1) A década de 1950 no Brasil foi marcada por transformações sociais, políticas e econômicas, estimulando novas ideias nas artes.
2) O governo de JK modernizou o Brasil através da industrialização, urbanização e integração na economia internacional.
3) As artes brasileiras foram influenciadas pelas vanguardas do início do século XX, com a poesia concreta emergindo como nova tendência.
O desenvolvimento é um conceito mais amplo, pode ter um contexto biológico ou...
Jornal Concretista
1. Contexto de época
Década de 50 foi marcada no âmbito social,
político e econômico, por uma série complexa
de transformações que insinuavam o perfil de
um momento de uma “nova modernidade”, que
forneceria um ambiente estimulante para o
desenvolvimento de sugestões renovadoras
nas artes.
poesia concreta de Augusto de Campos
Não apenas a sociedade brasileira, mas todo
o sistema internacional, experimentou mudan-
Entre a Vanguarda
ças extraordinárias . Uma nova arrancada Antônio Maluf
tecnológica ocorreu no interior de um proces-
e o Museo.
so de remanejamento das relações internacio-
nais que permitia a certos países tipicamente
Se projetou como vencedor do
“subdesenvolvidos”, como o Brasil, alcançarem,
primeiro concuroso de cartazes para a 1a
Bienal de São Paulo, em 1951 a integrante da
N o Brasil, a arte concreta surge em meio
dentro de certos limites e em determinados ao debate figuração X abstração, e, na capital
primeira turma de alunos do IAC, Instituto
setores, um razoável padrão de modernização paulista, do MASP e do MAM e sua bienal. Ao
de Arte Contemporânea do MASP, Maluf
industrial. lado do Salao Paulista de Arte Moderna e de
não manteve uma carreira regular como
algumas poucas galerias, essas intituições
artista plástico dedicando se mais ao de-
NO GOVERNO foram o principal campo de batalha daquele
senho industrial e à publicidade, no qual se
Juscelino Kubstchek, cujo lema era “50 anos de bate, com extencão à imprensa.
notabilizou elaborando logotipos, cartazes
em 5”, tinha como finalidade, com o seu “Pro- com esforço para garantir espaço próprio,
e padronagens de tecido, além de trabal-
grama de Metas”, modernizar o Brasil dot- a nova vanguerda artistica foi sendo as-
har em coaboração com arquitetos crian-
ando-o de indústrias de base e de bens de similada com intensidade e métodos que
do murais geométricos como na Vila Nor-
consumo. variaram em função de uma complexa rede
manda (no edifícil Itália). Em todas as áreas
É nesse período que a sociedade brasileira de interesses estético-politicos, não apenas
Maluf se pautou sempre por uma concep-
adquiria definitivamente sua feição urbana, locais, mas que ultrapassaram fronteiras
ção própria de Arte Concreta, baseada em
movida pela ideologia do desenvovimento e envolvendo, para dar alguns exemplos; o gov-
conceitos como o de adequação dos desen-
pela associação com capitais externos, com erno norte-americano e o MoMA, a bienal de
volvimentos, teoria criada por ele.
a instalação de um novo e sofisticado parque Veneza,artistascriticos estrangeiros como
industrial. Pela primeira vez em sua história,
as massas urbanas despontavam no cenário
político e a cidade transformava-se, sem pos-
sibilidade de retorno, no centro decisório da
Poesia concreta: um manifesto
vida nacional. TENSÃO DE PALAVRAS-COISAS NO ESPAÇO-TEMPO.
Essa configuração de um setor urbano-industrial moderno estreitava, como nunca, os laços entre
dezembro de 1956, n° 20)
o processo social interno e a dinâmica do sistema internacional. Uma área considerável da popu-
lação passava a desfrutar de uma experiência social cada vez mais próxima a dos habitantes dos
maiores centros urbanos internacionais. Diminuíam as distâncias e aumentava a sensibilidade para
as conquistas tecnológicas que repercutiam rapidamente na configuração do imaginário urbano e • a poesia concreta começa por assumir uma • contra a organização sintática perspectivista,
na própria conformação do cotidiano das grandes cidades. Em 1950, o Brasil já tinha transmissões responsabilidade total perante a linguagem: onde as palavras vêm sentar-se como “cadáveres
regulares de TV, sabia que um certo Peter Goldmark inventou o Long-play, no mesmo ano (1948)
aceitando o pressuposto do idioma histórico como em banquete”, a poesia concreta opõe um novo
em que três americanos formularam a teoria dos transístores e construíram os primeiros exem-
núcleo indispensável de comunicação, recusa- sentido de estrutura, capaz de, no momento
plares; já ouvira falar em cibernética e no “cérebro eletrônico”, criado em 1946, na Universidade da
se a absorver as palavras com meros veículos histórico, captar, sem desgaste ou regressão, o
Pensilvânia, tinha notícia de que a Força Aérea dos EUA havia feito o primeiro vôo a jato cruzando
o país e admirava o gênio de Einstein que expandira a fantástica Teoria da Relatividade na Teoria indiferentes, sem vida sem personalidade sem cerne da experiência humana poetizável.
Geral do Campo. Sete anos depois, já empolgados pela mobilização ideológica do desenvolvimento história - túmulos-tabu com que a convenção
insiste em sepultar a idéia. • mallarmé (un coup de dés-1897), joyce (finnegans
a produção da primeira pílula anticoncepcional, (1952), com a exploração da primeira bomba de hi-
wake), pound (cantos-ideograma), cummings e,
drogênio (1952), e com outras novidades incríveis como a vitamina B12 ou a invenção dos aparelhos
de telefoto - ficaram sabendo que a URSS colocou em órbita um satélite artificial, uma nova lua num segundo plano, apollinaire (calligrammes) e as
• o poeta concreto não volta a face às palavras, tentativas experimentais futuristasdadaistas
chamada Sputnik.
não lhes lança olhares oblíquos: vai direto ao seu estão na raíz do novo procedimento poético,
centro, para viver e vivificar a sua facticidade. que tende a imporse à organização convencional
NA MUSICA
Música, literatura, artes plásticas e as próprias jovens artes do século XX, como o cinema e a cuja unidade formal é o verso (livre inclusive).
fotografia, voltavam-se para o espírito da invenção e da radicalidade dos grandes movimentos de • o poeta concreto vê a palavra em si mesma
vanguarda do início do século - campo magnético de possibilidades - como um • o poema concreto ou ideograma passa a ser
Após 1945, processou-se em alguns centros da Europa uma espécie de reavaliação e retomada objeto dinâmico, uma célula viva, um organismo um campo relacional de funções.
de certos princípios das vanguardas que, de alguma forma, haviam-se perdido no emaranhado das completo, com propriedades psicofisicoquímicas
duas grandes guerras. É o caso do grupo Nova Música (Neue Musik), na Alemanha, que desenvolvia tacto antenas circulação coraação: viva. o núcleo poético é posto em evidencia não mais
um trabalho de recuperação das sugestões de Webern e Schönberg. Uma nova geração de músi- pelo encadeamento sucessivo e linear de versos,
cos como Pierre Boulez, Luigi Nono, Bruno Madena e Stockenhausen, passava a generalizar a noção • longe de procurar evadir-se da realidade ou mas por um sistema de relações e equilíbrios
de “série”, aprofundando a experiência da música dodecafônica. iludí-la, pretende a poesia concreta, contra a entre quaisquer parses do poema.
No Brasil, em 1946, surgia o manifesto do grupo Música Viva, criado pelo regente alemão Hans e
introspecção autodebilitante e contra o realismo
integrado por jovens músicos, que atacava o conservadorismo nacionalista e retomava idéias de
simplista e simplório, situar-se de frente para as • funções-relações gráfico-fonéticas
vanguarda, especialmente a partir de Schönberg. Da mesma forma em outras áreas, os primeiros
coisas, aberta, em posição de realismo absoluto. (“fatores de proximidade e semelhança”) e o
anos do pós-guerra já sugerem a possibilidade de uma guinada no sentido da inovação. Alguns signos
dessa possibilidade podem ser encontrados em fatos com a inauguração dos Museus de Arte Mod- uso substantivo do espaço como elemento
erna do Rio e São Paulo (1949 e 1948), da I Bienal de Arte de São Paulo(1951) onde pela primeira vez o • o velho alicerce formal e silogístico-discursivo, de composição entretêm uma dialética
brasil fazia uma exposição de arte com efetiva repercussão internacional e que trazia ao contato fortemente abalado no começo do século, voltou simultânea de olho e fôlego, que, aliada à síntese
do público e dos artistas locais o que de mais contemporâneo se realizava no exterior, nos trabal- a servir de escora às ruínas de uma poética ideogrâmica do significado, cria uma totalidade
hos de Niemeyer com Le Corbusier, e até mesmo a disposição de setores da burguesia paulista de comprometida, híbrido anacrônico de coração sensível “verbivocovisual”, de modo a justapor
financiar a Cia. Vera Cruz numa tentativa de implantar uma indústria cinematográfica. atômico e couraça medieval. palavras e experiência num estreito colamento
2. No Rio de Janeiro
Exposição Nacional de Arte Concreta Intituto de Arte Contemporâneo - IAC
Há muita controvérsia e muita discussão em revista habitat nº3, 1951
Tendo a poesia concreta atingido o seu torno da nova tendência e a Exposição Nacio-
primeiro estágio de maturação - a platafor- nal de Arte Concreta se transformou, entre 4
ma teórica ganhava, cada vez mais, corpo e O Intituto de Arte Contemporânea surge po iniciativa do “Museu de Arte” de São Paulo, com
e 11 de fevereiro de 57, no acontecimento mais
definição, o “paideum”e os procedimentos for- finalidade de colocar a disposicão dos jovens uma escola e um centro de atividade, onde
importante da cidade maravilhosa. Foi rea-
mais básicos já estavam estipulados - urgia o serão estudados e divulgados os princípios das artes plásticas em favor da coletividade e
lizado, sob o patrocínio do Teatro Universitário
lançamento oficial do movimento. em absoluta coerência com a com a época .
Brasileiro, um caloroso debate na UNE, em 10
de fevereiro. Nessa noite, Décio Pignatari faz
Noigandres Um grupo de arquitetos, artistas e técnicos, persuadido da necessidade dessa iniciativa,
uma conferência polêmica, assistida por im-
reune-se com o objetivo de trabalhar nessa escola rigorosamente disciplinada e orientada
portantes figuras da intelectualidade carioca.
No final de 1956, mais precisa numa base didática, visando;
Mas talvez, o saldo mais positivo desses acon-
mente dezembro, acrescida de um novo mem- tecimentos, para os poetas concretos, tenha
bro o jovem poeta carioca Ronaldo Azeredo, sido o artigo “A Poesia Concreta e o Momento
a equipe Noigandres, juntamente com os pin- formar jovens que se dediquem à arte industrial e se mostrem capazes de
Poético Brasileiro”, escrito por Mário Faustino
tores e escultores aliados à mesma tendência, desenhar objetos nos quais o gosto e a racionalidade das formas
e onde, após um rigoroso balanço da produção
realiza a primeira Exposição Nacional de Arte correspondam a progresso e à mentalidade atualizada.
poética daquele momento, o autor de O Homem
Concreta, no Museu de Arte Moderna de São e sua Hora elegia os poetas criadores do novo
aclarar a consciência da função social do desenho industrial, refutando a fácil
movimento como representantes do que ha-
e deletéria reprodução dos estilos superados e o diletanismo decorativo.
via de melhor no campo da criação literária
Paulo (MAM). brasileira.
ressaltar o sentido da função social que cada projetista, no campo da arte
aplicada, deve ter em relação à vida.
Os Artistas Rupturas
Participaram da exposição os seguintes ar- Após a realização da Exposição Nacional de
Em uma palavra o I.A.C., solicitando a colaboração definitiva da industria, deseja incrementar
tistas plásticos: Geraldo Barros, Aluísio Carvão, Arte Concreta, o movimento ganha repercussão.
a circulação de idéias novas, de novos empreendimentos no campo estético, erroneamente
Lygia Clark, Waldemar Cordeiro, João S. Costa, O poeta Manuel Bandeira, por exemplo, então
considerado como uma “torre de marfim” para iniciados, generalizando o mais possivel as
Hermelindo Fiaminghi, Judith Lauand, Maurício decano do Modernismo, adere as posições de
conquistas da arte, da tradição e da cultura.
Nogueira Lima, Rubem M. Ludolf, César Oiticica, equipe Noigandres, realizando alguma experiên-
Hélio Oiticica, Luis Sacilotto, Décio Vieira, Alfre- cias poéticas concretas, ao mesmo tempo que
do Volpi, Alexandre Wollner, Lothar Charoux, Ly- em sua coluna diária de crônica comentava a
gia Pape, Amílcar de Castro, Kasmer Fejer, Franz renovadora tendência.
J. Weissmann, Ivan Serpa e os poetas: Augusto Mas uma cisão ocorre dentro do movimento. O
e Haroldo de Campos, Décio Pignatari, Ronaldo poeta Ferreira Gullar e Reinaldo Jardim desin- Wollner um IAC
Azeredo, Ferreira Gullar e Waldimir Dias Pino, dentificam-se das posições do grupo paulista,
especialmente convidados. em defesa de uma poesia “subjetivista e intu-
itiva”. Também o crítico Oliveira Bastos assinou
A mostra o manifesto da cisão, embora reconhecendo Pioneiro, o artista-designer Alexandre Wollner
posteriormente, a validade das propostas da percebeu, nos anos 50, que a proximidade en-
Se compunha de cartazes-poemas, apresen- poesia concreta. tre arte e vida poderia dar-se ao trabalhar
tados ao lado de obras pictóricas e esculturas. A saída de Gullar, Jardim e Bastos do Movimento diretamente nos meios de produção urbanos,
As soluções gráficas dos cartazes (padroniza- de Poesia Concreta foi motivada pela publica- que surgiam em São Paulo. Era uma época em
ção de tipos, diagramação) foram sugeridas ção do ensaio “Da Fenomenologia da Composição que design era uma causa, e não um estilo.
pelo artista plástico e publicitário Hermelindo à matemática da Composição”.
Fiaminghi, que também participava do evento.
De 1951 a 1953, estudou no Instituto de Arte
Na ocasião a revista ad-arquitetura e decora-
Contemporânea do MASP, “O IAC, e principal-
ção é contatada através de Waldemar Cordeiro
mente a vivência e a convivência no ambiente
e inclui no seu nº 20, o material da exposição,
do MASP daqueles anos aprimoraram minha
funcionando, assim, como catálogo da mesma.
capacidade intuitiva e permitiram-me perce-
Neste número escreveram artigos o próprio
ber a possibilidade de participação social do
Waldemar Cordeiro, Décio Pignatari, Augusto
artista através do design”, disse Wollner, para
de Campos, Haroldo de Campos e Ferreira Gul-
o jornal Folha de S. Paulo, em 06/08/80.
lar. Foram publicados também, poemas concre-
tos e clichês reproduzindo os quadros e escul-
Seus trabalhos, assim como os de Maurício Nogueira Lima e Antonio Maluf, são pioneiros do de-
turas dos artistas expostos. No auditório do
sign gráfico no Brasil. Por seus trabalhos neste instituto, recebeu uma bolsa de estudos na
MAM, Décio Pignatari e o crítico Oliveira Bastos
Alemanha, em Ulm, na famosa escola de design “Hochschule fur Gestaltung”, advinda da Bauhaus..
pronunciaram conferências sobre a nova poe-
Lá estudou com Max Bill, Johannes Ittem, Josef Albers, Walter Peterhans, entre outros grandes
sia. Paralelamente ao evento, foi lançado o nº
nomes da arte e do design moderno. “A nossa turma do ano de 1954 foi drasticamente treinada
3 da revista Noigandres, trazendo como sub-tí-
para a ciência e tecnologia. Nem eu estava preparado para isso, afinal eu era um artista”, con-
tulo, o nome poesia concreta. A exposição, como
tou em entrevista para a revista D’Art, no 5.
era de esperar, repercurtiu nos meios artísti-
cos e intelectuais da capital paulista. Porém, o
Como artista plástico, realizou entre 1951 e 1954 pinturas geométricas que utilizavam a lingua-
impacto maior da eclosão do movimento con-
gem da gestalt visual, cujo aprendizado certamente veio de sua experiência como programador
creto vai ocorrer, de fato, quando a mostra é
visual. Trazia também materiais industriais para o campo das artes plásticas, como o eucatex.
levada para o Rio de Janeiro, em fevereiro do
Expôs na II Bienal Internacional de São Paulo, em 1953, onde ganhou um prêmio de jovem pintura.
ano seguinte e montada no saguão do MEC. A
Seu ideal de união entre arte e indústria o aproximou dos artistas da arte concreta paulista, o
esta altura, o movimento ganha espaço amplo
Grupo Ruptura, com o qual expôs na I Exposição Nacional de Arte Concreta (MAM-SP, 1956; MAM-
na imprensa, e jornais e revistas de grande cir-
RJ, 1957), e na mostra Konkrete Kunst (Zurique, 1960).
culação deram cobertura ao evento.
3. Paisagismo e Cultura
Waldemar Cordeiro movimento organizado no âmago dos in-
teresses extra-artísticos, que ocorrem
Noigandres e midia
Revista AD, nº21 1957
na vida artística, mobilizou o esforço
dos “papas” das “igrejinhas” que tentam
Ruptura neutralizar uma suposta ação renova-
Nos países de expressão portuguesa, as primei-
dora dos jovens. Na realidade, porém, o
Após 4 anos de luta semi-clandestina o movimento abstrato e concreto, e con- ras idéias sobre uma poesia em sintonia com a
movimento da arte abstrata e concre- sequentemente o grupo ruptura, não nu- era das mídias e das novas tecnologias começam
ta ingressa na vida legal artística. A ex- trem veleidades tão audaciosas. Anossa a ser esboçadas a partir de meados dos anos
posição do grupo ruptura, realizada no atitude como integrante do júri do II 50, graças à intervenção do grupo brasileiro
Museu de Arte Moderna, assinala esse Salão Paulista de Arte Moderna deveria Noigandres (Décio Pignatari, Augusto de Cam-
movimento. Esse grupo contudo está ser penhor do nosso absoluto repeito às pos e Haroldo de Campos), criador da poesia
longe de representar todo movimento concepções artísticas dos nossos cole- concreta, e nos anos 60, com o surgimento do
paulista de arte abstrata e concreta, gas e da nossa fé na possibilidade da co- grupo português PO.EX, que abrangia cerca
cuja fileiras contam hoje inúmeros inte- existencia pacífica, no terreno da orga- de uma dezena de poetas reunidos ao redor
grantes. nização artistica de tendências plásticas de Melo e Castro. Dessa época para cá, a idéia
de uma poesia de feição radicalmente contem-
diferentes. Mas parece, no entanto, que
A exposição Ruptura repercutiu profun- há quem nutra dúvidas a esse respeito, porânea, capaz de lançar mão dos novos recur-
damente nos meios artísticos e, como era e sái quebrando lanças contra moinhos sos escriturais, não cessa de ganhar adeptos.
de se esperar, provocou celeumas e po- de vento. Um fato digno de atenção, no que diz respeito
lemicas. De outro lado, entretanto com o a essa poesia, é a sua particular expansão em
Waldemar Cordeiro nosso país e a vitalidade das experiências que
foram aí desenvolvidas, a ponto de ser prati-
No âmbito das funções específicas do programa camente impossível hoje, em qualquer parte do
que está con dicionado o jardim, a solução mundo, conceber uma mostra ou uma antologia
Movimento NeoConcreto plástico-visual é sem duvida a característica dessa nova poesia verbo-áudio-moto-visual sem
mais relevante. que a presença brasileira seja considerada. Se
Dessa cisão, nasceria o movimento NeoConcreto, que dura de 1959 a 1961. Após esse isso pode parecer normal, atentemos entretan-
período, o poeta Ferreira Gullar renuncia à poesia de vanguarda e parte para uma É com efeito, ne forma real- resultado final que to ao fato de que muitos países, mesmo entre
literatura de cunho político-participante dispensa os antecedentes e as motivações - que os mais industrializados e com maior hegemonia
A partir da publicação, ainda nesse mesmo ano (1959), do “Plano- Piloto para Poe- reencontramos todos os conteúdos que fazem da mídia, ainda não despertaram para as pos-
sia Concreta”, o movimento completa maturação e as irradiações de suas idéias da arquitetura paisagistica uma atividade tão sibilidades de uma poesia da era da televisão e
começam a se fazer sentir não só no próprio ambiente literário, como também em válida e completa quanto as demais atividades do computador.
outras áreas do contexto cultural brasileiro. que já tem o seu lugar assegurado na cultura.
A expressão neoconcreto indica uma tomada de posição em face da arte não-figurativa “geo-
Na realidade, o paisagismo, quando encer-
métrica” (neoplasticismo, construtivismo, suprematismo, escola de Ulm) e particularmente em
rado num certo nível, não pode prescindir da
face da arte concreta levada a uma perigosa exacerbação racionalista. Trabalhando no cam-
po da pintura, escultura, gravura e literatura, os artistas que participam dessa I Exposição problemáticaque reflete, num sentido amplo um
Neoconcreta encontraram-se, por força de suas experiências, na contingência de rever as e histórico, o próprio desenvolvimento da con- movi
posições teóricas adotadas até aqui em face da arte concreta, uma vez que nenhuma delas sciência.
mento
“compreende” satisfatoriamente as possibilidades expressivas abertas por estas experiên-
cias. A concepção do jardim e sua solução formal, compondo
(...) portanto, devem constituir momentos da além
da
O neoconcreto, nascido de uma necessidade de exprimir a complexa realidade do homem mod- própria criação, em paridade com condições e
erno dentro da linguagem estrutural da nova plástica, nega a validez das atitudes cientificis-
nuvem
responsabilidades com a arquitetura, poesia,
tas e positivistas em arte e repõe o problema da expressão, incorporando as novas dimensões
música e artes visuais. Isso em virtude da supe-
“verbais” criadas pela arte não-figurativa construtiva. O racionalismo rouba à arte toda a
autonomia e substitui as qualidades intransferíveis da obra de arte por noções da objetividade
ração do preconceito relativo de uma suposta um
científica: assim os conceitos de forma, espaço, tempo, estrutura - que na linguagem das artes superioridades das chamadas artes puras. campo
estão ligados a uma significação existencial, emotiva, afetiva - são confundidos com a aplica-
Nesse sentido, o paisagismo depois de ter su-
de
combate
ção teórica que deles faz a ciência. Na verdade, em nome de preconceitos que hoje a filosofia
denuncia (M. Merleau-Ponty, E. Cassirer, S. Langer) - e que ruem em todos os campos a começar perado um naturalismo chocho, cuja aspiração
pela biologia moderna, que supero o mecanicismo pavloviano - os concretos-racionalistas ainda maxima é o “presépio” tenta participar d esfor-
vêem o homem como uma máquina entre máquinas e procuram limitar a arte à expressão ço da arquitetura para renovação do gosto.
dessa realidade teórica.
Não concebemos a obra de arte nem como “máquina” nem como “objeto”, mas como um quasi- mira
corpus, isto é, um ser cuja realidade não se esgota nas relações exteriores de seus elementos;
um ser que, decomponível em parte pela análise, só se dá plenamente à abordagem direta,
gem
fenomenológica. Acreditamos que a obra de arte supera o mecanicismo material sobre o qual ira
repousa, não por alguma virtude extraterrena: supera-o por transcender essas relações quem de
o um
mecânicas (que a Gestalt objetiva) e por criar para si uma significação tácita (M. Ponty) que
emerge nela pela primeira vez. Se tivéssemos que buscar um símile para a obra de arte não o
poderíamos encontrar, portanto, nem na máquina nem no objeto tomados objetivamente, mas, tivo horizonte
como S. Langer e W.Wleidlé nos organismos vivos. Essa comparação, entretanto, ainda não bas-
taria pra expressar a realidade específica do organismo estético. olev o uavi puro
(...)
verj o gand num
Por sua vez, a prosa neoconcreta, abrindo um novo campo para as experiências expressivas,
opér o lasp mo
mento
recupera a linguagem como fluxo, superando suas contingências, sintáticas e dando um sentido
novo, mais amplo, a certas soluções tidas até aqui equivocadamente como poesia. É assim que,
arap o ocos
na pintura como na poesia, na prosa como na escultura e na gravura, a arte neoconcreta re- vivo
afirma a independência da criação artística em face do conhecimento prático (moral, política, Portuguese: (in
indústria, etc.)
conventional form): “Que Décio Pignatari -1956
Os participantes desta I Exposição Neoconcreta não constituem um “grupo”. Não os ligam motivo o levou a viver
princípios dogmáticos. A afinidade evidente as pesquisas que realizam em vários campos os
aproximou e os reuniu aqui. O compromisso que os prende, prende-os primeiramente cada um à
jogando pérolas para
sua experiência, e eles estarão juntos enquanto dure a afinidade profunda que os aproximou. porcos (para poucos)?”
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Edição, pesquisa e diagramação BRITO, Ronaldo. Neoconcretismo, Vér-
Marilia Rubio tice e ruptura do projeto construtivo