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SIMONE ANTONIACI TUZZO
Texto 5
DESLUMBRAMENTO COLETIVO –
OPINIÃO PÚBLICA, MÍDIA E UNIVERSIDADE
Annablume
11
TUZZO, Simone Antoniaci.
Deslumbramento Coletivo – Opinião Pública, Mídia e Universidade /
Simone Antoniaci Tuzzo – São Paulo: Annablume, 2005.
238 p.; 14 x 21cm.
ISBN: 85-7419-448-4
1.Opinião Pública 2. Televisão 3. Universidade 4. Mídia
5.Comunicação Social – I. Título
Annablume Editora Comunicação
12
CAPÍTULO I
DO PRIVADO AO PÚBLICO:
REFLEXÕES SOBRE A PUBLICIZAÇÃO DO INDIVÍDUO
Há muito, os campos de estudo da Comunicação e da Educação já conhecem o tema
da opinião pública e as suas relações com os meios de comunicação de massa.
Necessário, contudo, é compreender o uso que se faz do termo opinião pública. A
primeira questão diz respeito à utilização do binômio como se fizesse referência à opinião de
um determinado público. Ou, relação à opinião de toda a sociedade, aí se configurando muito
mais como opinião da massa. Ou ainda, a possibilidade de publicamente todos expressarem
sua opinião sobre algo que não é privado, mas sim, pertence à coletividade.
Gomes (2001, p. 65) nos lembra que expressões como:
Convencer a opinião pública, informar à opinião pública, confundir a opinião
pública, ou ainda, sofrer nas mãos da opinião pública, seriam impossíveis se
pensássemos no sentido clássico daquilo que significa opinião. Tecnicamente, não
se convence uma opinião, no máximo se gera outra, assim como não se diria que
informamos a uma opinião, mas informamos a alguma instância que pode ter
opinião.
A segunda questão faz referência ao quantitativo de pessoas que representa a opinião
púbica. Até que ponto a opinião pública significa a visão da sociedade como um todo, ou o
fenômeno da opinião publicada, ou seja, a parcela da população que pode ter acesso a um
determinado assunto ou fato e expressar a sua opinião, caracterizando-se como opinião
exposta e disponível socialmente.
Neste princípio, quando falamos de opinião pública, na verdade estamos falando de
um grupo social que consegue pensar e manifestar sua opinião sobre coisas, relações,
circunstâncias, pessoas, fatos, questões, instituições, exercendo uma função de mecanismo-
guia, que estabelece os contornos daquilo que é possível para a sociedade.
Luhmann (1978, p. 97-8) faz uma crítica ao conceito clássico da opinião pública,
apresentando a idéia da tematização, colocando que na sociedade pós-industrial:
A opinião pública deve ser concebida como estrutura temática da comunicação
pública, fundada no fato de que, perante o número ilimitado de temas que podem ser
veiculados pela comunicação, a atenção do público só pode se manifestar de forma
limitada; não deve ser concebida causalmente como efeito produzido ou
continuamente operante; antes deve ser concebida funcionalmente, como
instrumento auxiliar de seleção realizada de uma forma contingente. A opinião
pública não consiste na generalização do conteúdo das opiniões individuais através
das fórmulas gerais, aceitáveis por todo aquele que faça uso da razão, mas sim na
adaptação da estrutura dos temas do processo de comunicação atrelada às
necessidades de decisão da sociedade e do seu sistema.
13
De acordo com Prada (1995) a opinião pública, conhecida como fenômeno
contemporâneo, foi assim observada pela primeira vez por Rousseau, que em 1750, cria o
termo opinião pública. Antes disso, em 1661, Glanwill formulou o conceito ‘clima de
opinião’, constituindo assim as bases sobre as quais se assentaria a tendência histórica para o
estudo da opinião pública, conhecida como escola clássica.
Importante lembrarmos que vinte e oito anos antes que Glanwill anunciasse o conceito
‘clima de opinião’, a fundação da congregatio de propaganda fide pelo Papa Urbano VIII,
uma instituição com o objetivo de difundir a doutrina de Cristo e propagar a fé, caracterizou-
se como um acontecimento histórico, classificado por alguns autores como manipulação da
opinião pública, e um dos primeiros movimentos estruturados e organizados de propaganda,
relações públicas e controle social.
Para Barros Filho (1995, p. 217) a importância do conceito de opinião pública remonta
aos pré-socráticos. Segundo o autor, tanto para Sócrates, quanto para Platão a opinião era
fruto de uma situação intermediária entre conhecimento e ignorância.
No entanto, a expressão – opinião pública – é muito mais recente. Embora haja
registros na literatura através de Shakespeare e Montaigne, o primeiro filósofo a
servir-se do termo com pretensões conceituais foi Rousseau. Para ele, o Estado se
estrutura em três tipos de leis: o direito público, o privado e o civil. Além dessas há
uma quarta, a mais importante, que não está gravada em mármore e bronze e sim no
coração dos cidadãos; uma verdadeira constituição do Estado cuja força se renova a
cada dia, que dá vida às outras leis e as substitui quando envelhecem ou
desaparecem. Refiro-me à moral, aos costumes e, sobretudo, à opinião pública.
Se nos concentrarmos na questão da comunicação, podemos citar Prada (1995, p. 71),
que coloca a questão da formação da opinião pública intrinsecamente ligada à questão da
Comunicação Social:
Se pensarmos que todo processo de comunicação traz consigo o conteúdo de uma
mensagem que gera resposta e esta resposta gera uma opinião, que provoca outra
reação que gerará outra opinião, e assim sucessivamente, em uma cadeia de estímulo
e efeitos da comunicação. Assim, podemos concluir que a primeira etapa da opinião
é a comunicação total, pessoal, direta e recíproca. O seu poder de formação da
opinião pública está ligado ao seu poder de retórica. Logo, não há opinião se não há
comunicação.
Para ele a opinião pública:
É o resultado de opiniões individuais sobre os assuntos de interesse comum que se
origina nas diferentes formas de comunicação humana, primeiramente através de
processos individuais, posteriormente, em processos coletivos, em diferentes graus,
segundo a natureza das informações compartilhadas pelos indivíduos, às vezes
influenciada pelos interesses particulares de grupos afetados. (1995, p. 127)
A opinião pública se forma no calor da discussão dos componentes do público e, para
Andrade (1996), caracteriza-se por não ser necessariamente uma opinião unânime, uma
opinião da maioria; muitas vezes é diferente da opinião de qualquer elemento no público; é
uma opinião composta, soma de várias opiniões divergentes existentes no público; está em
contínuo processo de formação e em direção a um consenso completo, sem nunca alcançá-lo.
14
Enfim, no dizer de Andrade, a opinião pública não é mais que a harmonia entre as opiniões
individuais.
Singular e Plural na Construção do Público
Na sociedade de massa que hoje vivemos, de forma geral, os bens simbólicos são
consumidos a partir da produção dos meios de comunicação de massa, entre eles a televisão, o
rádio ou o jornal impresso que se configuram como alguns dos produtores da cultura de
massa. Com algumas exceções como a Universidade, um espaço que ainda conserva a
possibilidade de discussão e crítica, em grupo, onde os símbolos ou bens culturais podem ser
pensados e discutidos coletivamente, para a maioria da população, o consumo desses produtos
é feito de forma isolada, ou seja, o consumo dos produtos da mídia é feito de forma individual
ou de grupos muito pequenos como os membros da família, amigos ou grupos de afinidade.
Assim, o pensamento coletivo desencadeado pelos meios de comunicação de massa
atinge um determinado alcance social por questões de distribuição geográfica isolada e não
por uma recepção coletiva, em grupos pré-determinados com possibilidade de discussão e
assimilação em grupo.
Dessa forma, quando pensamos no significado dos bens simbólicos criados pela mídia,
devemos considerar a contextualização social daqueles que estarão consumindo tais produtos.
Pensarmos na distância entre o significado de uma mensagem ao ser emitida pelo veículo e a
decodificação que os receptores farão, ou seja, as várias compreensões que serão feitas pelos
receptores.
Com isso, desencadeamos um questionamento sobre a forma de recepção dos produtos
dos meios de comunicação de massa e seus efeitos na sociedade, aquilo que, de fato, é
passado para a população sob o título de cultura de massa, ou indústria cultural, ou ainda,
como prefere chamar Bosi (1999, p. 320), cultura para as massas.
Para pensarmos sobre a recepção de mensagens pela massa, importante resgatar a
discussão sobre a troca do termo cultura de massa, proposto por Theodor W. Adorno no início
de 1947, quando o pensador substituiu a nomenclatura para indústria cultural, na sua obra
produzida em parceria com Max Horkheimer. Para eles, o termo indústria fazia alusão ao
complexo de produção de bens simbólicos, introduzindo a idéia de produção em série para a
cultura; o termo cultural foi adotado para elucidar o tipo desses bens.
Com não rara freqüência, encontramos autores como Thompson (1998, p. 16), que
consideram as teorias da Escola de Frankfurt petrificadas no passado, já sem muita aplicação
nos dias atuais:
Duvido que alguma coisa se possa ainda resgatar hoje dos escritos mais antigos dos
teóricos da Escola de Frankfurt, como Horkheimer, Adorno e Marcuse; sua crítica
do que eles chamavam a indústria da cultura era muito negativa e se baseava em
conceitos questionáveis sobre as sociedades modernas e suas tendências de
desenvolvimento.
Porém, quando analisamos o desenvolvimento da mídia como processo fundamental
de construção das sociedades modernas, verificamos que ainda podemos extrair profundas
análises sobre as teorias da Escola de Frankfurt, principalmente como compreensão histórica
da evolução dos meios de comunicação de massa e do comportamento social frente a eles.
15
Adorno e Horkheimer dirigiam o “Instituto de Pesquisas Sociais” de Frankfurt,
considerados os maiores expoentes da Escola que contou também com nomes como Jurgen
Habermas e Herbert Marcuse. A Escola de Frankfurt tinha por princípio trabalhar um
programa de pesquisa interdisciplinar que compreendia os processos de civilização modernos
e o desenvolvimento humano, passando pela política, as artes em geral e a vida cotidiana. A
originalidade estava em descobrir os efeitos dos meios de comunicação de massa e da
produção da cultura em série na sociedade.
Nesta linha de pensamento de Adorno e Horkheimer, muito mais que um re-batismo, a
troca do termo cultura de massa para indústria cultural abriu um pensar crítico sobre a posição
dos consumidores dos produtos dos veículos de comunicação de massa, colocando claramente
a condição destes como não participantes da produção dos bens simbólicos, como acontecia
nas culturas erudita e popular.
Textualmente Adorno afirma que:
Tudo indica que o termo indústria cultural foi empregado pela primeira vez no livro
Dialektik der Aufklãrung, que Horkheimer e eu publicamos em 1947, em Amsterdã.
Em nossos esboços tratava-se do problema da cultura de massa. Abandonamos essa
última expressão para substituí-la por “indústria cultural”, a fim de excluir de
antemão a interpretação que agrada aos advogados da coisa; estes pretendem, com
efeito, que se trata de algo como uma cultura surgindo espontaneamente das
próprias massas, em suma, da forma contemporânea da arte popular. Ora, dessa arte
a indústria cultural se distingue radicalmente. (...) A indústria cultural é a integração
deliberada, a partir do alto, de seus consumidores. Ela força a união dos domínios,
separados há milênios, da arte superior e da arte inferior. Com o prejuízo de ambos.
(ADORNO; HORKHEIMER, 1985)
Para refletirmos sobre a troca do termo proposto por Adorno e Horkheimer, faz-se
necessário pensar sobre o porquê da origem dele.
Antes do surgimento dos meios de comunicação de massa, a sociedade se
caracterizava por duas culturas: a cultura erudita e a cultura popular, marcadas,
principalmente, pelas classes sociais, determinadas por suas condições financeiras. Num
conceito simplista, a cultura erudita era produzida pelas classes altas e nos segmentos mais
protegidos da classe média; a cultura popular era produzida pelas classes pobres. Nas duas
versões os mesmos produtores das culturas eram também seus consumidores, ou seja, não
havia uma integração ou troca de valores simbólicos entre as culturas, conseqüentemente,
entre as classes sociais.
A partir do surgimento dos meios de comunicação de massa, há uma apropriação dos
bens simbólicos das duas culturas pelos veículos de comunicação, ou seja, música, dança,
artes plásticas ou qualquer forma de produção cultural passa a ser adaptada aos novos
veículos, o que Adorno e Horkheimer consideraram uma grande perda. Se por um lado, a
cultura erudita perde o seu efeito, por outro lado, a cultura inferior se vê imersa a uma
domesticação civilizadora.
A sociedade passa por um processo de pasteurização de seus bens simbólicos, sob o
tema de uma cultura de massa questionado por Adorno, Horkheimer e por Alfredo Bosi, tendo
em vista que a massa não produz a cultura, a massa somente consome os bens culturais.
Habermas (1984), em seu livro Mudança estrutural da esfera pública, discute o
problema, apresentando um público que migrou da condição de produtor de cultura para
consumidor de cultura.
16
Segundo Habermas, o grande prejuízo da apropriação das culturas erudita e popular
pela indústria cultural é a perda da possibilidade de discussão. O processo tem início com a
perda da prática da leitura desencadeada pelos meios de comunicação de massa com a difusão
de veículos como o rádio e a televisão, colocando a produção literária em um plano menor,
servindo a um quantitativo de pessoas da sociedade infinitamente menor que os consumidores
dos produtos eletrônicos.
Os produtos dos meios de comunicação de massa invadem a intimidade familiar e
desde o século XIX está abalando instituições que, até então, asseguravam a existência de
agrupamento de pessoas que se reuniam para pensar juntas sobre algo, conversar e discutir
assuntos que envolvessem a coletividade. Neste modelo de comunicação de massa as
discussões não encontram lugar. O convívio informal é ditado pela própria mídia e seus
agentes sociais se informam ou se divertem a partir do que a mídia apresenta, sempre como
produto já pronto e acabado. Para Habermas:
A discussão em sociedade entre indivíduos já não cabe mais no modelo: cede lugar a
atividade de grupo mais ou menos obrigatórias. Também estas encontram formas
rígidas de convívio informal; falta-lhes, no entanto, aquela força específica da
instituição. (...) Mesmo ao se ir junto ao cinema, ao se escutar conjuntamente rádio
ou olhar televisão, dissolveu-se a relação característica da privacidade correlata a
um público: a comunicação do público que pensava a cultura ficava intimamente
ligada à leitura que se fazia na clausura da esfera privada caseira. As ocupações do
público consumidor de cultura no tempo de lazer ocorrem, no entanto, elas mesmas,
num clima social em que não precisam encontrar alguma continuidade em
discussões. Com a forma privada de assimilação também se perde a comunicação
pública sobre o assimilado. A sua correlação dialética mútua é nivelada sem tensões
no quadro das atividades do grupo. (1984, p. 189 - 193)
Thompson (1998, p. 69) faz um adendo à obra de Habermas, considerando que, na
mesma época, outras formas de discurso e atividades públicas existiram, formas que não
fizeram parte da sociabilidade burguesa, como as que emergiram da cultura popular, muitas
vezes excluídas ou em oposição à cultura erudita, mas que tiveram uma grande importância na
variedade dos movimentos sociais e políticos plebeus nas origens da era moderna.
Embora discutindo a mesma dinâmica social explicitada por Habermas de imposição
de cultura (tanto para a cultura erudita quanto a popular) pelos meios de comunicação de
massa, as visões de Adorno e Horkheimer se configuram em um pensamento muito mais
pessimista em relação aos efeitos dos produtos dos mass media. Para eles a indústria cultural
reorienta as massas, não permite a evasão e impõe sem cessar os esquemas de seu
comportamento.
Para Adorno, somente a arte mais elevada, a mais pura, a mais abstrata poderia escapar
da manipulação e da queda no abismo da mercadoria e do magma totalitário.
Habermas não nega o fato de que há uma forte tendência para a dominação total dos
meios, auxiliada, inclusive pela busca constante de ampliação do capital e pelo processo de
venda de produtos pelos veículos de comunicação de massa, a chamada publicidade. Porém a
diferença entre os pensadores está no fato de Habermas possuir uma postura otimista sobre o
processo, conseguindo enxergar formas de resistência a esta aparente impossibilidade de
discussão sobre os produtos dos meios de comunicação de massa pela sociedade.
Para Habermas (1984), as pessoas passariam a decidir sobre a orientação das ações
sociais não por um processo de força ou pressão dos meios, mas por uma disposição
democrática de dialogar e alcançar o consenso, recriando espaços de discussões que, ainda
17
que diferentes daqueles existentes na época das culturas erudita e popular, seriam também
formas de pensar a cultura.
Segundo Habermas, a tendência ao debate pelos grupos sociais permanece, até porque
essa é uma necessidade dos grupos religiosos, dos grupos políticos e dos próprios meios de
comunicação, que passam a organizar formalmente os antigos debates informais sobre uma
cultura que pode e deve ser discutida.
Com isso, a discussão parece sujeita a grandes cuidados e não parecem existir
limites à sua expansão. Por baixo do pano, no entanto, ela se alterou de modo
peculiar: ela mesmo assume a configuração de um bem de consumo. (...) A
discussão, incluída no ‘negócio’, formaliza-se. (...) O mercado dos bens culturais
assume novas funções na configuração mais ampla do mercado do lazer. (...) Sim, a
cultura de massa recebe o seu duvidoso nome exatamente por conformar-se às
necessidades de distração e diversão de grupos de consumidores com um nível de
formação relativamente baixo, ao invés de, inversamente, formar o público mais
amplo numa cultura intacta em sua substância.(1984, p.193-5)
Mais tarde, Thompson tece uma crítica a respeito, colocando que o problema dessa
argumentação está no processo de refeudalização da esfera pública:
O desenvolvimento dos meios de comunicação criou novas formas de interação,
novos tipos de visibilidade e novas redes de difusão de informação no mundo
moderno, e que alteraram o caráter simbólico da vida social tão profundamente que
qualquer comparação entre política mediada de hoje e políticas teatrais das cortes
feudais é, no mínimo, superficial. Mais do que comparar a arena das mediações
deste século XX com eras passadas precisamos repensar o significado do caráter
público hoje, num mundo permeado por novas formas de comunicação e de difusão
de informações, onde os indivíduos são capazes de interagir com outros e observar
pessoas e eventos sem sequer os encontrar no mesmo ambiente espaço-temporal.
(1998, p. 72)
Thompson (1998, p. 207), contudo, não nega que as formas de articulação social desde
as classes populares de trabalhadores, até os salões, cafés e clubes da vida social burguesa, a
partir do desenvolvimento dos meios impressos de comunicação, “desempenharam um papel
muito importante na emergência destas formas de vida pública e na articulação de um tipo de
opinião pública que se distinguia das doutrinas oficiais do estado e exercia contra elas um
crescente poder crítico”.
Habermas coloca a questão no âmbito educacional, lembrando que, no final do século
XVIII, o público das camadas cultas havia se expandido no seio da pequena burguesia
empresarial, quando pequenos comerciantes fundaram suas próprias associações, numa forma
de sociedade de leitura. Assim, homem culto é quem possui uma enciclopédia; esse critério é
assumido aos poucos por pessoas de outras classes sociais como artesãos e merceeiros, numa
clara posição de que a própria cultura não é rebaixada a uma cultura de massa, mas educa-se o
povo para que ele possa ter acesso a ela. Segundo o autor:
A medida que a cultura se torna mercadoria, e isso não só por sua forma, mas
também por seu conteúdo, ela se aliena àqueles momentos cuja recepção exigem
uma certa escolarização – no que o ‘conhecimento’ assimilado por sua vez eleva a
própria capacidade de conhecer. (1984, p. 196)
18
Thompson (1998, p. 59) reporta a questão para o final do século XVI e início do
século XVII, com o surgimento das primeiras editoras na Europa, explicando que:
Os clientes das primeiras casas editoras foram as elites urbanas instituídas, incluindo
o clero, professores e estudantes, a elite política e a emergente classe social. Mas é
provável também que alguns livros tenham sido comprados e lidos também por uma
proporção crescente de artesãos urbanos e comerciantes. Embora provas dos índices
de alfabetização no início da Europa moderna sejam fragmentárias e inconclusivas,
há alguns indícios que nos sugerem números relativamente elevados de
alfabetizadores entre certos grupos de artesãos, como boticários, cirurgiões,
tipógrafos, pintores, músicos e ourives. Os livros eram disponíveis à venda em lojas
na cidade e em tendas no mercado, e os menos volumosos e mais baratos estavam
certamente presentes entre os trabalhadores urbanos e artesãos.
Para além destas idéias, Barbero (2001), um teórico que criticou o elitismo da Escola
de Frankfurt, principalmente a partir das idéias de Adorno, observa que o formato de
massificação, decorrente dos meios de comunicação de massa, teve origem antes de os meios
existirem, através da igreja, da literatura de cordel ou do melodrama. Assim, a cultura
contemporânea não se desenvolve sem os públicos massivos. Nem a cultura de elite, nem a
popular seriam redutos incontaminados a partir dos quais se pudesse construir outra
modernidade alheia ao caráter mercantil e aos conflitos da hegemonia. A idéia de que ficam
em lados opostos e hermeticamente fechados os emissores-dominantes e os receptores-
dominados, sem resistência nem questionamentos, já não é mais aceitável.
Acredita o autor que:
Com o passar dos anos algo nos estremeceu a realidade, destruindo velhas certezas e
abrindo novas brechas. Hoje vivemos a trama de modernidade e descontinuidades
culturais, deformações sociais e estruturas do sentimento, de memórias e
imaginários que misturam o indígena com o rural, o rural com o urbano, o folclore
com o popular e o popular com o massivo. Assim a comunicação se tornou para nós
questão de mediações muito mais que de meios, questão de cultura e, portanto, não
só de conhecimento mas de re-conhecimento. Um reconhecimento que foi, de início,
operação de deslocamento metodológico para re-ver o processo inteiro da
comunicação a partir de seu outro lado, o da recepção. (2001, p.27-8)
Assim, os meios de comunicação de massa devem ser vistos como uma oportunidade
nunca antes experimentada de revitalização do indivíduo, “massa deve deixar de significar
anonimato, passividade e conformismo. Já que é impossível que uma sociedade chegue a uma
completa unidade cultural, então o importante é que haja circulação. E quando existiu maior
circulação cultural que na sociedade de massa?”. (BARBERO, 2001, p. 70)
Influenciado pela Escola de Frankfurt, Morin (1977) analisa a questão resgatando a
idéia central do pensamento crítico e o otimismo dos teóricos norte-americanos. Pare ele
Indústria cultural não significa exatamente a racionalidade que informa essa cultura, mas sim
o modelo peculiar em que se organizam os novos processos de produção cultural.
Desta forma, enquanto Adorno e Horkheimer afirmavam que toda criação artística
perde seu valor quando passa a figurar nos veículos de comunicação de massa,
transformando-se em simples produção, fazendo com que algo que seja arte não possa ser
19
indústria, Morin nos coloca outra possibilidade, mostrando que a divisão do trabalho e a
mediação tecnológica não são incompatíveis com a criação artística.
Morin acredita, inclusive, que mesmo a estandartização não anula a tensão criadora.
Mais que isso, mostra uma possibilidade de pensamento de alternativas, até porque, para ele
não existe uma arte separada da vida, tampouco uma cultura separada da cotidianidade.
Corroborando esse pensamento, Barbero (2001, p. 47-8) entende que: há uma
continuidade da arte com a vida, encarnada no projeto de lutar contra tudo o que separe a arte
da vida, pois, mais do que nas obras, a arte reside é na experiência. E não na de alguns
homens especiais, os artistas-gênios, mas até na do homem mais humilde que sabe narrar, ou
cantar, ou entalhar a madeira.
Morin (1977) também analisa através dos meios de comunicação de massa o processo
do real e do imaginário, que projetará na sociedade a existência de heróis e celebridades,
colocando para os meios a função de estabelecer uma comunicação entre o real e o
imaginário.
Assim, entre as idéias de imposição dos produtos dos meios de comunicação de massa
consumidos de forma inquestionável por toda a sociedade, criada por Adorno e Hokheimer;
uma possibilidade de pensamento crítico sobre os produtos dos mass media pela sociedade
elucidada por Habermas; as contribuições de Thompson; uma nova visão de Barbero,
colocando não mais uma sociedade passiva, mas sim uma sociedade que pode ditar os rumos
dos produtos criados pelos meios de comunicação de massa e as idéias de Edgar Morin, sobre
a possibilidade de a técnica estar conjugada à criação artística numa simbiose entre arte e vida
dentro de uma cotidianidade, abriremos uma discussão sobre a formação da opinião pública.
No final dos anos 20 do século XX um congresso de sociólogos alemães discute o
tema opinião pública, apreciando o formato de grandes instituições jornalísticas que
apresentam um máximo de público, mas um mínimo de opinião, atrelado à publicidade, há um
reforço sobre esta idéia, gerando, inclusive uma leitura inversa, denominada de opinião não
pública.
Habermas (1984) defende a idéia de que as opiniões pessoais de indivíduos privados
podem evoluir para uma opinião pública através de um processo de debate crítico racional que
seja aberto a todos e livre de qualquer dominação.
O problema, contudo, é que esta concepção tem pouca relação com os tipos de ação
e comunicação que se tornaram enormemente comuns no mundo moderno. Hoje
ações podem afetar indivíduos largamente dispersos no espaço e no tempo; e a
mídia criou formas de comunicação que não implicam diálogos em locais
compartilhados. (THOMPSON, 1998, p. 225)
Para Habermas (1984, p. 277) a opinião pública reina, mas não governa. Com a ajuda
da discussão parlamentar, a opinião pública dá a conhecer ao governo as suas aspirações e o
governo transmite à opinião pública a sua política.
Da mesma forma os meios de comunicação de massa utilizam-se da opinião pública
para conhecimento daquilo que esta poderá absorver de informação, garantindo,
principalmente, audiência. A opinião pública não necessariamente reflete a opinião da
maioria, mas sim, reflete a opinião de uma parcela dominante da sociedade.
A partir daí o restante da população terá somente que absorver a nova informação.
Normalmente o membro individual do grupo possui uma idéia errônea da importância de sua
opinião e de seu comportamento para a formação da opinião pública. Não conhece também
20
quantos dos demais membros da sociedade partilham ou rejeitam a idéia apresentada como
coletiva e a sua provável não aceitação.
Esse desconhecimento, normalmente, empobrece a possibilidade de uma
argumentação, tendo em vista que a exposição individual em um processo coletivo tende a
não existir por medo ou vergonha dos demais componentes do grupo. Assim, a possibilidade
de uma rejeição da idéia da opinião pública tende a se tornar diminuta.
Para que o conceito fique completo se faz necessário aqui também pensarmos sobre o
que a sociedade considera como público, ou seja, se a massa já se caracteriza como um
agrupamento de indivíduos diferente do que identificamos como público, podemos considerar
que a opinião pública não se forma a partir da opinião da massa, mas sim, surge numa esfera
de público em oposição àquilo que é privado, sem ser, contudo, aquilo que faz parte da
maioria.
Assim, a opinião pública apresenta a opinião de uma esfera pública de pessoas
privadas reunidas num público. A grande massa, ou o chamado público enquanto tal, de forma
esporádica é inserido neste processo, majoritariamente ele aclama o processo já definido.
Mesmo quando a opinião pública pode ter chances reais de escolha como o voto nas
eleições diretas, por exemplo, previamente instâncias políticas ou econômicas superiores já
pré-determinaram e reduziram o universo de escolha de cada indivíduo na sociedade. Ou seja,
a reprodução social, ou pessoas privadas, ainda depende de consumir aquilo que o exercício
do poder político e/ou econômico determinou.
Sobre isso, Bourdieu em seu ensaio L’opinion publique n’existe pas, publicado no
livro Questions de sociologie (1984) de uma forma direta e extremista afirma: “a opinião
pública não existe”. O autor explica que:
Qualquer pesquisa de opinião supõe que todo mundo pode ter uma opinião; ou
colocando de outra maneira, que a produção de uma opinião está ao alcance de
todos. Mais que isso, supõe-se que todas as opiniões têm valor e se equivalem na
composição da opinião pública. Na verdade, pelo simples fato de se colocar a
mesma questão a todo mundo, fica implícita a hipótese de que há um consenso sobre
os problemas, ou seja, que há um acordo sobre as questões que merecem ser
colocadas. Nenhuma dessas suposições são evidentes.
Sobre outra ótica, Rosnay (2002, p. 218) analisa a questão observando que a opinião
pública exerce uma potencial pressão sobre os governantes, porém, as mudanças propostas
pela opinião pública, ou até suas eventuais conquistas, sempre estarão atreladas a estâncias
superiores:
Certamente, o crescimento, a competitividade e a mobilização contra o invasor
podem representar forças coletivas capazes de fazer mudar as coisas. Mas elas
conduzem, geralmente a mudanças ou a evoluções mais submissas do que desejadas.
Na verdade, os homens parecem menos aptos a resolver os problemas complexos,
em coletividade, do que individualmente ou em pequenos grupos.
Em outras situações, em que ações públicas poderão desencadear uma reação da
população, normalmente existe a chamada sondagem de opinião, através da qual se conhece
preliminarmente a reação que toda a sociedade possa vir a ter ou qual a idéia colocada que a
opinião pública poderá vir ou não a absorver.
A minha interpretação coincide com a de Sodré (2002), para quem não é verdade que
não exista uma opinião pública; a questão é que os conceitos atribuídos ao binômio foram
21
sendo distorcidos ao longo dos anos de forma a torná-lo inexistente como representativo da
totalidade da massa.
Se tomarmos como exemplo as ações políticas partidárias, quando comumente são
realizadas pesquisas de opinião para conhecimento da opinião pública, a forma de obtenção
dos dados pelos grupos políticos induz respostas de forma a produzir o que Sodré (2002, p.
44) chama de pseudofenômeno político. Pare ele “o controle estatístico da cidadania pelas
sondagens canaliza e orienta certas disposições preexistentes ou latentes (...) a opinião pública
existe como uma forma de buscar o que de algum modo já se tem.”
Para Barbero (2001), a opinião pública não se forma de maneira aleatória, mas sim,
forma-se dentro de um processo de análise, para poder agir no momento certo. Para ele:
Massa é um fenômeno psicológico pelo qual os indivíduos, por mais diferente que
seja seu modo de vida, suas ocupações ou seu caráter, estão dotados de uma alma
coletiva que lhes faz comportarem-se de maneira completamente distinta de como
faria cada indivíduo isoladamente. (p. 59)
A opinião pública não diz respeito, necessariamente, a uma opinião construída pela
massa. Numa relação com a divisão social entre público, massa e multidão, a opinião pública
se reporta majoritariamente aos públicos. É a partir dos grupos sociais com capacidade para
pensar sobre assuntos relevantes para a coletividade, suas formas de interação e reflexão, e,
acima de tudo, sua capacidade de expressar a opinião que a opinião pública se forma. É uma
opinião com força e capacidade de ser conhecida publicamente.
Em uma sociedade de massa, com um grande contingente de pessoas dispersas
fisicamente, os meios de comunicação de massa desenvolvem um papel determinante na
formação da opinião pública. São, de fato, responsáveis por grande parte daquilo que a
sociedade entenderá por opinião pública. Além da mídia, podemos encontrar outras maneiras
de formação da opinião pública, através de grupos específicos como os de uma organização
social – escola, órgãos públicos, clubes recreativos ou de serviço.
A educação e os fatores psicológicos de cada indivíduo têm papel fundamental no
processo. A seguir veremos como os efeitos dos meios de comunicação de massa, as relações
sociais e a consciência dos receptores se desenvolvem na construção da opinião pública.
A Psicogênese da Formação da Opinião Pública
O pensador canadense Marshall McLuhan (1967) insiste seguidamente no caráter
subliminar dos efeitos dos meios de comunicação. Para ele, é perfeitamente ilusório tentar
controlar esses efeitos com base no conteúdo daquilo que cada meio veicula. Para defender-se
de um meio, somente recorrendo a outro. Para contrabalançar os efeitos da exposição à
imagem da TV, é necessário recorrer a outro meio: por exemplo, a palavra impressa.
Encontramos assim uma forma de controle dos efeitos dos meios de comunicação, ou
seja, a diversidade de veículos de informação, ainda que de forma não muito otimista, uma
vez que McLuhan também afirma que somente quem controla os meios pode ter o domínio
dos seus efeitos.
Analisemos, porém, uma possibilidade de sermos mais ou menos impermeáveis aos
efeitos dos produtos da Indústria Cultural, por meio de uma ação consciente dos grupos
sociais em que cada indivíduo esteja envolvido, através de uma consciência da real natureza
dos media e a percepção das mensagens veiculadas por eles, conforme a característica de cada
um desses meios, a partir de uma diversidade de informações.
22
O ecletismo dos meios de comunicação, atrelado à possibilidade de discussão, quer em
família, universidades, clubes de bairro, igrejas, ou qualquer outro agrupamento social,
resultará num avanço da busca pelo senso crítico pessoal frente aos produtos da Indústria
Cultural, criando uma forma de resistência passiva às mensagens dos meios de comunicação
de massa.
Barbero (2001) reforça a idéia de que é através do aumento de circulação de bens e
mensagens que as sociedades contemporâneas atingem o processo de democratização,
contudo, a facilidade de acesso não é uma garantia para que as massas compreendam o que se
passa, tampouco vivam e pensem melhor.
A psicologia apresenta uma sociedade que se move a partir das mensagens dos meios
de comunicação de massa, entre elas as formas de construção dos programas de TV, as
veiculações do rádio e a forma de diagramação e construção dos textos dos veículos
impressos.
Para Guareschi (1991, p.14-15), a sociedade moderna coloca o povo em profundo
anonimato, causando uma massificação generalizada. Todos são anônimos e iguais, exceto os
que estão nos meios de comunicação, os que podem aparecer, aqueles que podem ter o rosto,
a voz ou o nome conhecido. Uma das implicações desse formato de sociedade é a relação
marcante entre a comunicação e o poder. Para o autor, quem detém a comunicação detém o
poder e, numa sociedade em que a comunicação é capaz de construir a realidade dos fatos,
aquele que possui o poder de construir essa realidade conquista o poder sobre a existência das
coisas, a difusão das idéias e a criação da opinião pública:
Mais que isso, os que detém a comunicação chegam até a definir os outros, definir
determinados grupos sociais como sendo melhores ou piores, confiáveis ou não
confiáveis, tudo de acordo com os interesses dos detentores do poder. Quem tem a
palavra constrói identidades pessoais ou sociais. Já foram feitos estudos
interessantes sobre o que determinados povos pensam de outros povos. Essa opinião
está baseada, principalmente, nas informações que as pessoas recebem. Em estudos
e pesquisas realizados no campo da comunicação, verificou-se que a opinião pública
é preparada com informações sobre determinadas populações.
Além disso, é importante lembrarmos de todo o processo de transmissão de uma
informação. Para isso, consideremos que cada indivíduo é composto por 3 elementos
estruturais:
Cultura, sociedade e personalidade. A cultura é o estoque de saber da comunidade,
que contém os conteúdos semânticos da tradição, onde os indivíduos se abastecem
dos modelos de interpretação necessários ao convívio social. A sociedade, strictu
sensu, é composta dos ordenamentos legítimos pelos quais os membros da
comunidade regulam suas solidariedades. A personalidade é um conjunto de
competências que qualificam um indivíduo para participar da vida social.
(ROUANET, 1989, p. 23)
Segundo Goldmann (1972, p.8), “numa transmissão de informações não há apenas um
homem ou um aparelho que emite informações e um mecanismo que as transmite, mas
também, em qualquer parte, um ser humano que as recebe.”
E vai além, explicando a consciência do receptor:
Essa consciência é opaca a toda uma série de informações que não passam em razão
mesmo de sua estrutura, enquanto outras informações passam, e outras, enfim, só
23
passam de maneira deformada(...). Muito freqüentemente, na verdade, quem olha do
exterior e tenta comparar o que foi emitido com o que foi recebido constata que
apenas uma parte da emissão foi recebida e que mesmo essa parte, ao nível da
recepção, adquiriu uma significação assaz diferente da que fora enviada. Trata-se aí
de um fato extremamente importante que leva especialmente a repor em discussão
toda a sociologia contemporânea na medida em que ela é mais centrada sobre o
conceito de consciência real que sobre o conceito de consciência possível.
O real é a realidade que o receptor conhece a partir das possibilidades de sua
interpretação. Uma mesma mensagem sofrerá interferências de recepção em cada indivíduo a
partir dos valores que cada receptor já possui. Assuntos como religião ou política têm uma
tendência à polêmica porque as relações dos indivíduos com estas questões extrapolam as
informações e são colocadas sob a ótica de doutrina, crença ou idolatria. Assim, uma
informação que contraste os valores previamente adquiridos terá uma tendência à resistência e
à não aceitação.
Minayo (2000, p. 69) citando Goldmann, afirma que a significação humana não pode
ser compreendida fora da estrutura social, pois a consciência se concebe, desde a origem,
como um produto social. Para as ciências Sociais é imprescindível lembrar a importância dos
significados dados pelos atores sociais a seus atos e aos acontecimentos a partir daquilo que
cada um considera relevante.
Para a autora, isso ocorre porque o objeto das ciências sociais (para efeito de uma
pesquisa social) é histórico:
Significa que as sociedades humanas existem num determinado espaço, num
determinado tempo, que os grupos sociais que as constituem são mutáveis e que
tudo, instituições, leis, visões de mundo são provisórios, passageiros, estão em
constante dinamismo e potencialmente tudo está para ser transformado. (2000, p.69)
E continua fazendo uma reflexão sobre os conceitos de consciência possível e
consciência real descritos por Goldmann, afirmando que:
De acordo com o desenvolvimento das forças produtivas, com a organização
particular da sociedade e de sua dinâmica interna, desenvolvem-se visões de mundo
determinadas que nem os grupos sociais e nem os filósofos e pensadores conseguem
superar. Alguns grupos sociais e alguns pensadores logram sair do senso comum
dado pela ideologia dominante, mas, mesmo assim, seu conhecimento é relativo e
nunca ultrapassa os limites das relações sociais de produção concretas que existem
na sua sociedade. O pensamento e a consciência são fruto da necessidade, eles não
são um ato ou entidade, são processos que têm como base o próprio processo
histórico. (MINAYO, 2000, p. 20)
Sob uma outra perspectiva, Fadul (1982, p.39-49) coloca a questão como problema
educacional:
Ao nível da educação formal, consideramos urgente e indispensável que se
reconheça esse novo domínio do conhecimento, o do estudo dos meios de
comunicação de massa, introduzindo uma nova disciplina que tenha por objetivo
alfabetizar, para uma leitura crítica e seletiva das mensagens divulgadas pelos mídia,
com a finalidade de superar a oposição entre o universo da escola e dos meios de
comunicação de massa, que se traduz na oposição entre o fácil e o difícil, o
recreativo e o instrutivo. Pois a introdução dos novos meios na escola é a única
24
defesa possível contra os efeitos nocivos da mídia. Aprender-se-ia a lê-los como um
livro e sua utilização permitiria a desmistificação de sua linguagem.
Considerando as colocações de Goldmann, Minayo, e Fadul, o que verificamos é que
os meios de comunicação de massa, conscientes do problema de má interpretação, ou
dificuldade de interpretação, por parte dos consumidores, acabam empobrecendo vocabulários
e adaptando mensagens para a compreensão da grande parcela da população brasileira, ainda
que esta adaptação implique em uma perda do conteúdo.
Falando especificamente da televisão, Bourdieu acrescenta que ela pode reunir numa
noite, mais pessoas que as mídias impressas, a exemplo da totalidade dos jornais franceses
reunidos. Esse grande público constitui uma legião de pessoas absolutamente heterogênea, e
para atingi-los a mídia tem que perder suas asperezas, tudo aquilo que pode excluir algum
membro da sociedade ou dividir as atenções:
Mais que isso, ele deve aplicar-se em não chocar ninguém, como se diz, em jamais
levantar problemas ou apenas problemas sem história. Na vida cotidiana, fala-se
muito da chuva e do tempo bom porque é o problema com o qual se está certo de
não causar choque. Quanto mais um jornal estende sua difusão, mais caminha para
assuntos-ônibus que não levantam problemas. Constrói-se o objeto de acordo com as
categorias de percepção do receptor. (BOURDIEU, 1997, p. 62-3)
Assim, o que podemos notar é toda uma estrutura adotada pelos veículos de massa
para homogeneizar a linguagem, realizando verdadeiras traduções de conteúdos para os
consumidores dos produtos da Indústria Cultural, além de contarmos com os processos
culturais por que passam os indivíduos ou grupos de indivíduos na sociedade, modificando
determinados significados regionais ou locais. Atrela-se a isso também o problema
educacional e a falta de prática interpretativa.
Barros Filho (1995, p. 223) explica o processo através da hipótese do knowledge gap,
ou intervalo do conhecimento, apresentada pela primeira vez à comunidade por Tichenor,
Donohue e Olien, em 1970. Segundo a hipótese:
Para o senso comum e alguns comunicólogos midiáticos, a mídia socializa o
conhecimento. O fato de a recepção, sobretudo televisiva, se dar de forma intensa
em todos os níveis sociais serve de argumento para que se acredite na tese
homogeneizadora da veiculação informativa. No entanto, as pesquisas realizadas
sobre os efeitos da recepção informativa mostram o contrário. Os grupos de maior
capital cultural, que ocupam os níveis mais altos na escala socioeconômica,
apresentam uma absorção da informação sempre superior aos grupos de nível de
instrução inferior. A distância de conhecimento entre esses grupos em vez de
diminuir, aumenta. Os meios de comunicação servem como instrumento de
reprodução das desigualdades culturais.
Além de todos esses fatores, ainda contamos com o fator psicológico, pelo qual cada
indivíduo tem o poder de impermeabilizar-se a ou supervalorizar determinadas informações a
partir dos valores que cultua, entre eles, o bem, o mal ou o belo, valores que não
necessariamente têm significados iguais para todos os indivíduos, aliás, com muita
freqüência, causam reações opostas entre pessoas ou grupos de uma mesma sociedade.
Neste sentido, temos que considerar que determinadas informações são incompatíveis
para este ou aquele grupo social. Assim, como os meios de comunicação de massa não fazem
esse tipo de distinção, a busca por um outro meio de comunicação regional ou local é
fundamental para a complementação de informações necessárias ao dia-a-dia.
25
Muitas vezes, a homogeneidade em relação a uma segmentação intelectual não garante
a recepção homogênea, através dos meios de comunicação, deste mesmo grupo, no tocante a
valores pessoais. Evidencia-se, nestes casos, uma heterogeneidade. A opinião relaciona-se
com um sistema de crenças e ideologias do indivíduo, o que Da Viá descreve como:
Um estado de disposição mental e nervosa, organizado pela experiência, que exerce
influência direta e dinâmica sobre as respostas individuais a todos os objetos e
situações com os quais se relaciona. Sendo essencialmente expressão, a opinião é de
natureza comunicativa e interpessoal, serve de mediadora entre o mundo exterior e o
indivíduo. (1983, p. 29)
Estudos na área da psicologia explicam que a adaptação à realidade faz-se através da
avaliação crítica dos fatos, fazendo com que cada indivíduo reajuste constantemente as suas
relações com o meio. O indivíduo tem necessidade de expressar a sua opinião como forma de
interação ao meio social em que vive. As opiniões certas de serem aceitas pelo grupo são
colocadas de forma mais fácil do que aquelas que tendem a uma rejeição pela maior parte das
pessoas que formam um grupo.
Através da interpretação psicológica, as relações sociais são estruturadas a partir do
mecanismo de identificação, que se apresenta como a introjeção, que é a assimilação das
características dos outros e a projeção, que é a atribuição ao outro de suas próprias
características. Elementos fundamentais para o reconhecimento das semelhanças e diferenças
como princípios constitutivos do indivíduo.
Ainda considerando a necessidade de expressão dos indivíduos como forma de
interação ao meio social, podemos considerar a hipótese da “espiral do silêncio”. Um modelo
de opinião pública, de autoria da alemã Noelle-Neumann (apud Barros Filho, 1995, p. 207-
211), que se baseia nos elementos destacados por Alexis de Tocqueville, quais sejam, medo
que os agentes sociais têm de se encontrarem isolados em seus comportamentos, atitudes e
opiniões; a tendência ao silêncio e a necessidade de consonância.
Segundo a hipótese, esse medo do isolamento social faz com que as pessoas
tendencialmente evitem expressar opiniões que não coincidam com a opinião dominante. Esse
silêncio tendencial é possível porque os agentes sociais têm aguda percepção de qual é a
opinião dominante, que seria, em grande parte, imposta pelos meios de comunicação de
massa. Desta forma, há uma tendência ao silêncio quando o indivíduo, por medo de
isolamento, não expressa sua opinião quando ela é minoritária.
A idéia visa explicitar a dimensão cíclica e progressiva dessa tendência ao silêncio.
Quanto mais uma opinião for dominada dentro de um universo social dado, maior será a
tendência a que ela não seja manifestada.
Neste princípio, a possibilidade de um grupo isolado que discorda de uma opinião
expressada nos meios de comunicação de massa manifestar sua visão de um fato é
absolutamente reduzida; haverá, portanto, uma tendência, desse grupo minoritário, ao
silêncio.
A maior parte dos agentes sociais procura evitar o isolamento, assim, cada um observa
seu próprio meio para constatar quais opiniões prevalecem ou se fortalecem, ou quais estão
em declínio.
Para que o processo da espiral possa se desenvolver é preciso que haja uma opinião
dominante, ou seja, uma seleção imposta de temas e abordagens, além disso, haja o medo do
isolamento por parte daqueles que não comungam dessa opinião dominante e, por fim, que
esses últimos percebam qual é a opinião dominante e sua tendência a fim de que possam
contrastá-la com a própria opinião.
Para Barros Filho (1995, p. 220):
26
o ser humano tem horror ao isolamento opinativo. Sustentar uma opinião contrária à
da maioria traz desconforto. Esse medo é generalizado e estatisticamente
comprovado. Para que se possa evitar esse isolamento é preciso que se saiba qual é a
opinião dominante.
Não podemos desconsiderar, contudo, que nem sempre um indivíduo que sustenta uma
opinião minoritária desistirá de sua posição ou se calará diante da opinião dominante. O medo
provocado pela hipótese da espiral do silêncio se manifesta nos atores sociais de diferentes
formas. A competência de cada ator social para abordar os temas em discussão condiciona
uma tomada de posição pública.
Desta forma Barros Filho nos diz que:
o medo do isolamento será tanto mais decisivo na tomada de posição quanto menor
a confiança que tiver o indivíduo na sua argumentação, que, por sua vez, é
dependente de todo o conjunto de elementos constitutivos do grau de educação,
conhecimento ou politização. (1995, p. 223)
O medo do isolamento tem sua base firmada nas questões psicológicas. Pesquisas
realizadas pelo psicólogo Salomon Asch na década de 50 revelam que poucos indivíduos
confiam em si mesmos quando confrontados com uma opinião externa. Por experiência o
psicólogo conseguiu provar que entre apresentar uma resposta certa para uma determinada
situação, discordando da pressão de uma resposta errada, o indivíduo prefere errar consciente,
mas concordar com o grupo dominante. Os indivíduos “temem mais o isolamento que o erro”.
(BARROS FILHO, 1995, p. 222)
Um outro ponto a ser considerado é a análise sobre a recepção dos produtos dos meios
pela sociedade. Segundo Lopes (1995, p.101):
A pesquisa sobre recepção dos meios pela sociedade é marcada pela ausência da crítica
cultural e política, tal como fora proposta pela tradição dos estudos culturais (...)
fundamentalmente o que os estudos culturais propõem é que as práticas de recepção sejam
articuladas com as relações de poder. A recepção, portanto, não é um processo redutível ao
psicológico e ao cotidiano, mas é profundamente cultural e político. Isto é, os processos de
recepção devem ser vistos como parte integrante das práticas culturais que articulam
processos tanto subjetivos como objetivos, tanto micro, como macro. A recepção é então um
contexto complexo e contraditório, multidimensional, em que as pessoas vivem o seu
cotidiano. Ao mesmo tempo, ao viverem esse cotidiano, as pessoas se inscrevem em relações
estruturais e históricas, as quais extrapolam as suas práticas.
Na verdade, os estudos qualitativos da recepção, nacionais ou internacionais, são
insuficientes no tocante à crítica cultural e política, pois normalmente dissociam as práticas
cotidianas de comunicação das relações de poder.
Não há garantia de que aquilo que os meios de comunicação de massa oferecem aos
seus públicos seja exatamente aquilo que eles recebem. A audiência não nasce, ela se faz a
partir de várias maneiras diferentes de construções da sociedade. Os receptores dos meios de
comunicação de massa não são recipientes vazios prontos para serem cheios. São sim,
indivíduos com maior ou menor poder de crítica, que podem até negociar as informações que
recebem, dentro de um conjunto de valores pessoais, chegando ao ápice de poderem até
recusá-las.
Para Thompson (1998, p. 31):
A recepção dos produtos da mídia não é um processo sem problemas, acríticos,
tampouco são absorvidos pelos indivíduos como uma esponja absorve água. A
27
atividade de recepção se constitui em maneiras complexas pelas quais os produtos
da mídia são recebidos pelos indivíduos, interpretados por eles e incorporados em
suas vidas.
Devemos considerar que, como qualquer outro processo social, o desenvolvimento do
senso crítico acerca das mensagens televisivas necessita de um aprendizado. Se desde criança
a única fonte de informação for a televisão, a predisposição para o consumo de forma passiva
será quase inerente ao processo. Assim, a possibilidade de se ter um receptor pronto para o
consumo inquestionável de seus produtos será real para grande parte das empresas de
televisão.
Resgatando as idéias de Bourdieu, na composição da opinião pública nem todos
possuem opiniões formadas sobre todos os acontecimentos sociais, tampouco necessariamente
têm algo a dizer sobre um determinado tema proposto. Além disso, nem todas as opiniões
emitidas se equivalem na composição da opinião pública porque essa se caracteriza,
principalmente, pela existência de líderes de opinião e formas de indivíduos expressarem sua
opinião publicamente, fazendo com que estas se sobreponham à opinião daqueles que não têm
condições de expressar suas visões sobre fatos e acontecimentos.
Os indivíduos atribuem escalas de importância diferentes para cada assunto social a
partir dos valores ou interesses que possuem, fazendo com que os assuntos que envolvem a
opinião pública nem sempre sejam de interesse de cada indivíduo isoladamente.
Estudos sobre a consciência do receptor ou sobre a hipótese da espiral do silêncio são
importantes para lembrarmos sempre que as mensagens da mídia podem ser passadas de
forma homogênea, mas o público que as recebe sempre será heterogêneo e carregado de
valores, constituindo-se pessoas que modificarão o significado das mensagens e o uso que
cada um poderá fazer dele.
Além disso, como veremos a seguir, um mesmo indivíduo é sujeito de vários grupos
sociais simultaneamente, suas relações de pertencimento, suas atitudes e valores são
adaptados a cada um dos papéis que desempenha nos diversos grupos sociais durante todo o
dia, durante toda a vida.
Teorias de Comunicação e Semiótica Relacionadas à Questão
“Comunicação de massa é a produção
institucionalizada e difusão generalizada de bens
simbólicos através da fixação e transmissão de
informação ou conteúdo simbólico”.
Thompson
Quando pensamos na construção da opinião pública nos reportamos à avaliação da
sociedade através da qual esta opinião pública será desencadeada, ou seja, torna-se condição
básica para a formação de uma opinião pública a existência de um grupo de indivíduos
denominado sociedade.
A sociedade é composta por públicos, não exatamente unidades organizacionais
predeterminadas, mas grupos sociais que desenvolvem processos de pertencimento, ou seja,
um mesmo indivíduo pode fazer parte de diversos públicos simultaneamente, acerca de várias
situações do cotidiano.
Assim, um mesmo cidadão pode ser torcedor de um determinado time de futebol, ser
cliente de uma loja de departamentos, freqüentador de um determinado restaurante, ser
28
ouvinte de uma rádio e telespectador de um programa de TV. Ainda trabalha em uma
empresa, é pai de um aluno de escola de segundo-grau e síndico do prédio onde mora. Enfim,
condições paralelas de existência enquanto usuários, funcionários, consumidores ou
defensores de uma ideologia.
Essas condições de vida em sociedade nos colocam o tempo todo na qualidade de
adaptação de linguagem, comportamento e formas de ação para cada situação que nos
encontramos em nosso dia-a-dia.
Segundo Baitello Junior (2002, p. 106-7), vivemos em um mundo composto por três
partes: o mundo real – que vivemos por meio do corpo, um mundo simbólico – que vivemos
por meio da linguagem e um mundo imaginário – que vivemos por meio de nossa fantasia.
Para viver esses mundos, as escolas semióticas soviéticas desenvolveram a teoria da
Semiótica da Cultura. Nela, está proposta uma tripla concepção dos fenômenos de
transmissão e conservação da informação pelos homens, quais sejam:
Um primeiro nível informacional que ocorre na esfera do organismo. Todo
organismo vivo se constitui a partir de trocas internas de informações. Estas
informações intra-organísticas são regidas por códigos e leis próprias da vida,
também denominadas de hipolinguais. Organismos mais complexos desenvolvem
sistemas também mais complexos que pressupõem interação e interdependência de
outros organismos. Forma-se então sociedades. Porém sociedades não sobrevivem
sem uma intensa e sincronizada comunicação social regida por códigos extra-
individuais. São os códigos linguais (das diversas línguas da comunicação social,
em todas as espécies que vivem em sociedades, desde insetos até mamíferos, com
suas linguagens olfativas, corporais, vocais ou ainda outras). Há ainda uma outra
esfera, denominada de segunda realidade, ou seja, a realidade do imaginário,
social, histórica, cultural, que desencadeiam manifestações humanas como o sonho
ou a atividade lúdica. (p. 107)
Vale ressaltar que a opinião pública se forma a partir de valores pessoais de cada
indivíduo, ou seja, opiniões e atitudes são fruto de um conjunto de valores adquiridos desde a
infância, com a família, reforçado pela sociedade em que se vive.
A escola, o trabalho e a mídia também apresentam reflexos diretos sobre as atitudes.
Na época da comunicação de massa, a mídia desempenha um papel importantíssimo na
formação da opinião das pessoas. O tempo que as crianças passam na escola e na frente da
televisão pode ser, muitas vezes, maior do que o tempo que passa com a família.
Guareschi (1991, p. 14) coloca a questão da comunicação não somente como
transmissão de informação, mas também como construção da realidade:
Não seria exagero dizer que a comunicação constrói a realidade. Num mundo todo
permeado de comunicação – um mundo de sinais – num mundo todo
teleinformatizado, a única realidade passa a ser a representação da realidade – um
mundo simbólico, imaterial. Uma situação existe, ou deixa de existir, à medida que
é comunicada, veiculada. É por isso que a comunicação é duplamente poderosa:
tanto porque pode criar realidades, como porque pode deixar que existam pelo fato
de serem silenciadas.
Levemos em consideração, também, os formadores de opinião, ou seja, pessoas que
têm a oportunidade de expressar publicamente o seu ponto de vista sobre algo. Membros da
família como os pais se constituem líderes de opinião, além de artistas, professores, líderes
religiosos, atletas, socialites ou líderes de classe, como empresários, advogados, médicos, ou
29
líderes sindicais podem exercer influência sobre aquilo que uma pessoa ou um determinado
grupo de pessoas pensa ou deva pensar.
Martín Lutero pode ser classificado como um grande formador de opinião. No início
do século XVI, Lutero, não conformado com as idéias e políticas adotadas pelo Vaticano,
escreveu as ‘95 Teses’, um documento crítico que tratava de questões religiosas e políticas.
Através de uma linguagem simples, transformou as idéias em cartazes e discursos públicos,
atraindo multidões e popularizando a sua doutrina.
Thompson (1998, p. 58) observa que as técnicas de impressão que se difundiam a
partir do século XVI foram determinantes para a difusão das idéias de Lutero, entre outros
reformadores:
As 95 Teses de Lutero, inicialmente fixadas à porta da igreja agostiniana em
Wittemberg, em 31 de outubro de 1517, logo foram traduzidas para as línguas
vernáculas, impressas em folhetos e distribuídas por toda a Europa; estima-se que
essas teses tenham chegado ao conhecimento de quase toda Alemanha em questão
de 15 dias, e de boa parte da Europa em um mês. Os sermões e tratados de Lutero
foram publicados em numerosas edições e logo se tornaram enormemente
populares.
Os líderes de opinião podem ser cientistas, pessoas famosas, que possuem o
reconhecimento da sociedade, bem-informados, estudiosos de renome ou celebridades da
mídia. Pessoas que conquistaram a simpatia do público a partir de suas aparições nos meios
de comunicação de massa e que se transformam em modelos sobre aquilo que a massa deva
ser, pensar ou consumir.
O valor simbólico criado na transmissão de uma mensagem, o acúmulo de acertos
sobre determinado assunto e o prestígio social também são fatores de construção de um líder
de opinião. Estes líderes podem ou não ser celebridades midiáticas. Além da mídia podem ser
pessoas reconhecidas em um determinado grupo social, um bairro ou uma cidade.
Os líderes de opinião podem ser políticos, por exemplo, pessoas públicas que possuem
alto grau de penetração e reconhecimento pela sociedade. Neste sentido, a opinião pública
também pode ser responsável por manter ou colocar alguém no poder. A opinião pública pode
ser determinante para as decisões políticas em qualquer instância, uma vez que, ações
políticas podem ser punidas por eleitores em eleições futuras, condenando o político
responsável à não reeleição. Já vivemos casos, até, de a opinião pública conseguir pressionar
instâncias governamentais a tal ponto de conquistar o afastamento do presidente
imediatamente, não sendo necessário, sequer, a espera por futuras eleições.
A Construção da Opinião Pública pelos Sistemas de Comunicação: o processo das
Relações Públicas
As relações públicas se caracterizam como uma atividade que tem como objetivo atrair
a atenção e conseguir a aceitação pública para uma causa social, política, religiosa,
educacional, esportiva ou a integração de uma organização com outros organismos de uma
sociedade. Em resumo, criar uma imagem de prestígio para o órgão ou indivíduo que
representa.
As relações públicas são também auxiliares na formação da opinião dos públicos de
interesse das organizações que defendem, quer seja no âmbito interno das instituições,
externo, com a sociedade, organismos de interesse da organização, órgãos de classe, ONG’s,
entidades governamentais de qualquer instância, imprensa, sindicatos, enfim pessoas que
30
estarão interagindo com a organização para realização de ações de toda ordem social.
Segundo Kunsch (1997, p. 15):
As organizações, como microssociedades, fazem parte do sistema social global,
achando-se sujeitas a todas as turbulências ambientais provocadas por uma
sociedade envolvida, de forma crescente, no fenômeno da globalização, e que
exigirão respostas cada vez mais rápidas no que se refere à comunicação. Esta tem
de ser pensada e administrada excelentemente.
Entre as várias definições de relações públicas existentes destacamos a definição
operacional da atividade pelo “Acordo do México” de 1978:
O exercício da profissão de relações públicas requer ação planejada, com apoio da
pesquisa, comunicação sistemática e participação programada, para elevar o nível de
entendimento, solidariedade e colaboração entre uma entidade, pública ou privada, e
os grupos sociais a ela ligados, em um processo de integração de interesses
legítimos, para promover seu desenvolvimento recíproco e da comunidade a que
pertencem. (KUNSCH, 1997, p. 50)
Quando atribuída especificamente à causa da opinião pública, Andrade (1996, p. 104)
nos lembra que “relações públicas são os métodos de integrar na opinião pública conceitos
favoráveis relativos a uma pessoa ou instituição”.
A Confederação Interamericana de Relações Públicas (CONFIARP), criada em 1985,
também considera a ligação das relações públicas com a opinião pública, da seguinte forma:
As relações públicas desenvolvem atividades sócio-técnico-administrativas,
mediante a qual se pesquisa e avalia a opinião pública e se empreende um programa
de ação planificado, contínuo e de comunicação recíproca, baseado no interesse da
comunidade e destinado a manter uma afinidade e compreensão da mesma para com
entidades de qualquer natureza. (ANDRADE, 1996, p. 105)
Kunsch (1986, p.133) destaca a opinião pública da seguinte forma:
A organização social deve identificar-se perante a opinião pública, cabendo às
relações públicas, por meio de um planejamento fundamentado em pesquisas e na
análise ambiental, ajudar a definir os melhores caminhos para que ela atinja mais
eficazmente os diversos públicos, graças a ações perfeitamente integradas do
composto da comunicação. Neste composto da comunicação, um importante papel
reservado às relações públicas é o de gerenciar ou administrar questões
controvertidas que envolvem o posicionamento da organização perante os públicos e
a opinião pública.
O que fazer e não fazer pela imagem de uma organização são questões que envolvem
o dia-a-dia dos relações públicas. Profissionais que buscam incessantemente colocar as
organizações públicas ou privadas que representam num conceito elevado junto à opinião
pública, ou, junto aos públicos de interesse da organização.
Foi-se o tempo em que os esforços dos relações públicas se concentravam mais na
produção de campanhas que valorizavam a organização do que nos interesses do público.
Nenhuma organização sobrevive sozinha, sem a interação com outras organizações – processo
interorganizacional, de interação social, independente do tipo de produto desenvolvido pela
organização.
31
Os relações públicas devem saber como interagir com os diversos públicos de uma
organização de forma vantajosa, preservando a honestidade, a reputação e a integridade,
acima de tudo exercer uma atividade de liderança.
Numa situação organizacional de problema ou conflito com a sociedade, uma das
preocupações dos relações públicas é quanto à identificação dos públicos que produzem
aquela opinião. Quem são de fato os públicos que interagem com a instituição? Quais os seus
anseios? São ou não líderes de opinião e multiplicadores de informação? As respostas dessas
questões serão determinantes para a tomada de decisões.
Em qualquer organização os relações públicas são responsáveis pela construção de um
programa de comunicação estratégico, capaz de prevenir situações de desgaste junto à
sociedade.
As relações públicas constituem uma das grandes áreas da comunicação
institucional, ao lado do jornalismo, da produção editorial, da publicidade e do
marketing social; com essas e a comunicação mercadológica, integra o composto de
comunicação que resultará num trabalho conjugado e interdisciplinar. Na prática os
relações públicas buscam criar e assegurar reações confiantes ou formas de
credibilidade entre uma organização social e os públicos com os quais se relaciona.
(KUNSCH, 1986, p. 38)
Carvas Junior corrobora, afirmando que:
Gerenciar e prevenir crises são duas faces da mesma moeda. Qualquer trabalho
sério, consistente e profundo no sentido da prevenção acabará por conferir
segurança à empresa em situações críticas. A atividade de relações públicas é de
extrema importância para o enfrentamento de crises, pois é ela que deve assumir a
responsabilidade pela coleta de informações e pela organização dos contatos com a
imprensa e com os p0úblicos de interesse. (1997, p. 205)
É no momento de crise que os relações públicas mais precisam mostrar suas
habilidades. Andrade (1979, p. 6) afirma que “a controvérsia e a sua análise constituem o
determinante inicial e decisivo para o desenvolvimento do processo gerador de públicos e da
opinião pública”.
Situações de acidentes, por exemplo, envolvendo funcionários ou pessoas da
sociedade são momentos delicados para qualquer organização pública ou privada. Neste
momento os relações públicas são chamados a responder questões para as vítimas, seus
familiares, imprensa, líderes comunitários e do público em geral, numa proporção ditada pela
proporção do problema.
Susskind e Field em sua obra Em crise com a opinião pública (1997), apresentam
estudos de caso de diversas organizações que tiveram suas imagens abaladas por anos, frente
à opinião pública. Algumas em processos irreversíveis de conquista do público.
Casos como vazamento de óleo, derramamento de petróleo, poluição do ar,
companhias de cigarros que provocam câncer ou vazamento de gás são exemplos que podem
arruinar uma instituição, ou, no mínimo, tirar de seus cofres cifras consideráveis para acalmar
o público e tornar o problema o menos aparente possível.
Acidentes acontecem, porém, o acúmulo de situações em que, historicamente, grandes
acidentes poderiam ter sido evitados, a partir de maiores cuidados das organizações
responsáveis, fazem com que a opinião pública freqüentemente acuse as empresas de
culpadas, pelo menos até que se prove o contrário.
32
Nestas circunstâncias a verdade é sempre a melhor escolha, até porque, enquanto não
se conheça a realidade, a especulação é inevitável e grupos da sociedade começam a formular
suas versões para o fato.
Assim, é sempre uma boa estratégia manter a opinião pública informada,
principalmente os grupos de interesse da instituição em crise. Susskind e Field (1997, p. 96)
defendem que os relações públicas devem:
Inventar informações, pois tudo o que for dito pode e será usado por alguém.
Portanto, informando o público em pequenas doses, e sob a melhor ótica possível,
não haverá armas perigosas para alguém usar. Transparência é a criação e
manutenção de uma imagem. Na era da MTV e de mais 500 canais a Cabo, os fatos
são apenas uma entre muitas possibilidades. A verdade é o que fazemos dela.
Esta estratégia, porém, não pode apresentar o menor risco de prejudicar ninguém.
Recriar sim, inventar não. Omitir sim, mas mentir jamais. Reconstruir uma imagem abalada é
muito mais difícil do que criar uma nova. Desmentir uma farsa é ainda pior.
Em qualquer situação, nos momentos de crise ou na rotina dos trabalhos de uma
organização, o relações públicas deve transpirar credibilidade. Deve ser alguém de linguagem
adequada; muito bem informado, não só sobre a sua organização, mas sobre os assuntos que a
envolvem; tranqüilo, confiante e que possa se transformar num entusiasta diante dos seus
públicos. Ninguém vai acreditar em palavras soltas, inseguras e ingênuas.
Para além dessa atuação, o relações públicas de uma organização deve buscar
parceiros para a construção da opinião pública a favor de sua organização, tendo em vista que
a opinião pública muitas vezes se caracteriza pela opinião de um determinado público que se
manifesta a favor ou contra determinada situação.
Assim, a busca por líderes sociais, jornalistas, ou formadores de opinião são
fundamentais para que, numa parceria, essas pessoas auxiliem na construção da imagem
favorável de uma organização. “As relações públicas, segundo a Associação Brasileira de
Empresas de Relações Públicas (ABERP), trabalham com públicos multiplicadores – opinion
leaders. Elas utilizam técnicas de opinião que trabalham o racional das pessoas.” (KUNSCH,
1986, p. 38)
Mestieri e Melo (1997, p. 20) corroboram tal opinião, colocando que: “As relações
públicas trabalham na segmentação, no corpo-a-corpo, empregam a razão em lugar da
emoção, trabalham com lideranças para formar multiplicadores conscientes de opinião”.
Dentro desta linha de atuação, cada vez mais os relações públicas têm exercido um
papel conjugado com a imprensa. Hoje os relações públicas se revelam como verdadeiros
tradutores daquilo que acontece no interior das organizações para a mídia, a fim de que
construam uma informação coerente e aprofundada para a sociedade.
Bucci (2000, p. 194-5) apresenta a idéia de que a imprensa pode ser dividida
historicamente em quatro fases: a primeira chamada de imprensa de opinião, a segunda
denominada de imprensa comercial, a terceira, no momento em que surgem os meios de
comunicação de massa e transformam o público de consumidores para massa e atualmente o
quarto estágio:
Estamos vivendo a era das relações públicas generalizadas (ou comunicação
generalizada). A gestão da cultura não mais se encontra no interior dos chamados
meios de comunicação; os Estados, as grandes e pequenas empresas e as instituições
passam a se equipar para promover, por si mesmas, a organização dos conteúdos
que, depois, terão a mídia como passagem para então se massificarem. Não que o
jornalismo de opinião, a imprensa de massa e os meios de comunicação de massa
tenham cessado de existir, mas todos agora existem dentro de um campo maior, no
33
qual a hegemonia é exercida pelas relações públicas generalizadas. Os
departamentos de relações públicas e as assessorias de imprensa (próprias ou
terceirizadas) vão a cada dia assumindo mais o papel de interlocutores oficiais e
oficiosos dos jornalistas. E cada vez mais a informação passa por um processo
prévio antes de entrar nas redações.
A grande maioria dos veículos de comunicação de massa, impressos ou eletrônicos,
variando de canais de televisão, jornais, rádios ou internet, nem sempre possuem em sua
equipe, profissionais capacitados a versar sobre conhecimentos das mais variadas áreas do
saber humano.
Assim, quando nos referimos à imprensa, sempre pensamos que esta deveria
comportar jornalistas especializados para nos informar sobre assuntos variados, desde uma
partida de futebol, até a descoberta da cura do câncer por um laboratório multinacional. Tudo
isso, é claro, com o maior rigor de informações, capaz de nos posicionar sobre a nova
informação, de tal forma que nos abasteça de dados minuciosos e detalhados.
Na era do jornalismo de opinião, ou mesmo da imprensa comercial, as melhores
redações possuíam, em seus quadros, jornalistas especializados que eram
intelectuais de ponta, capazes de avaliar e julgar técnica e teoricamente cada um dos
argumentos que ouviam dos governantes, dos empresários, dos líderes religiosos e
dos cientistas. Agora, isso só é possível no interior dos conselhos editoriais de
publicações ultra-especializadas, que não pertencem mais ao campo do jornalismo
destinado ao grande público, mas ao campo das próprias áreas do conhecimento de
que tratam. Na era das relações públicas generalizadas, o saber, além de ter sido
privatizado, distanciou-se ainda mais das redações. (BUCCI, 2000, p. 196)
Hoje vivemos uma diversidade de conhecimentos em todas as áreas, quais sejam,
biológicas, sociais, exatas ou humanas, desencadeando um processo de fragmentação do
conhecimento de tal forma que o mundo se apresenta recheado de especialistas de toda ordem,
localizados em diversas organizações sociais, cada uma com a sua especificidade.
Num dado momento, os veículos menores se abastecem de informações produzidas
pelos grandes canais de comunicação, ou seja, os principais jornais do país e do mundo se
transformam em agências de notícias para diversos veículos menores ou localizados fora dos
grandes centros, mas às vezes só isso não é suficiente, pois, de forma localizada, existe uma
necessidade de veiculação/publicação de notícias do próprio estado ou cidade, nem sempre
pautadas pelos grandes jornais agenciadores.
Neste sentido, as assessorias de comunicação e as assessorias de relações públicas, de
diversas organizações têm se mostrado grandes aliadas no abastecimento de informações aos
veículos. Com grande freqüência, conseguir transmitir uma nova descoberta, de qualquer área
científica, para um público leigo, pode se tornar uma tarefa de Hércules para quem não
domina a linguagem científica. Mais que isso, fazer com que um cientista que passa a sua vida
no laboratório consiga explicar de forma coloquial sua nova descoberta, adotando uma
linguagem jornalística, seria muita pretensão. Assim, os jornalistas especializados se mostram
fundamentais para resolver esta equação entre a necessidade da informação científica com a
adequação de linguagem para a massa.
Importante ressaltar que esse fato não ocorre somente com descobertas científicas, mas
no esporte, na educação ou na gastronomia, quando, com não rara freqüência, podemos notar
transmissões ao vivo pela televisão ou publicações que ignoram particularidades dos fatos e se
transformam em verdadeiros achismos de toda ordem.
Para trabalhar este processo de abastecimento de informações aos veículos de
comunicação de massa os relações públicas e as assessorias de comunicação das organizações
passam a desempenhar a função da não existência de jornalistas especializados em todos os
34
veículos de comunicação, conseguindo abastecer a mídia de releases e sugestões de pauta
cada vez mais eficientes.
A assessoria de comunicação de uma organização através de seus relações públicas
pode estar observando o dia-a-dia das descobertas de sua área de atuação na sociedade e
identificar aquilo que será importante como informação para toda a população. Por estar
diretamente ligada à linguagem do produto que desenvolve e, por conhecer as técnicas da
linguagem jornalística, poderá produzir uma verdadeira tradução daquilo que deseja
comunicar.
Um trabalho em conjunto no qual se beneficiam todos: a imprensa, porque ganha
diversos correspondentes científicos – um especialista em cada organismo social; as
organizações, porque conquistam um espaço maior nos veículos para mostrar suas atuações e,
é claro, a população, pois pode receber informações diversificadas, esclarecedoras e melhor
elaboradas.
Dentro deste processo, não estou desconsiderando a necessidade de um jornalismo
investigativo que chancele a fonte, que apure a verdade das informações e que continue
buscando fatos que as organizações podem não estar querendo revelar. Este trabalho não está
sendo substituído.
Por outro lado, cabe às organizações cumprir o seu papel e usufruir desta possibilidade
de estar construindo uma imagem favorável junto aos seus diversos públicos.
Minha referência à relação direta entre assessorias de comunicação e relações públicas
se fundamenta, principalmente, no fato de que os relações públicas são, entre os demais
profissionais da área de comunicação, aqueles que mais apresentam características de gestores
da comunicação, administradores e, portanto, os que deveriam integrar a equipe de
comunicação de qualquer organização. Principalmente no tocante às questões de formação da
opinião pública, ou, formação da opinião dos públicos.
Assim, dentro de uma construção de imagem da organização pretendida pelos relações
públicas, um ingrediente precioso é o trabalho social, capaz de projetar a organização como
amiga da sociedade onde está inserida.
Em nenhum outro momento na história das organizações se falou tanto sobre a
responsabilidade social de empresas de todos os portes e de qualquer área de atuação. O
assunto não é recente, em 1979 Scanlan (p. 52) já escrevia que:
A responsabilidade social pode ser definida como uma obrigação da parte da
empresa para com a sociedade. Tais obrigações podem ser muito complexas e estão
em debate contínuo atualmente. As obrigações podem ser: serviço comunitário e
governamental, doações educacionais e filantrópicas ou controle ambiental.
As organizações, caracterizadas como unidades sociais deixam de ter como foco
somente seu desenvolvimento econômico para atuarem como verdadeiras co-responsáveis
pelo crescimento da esfera social em que se encontram, enfatizando o privilégio ao ser
humano. Para Way (1983, p.23):
Surge a consciência de que uma empresa deve se preocupar com o seu papel social.
Uma empresa de grande porte, estável e bastante lucrativa, pode pensar em termos
de colaborar com a comunidade, incorporando uma filosofia de relações públicas.
Sua responsabilidade social fica expressa na função de produzir utilidades para os
públicos e não apenas lucro para os acionistas.
35
O trabalho social é importante no sentido de construir uma imagem positiva junto aos
diferentes públicos de uma organização; até porque, num país como o Brasil, em que o
trabalho de assistência à sociedade, por parte de lideranças governamentais de todas as
estâncias, deixa muitas vezes de ser cumprido, o papel de empresas privadas preenche lacunas
fundamentais de sobrevivência de toda a comunidade.
Essa nova atitude, mais humanista das organizações, gera notícias positivas na
construção da imagem da organização. Mais que isso, o trabalho social fez surgir, a partir da
década de 80, um novo enfoque das relações públicas a partir de um trabalho comunitário,
mostrando que o trabalho de relações públicas não se restringe às empresas e ao governo, mas
se estende a qualquer tipo de organização e movimentos sociais.
* * *
Partimos da idéia de que, da mesma forma que o termo cultura de massa foi
substituído por indústria cultural, tendo em vista que a massa não produz cultura, apenas
consome os bens simbólicos da mídia, também não existe uma opinião pública no sentido de
uma opinião formada pela massa, e sim, colocada para a massa a fim de que essa se manifeste
a partir de idéias previamente determinadas.
A opinião pública não é a expressão da massa, mas, a visão daqueles que podem ter
expressão na massa. A partir de uma exposição de idéias desses grupos, pela mídia, por
exemplo, são extraídas da massa as idéias que ela conseguir articular, e recolocadas na mídia
como reafirmação daquilo que grupos minoritários e articulados, inclusive no tocante à
política, desejam que se acredite ser a opinião de toda a sociedade.
Os fatores psicológicos têm interferência na formação da opinião pública. Quando a
mídia apresenta uma informação, devemos considerar que a recepção da mensagem sofrerá
modificações a partir dos valores pessoais que cada indivíduo possui. Além disso, a sociedade
é mutável, inconstante e deve ser considerada pela análise de seu espaço físico e temporal,
logo, num país de dimensões continentais como o Brasil, uma mesma mensagem pode sofrer
interferências a partir de cada indivíduo, além do caráter regional de interpretação.
Os indivíduos possuem necessidade de expressar suas opiniões, mas temem o medo do
isolamento do grupo a partir de uma eventual não aceitação de seu posicionamento. A
observação constante do meio em que cada um vive torna-o vulnerável à mudança de opinião
para adaptação ao grupo em que está inserido socialmente.
Além dos meios de comunicação de massa, as organizações sociais são representativas
na construção da opinião pública, numa via de mão dupla, também possuem necessidade de se
firmarem diante da própria opinião pública, demonstrando constantemente que são partes
importantes para o desenvolvimento de toda a sociedade. Isso faz com que as assessorias de
comunicação tenham papel fundamental para a construção de imagens positivas das
organizações.
No próximo capítulo abordaremos as questões dos meios de comunicação de massa e
da Sociedade da Informação, mostrando a realidade de um mundo cada vez mais veloz.
36
CAPÍTULO III
A MÍDIA NA CONSTRUÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA
“A Televisão é uma alegoria para os olhos,
basicamente para se olhar, não para se
participar, ou quando muito participar pelo
compartilhamento da visão, nem mesmo para
se pensar...”
Perry Anderson
Heróis e Celebridades –
O processo de deslumbramento coletivo na construção do mítico contemporâneo
A era contemporânea transformou a sociedade em grandes grupos de consumo de
informação e causou modificações fundamentais entre os veículos e seus consumidores. Os
diferentes meios de comunicação aprimoraram linguagens específicas, verdadeiros códigos
que, independente da mensagem a ser transmitida, seguem determinadas regras que lhes
garantem a compreensão desejada. “Embora a televisão também seja utilizada para exibir
filmes que foram feitos originalmente para o cinema, ou transmitir espetáculos musicais,
consertos e partidas esportivas, não necessariamente concebidos para a tela pequena”,
(MACHADO, 2000, p. 26), a TV, o rádio, os veículos impressos, enfim, qualquer meio a ser
exemplificado apropriou-se de uma forma lingüística padronizada. Assim, um noticiário, uma
novela ou um programa humorístico na TV, mantém as mesmas técnicas de produção,
fotografia, efeitos sonoros e colocação de luzes que garantem ao espectador a decodificação
imediata.
Para que esse processo fique absolutamente claro, é preciso compreender a mutação da
civilização contemporânea e entender a primeira grande transformação na ecologia das
mídias: a passagem das culturas orais para a cultura da escrita. A escrita abriu um espaço de
comunicação desconhecido às sociedades orais e fez com que os atores da comunicação não
precisassem mais partilhar da mesma situação para que houvesse troca de mensagens.
Muito tempo se passou entre o surgimento da escrita e dos meios de comunicação de
massa; porém, essa característica de que as pessoas não precisavam estar no mesmo território
geográfico, além de tampouco partilhar das mesmas experiências de vida para compreender
mensagens advindas de outros grupos sociais, continuou sendo fundamental para que os
veículos de comunicação de massa pudessem se desenvolver.
Não podemos esquecer, contudo, que, desta forma, nós não temos garantido que todos
os receptores de uma mesma mensagem, localizados em territórios geográficos diferentes,
irão compreendê-la da mesma forma. Porém, para que o consumo dos produtos dos meios de
comunicação de massa aconteça, isso não é o fundamental; o importante é que todos possam
fazer uso da informação, independente se de forma igual ou diferente, adaptada aos valores
que previamente já possui.
Para efeito de estudo, tomemos os meios de comunicação de massa como um grande
grupo social que desenvolve uma forma própria de transmissão de mensagens para os seus
públicos, bem como a forma como cada um deles desenvolve suas próprias linguagens. Este
ponto de partida pode ser visto como uma grande rede que necessita de todos os seus pontos
37
para se complementar, porém de forma tão sutil que não demonstra a interdependência aos
seus consumidores. Pelo contrário, cada um dos veículos se mostra único e total.
Quando a mídia cria heróis e celebridades, na verdade, ela está disponibilizando para o
público os ingredientes fundamentais para o desenvolvimento do imaginário coletivo. A mídia
tem consciência de que a fabricação dos seus produtos depende dos anseios do público a fim
de que o consumo seja facilitado. Neste contexto, porém, fazemos o seguinte questionamento:
esta vontade realmente vem da totalidade da população, ou da parte da população com maior
poder crítico e a partir daí é distribuída e massificada para todo o universo de espectadores?
É inegável que a mídia trabalha baseada no sentimento da população, porém, da
totalidade ou de parte dessa população?
A criação dos heróis e das celebridades pela mídia é uma forma de identificação
coletiva de personagens vitais para afirmação da coletividade, mais que isso, uma forma de
materializar em um personagem o modelo de perfeição e deslumbramento coletivo. Neste
sentido, cada grupo social busca na mídia diferentes formas de emoção. A TV, como um dos
grandes representantes da mídia, principalmente no Brasil, busca desenvolver em sua
programação a reprodução da emoção da coletividade.
Hoje é cada vez mais difícil a identificação entre realidade e ficção apresentada pelos
meios de comunicação de massa.
Neal Gabler, numa citação do historiador Daniel Boorstin, diz que:
Os americanos vivem cada vez mais um mundo onde a fantasia é mais real que a
realidade”, advertindo que “estamos a ponto de nos tornar o primeiro povo da
história a ter sido capaz de fazer suas ilusões tão vívidas, tão convincentes, tão
realistas, que podemos até viver nelas. (GABLER, 1999, p.11)
O autor nos diz ainda que para eles:
A vida estava se transformando num veículo de comunicação por direito próprio,
como a televisão, o rádio, a imprensa e o cinema (...), estávamos nos tornando
platéia e atores ao mesmo tempo (...), mais complexo e mais fascinante que qualquer
outra coisa concebida para os veículos de comunicação convencionais. Em suma, a
vida estava se transformando num filme”; (...). É claro que nem todos se deixam
hipnotizar. Muitos deploram os efeitos do entretenimento e das celebridades sobre o
país, e com certeza há muito o que deplorar. (GABLER, 1999, p.12-5)
Se é verdade que nem todos se deixam hipnotizar e atrair por uma forma de vida
similar à vida dos meios de comunicação de massa, não são poucos os que lutam para que
suas vidas sejam iguais às vividas pelos personagens da TV ou do cinema. Neste processo,
mais do que a mídia criar constantemente personagens com os quais a sociedade possa se
identificar, a própria sociedade seleciona (das mais variadas formas) celebridades ou heróis
que passarão a ser identificados como padrões de comportamento coletivo, em seguida
reafirmados pela mídia.
O primeiro ingrediente para se tornar um Herói ou uma Celebridade é a conquista da
fama. A fama é, de fato, um grande ingrediente de sustentação da mídia atual.
A fama parece circunscrever a esfera em que celebridades são produzidas no interior
do circuito específico da Indústria Cultural e da Comunicação de Massa, com seus
38
rankings, suas auras, suas estratégias simbólicas e suas construções, freqüentemente
fugazes, das imagens personalizadas do sucesso. (COELHO, 1999, p. 14)
Neste contexto, não nos cabe refletir sobre os efeitos da mídia sobre a sociedade, nem
de julgar que todos os consumidores da Indústria Cultural deveriam ler Adorno, mas entender
que, no contexto da criação de mitos, celebridades, heróis e pessoas famosas, cientistas
sociais, consumidores dos meios de comunicação de massa e celebridades da mídia
compartilham uma experiência estratégica comum: a de fazer parte de um mundo
absolutamente regido pelos efeitos dos vários produtos da mídia, sendo que cada indivíduo
passa a ser um consumidor diferente, extraindo deste processo tudo o que puder, da forma que
julgar melhor.
A criação de Heróis e Celebridades é fundamental para o desenvolvimento da
sociedade contemporânea. O deslumbramento coletivo cria em cada pessoa a certeza de
pensar coletivamente e, ao mesmo tempo, desencadeia um sonho de ser o próprio ídolo ou de
estar próximo dele de forma particular. Cada fã sonha com um momento íntimo com seu
ídolo, até porque isso seria uma forma de conquistar aquilo que todos querem.
Numa dicotomia, a existência do ídolo só é possível porque muitos exaltam um
mesmo personagem até transformá-lo numa celebridade ou herói, reafirmando a necessidade
do coletivo; porém, cada membro do processo coletivo sonha em se separar do grupo para
viver uma emoção singular com aquele que precisa do coletivo para se afirmar no grande jogo
de celebridade.
A ilusão de poder estar compartilhando da vida do ídolo é alimentada freqüentemente
pela mídia através de uma exposição da vida íntima das pessoas. Uma realidade não de fato,
mas sim uma realidade produzida da intimidade do ídolo é apresentada à sociedade como
forma de suprir um desejo coletivo de viver aquilo que não se pode de fato, porém se acredita
viver através do único elo entre o sonho e a realidade, ou seja, os próprios meios de
comunicação de massa.
Neste jogo, a mídia cumpre o seu papel no sentido de continuar alimentando a ilusão
do fã. Uma cumplicidade que obriga os meios de comunicação de massa a colocarem o fã na
qualidade que ele nunca terá, ou seja, na de pessoa íntima de seu ídolo, por isso continuará
fiel à mídia, na certeza de que “ela faz o que pode” para que seu sonho se torne uma realidade.
É correto afirmar que “acontecimentos envolvendo aspectos privados, sobretudo dos astros,
tendem a se transformar em megaeventos ou passam a ocupar por semanas a fio a opinião
pública e o debate político”. (MIRA, 1998, p. 97)
Assim, cada vez mais nos vemos conhecedores de detalhes dos personagens da novela,
por exemplo, mais do que de pessoas de nossa própria comunidade ou em extremos, até de
nossa família.
Pensar que os astros da TV fazem parte de nossas vidas, ou mais que isso, que nós
fazemos parte da vida deles, faz com que haja uma histeria coletiva em determinados casos,
como a morte, por exemplo.
Heróis e celebridades carregam em si o estigma da imortalidade, o sonho de qualquer
expectador da mídia; porque todos nós somos mortais. É nesse sentido que Bauman afirma
que:
O ponto crucial da questão é que o conhecimento da mortalidade significa, ao
mesmo tempo, o conhecimento da possibilidade de imortalidade. Em conseqüência,
não se pode estar ciente da mortalidade sem encarar a inevitabilidade da morte como
uma afronta e uma indignidade, e sem pensar nas maneiras de corrigir o erro. Estar
ciente da mortalidade significa imaginar a imortalidade, sonhar com a imortalidade,
trabalhar com vistas à imortalidade. (1998, p. 191)
39
A cada situação de morte de uma Celebridade ou um Herói construído pela mídia, uma
chance de um novo espetáculo midiático é desencadeada. O enunciado da mídia busca atingir
emocionalmente o público.
São closes e big-closes de caixões, velórios, velas a arder, enterros, missas fúnebres,
cenas de choros e depoimentos de parentes, amigos e/ou fãs transtornados. O tom de
tragédia, a (re)dramatização do acontecimento, tudo em geral é construído nos
mínimos detalhes no sentido de mobilizar o telespectador, o leitor e monopolizar a
audiência. Para se fixar o acontecimento na memória, a adesão maciça do público é
fundamental. (RONDELLI, 2000, p. 207)
Toda a cena ganha caráter ainda mais dramático quando pessoas das camadas mais
pobres da sociedade se envolvem num processo de identificação com o personagem célebre.
As mortes de Ayrton Senna e Lady Diana contêm todas as substâncias necessárias à
construção do espetáculo de que a mídia necessita. Ainda que criados com ingredientes
diferentes, uma vez que Lady Diana pode ser considerada uma celebridade – um produto
criado pela mídia, no mundo pop da mídia, e Ayrton Senna pode ser considerado um herói
nacional de um país onde poucas pessoas conseguem se consagrar como um salvador, ambos
se caracterizam como personagens perfeitos para o espetáculo da morte criado pela mídia
como uma prestação de contas de um enredo que foi sistematicamente narrado pelos meios de
comunicação de massa durante um determinado período.
É como se a morte fosse o último capítulo de uma novela da vida real, veiculada em
escala global. Rondelli, (2000, p.213) chega a narrar a morte da Princesa Diana como um
acontecimento social global raro no século XX, comparado somente às duas grandes guerras
mundiais e à Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Um outro ingrediente a se juntar nessa trama da morte dos heróis e das celebridades é
a existência em grande escala das biografias na era contemporânea. A nova forma de contar e
recontar fatos que parecem pertencer a toda a sociedade faz com que jornalistas adotem os
lugares dos historiadores e passem a contar a vida daqueles que fazem e deverão continuar
fazendo parte da história da humanidade. A construção biográfica ganha uma dimensão
fundamental no mundo contemporâneo.
Normalmente as narrativas biográficas veiculadas na mídia ganham um ar de autoria
coletiva. Jornalistas, fotógrafos, redatores, revisores, chargistas e cinegrafistas são
responsáveis por narrar a vida dos protagonistas dos meios de comunicação de massa, mais
que isso, com o poder de contar todo o seu passado heróico, se assim for o caso, ou até
assumirem a função de videntes e narrarem as possíveis ações futuras do protagonista, caso a
morte não lhe tivesse tirado de cena.
BIBLIOGRAFIA
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1985.
40
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41
5   livro deslumbramento coletivo (seleção)
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  • 1. SIMONE ANTONIACI TUZZO Texto 5 DESLUMBRAMENTO COLETIVO – OPINIÃO PÚBLICA, MÍDIA E UNIVERSIDADE Annablume 11
  • 2. TUZZO, Simone Antoniaci. Deslumbramento Coletivo – Opinião Pública, Mídia e Universidade / Simone Antoniaci Tuzzo – São Paulo: Annablume, 2005. 238 p.; 14 x 21cm. ISBN: 85-7419-448-4 1.Opinião Pública 2. Televisão 3. Universidade 4. Mídia 5.Comunicação Social – I. Título Annablume Editora Comunicação 12
  • 3. CAPÍTULO I DO PRIVADO AO PÚBLICO: REFLEXÕES SOBRE A PUBLICIZAÇÃO DO INDIVÍDUO Há muito, os campos de estudo da Comunicação e da Educação já conhecem o tema da opinião pública e as suas relações com os meios de comunicação de massa. Necessário, contudo, é compreender o uso que se faz do termo opinião pública. A primeira questão diz respeito à utilização do binômio como se fizesse referência à opinião de um determinado público. Ou, relação à opinião de toda a sociedade, aí se configurando muito mais como opinião da massa. Ou ainda, a possibilidade de publicamente todos expressarem sua opinião sobre algo que não é privado, mas sim, pertence à coletividade. Gomes (2001, p. 65) nos lembra que expressões como: Convencer a opinião pública, informar à opinião pública, confundir a opinião pública, ou ainda, sofrer nas mãos da opinião pública, seriam impossíveis se pensássemos no sentido clássico daquilo que significa opinião. Tecnicamente, não se convence uma opinião, no máximo se gera outra, assim como não se diria que informamos a uma opinião, mas informamos a alguma instância que pode ter opinião. A segunda questão faz referência ao quantitativo de pessoas que representa a opinião púbica. Até que ponto a opinião pública significa a visão da sociedade como um todo, ou o fenômeno da opinião publicada, ou seja, a parcela da população que pode ter acesso a um determinado assunto ou fato e expressar a sua opinião, caracterizando-se como opinião exposta e disponível socialmente. Neste princípio, quando falamos de opinião pública, na verdade estamos falando de um grupo social que consegue pensar e manifestar sua opinião sobre coisas, relações, circunstâncias, pessoas, fatos, questões, instituições, exercendo uma função de mecanismo- guia, que estabelece os contornos daquilo que é possível para a sociedade. Luhmann (1978, p. 97-8) faz uma crítica ao conceito clássico da opinião pública, apresentando a idéia da tematização, colocando que na sociedade pós-industrial: A opinião pública deve ser concebida como estrutura temática da comunicação pública, fundada no fato de que, perante o número ilimitado de temas que podem ser veiculados pela comunicação, a atenção do público só pode se manifestar de forma limitada; não deve ser concebida causalmente como efeito produzido ou continuamente operante; antes deve ser concebida funcionalmente, como instrumento auxiliar de seleção realizada de uma forma contingente. A opinião pública não consiste na generalização do conteúdo das opiniões individuais através das fórmulas gerais, aceitáveis por todo aquele que faça uso da razão, mas sim na adaptação da estrutura dos temas do processo de comunicação atrelada às necessidades de decisão da sociedade e do seu sistema. 13
  • 4. De acordo com Prada (1995) a opinião pública, conhecida como fenômeno contemporâneo, foi assim observada pela primeira vez por Rousseau, que em 1750, cria o termo opinião pública. Antes disso, em 1661, Glanwill formulou o conceito ‘clima de opinião’, constituindo assim as bases sobre as quais se assentaria a tendência histórica para o estudo da opinião pública, conhecida como escola clássica. Importante lembrarmos que vinte e oito anos antes que Glanwill anunciasse o conceito ‘clima de opinião’, a fundação da congregatio de propaganda fide pelo Papa Urbano VIII, uma instituição com o objetivo de difundir a doutrina de Cristo e propagar a fé, caracterizou- se como um acontecimento histórico, classificado por alguns autores como manipulação da opinião pública, e um dos primeiros movimentos estruturados e organizados de propaganda, relações públicas e controle social. Para Barros Filho (1995, p. 217) a importância do conceito de opinião pública remonta aos pré-socráticos. Segundo o autor, tanto para Sócrates, quanto para Platão a opinião era fruto de uma situação intermediária entre conhecimento e ignorância. No entanto, a expressão – opinião pública – é muito mais recente. Embora haja registros na literatura através de Shakespeare e Montaigne, o primeiro filósofo a servir-se do termo com pretensões conceituais foi Rousseau. Para ele, o Estado se estrutura em três tipos de leis: o direito público, o privado e o civil. Além dessas há uma quarta, a mais importante, que não está gravada em mármore e bronze e sim no coração dos cidadãos; uma verdadeira constituição do Estado cuja força se renova a cada dia, que dá vida às outras leis e as substitui quando envelhecem ou desaparecem. Refiro-me à moral, aos costumes e, sobretudo, à opinião pública. Se nos concentrarmos na questão da comunicação, podemos citar Prada (1995, p. 71), que coloca a questão da formação da opinião pública intrinsecamente ligada à questão da Comunicação Social: Se pensarmos que todo processo de comunicação traz consigo o conteúdo de uma mensagem que gera resposta e esta resposta gera uma opinião, que provoca outra reação que gerará outra opinião, e assim sucessivamente, em uma cadeia de estímulo e efeitos da comunicação. Assim, podemos concluir que a primeira etapa da opinião é a comunicação total, pessoal, direta e recíproca. O seu poder de formação da opinião pública está ligado ao seu poder de retórica. Logo, não há opinião se não há comunicação. Para ele a opinião pública: É o resultado de opiniões individuais sobre os assuntos de interesse comum que se origina nas diferentes formas de comunicação humana, primeiramente através de processos individuais, posteriormente, em processos coletivos, em diferentes graus, segundo a natureza das informações compartilhadas pelos indivíduos, às vezes influenciada pelos interesses particulares de grupos afetados. (1995, p. 127) A opinião pública se forma no calor da discussão dos componentes do público e, para Andrade (1996), caracteriza-se por não ser necessariamente uma opinião unânime, uma opinião da maioria; muitas vezes é diferente da opinião de qualquer elemento no público; é uma opinião composta, soma de várias opiniões divergentes existentes no público; está em contínuo processo de formação e em direção a um consenso completo, sem nunca alcançá-lo. 14
  • 5. Enfim, no dizer de Andrade, a opinião pública não é mais que a harmonia entre as opiniões individuais. Singular e Plural na Construção do Público Na sociedade de massa que hoje vivemos, de forma geral, os bens simbólicos são consumidos a partir da produção dos meios de comunicação de massa, entre eles a televisão, o rádio ou o jornal impresso que se configuram como alguns dos produtores da cultura de massa. Com algumas exceções como a Universidade, um espaço que ainda conserva a possibilidade de discussão e crítica, em grupo, onde os símbolos ou bens culturais podem ser pensados e discutidos coletivamente, para a maioria da população, o consumo desses produtos é feito de forma isolada, ou seja, o consumo dos produtos da mídia é feito de forma individual ou de grupos muito pequenos como os membros da família, amigos ou grupos de afinidade. Assim, o pensamento coletivo desencadeado pelos meios de comunicação de massa atinge um determinado alcance social por questões de distribuição geográfica isolada e não por uma recepção coletiva, em grupos pré-determinados com possibilidade de discussão e assimilação em grupo. Dessa forma, quando pensamos no significado dos bens simbólicos criados pela mídia, devemos considerar a contextualização social daqueles que estarão consumindo tais produtos. Pensarmos na distância entre o significado de uma mensagem ao ser emitida pelo veículo e a decodificação que os receptores farão, ou seja, as várias compreensões que serão feitas pelos receptores. Com isso, desencadeamos um questionamento sobre a forma de recepção dos produtos dos meios de comunicação de massa e seus efeitos na sociedade, aquilo que, de fato, é passado para a população sob o título de cultura de massa, ou indústria cultural, ou ainda, como prefere chamar Bosi (1999, p. 320), cultura para as massas. Para pensarmos sobre a recepção de mensagens pela massa, importante resgatar a discussão sobre a troca do termo cultura de massa, proposto por Theodor W. Adorno no início de 1947, quando o pensador substituiu a nomenclatura para indústria cultural, na sua obra produzida em parceria com Max Horkheimer. Para eles, o termo indústria fazia alusão ao complexo de produção de bens simbólicos, introduzindo a idéia de produção em série para a cultura; o termo cultural foi adotado para elucidar o tipo desses bens. Com não rara freqüência, encontramos autores como Thompson (1998, p. 16), que consideram as teorias da Escola de Frankfurt petrificadas no passado, já sem muita aplicação nos dias atuais: Duvido que alguma coisa se possa ainda resgatar hoje dos escritos mais antigos dos teóricos da Escola de Frankfurt, como Horkheimer, Adorno e Marcuse; sua crítica do que eles chamavam a indústria da cultura era muito negativa e se baseava em conceitos questionáveis sobre as sociedades modernas e suas tendências de desenvolvimento. Porém, quando analisamos o desenvolvimento da mídia como processo fundamental de construção das sociedades modernas, verificamos que ainda podemos extrair profundas análises sobre as teorias da Escola de Frankfurt, principalmente como compreensão histórica da evolução dos meios de comunicação de massa e do comportamento social frente a eles. 15
  • 6. Adorno e Horkheimer dirigiam o “Instituto de Pesquisas Sociais” de Frankfurt, considerados os maiores expoentes da Escola que contou também com nomes como Jurgen Habermas e Herbert Marcuse. A Escola de Frankfurt tinha por princípio trabalhar um programa de pesquisa interdisciplinar que compreendia os processos de civilização modernos e o desenvolvimento humano, passando pela política, as artes em geral e a vida cotidiana. A originalidade estava em descobrir os efeitos dos meios de comunicação de massa e da produção da cultura em série na sociedade. Nesta linha de pensamento de Adorno e Horkheimer, muito mais que um re-batismo, a troca do termo cultura de massa para indústria cultural abriu um pensar crítico sobre a posição dos consumidores dos produtos dos veículos de comunicação de massa, colocando claramente a condição destes como não participantes da produção dos bens simbólicos, como acontecia nas culturas erudita e popular. Textualmente Adorno afirma que: Tudo indica que o termo indústria cultural foi empregado pela primeira vez no livro Dialektik der Aufklãrung, que Horkheimer e eu publicamos em 1947, em Amsterdã. Em nossos esboços tratava-se do problema da cultura de massa. Abandonamos essa última expressão para substituí-la por “indústria cultural”, a fim de excluir de antemão a interpretação que agrada aos advogados da coisa; estes pretendem, com efeito, que se trata de algo como uma cultura surgindo espontaneamente das próprias massas, em suma, da forma contemporânea da arte popular. Ora, dessa arte a indústria cultural se distingue radicalmente. (...) A indústria cultural é a integração deliberada, a partir do alto, de seus consumidores. Ela força a união dos domínios, separados há milênios, da arte superior e da arte inferior. Com o prejuízo de ambos. (ADORNO; HORKHEIMER, 1985) Para refletirmos sobre a troca do termo proposto por Adorno e Horkheimer, faz-se necessário pensar sobre o porquê da origem dele. Antes do surgimento dos meios de comunicação de massa, a sociedade se caracterizava por duas culturas: a cultura erudita e a cultura popular, marcadas, principalmente, pelas classes sociais, determinadas por suas condições financeiras. Num conceito simplista, a cultura erudita era produzida pelas classes altas e nos segmentos mais protegidos da classe média; a cultura popular era produzida pelas classes pobres. Nas duas versões os mesmos produtores das culturas eram também seus consumidores, ou seja, não havia uma integração ou troca de valores simbólicos entre as culturas, conseqüentemente, entre as classes sociais. A partir do surgimento dos meios de comunicação de massa, há uma apropriação dos bens simbólicos das duas culturas pelos veículos de comunicação, ou seja, música, dança, artes plásticas ou qualquer forma de produção cultural passa a ser adaptada aos novos veículos, o que Adorno e Horkheimer consideraram uma grande perda. Se por um lado, a cultura erudita perde o seu efeito, por outro lado, a cultura inferior se vê imersa a uma domesticação civilizadora. A sociedade passa por um processo de pasteurização de seus bens simbólicos, sob o tema de uma cultura de massa questionado por Adorno, Horkheimer e por Alfredo Bosi, tendo em vista que a massa não produz a cultura, a massa somente consome os bens culturais. Habermas (1984), em seu livro Mudança estrutural da esfera pública, discute o problema, apresentando um público que migrou da condição de produtor de cultura para consumidor de cultura. 16
  • 7. Segundo Habermas, o grande prejuízo da apropriação das culturas erudita e popular pela indústria cultural é a perda da possibilidade de discussão. O processo tem início com a perda da prática da leitura desencadeada pelos meios de comunicação de massa com a difusão de veículos como o rádio e a televisão, colocando a produção literária em um plano menor, servindo a um quantitativo de pessoas da sociedade infinitamente menor que os consumidores dos produtos eletrônicos. Os produtos dos meios de comunicação de massa invadem a intimidade familiar e desde o século XIX está abalando instituições que, até então, asseguravam a existência de agrupamento de pessoas que se reuniam para pensar juntas sobre algo, conversar e discutir assuntos que envolvessem a coletividade. Neste modelo de comunicação de massa as discussões não encontram lugar. O convívio informal é ditado pela própria mídia e seus agentes sociais se informam ou se divertem a partir do que a mídia apresenta, sempre como produto já pronto e acabado. Para Habermas: A discussão em sociedade entre indivíduos já não cabe mais no modelo: cede lugar a atividade de grupo mais ou menos obrigatórias. Também estas encontram formas rígidas de convívio informal; falta-lhes, no entanto, aquela força específica da instituição. (...) Mesmo ao se ir junto ao cinema, ao se escutar conjuntamente rádio ou olhar televisão, dissolveu-se a relação característica da privacidade correlata a um público: a comunicação do público que pensava a cultura ficava intimamente ligada à leitura que se fazia na clausura da esfera privada caseira. As ocupações do público consumidor de cultura no tempo de lazer ocorrem, no entanto, elas mesmas, num clima social em que não precisam encontrar alguma continuidade em discussões. Com a forma privada de assimilação também se perde a comunicação pública sobre o assimilado. A sua correlação dialética mútua é nivelada sem tensões no quadro das atividades do grupo. (1984, p. 189 - 193) Thompson (1998, p. 69) faz um adendo à obra de Habermas, considerando que, na mesma época, outras formas de discurso e atividades públicas existiram, formas que não fizeram parte da sociabilidade burguesa, como as que emergiram da cultura popular, muitas vezes excluídas ou em oposição à cultura erudita, mas que tiveram uma grande importância na variedade dos movimentos sociais e políticos plebeus nas origens da era moderna. Embora discutindo a mesma dinâmica social explicitada por Habermas de imposição de cultura (tanto para a cultura erudita quanto a popular) pelos meios de comunicação de massa, as visões de Adorno e Horkheimer se configuram em um pensamento muito mais pessimista em relação aos efeitos dos produtos dos mass media. Para eles a indústria cultural reorienta as massas, não permite a evasão e impõe sem cessar os esquemas de seu comportamento. Para Adorno, somente a arte mais elevada, a mais pura, a mais abstrata poderia escapar da manipulação e da queda no abismo da mercadoria e do magma totalitário. Habermas não nega o fato de que há uma forte tendência para a dominação total dos meios, auxiliada, inclusive pela busca constante de ampliação do capital e pelo processo de venda de produtos pelos veículos de comunicação de massa, a chamada publicidade. Porém a diferença entre os pensadores está no fato de Habermas possuir uma postura otimista sobre o processo, conseguindo enxergar formas de resistência a esta aparente impossibilidade de discussão sobre os produtos dos meios de comunicação de massa pela sociedade. Para Habermas (1984), as pessoas passariam a decidir sobre a orientação das ações sociais não por um processo de força ou pressão dos meios, mas por uma disposição democrática de dialogar e alcançar o consenso, recriando espaços de discussões que, ainda 17
  • 8. que diferentes daqueles existentes na época das culturas erudita e popular, seriam também formas de pensar a cultura. Segundo Habermas, a tendência ao debate pelos grupos sociais permanece, até porque essa é uma necessidade dos grupos religiosos, dos grupos políticos e dos próprios meios de comunicação, que passam a organizar formalmente os antigos debates informais sobre uma cultura que pode e deve ser discutida. Com isso, a discussão parece sujeita a grandes cuidados e não parecem existir limites à sua expansão. Por baixo do pano, no entanto, ela se alterou de modo peculiar: ela mesmo assume a configuração de um bem de consumo. (...) A discussão, incluída no ‘negócio’, formaliza-se. (...) O mercado dos bens culturais assume novas funções na configuração mais ampla do mercado do lazer. (...) Sim, a cultura de massa recebe o seu duvidoso nome exatamente por conformar-se às necessidades de distração e diversão de grupos de consumidores com um nível de formação relativamente baixo, ao invés de, inversamente, formar o público mais amplo numa cultura intacta em sua substância.(1984, p.193-5) Mais tarde, Thompson tece uma crítica a respeito, colocando que o problema dessa argumentação está no processo de refeudalização da esfera pública: O desenvolvimento dos meios de comunicação criou novas formas de interação, novos tipos de visibilidade e novas redes de difusão de informação no mundo moderno, e que alteraram o caráter simbólico da vida social tão profundamente que qualquer comparação entre política mediada de hoje e políticas teatrais das cortes feudais é, no mínimo, superficial. Mais do que comparar a arena das mediações deste século XX com eras passadas precisamos repensar o significado do caráter público hoje, num mundo permeado por novas formas de comunicação e de difusão de informações, onde os indivíduos são capazes de interagir com outros e observar pessoas e eventos sem sequer os encontrar no mesmo ambiente espaço-temporal. (1998, p. 72) Thompson (1998, p. 207), contudo, não nega que as formas de articulação social desde as classes populares de trabalhadores, até os salões, cafés e clubes da vida social burguesa, a partir do desenvolvimento dos meios impressos de comunicação, “desempenharam um papel muito importante na emergência destas formas de vida pública e na articulação de um tipo de opinião pública que se distinguia das doutrinas oficiais do estado e exercia contra elas um crescente poder crítico”. Habermas coloca a questão no âmbito educacional, lembrando que, no final do século XVIII, o público das camadas cultas havia se expandido no seio da pequena burguesia empresarial, quando pequenos comerciantes fundaram suas próprias associações, numa forma de sociedade de leitura. Assim, homem culto é quem possui uma enciclopédia; esse critério é assumido aos poucos por pessoas de outras classes sociais como artesãos e merceeiros, numa clara posição de que a própria cultura não é rebaixada a uma cultura de massa, mas educa-se o povo para que ele possa ter acesso a ela. Segundo o autor: A medida que a cultura se torna mercadoria, e isso não só por sua forma, mas também por seu conteúdo, ela se aliena àqueles momentos cuja recepção exigem uma certa escolarização – no que o ‘conhecimento’ assimilado por sua vez eleva a própria capacidade de conhecer. (1984, p. 196) 18
  • 9. Thompson (1998, p. 59) reporta a questão para o final do século XVI e início do século XVII, com o surgimento das primeiras editoras na Europa, explicando que: Os clientes das primeiras casas editoras foram as elites urbanas instituídas, incluindo o clero, professores e estudantes, a elite política e a emergente classe social. Mas é provável também que alguns livros tenham sido comprados e lidos também por uma proporção crescente de artesãos urbanos e comerciantes. Embora provas dos índices de alfabetização no início da Europa moderna sejam fragmentárias e inconclusivas, há alguns indícios que nos sugerem números relativamente elevados de alfabetizadores entre certos grupos de artesãos, como boticários, cirurgiões, tipógrafos, pintores, músicos e ourives. Os livros eram disponíveis à venda em lojas na cidade e em tendas no mercado, e os menos volumosos e mais baratos estavam certamente presentes entre os trabalhadores urbanos e artesãos. Para além destas idéias, Barbero (2001), um teórico que criticou o elitismo da Escola de Frankfurt, principalmente a partir das idéias de Adorno, observa que o formato de massificação, decorrente dos meios de comunicação de massa, teve origem antes de os meios existirem, através da igreja, da literatura de cordel ou do melodrama. Assim, a cultura contemporânea não se desenvolve sem os públicos massivos. Nem a cultura de elite, nem a popular seriam redutos incontaminados a partir dos quais se pudesse construir outra modernidade alheia ao caráter mercantil e aos conflitos da hegemonia. A idéia de que ficam em lados opostos e hermeticamente fechados os emissores-dominantes e os receptores- dominados, sem resistência nem questionamentos, já não é mais aceitável. Acredita o autor que: Com o passar dos anos algo nos estremeceu a realidade, destruindo velhas certezas e abrindo novas brechas. Hoje vivemos a trama de modernidade e descontinuidades culturais, deformações sociais e estruturas do sentimento, de memórias e imaginários que misturam o indígena com o rural, o rural com o urbano, o folclore com o popular e o popular com o massivo. Assim a comunicação se tornou para nós questão de mediações muito mais que de meios, questão de cultura e, portanto, não só de conhecimento mas de re-conhecimento. Um reconhecimento que foi, de início, operação de deslocamento metodológico para re-ver o processo inteiro da comunicação a partir de seu outro lado, o da recepção. (2001, p.27-8) Assim, os meios de comunicação de massa devem ser vistos como uma oportunidade nunca antes experimentada de revitalização do indivíduo, “massa deve deixar de significar anonimato, passividade e conformismo. Já que é impossível que uma sociedade chegue a uma completa unidade cultural, então o importante é que haja circulação. E quando existiu maior circulação cultural que na sociedade de massa?”. (BARBERO, 2001, p. 70) Influenciado pela Escola de Frankfurt, Morin (1977) analisa a questão resgatando a idéia central do pensamento crítico e o otimismo dos teóricos norte-americanos. Pare ele Indústria cultural não significa exatamente a racionalidade que informa essa cultura, mas sim o modelo peculiar em que se organizam os novos processos de produção cultural. Desta forma, enquanto Adorno e Horkheimer afirmavam que toda criação artística perde seu valor quando passa a figurar nos veículos de comunicação de massa, transformando-se em simples produção, fazendo com que algo que seja arte não possa ser 19
  • 10. indústria, Morin nos coloca outra possibilidade, mostrando que a divisão do trabalho e a mediação tecnológica não são incompatíveis com a criação artística. Morin acredita, inclusive, que mesmo a estandartização não anula a tensão criadora. Mais que isso, mostra uma possibilidade de pensamento de alternativas, até porque, para ele não existe uma arte separada da vida, tampouco uma cultura separada da cotidianidade. Corroborando esse pensamento, Barbero (2001, p. 47-8) entende que: há uma continuidade da arte com a vida, encarnada no projeto de lutar contra tudo o que separe a arte da vida, pois, mais do que nas obras, a arte reside é na experiência. E não na de alguns homens especiais, os artistas-gênios, mas até na do homem mais humilde que sabe narrar, ou cantar, ou entalhar a madeira. Morin (1977) também analisa através dos meios de comunicação de massa o processo do real e do imaginário, que projetará na sociedade a existência de heróis e celebridades, colocando para os meios a função de estabelecer uma comunicação entre o real e o imaginário. Assim, entre as idéias de imposição dos produtos dos meios de comunicação de massa consumidos de forma inquestionável por toda a sociedade, criada por Adorno e Hokheimer; uma possibilidade de pensamento crítico sobre os produtos dos mass media pela sociedade elucidada por Habermas; as contribuições de Thompson; uma nova visão de Barbero, colocando não mais uma sociedade passiva, mas sim uma sociedade que pode ditar os rumos dos produtos criados pelos meios de comunicação de massa e as idéias de Edgar Morin, sobre a possibilidade de a técnica estar conjugada à criação artística numa simbiose entre arte e vida dentro de uma cotidianidade, abriremos uma discussão sobre a formação da opinião pública. No final dos anos 20 do século XX um congresso de sociólogos alemães discute o tema opinião pública, apreciando o formato de grandes instituições jornalísticas que apresentam um máximo de público, mas um mínimo de opinião, atrelado à publicidade, há um reforço sobre esta idéia, gerando, inclusive uma leitura inversa, denominada de opinião não pública. Habermas (1984) defende a idéia de que as opiniões pessoais de indivíduos privados podem evoluir para uma opinião pública através de um processo de debate crítico racional que seja aberto a todos e livre de qualquer dominação. O problema, contudo, é que esta concepção tem pouca relação com os tipos de ação e comunicação que se tornaram enormemente comuns no mundo moderno. Hoje ações podem afetar indivíduos largamente dispersos no espaço e no tempo; e a mídia criou formas de comunicação que não implicam diálogos em locais compartilhados. (THOMPSON, 1998, p. 225) Para Habermas (1984, p. 277) a opinião pública reina, mas não governa. Com a ajuda da discussão parlamentar, a opinião pública dá a conhecer ao governo as suas aspirações e o governo transmite à opinião pública a sua política. Da mesma forma os meios de comunicação de massa utilizam-se da opinião pública para conhecimento daquilo que esta poderá absorver de informação, garantindo, principalmente, audiência. A opinião pública não necessariamente reflete a opinião da maioria, mas sim, reflete a opinião de uma parcela dominante da sociedade. A partir daí o restante da população terá somente que absorver a nova informação. Normalmente o membro individual do grupo possui uma idéia errônea da importância de sua opinião e de seu comportamento para a formação da opinião pública. Não conhece também 20
  • 11. quantos dos demais membros da sociedade partilham ou rejeitam a idéia apresentada como coletiva e a sua provável não aceitação. Esse desconhecimento, normalmente, empobrece a possibilidade de uma argumentação, tendo em vista que a exposição individual em um processo coletivo tende a não existir por medo ou vergonha dos demais componentes do grupo. Assim, a possibilidade de uma rejeição da idéia da opinião pública tende a se tornar diminuta. Para que o conceito fique completo se faz necessário aqui também pensarmos sobre o que a sociedade considera como público, ou seja, se a massa já se caracteriza como um agrupamento de indivíduos diferente do que identificamos como público, podemos considerar que a opinião pública não se forma a partir da opinião da massa, mas sim, surge numa esfera de público em oposição àquilo que é privado, sem ser, contudo, aquilo que faz parte da maioria. Assim, a opinião pública apresenta a opinião de uma esfera pública de pessoas privadas reunidas num público. A grande massa, ou o chamado público enquanto tal, de forma esporádica é inserido neste processo, majoritariamente ele aclama o processo já definido. Mesmo quando a opinião pública pode ter chances reais de escolha como o voto nas eleições diretas, por exemplo, previamente instâncias políticas ou econômicas superiores já pré-determinaram e reduziram o universo de escolha de cada indivíduo na sociedade. Ou seja, a reprodução social, ou pessoas privadas, ainda depende de consumir aquilo que o exercício do poder político e/ou econômico determinou. Sobre isso, Bourdieu em seu ensaio L’opinion publique n’existe pas, publicado no livro Questions de sociologie (1984) de uma forma direta e extremista afirma: “a opinião pública não existe”. O autor explica que: Qualquer pesquisa de opinião supõe que todo mundo pode ter uma opinião; ou colocando de outra maneira, que a produção de uma opinião está ao alcance de todos. Mais que isso, supõe-se que todas as opiniões têm valor e se equivalem na composição da opinião pública. Na verdade, pelo simples fato de se colocar a mesma questão a todo mundo, fica implícita a hipótese de que há um consenso sobre os problemas, ou seja, que há um acordo sobre as questões que merecem ser colocadas. Nenhuma dessas suposições são evidentes. Sobre outra ótica, Rosnay (2002, p. 218) analisa a questão observando que a opinião pública exerce uma potencial pressão sobre os governantes, porém, as mudanças propostas pela opinião pública, ou até suas eventuais conquistas, sempre estarão atreladas a estâncias superiores: Certamente, o crescimento, a competitividade e a mobilização contra o invasor podem representar forças coletivas capazes de fazer mudar as coisas. Mas elas conduzem, geralmente a mudanças ou a evoluções mais submissas do que desejadas. Na verdade, os homens parecem menos aptos a resolver os problemas complexos, em coletividade, do que individualmente ou em pequenos grupos. Em outras situações, em que ações públicas poderão desencadear uma reação da população, normalmente existe a chamada sondagem de opinião, através da qual se conhece preliminarmente a reação que toda a sociedade possa vir a ter ou qual a idéia colocada que a opinião pública poderá vir ou não a absorver. A minha interpretação coincide com a de Sodré (2002), para quem não é verdade que não exista uma opinião pública; a questão é que os conceitos atribuídos ao binômio foram 21
  • 12. sendo distorcidos ao longo dos anos de forma a torná-lo inexistente como representativo da totalidade da massa. Se tomarmos como exemplo as ações políticas partidárias, quando comumente são realizadas pesquisas de opinião para conhecimento da opinião pública, a forma de obtenção dos dados pelos grupos políticos induz respostas de forma a produzir o que Sodré (2002, p. 44) chama de pseudofenômeno político. Pare ele “o controle estatístico da cidadania pelas sondagens canaliza e orienta certas disposições preexistentes ou latentes (...) a opinião pública existe como uma forma de buscar o que de algum modo já se tem.” Para Barbero (2001), a opinião pública não se forma de maneira aleatória, mas sim, forma-se dentro de um processo de análise, para poder agir no momento certo. Para ele: Massa é um fenômeno psicológico pelo qual os indivíduos, por mais diferente que seja seu modo de vida, suas ocupações ou seu caráter, estão dotados de uma alma coletiva que lhes faz comportarem-se de maneira completamente distinta de como faria cada indivíduo isoladamente. (p. 59) A opinião pública não diz respeito, necessariamente, a uma opinião construída pela massa. Numa relação com a divisão social entre público, massa e multidão, a opinião pública se reporta majoritariamente aos públicos. É a partir dos grupos sociais com capacidade para pensar sobre assuntos relevantes para a coletividade, suas formas de interação e reflexão, e, acima de tudo, sua capacidade de expressar a opinião que a opinião pública se forma. É uma opinião com força e capacidade de ser conhecida publicamente. Em uma sociedade de massa, com um grande contingente de pessoas dispersas fisicamente, os meios de comunicação de massa desenvolvem um papel determinante na formação da opinião pública. São, de fato, responsáveis por grande parte daquilo que a sociedade entenderá por opinião pública. Além da mídia, podemos encontrar outras maneiras de formação da opinião pública, através de grupos específicos como os de uma organização social – escola, órgãos públicos, clubes recreativos ou de serviço. A educação e os fatores psicológicos de cada indivíduo têm papel fundamental no processo. A seguir veremos como os efeitos dos meios de comunicação de massa, as relações sociais e a consciência dos receptores se desenvolvem na construção da opinião pública. A Psicogênese da Formação da Opinião Pública O pensador canadense Marshall McLuhan (1967) insiste seguidamente no caráter subliminar dos efeitos dos meios de comunicação. Para ele, é perfeitamente ilusório tentar controlar esses efeitos com base no conteúdo daquilo que cada meio veicula. Para defender-se de um meio, somente recorrendo a outro. Para contrabalançar os efeitos da exposição à imagem da TV, é necessário recorrer a outro meio: por exemplo, a palavra impressa. Encontramos assim uma forma de controle dos efeitos dos meios de comunicação, ou seja, a diversidade de veículos de informação, ainda que de forma não muito otimista, uma vez que McLuhan também afirma que somente quem controla os meios pode ter o domínio dos seus efeitos. Analisemos, porém, uma possibilidade de sermos mais ou menos impermeáveis aos efeitos dos produtos da Indústria Cultural, por meio de uma ação consciente dos grupos sociais em que cada indivíduo esteja envolvido, através de uma consciência da real natureza dos media e a percepção das mensagens veiculadas por eles, conforme a característica de cada um desses meios, a partir de uma diversidade de informações. 22
  • 13. O ecletismo dos meios de comunicação, atrelado à possibilidade de discussão, quer em família, universidades, clubes de bairro, igrejas, ou qualquer outro agrupamento social, resultará num avanço da busca pelo senso crítico pessoal frente aos produtos da Indústria Cultural, criando uma forma de resistência passiva às mensagens dos meios de comunicação de massa. Barbero (2001) reforça a idéia de que é através do aumento de circulação de bens e mensagens que as sociedades contemporâneas atingem o processo de democratização, contudo, a facilidade de acesso não é uma garantia para que as massas compreendam o que se passa, tampouco vivam e pensem melhor. A psicologia apresenta uma sociedade que se move a partir das mensagens dos meios de comunicação de massa, entre elas as formas de construção dos programas de TV, as veiculações do rádio e a forma de diagramação e construção dos textos dos veículos impressos. Para Guareschi (1991, p.14-15), a sociedade moderna coloca o povo em profundo anonimato, causando uma massificação generalizada. Todos são anônimos e iguais, exceto os que estão nos meios de comunicação, os que podem aparecer, aqueles que podem ter o rosto, a voz ou o nome conhecido. Uma das implicações desse formato de sociedade é a relação marcante entre a comunicação e o poder. Para o autor, quem detém a comunicação detém o poder e, numa sociedade em que a comunicação é capaz de construir a realidade dos fatos, aquele que possui o poder de construir essa realidade conquista o poder sobre a existência das coisas, a difusão das idéias e a criação da opinião pública: Mais que isso, os que detém a comunicação chegam até a definir os outros, definir determinados grupos sociais como sendo melhores ou piores, confiáveis ou não confiáveis, tudo de acordo com os interesses dos detentores do poder. Quem tem a palavra constrói identidades pessoais ou sociais. Já foram feitos estudos interessantes sobre o que determinados povos pensam de outros povos. Essa opinião está baseada, principalmente, nas informações que as pessoas recebem. Em estudos e pesquisas realizados no campo da comunicação, verificou-se que a opinião pública é preparada com informações sobre determinadas populações. Além disso, é importante lembrarmos de todo o processo de transmissão de uma informação. Para isso, consideremos que cada indivíduo é composto por 3 elementos estruturais: Cultura, sociedade e personalidade. A cultura é o estoque de saber da comunidade, que contém os conteúdos semânticos da tradição, onde os indivíduos se abastecem dos modelos de interpretação necessários ao convívio social. A sociedade, strictu sensu, é composta dos ordenamentos legítimos pelos quais os membros da comunidade regulam suas solidariedades. A personalidade é um conjunto de competências que qualificam um indivíduo para participar da vida social. (ROUANET, 1989, p. 23) Segundo Goldmann (1972, p.8), “numa transmissão de informações não há apenas um homem ou um aparelho que emite informações e um mecanismo que as transmite, mas também, em qualquer parte, um ser humano que as recebe.” E vai além, explicando a consciência do receptor: Essa consciência é opaca a toda uma série de informações que não passam em razão mesmo de sua estrutura, enquanto outras informações passam, e outras, enfim, só 23
  • 14. passam de maneira deformada(...). Muito freqüentemente, na verdade, quem olha do exterior e tenta comparar o que foi emitido com o que foi recebido constata que apenas uma parte da emissão foi recebida e que mesmo essa parte, ao nível da recepção, adquiriu uma significação assaz diferente da que fora enviada. Trata-se aí de um fato extremamente importante que leva especialmente a repor em discussão toda a sociologia contemporânea na medida em que ela é mais centrada sobre o conceito de consciência real que sobre o conceito de consciência possível. O real é a realidade que o receptor conhece a partir das possibilidades de sua interpretação. Uma mesma mensagem sofrerá interferências de recepção em cada indivíduo a partir dos valores que cada receptor já possui. Assuntos como religião ou política têm uma tendência à polêmica porque as relações dos indivíduos com estas questões extrapolam as informações e são colocadas sob a ótica de doutrina, crença ou idolatria. Assim, uma informação que contraste os valores previamente adquiridos terá uma tendência à resistência e à não aceitação. Minayo (2000, p. 69) citando Goldmann, afirma que a significação humana não pode ser compreendida fora da estrutura social, pois a consciência se concebe, desde a origem, como um produto social. Para as ciências Sociais é imprescindível lembrar a importância dos significados dados pelos atores sociais a seus atos e aos acontecimentos a partir daquilo que cada um considera relevante. Para a autora, isso ocorre porque o objeto das ciências sociais (para efeito de uma pesquisa social) é histórico: Significa que as sociedades humanas existem num determinado espaço, num determinado tempo, que os grupos sociais que as constituem são mutáveis e que tudo, instituições, leis, visões de mundo são provisórios, passageiros, estão em constante dinamismo e potencialmente tudo está para ser transformado. (2000, p.69) E continua fazendo uma reflexão sobre os conceitos de consciência possível e consciência real descritos por Goldmann, afirmando que: De acordo com o desenvolvimento das forças produtivas, com a organização particular da sociedade e de sua dinâmica interna, desenvolvem-se visões de mundo determinadas que nem os grupos sociais e nem os filósofos e pensadores conseguem superar. Alguns grupos sociais e alguns pensadores logram sair do senso comum dado pela ideologia dominante, mas, mesmo assim, seu conhecimento é relativo e nunca ultrapassa os limites das relações sociais de produção concretas que existem na sua sociedade. O pensamento e a consciência são fruto da necessidade, eles não são um ato ou entidade, são processos que têm como base o próprio processo histórico. (MINAYO, 2000, p. 20) Sob uma outra perspectiva, Fadul (1982, p.39-49) coloca a questão como problema educacional: Ao nível da educação formal, consideramos urgente e indispensável que se reconheça esse novo domínio do conhecimento, o do estudo dos meios de comunicação de massa, introduzindo uma nova disciplina que tenha por objetivo alfabetizar, para uma leitura crítica e seletiva das mensagens divulgadas pelos mídia, com a finalidade de superar a oposição entre o universo da escola e dos meios de comunicação de massa, que se traduz na oposição entre o fácil e o difícil, o recreativo e o instrutivo. Pois a introdução dos novos meios na escola é a única 24
  • 15. defesa possível contra os efeitos nocivos da mídia. Aprender-se-ia a lê-los como um livro e sua utilização permitiria a desmistificação de sua linguagem. Considerando as colocações de Goldmann, Minayo, e Fadul, o que verificamos é que os meios de comunicação de massa, conscientes do problema de má interpretação, ou dificuldade de interpretação, por parte dos consumidores, acabam empobrecendo vocabulários e adaptando mensagens para a compreensão da grande parcela da população brasileira, ainda que esta adaptação implique em uma perda do conteúdo. Falando especificamente da televisão, Bourdieu acrescenta que ela pode reunir numa noite, mais pessoas que as mídias impressas, a exemplo da totalidade dos jornais franceses reunidos. Esse grande público constitui uma legião de pessoas absolutamente heterogênea, e para atingi-los a mídia tem que perder suas asperezas, tudo aquilo que pode excluir algum membro da sociedade ou dividir as atenções: Mais que isso, ele deve aplicar-se em não chocar ninguém, como se diz, em jamais levantar problemas ou apenas problemas sem história. Na vida cotidiana, fala-se muito da chuva e do tempo bom porque é o problema com o qual se está certo de não causar choque. Quanto mais um jornal estende sua difusão, mais caminha para assuntos-ônibus que não levantam problemas. Constrói-se o objeto de acordo com as categorias de percepção do receptor. (BOURDIEU, 1997, p. 62-3) Assim, o que podemos notar é toda uma estrutura adotada pelos veículos de massa para homogeneizar a linguagem, realizando verdadeiras traduções de conteúdos para os consumidores dos produtos da Indústria Cultural, além de contarmos com os processos culturais por que passam os indivíduos ou grupos de indivíduos na sociedade, modificando determinados significados regionais ou locais. Atrela-se a isso também o problema educacional e a falta de prática interpretativa. Barros Filho (1995, p. 223) explica o processo através da hipótese do knowledge gap, ou intervalo do conhecimento, apresentada pela primeira vez à comunidade por Tichenor, Donohue e Olien, em 1970. Segundo a hipótese: Para o senso comum e alguns comunicólogos midiáticos, a mídia socializa o conhecimento. O fato de a recepção, sobretudo televisiva, se dar de forma intensa em todos os níveis sociais serve de argumento para que se acredite na tese homogeneizadora da veiculação informativa. No entanto, as pesquisas realizadas sobre os efeitos da recepção informativa mostram o contrário. Os grupos de maior capital cultural, que ocupam os níveis mais altos na escala socioeconômica, apresentam uma absorção da informação sempre superior aos grupos de nível de instrução inferior. A distância de conhecimento entre esses grupos em vez de diminuir, aumenta. Os meios de comunicação servem como instrumento de reprodução das desigualdades culturais. Além de todos esses fatores, ainda contamos com o fator psicológico, pelo qual cada indivíduo tem o poder de impermeabilizar-se a ou supervalorizar determinadas informações a partir dos valores que cultua, entre eles, o bem, o mal ou o belo, valores que não necessariamente têm significados iguais para todos os indivíduos, aliás, com muita freqüência, causam reações opostas entre pessoas ou grupos de uma mesma sociedade. Neste sentido, temos que considerar que determinadas informações são incompatíveis para este ou aquele grupo social. Assim, como os meios de comunicação de massa não fazem esse tipo de distinção, a busca por um outro meio de comunicação regional ou local é fundamental para a complementação de informações necessárias ao dia-a-dia. 25
  • 16. Muitas vezes, a homogeneidade em relação a uma segmentação intelectual não garante a recepção homogênea, através dos meios de comunicação, deste mesmo grupo, no tocante a valores pessoais. Evidencia-se, nestes casos, uma heterogeneidade. A opinião relaciona-se com um sistema de crenças e ideologias do indivíduo, o que Da Viá descreve como: Um estado de disposição mental e nervosa, organizado pela experiência, que exerce influência direta e dinâmica sobre as respostas individuais a todos os objetos e situações com os quais se relaciona. Sendo essencialmente expressão, a opinião é de natureza comunicativa e interpessoal, serve de mediadora entre o mundo exterior e o indivíduo. (1983, p. 29) Estudos na área da psicologia explicam que a adaptação à realidade faz-se através da avaliação crítica dos fatos, fazendo com que cada indivíduo reajuste constantemente as suas relações com o meio. O indivíduo tem necessidade de expressar a sua opinião como forma de interação ao meio social em que vive. As opiniões certas de serem aceitas pelo grupo são colocadas de forma mais fácil do que aquelas que tendem a uma rejeição pela maior parte das pessoas que formam um grupo. Através da interpretação psicológica, as relações sociais são estruturadas a partir do mecanismo de identificação, que se apresenta como a introjeção, que é a assimilação das características dos outros e a projeção, que é a atribuição ao outro de suas próprias características. Elementos fundamentais para o reconhecimento das semelhanças e diferenças como princípios constitutivos do indivíduo. Ainda considerando a necessidade de expressão dos indivíduos como forma de interação ao meio social, podemos considerar a hipótese da “espiral do silêncio”. Um modelo de opinião pública, de autoria da alemã Noelle-Neumann (apud Barros Filho, 1995, p. 207- 211), que se baseia nos elementos destacados por Alexis de Tocqueville, quais sejam, medo que os agentes sociais têm de se encontrarem isolados em seus comportamentos, atitudes e opiniões; a tendência ao silêncio e a necessidade de consonância. Segundo a hipótese, esse medo do isolamento social faz com que as pessoas tendencialmente evitem expressar opiniões que não coincidam com a opinião dominante. Esse silêncio tendencial é possível porque os agentes sociais têm aguda percepção de qual é a opinião dominante, que seria, em grande parte, imposta pelos meios de comunicação de massa. Desta forma, há uma tendência ao silêncio quando o indivíduo, por medo de isolamento, não expressa sua opinião quando ela é minoritária. A idéia visa explicitar a dimensão cíclica e progressiva dessa tendência ao silêncio. Quanto mais uma opinião for dominada dentro de um universo social dado, maior será a tendência a que ela não seja manifestada. Neste princípio, a possibilidade de um grupo isolado que discorda de uma opinião expressada nos meios de comunicação de massa manifestar sua visão de um fato é absolutamente reduzida; haverá, portanto, uma tendência, desse grupo minoritário, ao silêncio. A maior parte dos agentes sociais procura evitar o isolamento, assim, cada um observa seu próprio meio para constatar quais opiniões prevalecem ou se fortalecem, ou quais estão em declínio. Para que o processo da espiral possa se desenvolver é preciso que haja uma opinião dominante, ou seja, uma seleção imposta de temas e abordagens, além disso, haja o medo do isolamento por parte daqueles que não comungam dessa opinião dominante e, por fim, que esses últimos percebam qual é a opinião dominante e sua tendência a fim de que possam contrastá-la com a própria opinião. Para Barros Filho (1995, p. 220): 26
  • 17. o ser humano tem horror ao isolamento opinativo. Sustentar uma opinião contrária à da maioria traz desconforto. Esse medo é generalizado e estatisticamente comprovado. Para que se possa evitar esse isolamento é preciso que se saiba qual é a opinião dominante. Não podemos desconsiderar, contudo, que nem sempre um indivíduo que sustenta uma opinião minoritária desistirá de sua posição ou se calará diante da opinião dominante. O medo provocado pela hipótese da espiral do silêncio se manifesta nos atores sociais de diferentes formas. A competência de cada ator social para abordar os temas em discussão condiciona uma tomada de posição pública. Desta forma Barros Filho nos diz que: o medo do isolamento será tanto mais decisivo na tomada de posição quanto menor a confiança que tiver o indivíduo na sua argumentação, que, por sua vez, é dependente de todo o conjunto de elementos constitutivos do grau de educação, conhecimento ou politização. (1995, p. 223) O medo do isolamento tem sua base firmada nas questões psicológicas. Pesquisas realizadas pelo psicólogo Salomon Asch na década de 50 revelam que poucos indivíduos confiam em si mesmos quando confrontados com uma opinião externa. Por experiência o psicólogo conseguiu provar que entre apresentar uma resposta certa para uma determinada situação, discordando da pressão de uma resposta errada, o indivíduo prefere errar consciente, mas concordar com o grupo dominante. Os indivíduos “temem mais o isolamento que o erro”. (BARROS FILHO, 1995, p. 222) Um outro ponto a ser considerado é a análise sobre a recepção dos produtos dos meios pela sociedade. Segundo Lopes (1995, p.101): A pesquisa sobre recepção dos meios pela sociedade é marcada pela ausência da crítica cultural e política, tal como fora proposta pela tradição dos estudos culturais (...) fundamentalmente o que os estudos culturais propõem é que as práticas de recepção sejam articuladas com as relações de poder. A recepção, portanto, não é um processo redutível ao psicológico e ao cotidiano, mas é profundamente cultural e político. Isto é, os processos de recepção devem ser vistos como parte integrante das práticas culturais que articulam processos tanto subjetivos como objetivos, tanto micro, como macro. A recepção é então um contexto complexo e contraditório, multidimensional, em que as pessoas vivem o seu cotidiano. Ao mesmo tempo, ao viverem esse cotidiano, as pessoas se inscrevem em relações estruturais e históricas, as quais extrapolam as suas práticas. Na verdade, os estudos qualitativos da recepção, nacionais ou internacionais, são insuficientes no tocante à crítica cultural e política, pois normalmente dissociam as práticas cotidianas de comunicação das relações de poder. Não há garantia de que aquilo que os meios de comunicação de massa oferecem aos seus públicos seja exatamente aquilo que eles recebem. A audiência não nasce, ela se faz a partir de várias maneiras diferentes de construções da sociedade. Os receptores dos meios de comunicação de massa não são recipientes vazios prontos para serem cheios. São sim, indivíduos com maior ou menor poder de crítica, que podem até negociar as informações que recebem, dentro de um conjunto de valores pessoais, chegando ao ápice de poderem até recusá-las. Para Thompson (1998, p. 31): A recepção dos produtos da mídia não é um processo sem problemas, acríticos, tampouco são absorvidos pelos indivíduos como uma esponja absorve água. A 27
  • 18. atividade de recepção se constitui em maneiras complexas pelas quais os produtos da mídia são recebidos pelos indivíduos, interpretados por eles e incorporados em suas vidas. Devemos considerar que, como qualquer outro processo social, o desenvolvimento do senso crítico acerca das mensagens televisivas necessita de um aprendizado. Se desde criança a única fonte de informação for a televisão, a predisposição para o consumo de forma passiva será quase inerente ao processo. Assim, a possibilidade de se ter um receptor pronto para o consumo inquestionável de seus produtos será real para grande parte das empresas de televisão. Resgatando as idéias de Bourdieu, na composição da opinião pública nem todos possuem opiniões formadas sobre todos os acontecimentos sociais, tampouco necessariamente têm algo a dizer sobre um determinado tema proposto. Além disso, nem todas as opiniões emitidas se equivalem na composição da opinião pública porque essa se caracteriza, principalmente, pela existência de líderes de opinião e formas de indivíduos expressarem sua opinião publicamente, fazendo com que estas se sobreponham à opinião daqueles que não têm condições de expressar suas visões sobre fatos e acontecimentos. Os indivíduos atribuem escalas de importância diferentes para cada assunto social a partir dos valores ou interesses que possuem, fazendo com que os assuntos que envolvem a opinião pública nem sempre sejam de interesse de cada indivíduo isoladamente. Estudos sobre a consciência do receptor ou sobre a hipótese da espiral do silêncio são importantes para lembrarmos sempre que as mensagens da mídia podem ser passadas de forma homogênea, mas o público que as recebe sempre será heterogêneo e carregado de valores, constituindo-se pessoas que modificarão o significado das mensagens e o uso que cada um poderá fazer dele. Além disso, como veremos a seguir, um mesmo indivíduo é sujeito de vários grupos sociais simultaneamente, suas relações de pertencimento, suas atitudes e valores são adaptados a cada um dos papéis que desempenha nos diversos grupos sociais durante todo o dia, durante toda a vida. Teorias de Comunicação e Semiótica Relacionadas à Questão “Comunicação de massa é a produção institucionalizada e difusão generalizada de bens simbólicos através da fixação e transmissão de informação ou conteúdo simbólico”. Thompson Quando pensamos na construção da opinião pública nos reportamos à avaliação da sociedade através da qual esta opinião pública será desencadeada, ou seja, torna-se condição básica para a formação de uma opinião pública a existência de um grupo de indivíduos denominado sociedade. A sociedade é composta por públicos, não exatamente unidades organizacionais predeterminadas, mas grupos sociais que desenvolvem processos de pertencimento, ou seja, um mesmo indivíduo pode fazer parte de diversos públicos simultaneamente, acerca de várias situações do cotidiano. Assim, um mesmo cidadão pode ser torcedor de um determinado time de futebol, ser cliente de uma loja de departamentos, freqüentador de um determinado restaurante, ser 28
  • 19. ouvinte de uma rádio e telespectador de um programa de TV. Ainda trabalha em uma empresa, é pai de um aluno de escola de segundo-grau e síndico do prédio onde mora. Enfim, condições paralelas de existência enquanto usuários, funcionários, consumidores ou defensores de uma ideologia. Essas condições de vida em sociedade nos colocam o tempo todo na qualidade de adaptação de linguagem, comportamento e formas de ação para cada situação que nos encontramos em nosso dia-a-dia. Segundo Baitello Junior (2002, p. 106-7), vivemos em um mundo composto por três partes: o mundo real – que vivemos por meio do corpo, um mundo simbólico – que vivemos por meio da linguagem e um mundo imaginário – que vivemos por meio de nossa fantasia. Para viver esses mundos, as escolas semióticas soviéticas desenvolveram a teoria da Semiótica da Cultura. Nela, está proposta uma tripla concepção dos fenômenos de transmissão e conservação da informação pelos homens, quais sejam: Um primeiro nível informacional que ocorre na esfera do organismo. Todo organismo vivo se constitui a partir de trocas internas de informações. Estas informações intra-organísticas são regidas por códigos e leis próprias da vida, também denominadas de hipolinguais. Organismos mais complexos desenvolvem sistemas também mais complexos que pressupõem interação e interdependência de outros organismos. Forma-se então sociedades. Porém sociedades não sobrevivem sem uma intensa e sincronizada comunicação social regida por códigos extra- individuais. São os códigos linguais (das diversas línguas da comunicação social, em todas as espécies que vivem em sociedades, desde insetos até mamíferos, com suas linguagens olfativas, corporais, vocais ou ainda outras). Há ainda uma outra esfera, denominada de segunda realidade, ou seja, a realidade do imaginário, social, histórica, cultural, que desencadeiam manifestações humanas como o sonho ou a atividade lúdica. (p. 107) Vale ressaltar que a opinião pública se forma a partir de valores pessoais de cada indivíduo, ou seja, opiniões e atitudes são fruto de um conjunto de valores adquiridos desde a infância, com a família, reforçado pela sociedade em que se vive. A escola, o trabalho e a mídia também apresentam reflexos diretos sobre as atitudes. Na época da comunicação de massa, a mídia desempenha um papel importantíssimo na formação da opinião das pessoas. O tempo que as crianças passam na escola e na frente da televisão pode ser, muitas vezes, maior do que o tempo que passa com a família. Guareschi (1991, p. 14) coloca a questão da comunicação não somente como transmissão de informação, mas também como construção da realidade: Não seria exagero dizer que a comunicação constrói a realidade. Num mundo todo permeado de comunicação – um mundo de sinais – num mundo todo teleinformatizado, a única realidade passa a ser a representação da realidade – um mundo simbólico, imaterial. Uma situação existe, ou deixa de existir, à medida que é comunicada, veiculada. É por isso que a comunicação é duplamente poderosa: tanto porque pode criar realidades, como porque pode deixar que existam pelo fato de serem silenciadas. Levemos em consideração, também, os formadores de opinião, ou seja, pessoas que têm a oportunidade de expressar publicamente o seu ponto de vista sobre algo. Membros da família como os pais se constituem líderes de opinião, além de artistas, professores, líderes religiosos, atletas, socialites ou líderes de classe, como empresários, advogados, médicos, ou 29
  • 20. líderes sindicais podem exercer influência sobre aquilo que uma pessoa ou um determinado grupo de pessoas pensa ou deva pensar. Martín Lutero pode ser classificado como um grande formador de opinião. No início do século XVI, Lutero, não conformado com as idéias e políticas adotadas pelo Vaticano, escreveu as ‘95 Teses’, um documento crítico que tratava de questões religiosas e políticas. Através de uma linguagem simples, transformou as idéias em cartazes e discursos públicos, atraindo multidões e popularizando a sua doutrina. Thompson (1998, p. 58) observa que as técnicas de impressão que se difundiam a partir do século XVI foram determinantes para a difusão das idéias de Lutero, entre outros reformadores: As 95 Teses de Lutero, inicialmente fixadas à porta da igreja agostiniana em Wittemberg, em 31 de outubro de 1517, logo foram traduzidas para as línguas vernáculas, impressas em folhetos e distribuídas por toda a Europa; estima-se que essas teses tenham chegado ao conhecimento de quase toda Alemanha em questão de 15 dias, e de boa parte da Europa em um mês. Os sermões e tratados de Lutero foram publicados em numerosas edições e logo se tornaram enormemente populares. Os líderes de opinião podem ser cientistas, pessoas famosas, que possuem o reconhecimento da sociedade, bem-informados, estudiosos de renome ou celebridades da mídia. Pessoas que conquistaram a simpatia do público a partir de suas aparições nos meios de comunicação de massa e que se transformam em modelos sobre aquilo que a massa deva ser, pensar ou consumir. O valor simbólico criado na transmissão de uma mensagem, o acúmulo de acertos sobre determinado assunto e o prestígio social também são fatores de construção de um líder de opinião. Estes líderes podem ou não ser celebridades midiáticas. Além da mídia podem ser pessoas reconhecidas em um determinado grupo social, um bairro ou uma cidade. Os líderes de opinião podem ser políticos, por exemplo, pessoas públicas que possuem alto grau de penetração e reconhecimento pela sociedade. Neste sentido, a opinião pública também pode ser responsável por manter ou colocar alguém no poder. A opinião pública pode ser determinante para as decisões políticas em qualquer instância, uma vez que, ações políticas podem ser punidas por eleitores em eleições futuras, condenando o político responsável à não reeleição. Já vivemos casos, até, de a opinião pública conseguir pressionar instâncias governamentais a tal ponto de conquistar o afastamento do presidente imediatamente, não sendo necessário, sequer, a espera por futuras eleições. A Construção da Opinião Pública pelos Sistemas de Comunicação: o processo das Relações Públicas As relações públicas se caracterizam como uma atividade que tem como objetivo atrair a atenção e conseguir a aceitação pública para uma causa social, política, religiosa, educacional, esportiva ou a integração de uma organização com outros organismos de uma sociedade. Em resumo, criar uma imagem de prestígio para o órgão ou indivíduo que representa. As relações públicas são também auxiliares na formação da opinião dos públicos de interesse das organizações que defendem, quer seja no âmbito interno das instituições, externo, com a sociedade, organismos de interesse da organização, órgãos de classe, ONG’s, entidades governamentais de qualquer instância, imprensa, sindicatos, enfim pessoas que 30
  • 21. estarão interagindo com a organização para realização de ações de toda ordem social. Segundo Kunsch (1997, p. 15): As organizações, como microssociedades, fazem parte do sistema social global, achando-se sujeitas a todas as turbulências ambientais provocadas por uma sociedade envolvida, de forma crescente, no fenômeno da globalização, e que exigirão respostas cada vez mais rápidas no que se refere à comunicação. Esta tem de ser pensada e administrada excelentemente. Entre as várias definições de relações públicas existentes destacamos a definição operacional da atividade pelo “Acordo do México” de 1978: O exercício da profissão de relações públicas requer ação planejada, com apoio da pesquisa, comunicação sistemática e participação programada, para elevar o nível de entendimento, solidariedade e colaboração entre uma entidade, pública ou privada, e os grupos sociais a ela ligados, em um processo de integração de interesses legítimos, para promover seu desenvolvimento recíproco e da comunidade a que pertencem. (KUNSCH, 1997, p. 50) Quando atribuída especificamente à causa da opinião pública, Andrade (1996, p. 104) nos lembra que “relações públicas são os métodos de integrar na opinião pública conceitos favoráveis relativos a uma pessoa ou instituição”. A Confederação Interamericana de Relações Públicas (CONFIARP), criada em 1985, também considera a ligação das relações públicas com a opinião pública, da seguinte forma: As relações públicas desenvolvem atividades sócio-técnico-administrativas, mediante a qual se pesquisa e avalia a opinião pública e se empreende um programa de ação planificado, contínuo e de comunicação recíproca, baseado no interesse da comunidade e destinado a manter uma afinidade e compreensão da mesma para com entidades de qualquer natureza. (ANDRADE, 1996, p. 105) Kunsch (1986, p.133) destaca a opinião pública da seguinte forma: A organização social deve identificar-se perante a opinião pública, cabendo às relações públicas, por meio de um planejamento fundamentado em pesquisas e na análise ambiental, ajudar a definir os melhores caminhos para que ela atinja mais eficazmente os diversos públicos, graças a ações perfeitamente integradas do composto da comunicação. Neste composto da comunicação, um importante papel reservado às relações públicas é o de gerenciar ou administrar questões controvertidas que envolvem o posicionamento da organização perante os públicos e a opinião pública. O que fazer e não fazer pela imagem de uma organização são questões que envolvem o dia-a-dia dos relações públicas. Profissionais que buscam incessantemente colocar as organizações públicas ou privadas que representam num conceito elevado junto à opinião pública, ou, junto aos públicos de interesse da organização. Foi-se o tempo em que os esforços dos relações públicas se concentravam mais na produção de campanhas que valorizavam a organização do que nos interesses do público. Nenhuma organização sobrevive sozinha, sem a interação com outras organizações – processo interorganizacional, de interação social, independente do tipo de produto desenvolvido pela organização. 31
  • 22. Os relações públicas devem saber como interagir com os diversos públicos de uma organização de forma vantajosa, preservando a honestidade, a reputação e a integridade, acima de tudo exercer uma atividade de liderança. Numa situação organizacional de problema ou conflito com a sociedade, uma das preocupações dos relações públicas é quanto à identificação dos públicos que produzem aquela opinião. Quem são de fato os públicos que interagem com a instituição? Quais os seus anseios? São ou não líderes de opinião e multiplicadores de informação? As respostas dessas questões serão determinantes para a tomada de decisões. Em qualquer organização os relações públicas são responsáveis pela construção de um programa de comunicação estratégico, capaz de prevenir situações de desgaste junto à sociedade. As relações públicas constituem uma das grandes áreas da comunicação institucional, ao lado do jornalismo, da produção editorial, da publicidade e do marketing social; com essas e a comunicação mercadológica, integra o composto de comunicação que resultará num trabalho conjugado e interdisciplinar. Na prática os relações públicas buscam criar e assegurar reações confiantes ou formas de credibilidade entre uma organização social e os públicos com os quais se relaciona. (KUNSCH, 1986, p. 38) Carvas Junior corrobora, afirmando que: Gerenciar e prevenir crises são duas faces da mesma moeda. Qualquer trabalho sério, consistente e profundo no sentido da prevenção acabará por conferir segurança à empresa em situações críticas. A atividade de relações públicas é de extrema importância para o enfrentamento de crises, pois é ela que deve assumir a responsabilidade pela coleta de informações e pela organização dos contatos com a imprensa e com os p0úblicos de interesse. (1997, p. 205) É no momento de crise que os relações públicas mais precisam mostrar suas habilidades. Andrade (1979, p. 6) afirma que “a controvérsia e a sua análise constituem o determinante inicial e decisivo para o desenvolvimento do processo gerador de públicos e da opinião pública”. Situações de acidentes, por exemplo, envolvendo funcionários ou pessoas da sociedade são momentos delicados para qualquer organização pública ou privada. Neste momento os relações públicas são chamados a responder questões para as vítimas, seus familiares, imprensa, líderes comunitários e do público em geral, numa proporção ditada pela proporção do problema. Susskind e Field em sua obra Em crise com a opinião pública (1997), apresentam estudos de caso de diversas organizações que tiveram suas imagens abaladas por anos, frente à opinião pública. Algumas em processos irreversíveis de conquista do público. Casos como vazamento de óleo, derramamento de petróleo, poluição do ar, companhias de cigarros que provocam câncer ou vazamento de gás são exemplos que podem arruinar uma instituição, ou, no mínimo, tirar de seus cofres cifras consideráveis para acalmar o público e tornar o problema o menos aparente possível. Acidentes acontecem, porém, o acúmulo de situações em que, historicamente, grandes acidentes poderiam ter sido evitados, a partir de maiores cuidados das organizações responsáveis, fazem com que a opinião pública freqüentemente acuse as empresas de culpadas, pelo menos até que se prove o contrário. 32
  • 23. Nestas circunstâncias a verdade é sempre a melhor escolha, até porque, enquanto não se conheça a realidade, a especulação é inevitável e grupos da sociedade começam a formular suas versões para o fato. Assim, é sempre uma boa estratégia manter a opinião pública informada, principalmente os grupos de interesse da instituição em crise. Susskind e Field (1997, p. 96) defendem que os relações públicas devem: Inventar informações, pois tudo o que for dito pode e será usado por alguém. Portanto, informando o público em pequenas doses, e sob a melhor ótica possível, não haverá armas perigosas para alguém usar. Transparência é a criação e manutenção de uma imagem. Na era da MTV e de mais 500 canais a Cabo, os fatos são apenas uma entre muitas possibilidades. A verdade é o que fazemos dela. Esta estratégia, porém, não pode apresentar o menor risco de prejudicar ninguém. Recriar sim, inventar não. Omitir sim, mas mentir jamais. Reconstruir uma imagem abalada é muito mais difícil do que criar uma nova. Desmentir uma farsa é ainda pior. Em qualquer situação, nos momentos de crise ou na rotina dos trabalhos de uma organização, o relações públicas deve transpirar credibilidade. Deve ser alguém de linguagem adequada; muito bem informado, não só sobre a sua organização, mas sobre os assuntos que a envolvem; tranqüilo, confiante e que possa se transformar num entusiasta diante dos seus públicos. Ninguém vai acreditar em palavras soltas, inseguras e ingênuas. Para além dessa atuação, o relações públicas de uma organização deve buscar parceiros para a construção da opinião pública a favor de sua organização, tendo em vista que a opinião pública muitas vezes se caracteriza pela opinião de um determinado público que se manifesta a favor ou contra determinada situação. Assim, a busca por líderes sociais, jornalistas, ou formadores de opinião são fundamentais para que, numa parceria, essas pessoas auxiliem na construção da imagem favorável de uma organização. “As relações públicas, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Relações Públicas (ABERP), trabalham com públicos multiplicadores – opinion leaders. Elas utilizam técnicas de opinião que trabalham o racional das pessoas.” (KUNSCH, 1986, p. 38) Mestieri e Melo (1997, p. 20) corroboram tal opinião, colocando que: “As relações públicas trabalham na segmentação, no corpo-a-corpo, empregam a razão em lugar da emoção, trabalham com lideranças para formar multiplicadores conscientes de opinião”. Dentro desta linha de atuação, cada vez mais os relações públicas têm exercido um papel conjugado com a imprensa. Hoje os relações públicas se revelam como verdadeiros tradutores daquilo que acontece no interior das organizações para a mídia, a fim de que construam uma informação coerente e aprofundada para a sociedade. Bucci (2000, p. 194-5) apresenta a idéia de que a imprensa pode ser dividida historicamente em quatro fases: a primeira chamada de imprensa de opinião, a segunda denominada de imprensa comercial, a terceira, no momento em que surgem os meios de comunicação de massa e transformam o público de consumidores para massa e atualmente o quarto estágio: Estamos vivendo a era das relações públicas generalizadas (ou comunicação generalizada). A gestão da cultura não mais se encontra no interior dos chamados meios de comunicação; os Estados, as grandes e pequenas empresas e as instituições passam a se equipar para promover, por si mesmas, a organização dos conteúdos que, depois, terão a mídia como passagem para então se massificarem. Não que o jornalismo de opinião, a imprensa de massa e os meios de comunicação de massa tenham cessado de existir, mas todos agora existem dentro de um campo maior, no 33
  • 24. qual a hegemonia é exercida pelas relações públicas generalizadas. Os departamentos de relações públicas e as assessorias de imprensa (próprias ou terceirizadas) vão a cada dia assumindo mais o papel de interlocutores oficiais e oficiosos dos jornalistas. E cada vez mais a informação passa por um processo prévio antes de entrar nas redações. A grande maioria dos veículos de comunicação de massa, impressos ou eletrônicos, variando de canais de televisão, jornais, rádios ou internet, nem sempre possuem em sua equipe, profissionais capacitados a versar sobre conhecimentos das mais variadas áreas do saber humano. Assim, quando nos referimos à imprensa, sempre pensamos que esta deveria comportar jornalistas especializados para nos informar sobre assuntos variados, desde uma partida de futebol, até a descoberta da cura do câncer por um laboratório multinacional. Tudo isso, é claro, com o maior rigor de informações, capaz de nos posicionar sobre a nova informação, de tal forma que nos abasteça de dados minuciosos e detalhados. Na era do jornalismo de opinião, ou mesmo da imprensa comercial, as melhores redações possuíam, em seus quadros, jornalistas especializados que eram intelectuais de ponta, capazes de avaliar e julgar técnica e teoricamente cada um dos argumentos que ouviam dos governantes, dos empresários, dos líderes religiosos e dos cientistas. Agora, isso só é possível no interior dos conselhos editoriais de publicações ultra-especializadas, que não pertencem mais ao campo do jornalismo destinado ao grande público, mas ao campo das próprias áreas do conhecimento de que tratam. Na era das relações públicas generalizadas, o saber, além de ter sido privatizado, distanciou-se ainda mais das redações. (BUCCI, 2000, p. 196) Hoje vivemos uma diversidade de conhecimentos em todas as áreas, quais sejam, biológicas, sociais, exatas ou humanas, desencadeando um processo de fragmentação do conhecimento de tal forma que o mundo se apresenta recheado de especialistas de toda ordem, localizados em diversas organizações sociais, cada uma com a sua especificidade. Num dado momento, os veículos menores se abastecem de informações produzidas pelos grandes canais de comunicação, ou seja, os principais jornais do país e do mundo se transformam em agências de notícias para diversos veículos menores ou localizados fora dos grandes centros, mas às vezes só isso não é suficiente, pois, de forma localizada, existe uma necessidade de veiculação/publicação de notícias do próprio estado ou cidade, nem sempre pautadas pelos grandes jornais agenciadores. Neste sentido, as assessorias de comunicação e as assessorias de relações públicas, de diversas organizações têm se mostrado grandes aliadas no abastecimento de informações aos veículos. Com grande freqüência, conseguir transmitir uma nova descoberta, de qualquer área científica, para um público leigo, pode se tornar uma tarefa de Hércules para quem não domina a linguagem científica. Mais que isso, fazer com que um cientista que passa a sua vida no laboratório consiga explicar de forma coloquial sua nova descoberta, adotando uma linguagem jornalística, seria muita pretensão. Assim, os jornalistas especializados se mostram fundamentais para resolver esta equação entre a necessidade da informação científica com a adequação de linguagem para a massa. Importante ressaltar que esse fato não ocorre somente com descobertas científicas, mas no esporte, na educação ou na gastronomia, quando, com não rara freqüência, podemos notar transmissões ao vivo pela televisão ou publicações que ignoram particularidades dos fatos e se transformam em verdadeiros achismos de toda ordem. Para trabalhar este processo de abastecimento de informações aos veículos de comunicação de massa os relações públicas e as assessorias de comunicação das organizações passam a desempenhar a função da não existência de jornalistas especializados em todos os 34
  • 25. veículos de comunicação, conseguindo abastecer a mídia de releases e sugestões de pauta cada vez mais eficientes. A assessoria de comunicação de uma organização através de seus relações públicas pode estar observando o dia-a-dia das descobertas de sua área de atuação na sociedade e identificar aquilo que será importante como informação para toda a população. Por estar diretamente ligada à linguagem do produto que desenvolve e, por conhecer as técnicas da linguagem jornalística, poderá produzir uma verdadeira tradução daquilo que deseja comunicar. Um trabalho em conjunto no qual se beneficiam todos: a imprensa, porque ganha diversos correspondentes científicos – um especialista em cada organismo social; as organizações, porque conquistam um espaço maior nos veículos para mostrar suas atuações e, é claro, a população, pois pode receber informações diversificadas, esclarecedoras e melhor elaboradas. Dentro deste processo, não estou desconsiderando a necessidade de um jornalismo investigativo que chancele a fonte, que apure a verdade das informações e que continue buscando fatos que as organizações podem não estar querendo revelar. Este trabalho não está sendo substituído. Por outro lado, cabe às organizações cumprir o seu papel e usufruir desta possibilidade de estar construindo uma imagem favorável junto aos seus diversos públicos. Minha referência à relação direta entre assessorias de comunicação e relações públicas se fundamenta, principalmente, no fato de que os relações públicas são, entre os demais profissionais da área de comunicação, aqueles que mais apresentam características de gestores da comunicação, administradores e, portanto, os que deveriam integrar a equipe de comunicação de qualquer organização. Principalmente no tocante às questões de formação da opinião pública, ou, formação da opinião dos públicos. Assim, dentro de uma construção de imagem da organização pretendida pelos relações públicas, um ingrediente precioso é o trabalho social, capaz de projetar a organização como amiga da sociedade onde está inserida. Em nenhum outro momento na história das organizações se falou tanto sobre a responsabilidade social de empresas de todos os portes e de qualquer área de atuação. O assunto não é recente, em 1979 Scanlan (p. 52) já escrevia que: A responsabilidade social pode ser definida como uma obrigação da parte da empresa para com a sociedade. Tais obrigações podem ser muito complexas e estão em debate contínuo atualmente. As obrigações podem ser: serviço comunitário e governamental, doações educacionais e filantrópicas ou controle ambiental. As organizações, caracterizadas como unidades sociais deixam de ter como foco somente seu desenvolvimento econômico para atuarem como verdadeiras co-responsáveis pelo crescimento da esfera social em que se encontram, enfatizando o privilégio ao ser humano. Para Way (1983, p.23): Surge a consciência de que uma empresa deve se preocupar com o seu papel social. Uma empresa de grande porte, estável e bastante lucrativa, pode pensar em termos de colaborar com a comunidade, incorporando uma filosofia de relações públicas. Sua responsabilidade social fica expressa na função de produzir utilidades para os públicos e não apenas lucro para os acionistas. 35
  • 26. O trabalho social é importante no sentido de construir uma imagem positiva junto aos diferentes públicos de uma organização; até porque, num país como o Brasil, em que o trabalho de assistência à sociedade, por parte de lideranças governamentais de todas as estâncias, deixa muitas vezes de ser cumprido, o papel de empresas privadas preenche lacunas fundamentais de sobrevivência de toda a comunidade. Essa nova atitude, mais humanista das organizações, gera notícias positivas na construção da imagem da organização. Mais que isso, o trabalho social fez surgir, a partir da década de 80, um novo enfoque das relações públicas a partir de um trabalho comunitário, mostrando que o trabalho de relações públicas não se restringe às empresas e ao governo, mas se estende a qualquer tipo de organização e movimentos sociais. * * * Partimos da idéia de que, da mesma forma que o termo cultura de massa foi substituído por indústria cultural, tendo em vista que a massa não produz cultura, apenas consome os bens simbólicos da mídia, também não existe uma opinião pública no sentido de uma opinião formada pela massa, e sim, colocada para a massa a fim de que essa se manifeste a partir de idéias previamente determinadas. A opinião pública não é a expressão da massa, mas, a visão daqueles que podem ter expressão na massa. A partir de uma exposição de idéias desses grupos, pela mídia, por exemplo, são extraídas da massa as idéias que ela conseguir articular, e recolocadas na mídia como reafirmação daquilo que grupos minoritários e articulados, inclusive no tocante à política, desejam que se acredite ser a opinião de toda a sociedade. Os fatores psicológicos têm interferência na formação da opinião pública. Quando a mídia apresenta uma informação, devemos considerar que a recepção da mensagem sofrerá modificações a partir dos valores pessoais que cada indivíduo possui. Além disso, a sociedade é mutável, inconstante e deve ser considerada pela análise de seu espaço físico e temporal, logo, num país de dimensões continentais como o Brasil, uma mesma mensagem pode sofrer interferências a partir de cada indivíduo, além do caráter regional de interpretação. Os indivíduos possuem necessidade de expressar suas opiniões, mas temem o medo do isolamento do grupo a partir de uma eventual não aceitação de seu posicionamento. A observação constante do meio em que cada um vive torna-o vulnerável à mudança de opinião para adaptação ao grupo em que está inserido socialmente. Além dos meios de comunicação de massa, as organizações sociais são representativas na construção da opinião pública, numa via de mão dupla, também possuem necessidade de se firmarem diante da própria opinião pública, demonstrando constantemente que são partes importantes para o desenvolvimento de toda a sociedade. Isso faz com que as assessorias de comunicação tenham papel fundamental para a construção de imagens positivas das organizações. No próximo capítulo abordaremos as questões dos meios de comunicação de massa e da Sociedade da Informação, mostrando a realidade de um mundo cada vez mais veloz. 36
  • 27. CAPÍTULO III A MÍDIA NA CONSTRUÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA “A Televisão é uma alegoria para os olhos, basicamente para se olhar, não para se participar, ou quando muito participar pelo compartilhamento da visão, nem mesmo para se pensar...” Perry Anderson Heróis e Celebridades – O processo de deslumbramento coletivo na construção do mítico contemporâneo A era contemporânea transformou a sociedade em grandes grupos de consumo de informação e causou modificações fundamentais entre os veículos e seus consumidores. Os diferentes meios de comunicação aprimoraram linguagens específicas, verdadeiros códigos que, independente da mensagem a ser transmitida, seguem determinadas regras que lhes garantem a compreensão desejada. “Embora a televisão também seja utilizada para exibir filmes que foram feitos originalmente para o cinema, ou transmitir espetáculos musicais, consertos e partidas esportivas, não necessariamente concebidos para a tela pequena”, (MACHADO, 2000, p. 26), a TV, o rádio, os veículos impressos, enfim, qualquer meio a ser exemplificado apropriou-se de uma forma lingüística padronizada. Assim, um noticiário, uma novela ou um programa humorístico na TV, mantém as mesmas técnicas de produção, fotografia, efeitos sonoros e colocação de luzes que garantem ao espectador a decodificação imediata. Para que esse processo fique absolutamente claro, é preciso compreender a mutação da civilização contemporânea e entender a primeira grande transformação na ecologia das mídias: a passagem das culturas orais para a cultura da escrita. A escrita abriu um espaço de comunicação desconhecido às sociedades orais e fez com que os atores da comunicação não precisassem mais partilhar da mesma situação para que houvesse troca de mensagens. Muito tempo se passou entre o surgimento da escrita e dos meios de comunicação de massa; porém, essa característica de que as pessoas não precisavam estar no mesmo território geográfico, além de tampouco partilhar das mesmas experiências de vida para compreender mensagens advindas de outros grupos sociais, continuou sendo fundamental para que os veículos de comunicação de massa pudessem se desenvolver. Não podemos esquecer, contudo, que, desta forma, nós não temos garantido que todos os receptores de uma mesma mensagem, localizados em territórios geográficos diferentes, irão compreendê-la da mesma forma. Porém, para que o consumo dos produtos dos meios de comunicação de massa aconteça, isso não é o fundamental; o importante é que todos possam fazer uso da informação, independente se de forma igual ou diferente, adaptada aos valores que previamente já possui. Para efeito de estudo, tomemos os meios de comunicação de massa como um grande grupo social que desenvolve uma forma própria de transmissão de mensagens para os seus públicos, bem como a forma como cada um deles desenvolve suas próprias linguagens. Este ponto de partida pode ser visto como uma grande rede que necessita de todos os seus pontos 37
  • 28. para se complementar, porém de forma tão sutil que não demonstra a interdependência aos seus consumidores. Pelo contrário, cada um dos veículos se mostra único e total. Quando a mídia cria heróis e celebridades, na verdade, ela está disponibilizando para o público os ingredientes fundamentais para o desenvolvimento do imaginário coletivo. A mídia tem consciência de que a fabricação dos seus produtos depende dos anseios do público a fim de que o consumo seja facilitado. Neste contexto, porém, fazemos o seguinte questionamento: esta vontade realmente vem da totalidade da população, ou da parte da população com maior poder crítico e a partir daí é distribuída e massificada para todo o universo de espectadores? É inegável que a mídia trabalha baseada no sentimento da população, porém, da totalidade ou de parte dessa população? A criação dos heróis e das celebridades pela mídia é uma forma de identificação coletiva de personagens vitais para afirmação da coletividade, mais que isso, uma forma de materializar em um personagem o modelo de perfeição e deslumbramento coletivo. Neste sentido, cada grupo social busca na mídia diferentes formas de emoção. A TV, como um dos grandes representantes da mídia, principalmente no Brasil, busca desenvolver em sua programação a reprodução da emoção da coletividade. Hoje é cada vez mais difícil a identificação entre realidade e ficção apresentada pelos meios de comunicação de massa. Neal Gabler, numa citação do historiador Daniel Boorstin, diz que: Os americanos vivem cada vez mais um mundo onde a fantasia é mais real que a realidade”, advertindo que “estamos a ponto de nos tornar o primeiro povo da história a ter sido capaz de fazer suas ilusões tão vívidas, tão convincentes, tão realistas, que podemos até viver nelas. (GABLER, 1999, p.11) O autor nos diz ainda que para eles: A vida estava se transformando num veículo de comunicação por direito próprio, como a televisão, o rádio, a imprensa e o cinema (...), estávamos nos tornando platéia e atores ao mesmo tempo (...), mais complexo e mais fascinante que qualquer outra coisa concebida para os veículos de comunicação convencionais. Em suma, a vida estava se transformando num filme”; (...). É claro que nem todos se deixam hipnotizar. Muitos deploram os efeitos do entretenimento e das celebridades sobre o país, e com certeza há muito o que deplorar. (GABLER, 1999, p.12-5) Se é verdade que nem todos se deixam hipnotizar e atrair por uma forma de vida similar à vida dos meios de comunicação de massa, não são poucos os que lutam para que suas vidas sejam iguais às vividas pelos personagens da TV ou do cinema. Neste processo, mais do que a mídia criar constantemente personagens com os quais a sociedade possa se identificar, a própria sociedade seleciona (das mais variadas formas) celebridades ou heróis que passarão a ser identificados como padrões de comportamento coletivo, em seguida reafirmados pela mídia. O primeiro ingrediente para se tornar um Herói ou uma Celebridade é a conquista da fama. A fama é, de fato, um grande ingrediente de sustentação da mídia atual. A fama parece circunscrever a esfera em que celebridades são produzidas no interior do circuito específico da Indústria Cultural e da Comunicação de Massa, com seus 38
  • 29. rankings, suas auras, suas estratégias simbólicas e suas construções, freqüentemente fugazes, das imagens personalizadas do sucesso. (COELHO, 1999, p. 14) Neste contexto, não nos cabe refletir sobre os efeitos da mídia sobre a sociedade, nem de julgar que todos os consumidores da Indústria Cultural deveriam ler Adorno, mas entender que, no contexto da criação de mitos, celebridades, heróis e pessoas famosas, cientistas sociais, consumidores dos meios de comunicação de massa e celebridades da mídia compartilham uma experiência estratégica comum: a de fazer parte de um mundo absolutamente regido pelos efeitos dos vários produtos da mídia, sendo que cada indivíduo passa a ser um consumidor diferente, extraindo deste processo tudo o que puder, da forma que julgar melhor. A criação de Heróis e Celebridades é fundamental para o desenvolvimento da sociedade contemporânea. O deslumbramento coletivo cria em cada pessoa a certeza de pensar coletivamente e, ao mesmo tempo, desencadeia um sonho de ser o próprio ídolo ou de estar próximo dele de forma particular. Cada fã sonha com um momento íntimo com seu ídolo, até porque isso seria uma forma de conquistar aquilo que todos querem. Numa dicotomia, a existência do ídolo só é possível porque muitos exaltam um mesmo personagem até transformá-lo numa celebridade ou herói, reafirmando a necessidade do coletivo; porém, cada membro do processo coletivo sonha em se separar do grupo para viver uma emoção singular com aquele que precisa do coletivo para se afirmar no grande jogo de celebridade. A ilusão de poder estar compartilhando da vida do ídolo é alimentada freqüentemente pela mídia através de uma exposição da vida íntima das pessoas. Uma realidade não de fato, mas sim uma realidade produzida da intimidade do ídolo é apresentada à sociedade como forma de suprir um desejo coletivo de viver aquilo que não se pode de fato, porém se acredita viver através do único elo entre o sonho e a realidade, ou seja, os próprios meios de comunicação de massa. Neste jogo, a mídia cumpre o seu papel no sentido de continuar alimentando a ilusão do fã. Uma cumplicidade que obriga os meios de comunicação de massa a colocarem o fã na qualidade que ele nunca terá, ou seja, na de pessoa íntima de seu ídolo, por isso continuará fiel à mídia, na certeza de que “ela faz o que pode” para que seu sonho se torne uma realidade. É correto afirmar que “acontecimentos envolvendo aspectos privados, sobretudo dos astros, tendem a se transformar em megaeventos ou passam a ocupar por semanas a fio a opinião pública e o debate político”. (MIRA, 1998, p. 97) Assim, cada vez mais nos vemos conhecedores de detalhes dos personagens da novela, por exemplo, mais do que de pessoas de nossa própria comunidade ou em extremos, até de nossa família. Pensar que os astros da TV fazem parte de nossas vidas, ou mais que isso, que nós fazemos parte da vida deles, faz com que haja uma histeria coletiva em determinados casos, como a morte, por exemplo. Heróis e celebridades carregam em si o estigma da imortalidade, o sonho de qualquer expectador da mídia; porque todos nós somos mortais. É nesse sentido que Bauman afirma que: O ponto crucial da questão é que o conhecimento da mortalidade significa, ao mesmo tempo, o conhecimento da possibilidade de imortalidade. Em conseqüência, não se pode estar ciente da mortalidade sem encarar a inevitabilidade da morte como uma afronta e uma indignidade, e sem pensar nas maneiras de corrigir o erro. Estar ciente da mortalidade significa imaginar a imortalidade, sonhar com a imortalidade, trabalhar com vistas à imortalidade. (1998, p. 191) 39
  • 30. A cada situação de morte de uma Celebridade ou um Herói construído pela mídia, uma chance de um novo espetáculo midiático é desencadeada. O enunciado da mídia busca atingir emocionalmente o público. São closes e big-closes de caixões, velórios, velas a arder, enterros, missas fúnebres, cenas de choros e depoimentos de parentes, amigos e/ou fãs transtornados. O tom de tragédia, a (re)dramatização do acontecimento, tudo em geral é construído nos mínimos detalhes no sentido de mobilizar o telespectador, o leitor e monopolizar a audiência. Para se fixar o acontecimento na memória, a adesão maciça do público é fundamental. (RONDELLI, 2000, p. 207) Toda a cena ganha caráter ainda mais dramático quando pessoas das camadas mais pobres da sociedade se envolvem num processo de identificação com o personagem célebre. As mortes de Ayrton Senna e Lady Diana contêm todas as substâncias necessárias à construção do espetáculo de que a mídia necessita. Ainda que criados com ingredientes diferentes, uma vez que Lady Diana pode ser considerada uma celebridade – um produto criado pela mídia, no mundo pop da mídia, e Ayrton Senna pode ser considerado um herói nacional de um país onde poucas pessoas conseguem se consagrar como um salvador, ambos se caracterizam como personagens perfeitos para o espetáculo da morte criado pela mídia como uma prestação de contas de um enredo que foi sistematicamente narrado pelos meios de comunicação de massa durante um determinado período. É como se a morte fosse o último capítulo de uma novela da vida real, veiculada em escala global. Rondelli, (2000, p.213) chega a narrar a morte da Princesa Diana como um acontecimento social global raro no século XX, comparado somente às duas grandes guerras mundiais e à Declaração Universal dos Direitos do Homem. Um outro ingrediente a se juntar nessa trama da morte dos heróis e das celebridades é a existência em grande escala das biografias na era contemporânea. A nova forma de contar e recontar fatos que parecem pertencer a toda a sociedade faz com que jornalistas adotem os lugares dos historiadores e passem a contar a vida daqueles que fazem e deverão continuar fazendo parte da história da humanidade. A construção biográfica ganha uma dimensão fundamental no mundo contemporâneo. Normalmente as narrativas biográficas veiculadas na mídia ganham um ar de autoria coletiva. Jornalistas, fotógrafos, redatores, revisores, chargistas e cinegrafistas são responsáveis por narrar a vida dos protagonistas dos meios de comunicação de massa, mais que isso, com o poder de contar todo o seu passado heróico, se assim for o caso, ou até assumirem a função de videntes e narrarem as possíveis ações futuras do protagonista, caso a morte não lhe tivesse tirado de cena. BIBLIOGRAFIA 1 Bibliografia de Referência ADORNO, T.W.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1985. 40
  • 31. ANDERSON, P. As origens das pós-modernidades. Rio de Janeiro: Zahar, 1999. ANDRADE, C.T. de S. Administração de controvérsia pública. Revista Brasileira de Produtividade, São Paulo, ano XLVIII, n. 565-566, p. 5-17, mar./abr. 1979. ______. Dicionário profissional de relações públicas e comunicação. São Paulo: Summus, 1996. ARAGÃO, L.M. de C. Razão comunicativa e teoria social crítica em Jurgen Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. ARAÚJO, A.R. Discussão crítica da habilitação jornalismo: desejo e realidade. 2002. 145 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal da Paraíba. BAITELLO JUNIOR, N. Síndrome da Máquina. In: CASTRO, G. de (Coord.). Ensaios de Complexidade. Porto Alegre: Sulina, 2002. p. 103-108. BAPTISTA, M.L.C. Comunicação – trama de desejos e espelhos. Canoas: Ulbra, 1996. BARBERO, J.M. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e Hegemonia. Rio de Janeiro: EdUFRJ, 2001. BARROS FILHO, C. de. Ética na comunicação: da informação ao receptor. São Paulo: Moderna, 1995. BAUMAN, Z. Imortalidade na visão pós-moderna: o mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. p. 190 – 210. BEILLEROT, J. A sociedade pedagógica. Porto: Rés, 1985. BELAU, Angel Faus. La ciência periodística de Otto Groth. Pamplona: Instituto de Navarra, 1968. BERGER, C. A pesquisa em comunicação na América Latina. In: HOHLFELDT, A.; MARTINO, L.C.; FRANÇA, V.V. (Org.). Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 241 – 277. BERLO, D.K. O processo da comunicação: introdução à teoria e à prática. São Paulo: Martins Fontes, 1999. 41