O documento descreve o primeiro contato entre os portugueses e os nativos da região. Os nativos trouxeram comida e água para os portugueses, mas estes não quiseram comer ou beber quase nada. Um nativo gostou muito de um rosário que viu. Os portugueses deram presentes aos nativos em troca de arcos e setas. Muitos nativos tinham adornos nos lábios e orelhas. Alguns portugueses foram deixados com os nativos para aprender sobre seu estilo de vida.
2. Deram á eles ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, bolos de
açúcar, mel e figos passados. Eles não quiseram comer quase nada, e o que
provaram, logo jogaram fora. Eles trouxeram vinho numa taça, mal colocaram
a boca; não gostaram de nada e não quiseram mais nada. Trouxeram água em
uma vasilha. Não beberam. Mal colocaram na boca, e logo jogaram fora.
Um deles viu um rosário e acenou para que lhe dessem, folgou muito
com ele e colocou no pescoço. Depois tirou e enrolou no braço, ele mostrava
para a terra e de novo para o rosário e depois para o colar do capitão dizendo
que dariam ouro por aquilo.
Ele queria dizer que levaria o rosário mais o colar, mas ele não queria
entender o porquê não havíamos de dar.
Então eles deitaram de costas no tapete,para dormir, sem encobrir suas
vergonhas, que não eram circuncisadas e as cabeleiras delas estavam bem
rapadas e feitas. O capitão colocou almofadas por baixo de suas cabeças e um
cobertor por cima, eles consentiram e adormeceram.
No sábado pela manhã o capitão mandou-nos embora e fomos
procurar a entrada da qual era muito larga e alta de seis a sete braças.
Entraram todos os barcos dentro, e ancoraram em cinco ou seis braças, a
ancoragem era tão grande , tão formosa e tão segura que podia abrigar nela
mais de duzentos navios e barcos.
3. Então muitos começaram a chegar; e entravam pela beira do mar para as
canoas, até onde podiam. E traziam cabaças d'água, e tomavam alguns barris que
levávamos e os enchiam de água e traziam ate as canoas. Não que eles chegassem a
bordo das canoas. Mas junto a ela, nos lançavam os barris cheios de água. E nós o
tomávamos. E eles pediam alguma coisa em troca. Levava Nicolau Coelho o chocalho
da cobra cascavel e pulseiras. E dava a alguns um chocalho, e a outros uma pulseira,
de maneira que com aqueles atrativos quase que nos queriam dar a mão. Davam
para nós arcos e setas em troca de chapéus e carapuças de linho, e de qualquer coisa
que a gente queria dar a eles.
Dali se partiram os outros, dois jovens, que não os vimos mais.
Muitos deles ou quase a maioria que ali andavam tinham aqueles bicos de
osso nos lábios. E alguns, que andavam sem eles, tinham os lábios furados e nos
buracos uns pequenos recipientes de couro para vinhos, sendo a tampa, de pau,
chamada de espelho. E alguns deles traziam três daqueles bicos, sendo um no meio,
e os outros nas extremidades. E outros andavam, divididos em cores, sendo metade
deles da sua própria cor, e metade de tintura preta, um tanto azulada; e outros
divididos em cores se assemelhando aos quadrados dos tabuleiros de xadrez.
Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem novinhas e gentis, com
cabelos muito pretos e compridos pelas costas; e suas partes intimas, tão altas,
aparadas e limpas de cabelos que, de as olharmos, não nos envergonhavam.
4. Os barcos chegaram ancorados e todos os capitães vieram ao barco
do capitão Mor.E os mandaram a Nicolau Coelho e Bartolomeu que fossem
em terra e levassem aqueles dois homens e os deixassem ir com seu arco e
setas, tudo isso depois que cada um com sua camisa nova, sua carapuça
vermelha e um rosário de contas brancas de osso , que eles levaram nos
braços, suas cascavéis e suas companhias.Entrou com eles um escravo
degredado, criado de D. João Telo, chamado Afonso Ribeiro, para andar com
eles e saber sobre sua maneira de viver.
Fomos rapidamente direto a praia.Ali acudiram a obra de duzentos
homens todos nus, e com arcos e setas nas mãos.Aqueles que levávamos
acenaram para que eles se afastassem e descansassem os arcos, e eles
descansaram mas não se afastaram muito. E mal descansaram os arcos,
saíram os que nós levávamos e um jovem degredado com eles. Quando
saíram não passaram mais, e não esperava um pelo o outro e corriam a
quem mais corria. E passaram por um rio que por ali corre, de água doce com
muito água que batia na coxa deles. E eles foram correndo além do rio, entre
moitas onde estavam outros e ali passaram. Entretanto se foi o degredado
com um homem que ao sair do barco, o agasalhou e o levou até lá. Mas logo
voltaram até nós, e com ele vieram os outros que nós levamos, os quais
vinham nus e sem carapuças.