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Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz




  Mestrado Integrado em Medicina Dentária



Disfunção Temporomandibular:
      Técnicas Cirúrgicas de
               Tratamento

 Candidatura ao Grau de Mestre em Medicina Dentária



       Orientador: Prof. Doutor Paulo Maurício
           Candidata: Ana Pacheco Afonso




          Monte de Caparica, Setembro de 2009
Agradecimentos




Ao Professor Doutor Paulo Maurício, orientador deste trabalho, não só pela
dedicação, disponibilidade e confiança, mas pelas críticas e sugestões relevantes,
fundamentais para a sua elaboração. Agradeço, igualmente, a atenção com que
sempre acompanhou o meu percurso académico.


Ao Dr. André Almeida, com quem dei os primeiros passos nesta área, pela amizade,
disponibilidade e ajuda incondicionais, com que sempre pude contar, e também pelos
seus sábios conselhos, recomendações e contagioso entusiasmo.


Ao Dr. João Rua, Dr. João Coelho, Dra. Catarina Carvalho e Dra. Eunice Neutel, por
todos os longos dias que passámos juntos, durante mais um ano lectivo, que me
fizeram crescer como pessoa e profissional.


Ao Dr. João Gonçalves, pela enorme ajuda, valiosa paciência e compreensão perante
as dificuldades, mas sobretudo, pela grande amizade.


À minha família, por me incutirem o interesse pelo estudo, mas, especialmente à
minha Mãe, a quem devo todo este percurso. Agradeço-lhe por nunca me deixar
desistir e por exigir que, ao longo da minha vida, eu faça sempre mais e melhor.


Ao Duarte e ao Duda, por todo o apoio, pela compreensão, tolerância e ternura que
manifestaram, pela ajuda e motivação, pela companhia, enfim… por tudo!


A todos os amigos muito obrigado, porque nenhum caminho é longo demais quando
os amigos nos acompanham…




                                          2
Resumo


A disfunção temporomandibular (DTM) é uma patologia de etiologia multifactorial,
classificada como disfunção músculo-esquelética com envolvimento da articulação
temporomandibular (ATM), músculos mastigadores e estruturas adjacentes. Os sinais
e sintomas associados incluem dor severa, disfunção e ruídos articulares.
Este trabalho tem por objectivo realizar uma revisão da literatura disponível acerca
deste problema, bem como apresentar as diferentes opções terapêuticas descritas para
a sua resolução, comparando-as e avaliando a sua taxa de sucesso. Os resultados
demonstram que a artrocentese se apresenta como uma modalidade terapêutica
simples e eficaz. Apesar de não alterar a posição discal, melhora significativamente a
dor e promove o aumento da mobilidade mandibular. Por outro lado, a cirurgia
artroscópica apresenta, também, resultados satisfatórios na redução de sinais e
sintomas relacionados com DTM. No entanto, a literatura parece ser consensual na
abordagem das diferentes opções terapêuticas existentes, relegando para última
opção as intervenções de natureza cirúrgica, por considerar que estas apenas devem
ser contempladas quando o tratamento conservador não demonstrar eficácia na
resolução do problema.




Palavras – Chave


Articulação Temporomandibular; Disfunção Temporomandibular; Modalidades de
tratamento; Cirurgia




                                          3
Abstract


The temporomandibular disorder (DTM) is a disease with multifactorial etiologies,
classified   as   a   musculoskeletical     affection   with    involvement     of   the
temporomandibular joint (TMJ), the masticatory muscles and adjacent structures.
The signs and symptoms include severe pain, dysfunction and articular sounds. The
aim of this work is to review the available literature on this problem, and to describe
the different therapeutic approaches for its resolution, comparing them and valuating
their rate of success. The results show that the arthrocentesis is a simple and efficient
treatment approach. Despite of not changing the disk position, it improves
significantly the pain and improves the range of motion. On the other hand, the
arthroscopic surgery shows, as well, satisfactory results on the reduction of both
signs and symptoms DTM related. However, it seems to be consensual that, from the
several treatment options, the surgical approaches must be relegated to the last
option, considering that these must only be contemplated when the non-invasive
approach is not successful in the resolution of the problem.




Key-Words


Temporomandibular Joint, Temporomandibular Joint Dysfunction; Treatment
Modalities, Surgery




                                           4
Índice


I. Introdução                                                                      10
II. Desenvolvimento                                                                12
1. ArticulaçãoTemporomandibular                                                    12
       1.1 Anatomia da Articulação Temporomandibular                               12
                1.1.1 Superfícies Articulares                                      12
                1.1.2 Disco Articular                                              13
                1.1.3 Meios de União                                               15
                1.1.4 Sinoviais                                                    15
                1.1.5 Tecidos Retrodiscais                                         16
                1.1.6 Vascularização e Inervação                                   16
       1.2 Músculos Mastigatórios                                                  17
       1.3 Biomecânica da Articulação Temporomandibular                            20
2. Disfunção da Articulação Temporomandibular                                      22
       2.1 Definição                                                               22
       2.2 Epidemiologia                                                           23
       2.3 Etiologia                                                               25
                2.3.1 Factores Anatómicos                                          25
                2.3.2 Trauma                                                       26
                2.3.3 Factores Patofisiológicos                                    27
                2.3.4 Factores Psicossociais                                       27
       2.4 Critérios de Diagnóstico                                                28
       2.5 Disfunção da Articulação Temporomandibular                              30
                2.5.1 Disfunção por Desarmonia Discal                              31
                       2.5.1.1 Luxação Discal com Redução                          33
                       2.5.1.2 Luxação Discal sem Redução                          34
                2.5.2 Disfunções Inflamatórias da Articulação                      35
                       2.5.2.1 Sinuvite / Capsulite / Retrodiscite                 35
                       2.5.2.2 Osteoartrite                                        35
                2.5.3 Anquilose                                                    36
                2.5.4 Incompatibilidades Estruturais das Superfícies Articulares   36
                       2.5.4.1 Alterações morfológicas                             36



                                               5
2.5.4.2 Aderências e Adesões                  36
       2.6 Tratamentos de Disfunção Temporomandibular                 37
                2.6.1 Tratamentos Conservadores ou Reversíveis        38
                        2.6.1.1 Educação e Auto-controlo              38
                        2.6.1.2 Terapia Farmacológica                 38
                        2.6.1.3 Terapia Física                        39
                        2.6.1.4 Goteiras                              39
                2.6.2 Tratamentos não conservadores                   40
                        2.6.2.1 Terapia Oclusal                       40
                        2.6.2.2 Tratamentos Cirúrgicos                41
3. Técnicas Cirúrgicas de Tratamento de Disfunção Temporomandibular   42
       3.1 Indicações                                                 42
       3.2 Técnicas Cirúrgicas                                        43
                3.2.1 Artrocentese                                    44
                3.2.2 Artroscopia                                     48
                3.2.3 Artrotomia                                      54
                        3.2.3.1 Reposicionamento Discal               56
                        3.2.3.2 Discectomia                           57
IV. Conclusão                                                         60
V. Bibliografia                                                       63




                                              6
Índice de Figuras


Figura 1 – Estruturas ósseas da ATM, vista sagital;                         13


Figura 2 – Côndilo Articular;                                               13


Figura 3 – Articulação Temporomandibular. Diagrama representativo dos
                                                                            14
diferentes componentes anatómicos;


Figura 4 – Relação entre estruturas nervosas, vasos sanguíneos e músculos
                                                                            17
suprahióideus;


Figura 5 – Músculo Temporal;                                                18


Figura 6 – Músculo Masséter;                                                18


Figura 7 – Músculo Pterigóideu Lateral;                                     19


Figura 8 – Músculo Pterigóideu Medial;                                      19


Figura 9 – Músculo Digástrico;                                              20


Figura 10 - Esquema representativo da função articular normal durante o
                                                                            22
movimento de abertura e encerramento mandibular;


Figura 11 – Luxação Discal com Redução;                                     33


Figura 12 – Luxação Discal sem Redução;                                     34


Figura 13 - Artrocentese da Articulação Temporomandibular                   45


Figura 14 – Artroscopia da Articulação Temporomandibular;                   49


Figura 15 – Cirurgia aberta funcional da ATM;                               55




                                           7
Índice de Tabelas




Tabela 1 – Estudo comparativo sobre a prevalência de Sinais e Sintomas de
DTM, Okeson;                                                                 24


Tabela 2 – IHS 11: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção do crânio,
nariz, olhos, ouvidos, seios perinasais, dentes, cavidade oral ou outras
estruturas cranianas;                                                        29


Tabela 3 - Modificação da classificação diagnóstica recomendada para a
IHS 11.7.1: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção da ATM;             29


Tabela 4 - Classificação de Wilkes para os desarranjos internos da ATM;      31




                                         8
Lista de Siglas




ATM - Articulação Temporomandibular;


DTM - Disfunção Temporomandibular;


IHS – International Headache Society;


AAOP – American Academy of Orofacial Pain;


RDC/TMD – Research Diagnostic Criteria of Temporomandibular Disorders;


ADA – American Dental Association;


AI E – Anti-inflamatórios Não Esteróides;


RM – Ressonância Magnética Nuclear;


EEG – Estimulação electrogalvânica;


TE S – Estimulação Nervosa Eléctrica Transcutânea;


GAG – Glicosaminoglicanos;




                                        9
I. Introdução


O sistema mastigatório é a unidade funcional do organismo que, fundamentalmente,
se encarrega da mastigação, fala e deglutição. É extremamente complexo e muito
sofisticado, formado sobretudo por ossos, músculos, ligamentos e dentes, controlados
por um sistema neurológico altamente especializado.1 O conhecimento profundo da
anatomia, fisiologia e biomecânica da articulação temporomandibular (ATM) é
fundamental para compreender em detalhe o fenómeno da oclusão, permitindo
entender como a ATM normal e saudável se comporta, possibilitando ainda
diagnosticar os problemas existentes quando o sistema articular não funciona
devidamente.2 Em suma, deve conhecer-se a função para compreender a disfunção. 1


A disfunção temporomandibular (DTM) é uma patologia de etiologia multifactorial,
com uma elevada taxa de incidência, que se define como um conjunto de condições
caracterizadas pela presença de dor na articulação e estruturas circundantes,
limitações funcionais da mandíbula e / ou ruídos durante a função mandibular.3 A
DTM afecta milhões de pacientes em todo o mundo.4 Para a tratar eficazmente torna-
se indispensável conhecer, com detalhe, as diferentes alterações articulares e
musculares, que podem estar na sua origem, bem como a variedade de factores
etiológicos conhecidos: factores anatómicos; trauma; factores patofisiológicos;
factores psicossociais.1 O diagnóstico é obtido através de uma avaliação cuidadosa da
informação procedente da história clínica e dos métodos de exploração.


O presente trabalho pretende estudar e compreender a problemática desta patologia.
Para atingir o objectivo, esta dissertação encontra-se dividida em três partes distintas.
A primeira parte dedica-se ao estudo das diferentes estruturas anatómicas envolvidas,
essenciais para a compreensão da disfunção articular. A segunda e terceira partes
incidem nos aspectos clínicos da DTM e apresentam as diversas opções terapêuticas
preconizadas para a sua resolução, abordando com maior profundidade as diferentes
técnicas cirúrgicas descritas na literatura, comparando-as entre si, de forma a poder
retirar conclusões quanto às suas indicações específicas, avaliação de resultados
clínicos e critérios determinantes para o seu sucesso.




                                           10
As   estruturas   anatómicas    envolvidas    na disfunção   temporomandibular,     e
responsáveis pela biomecânica da ATM, incluem as superfícies articulares dos ossos
temporal e mandíbula, disco articular, meios de união constituídos pela cápsula
articular, ligamentos de reforço e acessórios, sinoviais e tecidos retrodiscais, e os
músculos responsáveis pelo controlo do movimento mandibular. As alterações
estruturais que podem ocorrer a nível anatómico consideram-se factores
predisponentes à ocorrência de DTM. Deve também ser considerado todo o sistema
vascular e nervoso da ATM, pois algumas das técnicas cirúrgicas descritas
apresentam como possível complicação a lesão destas estruturas nobres.


A ausência de um sistema de critérios de diagnóstico padronizado e unanimemente
aceite para a caracterização da disfunção temporomandibular conduziu a que vários
autores e instituições tais como, Welden Bell (1960), Farrar (1972), Block (1980),
International Headache Society (IHS) (1988), entre outros, desenvolvessem sistemas
de classificação de DTM. Actualmente, os sistemas propostos pela American
Academy of Orofacial Pain (AAOP) em 1996, com actualização em 2008, e pelo
Research Diagnostic Criteria of Temporomandibular Disorders (RDC/TMD),
através de Samuel Dworkin e Linda LeResche em 1992, são os mais referenciados na
literatura, promovendo novas linhas de orientação para um correcto diagnóstico e
comunicação entre clínicos e investigadores.3


A modificação dos critérios da IHS para a cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção
temporomandibular, proposta pela AAOP em 2008, permite diagnosticar diferentes
patologias articulares dividindo-as em função dos sintomas comuns e subdividindo-
as de acordo com a estrutura articular afectada. As diferentes disfunções da ATM
requerem abordagens terapêuticas, conservadoras ou não conservadoras, que
variariam dentro de um amplo espectro de tratamentos, incluindo diferentes técnicas
cirúrgicas, para a sua correcção.4




                                         11
II. Desenvolvimento


1. Articulação Temporomandibular


A articulação temporomandibular refere-se à articulação entre a mandíbula e o osso
temporal, que se classifica como bicondilomeniscartrose conjugada,5 sendo
constituída pelas superfícies articulares, côndilo mandibular e cavidade glenóide do
temporal, com interposição de um disco fribrocartilaginoso, o disco articular.1


1.1. Anatomia da Articulação Temporomandibular


Anatomicamente distinguem-se as superfícies articulares, disco articular, meios de
união, sinovial, tecidos retrodiscais, estruturas vasculares e nervosas.1,6,7


1.1.1 Superfícies Articulares


Diferente, em composição e desenvolvimento, de todas as outras articulações, a
superfície articular da ATM é coberta por fibrocartilagem, conferindo-lhe maior
resistência às forças oclusais e de movimento, sendo menos susceptíveis aos efeitos
da idade, o que se traduz numa menor probabilidade de ruptura ao longo do tempo e
numa maior capacidade de regeneração.7,8


A superfície articular do temporal é constituída pelo côndilo do temporal (vide Fig.1)
ou eminência articular, também denominada raiz transversa da apófise zigomática, e
pela cavidade glenóide. A eminência articular apresenta-se convexa da frente para
trás e ligeiramente côncava de fora para dentro.5 O grau de convexidade
anteroposterior desta superfície articular, bastante variável, condiciona o trajecto do
complexo côndilo-disco durante o movimento de translação da mandíbula, tendo sido
referida por autores como Cardoso et al (2005), como um dos factores etiológicos de
hipermobilidade articular.9




                                            12
Figura 1 – Estruturas ósseas da ATM, vista sagital. FM – Cavidade Glenóide; EA – Eminência Articular;
Okeson, 2003;

O côndilo da mandíbula (vide Fig.2) constitui a superfície articular mandibular,
sendo descrito como uma superfície elíptica em que podem ser observadas duas
projecções denominados pólos, um lateral e outro medial, habitualmente mais
proeminente. A verdadeira superfície articular abrange a zona superior do côndilo,
como se observa na Fig. 2.5




Figura 2 – Côndilo Articular. A – Imagem anterior; B – Imagem posterior; A linha marcada delimita
a superfície articular (Okeson, 2003)


1.1.2 Disco Articular


O disco articular é a estrutura fibrocartilagínea responsável pela correcta adaptação
entre as superfícies articulares, apresentando uma forma elíptica adequada à
interposição entre as estruturas ósseas mandibular e temporal,5 formado por tecido
conjuntivo fibroso desprovido de vasos sanguíneos ou fibras nervosas.1
Quando observado no plano sagital, é possível verificar que a espessura do disco
varia, aumentando do centro para a periferia. A área central, denominada zona



                                                13
intermédia, é, numa situação normal, ocupada pelo côndilo, apresentando uma
espessura mínima, que aumenta significativamente no sentido anteroposterior, ainda
que o bordo posterior se apresente, normalmente, mais espesso que o bordo anterior.1
Numa observação frontal é possível verificar a existência de um espaço medial, entre
o côndilo e a cavidade glenóide, mais amplo, ocupado pelo bordo medial do disco,
também mais espesso que o bordo lateral.1 A morfologia desta estrutura, além da sua
capacidade de flexão, permite a sua adaptação às exigências funcionais, excepto
quando é submetida a forças não fisiológicas e destrutivas ou alterações estruturais
da própria articulação.1


A estabilidade do disco articular é garantida pelas estruturas às quais se encontra
unido, tais como os tecidos retrodiscais na região posterior, cápsula articular, na
região superior, inferior e anterior, e fibras tendinosas do músculo pterigóideu lateral,
na região anterior.1 (vide Fig. 3)




Figura 3 – Articulação Temporomandibular. Diagrama representativo dos diferentes componentes
anatómicos. CI – Cavidade articular inferior; CS – Cavidade articular superior; LCA – Ligamento
Capsular Anterior (Cápsula Articular Anterior); LRI – Lamina Retrodiscal Inferior; LRS – Lamina
Retrodiscal Superior; PLI – Musculo Pterigóideu Lateral Inferior; PLS – Musculo Pterigóideu Lateral
Superior; SA – Superfície Articular; TR – Tecidos Retrodiscais; (Okeson, 2003)




                                                14
1.1.3 Meios de União


Como foi referido anteriormente, as superfícies articulares mantêm-se numa posição
estável devido à presença da cápsula articular, que envolve toda a articulação,
reforçada por dois ligamentos, lateral e medial,5 que, como em qualquer outro
sistema articular, desempenham um papel importante na protecção das estruturas,
não desenvolvendo uma função activa, mas pelo contrário, constituindo um
mecanismo de limitação passiva ao movimento articular.1 Os ligamentos são
compostos por tecido conjuntivo colagenoso, não distensível, excepto em situação
patológica, alterando a sua capacidade funcional, e consequentemente, a função
articular. 1


A cápsula articular, capaz de opor resistência a forças nocivas à ATM, adere ao disco
interarticular em toda a sua extensão, através de fibras longas superficiais que se
estendem do temporal à mandíbula, e de fibras curtas responsáveis pela união das
estruturas ósseas ao disco, promovendo a divisão da cavidade articular em duas
porções, uma temporomeniscal, e outra meniscomandibular, capazes de reter o
liquido sinovial essencial ao bom funcionamento da articulação.5


Os ligamentos acessórios, ligamento esfenomandibular, estilomandibular e
pterigomandibular, apenas contribuem para a manutenção da posição das superfícies
articulares de forma indirecta.1,5


1.1.4 Sinoviais


O disco interarticular, unido à cápsula articular, divide a cavidade articular em duas
porções, pelo que podemos considerar duas sinoviais distintas, uma superior, entre o
temporal e o disco, e uma inferior, entre o disco e o côndilo da mandíbula.5


As superfícies internas das cavidades estão rodeadas por células endoteliais
especializadas que formam um revestimento sinovial que, em conjunto com uma
franja sinovial especializada, situada no bordo anterior dos tecidos retrodiscais,
produz o líquido sinovial, que preenche ambas as cavidades articulares. Este líquido
sinovial tem duas finalidades, dado que as superfícies da articulação são avasculares


                                          15
o liquido sinovial actua como meio para o aporte das necessidades metabólicas
destes tecidos, actuando também como lubrificante entre as superfícies articulares
durante a sua função.1


1.1.5 Tecidos Retrodiscais


A porção posterior da ATM é constituída por uma zona denominada zona bilaminar,
formadas por duas lâminas, superior e inferior, entre as quais se encontra o genu
vasculosum com numerosos vasos, nervos e tecido adiposo. O estrato superior,
responsável pelo movimento de recolhimento do disco articular, especialmente na
fase inicial de encerramento mandibular, é composto por uma rede de fibras elásticas
e colegeneas, tecido adiposo e vasos sanguíneos. Em contraste, o estrato inferior,
uma das estruturas responsáveis pela estabilização do disco articular sobre o côndilo,
é composto por finas fibras colageneas, pobremente organizadas.7
Segundo Schumolke, existem ainda algumas questões, relacionadas com a anatomia
da ATM, que não se encontram ainda completamente esclarecidas, podendo,
consequentemente, limitar a compreensão de mecanismos de funcionamento
articular.10


1.1.6 Vascularização e Inervação


A irrigação sanguínea da ATM encontra-se mantida pelos diferentes vasos que a
rodeiam, predominantemente pela artéria temporal superficial, artéria meníngea
média e artéria maxilar interna, mas também pela artérias auricular profunda,
timpânica, anterior faríngea ascendente, e artéria alveolar inferior, sendo a última
responsável pelo aporte sanguíneo do côndilo mandibular através dos espaços
medulares, tal como os pequenos vasos que se situam directamente na zona
condilar.1,5,6,7


A inervação sensitiva e motora da ATM, tal como dos músculos que a controlam, é
assegurada pelo nervo trigémio, nervo auriculotemporal, masséter e temporal
profundo.1,5,6,7,11 (vide Fig. 4) O conhecimento destas estruturas é de extrema
importância, pois a sua lesão é umas das principais complicações decorrentes de
qualquer procedimento terapêutico invasivo na ATM.


                                         16
Figura 4 – Relação entre estruturas nervosas, vasos sanguíneos e músculos suprahioideus (Moore,
2002)




1.2 Músculos da Mastigação


A união de todos os componentes ósseos do corpo é da responsabilidade do sistema
muscular, sendo o grupo de interesse do presente trabalho, o dos músculos
mastigadores, no qual estão incluídos o temporal, masséter, pterigóideu lateral e
medial, que representam estruturas de extrema importância no estudo de DTM, pois
são constituintes do complexo articular, e consequentemente são sujeitos a ser alvo
de disfunção.1,5,6


O músculo temporal, grande, plano e radiado, ocupa a fossa temporal, desde onde os
seus três feixes distintos, diferenciados com base na orientação das fibras em
anterior, médio e posterior, convergem ate à apófise coronóide da mandíbula,
cobertos por uma fáscia muscular. (vide Fig.5) A contracção simultânea dos três
feixes musculares promove a elevação da mandíbula, como somatório da acção
independente de cada um dos feixes, dado que a contracção porção anterior apenas
promove a elevação da mandíbula, o feixe médio, quando contraído, provoca
retrusão e o posterior tem acção em ambos os movimentos. 1,5,6




                                              17
Figura 5 – Musculo Temporal. A. PA – Porção Anterior; PM – Porção Média; PP – Porção
Posterior; B. Função: Elevação da Mandíbula (Okeson, 2003)


O músculo masséter é um músculo curto, grosso e rectangular, também constituído
por dois feixes, superior e profundo, que estende desde o arco zigomático à face
lateral do ramo da mandíbula, sendo um dos músculos com função de elevação da
mandíbula, ainda que a contracção da sua porção superficial possa facilitar a
protrusão mandibular.1,5,6 (vide Fig.6)




Figura 6 – Musculo Masséter. A. PP – Porção Profunda; PS – Porção Superior; B. Função: Elevação
da mandíbula (Okeson, 2003)


O pterigóideu lateral é um músculo curto, grosso, aplanado transversalmente, e está
situado na região infratemporal, estendendo-se desde a apófise pterigoideia ao colo
do côndilo da mandíbula, (vide Fig.7) dividindo-se em dois fascículos, cuja
contracção simultânea bilateral, e acompanhada da contracção dos músculos
depressores da mandíbula promove o movimento de translação mandibular
acompanhado de protrusão da mesma, enquanto a sua contracção unilateral origina
um movimento de lateralidade da mandíbula para o lado contrário. No entanto o



                                              18
feixe superior do pterigóideu lateral, que se encontra unido ao disco articular,
anteriormente, só actua simultaneamente com os músculos elevadores, sendo muito
activo no encerramento forçado ou contra uma resistência. É de salientar que
aproximadamente oitenta por cento das fibras deste músculo são fibras lentas, o que
significa que são relativamente resistentes à fadiga e portanto têm capacidade de
suportar o côndilo articular numa posição estável durante longos períodos de
tempo.1,5,6




Figura 7 – Músculo Pterigóideu Lateral. A – Feixe superior e inferior do Musculo Pterigóideu
Lateral; B - Função: protrusão mandibular (Okeson, 2003)


O músculo pterigóideu medial é um músculo grosso e quadrilátero, medial ao
pterigóideu lateral, que se estende obliquamente, desde a fossa pterigoideia à face
medial do ângulo da mandíbula. (vide Fig.8) A contracção simultânea das suas fibras
promovem a elevação da mandíbula, embora apresente também actividade no
movimento de protrusão. 1,6




 Figura 8 – A - Músculo Pterigóideu Medial; B – Função: Elevação da Mandíbula (Okeson, 2003)




                                             19
Apesar de, geralmente, não ser considerado músculo da mastigação, o músculo
digástrico detém uma importante influência na função mandibular, sendo responsável
pelos movimentos necessários à deglutição. É uma estrutura alongada, formada por
dois ventres, um anterior e outro posterior, unidos por um tendão intermédio que se
localiza na parte superior e lateral do pescoço estendendo-se ao osso hióide, desde a
região mastóideia até às proximidades da sínfise mandibular. (vide Fig.9)
Quando a sua contracção simultânea ocorre com o osso hióide fixo pelos músculos
supra e infrahioideus, a mandíbula desce e é tracionada para trás ocorrendo abertura
mandibular, mas quando a mandíbula esta estável, os músculos digástricos e os
músculos infra e suprahióideus elevam o osso hióide.1,5,6




     Figura 9 – A - Musculo Digástrico; B – Função: Depressão Mandibular (Okeson, 2003)



1.3 Biomecânica da Articulação Temporomandibular


A complexidade deste sistema articular decorre do facto de duas articulações se
encontrem conectadas, impondo que cada articulação exerça a sua função combinada
e simultaneamente, com a articulação contralateral, assumindo movimentos de
rotação e translação tridimensionais, inter-relacionados.1,2


A estrutura anatómica e a função da ATM incluem dois sistemas articulares distintos:
o sistema formado pelo côndilo mandibular e disco, também denominado complexo
côndilo-discal, decorrente da forte união do disco ao côndilo mandibular, através dos
ligamentos de reforço, que apenas possibilita o movimento de rotação entre estas
superfícies; e o sistema formado pelo complexo côndilo-discal em relação à



                                            20
superfície da cavidade glenóide no qual ocorre um livre movimento de deslocamento
anterior do côndilo, na cavidade superior, denominado de translação.1


Para que as superfícies articulares se mantenham em contacto, e não se perda a
estabilidade da articulação é necessária uma constante actividade muscular,
principalmente dos músculos elevadores da mandíbula. Assim, mesmo numa
situação de repouso, os músculos elevadores da mandíbula devem manter um estado
de leve contracção denominado tonús muscular.1 O aumento do tonús muscular
promove o contacto progressivo do côndilo contra o disco, e deste contra a cavidade
glenóide, aumentando assim a pressão interarticular das estruturas, assegurando uma
função articular estável, com o côndilo devidamente entreposto numa posição
central.10,11 O mecanismo pela qual esta posição é mantida durante os movimentos
articulares baseia-se na morfologia do disco e no aumento da pressão interarticular e
consequente redução do espaço discal.1


Já os tecidos retrodiscais, aderidos ao bordo posterior do disco articular, também
sofrem alterações aquando do movimento mandibular. A lâmina retrodiscal superior,
formada por tecido conjuntivo elástico, apresenta uma tracção mínima ou nula sobre
o disco, numa situação de encerramento mandibular. No entanto, durante a abertura,
quando o côndilo se desloca na direcção da eminência articular, a lâmina retrodiscal
distende-se gradualmente, criando forças de retracção sobre o disco até à posição de
protrusão máxima, período em que esta força de retracção atinge o seu pico, sendo a
retracção excessiva, capaz de induzir alterações de posição e forma no disco,
impedida pela actividade da pressão interarticular e pela própria morfologia.1,13 É
importante salientar que a lâmina retrodiscal superior é a única estrutura capaz de
retrair o disco posteriormente sobre o côndilo, ainda que esta força retráctil só ocorra
durante uma abertura mandibular excessiva.1,7


A ATM é uma articulação capaz de executar apenas dois tipos de movimentos,
rotação e translação. A rotação ocorre durante o movimento mandibular, na cavidade
articular inferior, em torno de um ponto ou eixo de rotação horizontal fixo, também
denominado Eixo de Bisagra, sendo este o único movimento de rotação pura
produzido pelo aparelho mastigatório. A translação é definida como um movimento
em que cada ponto do objecto em movimento simultâneo tem a mesma velocidade e


                                          21
direcção. Este movimento acontece na cavidade superior da articulação, quando a
mandíbula se desloca anteriormente, efectuando um movimento de protrusão.
Durante a maioria dos movimentos mandibulares normais estes dois movimentos são
associados, como é possível verificar no seguinte esquema.1,7




Figura 10 – Esquema representativo da função articular normal durante o movimento de abertura e
encerramento mandibular (Okeson, 2003)



2. Disfunção Temporomandibular


2.1 Definição


Ao longo dos anos, os transtornos funcionais do sistema mastigatório têm sido
identificados através de diversos termos, introduzidos por diferentes autores, o que
dificulta a comunicação entre clínicos e investigadores.


Em 1934, James Costen descreveu uma série de sintomas referentes ao ouvido e à
ATM como “Síndrome de Costen”, surgindo posteriormente o termo “transtornos da
ATM”. Em 1959, surge, por Shore, a denominação de “Síndrome de Disfunção da



                                              22
ATM” e mais tarde surge ainda, por Ash e Ramfjord (1995) a denominação de
“Alterações Funcionais da ATM”. Apesar das constantes modificações alguns
autores defendiam que estas denominações eram bastante limitativas, pois nem
sempre os sintomas se encontravam confinados à articulação, tendo sido aceite pela
população cientifica, a denominação de “Transtornos Temporomandibulares”, por
Bell (1982).1


As diferentes variações verificadas na nomenclatura contribuíram para uma ampla
desordem nesta área de estudo, já por si complicada, o que levou, a American Dental
Association (ADA) a adoptar o termo “Disfunção Temporomandibular” referindo-se
a todas as alterações do sistema mastigatório, com o objectivo de facilitar a
comunicação e coordenação dos trabalhos de investigação.1


A DTM caracteriza-se por um conjunto de condições que envolvem a ATM,
músculos da mastigação e estruturas associadas, promovendo dor, limitações
funcionais da mandíbula ou ruídos articulares durante a função mandibular.13,14,15


2.2 Epidemiologia


Segundo o Dorland´s Illustrated Medical Dictionary a epidemiologia refere-se ao
estudo dos factores que determinam ou influenciam a distribuição de uma patologia,
lesão ou outros acontecimentos relacionados com a saúde, numa população humana
concreta, com o objectivo de execução de programas para prevenir e controlar o seu
desenvolvimento e dispersão.1


Inúmeros estudos epidemiológicos tentaram demonstrar a prevalência de DTM em
determinadas populações, alguns dos quais, foram comparados por Okeson et al, na
seguinte tabela.1 (vide Tabela 1)




                                          23
Sinais e Sintomas de DTM nas populações estudadas                       Prevalência (%)

                                                                                          Pelo
             Nº de Mulheres
   Nº de                                                                Pelo menos 1     menos
                    /             Idade             População
Indivíduos                                                                sintoma        1 sinal
                Homens
                                                                                         Clínico
                                                   Estudantes
   739          370/369           19-25                                       26              76
                                               universitários, EUA
   384          198/186            70           Jubilados, Suécia             59              37
                                                 Trabalhadores,
   583          441/256           18-64                                       58              86
                                                    Finlândia
   389            0/389           21-54        Reservistas, Suécia            15              60
   440          218/222           7-14          Crianças, Suécia              36              72
   309          162/147           15-18        Crianças, Suécia               41              77
   136           74/62              7          Crianças, Suécia               39              33
   131           61/70             11          Crianças, Suécia               67              46
   135           59/76             15          Crianças, Suécia               74              61
  1040          653/387           13-86      Consulta privada, EUA            33              50
   369          181/188           10-18         Crianças, Israel              56              44
                                            Estudantes de Medicina
   222          102/120           19-40             Dentária                  39              48
                                                e Higiene Oral
   637          323/314           18-46         Adultos, Suécia               14              88
  3468         1815/1653          15-74       Nacionais, Holanda              22              45
   293          164/129           17-25     Adultos Jovens, Suécia            43               -
                                              Adultos, Cidade do
   534          317/217         18 - > 65                                     46               -
                                                    Kansas
                                             Pacientes Ortodôntico
   323           146/86           3-29                                        16              15
                                                 Prospectivos
                                            Estudantes de Medicina
   105            0/105            23                                         20              56
                                            Dentaria, Arábia Saudita
                                               Adultos Maiores,
   342           243/99           76-86                                       80               -
                                                   Finlândia

                                                      Total                  41%              56%


      Tabela 1 – Estudo comparativo sobre a Prevalência de Sinais e Sintomas, Okeson (2003)



Okeson verificou que a taxa de prevalência, ou seja, a presença de pelo menos um
sintoma de DTM, apresenta um valor médio de 41% e a presença de, pelo menos, um
sinal clínico foi referido por 56% da população estudada, o que sugere que os sinais e
sintomas de DTM são bastante frequentes na população. Este estudo comparativo é
considerado uma amostra representativa da população geral, pois apresenta grande
heterogeneidade de critérios.1,15


Buescher, no artigo “Temporomandibular Join Disorders” (2007) refere que as DTM
são comuns e frequentemente auto-limitadas na população adulta, conclusão obtida a

                                               24
partir de literatura revista pelo autor, como estudos epidemiológicos que demonstram
uma prevalência de disfunção superior a 75% da população adulta. No entanto é
referido pelo autor que apenas 5% dos adultos com sintomas de DTM requerem
tratamento e ainda menos desenvolvem sintomas crónicos ou debilitantes.14


A maior prevalência de DTM no sexo feminino é referida por Jerges et al (2008) no
artigo de revisão, em que verifica que mulheres, particularmente na 3ª ou 4ª década
de vida, apresentam condições severas de disfunção, que incluem cefaleias, tensão
muscular e articular e ruídos articulas. É referido também que segundo a literatura, as
mulheres são mais conscientes na compreensão e aceitação da problemática da
DTM.16


2.3 Etiologia da DTM


A etiologia da DTM complexa e multifactorial, ainda apresenta algumas lacunas.1,14
A controvérsia existente acerta da etiologia da DTM deve-se ao facto de existirem
diversos factores que contribuem para essa patologia, podendo ser divididos em
factores predisponentes, ou seja, factores que podem contribuir para o aparecimento
de DTM, factores desencadeantes, que promovem o inicio de DTM ou factores
perpetuantes, que impedem o tratamento e favorecem a evolução da DTM. O êxito
do tratamento da DTM depende, por vezes, da correcta identificação destes factores.1


A revisão da literatura revela que existem quatro grupos de factores fortemente
associados a DTM como factores anatómicos, trauma1,5, factores patofisiológicos3 e
factores psicossociais.1,3


2.3.1 Factores Anatómicos


De acordo com a literatura disponível, existem dois tipos de factores anatómicos
associados a DTM, factores esqueléticos e factores oclusais. No âmbito dos factores
esqueléticos, podem ser descritas malformações esqueléticas severas, discrepâncias
entre arcadas e na própria arcada, e intervenções dentárias iatrogénicas.3 Como
exemplos, Jerges et al referem que a perda de peças dentárias pode contribuir para
esta situação, no entanto quadros clínicos que apresentem mordidas abertas, não


                                          25
comuns em pacientes assintomáticos, não parecem estar suficientemente relacionadas
com deslocamentos do disco articular, com ou sem redução de movimento, tal como
não estão demonstradas relações entre DTM e overjet, sobremordidas ou mordidas
cruzadas.3,16


Alguns estudos, não todos, sugerem porém, uma associação entre perda de molares e
ruídos articulares que podem eventualmente evoluir para bloqueios, outros artigos
referem uma alta frequência e severidade de DTM em pacientes com restaurações
dentárias, quando comparados com pacientes com dentições intactas.16 Estes são,
apenas, exemplos da diversidade de factores possivelmente relacionados, embora
ainda sejam considerados bastante controversos.


Os factores oclusais podem também estar directamente relacionados com DTM visto
que os padrões de contacto oclusal influenciam a função dos músculos mastigatórios.
É referido por Okeson, que estes factores são apresentados com alguma controvérsia
dado que existem estudos que observam uma relação positiva entre os factores
oclusais e os sintomas mastigatórios, embora outros não verifiquem qualquer
relação.1


2.3.2 Trauma


As estruturas internas da ATM são passíveis de sofrer traumas, classificados em dois
grandes grupos, macrotraumas e microtraumas, sendo os primeiros subdividos, em
função da sua origem, em directos ou indirectos. São definidos como traumas
quaisquer forças bruscas que possam provocar alterações estruturais. 1,3


Os traumas directos, que surgem de um impacto repentino e isolado na mandíbula ou
ATM, produzem lesão acompanhada de sinais e sintomas de inflamação, podendo ser
acompanhados de uma perda de função consequente à força excessiva exercida e
falha estrutural, enquanto os traumas indirectos são relacionados com impactos
súbitos, sem contacto directo com a face.1,3


Os microtraumas resultam de forças de pequena magnitude que actuam
repetidamente sobre as estruturas, ao longo de muito tempo tendo como por exemplo


                                          26
os hábitos parafuncionais. Hábitos como o de ranger e apertar os dentes, morder o
lábio e posições alteradas da mandíbula são sugeridos, na literatura, como factores
desencadeantes ou perpetuantes em determinados grupos de pacientes com DTM,
apesar desta relação não parecer suficientemente esclarecida.1,3


2.3.3. Factores Patofisiológicos


Os factores patofisiológicos associados a DTM podem ser divididos em três grupos
distintos: factores sistémicos, locais e genéticos.
São condições patofisiológicos sistémicas, capazes de influenciar as DTM, as
disfunções    degenerativas,       endócrinas,    infecciosas,   metabólicas,   neoplásicas,
reumatológicas ou vasculares.3


Os factores patofisiológicos locais, como a eficiência mastigatória, parecem ser
multifactoriais e envolver uma grande variação individual, pelo que se torna difícil
estabelecer regras para estes. 3


Existem ainda factores patofisiológicos genéticos associados a DTM. Como exemplo
refere-se o Síndrome de Ehlers-Danlos, doença hereditária do tecido conjuntivo,
caracterizada clinicamente por hipermobilidade articular, hiperdistensão da pele e
fragilidade, decorrentes de defeitos hereditários no metabolismo do colagénio,
frequentemente associada a quadros de hipermobilidade e luxação discal.17


2.3.4 Factores Psicossociais


Os factores psicossociais incluem variáveis individuais, interpessoais e situacionais,
capazes de afectar a capacidade do paciente de se adaptar funcionalmente,
encontrando-se descrita na literatura, a associação entre a presença de características
psicológicas diferenciais, como stress e factores psicopatológicos, em pacientes com
DTM.5 O aumento do stress é considerado um fenómeno sistémico, frequente, capaz
de alterar a função mastigatória, aumentando a tonicidade dos músculos e dos níveis
de actividade muscular não funcional, sendo verificada simultaneamente uma
redução da tolerância fisiológica do paciente.1



                                             27
Segundo Jerges et al (2008) eventos associados a uma vida stressada têm sido
frequentemente referenciados em grupos com DTM que apresentam frequentemente
disfunção muscular, quando comparados com grupo controlo.16 Ansiedade e outras
doenças afectivas, particularmente depressão e distúrbios de personalidade, podem
ser mais frequentes em grupos de pacientes com DTM do que nos grupos controlo.
Jerges et al conclui, num estudo, que 40 % da população do grupo avaliado, satisfaz
os critérios de diagnóstico apresentando, pelo menos, um distúrbio de personalidade,
sendo o mais frequente a perturbação obsessiva compulsiva.16


2.4 Critérios de Diagnóstico


Para tratar eficazmente as DTM é necessário conhecer os inúmeros tipos de
patologias que podem existir, tal como a sua etiologia, com o objectivo de
estabelecer um diagnóstico correcto. Este é considerado a chave para o êxito do
tratamento.1


Durante anos a classificação das DTM foi uma questão problemática, pois foram
várias as classificações propostas ao longo dos anos. Autores e instituições como
Farrar (1972), Block (1980), International Headache Society (IHS) (1988), entre
outros, desenvolveram classificações diferentes, mas que apresentavam algumas
lacunas e foram, por isso, sendo ultrapassadas.18 Em 1996, foi apresentado pela
American Academy of Orofacial Pain (AAOP), um esquema de classificação, que
apesar de ter sofrido algumas alterações, as últimas em 2008, é utilizado actualmente,
tendo sido adaptada da classificação preconizada pela IHS, onde a dor associada a
DTM é inserida no 11º grupo, como se pode verificar nas seguintes tabelas.3 (vide
Tabela 2)




                                         28
IHS 11: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção do crânio, nariz, olhos,
ouvidos, seios perinasais, dentes, cavidade oral ou outras estruturas cranianas
11.1 Cefaleia atribuída a disfunção dos ossos cranianos
11.2 Cefaleia atribuída a disfunção do pescoço
11.3 Cefaleia atribuída a disfunção dos olhos
11.4 Cefaleia atribuída a disfunção dos ouvidos
11.5 Cefaleia atribuída a rinosinusite
11.6 Cefaleia atribuída a disfunção dos dentes, maxilares ou estruturas relacionadas
11.7 Cefaleia atribuída a DTM
11.8 Cefaleia atribuída a outras disfunções do crânio, pescoço, olhos, nariz, seios
perinasais, dentes, cavidade oral ou outras estruturas faciais ou cervicais

Tabela 2 – IHS 11: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção do crânio, nariz, olhos, ouvidos, seios
perinasais, dentes, cavidade oral ou outras estruturas cranianas (Leeuw, 2008)


Na seguinte tabela descrevem-se as alterações efectuadas à classificação do grupo
11.7 definido pela IHS. (vide Tabela 3)


Modificação da classificação recomendada para IHS 11.7.1: Cefaleia ou dor
facial atribuída a disfunção da ATM
11.7.1.1 Disfunção por desarmonia discal
     11.7.1.1.1 Luxação discal com redução
     11.7.1.1.2 Luxação discal sem redução
11.7.1.2 Sub-luxação da ATM
11.7.1.3 Disfunções Inflamatórias
     11.7.1.3.1 Sinuvite e Capsulite
     11.7.1.3.2 Poliartrite
11.7.1.4 Disfunções não inflamatórias
     11.7.1.4.1 Osteoartrite primária
     11.7.1.4.2 Osteoartrite secundária
11.7.1.5. Anquilose
11.7.1.6 Fractura do côndilo mandibular

Tabela 3: Modificação da classificação diagnostica recomendada para a IHS 11.7.1: Cefaleia ou dor
facial atribuída a disfunção da ATM (Leeuw, 2008)




                                                 29
As tabelas anteriormente apresentadas, em que as categorias gerais são agrupadas em
função dos sintomas comuns e as subdivisões diferenciam-se por determinadas
características clínicas, são de extrema importância para o presente trabalho, pois
neste subgrupo de DTM estão englobadas as situações de disfunção articular que
poderão ser resolvidas, em última análise, com tratamento cirúrgico, assunto que será
abordado mais profundamente no seguimento do trabalho.1,3


Existem outras classificações de dor para a região orofacial, propostas por
instituições como a International Association for the Study of Pain Classification
System, a International Headache Society Classification System e Research
Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorder (RDC/TMD), dignos de
referência.1


A RDC/TMD, proposta por Samuel Dworkin et LeReshe, em 1992, tem evidenciado
ser superior em relação as outras classificações desde que estes critérios de
diagnóstico têm em consideração factores sociais e psicológicos.3,18 Esta classificação
divide-se em dois eixos, que podem ser usados para determinar os factores físicos
associados a DTM, através do Eixo I, e psicossociais, através do Eixo II.19


Apesar de inúmeros sistemas de classificação terem sido propostos para as DTM,
apenas os dois, acima referidos, se encontram em actual utilização, apresentando
áreas sobrepostas e concordantes.3


Para a determinação e avaliação do grau de dor experimentado pelos pacientes são
utilizadas escalas de dor, tais como, Visual Analogue Scale (VAS), Numerical Scale
(NS), Behaviour Rating Scale (BRS) and Verbas Scale (VS), sendo a primeira a mais
referenciada na literarura.16


2.5 Disfunção da Articulação Temporomandibular


De acordo com a classificação proposta pela AAOP a DTM divide-se em dois grupos
distintos, disfunção dos músculos mastigatórios e disfunção da ATM.1,3




                                          30
Tal como foi referido anteriormente, é sobre o segundo grupo que se prendem os
objectivos neste trabalho, sendo por isso apenas referenciadas patologias e alterações
que possam ter indicação para tratamento cirúrgico.
As disfunções internas da ATM podem ser divididas em diferentes grupos: disfunção
por desarmonia discal; sub-luxação da ATM; disfunções inflamatórias; disfunções
não inflamatórias; anquilose3 e ainda alterações estruturais.1 Serão apenas
referenciadas as que se encontram no âmbito deste trabalho.


2.5.1 Disfunção por Desarmonia Discal


Estas disfunções parecem ter origem na falência da função de rotação normal do
disco sobre o côndilo, produzindo consequentemente um estiramento dos ligamentos
laterais e da lâmina retrodiscal inferior, e, perda de espessura do bordo posterior do
disco, evoluindo para patologias denominadas luxações discais, classificadas em
redutíveis ou não redutíveis, com base na capacidade do disco articular de retomar a
sua posição fisiológica.1
Frequentemente, a DTM causada por desarmonia interna, é descrita como uma
patologia progressiva, que pode ser classificada através de quatro estadios clínicos
consecutivos definidos por Wilkes (1978 e 1989), descritos na tabela 4.20,21




                                          31
Classificação de Wilkes para os desarranjos internos da ATM

I. Estadio Inicial

     A. Clínica: Sem sintomas mecânicos excepto ruído articular recíproco; ausência de dor
e limitação de movimento
     B. Radiologia: Ligeiro deslocamento anterior; contorno anatómico do disco normal;
tomograma negativo;
     C. Anatomia Patológica: Forma anatómica excelente; ligeiro deslocamento anterior;
coordenação passiva demonstrável;

II. Estadio Intermediário Inicial

     A. Clínica: Um ou mais episódios de dor: inicio dos problemas mecânicos major,
consistentes com o ruído articular audível no meio/final da abertura; captura transitória e
bloqueio;
     B. Radiologia: Ligeiro deslocamento anterior; inicio da deformidade discal com ligeiro
estreitamento do bordo posterior; tomograma negativo;
     C. Anatomia Patológica: deslocamento anterior do disco, inicio da deformação
anatómica do disco; área central articular normal;

III. Estadio Intermédio

     A. Clínica: Múltiplos episódios de dor, sintomas mecânicos, consistentes com bloqueio
(intermitente ou completo); restrição de movimentos; dificuldade na função;
     B. Radiologia: Deslocamento anterior do disco com deformação significativa e
prolapso do disco (aumento da perda de espessura do bordo posterior); tomograma
negativo;
     C. Anatomia Patológica: Deformação discal acentuada com deslocamento anterior; Sem
grandes alterações tecidulares;

IV. Estádio Intermediário Tardio

    A. Clínica: Ligeiro aumento de severidade do estádio intermédio;
    B. Radiologia: Aumento de severidade do estádio intermédio; tomograma positivo
mostrando alterações degenerativas suaves a moderadas dos tecidos duros, achatamento da
eminência, deformação do côndilo mandibular, esclerose;
    C: Anatomia Patológica: Aumento de severidade do estádio intermédio, alterações
degenerativas (osteofitos); adesões múltiplas; ausência de perfuração do disco ou ligamento;

V. Estádio Tardio

    A. Clínica: Crepitações; Episódios de dor; Limitação crónica do movimento;
Dificuldade na função;
    B. Radiologia: Perfuração do disco ou ligamento; Preenchimento dos defeitos;
Grande deformidade do disco e tecidos duros; tomograma positivo com alterações artríticas
degenerativas;
    C. Anatomia Patológica: Grandes alterações degenerativas do disco e tecidos duros;
Perfuração do ligamento posterior; Adesões múltiplas; Osteofitos; Achatamento do côndilo
e eminência articular; formação de quisto subcondral;


         Tabela 4: Classificação de Wilkes dos desarranjos internos da ATM. (Undt, 2006)




                                               32
2.5.1.1 Luxação Discal com Redução


A luxação discal com redução acontece quando ocorre um extenso estiramento da
lâmina retrodiscal inferior e dos ligamentos laterais, associado à perda de espessura
do bordo posterior do disco, levando-o a ocupar uma posição mais avançada dentro
da cavidade articular, sendo classificada de redutível pois o côndilo retoma à sua
posição inicial, transpondo novamente o bordo posterior do disco.1,2 (vide Fig.11)
Clinicamente, os pacientes experimentam uma limitação da amplitude de abertura
mandibular e, no momento em que o disco é reposicionado, verifica-se um desvio de
trajectória deste movimento, acompanhado de ruído articular intenso e brusco,
audível no momento da recaptura.1,2
O tratamento dos deslocamentos discais e luxações discais com redução tem como
objectivo principal restabelecer a relação côndilo-disco normal, reduzindo a dor e
disfunção articular.1




Figura 11 – Luxação Discal com Redução. Durante a abertura o côndilo mandibular passa sobre o
bordo posterior do disco até à sua zona intermédia, reduzindo a luxação discal (2-4). O restante
encerramento e abertura ocorrem sem alterações (5-8). Durante a última fase do encerramento o disco
volta a luxar (8-1). (Okeson, 2003)




                                                33
2.5.1.3 Luxação Discal sem Redução


Em situações em que é perdida a elasticidade da lâmina retrodiscal superior, a
recolocação do côndilo sobre o disco articular deixa de ser possível pois quando o
disco não reduz, o movimento de translação força o posicionamento anterior do
côndilo, geralmente acompanhado de dor e redução da amplitude mandibular.1,2 (vide
Fig.12)
Clinicamente pode ser observada, durante o movimento mandibular, uma deflexão
mandibular, para o lado afectado. Os movimentos excêntricos não apresentam
alterações quando efectuados para o lado afectado, embora os movimentos
contralaterais se encontrem limitados. Como é possível verificar na tabela 4, este tipo
de luxações parece ter tendência de evolução para a cronicidade.1




Imagem 12 – Luxação Discal sem Redução. O côndilo não adopta uma relação normal com o disco,
mantendo-se sempre numa posição anterior. (1-8), (Okeson, 2003)




                                             34
2.5.2 Disfunções Inflamatórias da ATM


As disfunções inflamatórias são condições patológicas caracterizadas por dor
profunda, contínua, geralmente exacerbada pela função, classificadas de acordo com
a estrutura afectada em sinuvite, capsulite, retrodiscite e artrite.1


2.5.2.1. Sinuvite, Capsulite e Retrodiscite


A inflamação dos tecidos sinoviais, cápsula articular e tecidos retrodiscais,
manifestam-se clinicamente como uma só disfunção, devido à dificuldade inerente de
realizar um correcto diagnóstico diferencial. O exame clínico baseia-se na palpação
da cápsula articular através do pólo lateral do côndilo, que quando se manifesta
através de um quadro clínico de dor e limitação do livre movimento articular, prevê a
presença de lesão inflamatória localizada, associada a maloclusão.1


2.5.2.2. Osteoartrite


A osteoartrite é uma situação clínica caracterizada pela presença de um processo
destrutivo das superfícies articulares ósseas do côndilo e da cavidade glenóide,
considerando-se, por vezes, como sendo uma resposta do organismo às cargas
excessivas aplicadas nessa zona. Com o passar do tempo a degeneração progressiva
provoca a perda do estrato cortical sub-condral, erosão óssea e os consequentes sinais
imagiológicos de degradação óssea.
É uma patologia descrita como consequência de luxações ou perfurações discais ou
dos ligamentos, sendo habitual o aparecimento de ruídos articulares na forma de
crepitações, acompanhados de dor e disfunção, acentuada pelos movimentos
mandibulares.1


Quando as cargas excessivas aplicadas na zona articular são controladas, o processo
artrítico passa a ser um processo adaptativo, denominando osteoartrose, sendo
descrita na literatura como uma patologia assintomática, sendo o seu diagnóstico
confirmado através de exames imagiológicos, em que é verificável a presença de
alterações estruturais do osso subarticular do côndilo mandibular e da cavidade
glenóide, como aplanamento, presença de osteofitos ou erosões. 1


                                            35
2.5.3 Anquilose


A anquilose, patologia caracterizada por um quadro de hipomobilidade mandibular
crónica é uma limitação indolor e de larga duração, devida a aderências fibrosas
desenvolvidas nas superfícies intracapsulares da articulação, que impedem os
movimentos articulares normais. Pode também ocorrer uma anquilose óssea, em que
o côndilo e a cavidade glenóide se encontram verdadeiramente unidos, situação
maioritariamente associada a uma infecção prévia, em que se verifica uma
neoformação óssea. 1


2.5.4 Incompatibilidades Estruturais das Superfícies Articulares


2.5.4.1 Alterações Morfológicas


As alterações morfológicas são caracterizadas por modificações reais da forma das
superfícies articulares, produzidas no côndilo e na fossa articular, sob a forma de
aplanamento ou formação de protuberâncias, ou no disco, sob a forma de perda de
espessura dos bordos do disco e perfurações. A maior parte das alterações torna-se
responsável pela disfunção num ponto concreto do movimento de abertura e
encerramento, o que a torna muito reprodutível.1


Perante variedade de alterações, e visto que a sua causa é uma modificação real da
estrutura, o objectivo de tratamento definitivo é restabelecer a forma normal da
estrutura alterada. Esta situação pode ser conseguida através de uma intervenção
cirúrgica, técnica bastante agressiva, que só deve ser ponderada quando não há
eliminação de sintomas através de técnicas conservadoras.1


2.5.4.2 Aderências e Adesões


As aderências e adesões são situações patológicas que ocorrem quando as superfícies
articulares sofrem adesão, devido a uma força estática prolongada sobre as estruturas
articulares ou por perda de lubrificação efectiva, sendo observadas entre o côndilo e
o disco (no espaço articular inferior) ou entre o disco e a cavidade glenóide (espaço


                                         36
articular superior), apresentando uma durabilidade temporária (aderências) ou
definitiva (adesões), ocorrendo produção de tecido conjuntivo fibroso entre as
superfícies articulares e / ou tecidos circundantes.1


Clinicamente, na presença de uma aderência do espaço articular superior, o
movimento de translação fica inibido, e, consequentemente, o movimento do côndilo
limita-se à sua rotação, provocando a limitação de abertura mandibular. Quando esta
situação se prolonga, os ligamentos, anterior e laterais, podem sofrer distensão
levando a que côndilo não acompanhe o disco articular no seu movimento de
translação. Na condição de fixação definitiva do disco pode ser observado um
movimento de abertura relativamente normal da abertura, acompanhado da
incapacidade de encerramento, verificando-se um bloqueio articular.1


Dado que as aderências ocorrem como consequência a uma sobrecarga estática e
prolongada das superfícies articulares, o objectivo do tratamento passa por reduzir as
forças a que a articulação é submetida. Já as adesões, pelo seu carácter definitivo,
devem ser removidas, através de um procedimento cirúrgico, como artrocentese ou
artroscopia.1


2.6 Tratamentos da DTM


O tratamento indicado para DTM baseia-se fundamentalmente em dois factores: no
estabelecimento de um diagnóstico correcto e, no conhecimento da evolução natural
do processo. De acordo com o estadio da disfunção, é possível situar e acompanhar a
sua evolução, definindo as estratégias de tratamento mais adequadas. As diferentes
opções terapêuticas visam diminuir a sintomatologia associada, bem como a
restituição da função articular.1,20


Parece ser consensual a indicação de tratamentos conservadores como primeira
intervenção no tratamento da disfunção articular. No caso de estes se revelarem
ineficazes, devem ser ponderados os tratamentos não conservadores ou
irreversíveis.1,11, 16, 20, 23-24




                                           37
2.6.1 Tratamentos Conservadores ou Reversíveis


Os tratamentos conservadores ou reversíveis permitem modificar o estado oclusal do
paciente temporariamente. São conhecidas diversas opções terapêuticas que incluem
educação e auto-controlo do paciente, terapia farmacológica, terapia física e
utilização de dispositivos oclusais, sendo que cada técnica terapêutica indicada
isoladamente ou podendo ser associadas várias modalidades de tratamento,
realizadas em diferentes fases da evolução da patologia.


2.6.1.1 Educação e Auto-controlo


A literatura revela que algumas situações de DTM se relacionam etiologicamente
com determinados estados emocionais, sendo o stress emocional, certamente, um dos
diversos factores psicológicos que devem ser considerados. É muito importante que
esta relação seja identificada e considerada aquando da elaboração de um plano de
tratamento. 1


A educação do paciente passa por procurar mantê-lo num nível consciente e
informado, apresentando-lhe de métodos de auto-controlo de forma a evitar situações
desaconselhadas para a resolução da patologia, como por exemplos evitar mastigação
excessiva e de alimentos muito duros, evitar falar muito e durante muito tempo, tal
como evitar grandes aberturas mandibulares.1,16,25 O aconselhamento de simples
exercícios e instruções comportamentais são passos importantes quando de tratam
pacientes com sintomas, novos ou intermitentes, de DTM.3 Segundo Hodges (1990) e
Wright et al (1995), um auto-controlo bem sucedido permite a cura e previne o
aparecimento de novas lesões no sistema músculo-esquelético, o que pode ser o
suficiente para controlar o problema.1


2.6.1.2 Terapia Farmacológica


O tratamento farmacológico é considerado um método eficaz de controlo dos
sintomas associados a DTM, não oferecendo uma resolução definitiva. Os grupos de
fármacos mais utilizados para o seu tratamento são os analgésicos, anti-inflamatórios




                                         38
não esteróides (AINE), corticosteróides, ansiolíticos, relaxantes musculares, anti-
depressivos tricíclicos e anestésicos locais.1,22


Os analgésicos, corticosteróides e ansiolíticos estão indicados em situações de dor
aguda, os AINE’s, relaxantes musculares e os anestésicos locais podem ser utilizados
em quadros agudos e crónicos, e os anti-depressivos tricíclicos estão especialmente
indicados no tratamento da dor crónica. 1,14


2.6.1.3 Terapia Física


A terapia física engloba uma parte importante de um tratamento satisfatório de DTM,
com indicação em diversas fases do tratamento, sendo considerada vantajosa a
coordenação clínica entre o médico dentista e um fisioterapeuta com prática e
interesse por esta área.1 Os exercícios mandibulares, passivos ou activos, têm sido
altamente recomendados para diminuição de ruídos articulares, aumentos de
mobilidade mandibular, restabelecimento de movimentos mandibulares regulares, em
casos de falta de coordenação motora e tratamento de luxações meniscais anteriores
recorrentes.1,22 Medlicott et al (2006), concluiu, através do seu estudo de revisão, que
exercícios activos ou mobilizações manuais, isoladas ou combinados, parecem efectivos
a curto prazo, no sentido em que é possível aumentar a amplitude de abertura mandibular
em pacientes com luxação meniscal aguda.26


As modalidades de terapia física, descritas na literatura, incluem termoterapia,
crioterapia (tratamento por frio), ultra-sons, ionoforese, tratamento de estimulação
electrogalvânica (EEG), estimulação nervosa eléctrica transcutânea (TENS),
acupunctura e laser frio. 1,16


2.6.1.4 Goteira


Goteiras ou dispositivos oclusais são aparelhos acrílicos interoclusais, que se
adaptam à arcada dentária, criando uma nova posição oclusal e alterando a posição
mandibular e o padrão de contacto dos dentes, tendo como objectivo estabelecer um
padrão de contacto oclusal que se encontre em harmonia com a relação côndilo-
disco-fossa óptima determinada para o paciente. 1,2


                                             39
A terapia com goteiras é um dos assuntos mais debatidos no tratamento de DTM.
Existe uma grande variedade de design de goteiras, que têm vindo a ser descritas
como aparelhos de excelência no tratamento de DTM. 1, 16 Estudos como o de Badel et
al (2008) demonstram que a eficiência da utilização de goteiras para redução da dor
associada a luxação discal ronda os 88%.27
Existe uma variedade goteiras, utilizadas em diferentes situações, como exemplo
podem ser referidas as goteiras planas que pretendem diminuir o bruxismo nocturno
e actividade muscular mastigatória ou as goteiras de reposicionamento anterior, que
são descritas como mais efectivas na correcção de luxações anteriores, redução de
dor e eliminação de ruídos articulares.16


2.6.2 Tratamentos ão Conservadores ou Irreversíveis


Os tratamentos não conservadores ou irreversíveis são quaisquer tratamentos que
alterem permanentemente o estado oclusal e / ou a posição mandibular. São
exemplos os ajustes oclusais selectivos dos dentes, as técnicas restauradoras que
modificam o estado oclusal, os tratamentos ortodônticos, e as intervenções
cirúrgicas.1


Os dispositivos desenhados para modificar o crescimento ou para alterar
permanentemente a posição mandibular também podem ser considerados tratamentos
irreversíveis.1


2.6.2.1 Terapia Oclusal


A terapia oclusal irreversível, realizada através de desgastes dentários selectivos,
tratamento ortodôntico ou reabilitação protética, apenas se encontra indicada quando
existe evidência de que a principal causa de disfunção é o padrão de contacto oclusal ou
instabilidade ortopédica, não sendo aconselhável a alteração da oclusão em pacientes
com DTM associada a outros factores etiológicos.1,28


As alterações oclusais têm como objectivo a alteração do padrão de contacto oclusal,
eliminando contactos prematuros ou interferências, má posições dentárias ou


                                            40
esqueléticas ou restabelecendo contactos oclusais ausentes, de forma a reposicionar a
mandíbula numa posição estável e equilibrada denominada relação cêntrica.1,2,16 Um
pequeno estudo realizado por Lundh et al, que avaliou a relação entre DTM
decorrente de alteração da relação côndilo-disco e correcção oclusal, através de
reabilitação protética e tratamento ortodôntico, demonstrou uma redução significante
nos sintomas dolorosos.1, 16
Os desgastes selectivos e o tratamento restaurado raramente são considerados como
uma modalidade primária de tratamento das DTM.3 Um estudo de revisão elaborado
por Koth and Robisons, cujo objectivo foi avaliar a efectividade dos ajustes oclusais
no tratamento e prevenção de DTM em adultos, permitiu verificar não existirem
diferenças significativas entre os grupos submetidos a correcção oclusal, através de
desgastes selectivos, e grupos placebo, o que levou a concluir que não existe
qualquer evidência de que o ajuste oclusal possa reverter ou prevenir a DTM.3,16


2.6.2.2 Tratamento Cirúrgico


Desde o século VII AC, que as imagens dos papirus revelam tentativas de tratamento
da DTM procurando a deslocalização das luxações. Através de um longo e árduo
percurso, os clínicos têm procurado aliviar da disfunção dolorosa desta estrutura
através de várias avaliações mecânicas, anatómicas, biomecânicas e recursos
correccionais.23


Segundo Dolwick (2007), a cirurgia da ATM desempenha um pequeno, mas
importante, papel no tratamento de pacientes com DTM. Existe um largo espectro de
procedimentos cirúrgicos para o tratamento de DTM, que varia desde a simples
artrocentese e lavagem articular até ao mais complexo procedimento de cirurgia
aberta. É importante reconhecer que o tratamento cirúrgico raramente é realizado
isoladamente, sendo geralmente acompanhado por tratamentos não cirúrgicos, antes
e depois da cirurgia.24


Existem, hoje em dia, vários procedimentos cirúrgicos aceitáveis para o tratamento
de desarranjos internos do disco articular, mais propriamente, luxações meniscais
com ou sem redução, perfuração do disco articular ou dos tecidos retrodiscais ou
alterações degenerativas do disco ou da superfície articular.20 Apesar disso, várias


                                         41
referência bibliográficas, indicam que não existem evidências a longo prazo da
eficácia do tratamento cirúrgico em estudos controlo de DTM.16


3. Técnicas Cirúrgicas de Tratamento de DTM


A redução cirúrgica de uma luxação articular foi pela primeira vez documentada, em
1887, por Annandale. Posteriormente, em 1979, McCarty e Farrar introduziram a
técnica de reposicionamento discal através da excisão do tecido retrodiscal e sutura
intrarticular. Em 1984 por Hall, e mais tarde em 1985, por Dolwick e Sanders, foram
introduzidas variações na técnica que se tornaram procedimentos standards para a
redução meniscal aberta. Estados avançados da doença promoveram a necessidade de
intervenção através de procedimentos cirúrgicos mais complexos como discectomia,
condilectomia ou condiloctomia. Já em 1975, foi desenvolvida por Ohnishia a
técnica de artroscopia da ATM tendo sido definida, mais tarde, como uma técnica de
diagnóstico (Murakami e tal, 1986; Sanders, 1986).20,29 A artroscopia avançada surge
posteriormente, por Quinn, (1994) indicada para o tratamento de alterações
degenerativas severas na superfície articular.20 A artrocentese constitui a modalidade
cirúrgica mais recente dentro do tratamento das luxações meniscais e veio preencher
uma lacuna entre as duas modalidades de tratamento, o conservador e o cirúrgico.1


3.1 Indicações


Segundo Okeson, as indicações para cirurgia da ATM podem ser consideradas
relativas ou absolutas1, sendo as indicações absolutas reservadas para situações tais
como tumores, anomalias de crescimento ou anquilose da ATM.1,24 As indicações
relativas da cirurgia de ATM para o tratamento das DTM’s mais frequentes como
disfunções internas ou osteoartrite, são dor articular significante e disfunção,
tratamentos conservadores refractários, e presença de imagens de evidente patologia.
Apesar das indicações para a cirurgia parecerem claras, não são específicas.1,24


A ausência de critérios objectivos para a indicação de cirurgia de ATM impõe que a
decisão deve ser tomada após o conhecimento e avaliação da história clínica e
acompanhamento da evolução do paciente, pois a selecção do paciente é o maior
determinante para o sucesso do tratamento cirúrgico.24


                                          42
O primeiro critério, talvez o mais importante, remete à existência de dor articular
moderada a severa e disfunção articular. Os candidatos a uma intervenção cirúrgica
devem apresentar dor articular localizada e contínua, que piora com a função
mastigatória ou fala, sendo esta dor caracterizada por uma intensidade progressiva ao
longo do dia. A disfunção articular pode incluir ruídos articulares acompanhados de
dor e episódios de limitação de abertura mandibular ou mesmo bloqueio articular. 24


O segundo critério, que requer que o paciente apresente uma situação refractária a
tratamentos não cirúrgicos, também não é específico, visto que existe um variado
leque de tratamentos, cada qual com indicações específicas, que podem não ser os
mais indicados para a DTM em questão. Grande parte dos pacientes responde com
sucesso aos tratamentos conservadores, assim, deve ser confirmado que o tratamento
conservador prévio aplicado foi o mais adequado e que, ainda assim não obteve
                                               1,21
sucesso perante a patologia diagnosticada.            A cirurgia da ATM está limitada aos
pacientes que não respondem positivamente a outras terapias, e que apresentam
quadro de dor e disfunção articular. 24


Por último, a indicação para cirurgia requer que existam imagens que evidenciem a
patologia. Este critério é o mais objectivo, no entanto, os achados imagiológicos não
podem ser interpretados isoladamente. As imagens devem ser usadas para confirmar
e suportar achados clínicos. A decisão para uma intervenção cirúrgica deve ser
baseada nos achados clínicos, em conjugação com dor e disfunção articular, que
apresenta imagem capaz de evidenciar patologia articular e ainda em paciente em
que o prognóstico de não tratamento seja reservado.1,24


3.2 Técnicas Cirúrgicas


Existem diversas técnicas cirúrgicas indicadas para o tratamento de DTM, a artrocentese,
a artroscopia e a artrotomia,3 sendo que na última estão incluídas as técnicas de
reposicionamento discal, discectomia, condilectomia e condiloctomia, entre outras,
sendo as mais frequentes descritas seguidamente.23




                                          43
3.2.1 Artrocentese


A artrocentese da ATM é frequentemente definida como uma lavagem da
articulação, através de uma técnica de dupla punção, realizada sem visão da
articulação, sob anestesia.7,21,22,29,30
Este procedimento tem como indicações o fracasso do tratamento conservador31,
traumatismo articular agudo, hipomobilidade articular, luxação discal com ou sem
redução, alterações degenerativas ou inflamatórias e adesões capsulares ou discais,
no entanto, a maioria dos estudos apenas procura determinar a sua eficácia no
tratamento no tratamento de luxações discais sem redução, adesões ou bloqueio da
ATM.21,30 O sucesso desta intervenção baseia-se na identificação dos factores de
risco32 e num correcto diagnóstico prévio.23


A artrocentese ortopédica, por definição, envolve uma punção no espaço articular
com aspiração do fluído proveniente desse espaço e injecção de substância
terapêutica. A artrocentese da ATM é um procedimento em que o cavidade articular
superior (CAS) é puncionada, lavada com um fluído e a articulação é manualmente
manipulada, sendo o seu principal objectivo a eliminação de resíduos tecidulares,
sangue e mediadores inflamatório, isto é, das substâncias produzidas pela inflamação
intra-articular.1,7,21,30


É um procedimento realizado em consultório, com a articulação anestesiada através
bloqueio do nervo aurículotemporal, com cerca de 2 ml de anestesia local, podendo
ser complementada com sedação intravenosa que proporcionando algum conforto ao
paciente.4,7,30


Uma vez anestesiada a articulação, são marcados dois pontos, sobre a fossa e
eminência articular, ao longo da linha cantal-tragus, de forma a localizar a cavidade
articular. A primeira agulha, de 20G ou 18G, é inserida na cavidade articular e
injectados aproximadamente 2 ml de solução de Ringer ou solução salina estéril, para
promover a distensão da espaço articular superior4,7,30 Uma segunda agulha, é inserida
na zona da eminência articular, funcionando como porta de saída, com o objectivo de
estabelecer um livre fluxo da solução injectada na espaço articular superior.7,30 A
quantidade de solução de irrigação é arbitrária, não havendo uma quantidade mínima



                                           44
ou máxima que prove estar entre o intervalo terapêutico, podendo variar entre os 100
e os 400ml. (vide Fig.13) 4,24,30


Para garantir uma lise efectiva das adesões durante a lavagem, a agulha de saída do
fluxo é bloqueada intermitentemente, promovendo a distensão da cavidade articular
superior, através da injecção da solução, sob pressão. Terminada a lavagem podem,
eventualmente, ser injectados fármacos, como corticóides ou hialuronato de sódio, de
forma a aliviar inflamações intracapsulares. 24,30 Imediatamente após o procedimento,
a mandíbula deve ser suavemente manipulada de forma a retomar os livres
movimentos mandibulares.4,24,30




Fig. 13 – Artrocentese da Articulação Temporomandibular pela técnica de dupla punção (Valmaseda e
Gay-Escoda, 2002)


Durante a fase pós-operatória, é instituída aos pacientes uma dieta restrita e mole, e
                                                                                     4,24,30
eventualmente, prescritos anti-inflamatórios não esteróides e analgésicos                      Uma
goteira oclusal e fisioterapia, na forma de exercícios, passivos e activos, de abertura
mandibular, podem ser também recomendados e iniciados logo a seguir à
intervenção.4,24,30


Esta técnica encontra-se indicada no tratamento de DTM, tendo como objectivo o
alívio dos três sintomas mais comuns do bloqueio articular, limitação da máxima
abertura mandibular, dor e disfunção articular. Estes sintomas estão relacionados
entre si, pois quando aumenta a dor, diminui a abertura mandibular, que por sua vez
causa disfunção. A correcção de um dos problemas pode conduzir à correcção dos
outros dois. Segundo Barkin (2000), os dados publicados de resultados de longo




                                               45
prazo sugerem que a artrocentese apenas é eficaz no tratamento de bloqueio
articular.21


Em casos de adesões discais ou capsulares, através desta técnica é possível a
eliminação do efeito de vácuo e a lubrificação da cavidade articular, que combinada
com forças geradas pela manipulação articular, possibilita o funcionamento normal
da articulação. A artrocentese é descrita, na literatura como uma técnica útil e eficaz
na eliminação da dor articular, o que se deve à eliminação de mediadores
inflamatórios, conseguida pela administração de fármacos, com propriedade anti-
inflamatórias, directamente nos receptores intracapsulares. Alguns autores, como
Frost e itzan, referem que a infiltração de nutrientes na articulação, após a lavagem,
permite a reparação e adaptação de alguns componentes articulares, ainda que outros
autores argumentem que a sua eficácia parece não estar comprovada.30


Não são referidas complicações significativas associadas à técnica da artrocentese. É
previsível que se verifique edema e / ou tumefacção temporária associada a dor na
área articular e ligeira mordida aberta posterior por 12 a 24 h após o procedimento.24


As vantagens associadas a esta técnica advêm da simplicidade da intervenção21,
mímica invasão da estrutura articular e possibilidade de ser realizada em consultório
o que reduz o seu custo.


Segundo Emshoff, a artrocentese e distensão hidráulica da ATM tem sido descrita
como uma modalidade efectiva no tratamento de pacientes com achados clínicos
consistentes com o diagnóstico de luxação discal sem redução. 32-34
Num estudo realizado por itzan et al, em 1997, analisou-se o efeito da artrocentese
no tratamento do bloqueio severo da ATM e procedeu-se à reavaliação da patogénese
desta condição baseada nos resultados obtidos. Em 39 paciente (40 articulações)
apresentando limitação de abertura mandibular, de inicio súbito, e após verificado o
insucesso com tratamentos não invasivos, foram realizadas artrocenteses do
compartimento articular superior, com solução salina estéril. Neste estudo verificou-
se um aumento da abertura interincisal máxima e da lateralidade, diminuição da dor e
do nível de disfunção em 95% dos casos, tendo sido concluído pelos autores que esta



                                          46
técnica é eficaz no tratamento de bloqueio súbito da ATM, sendo possível
restabelecer a função normal, com alívio dos sintomas.35


Num estudo semelhante, Laskin et Carvajal (2000), concluíram que a artrocentese é
uma técnica capaz de reduzir a dor e a disfunção em pacientes com luxação discal
anterior, com e sem redução, tendo obtido uma taxa de sucesso de 80%, em que 54%
deixou de referir dor e 35% apresentaram melhorias, numa população que
apresentava luxações anteriores com e sem redução, em que apenas 3 casos não
apresentaram qualquer melhoria.48 Também em estudos realizados por Barkin et al
(2000), Sanromán (2004) e Cavalcanti et al (2006), em pacientes com situações
clínicas semelhantes, com os mesmos critérios de avaliação, verificaram-se
melhorias substanciais em todos os pacientes submetidos à artrocentese. 21,36,37


Alpasan et al (2003) realizou um estudo retrospectivo a 5 anos, semelhante, em que
avaliou os resultados da artrocentese no tratamento de DTM’s, em 48 articulações.
As conclusões em relação à diminuição da dor e disfunção e aumento da mobilidade
mandibular, foram semelhantes. Ainda assim, este autor verificou que os níveis de
dor, tanto no pré-operatório como no follow-up (média de 22 meses), foram sempre
mais elevados em bruxómanos, ainda que com uma diferença pouco significativa. Já
o alívio da dor e aumento da mobilidade mandibular foi superior em pacientes não
bruxómanos.38


O estudo realizado por Emshoff (2005) teve como objectivo investigar quais as
variáveis clínicas, como idade, género, nível de dor e mobilidade mandibular, podem
interferir nos resultados do tratamento de DTM com artrocentese e distensão
hidráulica. O autor concluiu que esta técnica apresenta melhor prognóstico quando
realizada em pacientes com idades iguais ou inferiores a 25 anos, com alto nível de
dor e um valor de amplitude mandibular inferior a 25mm.32,49


O mesmo autor realizou diversos estudos sobre a técnica. Num estudo publicado em
2004, o autor verificou que a artrocentese, quando realizada em pacientes com DTM
crónica apresenta uma taxa de sucesso menor, quando comparada com o sucesso
obtido em pacientes não crónicos.39



                                          47
Em 2007, o mesmo autor desenvolveu um estudo com o objectivo de investigar se as
variações de imagem de Ressonância Magnética (RNM) de derrame e / ou edema da
medula óssea podem prever os resultados do tratamento com artrocentese e distensão
hidráulica da ATM. Assim, concluiu que o derrame pode ser importante no
prognóstico e determinante no sucesso da artrocentese. Ainda assim, este dado vem
dar ênfase ao conceito que a predição do resultado não depende linearmente de um
factor único, mas de uma complexa interacção entre diferentes variáveis biológicas.34


Segundo Israel e Milam et al, o sucesso da artrocentese e da lavagem da ATM, o
procedimento mais simples, no restabelecimento do movimento mandibular em
pacientes com bloqueio articular altera dramaticamente todos os conceitos cirúrgicos,
pois demonstra que a correcta posição do disco articular não é um critério para o
sucesso do tratamento. É assumido que a sinuvite ou inflamação dos tecidos
retrodiscais, frequentemente observada na artroscopia, pode ser responsável pela dor
articular e mobilidade discal alterada.20


No entanto, Al-Belasy refere num seu artigo, cujo objectivo foi rever a eficácia da
artrocentese em tratamentos de pacientes com bloqueio da ATM, que a maioria dos
estudos publicados sobre este tema apresentam metodologias imperfeitas, ainda que
indiquem que a artrocentese pode ser benéfica para pacientes com bloqueio articular.
Al-Belasy defende que o resultado das cirurgias de ATM deve ser reportados a uma
categoria específica de DTM.40



3.2.2 Artroscopia


A artroscopia é uma técnica cirúrgica que tem sido defendida para o tratamento de
uma variedade de disfunções da ATM, desde hipomobilidade secundária a luxação
discal com ou sem redução, adesões, hipermobilidade, patologia articular
degenerativa inflamatória.21,23


Como modalidade clínica, a artroscopia é descrita como uma técnica segura e
efectiva, que melhora a função mandibular e diminui a dor em paciente com
sintomas severos, relacionados com patologia temporomandibular.20,41



                                            48
É uma técnica minimamente invasiva efectuada, normalmente, sob anestesia geral, e
em bloco operatório.24


A técnica artroscópica envolve a colocação de um artroscópio telescópico, com 1,8 a
2,6 mm de diâmetro, através de uma cânula, adaptado a uma câmara, na cavidade
articular superior da ATM, possibilitando a visualização das estruturas articulares
através da projecção da imagem num ecrã de televisão ou computador, necessitando
que o cirurgião conceptualize uma a imagem tridimensional da articulação numa
imagem bidimensional.1,4,29,24,23,32 De Bont et al, refere como vantagem desta técnica, o
facto que se obter uma visão clara das diferentes superfícies articulares e das relações
anatómicas entre disco e côndilo.41 Posteriormente, duas cânula de irrigação são
colocadas aproximadamente de forma a permitir a livre circulação de fluidos e
acesso à instrumentação na cavidade, onde podem ser inseridas sondas, ganchos,
instrumentos de corte como bisturis ou tesouras, fórceps de biopsias, dispositivos de
aspiração, instrumental rotatório, electrobisturis ou lasers. (vide Fig.14) 24,29,31




                Fig. 14 – Artroscopia da Articulação Temporomandibular (Miloro, 2004)


A cavidade articular é examinada e instrumentada, sistematicamente, de posterior
para anterior, permitindo identificar, na zona posterior, adesões tecidulares, a união
entre o bordo posterior do disco e os tecidos retrodiscais, presença de alterações
degenerativas na cartilagem articular ou presença de corpos estranhos. Caso exista



                                              49
uma perfuração do disco articular é, também, possível visualizar a cavidade articular
inferior e o côndilo mandibular. O conteúdo sinovial pode ser recolhido para análise
de forma a confirmar a presença de inflamação. Através da cânula de irrigação
podem ser introduzidos diversos instrumentos, caso se verifique necessário.


Após a observação e instrumentação, a cavidade articular é submetida a um processo
de lavagem com o objectivo de remover adesões, bridas e coágulos sanguíneos, tal
como os mediadores inflamatórios presentes na articulação.24 Essa lavagem pode ser
iniciada com a infiltração inicial de anestésico (por exemplo bupivacaína a, 0,2%),
que tem como objectivo a diminuição da dor no pós-operatório, seguida da
infiltração da solução salina estéril ou solução de Ringer, promovendo um fluxo,
intermitentemente sob pressão, que induz a remoção de adesões e outros detritos da
cavidade articular. Na fase final pode ser realizada uma infiltração com
betametasona, um corticóide, na tentativa de diminuir a inflamação na cavidade
articular, e hialuronato de sódio, fármaco constituído por ácido hialurónico, um
polímero natural da família dos glicosaminoglicanos (GAG), importante constituinte
importante da matriz extracelular e que está presente, em concentrações
particularmente elevadas, nas cartilagens e no líquido sinovial, com o intuito de
promover a lubrificação temporária da articulação, durante o período inicial de
recuperação. 1


A fase pós-operatória é idêntica à descrita para a técnica da artrocentese, sendo
indicado ao paciente uma dieta mole e exercícios, controlados, de abertura
mandibular, por alguns dias.4,24,29,35 Frequentemente, e caso seja necessário,
aconselhada uma terapêutica farmacológica de suporte, constituída por analgésicos
ou AINE’s.22,24,29,35


As vantagens desta técnica resumem-se ao facto de ser uma intervenção
minimamente invasiva, com incisões pequenas, causadora de menor trauma articular
quando comparada com a cirurgia aberta, implicando uma breve estadia no hospital.
Os pacientes apresentam uma rápida recuperação, sendo frequente a dor pós-
operatoria de rápida resolução. Já as desvantagens referem-se às limitações cirúrgicas
e à necessidade de equipamento sofisticado.21,22,29



                                           50
As complicações decorrentes deste tipo de intervenção são raras e maioritariamente
limitadas a efeitos reversíveis. Estão descritas na literatura, como complicações desta
técnica, diversas situações tais como o extravasamento ou perfuração para além da
cavidade articular, podendo provocar a lesão de estruturas nobres adjacentes, lesão
total ou parcial do nervo auriculotemporal e mentoniamo, hemorragia intra-articular
ou dos tecidos retrodiscais, fracturas de instrumentos ou lesão da membrana
timpânica.23


Em 2004, Vecino et al, avaliaram a eficácia do tratamento artroscópico, mediante lise
e lavagem articular, de um grupo homogéneo de pacientes diagnosticados com DTM,
segundo parâmetros clínicos e radiológicos. Foram sujeitos a cirurgia artroscópica 13
pacientes (22 articulações), com uma média de idade de 31 anos, em que 92%
apresentavam factores predisponentes à DTM. As variáveis observáveis foram: dor
articular, avaliada através de uma escala VAS, ruídos articulares, abertura máxima,
protrusão máxima, lateralidade máxima, dieta tolerada pelo paciente, utilização de
goteira de relaxamento muscular, achados artroscópicos, complicações da técnica e
consumo de recursos da mesma. Cerca de 76% dos pacientes referiram a dor como
principal sintoma.
Após a artroscopia verificaram que 80% dos casos apresentavam uma diminuição da
dor, 100% apresentavam uma melhoria na abertura máxima, 92% aumentaram a
protrusão, 84% e 92% obtiveram uma melhoria na lateralidade direita e esquerda,
respectivamente. Verificaram também que em 63% das articulações desapareceram
os ruídos articulares.
Ao fim de 12 meses foi realizada uma nova observação, em que verificaram que as
melhorias obtidas com a artroscopia se mantiveram, sem alteração estatística
significativa.
Assim,segundo os critérios de Murakami, este estudo demonstra uma taxa de êxito
de 23%, resultados satisfatórios na ordem dos 77%, sendo que 50% dos últimos se
encontravam num estado avançado de DTM.
Não foi detectada nenhuma complicação pós-operatória, ainda que 61% dos
pacientes tenho recebido uma infiltração articular com corticóides por apresentarem
sinais de sinuvite.42




                                          51
Vários são os autores que apresentam nos seus estudos resultados semelhantes,
confirmando o sucesso destas técnicas cirúrgicas. Segundo Barkin (2000), a cirurgia
artroscópica foi preconizada como um método seguro, minimamente invasivo e
efectivo no tratamento de desarranjos internos da ATM, reduzindo a dor e
aumentando a amplitude de movimentos mandibulares em aproximadamente 80%
dos pacientes. Apesar de stes resultados serem encorajadores, eles são amplamente
baseados em estudos retrospectivos, de curto prazo e incontrolados. O mesmo autor
refere que o facto da lise e lavagem, apenas da cavidade articular superior, sem o
reposicionamento do disco, produzir resultados clínicos de sucesso, suscitou a
questão acerca da importância da posição do disco articular como factor etiológico
da DTM.44 O mesmo autor refere ainda que, apesar de estudos restrospectivos,
aleatórios e de curto prazo, indicarem que a artrocentese e artroscopia apresentam
taxas de sucesso semelhantes, no tratamento de bloqueios articulares agudos, faltam
estudos similares a longo prazo. Até serem apresentados, os papéis da artrocentese e
artroscopia no tratamento das DTM continuam pouco claros.43


Também Dolwick (2007) refere que o sucesso desta técnica, determinado pela
diminuição da dor e aumento do movimento mandibular, varia entre 79% a 83%,
embora refira que os efeitos terapêuticos da artroscopia e artrocentese, necessitam de
ser avaliados em estudos prospectivos aleatórios.24


Fridich et al e Murakami et al, relataram resultados de comparações prospectivas
entre a artroscopia e artrocentese no tratamento de DTM. Fridich et al, estudaram 19
pacientes aleatórios, repartidos por dois grupos, tendo sido um grupo submetido a
artroscopia com lise e lavagem, sob anestesia geral e o outro grupo submetido a
artrocentese com distensão hidráulica e lavagem, sob sedação intravenosa.24
Concluiu-se que não existem diferença estatística significante nos resultados dos dois
grupos, sendo que a taxa de sucesso da artrocentese foi de 82% e da artroscopia de
75%, e que ambas as modalidades são úteis no diminuição da dor e aumento da
mobilidade mandibular. 21,30
No seu estudo, Murakami et al confirmaram os achados de Fridich et al.
Compararam também os resultados obtidos com artroscopia com os resultados
obtidos através de tratamentos não cirúrgicos, tendo concluído que a artroscopia é



                                          52
indicada para os pacientes com bloqueio articular agudo, refractário ao tratamento
não cirúrgico e manipulação manual.21


Num outro estudo de Ohnuki et al (2006) foram avaliadas as alterações na posição,
mobilidade e morfologia do disco articular em pacientes com DTM, submetidos a
quatro tratamentos diferentes, terapia com goteiras, manipulação, artrocentese e
artroscopia. Todos os pacientes apresentavam deslocamento anterior do disco, sem
redução, antes do tratamento. Verificou-se que, após o tratamento, apenas 10% dos
pacientes apresentava uma luxação com redução, concluindo-se que, apesar do alivio
dos sintomas, e após qualquer tratamento, na grande maioria dos casos, a luxação
discal pré-existente não sofre alteração. Já em relação à posição do disco, verificou-
se que nos pacientes submetidos a artroscopia, este se encontrava numa posição mais
anterior. Verificou-se também que a mobilidade articular verificou aumentos, em
todos os casos. No entanto a deformação do disco avançou, nos pacientes submetidos
a técnicas cirúrgicas.44


Na tentativa de determinar a importância da posição, morfologia e mobilidade do
disco, Sato et al, (1999) analisaram imagens de RMN de 24 articulações (21
pacientes) que não receberam tratamento por mais de 1 ano e foram examinados
depois, de uma média, de 27,1 meses. Apesar de todos os discos continuarem com
luxações anteriores sem redução, os sinais e sintomas foram aliviados durante o
tempo de follow-up. O disco apresentava uma forma bicôncava em apenas 2
articulações (8,3%), alargamento do bordo posterior em 3 (12,5%), espessura
uniforme em 6 (25%), configuração de dobra em 7 (29,2%) e uma configuração
convexa em 6 (25%), na avaliação de follow-up. Estes dados sugerem que a melhoria
de sinais e sintoma não esta relacionada com a melhoria da posição e morfologia
discal, dados que parecem confirmar o estudo anteriormente referido.44


Num outro artigo Mancha de la Plata et al (2008) referem que a cirurgia
artroscópica tem-se revelado efectiva no tratamento de pacientes com DTM,
diminuindo os sintomas e restaurando uma função mandibular normal. Apesar disso,
pacientes que apresentem fracos resultados, devem ser submetidos a outras
modalidades de tratamento, tais como tratamentos não cirúrgicos e cirúrgicos. O
objectivo deste estudo foi verificar qual a taxa de sucesso de uma segunda


                                         53
Tese mestrado   disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento
Tese mestrado   disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento
Tese mestrado   disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento
Tese mestrado   disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento
Tese mestrado   disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento
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Tese mestrado   disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento
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Tese mestrado   disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento
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Tese mestrado disfunção temporomandibular - técnicas cirúrgicas de tratamento

  • 1. Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz Mestrado Integrado em Medicina Dentária Disfunção Temporomandibular: Técnicas Cirúrgicas de Tratamento Candidatura ao Grau de Mestre em Medicina Dentária Orientador: Prof. Doutor Paulo Maurício Candidata: Ana Pacheco Afonso Monte de Caparica, Setembro de 2009
  • 2. Agradecimentos Ao Professor Doutor Paulo Maurício, orientador deste trabalho, não só pela dedicação, disponibilidade e confiança, mas pelas críticas e sugestões relevantes, fundamentais para a sua elaboração. Agradeço, igualmente, a atenção com que sempre acompanhou o meu percurso académico. Ao Dr. André Almeida, com quem dei os primeiros passos nesta área, pela amizade, disponibilidade e ajuda incondicionais, com que sempre pude contar, e também pelos seus sábios conselhos, recomendações e contagioso entusiasmo. Ao Dr. João Rua, Dr. João Coelho, Dra. Catarina Carvalho e Dra. Eunice Neutel, por todos os longos dias que passámos juntos, durante mais um ano lectivo, que me fizeram crescer como pessoa e profissional. Ao Dr. João Gonçalves, pela enorme ajuda, valiosa paciência e compreensão perante as dificuldades, mas sobretudo, pela grande amizade. À minha família, por me incutirem o interesse pelo estudo, mas, especialmente à minha Mãe, a quem devo todo este percurso. Agradeço-lhe por nunca me deixar desistir e por exigir que, ao longo da minha vida, eu faça sempre mais e melhor. Ao Duarte e ao Duda, por todo o apoio, pela compreensão, tolerância e ternura que manifestaram, pela ajuda e motivação, pela companhia, enfim… por tudo! A todos os amigos muito obrigado, porque nenhum caminho é longo demais quando os amigos nos acompanham… 2
  • 3. Resumo A disfunção temporomandibular (DTM) é uma patologia de etiologia multifactorial, classificada como disfunção músculo-esquelética com envolvimento da articulação temporomandibular (ATM), músculos mastigadores e estruturas adjacentes. Os sinais e sintomas associados incluem dor severa, disfunção e ruídos articulares. Este trabalho tem por objectivo realizar uma revisão da literatura disponível acerca deste problema, bem como apresentar as diferentes opções terapêuticas descritas para a sua resolução, comparando-as e avaliando a sua taxa de sucesso. Os resultados demonstram que a artrocentese se apresenta como uma modalidade terapêutica simples e eficaz. Apesar de não alterar a posição discal, melhora significativamente a dor e promove o aumento da mobilidade mandibular. Por outro lado, a cirurgia artroscópica apresenta, também, resultados satisfatórios na redução de sinais e sintomas relacionados com DTM. No entanto, a literatura parece ser consensual na abordagem das diferentes opções terapêuticas existentes, relegando para última opção as intervenções de natureza cirúrgica, por considerar que estas apenas devem ser contempladas quando o tratamento conservador não demonstrar eficácia na resolução do problema. Palavras – Chave Articulação Temporomandibular; Disfunção Temporomandibular; Modalidades de tratamento; Cirurgia 3
  • 4. Abstract The temporomandibular disorder (DTM) is a disease with multifactorial etiologies, classified as a musculoskeletical affection with involvement of the temporomandibular joint (TMJ), the masticatory muscles and adjacent structures. The signs and symptoms include severe pain, dysfunction and articular sounds. The aim of this work is to review the available literature on this problem, and to describe the different therapeutic approaches for its resolution, comparing them and valuating their rate of success. The results show that the arthrocentesis is a simple and efficient treatment approach. Despite of not changing the disk position, it improves significantly the pain and improves the range of motion. On the other hand, the arthroscopic surgery shows, as well, satisfactory results on the reduction of both signs and symptoms DTM related. However, it seems to be consensual that, from the several treatment options, the surgical approaches must be relegated to the last option, considering that these must only be contemplated when the non-invasive approach is not successful in the resolution of the problem. Key-Words Temporomandibular Joint, Temporomandibular Joint Dysfunction; Treatment Modalities, Surgery 4
  • 5. Índice I. Introdução 10 II. Desenvolvimento 12 1. ArticulaçãoTemporomandibular 12 1.1 Anatomia da Articulação Temporomandibular 12 1.1.1 Superfícies Articulares 12 1.1.2 Disco Articular 13 1.1.3 Meios de União 15 1.1.4 Sinoviais 15 1.1.5 Tecidos Retrodiscais 16 1.1.6 Vascularização e Inervação 16 1.2 Músculos Mastigatórios 17 1.3 Biomecânica da Articulação Temporomandibular 20 2. Disfunção da Articulação Temporomandibular 22 2.1 Definição 22 2.2 Epidemiologia 23 2.3 Etiologia 25 2.3.1 Factores Anatómicos 25 2.3.2 Trauma 26 2.3.3 Factores Patofisiológicos 27 2.3.4 Factores Psicossociais 27 2.4 Critérios de Diagnóstico 28 2.5 Disfunção da Articulação Temporomandibular 30 2.5.1 Disfunção por Desarmonia Discal 31 2.5.1.1 Luxação Discal com Redução 33 2.5.1.2 Luxação Discal sem Redução 34 2.5.2 Disfunções Inflamatórias da Articulação 35 2.5.2.1 Sinuvite / Capsulite / Retrodiscite 35 2.5.2.2 Osteoartrite 35 2.5.3 Anquilose 36 2.5.4 Incompatibilidades Estruturais das Superfícies Articulares 36 2.5.4.1 Alterações morfológicas 36 5
  • 6. 2.5.4.2 Aderências e Adesões 36 2.6 Tratamentos de Disfunção Temporomandibular 37 2.6.1 Tratamentos Conservadores ou Reversíveis 38 2.6.1.1 Educação e Auto-controlo 38 2.6.1.2 Terapia Farmacológica 38 2.6.1.3 Terapia Física 39 2.6.1.4 Goteiras 39 2.6.2 Tratamentos não conservadores 40 2.6.2.1 Terapia Oclusal 40 2.6.2.2 Tratamentos Cirúrgicos 41 3. Técnicas Cirúrgicas de Tratamento de Disfunção Temporomandibular 42 3.1 Indicações 42 3.2 Técnicas Cirúrgicas 43 3.2.1 Artrocentese 44 3.2.2 Artroscopia 48 3.2.3 Artrotomia 54 3.2.3.1 Reposicionamento Discal 56 3.2.3.2 Discectomia 57 IV. Conclusão 60 V. Bibliografia 63 6
  • 7. Índice de Figuras Figura 1 – Estruturas ósseas da ATM, vista sagital; 13 Figura 2 – Côndilo Articular; 13 Figura 3 – Articulação Temporomandibular. Diagrama representativo dos 14 diferentes componentes anatómicos; Figura 4 – Relação entre estruturas nervosas, vasos sanguíneos e músculos 17 suprahióideus; Figura 5 – Músculo Temporal; 18 Figura 6 – Músculo Masséter; 18 Figura 7 – Músculo Pterigóideu Lateral; 19 Figura 8 – Músculo Pterigóideu Medial; 19 Figura 9 – Músculo Digástrico; 20 Figura 10 - Esquema representativo da função articular normal durante o 22 movimento de abertura e encerramento mandibular; Figura 11 – Luxação Discal com Redução; 33 Figura 12 – Luxação Discal sem Redução; 34 Figura 13 - Artrocentese da Articulação Temporomandibular 45 Figura 14 – Artroscopia da Articulação Temporomandibular; 49 Figura 15 – Cirurgia aberta funcional da ATM; 55 7
  • 8. Índice de Tabelas Tabela 1 – Estudo comparativo sobre a prevalência de Sinais e Sintomas de DTM, Okeson; 24 Tabela 2 – IHS 11: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção do crânio, nariz, olhos, ouvidos, seios perinasais, dentes, cavidade oral ou outras estruturas cranianas; 29 Tabela 3 - Modificação da classificação diagnóstica recomendada para a IHS 11.7.1: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção da ATM; 29 Tabela 4 - Classificação de Wilkes para os desarranjos internos da ATM; 31 8
  • 9. Lista de Siglas ATM - Articulação Temporomandibular; DTM - Disfunção Temporomandibular; IHS – International Headache Society; AAOP – American Academy of Orofacial Pain; RDC/TMD – Research Diagnostic Criteria of Temporomandibular Disorders; ADA – American Dental Association; AI E – Anti-inflamatórios Não Esteróides; RM – Ressonância Magnética Nuclear; EEG – Estimulação electrogalvânica; TE S – Estimulação Nervosa Eléctrica Transcutânea; GAG – Glicosaminoglicanos; 9
  • 10. I. Introdução O sistema mastigatório é a unidade funcional do organismo que, fundamentalmente, se encarrega da mastigação, fala e deglutição. É extremamente complexo e muito sofisticado, formado sobretudo por ossos, músculos, ligamentos e dentes, controlados por um sistema neurológico altamente especializado.1 O conhecimento profundo da anatomia, fisiologia e biomecânica da articulação temporomandibular (ATM) é fundamental para compreender em detalhe o fenómeno da oclusão, permitindo entender como a ATM normal e saudável se comporta, possibilitando ainda diagnosticar os problemas existentes quando o sistema articular não funciona devidamente.2 Em suma, deve conhecer-se a função para compreender a disfunção. 1 A disfunção temporomandibular (DTM) é uma patologia de etiologia multifactorial, com uma elevada taxa de incidência, que se define como um conjunto de condições caracterizadas pela presença de dor na articulação e estruturas circundantes, limitações funcionais da mandíbula e / ou ruídos durante a função mandibular.3 A DTM afecta milhões de pacientes em todo o mundo.4 Para a tratar eficazmente torna- se indispensável conhecer, com detalhe, as diferentes alterações articulares e musculares, que podem estar na sua origem, bem como a variedade de factores etiológicos conhecidos: factores anatómicos; trauma; factores patofisiológicos; factores psicossociais.1 O diagnóstico é obtido através de uma avaliação cuidadosa da informação procedente da história clínica e dos métodos de exploração. O presente trabalho pretende estudar e compreender a problemática desta patologia. Para atingir o objectivo, esta dissertação encontra-se dividida em três partes distintas. A primeira parte dedica-se ao estudo das diferentes estruturas anatómicas envolvidas, essenciais para a compreensão da disfunção articular. A segunda e terceira partes incidem nos aspectos clínicos da DTM e apresentam as diversas opções terapêuticas preconizadas para a sua resolução, abordando com maior profundidade as diferentes técnicas cirúrgicas descritas na literatura, comparando-as entre si, de forma a poder retirar conclusões quanto às suas indicações específicas, avaliação de resultados clínicos e critérios determinantes para o seu sucesso. 10
  • 11. As estruturas anatómicas envolvidas na disfunção temporomandibular, e responsáveis pela biomecânica da ATM, incluem as superfícies articulares dos ossos temporal e mandíbula, disco articular, meios de união constituídos pela cápsula articular, ligamentos de reforço e acessórios, sinoviais e tecidos retrodiscais, e os músculos responsáveis pelo controlo do movimento mandibular. As alterações estruturais que podem ocorrer a nível anatómico consideram-se factores predisponentes à ocorrência de DTM. Deve também ser considerado todo o sistema vascular e nervoso da ATM, pois algumas das técnicas cirúrgicas descritas apresentam como possível complicação a lesão destas estruturas nobres. A ausência de um sistema de critérios de diagnóstico padronizado e unanimemente aceite para a caracterização da disfunção temporomandibular conduziu a que vários autores e instituições tais como, Welden Bell (1960), Farrar (1972), Block (1980), International Headache Society (IHS) (1988), entre outros, desenvolvessem sistemas de classificação de DTM. Actualmente, os sistemas propostos pela American Academy of Orofacial Pain (AAOP) em 1996, com actualização em 2008, e pelo Research Diagnostic Criteria of Temporomandibular Disorders (RDC/TMD), através de Samuel Dworkin e Linda LeResche em 1992, são os mais referenciados na literatura, promovendo novas linhas de orientação para um correcto diagnóstico e comunicação entre clínicos e investigadores.3 A modificação dos critérios da IHS para a cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção temporomandibular, proposta pela AAOP em 2008, permite diagnosticar diferentes patologias articulares dividindo-as em função dos sintomas comuns e subdividindo- as de acordo com a estrutura articular afectada. As diferentes disfunções da ATM requerem abordagens terapêuticas, conservadoras ou não conservadoras, que variariam dentro de um amplo espectro de tratamentos, incluindo diferentes técnicas cirúrgicas, para a sua correcção.4 11
  • 12. II. Desenvolvimento 1. Articulação Temporomandibular A articulação temporomandibular refere-se à articulação entre a mandíbula e o osso temporal, que se classifica como bicondilomeniscartrose conjugada,5 sendo constituída pelas superfícies articulares, côndilo mandibular e cavidade glenóide do temporal, com interposição de um disco fribrocartilaginoso, o disco articular.1 1.1. Anatomia da Articulação Temporomandibular Anatomicamente distinguem-se as superfícies articulares, disco articular, meios de união, sinovial, tecidos retrodiscais, estruturas vasculares e nervosas.1,6,7 1.1.1 Superfícies Articulares Diferente, em composição e desenvolvimento, de todas as outras articulações, a superfície articular da ATM é coberta por fibrocartilagem, conferindo-lhe maior resistência às forças oclusais e de movimento, sendo menos susceptíveis aos efeitos da idade, o que se traduz numa menor probabilidade de ruptura ao longo do tempo e numa maior capacidade de regeneração.7,8 A superfície articular do temporal é constituída pelo côndilo do temporal (vide Fig.1) ou eminência articular, também denominada raiz transversa da apófise zigomática, e pela cavidade glenóide. A eminência articular apresenta-se convexa da frente para trás e ligeiramente côncava de fora para dentro.5 O grau de convexidade anteroposterior desta superfície articular, bastante variável, condiciona o trajecto do complexo côndilo-disco durante o movimento de translação da mandíbula, tendo sido referida por autores como Cardoso et al (2005), como um dos factores etiológicos de hipermobilidade articular.9 12
  • 13. Figura 1 – Estruturas ósseas da ATM, vista sagital. FM – Cavidade Glenóide; EA – Eminência Articular; Okeson, 2003; O côndilo da mandíbula (vide Fig.2) constitui a superfície articular mandibular, sendo descrito como uma superfície elíptica em que podem ser observadas duas projecções denominados pólos, um lateral e outro medial, habitualmente mais proeminente. A verdadeira superfície articular abrange a zona superior do côndilo, como se observa na Fig. 2.5 Figura 2 – Côndilo Articular. A – Imagem anterior; B – Imagem posterior; A linha marcada delimita a superfície articular (Okeson, 2003) 1.1.2 Disco Articular O disco articular é a estrutura fibrocartilagínea responsável pela correcta adaptação entre as superfícies articulares, apresentando uma forma elíptica adequada à interposição entre as estruturas ósseas mandibular e temporal,5 formado por tecido conjuntivo fibroso desprovido de vasos sanguíneos ou fibras nervosas.1 Quando observado no plano sagital, é possível verificar que a espessura do disco varia, aumentando do centro para a periferia. A área central, denominada zona 13
  • 14. intermédia, é, numa situação normal, ocupada pelo côndilo, apresentando uma espessura mínima, que aumenta significativamente no sentido anteroposterior, ainda que o bordo posterior se apresente, normalmente, mais espesso que o bordo anterior.1 Numa observação frontal é possível verificar a existência de um espaço medial, entre o côndilo e a cavidade glenóide, mais amplo, ocupado pelo bordo medial do disco, também mais espesso que o bordo lateral.1 A morfologia desta estrutura, além da sua capacidade de flexão, permite a sua adaptação às exigências funcionais, excepto quando é submetida a forças não fisiológicas e destrutivas ou alterações estruturais da própria articulação.1 A estabilidade do disco articular é garantida pelas estruturas às quais se encontra unido, tais como os tecidos retrodiscais na região posterior, cápsula articular, na região superior, inferior e anterior, e fibras tendinosas do músculo pterigóideu lateral, na região anterior.1 (vide Fig. 3) Figura 3 – Articulação Temporomandibular. Diagrama representativo dos diferentes componentes anatómicos. CI – Cavidade articular inferior; CS – Cavidade articular superior; LCA – Ligamento Capsular Anterior (Cápsula Articular Anterior); LRI – Lamina Retrodiscal Inferior; LRS – Lamina Retrodiscal Superior; PLI – Musculo Pterigóideu Lateral Inferior; PLS – Musculo Pterigóideu Lateral Superior; SA – Superfície Articular; TR – Tecidos Retrodiscais; (Okeson, 2003) 14
  • 15. 1.1.3 Meios de União Como foi referido anteriormente, as superfícies articulares mantêm-se numa posição estável devido à presença da cápsula articular, que envolve toda a articulação, reforçada por dois ligamentos, lateral e medial,5 que, como em qualquer outro sistema articular, desempenham um papel importante na protecção das estruturas, não desenvolvendo uma função activa, mas pelo contrário, constituindo um mecanismo de limitação passiva ao movimento articular.1 Os ligamentos são compostos por tecido conjuntivo colagenoso, não distensível, excepto em situação patológica, alterando a sua capacidade funcional, e consequentemente, a função articular. 1 A cápsula articular, capaz de opor resistência a forças nocivas à ATM, adere ao disco interarticular em toda a sua extensão, através de fibras longas superficiais que se estendem do temporal à mandíbula, e de fibras curtas responsáveis pela união das estruturas ósseas ao disco, promovendo a divisão da cavidade articular em duas porções, uma temporomeniscal, e outra meniscomandibular, capazes de reter o liquido sinovial essencial ao bom funcionamento da articulação.5 Os ligamentos acessórios, ligamento esfenomandibular, estilomandibular e pterigomandibular, apenas contribuem para a manutenção da posição das superfícies articulares de forma indirecta.1,5 1.1.4 Sinoviais O disco interarticular, unido à cápsula articular, divide a cavidade articular em duas porções, pelo que podemos considerar duas sinoviais distintas, uma superior, entre o temporal e o disco, e uma inferior, entre o disco e o côndilo da mandíbula.5 As superfícies internas das cavidades estão rodeadas por células endoteliais especializadas que formam um revestimento sinovial que, em conjunto com uma franja sinovial especializada, situada no bordo anterior dos tecidos retrodiscais, produz o líquido sinovial, que preenche ambas as cavidades articulares. Este líquido sinovial tem duas finalidades, dado que as superfícies da articulação são avasculares 15
  • 16. o liquido sinovial actua como meio para o aporte das necessidades metabólicas destes tecidos, actuando também como lubrificante entre as superfícies articulares durante a sua função.1 1.1.5 Tecidos Retrodiscais A porção posterior da ATM é constituída por uma zona denominada zona bilaminar, formadas por duas lâminas, superior e inferior, entre as quais se encontra o genu vasculosum com numerosos vasos, nervos e tecido adiposo. O estrato superior, responsável pelo movimento de recolhimento do disco articular, especialmente na fase inicial de encerramento mandibular, é composto por uma rede de fibras elásticas e colegeneas, tecido adiposo e vasos sanguíneos. Em contraste, o estrato inferior, uma das estruturas responsáveis pela estabilização do disco articular sobre o côndilo, é composto por finas fibras colageneas, pobremente organizadas.7 Segundo Schumolke, existem ainda algumas questões, relacionadas com a anatomia da ATM, que não se encontram ainda completamente esclarecidas, podendo, consequentemente, limitar a compreensão de mecanismos de funcionamento articular.10 1.1.6 Vascularização e Inervação A irrigação sanguínea da ATM encontra-se mantida pelos diferentes vasos que a rodeiam, predominantemente pela artéria temporal superficial, artéria meníngea média e artéria maxilar interna, mas também pela artérias auricular profunda, timpânica, anterior faríngea ascendente, e artéria alveolar inferior, sendo a última responsável pelo aporte sanguíneo do côndilo mandibular através dos espaços medulares, tal como os pequenos vasos que se situam directamente na zona condilar.1,5,6,7 A inervação sensitiva e motora da ATM, tal como dos músculos que a controlam, é assegurada pelo nervo trigémio, nervo auriculotemporal, masséter e temporal profundo.1,5,6,7,11 (vide Fig. 4) O conhecimento destas estruturas é de extrema importância, pois a sua lesão é umas das principais complicações decorrentes de qualquer procedimento terapêutico invasivo na ATM. 16
  • 17. Figura 4 – Relação entre estruturas nervosas, vasos sanguíneos e músculos suprahioideus (Moore, 2002) 1.2 Músculos da Mastigação A união de todos os componentes ósseos do corpo é da responsabilidade do sistema muscular, sendo o grupo de interesse do presente trabalho, o dos músculos mastigadores, no qual estão incluídos o temporal, masséter, pterigóideu lateral e medial, que representam estruturas de extrema importância no estudo de DTM, pois são constituintes do complexo articular, e consequentemente são sujeitos a ser alvo de disfunção.1,5,6 O músculo temporal, grande, plano e radiado, ocupa a fossa temporal, desde onde os seus três feixes distintos, diferenciados com base na orientação das fibras em anterior, médio e posterior, convergem ate à apófise coronóide da mandíbula, cobertos por uma fáscia muscular. (vide Fig.5) A contracção simultânea dos três feixes musculares promove a elevação da mandíbula, como somatório da acção independente de cada um dos feixes, dado que a contracção porção anterior apenas promove a elevação da mandíbula, o feixe médio, quando contraído, provoca retrusão e o posterior tem acção em ambos os movimentos. 1,5,6 17
  • 18. Figura 5 – Musculo Temporal. A. PA – Porção Anterior; PM – Porção Média; PP – Porção Posterior; B. Função: Elevação da Mandíbula (Okeson, 2003) O músculo masséter é um músculo curto, grosso e rectangular, também constituído por dois feixes, superior e profundo, que estende desde o arco zigomático à face lateral do ramo da mandíbula, sendo um dos músculos com função de elevação da mandíbula, ainda que a contracção da sua porção superficial possa facilitar a protrusão mandibular.1,5,6 (vide Fig.6) Figura 6 – Musculo Masséter. A. PP – Porção Profunda; PS – Porção Superior; B. Função: Elevação da mandíbula (Okeson, 2003) O pterigóideu lateral é um músculo curto, grosso, aplanado transversalmente, e está situado na região infratemporal, estendendo-se desde a apófise pterigoideia ao colo do côndilo da mandíbula, (vide Fig.7) dividindo-se em dois fascículos, cuja contracção simultânea bilateral, e acompanhada da contracção dos músculos depressores da mandíbula promove o movimento de translação mandibular acompanhado de protrusão da mesma, enquanto a sua contracção unilateral origina um movimento de lateralidade da mandíbula para o lado contrário. No entanto o 18
  • 19. feixe superior do pterigóideu lateral, que se encontra unido ao disco articular, anteriormente, só actua simultaneamente com os músculos elevadores, sendo muito activo no encerramento forçado ou contra uma resistência. É de salientar que aproximadamente oitenta por cento das fibras deste músculo são fibras lentas, o que significa que são relativamente resistentes à fadiga e portanto têm capacidade de suportar o côndilo articular numa posição estável durante longos períodos de tempo.1,5,6 Figura 7 – Músculo Pterigóideu Lateral. A – Feixe superior e inferior do Musculo Pterigóideu Lateral; B - Função: protrusão mandibular (Okeson, 2003) O músculo pterigóideu medial é um músculo grosso e quadrilátero, medial ao pterigóideu lateral, que se estende obliquamente, desde a fossa pterigoideia à face medial do ângulo da mandíbula. (vide Fig.8) A contracção simultânea das suas fibras promovem a elevação da mandíbula, embora apresente também actividade no movimento de protrusão. 1,6 Figura 8 – A - Músculo Pterigóideu Medial; B – Função: Elevação da Mandíbula (Okeson, 2003) 19
  • 20. Apesar de, geralmente, não ser considerado músculo da mastigação, o músculo digástrico detém uma importante influência na função mandibular, sendo responsável pelos movimentos necessários à deglutição. É uma estrutura alongada, formada por dois ventres, um anterior e outro posterior, unidos por um tendão intermédio que se localiza na parte superior e lateral do pescoço estendendo-se ao osso hióide, desde a região mastóideia até às proximidades da sínfise mandibular. (vide Fig.9) Quando a sua contracção simultânea ocorre com o osso hióide fixo pelos músculos supra e infrahioideus, a mandíbula desce e é tracionada para trás ocorrendo abertura mandibular, mas quando a mandíbula esta estável, os músculos digástricos e os músculos infra e suprahióideus elevam o osso hióide.1,5,6 Figura 9 – A - Musculo Digástrico; B – Função: Depressão Mandibular (Okeson, 2003) 1.3 Biomecânica da Articulação Temporomandibular A complexidade deste sistema articular decorre do facto de duas articulações se encontrem conectadas, impondo que cada articulação exerça a sua função combinada e simultaneamente, com a articulação contralateral, assumindo movimentos de rotação e translação tridimensionais, inter-relacionados.1,2 A estrutura anatómica e a função da ATM incluem dois sistemas articulares distintos: o sistema formado pelo côndilo mandibular e disco, também denominado complexo côndilo-discal, decorrente da forte união do disco ao côndilo mandibular, através dos ligamentos de reforço, que apenas possibilita o movimento de rotação entre estas superfícies; e o sistema formado pelo complexo côndilo-discal em relação à 20
  • 21. superfície da cavidade glenóide no qual ocorre um livre movimento de deslocamento anterior do côndilo, na cavidade superior, denominado de translação.1 Para que as superfícies articulares se mantenham em contacto, e não se perda a estabilidade da articulação é necessária uma constante actividade muscular, principalmente dos músculos elevadores da mandíbula. Assim, mesmo numa situação de repouso, os músculos elevadores da mandíbula devem manter um estado de leve contracção denominado tonús muscular.1 O aumento do tonús muscular promove o contacto progressivo do côndilo contra o disco, e deste contra a cavidade glenóide, aumentando assim a pressão interarticular das estruturas, assegurando uma função articular estável, com o côndilo devidamente entreposto numa posição central.10,11 O mecanismo pela qual esta posição é mantida durante os movimentos articulares baseia-se na morfologia do disco e no aumento da pressão interarticular e consequente redução do espaço discal.1 Já os tecidos retrodiscais, aderidos ao bordo posterior do disco articular, também sofrem alterações aquando do movimento mandibular. A lâmina retrodiscal superior, formada por tecido conjuntivo elástico, apresenta uma tracção mínima ou nula sobre o disco, numa situação de encerramento mandibular. No entanto, durante a abertura, quando o côndilo se desloca na direcção da eminência articular, a lâmina retrodiscal distende-se gradualmente, criando forças de retracção sobre o disco até à posição de protrusão máxima, período em que esta força de retracção atinge o seu pico, sendo a retracção excessiva, capaz de induzir alterações de posição e forma no disco, impedida pela actividade da pressão interarticular e pela própria morfologia.1,13 É importante salientar que a lâmina retrodiscal superior é a única estrutura capaz de retrair o disco posteriormente sobre o côndilo, ainda que esta força retráctil só ocorra durante uma abertura mandibular excessiva.1,7 A ATM é uma articulação capaz de executar apenas dois tipos de movimentos, rotação e translação. A rotação ocorre durante o movimento mandibular, na cavidade articular inferior, em torno de um ponto ou eixo de rotação horizontal fixo, também denominado Eixo de Bisagra, sendo este o único movimento de rotação pura produzido pelo aparelho mastigatório. A translação é definida como um movimento em que cada ponto do objecto em movimento simultâneo tem a mesma velocidade e 21
  • 22. direcção. Este movimento acontece na cavidade superior da articulação, quando a mandíbula se desloca anteriormente, efectuando um movimento de protrusão. Durante a maioria dos movimentos mandibulares normais estes dois movimentos são associados, como é possível verificar no seguinte esquema.1,7 Figura 10 – Esquema representativo da função articular normal durante o movimento de abertura e encerramento mandibular (Okeson, 2003) 2. Disfunção Temporomandibular 2.1 Definição Ao longo dos anos, os transtornos funcionais do sistema mastigatório têm sido identificados através de diversos termos, introduzidos por diferentes autores, o que dificulta a comunicação entre clínicos e investigadores. Em 1934, James Costen descreveu uma série de sintomas referentes ao ouvido e à ATM como “Síndrome de Costen”, surgindo posteriormente o termo “transtornos da ATM”. Em 1959, surge, por Shore, a denominação de “Síndrome de Disfunção da 22
  • 23. ATM” e mais tarde surge ainda, por Ash e Ramfjord (1995) a denominação de “Alterações Funcionais da ATM”. Apesar das constantes modificações alguns autores defendiam que estas denominações eram bastante limitativas, pois nem sempre os sintomas se encontravam confinados à articulação, tendo sido aceite pela população cientifica, a denominação de “Transtornos Temporomandibulares”, por Bell (1982).1 As diferentes variações verificadas na nomenclatura contribuíram para uma ampla desordem nesta área de estudo, já por si complicada, o que levou, a American Dental Association (ADA) a adoptar o termo “Disfunção Temporomandibular” referindo-se a todas as alterações do sistema mastigatório, com o objectivo de facilitar a comunicação e coordenação dos trabalhos de investigação.1 A DTM caracteriza-se por um conjunto de condições que envolvem a ATM, músculos da mastigação e estruturas associadas, promovendo dor, limitações funcionais da mandíbula ou ruídos articulares durante a função mandibular.13,14,15 2.2 Epidemiologia Segundo o Dorland´s Illustrated Medical Dictionary a epidemiologia refere-se ao estudo dos factores que determinam ou influenciam a distribuição de uma patologia, lesão ou outros acontecimentos relacionados com a saúde, numa população humana concreta, com o objectivo de execução de programas para prevenir e controlar o seu desenvolvimento e dispersão.1 Inúmeros estudos epidemiológicos tentaram demonstrar a prevalência de DTM em determinadas populações, alguns dos quais, foram comparados por Okeson et al, na seguinte tabela.1 (vide Tabela 1) 23
  • 24. Sinais e Sintomas de DTM nas populações estudadas Prevalência (%) Pelo Nº de Mulheres Nº de Pelo menos 1 menos / Idade População Indivíduos sintoma 1 sinal Homens Clínico Estudantes 739 370/369 19-25 26 76 universitários, EUA 384 198/186 70 Jubilados, Suécia 59 37 Trabalhadores, 583 441/256 18-64 58 86 Finlândia 389 0/389 21-54 Reservistas, Suécia 15 60 440 218/222 7-14 Crianças, Suécia 36 72 309 162/147 15-18 Crianças, Suécia 41 77 136 74/62 7 Crianças, Suécia 39 33 131 61/70 11 Crianças, Suécia 67 46 135 59/76 15 Crianças, Suécia 74 61 1040 653/387 13-86 Consulta privada, EUA 33 50 369 181/188 10-18 Crianças, Israel 56 44 Estudantes de Medicina 222 102/120 19-40 Dentária 39 48 e Higiene Oral 637 323/314 18-46 Adultos, Suécia 14 88 3468 1815/1653 15-74 Nacionais, Holanda 22 45 293 164/129 17-25 Adultos Jovens, Suécia 43 - Adultos, Cidade do 534 317/217 18 - > 65 46 - Kansas Pacientes Ortodôntico 323 146/86 3-29 16 15 Prospectivos Estudantes de Medicina 105 0/105 23 20 56 Dentaria, Arábia Saudita Adultos Maiores, 342 243/99 76-86 80 - Finlândia Total 41% 56% Tabela 1 – Estudo comparativo sobre a Prevalência de Sinais e Sintomas, Okeson (2003) Okeson verificou que a taxa de prevalência, ou seja, a presença de pelo menos um sintoma de DTM, apresenta um valor médio de 41% e a presença de, pelo menos, um sinal clínico foi referido por 56% da população estudada, o que sugere que os sinais e sintomas de DTM são bastante frequentes na população. Este estudo comparativo é considerado uma amostra representativa da população geral, pois apresenta grande heterogeneidade de critérios.1,15 Buescher, no artigo “Temporomandibular Join Disorders” (2007) refere que as DTM são comuns e frequentemente auto-limitadas na população adulta, conclusão obtida a 24
  • 25. partir de literatura revista pelo autor, como estudos epidemiológicos que demonstram uma prevalência de disfunção superior a 75% da população adulta. No entanto é referido pelo autor que apenas 5% dos adultos com sintomas de DTM requerem tratamento e ainda menos desenvolvem sintomas crónicos ou debilitantes.14 A maior prevalência de DTM no sexo feminino é referida por Jerges et al (2008) no artigo de revisão, em que verifica que mulheres, particularmente na 3ª ou 4ª década de vida, apresentam condições severas de disfunção, que incluem cefaleias, tensão muscular e articular e ruídos articulas. É referido também que segundo a literatura, as mulheres são mais conscientes na compreensão e aceitação da problemática da DTM.16 2.3 Etiologia da DTM A etiologia da DTM complexa e multifactorial, ainda apresenta algumas lacunas.1,14 A controvérsia existente acerta da etiologia da DTM deve-se ao facto de existirem diversos factores que contribuem para essa patologia, podendo ser divididos em factores predisponentes, ou seja, factores que podem contribuir para o aparecimento de DTM, factores desencadeantes, que promovem o inicio de DTM ou factores perpetuantes, que impedem o tratamento e favorecem a evolução da DTM. O êxito do tratamento da DTM depende, por vezes, da correcta identificação destes factores.1 A revisão da literatura revela que existem quatro grupos de factores fortemente associados a DTM como factores anatómicos, trauma1,5, factores patofisiológicos3 e factores psicossociais.1,3 2.3.1 Factores Anatómicos De acordo com a literatura disponível, existem dois tipos de factores anatómicos associados a DTM, factores esqueléticos e factores oclusais. No âmbito dos factores esqueléticos, podem ser descritas malformações esqueléticas severas, discrepâncias entre arcadas e na própria arcada, e intervenções dentárias iatrogénicas.3 Como exemplos, Jerges et al referem que a perda de peças dentárias pode contribuir para esta situação, no entanto quadros clínicos que apresentem mordidas abertas, não 25
  • 26. comuns em pacientes assintomáticos, não parecem estar suficientemente relacionadas com deslocamentos do disco articular, com ou sem redução de movimento, tal como não estão demonstradas relações entre DTM e overjet, sobremordidas ou mordidas cruzadas.3,16 Alguns estudos, não todos, sugerem porém, uma associação entre perda de molares e ruídos articulares que podem eventualmente evoluir para bloqueios, outros artigos referem uma alta frequência e severidade de DTM em pacientes com restaurações dentárias, quando comparados com pacientes com dentições intactas.16 Estes são, apenas, exemplos da diversidade de factores possivelmente relacionados, embora ainda sejam considerados bastante controversos. Os factores oclusais podem também estar directamente relacionados com DTM visto que os padrões de contacto oclusal influenciam a função dos músculos mastigatórios. É referido por Okeson, que estes factores são apresentados com alguma controvérsia dado que existem estudos que observam uma relação positiva entre os factores oclusais e os sintomas mastigatórios, embora outros não verifiquem qualquer relação.1 2.3.2 Trauma As estruturas internas da ATM são passíveis de sofrer traumas, classificados em dois grandes grupos, macrotraumas e microtraumas, sendo os primeiros subdividos, em função da sua origem, em directos ou indirectos. São definidos como traumas quaisquer forças bruscas que possam provocar alterações estruturais. 1,3 Os traumas directos, que surgem de um impacto repentino e isolado na mandíbula ou ATM, produzem lesão acompanhada de sinais e sintomas de inflamação, podendo ser acompanhados de uma perda de função consequente à força excessiva exercida e falha estrutural, enquanto os traumas indirectos são relacionados com impactos súbitos, sem contacto directo com a face.1,3 Os microtraumas resultam de forças de pequena magnitude que actuam repetidamente sobre as estruturas, ao longo de muito tempo tendo como por exemplo 26
  • 27. os hábitos parafuncionais. Hábitos como o de ranger e apertar os dentes, morder o lábio e posições alteradas da mandíbula são sugeridos, na literatura, como factores desencadeantes ou perpetuantes em determinados grupos de pacientes com DTM, apesar desta relação não parecer suficientemente esclarecida.1,3 2.3.3. Factores Patofisiológicos Os factores patofisiológicos associados a DTM podem ser divididos em três grupos distintos: factores sistémicos, locais e genéticos. São condições patofisiológicos sistémicas, capazes de influenciar as DTM, as disfunções degenerativas, endócrinas, infecciosas, metabólicas, neoplásicas, reumatológicas ou vasculares.3 Os factores patofisiológicos locais, como a eficiência mastigatória, parecem ser multifactoriais e envolver uma grande variação individual, pelo que se torna difícil estabelecer regras para estes. 3 Existem ainda factores patofisiológicos genéticos associados a DTM. Como exemplo refere-se o Síndrome de Ehlers-Danlos, doença hereditária do tecido conjuntivo, caracterizada clinicamente por hipermobilidade articular, hiperdistensão da pele e fragilidade, decorrentes de defeitos hereditários no metabolismo do colagénio, frequentemente associada a quadros de hipermobilidade e luxação discal.17 2.3.4 Factores Psicossociais Os factores psicossociais incluem variáveis individuais, interpessoais e situacionais, capazes de afectar a capacidade do paciente de se adaptar funcionalmente, encontrando-se descrita na literatura, a associação entre a presença de características psicológicas diferenciais, como stress e factores psicopatológicos, em pacientes com DTM.5 O aumento do stress é considerado um fenómeno sistémico, frequente, capaz de alterar a função mastigatória, aumentando a tonicidade dos músculos e dos níveis de actividade muscular não funcional, sendo verificada simultaneamente uma redução da tolerância fisiológica do paciente.1 27
  • 28. Segundo Jerges et al (2008) eventos associados a uma vida stressada têm sido frequentemente referenciados em grupos com DTM que apresentam frequentemente disfunção muscular, quando comparados com grupo controlo.16 Ansiedade e outras doenças afectivas, particularmente depressão e distúrbios de personalidade, podem ser mais frequentes em grupos de pacientes com DTM do que nos grupos controlo. Jerges et al conclui, num estudo, que 40 % da população do grupo avaliado, satisfaz os critérios de diagnóstico apresentando, pelo menos, um distúrbio de personalidade, sendo o mais frequente a perturbação obsessiva compulsiva.16 2.4 Critérios de Diagnóstico Para tratar eficazmente as DTM é necessário conhecer os inúmeros tipos de patologias que podem existir, tal como a sua etiologia, com o objectivo de estabelecer um diagnóstico correcto. Este é considerado a chave para o êxito do tratamento.1 Durante anos a classificação das DTM foi uma questão problemática, pois foram várias as classificações propostas ao longo dos anos. Autores e instituições como Farrar (1972), Block (1980), International Headache Society (IHS) (1988), entre outros, desenvolveram classificações diferentes, mas que apresentavam algumas lacunas e foram, por isso, sendo ultrapassadas.18 Em 1996, foi apresentado pela American Academy of Orofacial Pain (AAOP), um esquema de classificação, que apesar de ter sofrido algumas alterações, as últimas em 2008, é utilizado actualmente, tendo sido adaptada da classificação preconizada pela IHS, onde a dor associada a DTM é inserida no 11º grupo, como se pode verificar nas seguintes tabelas.3 (vide Tabela 2) 28
  • 29. IHS 11: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção do crânio, nariz, olhos, ouvidos, seios perinasais, dentes, cavidade oral ou outras estruturas cranianas 11.1 Cefaleia atribuída a disfunção dos ossos cranianos 11.2 Cefaleia atribuída a disfunção do pescoço 11.3 Cefaleia atribuída a disfunção dos olhos 11.4 Cefaleia atribuída a disfunção dos ouvidos 11.5 Cefaleia atribuída a rinosinusite 11.6 Cefaleia atribuída a disfunção dos dentes, maxilares ou estruturas relacionadas 11.7 Cefaleia atribuída a DTM 11.8 Cefaleia atribuída a outras disfunções do crânio, pescoço, olhos, nariz, seios perinasais, dentes, cavidade oral ou outras estruturas faciais ou cervicais Tabela 2 – IHS 11: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção do crânio, nariz, olhos, ouvidos, seios perinasais, dentes, cavidade oral ou outras estruturas cranianas (Leeuw, 2008) Na seguinte tabela descrevem-se as alterações efectuadas à classificação do grupo 11.7 definido pela IHS. (vide Tabela 3) Modificação da classificação recomendada para IHS 11.7.1: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção da ATM 11.7.1.1 Disfunção por desarmonia discal 11.7.1.1.1 Luxação discal com redução 11.7.1.1.2 Luxação discal sem redução 11.7.1.2 Sub-luxação da ATM 11.7.1.3 Disfunções Inflamatórias 11.7.1.3.1 Sinuvite e Capsulite 11.7.1.3.2 Poliartrite 11.7.1.4 Disfunções não inflamatórias 11.7.1.4.1 Osteoartrite primária 11.7.1.4.2 Osteoartrite secundária 11.7.1.5. Anquilose 11.7.1.6 Fractura do côndilo mandibular Tabela 3: Modificação da classificação diagnostica recomendada para a IHS 11.7.1: Cefaleia ou dor facial atribuída a disfunção da ATM (Leeuw, 2008) 29
  • 30. As tabelas anteriormente apresentadas, em que as categorias gerais são agrupadas em função dos sintomas comuns e as subdivisões diferenciam-se por determinadas características clínicas, são de extrema importância para o presente trabalho, pois neste subgrupo de DTM estão englobadas as situações de disfunção articular que poderão ser resolvidas, em última análise, com tratamento cirúrgico, assunto que será abordado mais profundamente no seguimento do trabalho.1,3 Existem outras classificações de dor para a região orofacial, propostas por instituições como a International Association for the Study of Pain Classification System, a International Headache Society Classification System e Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorder (RDC/TMD), dignos de referência.1 A RDC/TMD, proposta por Samuel Dworkin et LeReshe, em 1992, tem evidenciado ser superior em relação as outras classificações desde que estes critérios de diagnóstico têm em consideração factores sociais e psicológicos.3,18 Esta classificação divide-se em dois eixos, que podem ser usados para determinar os factores físicos associados a DTM, através do Eixo I, e psicossociais, através do Eixo II.19 Apesar de inúmeros sistemas de classificação terem sido propostos para as DTM, apenas os dois, acima referidos, se encontram em actual utilização, apresentando áreas sobrepostas e concordantes.3 Para a determinação e avaliação do grau de dor experimentado pelos pacientes são utilizadas escalas de dor, tais como, Visual Analogue Scale (VAS), Numerical Scale (NS), Behaviour Rating Scale (BRS) and Verbas Scale (VS), sendo a primeira a mais referenciada na literarura.16 2.5 Disfunção da Articulação Temporomandibular De acordo com a classificação proposta pela AAOP a DTM divide-se em dois grupos distintos, disfunção dos músculos mastigatórios e disfunção da ATM.1,3 30
  • 31. Tal como foi referido anteriormente, é sobre o segundo grupo que se prendem os objectivos neste trabalho, sendo por isso apenas referenciadas patologias e alterações que possam ter indicação para tratamento cirúrgico. As disfunções internas da ATM podem ser divididas em diferentes grupos: disfunção por desarmonia discal; sub-luxação da ATM; disfunções inflamatórias; disfunções não inflamatórias; anquilose3 e ainda alterações estruturais.1 Serão apenas referenciadas as que se encontram no âmbito deste trabalho. 2.5.1 Disfunção por Desarmonia Discal Estas disfunções parecem ter origem na falência da função de rotação normal do disco sobre o côndilo, produzindo consequentemente um estiramento dos ligamentos laterais e da lâmina retrodiscal inferior, e, perda de espessura do bordo posterior do disco, evoluindo para patologias denominadas luxações discais, classificadas em redutíveis ou não redutíveis, com base na capacidade do disco articular de retomar a sua posição fisiológica.1 Frequentemente, a DTM causada por desarmonia interna, é descrita como uma patologia progressiva, que pode ser classificada através de quatro estadios clínicos consecutivos definidos por Wilkes (1978 e 1989), descritos na tabela 4.20,21 31
  • 32. Classificação de Wilkes para os desarranjos internos da ATM I. Estadio Inicial A. Clínica: Sem sintomas mecânicos excepto ruído articular recíproco; ausência de dor e limitação de movimento B. Radiologia: Ligeiro deslocamento anterior; contorno anatómico do disco normal; tomograma negativo; C. Anatomia Patológica: Forma anatómica excelente; ligeiro deslocamento anterior; coordenação passiva demonstrável; II. Estadio Intermediário Inicial A. Clínica: Um ou mais episódios de dor: inicio dos problemas mecânicos major, consistentes com o ruído articular audível no meio/final da abertura; captura transitória e bloqueio; B. Radiologia: Ligeiro deslocamento anterior; inicio da deformidade discal com ligeiro estreitamento do bordo posterior; tomograma negativo; C. Anatomia Patológica: deslocamento anterior do disco, inicio da deformação anatómica do disco; área central articular normal; III. Estadio Intermédio A. Clínica: Múltiplos episódios de dor, sintomas mecânicos, consistentes com bloqueio (intermitente ou completo); restrição de movimentos; dificuldade na função; B. Radiologia: Deslocamento anterior do disco com deformação significativa e prolapso do disco (aumento da perda de espessura do bordo posterior); tomograma negativo; C. Anatomia Patológica: Deformação discal acentuada com deslocamento anterior; Sem grandes alterações tecidulares; IV. Estádio Intermediário Tardio A. Clínica: Ligeiro aumento de severidade do estádio intermédio; B. Radiologia: Aumento de severidade do estádio intermédio; tomograma positivo mostrando alterações degenerativas suaves a moderadas dos tecidos duros, achatamento da eminência, deformação do côndilo mandibular, esclerose; C: Anatomia Patológica: Aumento de severidade do estádio intermédio, alterações degenerativas (osteofitos); adesões múltiplas; ausência de perfuração do disco ou ligamento; V. Estádio Tardio A. Clínica: Crepitações; Episódios de dor; Limitação crónica do movimento; Dificuldade na função; B. Radiologia: Perfuração do disco ou ligamento; Preenchimento dos defeitos; Grande deformidade do disco e tecidos duros; tomograma positivo com alterações artríticas degenerativas; C. Anatomia Patológica: Grandes alterações degenerativas do disco e tecidos duros; Perfuração do ligamento posterior; Adesões múltiplas; Osteofitos; Achatamento do côndilo e eminência articular; formação de quisto subcondral; Tabela 4: Classificação de Wilkes dos desarranjos internos da ATM. (Undt, 2006) 32
  • 33. 2.5.1.1 Luxação Discal com Redução A luxação discal com redução acontece quando ocorre um extenso estiramento da lâmina retrodiscal inferior e dos ligamentos laterais, associado à perda de espessura do bordo posterior do disco, levando-o a ocupar uma posição mais avançada dentro da cavidade articular, sendo classificada de redutível pois o côndilo retoma à sua posição inicial, transpondo novamente o bordo posterior do disco.1,2 (vide Fig.11) Clinicamente, os pacientes experimentam uma limitação da amplitude de abertura mandibular e, no momento em que o disco é reposicionado, verifica-se um desvio de trajectória deste movimento, acompanhado de ruído articular intenso e brusco, audível no momento da recaptura.1,2 O tratamento dos deslocamentos discais e luxações discais com redução tem como objectivo principal restabelecer a relação côndilo-disco normal, reduzindo a dor e disfunção articular.1 Figura 11 – Luxação Discal com Redução. Durante a abertura o côndilo mandibular passa sobre o bordo posterior do disco até à sua zona intermédia, reduzindo a luxação discal (2-4). O restante encerramento e abertura ocorrem sem alterações (5-8). Durante a última fase do encerramento o disco volta a luxar (8-1). (Okeson, 2003) 33
  • 34. 2.5.1.3 Luxação Discal sem Redução Em situações em que é perdida a elasticidade da lâmina retrodiscal superior, a recolocação do côndilo sobre o disco articular deixa de ser possível pois quando o disco não reduz, o movimento de translação força o posicionamento anterior do côndilo, geralmente acompanhado de dor e redução da amplitude mandibular.1,2 (vide Fig.12) Clinicamente pode ser observada, durante o movimento mandibular, uma deflexão mandibular, para o lado afectado. Os movimentos excêntricos não apresentam alterações quando efectuados para o lado afectado, embora os movimentos contralaterais se encontrem limitados. Como é possível verificar na tabela 4, este tipo de luxações parece ter tendência de evolução para a cronicidade.1 Imagem 12 – Luxação Discal sem Redução. O côndilo não adopta uma relação normal com o disco, mantendo-se sempre numa posição anterior. (1-8), (Okeson, 2003) 34
  • 35. 2.5.2 Disfunções Inflamatórias da ATM As disfunções inflamatórias são condições patológicas caracterizadas por dor profunda, contínua, geralmente exacerbada pela função, classificadas de acordo com a estrutura afectada em sinuvite, capsulite, retrodiscite e artrite.1 2.5.2.1. Sinuvite, Capsulite e Retrodiscite A inflamação dos tecidos sinoviais, cápsula articular e tecidos retrodiscais, manifestam-se clinicamente como uma só disfunção, devido à dificuldade inerente de realizar um correcto diagnóstico diferencial. O exame clínico baseia-se na palpação da cápsula articular através do pólo lateral do côndilo, que quando se manifesta através de um quadro clínico de dor e limitação do livre movimento articular, prevê a presença de lesão inflamatória localizada, associada a maloclusão.1 2.5.2.2. Osteoartrite A osteoartrite é uma situação clínica caracterizada pela presença de um processo destrutivo das superfícies articulares ósseas do côndilo e da cavidade glenóide, considerando-se, por vezes, como sendo uma resposta do organismo às cargas excessivas aplicadas nessa zona. Com o passar do tempo a degeneração progressiva provoca a perda do estrato cortical sub-condral, erosão óssea e os consequentes sinais imagiológicos de degradação óssea. É uma patologia descrita como consequência de luxações ou perfurações discais ou dos ligamentos, sendo habitual o aparecimento de ruídos articulares na forma de crepitações, acompanhados de dor e disfunção, acentuada pelos movimentos mandibulares.1 Quando as cargas excessivas aplicadas na zona articular são controladas, o processo artrítico passa a ser um processo adaptativo, denominando osteoartrose, sendo descrita na literatura como uma patologia assintomática, sendo o seu diagnóstico confirmado através de exames imagiológicos, em que é verificável a presença de alterações estruturais do osso subarticular do côndilo mandibular e da cavidade glenóide, como aplanamento, presença de osteofitos ou erosões. 1 35
  • 36. 2.5.3 Anquilose A anquilose, patologia caracterizada por um quadro de hipomobilidade mandibular crónica é uma limitação indolor e de larga duração, devida a aderências fibrosas desenvolvidas nas superfícies intracapsulares da articulação, que impedem os movimentos articulares normais. Pode também ocorrer uma anquilose óssea, em que o côndilo e a cavidade glenóide se encontram verdadeiramente unidos, situação maioritariamente associada a uma infecção prévia, em que se verifica uma neoformação óssea. 1 2.5.4 Incompatibilidades Estruturais das Superfícies Articulares 2.5.4.1 Alterações Morfológicas As alterações morfológicas são caracterizadas por modificações reais da forma das superfícies articulares, produzidas no côndilo e na fossa articular, sob a forma de aplanamento ou formação de protuberâncias, ou no disco, sob a forma de perda de espessura dos bordos do disco e perfurações. A maior parte das alterações torna-se responsável pela disfunção num ponto concreto do movimento de abertura e encerramento, o que a torna muito reprodutível.1 Perante variedade de alterações, e visto que a sua causa é uma modificação real da estrutura, o objectivo de tratamento definitivo é restabelecer a forma normal da estrutura alterada. Esta situação pode ser conseguida através de uma intervenção cirúrgica, técnica bastante agressiva, que só deve ser ponderada quando não há eliminação de sintomas através de técnicas conservadoras.1 2.5.4.2 Aderências e Adesões As aderências e adesões são situações patológicas que ocorrem quando as superfícies articulares sofrem adesão, devido a uma força estática prolongada sobre as estruturas articulares ou por perda de lubrificação efectiva, sendo observadas entre o côndilo e o disco (no espaço articular inferior) ou entre o disco e a cavidade glenóide (espaço 36
  • 37. articular superior), apresentando uma durabilidade temporária (aderências) ou definitiva (adesões), ocorrendo produção de tecido conjuntivo fibroso entre as superfícies articulares e / ou tecidos circundantes.1 Clinicamente, na presença de uma aderência do espaço articular superior, o movimento de translação fica inibido, e, consequentemente, o movimento do côndilo limita-se à sua rotação, provocando a limitação de abertura mandibular. Quando esta situação se prolonga, os ligamentos, anterior e laterais, podem sofrer distensão levando a que côndilo não acompanhe o disco articular no seu movimento de translação. Na condição de fixação definitiva do disco pode ser observado um movimento de abertura relativamente normal da abertura, acompanhado da incapacidade de encerramento, verificando-se um bloqueio articular.1 Dado que as aderências ocorrem como consequência a uma sobrecarga estática e prolongada das superfícies articulares, o objectivo do tratamento passa por reduzir as forças a que a articulação é submetida. Já as adesões, pelo seu carácter definitivo, devem ser removidas, através de um procedimento cirúrgico, como artrocentese ou artroscopia.1 2.6 Tratamentos da DTM O tratamento indicado para DTM baseia-se fundamentalmente em dois factores: no estabelecimento de um diagnóstico correcto e, no conhecimento da evolução natural do processo. De acordo com o estadio da disfunção, é possível situar e acompanhar a sua evolução, definindo as estratégias de tratamento mais adequadas. As diferentes opções terapêuticas visam diminuir a sintomatologia associada, bem como a restituição da função articular.1,20 Parece ser consensual a indicação de tratamentos conservadores como primeira intervenção no tratamento da disfunção articular. No caso de estes se revelarem ineficazes, devem ser ponderados os tratamentos não conservadores ou irreversíveis.1,11, 16, 20, 23-24 37
  • 38. 2.6.1 Tratamentos Conservadores ou Reversíveis Os tratamentos conservadores ou reversíveis permitem modificar o estado oclusal do paciente temporariamente. São conhecidas diversas opções terapêuticas que incluem educação e auto-controlo do paciente, terapia farmacológica, terapia física e utilização de dispositivos oclusais, sendo que cada técnica terapêutica indicada isoladamente ou podendo ser associadas várias modalidades de tratamento, realizadas em diferentes fases da evolução da patologia. 2.6.1.1 Educação e Auto-controlo A literatura revela que algumas situações de DTM se relacionam etiologicamente com determinados estados emocionais, sendo o stress emocional, certamente, um dos diversos factores psicológicos que devem ser considerados. É muito importante que esta relação seja identificada e considerada aquando da elaboração de um plano de tratamento. 1 A educação do paciente passa por procurar mantê-lo num nível consciente e informado, apresentando-lhe de métodos de auto-controlo de forma a evitar situações desaconselhadas para a resolução da patologia, como por exemplos evitar mastigação excessiva e de alimentos muito duros, evitar falar muito e durante muito tempo, tal como evitar grandes aberturas mandibulares.1,16,25 O aconselhamento de simples exercícios e instruções comportamentais são passos importantes quando de tratam pacientes com sintomas, novos ou intermitentes, de DTM.3 Segundo Hodges (1990) e Wright et al (1995), um auto-controlo bem sucedido permite a cura e previne o aparecimento de novas lesões no sistema músculo-esquelético, o que pode ser o suficiente para controlar o problema.1 2.6.1.2 Terapia Farmacológica O tratamento farmacológico é considerado um método eficaz de controlo dos sintomas associados a DTM, não oferecendo uma resolução definitiva. Os grupos de fármacos mais utilizados para o seu tratamento são os analgésicos, anti-inflamatórios 38
  • 39. não esteróides (AINE), corticosteróides, ansiolíticos, relaxantes musculares, anti- depressivos tricíclicos e anestésicos locais.1,22 Os analgésicos, corticosteróides e ansiolíticos estão indicados em situações de dor aguda, os AINE’s, relaxantes musculares e os anestésicos locais podem ser utilizados em quadros agudos e crónicos, e os anti-depressivos tricíclicos estão especialmente indicados no tratamento da dor crónica. 1,14 2.6.1.3 Terapia Física A terapia física engloba uma parte importante de um tratamento satisfatório de DTM, com indicação em diversas fases do tratamento, sendo considerada vantajosa a coordenação clínica entre o médico dentista e um fisioterapeuta com prática e interesse por esta área.1 Os exercícios mandibulares, passivos ou activos, têm sido altamente recomendados para diminuição de ruídos articulares, aumentos de mobilidade mandibular, restabelecimento de movimentos mandibulares regulares, em casos de falta de coordenação motora e tratamento de luxações meniscais anteriores recorrentes.1,22 Medlicott et al (2006), concluiu, através do seu estudo de revisão, que exercícios activos ou mobilizações manuais, isoladas ou combinados, parecem efectivos a curto prazo, no sentido em que é possível aumentar a amplitude de abertura mandibular em pacientes com luxação meniscal aguda.26 As modalidades de terapia física, descritas na literatura, incluem termoterapia, crioterapia (tratamento por frio), ultra-sons, ionoforese, tratamento de estimulação electrogalvânica (EEG), estimulação nervosa eléctrica transcutânea (TENS), acupunctura e laser frio. 1,16 2.6.1.4 Goteira Goteiras ou dispositivos oclusais são aparelhos acrílicos interoclusais, que se adaptam à arcada dentária, criando uma nova posição oclusal e alterando a posição mandibular e o padrão de contacto dos dentes, tendo como objectivo estabelecer um padrão de contacto oclusal que se encontre em harmonia com a relação côndilo- disco-fossa óptima determinada para o paciente. 1,2 39
  • 40. A terapia com goteiras é um dos assuntos mais debatidos no tratamento de DTM. Existe uma grande variedade de design de goteiras, que têm vindo a ser descritas como aparelhos de excelência no tratamento de DTM. 1, 16 Estudos como o de Badel et al (2008) demonstram que a eficiência da utilização de goteiras para redução da dor associada a luxação discal ronda os 88%.27 Existe uma variedade goteiras, utilizadas em diferentes situações, como exemplo podem ser referidas as goteiras planas que pretendem diminuir o bruxismo nocturno e actividade muscular mastigatória ou as goteiras de reposicionamento anterior, que são descritas como mais efectivas na correcção de luxações anteriores, redução de dor e eliminação de ruídos articulares.16 2.6.2 Tratamentos ão Conservadores ou Irreversíveis Os tratamentos não conservadores ou irreversíveis são quaisquer tratamentos que alterem permanentemente o estado oclusal e / ou a posição mandibular. São exemplos os ajustes oclusais selectivos dos dentes, as técnicas restauradoras que modificam o estado oclusal, os tratamentos ortodônticos, e as intervenções cirúrgicas.1 Os dispositivos desenhados para modificar o crescimento ou para alterar permanentemente a posição mandibular também podem ser considerados tratamentos irreversíveis.1 2.6.2.1 Terapia Oclusal A terapia oclusal irreversível, realizada através de desgastes dentários selectivos, tratamento ortodôntico ou reabilitação protética, apenas se encontra indicada quando existe evidência de que a principal causa de disfunção é o padrão de contacto oclusal ou instabilidade ortopédica, não sendo aconselhável a alteração da oclusão em pacientes com DTM associada a outros factores etiológicos.1,28 As alterações oclusais têm como objectivo a alteração do padrão de contacto oclusal, eliminando contactos prematuros ou interferências, má posições dentárias ou 40
  • 41. esqueléticas ou restabelecendo contactos oclusais ausentes, de forma a reposicionar a mandíbula numa posição estável e equilibrada denominada relação cêntrica.1,2,16 Um pequeno estudo realizado por Lundh et al, que avaliou a relação entre DTM decorrente de alteração da relação côndilo-disco e correcção oclusal, através de reabilitação protética e tratamento ortodôntico, demonstrou uma redução significante nos sintomas dolorosos.1, 16 Os desgastes selectivos e o tratamento restaurado raramente são considerados como uma modalidade primária de tratamento das DTM.3 Um estudo de revisão elaborado por Koth and Robisons, cujo objectivo foi avaliar a efectividade dos ajustes oclusais no tratamento e prevenção de DTM em adultos, permitiu verificar não existirem diferenças significativas entre os grupos submetidos a correcção oclusal, através de desgastes selectivos, e grupos placebo, o que levou a concluir que não existe qualquer evidência de que o ajuste oclusal possa reverter ou prevenir a DTM.3,16 2.6.2.2 Tratamento Cirúrgico Desde o século VII AC, que as imagens dos papirus revelam tentativas de tratamento da DTM procurando a deslocalização das luxações. Através de um longo e árduo percurso, os clínicos têm procurado aliviar da disfunção dolorosa desta estrutura através de várias avaliações mecânicas, anatómicas, biomecânicas e recursos correccionais.23 Segundo Dolwick (2007), a cirurgia da ATM desempenha um pequeno, mas importante, papel no tratamento de pacientes com DTM. Existe um largo espectro de procedimentos cirúrgicos para o tratamento de DTM, que varia desde a simples artrocentese e lavagem articular até ao mais complexo procedimento de cirurgia aberta. É importante reconhecer que o tratamento cirúrgico raramente é realizado isoladamente, sendo geralmente acompanhado por tratamentos não cirúrgicos, antes e depois da cirurgia.24 Existem, hoje em dia, vários procedimentos cirúrgicos aceitáveis para o tratamento de desarranjos internos do disco articular, mais propriamente, luxações meniscais com ou sem redução, perfuração do disco articular ou dos tecidos retrodiscais ou alterações degenerativas do disco ou da superfície articular.20 Apesar disso, várias 41
  • 42. referência bibliográficas, indicam que não existem evidências a longo prazo da eficácia do tratamento cirúrgico em estudos controlo de DTM.16 3. Técnicas Cirúrgicas de Tratamento de DTM A redução cirúrgica de uma luxação articular foi pela primeira vez documentada, em 1887, por Annandale. Posteriormente, em 1979, McCarty e Farrar introduziram a técnica de reposicionamento discal através da excisão do tecido retrodiscal e sutura intrarticular. Em 1984 por Hall, e mais tarde em 1985, por Dolwick e Sanders, foram introduzidas variações na técnica que se tornaram procedimentos standards para a redução meniscal aberta. Estados avançados da doença promoveram a necessidade de intervenção através de procedimentos cirúrgicos mais complexos como discectomia, condilectomia ou condiloctomia. Já em 1975, foi desenvolvida por Ohnishia a técnica de artroscopia da ATM tendo sido definida, mais tarde, como uma técnica de diagnóstico (Murakami e tal, 1986; Sanders, 1986).20,29 A artroscopia avançada surge posteriormente, por Quinn, (1994) indicada para o tratamento de alterações degenerativas severas na superfície articular.20 A artrocentese constitui a modalidade cirúrgica mais recente dentro do tratamento das luxações meniscais e veio preencher uma lacuna entre as duas modalidades de tratamento, o conservador e o cirúrgico.1 3.1 Indicações Segundo Okeson, as indicações para cirurgia da ATM podem ser consideradas relativas ou absolutas1, sendo as indicações absolutas reservadas para situações tais como tumores, anomalias de crescimento ou anquilose da ATM.1,24 As indicações relativas da cirurgia de ATM para o tratamento das DTM’s mais frequentes como disfunções internas ou osteoartrite, são dor articular significante e disfunção, tratamentos conservadores refractários, e presença de imagens de evidente patologia. Apesar das indicações para a cirurgia parecerem claras, não são específicas.1,24 A ausência de critérios objectivos para a indicação de cirurgia de ATM impõe que a decisão deve ser tomada após o conhecimento e avaliação da história clínica e acompanhamento da evolução do paciente, pois a selecção do paciente é o maior determinante para o sucesso do tratamento cirúrgico.24 42
  • 43. O primeiro critério, talvez o mais importante, remete à existência de dor articular moderada a severa e disfunção articular. Os candidatos a uma intervenção cirúrgica devem apresentar dor articular localizada e contínua, que piora com a função mastigatória ou fala, sendo esta dor caracterizada por uma intensidade progressiva ao longo do dia. A disfunção articular pode incluir ruídos articulares acompanhados de dor e episódios de limitação de abertura mandibular ou mesmo bloqueio articular. 24 O segundo critério, que requer que o paciente apresente uma situação refractária a tratamentos não cirúrgicos, também não é específico, visto que existe um variado leque de tratamentos, cada qual com indicações específicas, que podem não ser os mais indicados para a DTM em questão. Grande parte dos pacientes responde com sucesso aos tratamentos conservadores, assim, deve ser confirmado que o tratamento conservador prévio aplicado foi o mais adequado e que, ainda assim não obteve 1,21 sucesso perante a patologia diagnosticada. A cirurgia da ATM está limitada aos pacientes que não respondem positivamente a outras terapias, e que apresentam quadro de dor e disfunção articular. 24 Por último, a indicação para cirurgia requer que existam imagens que evidenciem a patologia. Este critério é o mais objectivo, no entanto, os achados imagiológicos não podem ser interpretados isoladamente. As imagens devem ser usadas para confirmar e suportar achados clínicos. A decisão para uma intervenção cirúrgica deve ser baseada nos achados clínicos, em conjugação com dor e disfunção articular, que apresenta imagem capaz de evidenciar patologia articular e ainda em paciente em que o prognóstico de não tratamento seja reservado.1,24 3.2 Técnicas Cirúrgicas Existem diversas técnicas cirúrgicas indicadas para o tratamento de DTM, a artrocentese, a artroscopia e a artrotomia,3 sendo que na última estão incluídas as técnicas de reposicionamento discal, discectomia, condilectomia e condiloctomia, entre outras, sendo as mais frequentes descritas seguidamente.23 43
  • 44. 3.2.1 Artrocentese A artrocentese da ATM é frequentemente definida como uma lavagem da articulação, através de uma técnica de dupla punção, realizada sem visão da articulação, sob anestesia.7,21,22,29,30 Este procedimento tem como indicações o fracasso do tratamento conservador31, traumatismo articular agudo, hipomobilidade articular, luxação discal com ou sem redução, alterações degenerativas ou inflamatórias e adesões capsulares ou discais, no entanto, a maioria dos estudos apenas procura determinar a sua eficácia no tratamento no tratamento de luxações discais sem redução, adesões ou bloqueio da ATM.21,30 O sucesso desta intervenção baseia-se na identificação dos factores de risco32 e num correcto diagnóstico prévio.23 A artrocentese ortopédica, por definição, envolve uma punção no espaço articular com aspiração do fluído proveniente desse espaço e injecção de substância terapêutica. A artrocentese da ATM é um procedimento em que o cavidade articular superior (CAS) é puncionada, lavada com um fluído e a articulação é manualmente manipulada, sendo o seu principal objectivo a eliminação de resíduos tecidulares, sangue e mediadores inflamatório, isto é, das substâncias produzidas pela inflamação intra-articular.1,7,21,30 É um procedimento realizado em consultório, com a articulação anestesiada através bloqueio do nervo aurículotemporal, com cerca de 2 ml de anestesia local, podendo ser complementada com sedação intravenosa que proporcionando algum conforto ao paciente.4,7,30 Uma vez anestesiada a articulação, são marcados dois pontos, sobre a fossa e eminência articular, ao longo da linha cantal-tragus, de forma a localizar a cavidade articular. A primeira agulha, de 20G ou 18G, é inserida na cavidade articular e injectados aproximadamente 2 ml de solução de Ringer ou solução salina estéril, para promover a distensão da espaço articular superior4,7,30 Uma segunda agulha, é inserida na zona da eminência articular, funcionando como porta de saída, com o objectivo de estabelecer um livre fluxo da solução injectada na espaço articular superior.7,30 A quantidade de solução de irrigação é arbitrária, não havendo uma quantidade mínima 44
  • 45. ou máxima que prove estar entre o intervalo terapêutico, podendo variar entre os 100 e os 400ml. (vide Fig.13) 4,24,30 Para garantir uma lise efectiva das adesões durante a lavagem, a agulha de saída do fluxo é bloqueada intermitentemente, promovendo a distensão da cavidade articular superior, através da injecção da solução, sob pressão. Terminada a lavagem podem, eventualmente, ser injectados fármacos, como corticóides ou hialuronato de sódio, de forma a aliviar inflamações intracapsulares. 24,30 Imediatamente após o procedimento, a mandíbula deve ser suavemente manipulada de forma a retomar os livres movimentos mandibulares.4,24,30 Fig. 13 – Artrocentese da Articulação Temporomandibular pela técnica de dupla punção (Valmaseda e Gay-Escoda, 2002) Durante a fase pós-operatória, é instituída aos pacientes uma dieta restrita e mole, e 4,24,30 eventualmente, prescritos anti-inflamatórios não esteróides e analgésicos Uma goteira oclusal e fisioterapia, na forma de exercícios, passivos e activos, de abertura mandibular, podem ser também recomendados e iniciados logo a seguir à intervenção.4,24,30 Esta técnica encontra-se indicada no tratamento de DTM, tendo como objectivo o alívio dos três sintomas mais comuns do bloqueio articular, limitação da máxima abertura mandibular, dor e disfunção articular. Estes sintomas estão relacionados entre si, pois quando aumenta a dor, diminui a abertura mandibular, que por sua vez causa disfunção. A correcção de um dos problemas pode conduzir à correcção dos outros dois. Segundo Barkin (2000), os dados publicados de resultados de longo 45
  • 46. prazo sugerem que a artrocentese apenas é eficaz no tratamento de bloqueio articular.21 Em casos de adesões discais ou capsulares, através desta técnica é possível a eliminação do efeito de vácuo e a lubrificação da cavidade articular, que combinada com forças geradas pela manipulação articular, possibilita o funcionamento normal da articulação. A artrocentese é descrita, na literatura como uma técnica útil e eficaz na eliminação da dor articular, o que se deve à eliminação de mediadores inflamatórios, conseguida pela administração de fármacos, com propriedade anti- inflamatórias, directamente nos receptores intracapsulares. Alguns autores, como Frost e itzan, referem que a infiltração de nutrientes na articulação, após a lavagem, permite a reparação e adaptação de alguns componentes articulares, ainda que outros autores argumentem que a sua eficácia parece não estar comprovada.30 Não são referidas complicações significativas associadas à técnica da artrocentese. É previsível que se verifique edema e / ou tumefacção temporária associada a dor na área articular e ligeira mordida aberta posterior por 12 a 24 h após o procedimento.24 As vantagens associadas a esta técnica advêm da simplicidade da intervenção21, mímica invasão da estrutura articular e possibilidade de ser realizada em consultório o que reduz o seu custo. Segundo Emshoff, a artrocentese e distensão hidráulica da ATM tem sido descrita como uma modalidade efectiva no tratamento de pacientes com achados clínicos consistentes com o diagnóstico de luxação discal sem redução. 32-34 Num estudo realizado por itzan et al, em 1997, analisou-se o efeito da artrocentese no tratamento do bloqueio severo da ATM e procedeu-se à reavaliação da patogénese desta condição baseada nos resultados obtidos. Em 39 paciente (40 articulações) apresentando limitação de abertura mandibular, de inicio súbito, e após verificado o insucesso com tratamentos não invasivos, foram realizadas artrocenteses do compartimento articular superior, com solução salina estéril. Neste estudo verificou- se um aumento da abertura interincisal máxima e da lateralidade, diminuição da dor e do nível de disfunção em 95% dos casos, tendo sido concluído pelos autores que esta 46
  • 47. técnica é eficaz no tratamento de bloqueio súbito da ATM, sendo possível restabelecer a função normal, com alívio dos sintomas.35 Num estudo semelhante, Laskin et Carvajal (2000), concluíram que a artrocentese é uma técnica capaz de reduzir a dor e a disfunção em pacientes com luxação discal anterior, com e sem redução, tendo obtido uma taxa de sucesso de 80%, em que 54% deixou de referir dor e 35% apresentaram melhorias, numa população que apresentava luxações anteriores com e sem redução, em que apenas 3 casos não apresentaram qualquer melhoria.48 Também em estudos realizados por Barkin et al (2000), Sanromán (2004) e Cavalcanti et al (2006), em pacientes com situações clínicas semelhantes, com os mesmos critérios de avaliação, verificaram-se melhorias substanciais em todos os pacientes submetidos à artrocentese. 21,36,37 Alpasan et al (2003) realizou um estudo retrospectivo a 5 anos, semelhante, em que avaliou os resultados da artrocentese no tratamento de DTM’s, em 48 articulações. As conclusões em relação à diminuição da dor e disfunção e aumento da mobilidade mandibular, foram semelhantes. Ainda assim, este autor verificou que os níveis de dor, tanto no pré-operatório como no follow-up (média de 22 meses), foram sempre mais elevados em bruxómanos, ainda que com uma diferença pouco significativa. Já o alívio da dor e aumento da mobilidade mandibular foi superior em pacientes não bruxómanos.38 O estudo realizado por Emshoff (2005) teve como objectivo investigar quais as variáveis clínicas, como idade, género, nível de dor e mobilidade mandibular, podem interferir nos resultados do tratamento de DTM com artrocentese e distensão hidráulica. O autor concluiu que esta técnica apresenta melhor prognóstico quando realizada em pacientes com idades iguais ou inferiores a 25 anos, com alto nível de dor e um valor de amplitude mandibular inferior a 25mm.32,49 O mesmo autor realizou diversos estudos sobre a técnica. Num estudo publicado em 2004, o autor verificou que a artrocentese, quando realizada em pacientes com DTM crónica apresenta uma taxa de sucesso menor, quando comparada com o sucesso obtido em pacientes não crónicos.39 47
  • 48. Em 2007, o mesmo autor desenvolveu um estudo com o objectivo de investigar se as variações de imagem de Ressonância Magnética (RNM) de derrame e / ou edema da medula óssea podem prever os resultados do tratamento com artrocentese e distensão hidráulica da ATM. Assim, concluiu que o derrame pode ser importante no prognóstico e determinante no sucesso da artrocentese. Ainda assim, este dado vem dar ênfase ao conceito que a predição do resultado não depende linearmente de um factor único, mas de uma complexa interacção entre diferentes variáveis biológicas.34 Segundo Israel e Milam et al, o sucesso da artrocentese e da lavagem da ATM, o procedimento mais simples, no restabelecimento do movimento mandibular em pacientes com bloqueio articular altera dramaticamente todos os conceitos cirúrgicos, pois demonstra que a correcta posição do disco articular não é um critério para o sucesso do tratamento. É assumido que a sinuvite ou inflamação dos tecidos retrodiscais, frequentemente observada na artroscopia, pode ser responsável pela dor articular e mobilidade discal alterada.20 No entanto, Al-Belasy refere num seu artigo, cujo objectivo foi rever a eficácia da artrocentese em tratamentos de pacientes com bloqueio da ATM, que a maioria dos estudos publicados sobre este tema apresentam metodologias imperfeitas, ainda que indiquem que a artrocentese pode ser benéfica para pacientes com bloqueio articular. Al-Belasy defende que o resultado das cirurgias de ATM deve ser reportados a uma categoria específica de DTM.40 3.2.2 Artroscopia A artroscopia é uma técnica cirúrgica que tem sido defendida para o tratamento de uma variedade de disfunções da ATM, desde hipomobilidade secundária a luxação discal com ou sem redução, adesões, hipermobilidade, patologia articular degenerativa inflamatória.21,23 Como modalidade clínica, a artroscopia é descrita como uma técnica segura e efectiva, que melhora a função mandibular e diminui a dor em paciente com sintomas severos, relacionados com patologia temporomandibular.20,41 48
  • 49. É uma técnica minimamente invasiva efectuada, normalmente, sob anestesia geral, e em bloco operatório.24 A técnica artroscópica envolve a colocação de um artroscópio telescópico, com 1,8 a 2,6 mm de diâmetro, através de uma cânula, adaptado a uma câmara, na cavidade articular superior da ATM, possibilitando a visualização das estruturas articulares através da projecção da imagem num ecrã de televisão ou computador, necessitando que o cirurgião conceptualize uma a imagem tridimensional da articulação numa imagem bidimensional.1,4,29,24,23,32 De Bont et al, refere como vantagem desta técnica, o facto que se obter uma visão clara das diferentes superfícies articulares e das relações anatómicas entre disco e côndilo.41 Posteriormente, duas cânula de irrigação são colocadas aproximadamente de forma a permitir a livre circulação de fluidos e acesso à instrumentação na cavidade, onde podem ser inseridas sondas, ganchos, instrumentos de corte como bisturis ou tesouras, fórceps de biopsias, dispositivos de aspiração, instrumental rotatório, electrobisturis ou lasers. (vide Fig.14) 24,29,31 Fig. 14 – Artroscopia da Articulação Temporomandibular (Miloro, 2004) A cavidade articular é examinada e instrumentada, sistematicamente, de posterior para anterior, permitindo identificar, na zona posterior, adesões tecidulares, a união entre o bordo posterior do disco e os tecidos retrodiscais, presença de alterações degenerativas na cartilagem articular ou presença de corpos estranhos. Caso exista 49
  • 50. uma perfuração do disco articular é, também, possível visualizar a cavidade articular inferior e o côndilo mandibular. O conteúdo sinovial pode ser recolhido para análise de forma a confirmar a presença de inflamação. Através da cânula de irrigação podem ser introduzidos diversos instrumentos, caso se verifique necessário. Após a observação e instrumentação, a cavidade articular é submetida a um processo de lavagem com o objectivo de remover adesões, bridas e coágulos sanguíneos, tal como os mediadores inflamatórios presentes na articulação.24 Essa lavagem pode ser iniciada com a infiltração inicial de anestésico (por exemplo bupivacaína a, 0,2%), que tem como objectivo a diminuição da dor no pós-operatório, seguida da infiltração da solução salina estéril ou solução de Ringer, promovendo um fluxo, intermitentemente sob pressão, que induz a remoção de adesões e outros detritos da cavidade articular. Na fase final pode ser realizada uma infiltração com betametasona, um corticóide, na tentativa de diminuir a inflamação na cavidade articular, e hialuronato de sódio, fármaco constituído por ácido hialurónico, um polímero natural da família dos glicosaminoglicanos (GAG), importante constituinte importante da matriz extracelular e que está presente, em concentrações particularmente elevadas, nas cartilagens e no líquido sinovial, com o intuito de promover a lubrificação temporária da articulação, durante o período inicial de recuperação. 1 A fase pós-operatória é idêntica à descrita para a técnica da artrocentese, sendo indicado ao paciente uma dieta mole e exercícios, controlados, de abertura mandibular, por alguns dias.4,24,29,35 Frequentemente, e caso seja necessário, aconselhada uma terapêutica farmacológica de suporte, constituída por analgésicos ou AINE’s.22,24,29,35 As vantagens desta técnica resumem-se ao facto de ser uma intervenção minimamente invasiva, com incisões pequenas, causadora de menor trauma articular quando comparada com a cirurgia aberta, implicando uma breve estadia no hospital. Os pacientes apresentam uma rápida recuperação, sendo frequente a dor pós- operatoria de rápida resolução. Já as desvantagens referem-se às limitações cirúrgicas e à necessidade de equipamento sofisticado.21,22,29 50
  • 51. As complicações decorrentes deste tipo de intervenção são raras e maioritariamente limitadas a efeitos reversíveis. Estão descritas na literatura, como complicações desta técnica, diversas situações tais como o extravasamento ou perfuração para além da cavidade articular, podendo provocar a lesão de estruturas nobres adjacentes, lesão total ou parcial do nervo auriculotemporal e mentoniamo, hemorragia intra-articular ou dos tecidos retrodiscais, fracturas de instrumentos ou lesão da membrana timpânica.23 Em 2004, Vecino et al, avaliaram a eficácia do tratamento artroscópico, mediante lise e lavagem articular, de um grupo homogéneo de pacientes diagnosticados com DTM, segundo parâmetros clínicos e radiológicos. Foram sujeitos a cirurgia artroscópica 13 pacientes (22 articulações), com uma média de idade de 31 anos, em que 92% apresentavam factores predisponentes à DTM. As variáveis observáveis foram: dor articular, avaliada através de uma escala VAS, ruídos articulares, abertura máxima, protrusão máxima, lateralidade máxima, dieta tolerada pelo paciente, utilização de goteira de relaxamento muscular, achados artroscópicos, complicações da técnica e consumo de recursos da mesma. Cerca de 76% dos pacientes referiram a dor como principal sintoma. Após a artroscopia verificaram que 80% dos casos apresentavam uma diminuição da dor, 100% apresentavam uma melhoria na abertura máxima, 92% aumentaram a protrusão, 84% e 92% obtiveram uma melhoria na lateralidade direita e esquerda, respectivamente. Verificaram também que em 63% das articulações desapareceram os ruídos articulares. Ao fim de 12 meses foi realizada uma nova observação, em que verificaram que as melhorias obtidas com a artroscopia se mantiveram, sem alteração estatística significativa. Assim,segundo os critérios de Murakami, este estudo demonstra uma taxa de êxito de 23%, resultados satisfatórios na ordem dos 77%, sendo que 50% dos últimos se encontravam num estado avançado de DTM. Não foi detectada nenhuma complicação pós-operatória, ainda que 61% dos pacientes tenho recebido uma infiltração articular com corticóides por apresentarem sinais de sinuvite.42 51
  • 52. Vários são os autores que apresentam nos seus estudos resultados semelhantes, confirmando o sucesso destas técnicas cirúrgicas. Segundo Barkin (2000), a cirurgia artroscópica foi preconizada como um método seguro, minimamente invasivo e efectivo no tratamento de desarranjos internos da ATM, reduzindo a dor e aumentando a amplitude de movimentos mandibulares em aproximadamente 80% dos pacientes. Apesar de stes resultados serem encorajadores, eles são amplamente baseados em estudos retrospectivos, de curto prazo e incontrolados. O mesmo autor refere que o facto da lise e lavagem, apenas da cavidade articular superior, sem o reposicionamento do disco, produzir resultados clínicos de sucesso, suscitou a questão acerca da importância da posição do disco articular como factor etiológico da DTM.44 O mesmo autor refere ainda que, apesar de estudos restrospectivos, aleatórios e de curto prazo, indicarem que a artrocentese e artroscopia apresentam taxas de sucesso semelhantes, no tratamento de bloqueios articulares agudos, faltam estudos similares a longo prazo. Até serem apresentados, os papéis da artrocentese e artroscopia no tratamento das DTM continuam pouco claros.43 Também Dolwick (2007) refere que o sucesso desta técnica, determinado pela diminuição da dor e aumento do movimento mandibular, varia entre 79% a 83%, embora refira que os efeitos terapêuticos da artroscopia e artrocentese, necessitam de ser avaliados em estudos prospectivos aleatórios.24 Fridich et al e Murakami et al, relataram resultados de comparações prospectivas entre a artroscopia e artrocentese no tratamento de DTM. Fridich et al, estudaram 19 pacientes aleatórios, repartidos por dois grupos, tendo sido um grupo submetido a artroscopia com lise e lavagem, sob anestesia geral e o outro grupo submetido a artrocentese com distensão hidráulica e lavagem, sob sedação intravenosa.24 Concluiu-se que não existem diferença estatística significante nos resultados dos dois grupos, sendo que a taxa de sucesso da artrocentese foi de 82% e da artroscopia de 75%, e que ambas as modalidades são úteis no diminuição da dor e aumento da mobilidade mandibular. 21,30 No seu estudo, Murakami et al confirmaram os achados de Fridich et al. Compararam também os resultados obtidos com artroscopia com os resultados obtidos através de tratamentos não cirúrgicos, tendo concluído que a artroscopia é 52
  • 53. indicada para os pacientes com bloqueio articular agudo, refractário ao tratamento não cirúrgico e manipulação manual.21 Num outro estudo de Ohnuki et al (2006) foram avaliadas as alterações na posição, mobilidade e morfologia do disco articular em pacientes com DTM, submetidos a quatro tratamentos diferentes, terapia com goteiras, manipulação, artrocentese e artroscopia. Todos os pacientes apresentavam deslocamento anterior do disco, sem redução, antes do tratamento. Verificou-se que, após o tratamento, apenas 10% dos pacientes apresentava uma luxação com redução, concluindo-se que, apesar do alivio dos sintomas, e após qualquer tratamento, na grande maioria dos casos, a luxação discal pré-existente não sofre alteração. Já em relação à posição do disco, verificou- se que nos pacientes submetidos a artroscopia, este se encontrava numa posição mais anterior. Verificou-se também que a mobilidade articular verificou aumentos, em todos os casos. No entanto a deformação do disco avançou, nos pacientes submetidos a técnicas cirúrgicas.44 Na tentativa de determinar a importância da posição, morfologia e mobilidade do disco, Sato et al, (1999) analisaram imagens de RMN de 24 articulações (21 pacientes) que não receberam tratamento por mais de 1 ano e foram examinados depois, de uma média, de 27,1 meses. Apesar de todos os discos continuarem com luxações anteriores sem redução, os sinais e sintomas foram aliviados durante o tempo de follow-up. O disco apresentava uma forma bicôncava em apenas 2 articulações (8,3%), alargamento do bordo posterior em 3 (12,5%), espessura uniforme em 6 (25%), configuração de dobra em 7 (29,2%) e uma configuração convexa em 6 (25%), na avaliação de follow-up. Estes dados sugerem que a melhoria de sinais e sintoma não esta relacionada com a melhoria da posição e morfologia discal, dados que parecem confirmar o estudo anteriormente referido.44 Num outro artigo Mancha de la Plata et al (2008) referem que a cirurgia artroscópica tem-se revelado efectiva no tratamento de pacientes com DTM, diminuindo os sintomas e restaurando uma função mandibular normal. Apesar disso, pacientes que apresentem fracos resultados, devem ser submetidos a outras modalidades de tratamento, tais como tratamentos não cirúrgicos e cirúrgicos. O objectivo deste estudo foi verificar qual a taxa de sucesso de uma segunda 53