelação que a irmã acabara de lhe fazer - Mas..., e estás bem..., isto..., quer dizer, ...tu estás bem? - indagou preocupado - Não te aconteceu nada?... 33
  • 34. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo - Não... - disse, soluçando cada vez mais, e começando também a chorar - Não..., não me aconteceu nada..., mas o carro ficou sem o pára-choques, os vidros dos faróis, e... os piscas ficaram partidos. Desculpa, ...está bem...? - Acalma-te... - pediu o jovem, verificando que ela ainda não recuperara do susto - escuta, ...isso não interessa. O que interessa é que estás bem... Então, ...acalma-te, ...não há razão para isso... - prosseguiu, tentando confortar e descansar a irmã, minimizando o problema - Então, ...como é que isso aconteceu? - Anteontem, quando ia a caminho da escola, ia a parar atrás de uns carro que estavam parados nos semáforos, ... e quando carreguei no travão o carro continuou a deslizar, ...e eu para não bater nos que estavam à minha frente, dei uma guinada no volante, e fui bater de frente num muro... - esclareceu a rapariga um pouco mais serena. - E depois, ...o que fizeste? - Depois, ...peguei no telemóvel, e telefonei aos tipos da oficina para irem lá buscar o carro. Disse-lhes onde estava, e esperei que eles lá chegassem para me vir embora... - E eles disseram o que foi? - Sim..., foi falta de travões, ...ao que parece, uma das mangueirinhas do óleo tinha uma fuga, e o nível estava no zero. Desculpa, ...está bem? - esclareceu Isabel ainda um pouco perturbada. - Ouve, já te disse que não há problema nenhum. O que me importa, é que a ti não te aconteceu nada. Por isso, esquece esse assunto, ...já faz parte do passado, o.k.? - pediu o irmão, não se preocupando muito com o sucedido - E, a propósito, ...quando é que te devolvem o carro? - Já cá o tenho. Vieram-no entregar hoje de manhã, e até já paguei o arranjo. Antes do almoço fui dar uma volta com ele, e fiquei contente porque tiraram aquele baralho que eu te disse, e tiraram aquele risco que tu fizeste na porta. - Ainda bem. Pronto, ...então podes esquecer isso duma vez por todas. Tiveste um acidente, e daí? - Sim, vou fazer como dizes... - respondeu a irmã muito mais calma - Mas, diz-me uma coisa, ...se não recebeste o meu recado, porque razão telefonaste? - Ah! É verdade, ainda bem que me lembras, que eu com esta história já me estava a esquecer!... A Rita, a Sofia, e a Joana resolveram finalmente aceitar o meu convite para passarem o fim-de-semana connosco, e eu queria prevenir-te que elas amanhã vão comigo - explicou Jorge, esperando que a irmã não visse qualquer inconveniente em relação àquele assunto - Não te importas, pois não? - Não, claro que não! Na verdade, ainda bem que as trazes... Estou ansiosa para as conhecer... 34
  • 35. artciencia.com (ISSN 1646-3463) Ano I ● Número Dois ● Fevereiro-Abril 2006 - Pronto, está assente. Obrigada! - agradeceu Jorge contente pelo anuimento pronto da irmã - Bem, então posso ficar descansado que tu estás bem, ...certo? - insistiu de novo o rapaz, querendo certificar-se que de facto Isabel não sofrera quaisquer danos físicos. - Sim, ...podes ficar descansado, que eu estou óptima. Só tenho uma nódoa negra no joelho direito, e ontem doía-me um bocadinho a barriga... - respondeu a rapariga convictamente. - E foste ao médico? - indagou o irmão - Não, ...não é necessário... Isto foi só o susto, e aquilo do carro, portanto fica tranquilo... - esclareceu ela - E, ...mudando de assunto, a que horas chegas amanhã? - Não sei bem... - Mas, ...não estás a contar chegar tão tarde como na semana passada, pois não? - Livra!... Espero bem que não!... Já me chegou uma vez, porra!... Não estou muito... - principiou, interrompendo-se logo em seguida - Olha, vou ter que desligar, está alguém a tocar à campainha... Vemo-nos amanhã, está bem? Um beijinho... - concluiu, pousando rapidamente o auscultador do telefone e, precipitando-se para a porta de entrada, quando uma vez mais o ruído da campainha ecoou pelo corredor... - Boa tarde! - cumprimentou o carteiro, quando Jorge abriu finalmente a porta, recebendo das mãos do indivíduo um pequeno volume e duas cartas. - Obrigado!... - agradeceu o jovem delicadamente, voltando a entrar em casa, e dando uma vista de olhos pelo correio, constatando com alguma surpresa que a única correspondência que lhe era dirigida, tinha o remetente do Rio de Janeiro, Brasil... Espantado, abriu rapidamente o envelope, desdobrando de imediato o papel que este trazia no seu interior... De imediato reconheceu a letra de Ana... “Jorge, espero que esteja tudo bem por aí. Isto aqui é espectacular. O Rio de Janeiro é uma cidade enorme, e igualmente linda. As praias são maravilhosas, com areais longuíssimos, e águas límpidas e cristalinas. A vida nocturna é agitadíssima e as discotecas muito animadas, estão sempre cheias. Eu e o Rui estamos óptimos, e temo-nos divertido imenso. Espero que tu estejas a aproveitar a minha ausência para fazeres o mesmo. ‘Quem disse que a vida não é bela?’ Um beijo meu e da Paula, e um abraço do meu pai, e outro do Rui. Mil beijinhos da tua prima: Ana “ Jorge, sentou-se confortavelmente na cadeira do escritório, e após ter ligado o computador foi observando com atenção a restante correspondência que era dirigida à prima, enquanto esperava que o jogo que escolhera entrasse, e com o qual se ocupou durante 35
  • 36. Cartel Fantasma Alexandre Figueiredo bastante tempo. Por volta das cinco e meia da tarde, o jovem entrou na cozinha, e depois de beber um copo de água, dirigiu-se para a sala de estar, levando consigo uma apetitosa maçã. Pegou no livro que começara a ler há já algumas semanas, instalando-se no acolhedor sofá de pele, trincando descontraidamente a suculenta maçã e lendo em simultâneo. A leitura ocupou-o por completo até próximo das oito horas, quando por fim ficou a conhecer o desenlace da história. Nessa altura, voltou a dirigir-se para a cozinha, a fim de preparar o jantar. No congelador do frigorífico encontrou uma embalagem de lasanha, que apenas teria de aquecer no forno micro-ondas, para que esta estivesse pronta a comer. Quando por fim aquela refeição rápida ficou pronta, Jorge abriu o forno e usando uma luva para não se queimar, pegou no prato em que espalhara a lasanha, pousando-o sobre a mesa. - Porra..., esqueci-me outra vez de comprar cerveja! - exclamou, pegando desiludido numa lata de sumo de laranja, continuando a lamentar-se pelo seu esquecimento, sentando- se finalmente à mesa. A seguir à refeição o jovem juntou toda a louça que utilizara e arrumou-a cuidadosamente no interior da máquina de lavar, onde já se encontrava também uma quantidade apreciável de louça suja. Por isso, Jorge decidiu-se a premir o botão que fazia funcionar o aparelho de modo a que este pudesse lavar tudo aquilo que ele fora acumulando às refeições durante vários dias. Mais tarde, voltou a sentar-se comodamente no confortável sofá da sala de estar, descansando as pernas, como era hábito em cima da pequena e elegante mesa de madeira escura que se encontrava ao centro da dependência, enquanto esperava pelo filme que ia ser transmitido por um dos canais de televisão naquela noite... A manhã seguinte surgiu de novo escura e fria à semelhança do dia anterior, e embora não chovesse, a verdade é que o intenso nevoeiro que se formara durante a noite, tornava mais desolador um cenário que era por si só suficientemente sombrio. Por sorte, Jorge não tinha qualquer aula naquela manhã, pelo que já passavam alguns minutos do meio-dia, quando por fim ele se decidiu a sair debaixo do aconchego que lhe era proporcionado pelos inúmeros cobertores que tinha na sua cama, dirigindo-se de imediato para o quarto de banho a fim de tomar o seu habitual duche matinal, que tanto apreciava. Logo após terem soado as treze horas no antiquíssimo relógio da sala de estar, Jorge, terminou o almoço, e precipitando-se para a entrada da habitação, pegou apressadamente nos seus livros, saindo rapidamente, e fechando a porta atrás de si com um provocando um estrondo enorme. Depois, em passo de corrida, encaminhou-se para o espantoso BMW M3 coupé, que permanecia estacionado em frente da habitação. Já no interior do automóvel, rodou a chave na ignição, arrancando de uma maneira um tanto brusca, o que provocou que os pneus do veículo tivessem deixado alguma borracha agarrada ao asfalto irregular daquela estrada. Um pouco mais à frente, o jovem virou à direita num cruzamento, tomando o 36