O documento defende o uso do marxismo-leninismo científico como base para um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento no Brasil. Argumenta que o marxismo-leninismo é a ciência mais rigorosa para analisar a realidade brasileira e traçar estratégias para o progresso do país, indo além de abordagens superficiais. Também critica quem resiste em aplicar plenamente o marxismo-leninismo à realidade concreta brasileira.
1. DA INFUNGIBILIDADE DO MARXISMO-LENINISMO CIENTÍFICO
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Paulo Henrique Schlickmann (Geógrafo e Mestre UFSC)
Roberto César Cunha (Geógrafo UFMA)
Uma nação tem papel importante no mundo, não somente pela sua unidade, sua
soberania, seu povo, e/ou sua história, mas, também, pela capacidade de planejar seu
desenvolvimento, de programar estratégias de progresso e de obter um processo tecnológico.
Como sabemos, historicamente as mudanças que já ocorreram no país não foram por
substituição de classes por outras, mas por mudanças de atitude e de dissidências nos seios
das próprias classes dominantes, perdendo características conservadoras e ganhando
elementos progressistas, sem apagar o caráter burguês. É por isso a necessidade angular de
uma opção consciente por um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento (NPND) baseado
em parâmetros científicos, para conhecermos nossa dinâmica interna e sem muletas teóricas
de outras formações econômicas e sociais. Trata-se de almejar uma mudança de maior
envergadura, como a Independência, a Abolição/República e a Revolução de 1930.
Como Vigotsky demonstra o ser humano não nasce pronto, um NPND também não é
feito da noite para o dia, exige um processo de lapidação crítica, incorporação de conteúdo e
um viés progressista. É necessária vasta discussão e elaboração teórica, investigação rigorosa
do real concreto, infatigabilidade do debate de ideias quebrando cânones enrugados. É preciso
ir além da aparência, que é de fácil sedução, ir à etiologia, na essência. Deve-se romper com
os arraigados vícios ideológicos, com os preconceitos do senso comum, não flertar com a
vaidade e nunca abandonar ideias genuínas. O grande sistema de investigação que deve dar o
pontapé inicial ao NPND é o marxismo-leninismo científico, por carregar em si o
materialismo histórico dialético, que para Althusser, não vai acima das ciências, pois é a
própria teoria da pratica científica.
O marxismo-leninismo é uma posição política, uma posição científica da realidade, o
mais alto rigor científico da verdade. Nesse sentido, refuta-se o popperianismo romantizado
pelos tubos de ensaios, as matematizações ideais abstratas que fogem do real, ou o
dependentismo, gerado por fantasmas que se “envergonhavam” por terem nascido no terceiro
mundo. O marxismo-leninismo científico pode ser um instrumento letal para romper com os
ranços tradicionais do passado, além de ajudar a compreender a formação econômica e social
complexa brasileira. Serve também, como último recurso teórico para se libertar dos “mitos
da onisciência divina ou das profanas religiões dogmáticas” de nossos planejadores,
intelectuais e políticos.
Hoje em dia, se lê por ai que “o marxismo-leninismo representa o sentimento e o
sofrimento dos trabalhadores”, “o marxismo-leninismo é feito por meio de uma forte
disciplina interna, está preparado para todas as formas de luta”. “O marxismo-leninismo é
concepção de aliança da classe operária com o campesinato”, etc. Alguns divagam no
“leninismo contemporâneo” recheado de adjetivações, tão comum nessa fase crítica da pseudo
pós-modernidade. Outros usam o marxismo-leninismo do “Que Fazer?” e de “Esquerdismo,
doença infantil do comunismo”. Isso explica alguma coisa no real?
Gostaríamos de entender o porquê se resiste encarar a obra de maior fôlego de Lênin:
“O Desenvolvimento do Capitalismo na Rússia”? Por que se tem medo de interpretar a
realidade concreta? Por que perdemos tempo em querer transplantar o que Álvaro Cunhal e
Gramsci escreveram sobre seus países para o Brasil? Isso não passa de marxismo-leninismo
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Título idealizado a partir do texto “Da infugibilidade das árvores” publicado na folha de São Paulo em
27/02/1987 por Ignácio Rangel, maior marxista leninista das Américas.
2. de pires. Só através do conhecimento real de nossa formação econômica e social (Brasil)
teremos condições de traçar estratégia e tática para o NPND, sem isso, apenas emascularemos
o marxismo-leninismo científico.
Ora! Na atual ordem das coisas, nada mais fácil do que abandonar a análise de
economia política, em consequência do fascínio academicista em moda. Atualmente, a receita
é tatear outras explicações ecléticas para os fenômenos, parecendo o weberianismo mais
simples. Entendemos que em última instância o econômico, sempre! Em última instância o
marxismo – leninismo é a ciência.
Marxismo-leninismo científico não é realidade virtual, como por exemplo, os pequenos
agricultores, os sem terras e uma maioria que sai em defesa da reforma agrária distribuidora
de microlotes. Estes estão lastreados na pequena propriedade privada da terra, artifício
utilizado pela burguesia no século XVIII. Nada mais falso que essa pretensa argumentação.
Assim como a defesa do cooperativismo e do solidarismo, ambos os aspectos utilizados para
acabar com os restos feudais. Cooperativa não supera o capitalismo, muito pelo contrário, ela
serve para acabar com zonas atrasadas ao capital, e isso que vale.
O marxismo-leninismo científico é saber que o campesinato deixa de existir, se destrói e
é substituído por novos tipos de estabelecimentos rurais (agronegócios), que constituem a
base de uma sociedade dominada pela grande produção capitalista. O marxismo-leninismo
científico não é a defesa irresponsável da quase santa “agricultura familiar”, onde se coloca
lado a lado os pequenos produtores baseados na mais-valia absoluta (alta concentração de
mão de obra, jornadas de trabalho de até 18 horas por dia, baixa produtividade e etc.) com a
empresa familiar, fornecedora e com especialização tecnológica subordinada às grandes
empresas.
O marxismo-leninismo científico é aquele que estuda a circulação ampliada do capital
na agricultura, é aquele que estuda as engenharias financeiras e as políticas de crédito da
produção do campo dos pequenos, médios e grandes produtores. Para isso utiliza-se como
aporte, as cooperativas capitalizadas, mas não tendo nelas o alardeado neo-socialismo. O que
dizer das cooperativas capitalizadas do Oeste de Santa Catarina que dinamizaram a vida rural
arcaica, e que hoje compõem grandes cotas exportadoras do país?
Basta analisar a pujança das pequenas produções mercantis, que carregavam o germe da
melhoria de vida ao camponês, e que hoje está apto para entender e lutar contra as
contradições do capital. Marxismo-leninismo para o NPND deve levar em consideração as
dinâmicas diferenciais de desenvolvimento das áreas de latifúndio e da pequena produção.
Entender que ambas transitam no capitalismo e carregam o germe do desenvolvimento,
superando a miséria e gerando uma estrutura dinâmica, com uma classe possivelmente
progressista na nação. Trata-se da superação do trabalho braçal familiar intensivo, da
“domesticação” e racionalização da natureza, da compreensão do movimento da burguesia e
de sua técnica de dominação, para compor na prática o planejamento voltado para o Brasil.
No Maranhão, por exemplo, o marxismo-leninismo científico não é o anti-sarneysismo,
um simbolismo da incompreensão da origem das relações sociais de produção e da formação
econômica e social. O mainstream político e acadêmico fala abertamente que isso se reduz o
antagonismo de classe no Maranhão e que essa é a tradição. O marxismo-leninismo científico
é saber a gênese e o desenvolvimento de ocupação do estado para entender o caráter
progressista dos agronegócios do Sul do Maranhão, que representará o fim das reminiscências
feudais e da oligarquia retrógrada. É saber como: a Balaiada (levantamento de cafuzos,
crioulos, mulatos e pretos, de vaqueiros e agricultores, de escravos fugidos e soldados
desertores, de bandidos e vagabundos, sem uma figura maior que os chefiassem, sem um
único elemento de clero, da nobreza, da burguesia, da oficialidade de linha, da magistratura,
do funcionalismo, à sua frente); a República de Pastos Bons; e a Revolta de Bequimão,
ajudaram nas raízes do nacionalismo brasileiro e no caráter revolucionário da industrialização
de Getúlio Vargas.
3. O marxismo-leninismo científico é estudar a pequena produção mercantil, a
dinamicidade de nossa industrialização, para saber como nosso desenvolvimento econômico
nacional foi dependente máximo de substituição de importações. É entender como de ¨cada
volta do parafuso¨, pouco a pouco se construiu nosso poderoso departamento I da economia.
É estudar como que nas fases A (fase expansiva) do ciclo longo (ciclos de Kondratiev), o país
e sua economia rompiam com o relativo atraso perante o centro dinâmico do capitalismo.
Além de entender que, devido nossa produção ser voltada para as exportações, nas fases B
(fase depressiva), em consequência da crise de demanda pelo centro dinâmico, houve a
obrigação de se fazer força com a substituição de importações, o que representou crescimento
na crise. Assim, historicamente, nossa industrialização segue, e no meio dessa característica,
os serviços de utilidade pública, (infraestrutura urbana, transportes, energia, etc) aparecem
hoje, como os possíveis motores da base produtiva e da assimilação tecnológica. Pois como
dizia Marx nenhuma produção é possível sem trabalho passado e acumulado.
O marxismo-leninismo científico não é ser contra as concessões de serviços de utilidade
pública para empresas privadas, sem saber origem desses serviços e o porquê do
estrangulamento: o esgotamento da capacidade de endividamento do país. O leilão de libras,
por exemplo, uma gigantesca oportunidade de investimentos, pode representar assimilação
técnica sem precedente para o país, além da articulação estratégica com o centro dinâmico do
capitalismo e com o centro dinâmico do comunismo. O marxismo-leninismo científico quer
saber como atualmente, os serviços e a incorporação de tecnologia, são os pontos de
estrangulamento de nossa economia.
É mister no Brasil concessões dos serviços de utilidade pública a empresas privadas,
pois, esses setores (portos, estradas, ferrovias, aeroportos, linhas de metrô, transporte coletivo,
nas cidades) são subinvestidos e acarretam prejuízo da montante a jusante de todos os setores
produtivos, e as consequências são os estrangulamentos. Essas concessões devem ser lincadas
com uma política macroeconômica desenvolvimentista, que favoreça um efeito multiplicador
em todos os setores da economia brasileira. Favorecerá, em última instância a geração de
emprego nas indústrias de bens de capital, e consequentemente nas de bens de consumo,
resultando no maior poder de compra da classe dos trabalhadores como um todo.
Por fim, um NPND lastreado no marxismo-leninismo científico é conceder parques e
praças (de árvores podres, velhas e feias) das grandes e médias cidades à iniciativa privada
para construção de estacionamentos subterrâneos e em cima refazer um paisagismo moderno
e sofisticado à la Burle Marx (RANGEL, 1987). É pensar grande, é estudar com largueza para
não sermos profetas de panaceia anticientífica, antiprogressista, antinacional e antipopular.
É imprescindível para um NPND o desapego dos automatismos de linguagem e
voluntarismo estéril. Sabe-se que o hábito não basta para fazer o monge. Ignácio Rangel foi
um dos poucos que não temeu a infungibilidade do marxismo-leninismo científico, pois não
teve medo do cadafalso da história, e desvendou, no seu tempo, esse organismo vivo chamado
Brasil (a dualidade básica da economia brasileira, a inflação brasileira, questão agrária, a
capacidade ociosa, etc.).
Como disse Danton a caminho do cadafalso “é melhor ser guilhotinado do que
guilhotinar”. Quem estará disposto à enfrentar infungibilidade do marxismo-leninismo
científico, uma vez que a história é implacável no encalço do progresso?
Referência:
RANGEL, Ignácio: Da infugibilidade
Tendências/Debates. São Paulo, 27 Fev. 1987.
das
arvores.
Folha
de
São
Paulo.