2. O período da ditadura militar foi horrível para qualquer
prática de atividade inteligente, um regime de força que
foi responsável direto e indireto por uma lamentável
desarticulação da vida cultural. Tradicional reduto
militar, o Rio Grande do Sul forneceu 3 dos 5 generais-
presidentes. Apesar de tudo, o movimento tradicionalista
ganha força.
3. Ocorre a caracterização do
homem gaúcho, destituído da
grandeza épica, mas que busca
a dignificação. Uma longa
meditação sobre o velho e
solitário gaúcho, mas com
algum traço quixotesco,
como na obra Crisbal, o
guerreiro (1966) escrito por
Paulo Roberto do Carmo, e
pode ser considerado o
marco da poesia gaúcha.
4. PAULO ROBERTO DO CARMO
- Paulo Roberto do Carmo
nasceu em Porto Alegre, em
1941.
- É poeta, professor e tradutor.
- Tem participado de diversas
antologias coletivas no Brasil
e em Portugal.
5. Anterior a Paulo Roberto do
Carmo em poesia é Carlos
Nejar (1939), que estreia em 1963
com O livro de Sílbon, e segue
a mesma caracterização do
homem gaúcho. Em 1974 Nejar
parece querer inventar uma
metafísica da condição gaúcha,
perspectiva que de alguma
forma parece estar em O poço
do calabouço, e foi além da
dimensão sul-rio-grandense,
serviu como senha
antitotalitária no período da
ditadura.
Metafísica: É um ramo da filosofia que estuda a essência do
mundo.
6. CARLOS NEJAR
- Carlos Nejar, poeta, ficcionista,
crítico, nasceu em Porto Alegre
(RS), em 11 de janeiro de 1939.
- Formou-se, pela PUCRS, em
Ciências Jurídicas e Sociais
(Direito) em 1962.
- Fez exame de Suficiência na
UFSM(RS), tendo sido aprovado
para lecionar Português e
Literatura no 2º ciclo do
magistério estadual.
- Quinto ocupante da cadeira nº 4,
eleito em 24 de novembro de
1988, na sucessão de Vianna
Moog, foi recebido em 9 de
maio de 1989 pelo Acadêmico
Eduardo Portella.
7. DO LIVRO O POÇO DO CALABOUÇO, SEGUE O POEMA CAMARADAGEM
CAMARADAGEM
Ao lado estou da dor.
Impreterivelmente.
A dor e seu combate
é meu recibo.
Restituir para a vida
o que é devido
sem o dote
de ser absorvido.
Lado a lado
na dor.
Quem a concebe
no monte de feno
ou entre as sebes,
cinza lenta no coração,
hora única
junto ao mar
ou no campo,
hora geral
quando a lágrima
for árvore, sino,
viagem?
Lado a lado
na dor.
A passos largos
ou tardos.
8. Outro companheiro de
geração de Nejar foi Armindo
Trevisan (1933), que também
demonstra um interesse pela
metafísica mas não a do
gaúcho. Seu livro de estreia
foi A surpresa do ser (1967),
vindo da tradição católica
culta, Trevisan alia sua
linguagem breve a uma
perspectiva informada da
tradição plástica ocidental,
matéria que de modo
esperado marcou a sua
poesia.
9. ARMINDO TREVISAN
- Armindo Trevisan (Santa Maria RS, 1933).
Formou-se em Teologia no Colégio
Máximo Palotino, em Santa Maria RS, em
1958. Em 1963 tornou-se doutor em
Filosofia em Friburgo (Suíça).
- Seu primeiro livro de poesia, A Surpresa
do Ser, é publicado em 1967. Em 1970
solicita a dispensa dos votos religiosos.
- Em 1986 torna-se professor de pós-
graduação na Universidade Federal do
Rio Grande do Sul.
- Segundo a crítica Regina Zilberman,
Armindo Trevisan "orienta seus versos
para uma temática menos individualista
e mais filosófica, adere à estética
moderna, mas não chega a aderir à
vanguarda concretista que marcou por
algum tempo a produção literária de
autores do centro e do norte do país".
10. POEMA INTEGRANTE DA SÉRIE O LIVRO DOS SALMOS,
ARMINDO TREVISAN
Salmo das Aves do Céu
Olhai as aves do céu:
as águias
descem sobre vossos
cordeiros
e os devoram
os abutres:
limpam vossas estâncias
os pardais:
dilapidam vossas hortas
Aprendei dos lírios do
campo:
não trabalham nem fiam
é ali
que a hóstia mói-se
com o esperma de vosso
suor
e o vinho
rebenta das pedras
Contemplai Salomão:
com todo o seu esplendor
chega (como um de vós)
vestido
com o macacão de garagista
vai morrer crucificado
em vosso relógio-ponto
11. A DÉCADA DE 60 E O AUGE DA BOSSA NOVA
Os anos 60 em geral foram
duros para a poesia, talvez
muito piores do que para os
narradores. Nessa época
entrou em cena uma
novidade cultural: a Bossa
Nova, que era capaz de
reunir o melhor da
tradição lírica com uma
sofisticada elaboração
musical.
Surgem as melhores
vocações artísticas do país
nascidos nos anos de 1940:
Chico Buarque, Caetano
Veloso, Gilberto Gil,
Paulinho da Viola, Roberto
Carlos, Milton Nascimento,
entre vários outros.
12. Porém, no Rio Grande do
Sul não aconteceu esse
fenômeno (Bossa Nova). A
vocação local nesta época
era expressada ou no
samba-canção de Lupcínio,
rock’n’roll, ou numa
síntese que só seria
alcançado em 1980.
Com Nei Lisboa, Bebeto
Alves, Vitor Ramil, Nelson
Coelho de Castro entre
outros. O certo é que aqui
a poesia não teve
concorrência direta.
13. Toda Forma de Poder – Nei Lisboa
Eu presto atenção no que eles dizem,
mas eles não dizem nada
Fidel e Pinochet tiram sarro de você
que não faz nada
E eu começo a achar normal que algum
boçal atire bombas na embaixada
Se tudo passa talvez você passe por
aqui
E me faça esquecer tudo que eu vi
Toda forma de poder é uma forma de
morrer por nada
Toda forma de conduta se transforma
numa luta armada
A história se repete, mas a força deixa a
história mal contada
Se tudo passa talvez você passe por
aqui
E me faça esquecer tudo que eu vi
O fascismo é fascinante, deixa a gente
ignorante e fascinada
É tão fácil ir adiante e esquecer que a
coisa toda tá errada
Eu presto atenção no que eles dizem,
mas eles não dizem nada
Se tudo passa talvez você passe por
14. AQUI NO SUL É APRESENTADA UMA DIVISÃO DE TODA A GERAÇÃO EM DUAS
VERTENTES: LINHAGEM METAFÍSICA E LINHAGEM ENGAJADA.
Na linhagem Metafísica estão
os citados poetas Nejar e
Trevisan, ao lado deles a
interessante experiência do
chamado grupo Matrícula, que
aproximadamente em 1967 lança
autores como Oscar Bertholdo,
e ligavam os temas da
imigração italiana da Serra a
uma vida filosófica.
Componho um vale para dizer
as coisas tranquilas da nostalgia,
construo um vale por desamor,
cadeado sem chave
e nele vamos brincar de
percorrer todas
as direções, reino preparado
desde
a criação do mundo, onde
desprendo
a morte apenas com minhas
forças.
Somos as dores de tanto
Linhagem Metafísica O Exílio - Oscar Bertholdo
15. Já na linhagem engajada tivemos
vários cultores, a começar com
Luiz de Miranda (1945) sempre
ostentando uma voz nerudiana,
quer dizer, ao mesmo tempo
envolvida nos temas do presente
e submetida ao impulso amoroso.
Há também Luiz Coronel (1939) ,
mas recai na aproximação com o
ideário gaúcho identitário, sendo
também letrista de canções de
bastante alcance.
Se uso vincha na testa
é pra ver o mundo mais claro.
Não vendo o mundo por frestas
lhe posso fazer reparos.
Sem cinturão nem guaiaca
me sinto quase sem pêlo.
Quando meu laço desata
sou carretel de novelo.
Da bodega levo um trago
para matar a minha sede.
Meu chapéu de aba quebrada
beija-santo-de-parede.
Atirei as boleadeiras
contra a noite que surgia.
Noite a dentro entre as estrelas
se tornaram três-marias.
Linhagem Engajada Pilcha – Luiz Coronel
16. Há uma eclosão de textos literários que se ocupam de
expor as culturas de identidade (Assis Brasil, Tapajara,
Nejar, entre outros). Mostram um gaúcho que é fantasma
de si mesmo, e que vive uma pálida lembrança da
vivacidade. Isso é demonstração de vida na literatura, em
que as coisas são dramatizadas, pensadas e revividas
simbolicamente.