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TEATRO DO OPRIMIDO E TEATRO-EDUCAÇÃO: CONSTRUINDO CAMINHOS
NA EDUCAÇÃO DO SENSÍVEL
Marli Susana Carrard Sitta
UPF
Cilene Maria Potrich
UPF
Graciela Ormezzano
UPF – UNOESC
Resumo: A pesquisa realizada focou o desenvolvimento de jogos e
exercícios teatrais, de acordo com a proposta do Teatro do Oprimido de Augusto
Boal, cujo objetivo principal foi proporcionar uma experiência estética na educação,
possibilitada pelo contato com os códigos estéticos da arte teatral, desvelando seus
significados e suas implicações para a construção do conhecimento e o
desenvolvimento humano. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de cunho
fenomenológico. As atividades pedagógicas foram desenvolvidas com nove
professoras de diversas áreas do conhecimento, da rede pública estadual, na cidade
de André da Rocha, RS com duração de 32 horas/aula. Utilizou-se um diário de
campo para registrar todas as informações obtidas durante o desenvolvimento das
atividades artístico–pedagógicas. Também foi aplicada uma entrevista individual no
final dos encontros. Os achados da investigação foram considerados a partir da
observação do grupo e, também, por meio da reflexão crítica do que aconteceu nos
quatro encontros do desenvolvimento do trabalho, resgatando-se a fala das
professoras quanto à significação dos encontros, que girou em torno de um melhor
relacionamento com seus alunos, deixando-as mais espontâneas e confiantes no
seu fazer pedagógico diário. A cada encontro mostravam-se mais motivadas. As
experiências estéticas revelaram-se inquietantes para o grupo de docentes, levando-
as a refletir sobre o papel de “ser educador”, comprometendo-as de forma pessoal
nas transformações vistas como necessárias no âmbito educacional.
Palavras-chave: Educação básica; Teatro do Oprimido; teatro-educação;
educação sensível; experiências estéticas.
Considerações iniciais
Neste artigo pretendemos divulgar uma pesquisa qualitativa cuja temática
está centrada numa experiência estética que busca aguçar os sentidos emergente
dos jogos e exercícios teatrais do arsenal do Teatro do Oprimido, de Augusto Boal
(1998), em escola estadual, e desvelar a sua importância como processo de
aprendizagem para a vida.
O principal objetivo da investigação foi proporcionar uma experiência estética
na educação, possibilitada pelo contato com códigos estéticos da arte teatral,
desvelando seus significados e suas implicações para a construção do
conhecimento e para o desenvolvimento humano. Abrem-se, assim, precedentes
para os seguintes objetivos específicos: promover a valorização de um saber
sensível e suas relações no âmbito da educação básica; auxiliar na percepção da
realidade e na práxis por um projeto educacional mais humanitário; oferecer também
aos educadores de arte subsídios para a ação/reflexão/ação a partir dos jogos e
exercícios teatrais do arsenal do Teatro do Oprimido.
O sentido de experiência estética está associado, neste estudo, à
capacidade sensível do ser humano para organizar os estímulos que lhe alcançam o
corpo, para que ele sinta e perceba a interdependência dos múltiplos aspectos
inerentes à condição humana, potencializando a vida e a natureza humana.
Nesta pesquisa qualitativa, utilizamos uma metodologia de cunho
fenomenológico, sendo desenvolvida conforme os passos propostos por Giorgi
(1985) e Comiotto (1992). A compreensão fenomenológica das entrevistas, por sua
vez, permitiu descrever o fenômeno como um todo.
O campo de ação deste estudo foi a Escola Estadual de Ensino Médio
Amantino Vieira Hoffmann, na cidade de André da Rocha, Rio Grande do Sul. Nela,
foi iniciado, com nove professoras, um trabalho sobre questões do saber sensível na
educação, na forma de exercícios e jogos teatrais apoiados na proposta do arsenal
do Teatro do Oprimido de Augusto Boal (1998). As nove participantes trabalham na
escola, lecionando na educação infantil, séries iniciais, ensino fundamental e médio,
tendo formação acadêmica nas mais diversas áreas do conhecimento. Algumas
residem no próprio município; outras, em cidades vizinhas.
A seleção das participantes foi realizada dentre dezoito professoras, que
demonstraram interesse pelo tema da pesquisa, contudo apenas nove delas tinham
disponibilidade de tempo naquele momento. As atividades foram propostas e
experenciadas durante quatro encontros, cada um deles com 8 horas/aula,
totalizando 32 horas/aula. Todas escolheram um pseudônimo para guardar sigilo
sobre seus depoimentos.
Visando cumprir os objetivos, foi proposto em cada um dos quatro encontros
um tema, um objetivo geral e vivências de jogos e exercícios teatrais do arsenal do
Teatro do Oprimido. Esse arsenal de jogos e exercícios de teatro foi dividido em
cinco categorias, as quais, de acordo com a proposta de Boal (1998) em seu livro
Jogos para atores e não atores, partem do princípio de que o ser humano é uma
unidade, é um corpo, um todo indivisível onde os cinco sentidos estão todos
interligados, fazendo com que todas as atividades físicas, intelectuais ou emocionais
sejam do corpo inteiro. É o próprio Boal (1998: 88) quem comenta: “Nós respiramos
com o corpo todo: com os braços, com as pernas, os pés, mesmo que os pulmões e
o aparelho respiratório tenham uma importância prioritária no processo. Nós
cantamos com o corpo todo (...). Fazemos amor com o corpo inteiro (...)”.
Porém, justifica ainda Boal (1998), na relação do corpo no mundo em que
vive, os sentidos sofrem, e nós começamos a sentir muito pouco daquilo que
tocamos, a escutar muito pouco daquilo que ouvimos, a ver muito pouco daquilo que
olhamos. Escutamos, sentimos e vemos segundo nossas especialidades. Os
corpos adaptam-se ao trabalho que devem realizar, ao dever que devem cumprir, ao
querer que lhes é imposto por alguns segmentos da sociedade atual, em geral,
ávidos por lucros excessivos. Essa adaptação, por sua vez, leva à anestesia, à
incapacidade de sentir com sentimento, a respostas de impulsos mecânicos.
Dentro do vasto campo da sensibilidade que se apresenta como possibilidade
para amenizar a situação de privar o corpo de atuações originais, criativas e
espontâneas causando, o que Capra (1996) chama de “crise de percepção”,
escolhemos neste estudo, resgatar e dar ênfase à percepção, tomando-a como a
elaboração mental das sensações. Para tanto, articulamo-la aos jogos e exercícios
teatrais do Teatro do Oprimido, os quais Boal (1998) classifica em cinco categorias.
São elas: sentir tudo que se toca, escutar tudo que se ouve, ativando os vários
sentidos, ver tudo que se olha e a memória dos sentidos.
Cada jogo ou exercício realizado com o grupo foi explorado e relacionado
com o tema e o objetivo de cada encontro. Na primeira categoria, procuramos
diminuir a distância entre sentir e tocar; na segunda, entre escutar e ouvir; na
terceira, procuramos desenvolver os vários sentidos ao mesmo tempo; na quarta,
buscamos ver tudo aquilo que olhamos e finalmente, na quinta categoria, os
sentidos têm também sua memória. Foi preciso trabalhar para despertá-la. A
metodologia, tendo como parâmetro de ação a proposta do Teatro do Oprimido, foi
utilizada de forma dinâmica, conectada com nossas experiências anteriores
enquanto educadoras em teatro-educação, permitindo-nos certa liberdade para
estabelecer o nosso modo e estilo de trabalho em cada proposta e atividade.
As nove professoras foram entrevistadas no final dos quatro encontros, com o
intuito de chegarmos à perspectiva do todo. Assim, solicitamos às envolvidas que
respondessem à questão: "O que significou para você esta experiência estética?” A
entrevista foi gravada individualmente e proporcionou abertura para outras questões
pertinentes à investigação.
Durante as entrevistas, em quase todas as falas das pesquisadas, houve um
questionamento sobre o porquê de durante a formação profissional não se
oportunizarem experiências semelhantes a esta, onde o sensível pode fundir-se ao
inteligível fazendo com que o conhecimento se torne mais significativo e prazeroso.
Confirmam isso as considerações de Morin (1995), ao observar que entre
inteligência e afetividade não existe hierarquia, com dominação de uma instância
sobre a outra. Uma só teria sentido de dominação sobre a outra se o ser humano
fosse controlado permanentemente pela inteligência racional, o que é humanamente
impossível.
Solange, uma das professoras entrevistadas, comenta:
Essas atividades humanizam o trabalho, seja em que disciplina for. Faz
a gente perceber que não está trabalhando com coisas, com objetos,
mas sim com pessoas que pensam e têm sentimentos. Os alunos,
assim como nós educadores, podem se perceber dentro de um
contexto, de um mundo e que existem muitas possibilidades, boas e
ruins, mas que podem escolher.
A partir desta resposta, observamos a carência de atividades proporcionadas
aos educadores, que lhes permitam registrar um conhecimento tanto reflexivo
quanto sentido, ou seja, um conhecimento percebido por todo o corpo em sua
totalidade. Estamos nos referindo aqui a uma realidade singular, não tendo a
intenção de generalizar o que sucede em todo o país.
Nas considerações de Aldrich (1976: 34) podemos ver que a experiência
estética está ligada às sensações do sujeito que a vive:
Se se espera que a experiência tenha qualidade estética, ela não deve
fazer uma exclusão dos diversos fatores comumente presentes, mas
uma inclusão mais compreensiva do que a costumeira, apresentando
uma unidade, que possa ser sentida, dos elementos que aparecem
mais dispersos na percepção atual.
Essa realidade nos faz rever e pensar sobre alguns aspectos no processo
educacional, tanto na formação inicial do profissional quanto num processo contínuo
de formação. Por isso, as experiências estéticas com jogos e exercícios teatrais
foram se construindo como espaço para uma prática educativa de qualidade,
permitindo às participantes terem uma visão inovadora sobre o ato de educar em si,
rompendo com os limites das práticas pedagógicas tradicionais vigentes. Duarte
Júnior (2001) aponta que o sentido das ações devem se sobrepor a sua
funcionalidade, que a dimensão poética dessas mesmas ações deve transcender
para um movimento além de formas já estabelecidas, padronizadas e impostas pela
sociedade, que causam alienação e sofrimento para o ser humano.
Jogos e exercícios teatrais do arsenal do Teatro do Oprimido: uma
possibilidade estética/ educativa.
Nietzsche (1992) aponta que o desejo tem como ingrediente primeiro o sentir
e, segundo, o pensar, e nesse complexo entre sentir e pensar existe uma pluralidade
de sensações que se aproximam dos sentidos corporais.
Tomando os apontamentos de Nietzsche (1992), podemos apresentar o
Teatro do Oprimido e seu arsenal como possibilidade estética/educativa, porque nele
todos os sentidos corporais são chamados para trabalhar nas mais diversas ordens:
feitas de odores, de ruídos, de texturas, de cores, de formas, de sons, de
expressões...A finalidade é preparar para a ação, não para a passividade e/ou
repouso; para o desequilíbrio, que dá início a uma ação transformadora. Seu
objetivo é sempre o de dinamizar, e nesse movimento dinâmico é que vemos um
aspecto pedagógico novo, capaz de acompanhar as mudanças rápidas do mundo.
Na busca incessante de si mesmo, o ser humano experimenta diversos
materiais e técnicas, seguindo vários caminhos à procura da expressão. Durante o
desenvolvimento das atividades foram aparecendo tanto aspectos pessoais quanto
profissionais. Madalena comentou:
(...) tudo que ia sendo falado vinha do “fundo”, do íntimo de cada uma
de nós, e tudo parecia mais verdadeiro. Chegamos a nos emocionar,
me senti muito à vontade para falar de mim, tanto como profissional
quanto pessoa. Muitas coisas que encarava como normal comecei a
questionar, comecei a me inquietar, me auto-avaliar. Vi que em muitas
coisas tenho que mudar. É sempre mais fácil jogar no outro, ver como
ele é, julgá-lo e o meu eu deixar para trás.
Foi interessante perceber que a maioria das participantes, quando recebia a
proposta dos jogos e exercícios relacionados ao tema de cada encontro, respondia
de forma muito espontânea, logo expressando suas idéias em discussão, buscando
juntas a melhor solução para aquele momento. Mas em algumas de suas falas fica
claro o esforço que fizeram, conforme revelou-se na fala de Noemia: “No começo
tentei negar as atividades, porque percebi que podiam revelar coisas em mim, mas
quando via, estava fazendo e descobrindo coisas interessantes, muito reveladoras
que me ajudavam a entender melhor o meu aluno suas possibilidades e limitações”.
Bentley (1981) afirma que, nos jogos teatrais, desejos são realizados, medos
são desmistificados, emoções são ensaiadas; mente e corpo entram no jogo,
exercitando-se, ganhando massa e agilidade, preparando-se para enfrentar desafios
futuros. Jogando sozinho ou em grupo, o sujeito aprende a conviver, a ouvir os
outros e fazer-se ouvir, a assumir responsabilidades e permitir que os outros
também assumam. Conflitos afloram naturalmente e são enfrentados sem culpa e
sem temores, dando origem a um precioso banco de dados, que será consultado
mais tarde, quando o indivíduo tiver de tomar decisões complexas.
Boal (1998), em sintonia com Bentley, deixa anotado que o teatro é capaz de
gerar um registro muito mais consciente na memória ao atingir quem dele participa
como ator ou espectador em três níveis: racional, emocional e, conseqüentemente,
estético. Portanto, quando utilizado em programas de aprendizagem, pode resultar
num germe de criação e formação da consciência estética. Essa experiência estética
se dá de forma global, mantendo-nos conectados e em relação com o universo e
está a serviço do criativo, do espontâneo, do belo.
Nesse sentido, percebemos que as docentes participantes conseguiram
produzir respostas nunca imaginadas, nem possíveis de serem ditas apenas com
palavras, e surpreendiam-se com o resultado de cada criação e seus significados.
Assim, experimentavam, conheciam e passavam a se sensibilizar com o grupo em
busca de respostas novas para compreender melhor a escola e o mundo em torno
delas. Sentiam-se mais fortes, diziam que era preciso se unirem para ganhar forças.
Ao comentar sobre isso, Corina disse:
Muitas das atividades de início pensei que não conseguiria fazer, mas
fui lentamente permitindo-me fazer e percebi resultados
surpreendentes. Às vezes vemos o outro fazendo determinadas coisas
e admiramos. Mas dizemos a nós mesmos que não conseguiremos
fazer. Porém se nos desafiarmos a fazer, conseguimos e nos sentimos
capazes e realizados. Eu me julgo o tempo todo incapaz, tenho medo
do julgamento, mas pude ver que eu não sou a única a ter que superar
isso. Fiquei mais forte agora. Precisaríamos ter mais espaços na
escola para continuar essas atividades e ter uma relação mais próxima
com todas as disciplinas. Precisamos nos reunir para ganhar forças.
Não para discussões apenas teóricas, mas para troca de experiências.
Momentos sensíveis para saber qual a melhor sugestão em aproximar
mais o aluno de todo o contexto escolar, para chegar a um bom
trabalho.
Registramos que muitas das participantes se colocaram no papel do aluno,
tanto no desenvolvimento das atividades quanto na reflexão sobre elas, o que
podemos perceber na fala de Marta:
Coloquei-me inúmeras vezes no lugar do aluno durante o
desenvolvimento das atividades. Se eu estou sentindo isso, como será
que o meu aluno se sente cada vez que lhe proponho alguma coisa?
Preciso oportunizar formas diferentes para que ele possa se expressar,
se colocar. Temos que dar espaço para que a pérola apareça. Mas é
importante fazer-se um trabalho coletivo, para vencer preconceitos e
para que exista a aceitação. Na adolescência isto é complicado, eles
não querem se mostrar e colocam máscaras de proteção o tempo todo.
No teatro existe a ficção de que a vida pode ser reinventada, revista, revisada.
Nada precisa ser novo, mas tudo precisa ser recriado. Nesse processo do refazer,
lembramos, refletimos e damos nossa opinião e, assim, exercitamos nossa postura
diante da vida.
Através dos jogos e exercícios do arsenal do Teatro do Oprimido foi
possibilitado vivenciar momentos que pertenciam ao cotidiano dos alunos e da
escola como um todo. Foi possível experimentar, por meio de uma construção
lógica, o desenvolvimento de histórias- reais ou metafóricas- que falassem de cada
uma, daqueles ligados a elas de alguma maneira: de alunos, de colegas, de amigos,
de inimigos, de nosso país e da situação atual do educador e da educação. As
experiências teatrais proporcionadas nos encontros possibilitou que elas se
colocassem no papel do outro, conhecendo melhor a si mesmas e aos “outros” e
aprendendo a aceitar e conviver com as diferenças ao invés de tentar eliminá-las.
Fica claro nas colocações de Salomé:
Eu diria que o que fizemos mostrou o esqueleto de cada personalidade.
A forma de fazer é que nos fazia desligar do mundo e apenas nos
concentrar naquilo que estávamos fazendo. Eu sempre conseguia me
ver em tudo, não adiantava querer me esconder. Coisa mais
impressionante, não conseguia parar de falar sobre o que fazia, era
muito revelador. Estava pensando, trabalhar dessa forma com os aluno
também vai fazer com que eles se percebam cada vez mais, como nós
nos percebemos. Assim como, possibilitaria conhecê-los pelo lado
avesso, como ele é realmente. Possibilitaria um trabalho mais humano
dentro da sala de aula.
Pela arte teatral podemos refletir sobre quem somos e sobre os diversos
papéis que representamos hoje. Vejamos o que disse Maria: “Eu no começo queria
me esconder. A cada atividade proposta sempre achava o outro antes, tudo servia
para um dos colegas, menos para mim. Achar as minhas coisas foi muito difícil.
Parece que queria negá-las o tempo todo”. Por outro lado Madalena comentou:
Eu, ao contrário, já achei que a forma conduzida de fazer cada
atividade me deixou muito livre e espontânea. Cada uma de nós pode
falar de si de forma tranqüila. As propostas feitas a cada encontro eram
desafiadoras. Não propunham: agora cada uma vai dizer o que pensa
sobre isso, sobre o tema proposto. Não, a gente pegava uma revista,
uma bola, um pincel e outros objetos, ou só o nosso corpo e não
sabíamos muito bem no que aquilo ia dar, mas no final “aquilo” dizia
exatamente o que eu queria dizer.
Percebemos que as professoras participantes estavam passando por um
processo de aprendizagem, reavaliando sua postura profissional. Foi possível
reconhecer as especificidades que caracterizam a linguagem artística como um
instrumento de construção do conhecimento do sujeito. Vanda, professora de
matemática, comentou a respeito:
Ao relacionar o que nos foi proposto ao meu fazer pedagógico, quero
dizer que tive muitas idéias. Eu preciso mudar o “visual” das aulas para
chamar mais atenção para a disciplina. Preciso variar os estímulos. Em
algumas disciplinas fica mais fácil. Mas em todas elas é possível
desenvolver esse tipo de atividade, pois proporcionam prazer,
estimulam a vontade de aprender.
Muitas vezes ignoramos o que pode fazer a diferença, e muito, para as
transformações necessárias e esperadas na educação. Porém, para descobrirmos
as essências precisamos de espaços para, primeiro, nos colocarmos, nos
posicionarmos, sentirmos como é importante a nossa cultura, para podermos
intermediar uma relação mais humana do aluno com o mundo. O teatro mostra-se
fundamental, como oportunidade na tentativa de um aprendizado mais humano.
Sabemos que momentos possibilitando experiências estéticas devem ser
proporcionados de forma contínua, pois, na nossa condição humana, sempre novos
desafios deverão ser superados e novas alternativas buscadas. Estamos inseridos e
expostos diariamente numa sociedade que muitas vezes não é a que desejamos
nem a que idealizamos; assim, principalmente como educadores, necessitamos
quase que a todo o momento de estímulos que suscitem pensamentos capazes de
reavaliar a situação, bem como conhecimento de procedimentos práticos capazes de
transformar continuamente nossas ações porque a educação é um processo
contínuo e dinâmico.
Considerações finais
Neste estudo compreendemos que a arte teatral nos permite estabelecer
leituras diferentes do mundo. Percebemos que foi possível resgatar no tempo-
espaço da experiência estética realizada uma universalidade. Entretanto, só a
liberdade de expressão não é suficiente; precisamos aprender a conhecer o real e a
entrar na lógica da estética ampla que permite um leque enorme de possibilidades
de convívio com o outro e com nós mesmos.
Melhorar a qualidade da educação está intrinsecamente ligada com a
melhoria da qualidade das experiências estéticas vividas pelos alunos nas escolas.
Para tanto, é imprescindível que os profissionais da educação reflitam sobre suas
concepções e relações entre ensinar e aprender, e sobre suas práticas pedagógicas.
A experiência estética depende de um aprendizado e, à medida que os códigos
estéticos forem familiares a quem a eles estiver exposto, não como um adereço ou
divertimento, mas como parte fundamental e essencial da vida, a própria maneira de
sentir irá se refinando, tornando as pessoas mais sensíveis às sutilezas da vida, aos
meandros do mundo, tanto interior quanto exterior. Assim, será intensificada a
percepção do estar no mundo, do conhecer, reconhecendo que somos sujeitos
inalienáveis, únicos e capazes. Duarte Júnior (2001: 12) pontua a respeito:
Sem dúvida, há um saber sensível, inelutável, primitivo, fundador de
todos os demais conhecimentos, por mais abstratos que estes sejam;
um saber direto, corporal, anterior às representações simbólicas que
permitem os nossos processos de raciocínio e reflexão.
A realização dos encontros tendo como parâmetro de ação os jogos e
exercícios teatrais do Arsenal do Teatro do Oprimido de Augusto Boal (1998)
permitiu-nos compreender melhor a relação do teatro com a educação do sensível,
transformando esse aprendizado numa experiência única e profundamente
significativa.
Referências Bibliográficas
ALDRICH, Virgil. Filosofia da arte. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1976.
BENTLEY, Eric. A experiência viva do teatro. Rio de Janeiro: Zaar, 1981.
BOAL, Augusto. Jogos para atore e não-atores. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1998.
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. São Paulo: Cultrix, 1996.
COMIOTTO, Miriam S. Adultos médios: sentimentos e trajetórias de vida. Tese
(Doutorado) FACED, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
1992.
DUARTE JÚNIOR, João-Francisco. O sentido dos sentidos: a educação (do)
sensível. Curitiba: Criar Edições, 2001.
GIORGI, Amadeu. Phenomenology and psicological research. Pittsburgh: Duquesne
University Press, 1985.
MORIN, Edgar.Os meus demônios. Portugual: Publicações Europa-América, 1995.
NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do mal: prelúdio a uma educação do futuro.
São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
Bibliografia Complementar
ALVES, Rubem. Conversas com quem gosta de ensinar. 10 ed. São Paulo: Cortez/
Autores Associados, 1984.
BERTRAND, Yves. VALOIS, Paul. Paradigmas educacionais: escola e sociedade.
São Paulo: Horizontes Pedagógicos, 1994.
BOAL, Augusto. O teatro do oprimido e outras poéticas. 4 ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1983.
BRITES, Blanca e TESSLER, Elida. O meio como ponto zero: metodologia da
pesquisa em artes plásticas. Porto Alegre: Universidade/UFRGS, 2002.
MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. 2. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1999.

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Teatro do Oprimido na Educação: Experiências Estéticas

  • 1. TEATRO DO OPRIMIDO E TEATRO-EDUCAÇÃO: CONSTRUINDO CAMINHOS NA EDUCAÇÃO DO SENSÍVEL Marli Susana Carrard Sitta UPF Cilene Maria Potrich UPF Graciela Ormezzano UPF – UNOESC Resumo: A pesquisa realizada focou o desenvolvimento de jogos e exercícios teatrais, de acordo com a proposta do Teatro do Oprimido de Augusto Boal, cujo objetivo principal foi proporcionar uma experiência estética na educação, possibilitada pelo contato com os códigos estéticos da arte teatral, desvelando seus significados e suas implicações para a construção do conhecimento e o desenvolvimento humano. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de cunho fenomenológico. As atividades pedagógicas foram desenvolvidas com nove professoras de diversas áreas do conhecimento, da rede pública estadual, na cidade de André da Rocha, RS com duração de 32 horas/aula. Utilizou-se um diário de campo para registrar todas as informações obtidas durante o desenvolvimento das atividades artístico–pedagógicas. Também foi aplicada uma entrevista individual no final dos encontros. Os achados da investigação foram considerados a partir da observação do grupo e, também, por meio da reflexão crítica do que aconteceu nos quatro encontros do desenvolvimento do trabalho, resgatando-se a fala das professoras quanto à significação dos encontros, que girou em torno de um melhor relacionamento com seus alunos, deixando-as mais espontâneas e confiantes no seu fazer pedagógico diário. A cada encontro mostravam-se mais motivadas. As experiências estéticas revelaram-se inquietantes para o grupo de docentes, levando- as a refletir sobre o papel de “ser educador”, comprometendo-as de forma pessoal nas transformações vistas como necessárias no âmbito educacional. Palavras-chave: Educação básica; Teatro do Oprimido; teatro-educação; educação sensível; experiências estéticas. Considerações iniciais Neste artigo pretendemos divulgar uma pesquisa qualitativa cuja temática está centrada numa experiência estética que busca aguçar os sentidos emergente dos jogos e exercícios teatrais do arsenal do Teatro do Oprimido, de Augusto Boal (1998), em escola estadual, e desvelar a sua importância como processo de aprendizagem para a vida. O principal objetivo da investigação foi proporcionar uma experiência estética na educação, possibilitada pelo contato com códigos estéticos da arte teatral, desvelando seus significados e suas implicações para a construção do conhecimento e para o desenvolvimento humano. Abrem-se, assim, precedentes para os seguintes objetivos específicos: promover a valorização de um saber
  • 2. sensível e suas relações no âmbito da educação básica; auxiliar na percepção da realidade e na práxis por um projeto educacional mais humanitário; oferecer também aos educadores de arte subsídios para a ação/reflexão/ação a partir dos jogos e exercícios teatrais do arsenal do Teatro do Oprimido. O sentido de experiência estética está associado, neste estudo, à capacidade sensível do ser humano para organizar os estímulos que lhe alcançam o corpo, para que ele sinta e perceba a interdependência dos múltiplos aspectos inerentes à condição humana, potencializando a vida e a natureza humana. Nesta pesquisa qualitativa, utilizamos uma metodologia de cunho fenomenológico, sendo desenvolvida conforme os passos propostos por Giorgi (1985) e Comiotto (1992). A compreensão fenomenológica das entrevistas, por sua vez, permitiu descrever o fenômeno como um todo. O campo de ação deste estudo foi a Escola Estadual de Ensino Médio Amantino Vieira Hoffmann, na cidade de André da Rocha, Rio Grande do Sul. Nela, foi iniciado, com nove professoras, um trabalho sobre questões do saber sensível na educação, na forma de exercícios e jogos teatrais apoiados na proposta do arsenal do Teatro do Oprimido de Augusto Boal (1998). As nove participantes trabalham na escola, lecionando na educação infantil, séries iniciais, ensino fundamental e médio, tendo formação acadêmica nas mais diversas áreas do conhecimento. Algumas residem no próprio município; outras, em cidades vizinhas. A seleção das participantes foi realizada dentre dezoito professoras, que demonstraram interesse pelo tema da pesquisa, contudo apenas nove delas tinham disponibilidade de tempo naquele momento. As atividades foram propostas e experenciadas durante quatro encontros, cada um deles com 8 horas/aula, totalizando 32 horas/aula. Todas escolheram um pseudônimo para guardar sigilo sobre seus depoimentos. Visando cumprir os objetivos, foi proposto em cada um dos quatro encontros um tema, um objetivo geral e vivências de jogos e exercícios teatrais do arsenal do Teatro do Oprimido. Esse arsenal de jogos e exercícios de teatro foi dividido em cinco categorias, as quais, de acordo com a proposta de Boal (1998) em seu livro Jogos para atores e não atores, partem do princípio de que o ser humano é uma unidade, é um corpo, um todo indivisível onde os cinco sentidos estão todos interligados, fazendo com que todas as atividades físicas, intelectuais ou emocionais sejam do corpo inteiro. É o próprio Boal (1998: 88) quem comenta: “Nós respiramos
  • 3. com o corpo todo: com os braços, com as pernas, os pés, mesmo que os pulmões e o aparelho respiratório tenham uma importância prioritária no processo. Nós cantamos com o corpo todo (...). Fazemos amor com o corpo inteiro (...)”. Porém, justifica ainda Boal (1998), na relação do corpo no mundo em que vive, os sentidos sofrem, e nós começamos a sentir muito pouco daquilo que tocamos, a escutar muito pouco daquilo que ouvimos, a ver muito pouco daquilo que olhamos. Escutamos, sentimos e vemos segundo nossas especialidades. Os corpos adaptam-se ao trabalho que devem realizar, ao dever que devem cumprir, ao querer que lhes é imposto por alguns segmentos da sociedade atual, em geral, ávidos por lucros excessivos. Essa adaptação, por sua vez, leva à anestesia, à incapacidade de sentir com sentimento, a respostas de impulsos mecânicos. Dentro do vasto campo da sensibilidade que se apresenta como possibilidade para amenizar a situação de privar o corpo de atuações originais, criativas e espontâneas causando, o que Capra (1996) chama de “crise de percepção”, escolhemos neste estudo, resgatar e dar ênfase à percepção, tomando-a como a elaboração mental das sensações. Para tanto, articulamo-la aos jogos e exercícios teatrais do Teatro do Oprimido, os quais Boal (1998) classifica em cinco categorias. São elas: sentir tudo que se toca, escutar tudo que se ouve, ativando os vários sentidos, ver tudo que se olha e a memória dos sentidos. Cada jogo ou exercício realizado com o grupo foi explorado e relacionado com o tema e o objetivo de cada encontro. Na primeira categoria, procuramos diminuir a distância entre sentir e tocar; na segunda, entre escutar e ouvir; na terceira, procuramos desenvolver os vários sentidos ao mesmo tempo; na quarta, buscamos ver tudo aquilo que olhamos e finalmente, na quinta categoria, os sentidos têm também sua memória. Foi preciso trabalhar para despertá-la. A metodologia, tendo como parâmetro de ação a proposta do Teatro do Oprimido, foi utilizada de forma dinâmica, conectada com nossas experiências anteriores enquanto educadoras em teatro-educação, permitindo-nos certa liberdade para estabelecer o nosso modo e estilo de trabalho em cada proposta e atividade. As nove professoras foram entrevistadas no final dos quatro encontros, com o intuito de chegarmos à perspectiva do todo. Assim, solicitamos às envolvidas que respondessem à questão: "O que significou para você esta experiência estética?” A entrevista foi gravada individualmente e proporcionou abertura para outras questões pertinentes à investigação.
  • 4. Durante as entrevistas, em quase todas as falas das pesquisadas, houve um questionamento sobre o porquê de durante a formação profissional não se oportunizarem experiências semelhantes a esta, onde o sensível pode fundir-se ao inteligível fazendo com que o conhecimento se torne mais significativo e prazeroso. Confirmam isso as considerações de Morin (1995), ao observar que entre inteligência e afetividade não existe hierarquia, com dominação de uma instância sobre a outra. Uma só teria sentido de dominação sobre a outra se o ser humano fosse controlado permanentemente pela inteligência racional, o que é humanamente impossível. Solange, uma das professoras entrevistadas, comenta: Essas atividades humanizam o trabalho, seja em que disciplina for. Faz a gente perceber que não está trabalhando com coisas, com objetos, mas sim com pessoas que pensam e têm sentimentos. Os alunos, assim como nós educadores, podem se perceber dentro de um contexto, de um mundo e que existem muitas possibilidades, boas e ruins, mas que podem escolher. A partir desta resposta, observamos a carência de atividades proporcionadas aos educadores, que lhes permitam registrar um conhecimento tanto reflexivo quanto sentido, ou seja, um conhecimento percebido por todo o corpo em sua totalidade. Estamos nos referindo aqui a uma realidade singular, não tendo a intenção de generalizar o que sucede em todo o país. Nas considerações de Aldrich (1976: 34) podemos ver que a experiência estética está ligada às sensações do sujeito que a vive: Se se espera que a experiência tenha qualidade estética, ela não deve fazer uma exclusão dos diversos fatores comumente presentes, mas uma inclusão mais compreensiva do que a costumeira, apresentando uma unidade, que possa ser sentida, dos elementos que aparecem mais dispersos na percepção atual. Essa realidade nos faz rever e pensar sobre alguns aspectos no processo educacional, tanto na formação inicial do profissional quanto num processo contínuo de formação. Por isso, as experiências estéticas com jogos e exercícios teatrais foram se construindo como espaço para uma prática educativa de qualidade, permitindo às participantes terem uma visão inovadora sobre o ato de educar em si,
  • 5. rompendo com os limites das práticas pedagógicas tradicionais vigentes. Duarte Júnior (2001) aponta que o sentido das ações devem se sobrepor a sua funcionalidade, que a dimensão poética dessas mesmas ações deve transcender para um movimento além de formas já estabelecidas, padronizadas e impostas pela sociedade, que causam alienação e sofrimento para o ser humano. Jogos e exercícios teatrais do arsenal do Teatro do Oprimido: uma possibilidade estética/ educativa. Nietzsche (1992) aponta que o desejo tem como ingrediente primeiro o sentir e, segundo, o pensar, e nesse complexo entre sentir e pensar existe uma pluralidade de sensações que se aproximam dos sentidos corporais. Tomando os apontamentos de Nietzsche (1992), podemos apresentar o Teatro do Oprimido e seu arsenal como possibilidade estética/educativa, porque nele todos os sentidos corporais são chamados para trabalhar nas mais diversas ordens: feitas de odores, de ruídos, de texturas, de cores, de formas, de sons, de expressões...A finalidade é preparar para a ação, não para a passividade e/ou repouso; para o desequilíbrio, que dá início a uma ação transformadora. Seu objetivo é sempre o de dinamizar, e nesse movimento dinâmico é que vemos um aspecto pedagógico novo, capaz de acompanhar as mudanças rápidas do mundo. Na busca incessante de si mesmo, o ser humano experimenta diversos materiais e técnicas, seguindo vários caminhos à procura da expressão. Durante o desenvolvimento das atividades foram aparecendo tanto aspectos pessoais quanto profissionais. Madalena comentou: (...) tudo que ia sendo falado vinha do “fundo”, do íntimo de cada uma de nós, e tudo parecia mais verdadeiro. Chegamos a nos emocionar, me senti muito à vontade para falar de mim, tanto como profissional quanto pessoa. Muitas coisas que encarava como normal comecei a questionar, comecei a me inquietar, me auto-avaliar. Vi que em muitas coisas tenho que mudar. É sempre mais fácil jogar no outro, ver como ele é, julgá-lo e o meu eu deixar para trás. Foi interessante perceber que a maioria das participantes, quando recebia a proposta dos jogos e exercícios relacionados ao tema de cada encontro, respondia de forma muito espontânea, logo expressando suas idéias em discussão, buscando juntas a melhor solução para aquele momento. Mas em algumas de suas falas fica
  • 6. claro o esforço que fizeram, conforme revelou-se na fala de Noemia: “No começo tentei negar as atividades, porque percebi que podiam revelar coisas em mim, mas quando via, estava fazendo e descobrindo coisas interessantes, muito reveladoras que me ajudavam a entender melhor o meu aluno suas possibilidades e limitações”. Bentley (1981) afirma que, nos jogos teatrais, desejos são realizados, medos são desmistificados, emoções são ensaiadas; mente e corpo entram no jogo, exercitando-se, ganhando massa e agilidade, preparando-se para enfrentar desafios futuros. Jogando sozinho ou em grupo, o sujeito aprende a conviver, a ouvir os outros e fazer-se ouvir, a assumir responsabilidades e permitir que os outros também assumam. Conflitos afloram naturalmente e são enfrentados sem culpa e sem temores, dando origem a um precioso banco de dados, que será consultado mais tarde, quando o indivíduo tiver de tomar decisões complexas. Boal (1998), em sintonia com Bentley, deixa anotado que o teatro é capaz de gerar um registro muito mais consciente na memória ao atingir quem dele participa como ator ou espectador em três níveis: racional, emocional e, conseqüentemente, estético. Portanto, quando utilizado em programas de aprendizagem, pode resultar num germe de criação e formação da consciência estética. Essa experiência estética se dá de forma global, mantendo-nos conectados e em relação com o universo e está a serviço do criativo, do espontâneo, do belo. Nesse sentido, percebemos que as docentes participantes conseguiram produzir respostas nunca imaginadas, nem possíveis de serem ditas apenas com palavras, e surpreendiam-se com o resultado de cada criação e seus significados. Assim, experimentavam, conheciam e passavam a se sensibilizar com o grupo em busca de respostas novas para compreender melhor a escola e o mundo em torno delas. Sentiam-se mais fortes, diziam que era preciso se unirem para ganhar forças. Ao comentar sobre isso, Corina disse: Muitas das atividades de início pensei que não conseguiria fazer, mas fui lentamente permitindo-me fazer e percebi resultados surpreendentes. Às vezes vemos o outro fazendo determinadas coisas e admiramos. Mas dizemos a nós mesmos que não conseguiremos fazer. Porém se nos desafiarmos a fazer, conseguimos e nos sentimos capazes e realizados. Eu me julgo o tempo todo incapaz, tenho medo do julgamento, mas pude ver que eu não sou a única a ter que superar isso. Fiquei mais forte agora. Precisaríamos ter mais espaços na
  • 7. escola para continuar essas atividades e ter uma relação mais próxima com todas as disciplinas. Precisamos nos reunir para ganhar forças. Não para discussões apenas teóricas, mas para troca de experiências. Momentos sensíveis para saber qual a melhor sugestão em aproximar mais o aluno de todo o contexto escolar, para chegar a um bom trabalho. Registramos que muitas das participantes se colocaram no papel do aluno, tanto no desenvolvimento das atividades quanto na reflexão sobre elas, o que podemos perceber na fala de Marta: Coloquei-me inúmeras vezes no lugar do aluno durante o desenvolvimento das atividades. Se eu estou sentindo isso, como será que o meu aluno se sente cada vez que lhe proponho alguma coisa? Preciso oportunizar formas diferentes para que ele possa se expressar, se colocar. Temos que dar espaço para que a pérola apareça. Mas é importante fazer-se um trabalho coletivo, para vencer preconceitos e para que exista a aceitação. Na adolescência isto é complicado, eles não querem se mostrar e colocam máscaras de proteção o tempo todo. No teatro existe a ficção de que a vida pode ser reinventada, revista, revisada. Nada precisa ser novo, mas tudo precisa ser recriado. Nesse processo do refazer, lembramos, refletimos e damos nossa opinião e, assim, exercitamos nossa postura diante da vida. Através dos jogos e exercícios do arsenal do Teatro do Oprimido foi possibilitado vivenciar momentos que pertenciam ao cotidiano dos alunos e da escola como um todo. Foi possível experimentar, por meio de uma construção lógica, o desenvolvimento de histórias- reais ou metafóricas- que falassem de cada uma, daqueles ligados a elas de alguma maneira: de alunos, de colegas, de amigos, de inimigos, de nosso país e da situação atual do educador e da educação. As experiências teatrais proporcionadas nos encontros possibilitou que elas se colocassem no papel do outro, conhecendo melhor a si mesmas e aos “outros” e aprendendo a aceitar e conviver com as diferenças ao invés de tentar eliminá-las. Fica claro nas colocações de Salomé:
  • 8. Eu diria que o que fizemos mostrou o esqueleto de cada personalidade. A forma de fazer é que nos fazia desligar do mundo e apenas nos concentrar naquilo que estávamos fazendo. Eu sempre conseguia me ver em tudo, não adiantava querer me esconder. Coisa mais impressionante, não conseguia parar de falar sobre o que fazia, era muito revelador. Estava pensando, trabalhar dessa forma com os aluno também vai fazer com que eles se percebam cada vez mais, como nós nos percebemos. Assim como, possibilitaria conhecê-los pelo lado avesso, como ele é realmente. Possibilitaria um trabalho mais humano dentro da sala de aula. Pela arte teatral podemos refletir sobre quem somos e sobre os diversos papéis que representamos hoje. Vejamos o que disse Maria: “Eu no começo queria me esconder. A cada atividade proposta sempre achava o outro antes, tudo servia para um dos colegas, menos para mim. Achar as minhas coisas foi muito difícil. Parece que queria negá-las o tempo todo”. Por outro lado Madalena comentou: Eu, ao contrário, já achei que a forma conduzida de fazer cada atividade me deixou muito livre e espontânea. Cada uma de nós pode falar de si de forma tranqüila. As propostas feitas a cada encontro eram desafiadoras. Não propunham: agora cada uma vai dizer o que pensa sobre isso, sobre o tema proposto. Não, a gente pegava uma revista, uma bola, um pincel e outros objetos, ou só o nosso corpo e não sabíamos muito bem no que aquilo ia dar, mas no final “aquilo” dizia exatamente o que eu queria dizer. Percebemos que as professoras participantes estavam passando por um processo de aprendizagem, reavaliando sua postura profissional. Foi possível reconhecer as especificidades que caracterizam a linguagem artística como um instrumento de construção do conhecimento do sujeito. Vanda, professora de matemática, comentou a respeito: Ao relacionar o que nos foi proposto ao meu fazer pedagógico, quero dizer que tive muitas idéias. Eu preciso mudar o “visual” das aulas para chamar mais atenção para a disciplina. Preciso variar os estímulos. Em algumas disciplinas fica mais fácil. Mas em todas elas é possível desenvolver esse tipo de atividade, pois proporcionam prazer, estimulam a vontade de aprender. Muitas vezes ignoramos o que pode fazer a diferença, e muito, para as transformações necessárias e esperadas na educação. Porém, para descobrirmos
  • 9. as essências precisamos de espaços para, primeiro, nos colocarmos, nos posicionarmos, sentirmos como é importante a nossa cultura, para podermos intermediar uma relação mais humana do aluno com o mundo. O teatro mostra-se fundamental, como oportunidade na tentativa de um aprendizado mais humano. Sabemos que momentos possibilitando experiências estéticas devem ser proporcionados de forma contínua, pois, na nossa condição humana, sempre novos desafios deverão ser superados e novas alternativas buscadas. Estamos inseridos e expostos diariamente numa sociedade que muitas vezes não é a que desejamos nem a que idealizamos; assim, principalmente como educadores, necessitamos quase que a todo o momento de estímulos que suscitem pensamentos capazes de reavaliar a situação, bem como conhecimento de procedimentos práticos capazes de transformar continuamente nossas ações porque a educação é um processo contínuo e dinâmico. Considerações finais Neste estudo compreendemos que a arte teatral nos permite estabelecer leituras diferentes do mundo. Percebemos que foi possível resgatar no tempo- espaço da experiência estética realizada uma universalidade. Entretanto, só a liberdade de expressão não é suficiente; precisamos aprender a conhecer o real e a entrar na lógica da estética ampla que permite um leque enorme de possibilidades de convívio com o outro e com nós mesmos. Melhorar a qualidade da educação está intrinsecamente ligada com a melhoria da qualidade das experiências estéticas vividas pelos alunos nas escolas. Para tanto, é imprescindível que os profissionais da educação reflitam sobre suas concepções e relações entre ensinar e aprender, e sobre suas práticas pedagógicas. A experiência estética depende de um aprendizado e, à medida que os códigos estéticos forem familiares a quem a eles estiver exposto, não como um adereço ou divertimento, mas como parte fundamental e essencial da vida, a própria maneira de sentir irá se refinando, tornando as pessoas mais sensíveis às sutilezas da vida, aos meandros do mundo, tanto interior quanto exterior. Assim, será intensificada a percepção do estar no mundo, do conhecer, reconhecendo que somos sujeitos inalienáveis, únicos e capazes. Duarte Júnior (2001: 12) pontua a respeito:
  • 10. Sem dúvida, há um saber sensível, inelutável, primitivo, fundador de todos os demais conhecimentos, por mais abstratos que estes sejam; um saber direto, corporal, anterior às representações simbólicas que permitem os nossos processos de raciocínio e reflexão. A realização dos encontros tendo como parâmetro de ação os jogos e exercícios teatrais do Arsenal do Teatro do Oprimido de Augusto Boal (1998) permitiu-nos compreender melhor a relação do teatro com a educação do sensível, transformando esse aprendizado numa experiência única e profundamente significativa. Referências Bibliográficas ALDRICH, Virgil. Filosofia da arte. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1976. BENTLEY, Eric. A experiência viva do teatro. Rio de Janeiro: Zaar, 1981. BOAL, Augusto. Jogos para atore e não-atores. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. São Paulo: Cultrix, 1996. COMIOTTO, Miriam S. Adultos médios: sentimentos e trajetórias de vida. Tese (Doutorado) FACED, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1992. DUARTE JÚNIOR, João-Francisco. O sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. Curitiba: Criar Edições, 2001. GIORGI, Amadeu. Phenomenology and psicological research. Pittsburgh: Duquesne University Press, 1985. MORIN, Edgar.Os meus demônios. Portugual: Publicações Europa-América, 1995. NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do mal: prelúdio a uma educação do futuro. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. Bibliografia Complementar
  • 11. ALVES, Rubem. Conversas com quem gosta de ensinar. 10 ed. São Paulo: Cortez/ Autores Associados, 1984. BERTRAND, Yves. VALOIS, Paul. Paradigmas educacionais: escola e sociedade. São Paulo: Horizontes Pedagógicos, 1994. BOAL, Augusto. O teatro do oprimido e outras poéticas. 4 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983. BRITES, Blanca e TESSLER, Elida. O meio como ponto zero: metodologia da pesquisa em artes plásticas. Porto Alegre: Universidade/UFRGS, 2002. MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.