O documento descreve trechos do livro "Clara dos Anjos", de Lima Barreto. O autor usa uma linguagem simples para retratar a vida nos subúrbios cariocas no início do século XX e criticar o racismo e preconceito social da época, mostrando a história de Clara, uma jovem mulata iludida por um homem branco. Lima Barreto faz uma fusão do real com a ficção para demonstrar a situação das famílias populares e a formação da sociedade brasileira.
2. *
*Afonso Henrique de Lima Barreto (1881-1922) nasceu no
Rio de Janeiro no dia 13 de maio. Filho de Joaquim
Henriques de Lima Barreto e Amália Augusta, ambos
mestiços e pobres. Sofreu preconceito a vida toda. Seu
pai era tipógrafo e sua mãe professora primária. Logo
cedo ficou órfão de mãe.
*Estudou no Liceu Popular Niteroiense e concluiu o curso
secundário no Colégio Pedro II, ingressou na Escola
Politécnica do Rio de Janeiro, onde iniciou o curso de
Engenharia. Em 1904 foi obrigado a abandonar o curso,
pois, seu pai havia enlouquecido e o sustento dos três
irmão agora era responsabilidade dele.
3. *Em 1904 consegue emprego de escrevente copista
na Secretaria de Guerra, ao mesmo tempo que
colabora com quase todos os jornais do Rio de
Janeiro. Ainda estudante já colaborava para a
Revista da Época e para a Quinzena Alegre. Em
1905 passa a escrever no Correio da Manhã, jornal
de grande prestígio.
*Com uma linguagem descuidada, suas obras são
impregnadas da justa preocupação com os fatos
históricos e com os costumes sociais. Torna-se uma
espécie de cronista e um caricaturista se vingando
da hostilidade dos escritores e do público burguês.
Poucos aceitam aqueles contos e romances que
revelavam a vida cotidiana das classes populares,
sem qualquer idealização.
4.
5.
6. *
*Em Clara dos Anjos relata-se a estória de
uma pobre mulata, filha de um carteiro de
subúrbio, que apesar das cautelas
excessivas da família, é iludida, seduzida e,
como tantas outras, desprezada, enfim, por
um rapaz de condição social menos humilde
do que a sua. É uma estória onde se tenta
pintar em cores ásperas o drama de tantas
outras raparigas da mesma cor e do mesmo
ambiente.
7. *O romancista procurou fazer de sua personagem
uma figura apagada, de natureza "amorfa e
pastosa", como se nela quisesse resumir a
fatalidade que persegue tantas criaturas de sua
casta: "A priori", diz, "estão condenadas, e tudo
e todos parecem condenar os seus esforços e os
dos seus para elevar a sua condição moral e
social." É claro que os traços singulares, capazes
de formar um verdadeiro "caráter" romanesco,
dando-lhe relevo próprio e nitidez hão de
esbater-se aqui para melhor se ajustarem à
regra genérica. E Clara dos Anjos torna-se,
assim, menos uma personagem do que um
argumento vivo e um elemento para a denúncia."
8. *
*Clara dos Anjos: Protagonista e narradora.
Mulata do subúrbio carioca, era admirada
por sua, beleza e inocência. Tinha por
ambição arranjar um belo casamento,
tivera uma vida simples, porém o melhor
que seus pais podiam lhe oferecer.
9. * Ex:
“Era tratada pelos pais com muito desvelo,
recato e carinho; e, a não ser com a mãe
ou pai, só saía com Dona margarida, uma
viúva muito séria, que morava nas
vizinhanças e ensinava a Clara bordados e
costuras.”
10. *Marrameque : Semiparalítico, padrinho de
Clara, compadre de Joaquim dos Anjos,
frequentara uma pequena roda de boêmios e
literatos e poetas.
*Ex:
“(...)devido a seu estado de invalidez, de
semi-aleijado e semiparalítico do lado
esquerdo, tinha, entretanto, pertencido a
uma modesta roda de boêmios literatos e
poetas, na qual, a par da poesia e de
coisas de literatura, se discutia muita
política, hábito que lhe fico(...).”
11. *Cassi Jones: Andava na moda, seduzia as damas
com seu irresistível violão, seguido de
escândalos, nos jornais e nas delegacias. Pelo
fato de sedução em senhoras casadas. Porém a
mãe sempre o defendia.
*Ex:
“Era Cassi um rapaz de pouco menos de
trinta anos, branco, sardento, insignificante,
de rosto e de corpo; e, conquanto fosse
conhecido como consumado "modinhoso",
além de o ser também por outras façanhas
verdadeiramente ignóbeis, não tinha as
melenas do virtuose do violão, nem outro
qualquer traço de capadócio(...).”
12. *Joaquim dos anjos: carteiro, acredita-se
músico escreveu a polca, valsas, tangos e
acompanhamentos de modinha. polca: siri
sem unhas; valsa: magos do coração.
Tiveram algum sucesso, a ponto de vender
ele a propriedade de cada uma, por
cinquenta mil-réis, a uma casa de músicas.
O seu saber musical era fraco; adivinha
mais do que empregava noções teóricas que
tivesse estudo. Pai de Clara dos Anjos
13. *Ex:
*“O carteiro Joaquim dos anjos não
era homem de serestas e serenatas;
mas gostava de violão e de
modinhas. Ele mesmo tocava flauta,
instrumento que já foi muito estimado
em outras épocas, não o sendo
atualmente como outrora.”
14. *Mr. Shays: Chefe da seita bíblica, homem
tenaz cheio de eloquência bíblica faz seus
adeptos ouvir a palavra. Quando os adeptos
se acham preparados põem-se a propagá-la.
*Ex:
“Era Shays Quick ou Quick Shays daquela
raça curiosa de yankees fundadores de
novas seitas cristãs. De quando em
quando, um cidadão protestante dessa
raça que deseja a felicidade de nós outros,
na terra e no céu, à luz de uma sua
interpretação de um ou mais versículos da
Bíblia, funda uma novíssima seita, põe-se a
propagá-la e logo encontra dedicados
adeptos(...).”
15. *Manuel borges de Azevedo e Salustiana Baeta
de Azevedo: Pais de Cassi. O pai não gostava
dos procedimentos do filho, enquanto a mãe,
cobria-lhe as desfeitas com as proteções.
*“(...) Dona Salustiana, chorando e
jurando a sua inocência, asseverando
que a tal fulana – qualquer das vítimas –
já estava perdida, por esse ou por aquele;
que fora uma cilada que lhe armaram,
para encobrir um mal feito por outrem, e
por o saberem de boa família, etc.,etc.”
16. *Ex:
“O pai desse Cassi era verdadeiramente
um homem sério. Estreito de ideias,
familiarizado no emprego público, que, há
cerca de trinta anos, exercia, ele tinha
profundos sentimentos morais, que lhe
guiavam a conduta no seu comércio com
os filhos. Nunca fora afetuoso: evitava até
todas as exibições e exageros
sentimentais(...). ”
17. *Doutor Meneses:
es: O dentista da família. Intermediário dos
bilhetes e cartas de Cassi para Clara. Senhor
Monção - caixeiro vendedor; Belmiro Bernedes &
Cia. - "tocava realejo", era um moço português,
simpático, educado, e bom porte.
*Ex:
*“ - Foi para casa do carteiro. Está tratando
dos dentes da filha e almoça quase sempre
lá. Ele precisava, coitado do Doutor
Meneses! – um homem ilustrado, velho,
doente – quase não comia; era só beber
(...).”
18. *D.laurentina Jácome: gostava de rezar, ficar
zelando a igreja.
*Ex:
“(...)Dona Laurentina Jácome, uma velha,
sempre metida com rezas e padres,
pensionista do ex Imperador e empregada
numa capelinha da vizinhança, de cuja
limpeza era encarregada, inclusive da
lavagem das toalhas dos altares. . Não
podia conversar outra coisa que não
fossem acontecimentos eclesiásticos e,
quase sempre, os de sua igreja.”
19. *D. Vicêntina : cartomante.
*Ex:
“(...)Além desta, havia uma digna de
nota: era Dona Vicência. Morava na
vizinhança também e vivia a deitar cartas
e cortar "cousas feitas". O seu
procedimento era inatacável e exercia a
sua profissão de cartomante com toda a
seriedade e convicção.”
20. *João pintor: Era um cidadão que visitava "os
bíblias" aqueles que pregavam o evangelho.
*Ex:
“Era homem de pouca altura, trazia a
cabeça sempre erguida, testa reta e alta,
queixo forte e largo, olhar firme, debaixo
de seu pince-nez de aros de ouro. “Era
preto retinto, grossos lábios, malares
proeminentes, testa curta dentes muito
bons e muitos claros, longos braços,
manoplas enormes, longas pernas e uns
tais pés que não havia calçado”.
21. *
*Tempo Psicológico: “(...) Hoje, é raro ver-
se, no Rio de Janeiro, um muro coberto
de hera; entretanto, há trinta anos, nas
laranjeiras, na rua Conde de Bonfim, no
Rio Comprido, no Andaraí, no Engenho
Novo, enfim, em todos os bairros que
foram antigamente estações de repouso
e prazer, encontravam-se, a cada passo,
longos muros cobertos de hera, exalando
melancolia e sugerindo recordações (...)”
22. * Tempo Cronológico: “(...)Chegou
Cassi Jones à casa de Lafões quase à
noite. Era uma pequena casa, mas
bem tratada e limpa(...)”
23. *
*Rio de Janeiro: sob o impacto das
mudanças estruturais impostas à cidade,
surgem através de aspectos relevantes para
a constituição do espaço da narrativa. A
idealização do espaço urbano, de seu
planejamento, e as diferentes estratégias
de intervenção que fizeram parte do Rio de
Janeiro, no começo do século XX, pareceu-
nos transformar a cidade em denúncia de
uma sociedade injusta e racista.
24. *Ex:
“O subúrbio é um refugio dos infelizes.
Os que perderam o emprego, as
fortunas; os que faliram nos negócios,
enfim, todos os que perderam a sua
situação normal vão se alinhar ali (...).”
25. *
*O narrador é observador e em 3ª pessoa. Em
outras palavras, conta a historia e, ao
mesmo tempo, vai descrevendo as
personagens e o espaço para nós, leitores,
termos informação para formar o perfil
social e psicológico de cada personagem e
também para conseguirmos perceber como
eram os subúrbios.
26. *Ex:
“[...] O carteiro Joaquim dos Anjos não era
homem de serestas; mas gostava de
violão e de modinhas. Ele mesmo tocava
flauta, instrumento que já foi muito
estimado em outras épocas, não o sendo
atualmente como outrora[...]”
27. *
*O autor procura usar uma linguagem
simples, aproximando-se da língua falada
da época. O estilo da narrativa é objetivo,
incorporando a linguagem do texto
jornalístico, com frases espontâneas. Foi
muito criticado por escrever desse modo e
mostra a questão social do uso da
linguagem em trechos do livro.
28. *Ex:
“O violeiro leu o que quis, fechou a
carta e deu ao pobre velho. A sua
resolução já estava tomada. Havia
forçosamente de se entregar que o
arrastava. Ela o havia levado até ali; era
inútil resistir. Entregou a carta a clara.
No dia seguinte, recebeu a resposta.
Entregou-a Cassi. Assim, durante um
mês e tanto, e ele foi o intermediário
dos dois(...).”
29. *
*Questão racial... que até hoje muitas
pessoas sofrem com o problema de
preconceito racial. e clara sofria com
isso.
*Ex:
“ (...) repugnava-lhe ver o filho
casado com uma criada preta, ou
com uma pobre mulata
costureira(...).“
30. *
*Preconceito racial-social
*Realismo e naturalismo
*Cultural brasileira
*Ex:
“(...) não haveria um talvez, entre toda
aquela gente de ambos os sexos, que
não fosse indiferente á sua desgraça...
Ora, uma mulatinha, filha de um carteiro!
O que era preciso, tanto a ela como ás
suas iguais, era educar o caráter (...)“
31. *
*A narrativa literária nos propicia
estabelecer a intersubjetividade entre a
obra, autor e leitor, fato que nos orienta
para o real e que se estabelece de maneira
concreta pela escritura. As múltiplas visões
que uma história pode vir a ter são criadas
nesse momento, projetando aspectos
sociais de dadas culturas que, nesse caso,
mostrado por Clara dos Anjos, assume o
imaginário vivido no Brasil do século
passado,marcado pelo racismo.
32. *Lima Barreto descrevia, em seus textos, tudo
aquilo que caísse na sua inconformidade com
a sociedade. Em Clara dos Anjos, o autor não
separa a obra literária dos acontecimentos
reais, representando as crenças, o
comportamento e a tradição popular das
pessoas. Barreto faz uma fusão do real com a
ficção, narrando acontecimentos e fatos que
demonstram a situação das famílias cariocas
no início do século XX, atentando para a
maneira de agir de alguns grupos sociais, que
contribuiriam direta ou indiretamente na
formação da nova sociedade que estava por
vir.
33. *Não é preciso, portanto, mencionar todos os
capítulos desse romance para que se chegue a
uma consideração, aqui já dita, de que Lima
Barreto contempla o imaginário social que se
forma pela base de pessoas comuns,
conseguindo, assim, revelar a busca por uma
sociedade igualitária, embora se mostre
esfacelada e caótica perante o olhar do autor.