1. O QUE É FILOSOFIA?
PHILOS (AMIGO) SOPHIA (SABER)
Origem: por volta do séc. VI A.C.
Local: colônias gregas da Ásia menor
2. Características dessa nova forma de saber:
• Saber de todas as coisas (universal).
• Saber pelo saber (livre, sem
finalidade prática ou utilitária).
• Saber despertado pelo espanto,
admiração, perplexidade.
3. • Rompimento com as explicações
mitológicas baseadas no sagrado, na
autoridade do divino.
• Exercício da razão (logos) e da crítica:
ciência.
4. Período pré-socrático
(sécs. VI a V A.C.)
• Principal contribuição: conjunto de noções
que tentam explicar a realidade de forma
natural:
1)
2)
3)
4)
5)
Causalidade
Arqué
Cosmo
Logos
Caráter Crítico
5. 1) Causalidade
• Conexão causal entre os fenômenos
naturais: forma básica da explicação
científica até hoje;
• Explicar (e não “narrar”): relacionar um
efeito a uma causa que o antecede e
determina;
6. 1) Causalidade (cont.)
• A existência do nexo causal torna a
realidade inteligível (compreensível);
• A explicação tem caráter regressivo: cada
fenômeno é tomado como efeito de uma
nova causa, até o estabelecimento de
uma “causa primeira”;
7. 2) Arqué
• Ponto de partida e fundamento da cadeia racional/causal
que liga todos os fenômenos naturais;
• Elemento que dá unidade a toda natureza (physis);
• A arqué representa, portanto, um princípio básico que
permeia toda a realidade (physis): é universal e só
acessível para o pensamento, embora seja totalmente
natural (não está “fora” da natureza);
8. 2) Arqué (cont.)
• O elemento representativo da arqué segundo a
interpretação dos mais importantes pensadores
pré-socráticos:
• Água (Tales de Mileto)
• Ar (Anaxímenes de Mileto)
• Apeiron ou o “Ilimitado”
(Anaximandro de Mileto)
9. 2) Arqué (cont.)
• Número (Pitágoras)
• Fogo (Heráclito de Éfeso)
• Átomo (Demócrito de Abdera)
• Terra, fogo, ar e água (Empédocles
de Agrigento)
10. 3) Cosmo
• Kosmós: mundo natural ordenado de
acordo com princípios racionais (a
causalidade é a sua lei principal);
• Ordem hierárquica e harmônica, com
forma determinada, onde certos
elementos são mais básicos que outros;
• Opõe-se ao caos (kaós) ou à “falta de
ordem” (estado da matéria que
antecedeu a ordenação);
11. 3) Cosmo (cont.)
• Há uma correspondência entre a razão
humana e o cosmo. Por isso este pode
ser compreendido e explicado pela
ciência.
• A filosofia pré-socrática é uma cosmologia que nasceu em oposição às
cosmo-gonias típicas das narrativas
míticas.
13. 4. Logos
• Opõe-se ao mito (Mythos) ou à narrativa que recorre ao
poético, à personalização dos elementos e ao mistério
divino na descrição da gênese da realidade
(cosmogonias).
• O logos explica o real por meio de razões e causas
naturais.
• O mito narra histórias sobre a vida e as relações entre os
deuses (e entre estes e os humanos): através de
conjunções carnais ou simples criações espontâneas são
gerados todos os seres seres.
14. 4. Logos (cont.)
• Diferencia-se dos saberes mais antigos (assírios,
babilônios, chineses, indianos, egípcios, persas, hebreus)
• Esses saberes ainda fazem parte da tradição cultural
mítica, onde há ausência de discussão (adesão e
aceitação), apelo ao sobrenatural, ao sagrado inexplicável)
• O logos procura pela arqué da physis.
15. 4. Logos (cont.)
• Forma específica de o homem tentar entender o
mundo que o cerca
• O logos explica o real por meio de razões e
causas naturais.
16. 5. Caráter Crítico
• As teorias filosóficas não são dogmáticas, isto é, não são
verdades absolutas e definitivas; não têm caráter de
“revelação sobrenatural”.
• As teorias estão sujeitas à discussão, divergência,
propostas alternativas, reformulação e correção.
• Única exigência: justificação, fundamentação,
demonstração ou comprovação por argumentos. Algumas
vezes a observação empírica é adotada como testemunha.
17. Primeiros filósofos (Pré-Socráticos)
• Circunstâncias históricas anteriores:
• Séc XII A. C. em diante: longo período de
transição calcado em profundas transformações
sociais.
Decadência da civilização micênico-cretense
(monarquia com poderes divinos/ grande
influência da classe sacerdotal/ poder político
hereditário/ aristocracia militar/economia agrária)
18. Primeiros filósofos: Pré-Socráticos
(Cont.)
•
Séc. VIII em diante:
- Surgimento das cidades-estado (polis);
- Participação mais ativa dos cidadãos (espaço público: Ágora);
- Secularização (dessacralização) da sociedade;
- Economia baseada em atividades mercantis (expansão marítima
com ampliação de territórios e de conhecimentos).
- Invenção da “política”: lei como expressão da vontade da
coletividade; discussão e persuasão;
19. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.)
Interesse pela physis (natureza em sentido amplo;
natureza subjacente)
“A maior parte dos primeiros filósofos considerava como os
únicos princípios de todas as coisas os que são da
natureza da matéria. Aquilo de que todos os seres são
constituídos e de que primeiro são gerados e em que por
fim se dissolvem, tal é para eles o elemento , o princípio
dos seres, e por isso julgam que nada se cria nem se
destrói, como se tal natureza subsistisse para sempre (..)
Aristóteles, in Política
20. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Escola de Mileto:
- Tales (585 A.C.)
- Anaximandro (547 A.C.)
- Anaxímenes (528 A.C.)
- Xenófanes de Colofon (480 A.C.)
- Heráclito de Éfeso (500 A.C.)
21. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Tales de Mileto (585 A.C.)
- Fundador da cosmo-logia (tratamento sistemático e
racional da origem, transformação e conservação do
mundo).
- O princípio da Physis é a ÁGUA (ou o úmido): qualidade
ou ser primordial. Aquilo de que o mundo como um todo é
feito.
22. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Tales de Mileto (585 A.C.) (cont.)
- A água apresenta-se sob as mais diferentes formas e em
todos os estados em que vemos os corpos da natureza:
líquido, sólido, gasoso.
- A água passa de um estado a outro num processo
contínuo no qual mantém a identidade consigo mesma.
- O fenômeno da evaporação faz pensar que a água é a
causa do céu e do que nele existe. A chuva faz pensar que
a água é a causa do existe na Terra.
23. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Tales de Mileto (585 A.C.) (cont.)
- A água está diretamente vinculada à vida (coisas mortas
ressecam).
- A água tem movimento (kínesis) próprio, é
“automovente”, transforma-se e transforma as coisas.
24. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Anaximandro de Mileto (547 A.C.)
- Discípulo de Tales, geógrafo, astrônomo, matemático e
político, inventor do relógio de sol, do esquadro, da
medição da distância entre as estrelas e do cálculo de
suas magnitudes.
- A cosmologia dá um “salto qualitativo”: a physis não é
mais um elemento material, determinado ou definido, é o
Ápeiron (o ilimitado, infinito, inumerável, indeterminado)
25. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Anaximandro de Mileto (547 A.C.) (cont.)
- A physis está para além do que se pode perceber pelos
sentidos: é apreendida exclusivamente pelo pensamento
- A cosmologia dá um “salto qualitativo”: a physis não é
mais um elemento material, determinado ou definido, é o
Ápeiron (o ilimitado, infinito, inumerável, indeterminado)
26. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Anaximandro de Mileto (547 A.C.) (cont.)
- O mundo surge por um movimento circular
turbilhonante que irrompe em diversos pontos do
Ápeiron. Nesse momento separam-se as duas
determinações ou qualidades primeiras: o quente e o frio
(origem do fogo e do ar). Em seguida separam-se o seco
e o úmido (origem da terra e da água). Essas
determinações combinam-se entre si e os seres vão
sendo formados.
27. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Anaxímenes de Mileto (547 A.C.)
- Concidadão e associado a Anaximandro.
- A natureza subjacente ( Physis) não é indefinida, embora
seja ilimitada: ela é o AR (pneuma.
- Parece um retrocesso em relação a Anaximandro, mas
não é: o Ápeiron deste último ainda está muito próximo
ao caos descrito pelos mitos.
28. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Anaxímenes de Mileto (547 A.C.)
- Mantém a ideia central de seu predecessor: a Physis é
ilimitada, incorruptível e imortal, mas é determinada
(qualificada), pois o pensamento só pode pensar o que
possui determinações.
- Ao contrário da água, que precisa de suporte ou
continente, o ar sustenta-se a si mesmo, possui a
autonomia (autossuficiência) própria de um fundamento
ou princípio.
29. Escola Jônica (Naturalista)
(Séc. VI – V A.C.) (cont.)
Anaxímenes de Mileto (547 A.C.)
- A difusão do ar é ilimitada; sua presença compõe todas
as coisas.
- O ar é o primeiro “alimento” de um ser vivo, e também o
último: princípio vital. O mundo é um ser vivo.
- O ar mantém unidas as partes do todo. A condensação
e a rarefação determinam toda a variedade das coisas.
30. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
Visão de mundo mais abstrata, menos naturalista,
prenunciando o surgimento da Lógica e da metafísica.
Pitágoras de Samos (530 A.C.)
Alcmeon de Crotona
Filolau de Crotona
Escola Eleática:
Parmênides de Eléia (500 A.C.)
Zenão de Eléia (464 A.C.)
Melisso de Samos (444 A.C.)
31. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
A escola pitagórica:
Recebe influências da nova religiosidade (diferente da
religião homérica).
- Rituais de purificação da alma.
- Crença na transmigração da alma (reencarnação): a
alma tem origem divina e é imortal.
- A religião não é mais “culto” e sim “interioridade”
(ascese moral e catarse).
32. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.)
- Figura lendária.
- Fundador de uma confraria religiosa.
- Defensor da purificação da alma por meio da sabedoria e
da teoria (sempre acompanhados da abstinência e do
isolamento).
33. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.) (cont.)
- Adepto do deus Apolo Delphos: a verdade é inspiração e
revelação divina. A sabedoria plena pertence ao deus, e ao
sábio só resta amá-la, desejá-la, ligar-se a ela por amizade
(criador da palavra philos/sophia).
- A arqué ou physis é o número: harmonia e proporção.
34. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.) (cont.)
- O um é o princípio de tudo.
- Criação da aritmética e da geometria:
- Unidade
- Sequência
- Par e ímpar
- Pontos e superfícies
35. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.) (cont.)
- O um não é uma “representação” das coisas: ele É as
próprias coisas; a estrutura fundamental ou a Physis.
- Princípio da imutabilidade (um): a dualidade é a diversidade
e o devir, que são inessenciais.
36. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.) (cont.)
- O número é o elemento básico explicativo da realidade:
há uma proporção em todo o cosmo (o que explica a
harmonia e o equilíbrio do real).
- Há uma proporção ideal em todo o universo que se reflete
na concepção da escala musical (harmonia musical).
37. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.) (cont.)
- Busca de um princípio geométrico de proporção
representando a harmonia cósmica.
- Concepção do número como elemento primordial reflete-se
no TETRACTYS (grupo dos quatro), que consiste nos
quatro primeiros algarismos (1,2,3,4), que somam 10 e que
podem ser dispostos de forma triangular, simbolizando uma
relação perfeita.
38. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.) (cont.)
- O limite e o ilimitado são princípios das coisas e dos
números (as coisas são números).
- O estudo das matemáticas (que se confundem com a
filosofia, já que tudo é número) era feito para promover a
harmonia da alma com o cosmo, realizando assim uma
catharsis (purificação) libertadora da alma do ciclo das
representações (o corpo é uma prisão da alma).
39. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Pitágoras de Samos (530 A.C.) (cont.)
Embora partam de princípios que hoje chamamos
“abstratos”, os pitagóricos postulam que “o ser não é mais
do que o sensível”, acabando num corporalismo: não há
ainda distinção definitiva entre o corpóreo e o não-corpóreo.
40. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Zenão de Eléia (500 A.C.):
- Famoso pelos paradoxos (reductio ad absurdum) que
formulou em defesa da filosofia monista e contra a noção
de movimento. Até hoje seus paradoxos são objeto de
controvérsia.
- Paradoxos mais conhecidos: 1) Aquiles e a tartaruga e 2)
Paradoxo da flecha.
41. Escola Italiana (sec. VI - V A.C.)
(cont.)
Zenão de Eléia (500 A.C.) (cont.):
1) Aquiles e a tartaruga: Aquiles, o corredor mais veloz da
Grécia, tendo dado a dianteira à tartaruga numa corrida,
jamais poderá alcançá-la ou ultrapassá-la, pois a distância
que os separa é divisível ao infinito e jamais poderá ser
percorrida por inteiro.
2) Paradoxo da flecha: A flecha jamais atingirá o alvo pois a
cada ponto em que se encontra deverá percorrer uma
distância igual a seu comprimento. Como o espaço é
infinitamente divisível, a flecha deve permanecer imóvel.
42. Escola pluralista (Segunda fase)
Pensadores que combinam aspectos de diferentes escolas,
valorizando as noções de múltiplo e dinâmico.
- Anaxágoras de Clazômena
- Empédocles de Agrigento
- Escola Atomista:
- Leucipo
- Demócrito
43. Escola pluralista (Segunda fase)
(cont.)
Escola Atomista:
Fundada por Leucipo, que foi discípulo de Zenão e
influenciado pela escola eleática. Seu pensamento é
mais conhecido a partir de seu discípulo Demócrito,
que aprofundou o atomismo (uma das escolas présocráticas mais importantes de toda a antiguidade).
44. Escola pluralista (Segunda fase)
(cont.)
O atomismo de Demócrito (desenvolvido mais tarde por
Epicuro):
- A realidade constitui-se de átomos e do vazio.
- Os átomos se atraem e se repelem, gerando com
isso os fenômenos naturais e o movimento.
- A atração e a repulsão dos átomos devem-se às
suas formas geométricas (os átomos de forma
semelhante se atraem e os diferentes se
repelem).
45. Heráclito (Jônico) versus
Parmênides (Eleata)
(Mobilismo versus monismo)
- Controvérsia que marca o fim do séc. V A.C.: divisor
de águas que influencia todo o pensamento posterior.
46. Heráclito de Éfeso (500 A.C)
Representante do mobilismo (em oposição à escola
italiana de Pitágoras e dos eleatas)
Defende, como os atomistas, que a realidade natural
se caracteriza pelo movimento ou fluxo eterno: tudo
passa (panta rei). Mas ainda assim ela é única e não
múltipla.
O Logos é o princípio unificador do Real e elemento
básico da racionalidade do cosmo.
47. Heráclito de Éfeso (500 A.C) (cont.)
O Logos dá à realidade unidade na pluralidade, ou
unidade dos opostos: os opostos se complementam .
O fogo (Pyr) é o elemento primordial, simbolizando o
caráter dinâmico da realidade: energia que queima e
se consome.
O mundo é um fluxo incessante onde só permanece
inalterado o Logos (ordem cósmica) que rege a
inevitável transformação de todas as coisas.
48. Parmênides de Eléia (500 A.C.)
• Fundador do “eleatismo”.
• Afirma a unidade e a imobilidade do ser.
• Investiga os princípios do cosmo: pergunta pelo que está
“atrás” das aparências e das transformações.
• Pergunta pelo SER: é preciso descobrir as exigências
lógicas dessa noção.
49. Parmênides de Eléia (500 A.C.) (cont.)
Adversário dos mobilistas, defende a existência de uma
realidade única e imóvel.
O movimento é apenas aparente (aspecto superficial
das coisas). Se formos além da visão imediata das
coisas, descobriremos pelo pensamento que o ser (ou
realidade) é:
único, imóvel, imutável, sem princípio nem fim, contínuo,
indivisível, atemporal.
50. Parmênides de Eléia (500 A.C.) (cont.)
Investiga a exigência lógica intrínseca à palavra ser.
Só existem dois caminhos:
1)
2)
O que é (necessário)
O que não é (impossível)
O que não é revela-se impossível. O caminho do ser é
necessário.
51. Parmênides de Eléia (500 A.C.) (cont.)
A busca racional do ser revela um ser uno, imutável,
eterno (do contrário tem-se que apelar para a noção
de não-ser, que é impossível.
O ser é lógico e cosmológico e não pode ser captado
pelos sentidos. Olfato, visão, tato etc. não são
adequados para o conhecimento verdadeiro.
Do ponto de vista cosmológico, ele é esférico, limitado e
homogêneo (sem interstícios de não-ser).
52. Parmênides de Eléia (500 A.C.) (cont.)
Só o ser racional é real pois só ele pode ser entendido:
ser e pensar são o mesmo.
A realidade é única, enquanto a aparência é múltipla.
Só posso entender a mudança se há algo essencial que
permanece e me permite identificar o objeto como o
mesmo: a noção de movimento pressupõe a noção de
permanência.
53. Parmênides de Eléia (500 A.C.) (cont.)
Versão inicial da lei da identidade (princípio lógico e
metafísico): A=A. O ser é idêntico a si mesmo, por isso
é imutável e permanente.
Movimento e mudança representam o que não é:
deixam de ser o que são para tornarem-se o que
não são (o que é impossível!).
O ser é único, imóvel, imutável, sem princípio nem fim,
contínuo, indivisível, atemporal.
54. A época dos sofistas e Sócrates (secs.
V e IV A.C.)
Conjuntura histórica:
Atenas se torna o centro do mundo grego depois de
sair vitoriosa na guerra contra os persas
Consolidação das instituições democráticas e do poderio
econômico e militar.
55. A época dos sofistas e Sócrates (secs.
V e IV A.C.) (cont.)
Mudanças na temática da filosofia:
Os filósofos deixam de ocupar-se com a natureza (Physis)
e com a cosmologia para dedicarem-se à formação do
cidadão e do sábio virtuoso.
O interesse agora é a política, a ética, e a teoria do
conhecimento.
56. A época dos sofistas e Sócrates (secs.
V e IV A.C.) (cont.)
A filosofia define-se como gênero cultural autônomo,
com estilo próprio e princípios específicos.
Atenas assume a hegemonia entre as cidades-estados
(polis), e ocorrem reformas políticas que
introduzem as
primeiras regras democráticas,
quebrando os privilégios
das antigas oligarquias.
As decisões políticas são resolvidas em reuniões dos
cidadãos (assembleias: ágoras), através do consenso:
necessidade de persuadir, convencer, justificar, explicar.
57. A época dos sofistas e Sócrates (secs.
V e IV A.C.) (cont.)
Anteriormente o exercício do poder era feito por
privilégios, tradição, imposição, violência e obediência.
Na democracia, a razão e o diálogo se sobrepõem à
força, e os argumentos são abertos à interpelação, ao
questionamento.
O surgimento da filosofia corresponde à busca pelas
bases para essa discussão, mediante as perguntas pelo
que é a verdade, quais os princípios da razão etc.
58. Os sofistas (sec. V A.C.)
Fundadores da pedagogia democrática.
Professores itinerantes de técnicas (retórica, eloquência):
saber prático ( e não “contemplativo”).
SOPHISTÉS: erudito, sábio, ensina com paixão e carisma.
No ínício, a palavra não tem sentido pejorativo. Depois de
Platão, ela passa a significar também: charlatão,
mentiroso, ardiloso.
59. Os sofistas (cont.)
Recebem críticas dos nobres (aristocratas): o sofista
vende a arte de “ser cidadão” (para os nobres, isto não
se compra nem ensina,vem do berço).
Recebem críticas dos filósofos pós-socráticos (Platão e
Aristóteles) pois seu pensamento não é livre nem
autônomo: está preso a uma remuneração.
Lidam apenas com opiniões (DOXA), ensinando a
argumentar persuasivamente em favor de uma opinião em
detrimento de outra, dependendo de quem paga.
60. Os sofistas (cont.)
Surgem no momento de passagem da tirania e da
oligarquia para a democracia.
Têm função muito importante na preparação dos cidadãos
para a vida pública: paideia (cultura, ensinamento e
formação) da juventude ateniense.
61. Os sofistas (cont.)
Principais sofistas: Protágoras (490-421), Górgias (487380), Hípias, Licofron, Trasímaco.
Protágoras: “o homem é a medida de todas as coisas”,
das que são e das que não são”: humanismo e
relativismo. Em outros termos:
As coisas são como nos parecem ser (para nossa
percepção) e não há nenhum critério para decidir essa
questão. (Aproximação com os mobilistas e distância do
eleatismo)
62. Os sofistas (cont.)
Acreditam que não outra instância além da mera opinião
(doxa), a qual deve ser tomada com base ma persuasão
a fim de produzir um consenso nas questões políticas.
Ninguém detém a verdade em sentido absoluto,
simplesmente porque isto não é possível; mas todos têm
suas razões, seus interesses, seus objetivos e pode
defendê-los da melhor forma possível.
Técnica argumentativa de Protágoras: antilógica –
argumentação pró e contra uma determinada posição,
sendo ambas igualmente verdadeiras e defensáveis.
63. Os sofistas (cont.)
Górgias: defende a impossibilidade do conhecimento em
um sentido estável e definitivo:
“Nada existe que possa ser conhecido; se pudesse ser
conhecido não poderia ser comunicado; se pudesse ser
comunicado não seria compreendido”
64. Sócrates (469-399 A.C.)
Temas preferidos: o homem, a ética, o conhecimento.
Diálogo: forma da busca incessante pela verdade.
Conceito ou IDEIA: definição universal e necessária da
coisa procurada.
65. Sócrates (cont.)
Opinião versus Verdade
Aparência versus Realidade
Percepção Sensível versus Pensamento
Tarefa do Diálogo: cada um deve descobrir por si mesmo
(sozinho) que aquilo que julgava ser a ideia da coisa, na
verdade é apenas uma “imagem” ou uma “opinião” sobre
ela.
Pela primeira vez na história a filosofia fala em um método
(methodos) e em ciência (episteme).
66. Sócrates (cont.)
Papel do filósofo não é transmitir um saber pronto
e acabado mas fazer com que seu interlocutor,
através da dialética, dê à luz suas próprias ideias.
Conhece-te a ti mesmo
Só sei que nada sei.
67. Sócrates (cont.)
Sócrates confronta o Estado: suas ideias se insurgem
contra as práticas políticas da época. A necessidade da
independência do pensamento é discutida pela primeira
vez em nossa tradição.
Em 399 a. C. Sócrates é acusado de graves crimes por
alguns cidadãos atenienses. Eles pedem sua condenação
à morte por desrespeito às tradições religiosas e por
corrupção da juventude.
68. Sócrates (cont.)
A motivação da acusação é claramente política: contra
as críticas feitas por Sócrates ao que ele considerava um
desvirtuamento da democracia ateniense e aos valores e
atitudes da sociedade da época.
O julgamento e a morte de Sócrates marcaram
profundamente seus contemporâneos e muitos de seus
discípulos e companheiros relataram esse episódio.
69. Sócrates (cont.)
Em seu julgamento diante de um júri de 501 cidadãos,
Sócrates apresenta um longo discurso (sua apologia ou
defesa), no qual, entretanto, longe de se defender
objetivamente das acusações, ironiza seus acusadores,
assume as acusações e recusa-se a declarar-se
inocente, dizendo-se coerente com o que ensinava.
Com isso só restou ao júri condená-lo à morte. Sócrates
aceita a condenação e recusa-se a fugir para o exílio, pois
isto equivaleria a renegar suas ideias e princípios.
70. Sócrates (cont.)
Em geral, a definição inicial oferecida pelo interlocutor
de Sócrates reflete a visão corrente, o senso
(entendimento) comum que todos temos sobre o tema
em questão (nossa opinião ou doxa).
Isto é sempre considerado insatisfatório para Sócrates.
Ménon (personagem do diálogo escrito por Platão), por
exemplo, oferece várias definições do que é a virtude,
todas recusadas por Sócrates por serem apenas
“exemplos” de virtude, mas não a própria virtude: todos
têm algo em comum que os faz serem virtudes, e é isto
que precisa ser buscado.
71. Sócrates (cont.)
O método socrático questiona as crenças e as opiniões
por serem parciais e incompletas, revelando a
fragilidade desse entendimento comum e apontando
para a necessidade e a possibilidade de aperfeiçoá-lo
através da reflexão.
A reflexão filosófica vem mostrar que em geral não
sabemos aquilo que pensávamos saber. A reflexão
parte, portanto, de um entendimento já existente mas
quer ir além dele em busca de algo mais perfeito, mais
completo.
72. Sócrates (cont.)
Isto se dá através de sucessivos graus de abstração e
de exame do que a nossa experiência comum envolve,
explicitando o que já está contido nela.
Trata-se de um exercício intelectual no qual a razão
humana deve descobrir por si própria aquilo que busca .
Sócrates jamais responde aquilo que pergunta, apenas
indica, às vezes com bastante ironia, quando as
respostas de seu interlocutor são insatisfatórias e por
que o são.
73. Sócrates (cont.)
A definição correta jamais é dada por Sócrates, pois
apenas através do diálogo e da discussão, o filósofo fará
com que seu interlocutor (ao cair em contradição e ao
hesitar depois de parecer muito seguro) passe por todo
um processo de revisão de suas crenças e opiniões,
transformando sua maneira de ver as coisas e chegando
por si mesmo a aproximar-se mais e mais do verdadeiro
e autêntico conhecimento.
74. Platão (428-347 A.C.)
Seguia os ensinamentos de Sócrates (personagem
recorrente na obra platônica) : o diálogo como método de
discussão crítica das opiniões desprovidas de
consistência na busca da verdade.
A obra de Platão preocupa-se com: a ciência (o
conhecimento verdadeiro e legítimo), com a moral e a
política. Na medida em que o conhecimento identifica-se
com o Bem, ele possui uma função ética e política.
75. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Interesse pela POLÍTICA: a filosofia procura pelos
fundamentos teóricos do projeto político.
É preciso projetar e construir a “cidade ideal” (governada
pelo filósofo).
Interesse pelo CONHECIMENTO (representação
correta do real): a tarefa da filosofia seria estabelecer
como podemos avaliar determinadas pretensões ao
conhecimento. A filosofia é uma espécie de árbitro ou
legislador do conhecimento(função crítica).
76. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Caráter fundacional da filosofia: avaliar criticamente as
bases de nossa pretensão ao conhecimento sem
pressupor este mesmo conhecimento para evitar a
circularidade.
A filosofia é um método para se atingir o IDEAL em
todas as áreas pela superação do senso comum,
estabelecendo o que deve ser aceito por todos,
independentemente da origem, classe ou função.
77. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
A prática filosófica envolve o abandono do mundo
sensível e a busca do mundo das ideias.
Opinião versus verdade
Desejo versus razão
Interesse particular versus interesse universal
Senso comum versus filosofia
78. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
O método dialético visa a expor e denunciar a
fragilidade, a ausência de fundamento, o caráter de
aparência das opiniões e preconceitos do senso comum.
É preciso ir contra a opinião que não se reconhece como
tal, que se apresenta como certeza, que se baseia em
fatos, na experiência ou na realidade particular, concreta
e por isso toma o parcial , contingente, mutável e
passageiro pela totalidade do real.
79. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
A opinião não se dá conta do caráter convencional da
linguagem: dos valores, crenças, interesses e
preconceitos nela embutidos, ocultando as
inconsistências da experiência.
O diálogo socrático visa ao desmascaramento dessa
realidade, buscando um consenso (homologia) fundado
no conhecimento verdadeiro, no entendimento racional,
na possibilidade de justificação.
80. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
A dialética é um processo de abstração que permite que
se chegue à definição dos conceitos. É a partir da
radicalização da discussão que se vai descobrir a
essência, a natureza universal do que se discute (ex: a
coragem, a alma, a virtude etc.)
O diálogo opõe-se à violência, à força física, e à retórica
manipuladora dos sofistas. Entre os interlocutores
instaura-se uma nova relação, não mais baseada em
interesses, desejos e inclinações particulares.
81. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
A filosofia como projeto político tem como objetivo
promover a transformação da realidade. Esse projeto é
antagônico à democracia que, na visão de Platão, admite
paixões, opiniões, interesses privados e não o
conhecimento.
Mas o projeto filosófico não é tampouco a favor da tirania
a da oligarquia, pois estas também não se fundam no
conhecimento da verdade, no saber.
82. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
A teoria das formas ou das ideias:
Após a morte de Sócrates, Platão trava contato com
pitagóricos e eleatas, quando começa a desenvolver a sua
própria doutrina (a teoria das formas ou das ideias).
É preciso desenvolver, indo além do simples “método”
socrático, uma teoria sobre a natureza dos conceitos e das
definições.
83. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Forma ou ideia: natureza essencial das coisas.
Enquanto Sócrates considerava a filosofia um método de
análise, reflexão, transformação intelectual, revisão e
reavaliação de crenças e valores que levaria o indivíduo a
uma melhor compreensão de si mesmo, de sua
experiência e da realidade que o cerca, Platão acredita que
a filosofia é essencialmente teoria, isto é, capacidade de
ver através de um processo de abstração e de superação
da nossa experiência concreta, a verdadeira natureza das
coisas em seu sentido eterno e imutável.
84. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
O conhecimento teórico é necessário e indispensável
para o método de análise socrático, precedendo-o e
tornando-o possível. É nele que o método socrático deve
se fundamentar.
Construção de uma Metafísica ou Ontologia (doutrina
sobre a natureza última e essencial da realidade), para que
se possa definir o tipo de compreensão e de conhecimento
que podemos ter desta realidade.
85. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Consequência: a tarefa filosófica passa a definir-se
como exclusivamente teórica, contemplativa,
especulativa, dirigida para uma realidade abstrata e
ideal.
A reflexão filosófica afasta-se do mundo da
nossa experiência imediata e concreta,
passando a ser vista como uma pura
meditação contemplativa.
Daí se origina o sentido vulgar que o termo
“platônico” possui ainda hoje, como na
expressão “amor platônico”.
86. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Platão mantém contudo a preocupação de seu
mestre Sócrates com a ética e os valores que
orientam a ação humana e isto inclui a análise dos
conceitos ou qualidades que caracterizam a
natureza humana, como a coragem, a piedade, a
amizade e a temperança.
A filosofia, portanto, também tem um interesse prático:
voltado para a dimensão ética e política da existência
humana.
87. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Mas o interesse prático da filosofia só se realiza com
a articulação entre teoria e prática. Como toda ação
humana envolve uma escolha entre alternativas, é
preciso que o processo de decisão seja embasado
numa teoria.
Nossas decisões não devem ser meramente
práticas, particulares ou casuísticas: devem, antes,
partir de certos princípios e valores gerais para
orientar e justificar nossas ações.
88. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Uma ação é justificada quando baseada numa
decisão que obedeceu normas universais, abstratas e
permanentes (acessíveis à nossa inteligência), que se
aplicam a todos os casos de um determinado tipo e a
todos os indivíduos em condições equivalentes.
Atos assim são racionais, têm um fundamento
teórico, não são arbitrários, aleatórios, casuais,
nem estão a serviço do mero interesse individual e
imediato.
89. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Do contrário, a ação humana seria caótica,
incompreensível e com resultados imprevisíveis.
A teoria platônica está, portanto, a serviço de uma
aplicação prática (justificada teoricamente). A
teoria é condição da ação racional porque
estabelece suas normas, mas não é um fim em si
mesmo pois visa sempre uma prática.
90. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
A teoria é necessária para nos distanciarmos da
prática e podermos avaliá-la de modo isento.
Enquanto estamos imersos na prática, não temos
condições de julgá-la de modo claro e eficaz. Porém a
teoria tem sempre a prática como objetivo.
91. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Doutrina da reminiscência (ou da anamnese):
formulada para explicar como se inicia o processo do
conhecimento. Há um conhecimento inato que serve
de ponto de partida para todo o processo de
conhecimento.
Esse conhecimento inato é um conhecimento
prévio que a alma traz consigo desde sempre e
que resultou da contemplação das formas
(essências das coisas) pela alma, que também é
uma essência, antes de encarnar em nosso corpo
material e mortal no nosso nascimento.
92. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Ao encarnar no corpo a alma tem seu saber prévio
obscurecido (esquecido). O papel do filósofo é
despertar esse conhecimento esquecido, fazendo
com que o processo de conhecimento tenha início e o
indivíduo possa aprender por si mesmo.
Dualismo platônico: A realidade é dupla. De um
lado há o mundo das ideias, formas ou essências.
De outro, o mundo concreto ou material, que é
uma cópia imperfeita do primeiro.
93. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Real
Estado
mental
Mundo
Material
(objetos
concretos)
Visão de
imagens pelo
homem
comum/
Conhecimento dos
objetos
naturais
Eikasia: visão do mundo
através de sombras e reflexos.
Ela é superficial, imediata,
parcial, um conhecimento de
grau inferior, incompleto e
instável (doxa).
Pistis: (crença, convicção):
conhecimento mais elaborado
sobre o mundo natural (por ex:
botânica, zoologia). Os mesmos
objetos da eikasia aparecem
com mais clareza, com relações
causais estabelecidas. Mas é
ainda impreciso e imperfeito.
94. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
Real
Mundo
Inteligível
Estado
mental
Conhecimento
dos objetos
matemáticos
(Formas ou pelo
ideias)
geômetra/Co
nhecimento
dialético pelo
filósofo
Geometria: passamos a um nível
de realidades abstratas, perfeitas
e imutáveis. Mas como a
geometria ainda guarda relações
com o mundo sensível (imagens),
ela é apenas uma preparação
para a filosofia.
Intuição intelectual (noesis):
atinge os princípios mais
elevados do ser, o “âmago” da
realidade, o fundamento último
que dá a compreensão do
todo.
95. Platão (428-347 A.C.) (cont.)
A filosofia de Platão é a conciliação ou síntese de duas
grandes tendências filosóficas: o imobilismo de Parmênides
e o mobilismo de Heráclito.
Dialética: caminho ascendente em direção à definição dos
conceitos, ideias ou essências (modelos eternos,
incorpóreos e imutáveis das coisas sensíveis finitas,
corpóreas e mutáveis).
96. Aristóteles (384-322 A.C)
• Crítico dos pré-socráticos e de Platão.
• Redefine o sentido e o projeto da filosofia.
• Constrói um grande sistema de saber, muito
influente no desenvolvimento da ciência até
hoje.
97. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Crítico da teoria das ideias e ao dualismo
de Platão:
• Como entender a relação entre o mundo inteligível (das
ideias) e o mundo sensível ou material?
• A principal objeção de Aristóteles é o paradoxo da relação
entre os dois mundos.
98. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Toda relação deve ser de dois tipos: interno
ou externo.
1) Uma relação interna entre A e B se dá quando A e B
possuem elementos comuns: há uma intersecção entre A e
B:
A
B
99. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
2) Já numa relação externa entre A e B não há elementos
comuns entre ambos: caso do mundo inteligível e do sensível
(naturezas distintas)
A relação só pode ser feita através de um intermediário, um
ponto externo, que podemos chamar de C, que servirá de elo
entre A e B.
C
A
B
100. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Ora, a relação entre
A, B e C também será
uma relação externa,
necessitando de um
ponto D etc. para
relacioná-los:
D
A
B
C
101. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Agora, para relacionar agora A, B, C e D
deverá haver um ponto E e assim por diante,
numa progressão ao infinito...
Eis, portanto, o paradoxo: ou a relação é
interna e então não haverá problema em
explicá-la, mas não haverá dualismo, ou será
externa, e nesse caso exigirá um número
infinito de pontos externos para efetuá-la.
102. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Para evitar este tipo de problema, Aristóteles
considerará necessário um novo ponto de partida,
uma nova concepção de real que evite o dualismo
dos “dois mundos” platônicos.
Aristóteles entende a realidade como uma
substância individual concreta, a qual entretanto é
composta de forma (morphé) e matéria (hylé).
103. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
A matéria é o princípio da individuação e a forma a
maneira como, em cada indivíduo ou substância
concreta, a matéria se organiza.
Todos os indivíduos de uma mesma espécie têm a
mesma forma, mas diferem do ponto de vista da
matéria (que é o que os individualiza e separa dos
outros). Por exemplo: a forma cavalo é a mesma,
mas um cavalo é (tem a matéria) marrom e grande,
o outro é (tem a matéria) preto e pequeno, etc.
104. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Matéria e forma são contudo indissociáveis, constituem uma
unidade (um indivíduo): a matéria só existe porque possui uma
determinada forma; a forma, por sua vez, é sempre a forma de
um objeto material concreto.
Isto significa que não existem, para Aristóteles, formas ou
ideias puras como em Platão. É o intelecto humano que, pela
abstração, separa matéria e forma no processo de
conhecimento da realidade, relacionando os objetos que
possuem a mesma forma e abstraindo sua matéria particular:
daí surgem os tipos (cavalo), os gêneros (mamífero) e as
espécies (animal), classificações que nos trazem
conhecimento sobre a realidade.
105. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Assim, “O cavalo” não existe; o que existem são “este e aquele
cavalos”, com estas e aquelas características materiais. O
cavalo, enquanto tipo geral, é apenas resultado desse
processo de abstração que identifica e separa a “forma” cavalo
em todo cavalo individual.
Isto significa que as formas não existem em algum mundo
“inteligível” e independente do mundo dos objetos individuais.
A ideia de cavalo é apenas a natureza comum a todos os
cavalos e não pode existir separadamente.
106. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
A ideia ou forma é apenas o princípio de
determinação que faz com que um indivíduo
pertença a uma determinada espécie.
Isto significa que apenas as substâncias concretas e
individuais existem: se não existissem os indivíduos,
nada mais existiria, nem gêneros, nem espécies.
107. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
A concepção aristotélica da realidade como
substância individual a sua teoria da causalidade
visam resolver o conflito entre o monismo de
Parmênides e as teorias pré-socráticas do
movimento (como o atomismo).
Contra o monismo de Parmênides, Aristóteles
defende a concepção de uma natureza plural (já que
é composta de indivíduos). A própria noção de ser
exprime essa pluralidade.
108. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Há ainda três distinções adicionais na teoria aristotélica do
ser:
1)
2)
3)
Essência e acidente: a essência é aquilo que faz com que a
coisa seja o que é, ou seja, suporte invariável de seus
predicados, enquanto os acidentes são as características
mutáveis e variáveis da coisa, que explicam sua mudança ao
longo do tempo.
Necessidade e contingência: é correlata da distinção acima.
As características essenciais são necessárias (a coisa não
pode deixar de tê-las sob pena de transformar-se em outra
coisa); já as características contingentes são variáveis e
mutáveis.
Ato e potência: permite explicar a mudança e a
transformação. Uma coisa pode ser una e múltipla ao mesmo
tempo: por exemplo, a semente é árvore em ato e a árvore
adulta é a semente em potência.
109. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
A filosofia aristotélica é sistemática e guiou
a cultura grega e o saber científico a partir
de então.
Sistema: visão integrada do saber,
subdividido em várias áreas.
110. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
A mesma estratégia argumentativa é usada por
Aristóteles a propósito da noção de causa (Teoria
das 4 Causas):
1) Causa Formal: Forma ou modelo que faz com que
a coisa seja o que é. (O que é X? X é uma estátua).
2) Causa material: É o elemento constituinte da coisa,
a matéria de que é feita. (De que é feito X? X é feito
de mármore).
3) Causa eficiente: Agente de produção e
transformação da coisa. (Por que X é X? O que fez
com que X viesse a ser X? A mão do escultor)
4) Causa Final: O objetivo, o propósito, a finalidade da
coisa. (Para que serve X? Para o culto)
111. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Divisão do
conhecimento
segundo Aristóteles:
conhecimento
Prático (práxis):
Ética
e Política
Esses saberes
estabelecem normas
e critérios da boa
forma de agir
Produtivo (poiesis):
artes produtivas
ou criativas (poesia,
arquitetura,
escultura, pintura).
Teórico (theoria):
física,
matemática,
ontologia
(teologia)
112. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Divisão do saber
teórico segundo
Aristóteles:
Saber
Teórico
Física e
astronomia
Ciências
da vida
ou biologia
Matemática
(quantidade,
número)
Psicologia
113. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
O célebre tratado da “Física” examina a realidade natural, as leis do
movimento e das quatro causas no mundo sublunar. Teve grande
importância da antiguidade até os sécs. XV e XVI, quando só então passa
a ser questionado.
Tratado do céu: obra de astronomia. Examina a realidade das esferas
celestes – consideradas “mais perfeitas” (matéria superior) do que a esfera
sublunar. Há uma diferença qualitativa entre os fenômenos da Terra e os
fenômenos celestes – concepção que prevalecerá até a modernidade.
As ciências da vida ou biológicas (“história natural”) incluem os tratados
“História dos animais”, “Marcha dos animais”, “Partes dos animais” :
investigam o ser vivo em movimento.
Psicologia: estudo do ser vivo, sensível e inteligente em movimento. O
mais famoso é o “Tratado da alma”, que examina as diferentes funções da
alma e aspectos do intelecto. Há ainda os tratados “Sobre os sonhos”,
“Sobre a memória”, “Sobre a sensação”.
114. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
O processo de conhecimento para Aristóteles é
linear e sem rupturas (diferentemente do de
Platão). É um processo cumulativo em que se
progride da etapa anterior para a seguinte com
base no conhecimento já obtido:
sensação → memória → experiência →
técnica/arte (téchne) → teoria/ciência (episteme)
115. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Lógica (Analytika): não faz parte da divisão do
sistema do saber pois constitui a metodologia
para todos os saberes. Encontra-se no tratado
chamado “Organon”.
A lógica trata dos princípios da inferência válida.
Os filósofos gregos começaram a discutir os
princípios da inferência válida bem antes de
Aristóteles ter escrito o Organon.
116. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Qualquer investigação científica que
proceda por demonstrações dá origem à
reflexão lógica, uma vez que demonstrar
uma proposição é inferi-la validamente de
premissas verdadeiras.
117. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
Há três tipos diferentes de linguagem nos quais se procura
ou se exige demonstração:
1) Matemática pura: procura demonstrações de verdades
abstratas e a priori. É provável que as primeiras
investigações lógicas tenham sido estimuladas pela
geometria.
2) Metafísica: procura demonstrações de proposições
muito gerais sobre a estrutura do universo.
3) Linguagem política e jurídica: procura demonstrações
de proposições contingentes.
118. Aristóteles (384-322 A.C) (cont.)
A doutrina do silogismo:
O silogismo é uma inferência na qual uma conclusão é necessariamente
deduzida de duas ou mais premissas verdadeiras a partir do
relacionamento de seus termos.
Porque X pertence a todo Y e Y pertence a todo Z, X tem que pertencer a
todo Z.
O termo maior é aquele no qual o termo médio está contido e o termo
menor é aquele que está contido no termo médio. Ex:
Todo homem (termo maior) é mortal (termo médio).
Sócrates (termo menor) é homem (termo maior).
Logo, Sócrates (termo menor) é mortal (termo médio)
119. O Helenismo e suas principais
correntes
O termo Helenismo designa a influência da
cultura grega em toda a região do Mar
Mediterrâneo oriental e o do Oriente Próximo
desde o estabelecimento do império de
Alexandre (332- 323 a.C.) e seus sucessores,
até a conquista romana do Egito em 30 a.C.
(início da influência de Roma naquela região).
120. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
O império de Alexandre significou a primeira hegemonia
militar, econômica (adoção da moeda grega) cultural e
linguística (língua e cultura gregas) da região oriental do
Mediterrâneo. Mas teve curta duração: como Alexandre
não deixou descendentes, seu império foi dividido entre
seus principais generais.
Mas a influência da cultura grega ainda permaneceu
durante muitos séculos em toda a região da
Mesopotâmia ao Egito, incluindo Síria e Palestina (da
época de Cristo).
121. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
A hegemonia da ciência e da filosofia gregas se estende
do império Alexandrino (séc. IV a.C.) até o início da
filosofia medieval com Santo Agostinho (354-430 d.C) e
Boécio (480-524 d.C.).
A influência das escolas filosóficas fundadas no início do
Helenismo e mantidas em Alexandria (capital do império
Alexandrino) permaneceu durante o Império Romano.
Embora houvesse uma filosofia desenvolvida em Roma
e escrita em latim, ela foi uma continuação das escolas
gregas, sobretudo do estoicismo e do epicurismo.
122. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
O grande centro político e cultural do Helenismo foi a cidade de
Alexandria, fundada por Alexandre e capital do reino grego
estabelecido no Egito por seu sucessor General Ptolomeu.
Ao difundir-se para além da Grécia através das conquistas de
Alexandre, a cultura grega entra em contato com outras culturas,
produzindo um “sincretismo” cultural.
Alexandria era uma cidade cosmopolita, predominantemente grega
mas ainda com forte influência do antigo Egito, contando também
com uma ativa e importante comunidade judaica.
123. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
A célebre biblioteca (chamada Museum) de Alexandria, que em seu
auge chegou a ter mais de 500.000 volumes (rolos de papiros), foi
formada a partir da biblioteca e do acervo de Aristóteles.
Por mais de seiscentos anos (desde sua fundação no séc. III a.C.,
atravessando a Idade Média, até o início da Idade Moderna no séc.
XVI), o Museum será o principal núcleo científico e cultural de
ensino e pesquisa do mundo, abarcando templo, anfiteatro, jardim
zoológico, observatório etc.
Foi incendiada duas vezes (na conquista romana do Egito pelo
imperador Julio Cesar em 47 a.C., e em 390 d.C. pelo bispo cristão
Teófilo), até ser finalmente destruída na invasão árabe (Maomé) de
642 d.C.
124. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
O tipo de saber produzido no Museum de Alexandria
afasta-se das preocupações metafísicas das escolas
platônica e aristotélica e valoriza as ciências naturais, a
observação e a pesquisa empírica.
Destacam-se: a matemática e a geometria de Euclides
(final do séc. IV a.C.), cuja obra “Elementos” constitui a
base da geometria clássica; Arquimedes (287-212 a.C.),
importantíssimo para a geometria e a mecânica; a
medicina de Herófilo (séc. III a.C.), descobridor das
funções do cérebro e Erasistrato (séc. III a.C), que
realizou dissecações e estudou a circulação do sangue.
125. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
E mais: estudos da linguagem, com a elaboração da primeira
gramática da língua grega; de astronomia com Aristarco de Samos
(320-250 a.C.), que formulou o primeiro modelo heliocêntrico de
cosmo e a primeira hipótese de rotação da Terra (que entretanto
não vingaram até serem relançados por Copérnico no
renascimento). A geografia será desenvolvida por Erastótenes de
Cireno, autor de importantes mapas e de uma primeira tentativa de
medição da Terra.
Mais tarde Claudio Ptolomeu (100-178 d.C.), geógrafo e astrônomo,
criará o modelo geocêntrico de cosmo que prevalecerá até
Copérnico (1543)
126. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
A filosofia do Helenismo, embora cubra mais de dez séculos, é pouco
estudada nos dias de hoje. No Helenismo não se dava importância à autoria
individual, e sim à vinculação do pensador a uma determinada corrente
filosófica. Há uma tendência doutrinária e a perda do caráter polêmico e
dialético da filosofia grega clássica
Embora tenha havido pensadores importantes, como Plotino (séc. III d.C.),
certamente não houve ninguém da estatura de Sócrates, Platão e Aristóteles.
A produção consistia basicamente de comentários, interpretações e
reproduções de textos clássicos. Isso foi contudo de grande valia pois formou
uma ponte entre a antiguidade clássica e as épocas vindouras.
Dentre esses comentadores está Cícero (séc. I a.C.), jurista, mestre de
oratória, filósofo eclético, importante tradutor de textos gregos para o latim,
tendo criado grande parte do vocabulário filosófico latino que chegou até nós.
127. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
O ecletismo foi um dos traços principais do Helenismo
sobretudo a partir do período romano (final do séc. I a.C,.
Até o séc. IV d.C.). Vários pensadores elaboraram
sínteses entre platonismo e aristotelismo, neopitagorismo
e platonismo, sendo que o próprio cristianismo se
desenvolveu absorvendo elementos importantes da ética
estoica, da metafísica platônica, da lógica e dialética
aristotélicas.
A filosofia do Helenismo é fortemente marcada por uma
preocupação com a ética, entendida como o
estabelecimento de regras do bem viver (arte de viver).
128. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
O ecletismo foi um dos traços principais do Helenismo
sobretudo a partir do período romano (final do séc. I a.C,.
Até o séc. IV d.C.). Vários pensadores elaboraram
sínteses entre platonismo e aristotelismo, neopitagorismo
e platonismo etc., sendo que o próprio cristianismo se
desenvolveu absorvendo elementos importantes da ética
estoica, da metafísica platônica, da lógica e dialética
aristotélicas.
A filosofia do Helenismo é fortemente marcada por uma
preocupação com a ética, entendida como o
estabelecimento de regras do bem viver (arte de viver).
129. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Com o fim da pólis grega devido à centralização política do
império alexandrino, há uma grande redução da
participação política do cidadão. Havia a necessidade de
elaborar-se uma ética que lhe desse novas referências de
conduta, apontando o caminho da felicidade pessoal neste
contexto pluralista e multicultural.
Houve diversas escolas helenistas: o platonismo herdeiro
da academia platônica,o aristotelismo, o neopitagorismo, o
neoplatonismo, mas aqui examinaremos apenas o
estoicismo,o epicurismo e o ceticismo.
130. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Estoicismo:
Fundado em Atenas em 300 a.C.
Há uma estreita conexão entre física e ética. O homem é um
microcosmo num macrocosmo (parte da natureza). Para ter uma
conduta ética que assegure sua felicidade, suas ações devem estar
de acordo com os princípios naturais e a harmonia do cosmo, que dá
equilíbrio ao universo e ao homem.
São três as virtudes básicas: a inteligência (conhecimento do bem e
do mal), a coragem (conhecimento que temer e não temer), e a justiça
(conhecimento do que é devido a cada um).
131. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Estoicismo:
Em virtude da integração do homem à natureza, há um forte
determinismo ou “fatalismo” ético. A noção de necessidade ou “destino”
é muito forte. O homem deve aceitar ou resignar-se aos
acontecimentos.
Se vejo alguém se afogando, devo tentar ajudá-lo, mas se não
conseguir não devo desesperar-me pois era inevitável.
O destino não é cego nem arbitrário pois reflete a racionalidade do real,
que devo aceitar mesmo que não entenda.
132. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Estoicismo:
A felicidade consiste na tranquilidade (ataraxia), ou ausência de
perturbação. Alcança-se esse estado atrvés do autocontrole, da
contenção e da austeridade. Só o “sábio perfeito” é capaz disso, pois
tal perfeição é dificílima de atingir, embora devamos almejá-la e
buscá-la.
A partir do séc. I o estoicismo se desloca para Roma, dando origem
ao “novo estoicismo”, cujos principais representantes foram Sêneca
(4ª.C. – 65 d. C.), Epiteto (60-138 d. C.) e Marco Aurélio (121-180 d.
C.), que foi imperador romano.
O estoicismo latino ou romano caracteriza-se pela ênfase na filosofia
prática e no humanismo, valorizando a indiferença (apatheia) e o
autocontrole.
133. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Epicurismo:
Fundado por Epicuro em Atenas (306 a.C.). Defende uma
física materialista e valoriza a experiência imediata.
A ética epicurista, assim como a estoica, postulava a
felicidade obtida pela tranquilidade ou imperturbabilidade,
mas divergia dos estoicos quanto ao caminho a ser
seguido para atingir a felicidade.
Os epicuristas valorizavam a inteligência prática
(phronesis), considerando não haver conflito entre razão e
paixão.
134. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Epicurismo:
O homem age eticamente quando dá vazão a seus
desejos e necessidades naturais de forma equilibrada ou
moderada, garantindo assim a ataraxia.
Assim, a ética epicurista prega a austeridade e a
moderação, mas não a supressão dos prazeres e desejos
que são expressões de nossa natureza.
135. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Ceticismo antigo:
Embora alguns pensadores pré-socráticos (Demócrito e Crátilo,
discípulo de Heráclito), os sofistas e alguns neoplatônicos podem ser
considerados céticos, o ceticismo antigo foi inaugurado por Pirro de
Élis (360-270 a.C.) e desenvolvido por Sexto Empírico (séc. II d.C.).
Pirro, assim como Sócrates, jamais escreveu nada e considera a
filosofia não uma doutrina, mas uma atitude ou modus vivendi.
Assim como as outras principais escolas do Helenismo (estoicismo e
epicurismo), o ceticismo tem uma preocupação ética ou prática.
136. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Ceticismo antigo:
Embora alguns pensadores pré-socráticos (Demócrito e Crátilo,
discípulo de Heráclito), os sofistas e alguns neoplatônicos podem ser
considerados céticos, o ceticismo antigo foi inaugurado por Pirro de
Élis (360-270 a.C.) e desenvolvido por Sexto Empírico (séc. II d.C.).
Pirro, assim como Sócrates, jamais escreveu nada e considera a
filosofia não uma doutrina, mas uma atitude ou modus vivendi.
Assim como as outras principais escolas do Helenismo (estoicismo e
epicurismo), o ceticismo tem uma preocupação ética ou prática.
137. O Helenismo e suas principais
correntes (cont.)
Ceticismo antigo:
Os céticos duvidam da possibilidade de se adotar um critério de verdade
imune ao questionamento.
O sábio deve suspender o juízo (realizar a Epoché: impossibilidade de afirmar
ou negar) em relação àquilo que é inapreensível, evitando fazer afirmações
falsas.
O filósofo, em sua busca da verdade, defronta-se com uma variedade de
posições teóricas, que entram inevitavelmente em conflito (diaphonia) pois são
mutuamente excludentes, cada uma pretendendo ser a única válida. Dada a
ausência de critério para a decisão sobre qual a melhor teoria, já que os
critérios dependem das próprias teorias, todas se encontram no mesmo plano.
Diante da impossibilidade de decidir, o cético suspende o juízo e descobre-se
livre das inquietações.
138. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
As origens da filosofia cristã:
A religião cristã, embora originária do judaísmo,
surge e se desenvolve no contexto do Helenismo
e é da síntese entre judaísmo, cristianismo e
cultura grega que se origina a tradição cultural
ocidental de que somos herdeiros até hoje.
139. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
Séc. I a. C:
O pensamento helenista e o contexto urbano de
Alexandria fornecem o pano de fundo político e cultural
que permite a aproximação entre a cultura judaica e a
filosofia grega, fazendo surgir uma filosofia cristã.
Nesse período Alexandria é uma cidade cosmopolita, onde
convivem diversas culturas: egípcia (da região), grega
(dos fundadores da cidade), romana (do Império que havia
recentemente conquistado o Egito) e judaica (da grande
comunidade que ali habitava).
140. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
Fílon de Alexandria (Fílon, o judeu: 25 a.C. – 50
d.C.)
Produziu uma série de comentários ao
Pentateuco (“Livro da Lei”: os cinco livros iniciais
do Antigo Testamento) aproximando-o da filosofia
grega platônica: cosmologia do Timeu com a
narrativa da criação do mundo no Gênesis.
141. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
No Timeu Platão apresenta uma explicação da origem do cosmo
segundo a qual o demiurgo (artífice), olhando para as Formas ou
Ideias eternas que lhe servem de modelos, organiza a matéria e dá
origem a todas as coisas.
Na interpretação de Fílon, Deus (e não o demiurgo) cria o cosmo a
partir das ideias de sua própria mente e não contemplando-as “fora”
dele, como o demiurgo do Timeu.
Esta é uma das origens da concepção, que se desenvolverá
progressivamente ao longo desta tradição, segundo a qual as ideias
são “entidades mentais” (e não “formas independentes” existindo em
um mundo próprio e separado, como queria Platão). As ideias
inicialmente estão na mente de Deus; depois estarão na mente
humana (Descartes, séc. XVII)
142. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
Mesmo sem ser cristão, Fílon abre caminho para a síntese
entre cristianismo e filosofia grega que ocorre ao longo dos
três primeiros séculos da religião cristã. (Inicialmente o
cristianismo era visto como uma “seita” ou movimento
reformista no interior da religião judaica: ambos são
monoteístas, ao contrário da religião grega, que era
politeista).
Fílon retoma o conceito grego do LOGOS, interpretando-o
como um princípio divino a partir do qual Deus opera no
mundo. Essa visão encontra-se na abertura do quarto
evangelho (de São João), escrito no final do séc. I em
Éfeso, em que se lê: “No princípio era o verbo (Logos)”.
143. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
O primeiro marco na constituição do cristianismo como
religião independente, dotada de identidade própria, é a
pregação de São Paulo, um judeu helenizado, funcionário
do Império Romano, que passa a difundir a religião cristã
em suas viagens pelos principais centros do Império.
São Paulo veicula a ideia de uma religião universal: “não
há judeu, nem grego, nem escravo, nem homem livre,
nem homem, nem mulher: todo sois um no Cristo Jesus”.
144. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
A mensagem cristã não se dirige apenas a um povo
escolhido mas é universal, pois todos os homens foram
criados à imagem e semelhança de Deus (Gênesis 1, 26).
Esta é uma diferença básica em relação ao judaísmo e às
demais religiões da época, que não tinham pretensão de
evangelizar ou converter outros povos.
O contexto de Alexandria e do Helenismo favoreceu isso
pela existência de uma cultura hegemônica, a de língua
grega (que entretanto assimilou traços das diferentes
culturas locais), e da unidade político-administrativa
originada desde o Império de Alexandre.
145. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
A difusão do cristianismo é um processo paulatino
desenvolvido ao longo de alguns séculos até sua
consolidação com o imperador Constantino (batizado em
337 d.C.) que a institucionalizou como religião oficial do
Império Romano (391 d.C.).
O cristianismo difundiu-se através de núcleos de fiéis nos
principais centros urbanos, levando adiante a missão de
São Paulo, pequenas comunidades que se reuniam em
torno de uma liderança(futuramente o bispo) para leituras,
prátcas religiosas, rituais. Daí se origina o termo “igreja”, a
partir do grego ecclesia (assembleia ou reunião).
146. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
São Justino é tido como o primeiro filósofo a se
converter ao cristianismo, passando a considerálo como a verdadeira filosofia e a defender a ideia
e a necessidade de uma filosofia cristã.
Os filósofos e teólogos que seguem essa via são
chamados apologetas (defensores) do
cristianismo e seu pensamento será conhecido
como patrística (doutrina dos pais da Igreja)
147. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
A escola neoplatônica cristã de Alexandria elabora e
desenvolve a síntese entre o platonismo e os
ensinamentos cristãos:
Clemente de Alexandria (150-215 d.C.):
Dá continuidade à interpretação de Fílon que aproxima a
cosmologia platônicado Timeu da narrativa da criação no
Gênesis. Defende também o papel pedagógico da filosofia
como preparação do espírito para a revelação.
148. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
Orígenes (184-254):
Segue a mesma interpretação do Gênesis e funda uma
escola cristã em que o estudo da filosofia grega era parte
do currículo.
Defende o uso pelos cristãos da filosofia grega e influencia
fortemente a filosofia medieval. Sócrates, Platão e alguns
estóicos são vistos como precursores do cristianismo por
sua sabedoria e virtude, não tendo sido cristãos apenas
por terem vivido antes da vinda de Cristo.
149. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
Há porém aqueles que se opõem a essa interpretação.
Teólogos como Taciano (séc. II), Tertuliano (155-222) e
Lactâncio (240-320) advertem que a filosofia grega é pagã
e portanto alheia à mensagem cristã: seus métodos e
discussões podem ser perniciosos. Algumas passagens
das Epístolas de São Paulo parecem condenar a filosofia
(Destruirei a sabedoria dos sábios e a inteligência dos
inteligentes”). A filosofia é desnecessária à fé pois a fé é
um pressuposto do entendimento da mensagem divina e
não um meio de alcançá-la”.
“Se não crerdes não entendereis” (Isaías 7,9).
150. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
Essa controvérsia acompanhará todo o pensamento medieval: conflito entre
razão e fé.
Seriam a razão, o conhecimento e a filosofia preparações para a fé ou, ao
contrário, a fé ou “sabedoria revelada” independeriam da filosofia, não
podendo ser justificadas ou explicadas?
Diferentes pensadores tomaram posições opostas a esse respeito.
De qualquer forma, mesmo os defensores da importância da filosofia grega
admitirão que os ensinamentos dos textos sagrados têm precedência e
portanto só podem ser aceitas doutrinas filosóficas compatíveis com esses
ensinamentos. Os chamados dogmas não são passíveis de discussão.
Com isso a filosofia perde bastante de seu espírito crítico inicial.
151. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
Os diversos Concílios (reuniões de bispos e líderes religiosos) fixarão a
doutrina considerada legítima e condenarão os que não aceitarem esses
dogmas como hereges, expulsando-os da Igreja.
Mas mesmo nas discussões travadas nos concílios encontram-se elementos
da filosofia grega em defesa de determinados pontos doutrinários, na fixação
dos dogmas e na condenação das heresias. É justo a partir desse momento
que a filosofia grega se incorpora de maneira definitiva à tradição cristã,
formando as bases do desenvolvimento do pensamento medieval.
A lógica e a retórica fornecem os meios de argumentação e os instrumentos
interpretativos das sagradas escrituras. A metafísica (Platão e Aristóteles)
fornece os conceitos-chave (substância, essência etc.) em função dos quais
questões teológicas como a unidade das 3 pessoas divinas e a natureza
divina ou humana de Cristo são discutidas.
152. O surgimento da Filosofia Cristã no
contexto do Helenismo
A leitura que os primeiros pensadores cristãos fazem da filosofia
grega é seletiva, sempre de acordo com o que eles consideram
compatível com o cristianismo enquanto religião revelada.
Privilegia-se a metafísica platônica com seu dualismo entre mundo
espiritual e material, a lógica aristotélica com seus recursos
demonstrativos e dialéticos, e a retórica e a ética dos estóicos, com
sua ênfase na resignação, na austeridade e no autocontrole.
153. O pensamento de Santo Agostinho
(354 d. C.)
Considerado o último dos pensadores antigos (pela
cronologia) e também o primeiro dos medievais, já que
sua obra de grande originalidade influencia fortemente os
rumos do pensamento medieval até a redescoberta do
pensamento de Aristóteles no séc. XIII.
Foi o filósofo mais importante a surgir depois de Platão e
Aristóteles. Contribui decisivamente para a consolidação
do cristianismo na formação da cultura ocidental. Sua
aproximação com o platonismo foi influenciada pelos
intérpretes da escola de Alexandria.
154. O pensamento de Santo Agostinho
(354 d. C.)
A verdadeira e legítima ciência é a teologia, que prepara a
alma para a salvação e a visão de Deus, que é sua
recompensa.
Essa concepção foi interpretada posteriormente, no início
do período medieval, como desvalorizando o
conhecimento do mundo, inclusive a ciência, o que
explica em parte o desinteresse do cristianismo pela
ciência natural nos primeiros séculos da Idade Média
155. O pensamento de Santo Agostinho
(354 d. C.)
S. Agostinho se pergunta como pode a mente humana, mutável e
falível, atingir uma verdade terna com certeza infalível. Sua resposta
a essa questão se encontra em sua teoria da iluminação divina,
elaborada com base na teoria platônica da reminiscência.
Seu ponto de partida e desenvolvimento são semelhantes em muitos
aspectos ao diálogo Ménon de Platão, em que se discute o que é a
virtude e se esta pode ser ensinada.
A resposta de Platão é negativa: a virtude não pode ser ensinada
pois ou já a trazemos conosco ou nenhum mestre será capaz de
introduzi-la em nossa alma, uma vez que é uma característica da
própria natureza humana.A função do filósofo é precisamente
despertar essa virude adormecida na alma dos indivíduos.
156. O pensamento de Santo Agostinho
(354 d. C.)
S. Agostinho (em De magistro) começa igualmente se interrogando
sobre o que é ensinar e aprender, o que torna essa obra um dos
textos clássicos de pedagogia. Indaga em seguida acerca do papel
da linguagem e da comunicação no processo de ensino e
aprendizagem, o que torna a obra também um clássico da teoria da
linguagem e do significado, assunto que S. Agostinho se ocupou em
várias de suas obras.
Após uma detalhada consideração da natureza do signo linguístico e
do processo de comunicação, Agostinho conclui que, dada a
convencionalidade do signo, isto é, dado que as palavras variam de
língua para língua (são sinais arbitrários das coisas), o signo não
pode ter qualquer valor cognitivo mais profundo: não é através das
palavras que conhecemos: o conhecimento não pode ser transmitido
pela linguagem.
157. O pensamento de Santo Agostinho
(354 d. C.)
A possibilidade de conhecer supõe algo prévio que torna
a própria linguagem inteligível: trata-se da mesma
posição inatista defendida por Platão. O conhecimento
não pode derivar da impressão sensível ou da
experiência concreta, necessitando de algo a priori como
ponto de partida para o processo de conhecer.
Ao invés da teoria da anamnese, contudo, Agostinho
desenvolve sua teoria da interioridade e da iluminação
interior. Pode ser considerado, portanto, o prenunciador
do conceito de subjetividade do pensamento moderno.
Encontra-se já nele a oposição entre “interior” e “exterior”
e a concepção de que a interioridade é o lugar da
verdade.
158. O pensamento de Santo Agostinho
(354 d. C.)
A mente humana possui uma centelha do intelecto divino, já que o
homem foi criado à imagem e semelhança de deus. Essa tese vem
substituir a tese platônica da reminiscência, explicando o ponto de
partida do processo de conhecimento e abrindo caminho para a fé.
Essa teoria permitirá que a Igreja se dedique a converter os bárbaros
pagãos, ao invés de combatê-los pelas armas. Tornou possível assim a
cristianização da Europa ocidental naquele momento de declínio do
Império romano.
159. A filosofia medieval
Corresponde ao longo período histórico que vai do final do
Helenismo (sécs. IV e V d.C.) até o Renascimento e início
do Pensamento Moderno (final do séc. XV e séc. XVI):
aproximadamente 10 séculos, portanto.
Porém a maior parte da produção filosófica da Idade Média
está concentrada entre os sécs. XII e XIV, período do
surgimento e desenvolvimento da Escolástica.
160. A filosofia medieval (cont.)
Primeiro período: imediatamente posterior à queda do
Império Romano (séc. V) até os sécs. IX e X, quando a
situação econômica e política comeca a se estabilizar.
Segundo período (final): sécs. XI a XV (período de
desenvolvimento da Escolástica, com uma grande
produção filosófica a partir da criação das universidades)
até a crise do pensamento escolástico e surgimento do
humanismo renascentista (sécs. XV e XVI).
161. A filosofia medieval (cont.)
Santo Agostinho é considerado o último dos pensadores
antigos e também o primeiro dos medievais, já que sua
obra influenciará fortemente os rumos do pensamento
medieval em seus primeiros séculos.
Após sua morte e até os séculos XI-XII é extremamente
reduzida a produção filosófica e cultural no mundo europeu
ocidental.
162. A filosofia medieval (cont.)
Boécio foi outro pensador fundamental para a mediacão
entre a filosofia antiga e a cristã medieval. Boécio era
romano e cristão.
Este período é caracterizado pela fragmentacão política,
cultural e linguística do mundo europeu: instabilidade social
e econômica. O Império Romano havia se dissolvido depois
de séculos, após as sucessivas invasões bárbaras.
163. A filosofia medieval (cont.)
Surgem os primeiros reinos bárbaros na Europa Ocidental:
os visigodos na Península Ibérica, os burgúndios e os
lombardos no sul da França e norte da Itália, os francos na
atual França e oeste da Alemanha, os saxões na Alemanha
e Inglaterra.
Neste contexto é praticamente nula a produção filosófica e
cultural de modo geral. Em 529 são Bento cria, na Itália, a
ordem monástica beneditina, em cujos mosteiros serão
preservadas algumas das mais importantes obras da
Antiguidade.
164. A filosofia medieval (cont.)
No mesmo ano, o Imperador Justiniano fecha as últimas
escolas de filosofia no Império Romano do Oriente.
Os monges beneditinos eram copistas, que produziram
cópias de manuscritos e obras antigas, permitindo que
fossem preservados e difundidos.
Durante esse período a Igreja era a única instituição estável
e a única responsável pela educação e cultura. Foi nas
bibliotecas dos mosteiros que foram guardados textos da
Antiguidade clássica greco-romana.
165. A filosofia medieval (cont.)
A guarda desses textos era feita, contudo, de uma forma
bastante seletiva, já que foram mantidos essencialmente
textos considerados compatíveis com o cristianismo,
sobretudo os textos dos pensadores dos primeiros séculos
da era cristã.
Aos poucos o mundo ocidental foi começando a se
reestruturar e um importante fato foi a criação do Sacro
Império Romano Germânico (séc. IX). Carlos Magno (rei
dos francos) foi coroado imperador pelo papa.
Isso representou a primeira tentativa de reunificação do
mundo europeu depois da queda do Império Romano do
166. A filosofia medieval (cont.)
O império de Carlos Magno foi buscar na antiguidade
clássica (greco-romana) a identidade política e cultural
necessária para a consolidação do novo império. O período
é chamado de a “Renascença Carolíngia”.
Funda-se a Academia Palatina, instituição que visava o
ensino e a formação de quadros intelectuais e culturais do
novo império.
A filosofia voltou a ter importância. João Escoto Erígena
(810-870) surge como o primeiro autor a elaborar um
pensamento novo desde santo Agostinho.
167. A filosofia medieval (cont.)
Escoto Erígena retoma a filosofia agostiniana e o
neoplatonismo.
Funda-se a Academia Palatina, instituição que visava o
ensino e a formação de quadros intelectuais e culturais do
novo império.
A filosofia voltou a ter importância. João Escoto Erígena
(810-870) surge como o primeiro autor a elaborar um
pensamento novo desde santo Agostinho.
168. A filosofia medieval (cont.)
Santo Anselmo de Canterbury e o desenvolvimento da
escolástica:
S. Anselmo é o primeiro grande pensador do período
conhecido por “Escolástica”.
Sua filosofia preocupa-se em articular a fé e o
entendimento, a razão e a revelação.
169. A filosofia medieval (cont.)
Santo Anselmo de Canterbury e o desenvolvimento da
escolástica (cont.):
Nasceu na Itália, tornou-se monge beneditino na França e
foi nomeado arcebispo de Canterbury na Inglaterra
(exemplo do caráter transnacional da Igreja na época e da
mobilidade geográfica típica de um eclesiástico de seu
tempo.
As ordens religiosas possuíam abadias e conventos nos
diferentes territórios da Itália, França, Alemanha.
170. A filosofia medieval (cont.)
O latim era conhecido e falado por todos que tinham algum
grau de instrução, o que facilitava a comunicação.
Os abades e priores dos conventos eram na prática
senhores feudais, proprietários de terras, e desfrutavam de
grande autonomia e autoridade espiritual e política.
Santo Anselmo segue a tradição agostiniana, procurando a
aproximação entre a filosofia e a teologia, consagrando as
fórmulas: “creio para compreender” e “a fé buscando a
compreensão”.
171. A filosofia medieval (cont.)
A prova ontológica da existência de Deus segundo S.
Anselmo:
Do conceito de Deus como um Ser Perfeito (um ser do qual nada
maior ou mais perfeito pode-se pensar) deriva-se a sua existência (a
tal ser nada pode faltar, inclusive a esistência). Assim, alguém que
entenda esse conceito não pode coerentemente duvidar da existência
de Deus: passagem do campo lógico-semântico (a definição de Deus)
para o campo ontológico (a existência de um ser correspondente a
esse conceito).
Dado o entendimento desse conceito (elemento epistemológico), não
se pode evitar a aceitação da existência desse ser (elemento
ontológico).
172. A filosofia medieval (cont.)
A conclusão de santo Anselmo é que não se pode pensar, sem
contradição, a inexistência de um ser do qual nada maior pode ser
pensado. Desse modo fica provada a existência de Deus.O argumento
só é aplicável a deus, devido à necessidade desse ser (diferentemente
de qualquer outra coisa)
Essa prova segue o objetivo de santo Anselmo de conciliar a razão e
afé. Aquilo que a fé nos ensina pode ser entendido pela razão e a
filosofia nos ajuda a argumentar a favor disso: tal é a característica da
Escolástica ao utilizar a forma de argumentar da filosofia, bem como
seus conceitos básicos) em defesa de questões religiosas e teológicas.
173. A Filosofia Árabe
A escolástica caracteriza-se por resgatar a filosofia aristotélica, que
havia sido esquecida em favor do platonismo. Foram os árabes
resgataram e difundiram o aristotelismo no Ocidente. Vejamos como.
O império de Alexandre havia unificado o Oriente Médio e seguido até
a Índia, expandindo a língua e a cultura gregas que se mantêm durante
o Império Romano.
O profeta Maomé no ano de 622 assume a liderança do povo árabe
que vivia na península Arábica, fundando a religião islâmica. Após sua
morte os “califas” (seus representantes) expandiram rapidamente seus
domínios para a Síria, Palestina, Mesopotâmia, Pérsia, Egito e todo o
norte da África.
174. A Filosofia Árabe
Os árabes entram em contato com os núcleos de cultura
grega e cristã estabelecidos nessas regiões, sabendo
valorizar seus ensinamentos, absorvendo essa cultura e
desenvolvendo-a nas várias áreas da ciência (matemática,
química, medicina, agronomia e filosofia).
Eles leram, traduziram e comentaram as obras de Platão e
Aristóteles (ex: Avicenna, Averróes).
A cidade de Bagdá na Mesopotâmia tornou-se a capital do
Império Árabe e já no séc. IX era altamente desenvolvida,
sem rival na época.
175. A Filosofia Árabe
Após a conquista do norte da África e a conversão ao Islã
dos povos locais (berberes), os árabes invadem em 711 a
Península Ibérica, derrotando os visigodos.
Em menos de um século eles haviam conquistado um
imenso teritório, formando o mais vasto império de sua
época. Só foram derrotados ao quererem invadir a França.
Estabeleceram na Espanha o Emirado de Córdoba,
posteriormente tornado independente de Bagdá e chamado
El Andaluz. Nos séculos seguintes Córdoba será a cidade
mais desenvolvida, rica e culta da Europa Ocidental.
176. A Filosofia Árabe
Os árabes levam para a Península Ibérica sua vasta cultura
e conhecimento da filosofia e da ciência gregas, que,
traduzidas para o siríaco e para o árabe, eram superiores
às do mundo cristão latino da Europa, que permanecia
ainda fragmentado desde as invasões bárbaras.
Os árabes eram herdeiros da mesma tradição grega
helenística do mundo cristão ocidental.
O grande desenvolvimento da filosofia escolástica a partir
do séc. XIII é devido à influência árabe.
177. A Filosofia Árabe
O melhor disso foi a transmissão da obra científica e
filosófica de Aristóteles e sua escola. Naquela época, o
conhecimento dos filósofos gregos na Europa restringia-se
a alguns textos de Platão e dos neoplatônicos e apenas os
tratados da lógica de Aristóteles.
O principal autor árabe é Averróes (1126-1198): através de
sua obra Aristóteles tornou-se conhecido no mundo crsitão
latino.
178. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão
Contexto histórico:
O mundo europeu dos séculos XI e XII já é bastante
diferente dos primeiros séculos da Idade Média.
Desenvolve-se uma intensa atividade artesanal e comercial
que, juntamente com uma progressiva imigração do campo
para as cidades devido às crises na produção agrícola,
leva ao enriquecimento de um segmento da população
(burgueses) e ao surgimento de núcleos urbanos
importantes (burgos).
179. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
As futuras cidades-estados italinas, berço da Renasença
(Florença, Bolonha, Milão, Pádua, Veneza) crescem
rompendo pouco a pouco com a ordem econômica e
política do feudalismo.
O mundo fechado e hierárquico do feudalismo, com sua
vida circunscrita à aldeia e ao campo em torno do castelo
ou da abadia, e a pouca mobilidade social e territorial, dá
lugar a uma nova ordem política e econômica.
Os artesãos se mobilizam em ligas (corporações de ofício)
para regulamnetar suas práticas e proteger seus
interesses.
180. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
As transformações são lentas mas profundas, e se
restringem a algumas regiões em particular, prenunciando
a verdadeira “revolução” que acontecerá nos séculos
seguintes (XIV e XV), com o início da idade Moderna.
Ora, a obra de Aristóteles, com sua preocupação científica
e empírica voltada para a realidade natural, parece mais
adequada a esse novo contexto do que o platonismo.
No século XIII há o surgimento das universidades. São
Tomás de Aquino é um monge dominicano que também
fará carreira nas universidades da época, sobretudo em
Paris.
181. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
As universidades surgem em consequência do grande
desenvolvimento das escolas ligadas às abadias e
catedrais criadas a partir do período carolíngeo (Império de
Carlos Magno)
Com o crescimento dos núcleos urbanos e o
enriquecimento da população, há o aumento da procura,
pela elite econômica, por uma educação tanto eclesiástica
quanto leiga (governos e administração pública).
As universidades seguem o modelo das corporações de
ofício, com mestres e aprendizes.
182. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
O termo universitas designa o conjunto de mestres e estudantes
provenientes de diferentes regiões, reunidos numa determinada
cidade. Os graduados recebiam o direito de lecionar em todo o mundo
cristão (latino): saber universal.
As universidades estruturam-se em torno de um currículo derivado das
antigas escolas da Antiguidade e das abadias e mosteiros do início da
Idade Média.
A despeito da inicial rejeição da Igreja, são as obras de Aristóteles e
dos pensadores árabes leitores de Aristóteles que interessam ao
ensino universitário, especialmente o foco na ciência natural até então
pouco desenvolvida.
183. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
Setores mais tradicionalistas da Igreja começam a proibir o
ensino de Aristóteles a partir de 1215 por considerarem-no
herético ao valorizar a “experiência”.
A partir do esfacelamento do mundo árabe pelas invasões
de turcos e mongóis, e a queda do Império Romano do
Oriente pelas mesmas razões, o centro da produção
filosófica desloca-se para o Ocidente (Paris e Oxford, as
maiores cidades universitárias).
A universidade medieval ainda é um modelo de
universidade até hoje, apesar das sucessivas mudanças
que sofreu ao longo dos tempos.
184. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
O pensamento de São Tomás de Aquino teve
imensa influência em sua época e esta influência
estende-se até os dias de hoje (neotomismo).
Tratou de todas as grandes questões da filosofia e
da teologia, tomando Aristóteles como ponto de
partida de seu grande sistema (e não o platonismo
e o agostinismo com era comum até então).
Tomás mostra que a filosofia aristotélica é
perfeitamente compatível com a filosofia cristã.
185. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
Tomás nasceu em Nápoles em 1224 e viveu até 1274. Era
de família nobre e entra para a ordem dos dominicanos em
1244 apesar da oposição da família, indo estudar em Paris.
Seu principal mentor foi santo Alberto Magno (1206-80),
grande conhecedor da ciência da época, que iniciou-o na
obra de Aristóteles.
Como professor da Universidade de Paris começou a
desenvolver sua grande obra, quase toda ela produto das
notas de seus cursos: “Sobre o ente e a essência”, “Suma
contra os gentios”, “Suma Teológica”.
186. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
Sua obra será censurada em Paris por ser aristotélica, em
1277. Com o apoio dos dominicanos, sua obra continuou a
ser estudada. Em seguida a Igreja reconhece seu valor.
Em 1323 ele é canonizado. Em 1567 é declarado “Doutor
da Igreja” e sua obra é depositada no altar ao lado da
Bíblia, por sua importância no combate ao protestantismo.
O tomismo vai ser considerado exemplo de ortodoxia
católica e confundida com posições conservadoras no
período moderno. Mas isto não faz jus a santo Tomás.
Tomás tinha grande admiração por Aristóteles (“o filósofo”)
e por Averróes, a quem chama de “o comentador”.
187. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
Uma grande contribuição sua foi a rejeição da prova
ontológica da existência de Deus de santo Anselmo.
São Tomás elabora a sua própria prova da existência de
Deus, que tem 5 vias. (A demonstração racional da
existência de Deus é uma das questões mais centrais do
pensamento medieval).
Tomás foi um pensador de grande originalidade e
criatividade, com agudeza de raciocínio e grande
capacidade argumentativa. Todo estudante de teologia e
filosofia de então passou a copiar seu estilo rigidamente
sistemático, o que empobreceu o tomismo e fez com que
os filósofos do Renascimento o rejeitassem.
188. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
Se convém entender o conhecimento autoevidente de Deus como inato, ié,
natural ao homem (Santo Anselmo), este conhecimento contudo é confuso e
não pode ser considerado um conhecimento absoluto de que Deus existe.
Santo Anselmo diz que quem entende a definição de Deus como de um ser
supremo do qual nada de maior pode ser pensado, deve aceitar sua existência,
já que nada pode faltar a Ele. Contudo, Tomás rejeitará a passagem
automática do entendimento da definição de Deus (sua existência no intelecto)
para a sua existência de fato: primeiro porque a definição de que se parte pode
não ser aceita, segundo porque a existência no intelecto é diferente da
existência real.
Tomás considera que a existência da verdade é autoevidente, já que é
impossível negar a verdade pois aquele que a nega supõe que sua negação
seja verdadeira, mas não é autoevidente a existência de uma verdade primeira
determinada. A conclusão é que Deus não é autoevidente, precisando ser
demonstrado através daquilo que conhecemos.
189. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
Enfim, as 5 vias da demonstração da existência de Deus por São Tomás,
todas derivadas de Aristóteles:
1)
Argumento do movimento: tudo que se move é movido por algo imóvel. Já
que não se pode admitir uma regressão ao infinito, Deus é entendido como o
Primeiro Motor (imóvel).
2)
Argumento da causa eficiente: nada pode ser causa eficiente de si próprio,
pois nesse caso seria anterior a si próprio. Como não é possível admitir uma
regressão infinita de causas, Deus é a primeira causa eficiente.
3)
Argumento cosmológico: baseia-se nas noções aristotélicas de necessidade
e contingência e visa explicar a necessidade da existência do universo
(cosmo). A natureza é contingente mas nem todas as coisas podem ser
contingentes, senão seria possível que não houvesse nada. É preciso que
algo do que existe seja necessário.
190. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
4) Argumento dos “graus” existentes nas coisas: todas as coisas que
têm um predicado ou qualidade, caracterizam-se por um termo
comparativo (mais ou menos isso ou aquilo), portanto pressupõem
um parâmetro máximo. Deus é o ser perfeito,ié, aquele que tem o
grau mais alto de perfeição (entendida como o máximo de realização
de atributos ou qualidades).
5) Argumento teológico: parte da noção de finalidade ou causa final.
Deve haver um propósito ou finalidade na natureza, do contrário o
universo não tenderia para o emso fim ou resultado. A causa
inteligente dessa determinação é Deus.
Os argumentos de são Tomás vão contra a concepção de que se
pode conhecer Deus diretamente ou através de uma “evidência”
sem passar pelo mundo sensível. Vão também contra a suposição
de que só se pode conhecer Deus pela fé, e de que só se pode falr
de Deus se já se sabe quem Ele é.
191. São Tomás de Aquino e o
Aristotelismo Cristão (cont.)
Os argumentos de são Tomás abrem caminho para uma
revalorização aristotélica do mundo natural como objeto
de conhecimento: conhecemos Deus por seus efeitos,
por sua obra, o mundo criado, a natureza.
O criador sempre deixa sua marca no que cria. Isso torna
legítimo, do ponto de vista teológico, o interesse pela
investigação científica do mundo natural, que despertava
nesse momento a curiosidade do homem medieval
devido à influência das obras científicas aristotélicas e
árabes, e também correspondia às necessidades de um
mundo em rápido desenvolvimento econômico e social.
Isso prenuncia o que virá nos séculos seguintes no
mundo europeu ocidental.