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SARGENTO           CONDENADO              PELO       CRIME       DE     RECUSA         DE
OBEDIÊNCIA             PRATICADO             CONTRA            OUTRO      SARGENTO.
CONCESSÃO ORIGINÁRIA DO SURSIS INOBSTANTE VEDAÇÃO
LEGAL. IMPOSSIBILIDADE DE REFORMATIO IN PEJUS QUANDO O
RECURSO          É SOMENTE             DO     RÉU.      DECISÃO       CONSIDERADA
HISTÓRICA PELO TRIBUNAL.

                                                                      Jorge Cesar de Assis




1. DA DECISÃO EM ANÁLISE

           O Diário da Justiça da União de Seção I, nº 77, de 26 de abril de 2005, publicou
ementa de decisão do Superior Tribunal Militar na apelação n° 2004.01.049793-5 – RJ,
julgado em 10 de março de 2005, a qual pelas circunstâncias do fato merece uma análise
detalhada à comunidade interessada no direito penal militar.

           A ementa da decisão ficou assim vasada:

           “Ementa. Apelação. Recusa de obediência (CPM, art. 163). Militar que, livre
e conscientemente, se recusa a cumprir ordem de superior hierárquico para que trocasse
o uniforme. Reconhecimento por parte do acusado de que a ordem era legal, tendo
praticado o delito na presença de outros militares, com reflexos negativos para a
disciplina militar. Negado provimento ao apelo defensivo. Decisão unânime” (STM – Ap.
n° 2004.01.049793-5/RJ, Rel. Min. Gen Ex Valdésio Guilherme de Figueiredo).

           O processo iniciou-se por denúncia do MPM, dando conta que um 2° Sargento do
Exército, em data de 13 de janeiro de 2003, por volta das 07:30h tendo recebido ordem de um
1° Sargento (superior imediato) para que trocasse o uniforme de instrução pelo de educação
física (em razão de que as atividades diárias do Batalhão haviam sido alteradas), negou-se a
cumpri-la, alegando que só trocaria de roupa após a verificação das faltas de seu pelotão. A
determinação foi reiterada e novamente o denunciado recusou-se a cumpri-la, sendo que a
recusa fora presenciada por outros militares.

            Consta igualmente do inteiro teor do acórdão que o acusado foi submetido a
julgamento em 27 de setembro de 2004, tendo sido condenado pelo fato já descrito
anteriormente, em que pese ter sido absolvido de duas outras imputações de cunho
semelhante, que não cabem aqui serem analisadas.

            Mas o Conselho de Justiça resolveu, ainda, conceder ao acusado a suspensão
condicional da pena, pelo prazo de dois (2) anos, fundamentando que “não se justifica manter
um sargento na prisão quando pode ser útil no cumprimento de suas tarefas. É melhor para a
Administração Militar e qualquer ato de indisciplina pode ser recolhido à prisão”.

            Da sentença recorreu apenas o réu, transitada a decisão em julgado para o MPM.




2. A RECUSA DE OBEDIÊNCIA E A VEDAÇÃO LEGAL DE CONCESSÃO DO SURSIS

            O crime de recusa de obediência (art. 163, CPM) pelo qual o réu foi condenado
em 1ª instância, está previsto no capítulo V - DA INSUBORDINAÇÃO, do Título II - DOS
CRIMES CONTRA A AUTORIDADE OU DISCIPLINA MILITAR.

            Os bens juridicamente tutelados pelo Código Penal Militar são a autoridade e a
disciplina Militar.

            Considerando-se que as Forças Armadas (art. 142, CF) e de igual forma as Forças
Auxiliares (art. 42, CF) são instituições permanentes e regulares baseadas na HIERARQUIA
e na DISCIPLINA, não é difícil de verificar a necessidade da previsão dos tipos penais que
integram o Título II do Código Penal Militar.
Dentro dessa ótica, o CPM, ao tratar da Suspensão Condicional da Pena (o sursis),
VEDOU por expressa disposição legal, em seu art. 88, a concessão do benefício: I) ao
condenado por crime militar em tempo de guerra e; II) em tempo de paz, ao condenado por
crime contra a segurança nacional; de aliciação e incitamento; de violência contra superior,
oficial de dia, de serviço ou de quanto, sentinela, vigia ou plantão; de desrespeito a superior;
de insubordinação, ou de deserção.

            Como já referimos alhures , o artigo 88 encontra sua justificação no entendimento
de que há casos em que o interesse da Pátria ou das Instituições Militares (Forças Armadas e
Polícias Militares) está acima dos próprios fundamentos da suspensão condicional da pena
que deve ser executada para servir de exemplo e dissuadir a repetição do crime.

            Desta forma, o Conselho de Justiça estava legalmente impedido de conceder o
sursis ao condenado.

            Todavia, tendo o Ministério Público de 1° Grau se conformado com a decisão, e
como o recurso fora apenas do réu, era impossível ao Tribunal cassar o benefício ilegalmente
concedido, em função da prevalência da regra que proíbe a reformatio in pejus.

            Esta circunstância já havia sido anotada pelo representante do MPM que atuou em
2° grau, o Subprocurador-Geral de Justiça Militar Edmar Jorge de Almeida, ao referir em seu
parecer que “a rigor, a condenação imposta já o favorece de maneira inusual, excluindo a
incriminação em condutas idênticas e concedendo benefício expressamente vedado em lei,
cuja manutenção apenas se concretizará ante a lamentável omissão do representante do
Ministério Público Militar que oficiou no Processo”.

            Por sua vez, constou do corpo do v. acórdão que “andou mal o Conselho
Permanente de Justiça para o Exército quando da concessão da suspensão condicional da pena
a réu condenado por infração ao artigo 163, à revelia do artigo 88, tudo do CPM; se o
legislador estabeleceu tal vedação, certamente objetivava maior preservação da hierarquia e
da disciplina, contra o que, lamentavelmente, o MPM não se insurgiu...”.
Todavia, há que se notar que o presente processo demonstrou a ocorrência de fato
raro na Justiça Militar, ou seja, um graduado foi condenado por ter se insubordinado contra
outro graduado, demonstrando-se assim que “a disciplina é a rigorosa observação e o
acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam o
organismo militar e coordenam seu funcionamento regular e harmônico, traduzindo-se pelo
perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes desse
organismo”, na exata acepção do parágrafo 2° do artigo 14, do Estatuto dos Militares.

            Bem por isso, o e. relator Min. Gen Ex Valdésio Guilherme de Figueiredo fez
consignar de seu voto o seguinte: “creio tratar-se de uma decisão histórica pois é normal a
condenação de praça por insubordinação a oficial; entretanto, neste caso, a insubordinação
ocorreu entre praças, o que está a revelar o necessário resgate da autoridade do sargento”.

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  • 1. SARGENTO CONDENADO PELO CRIME DE RECUSA DE OBEDIÊNCIA PRATICADO CONTRA OUTRO SARGENTO. CONCESSÃO ORIGINÁRIA DO SURSIS INOBSTANTE VEDAÇÃO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE DE REFORMATIO IN PEJUS QUANDO O RECURSO É SOMENTE DO RÉU. DECISÃO CONSIDERADA HISTÓRICA PELO TRIBUNAL. Jorge Cesar de Assis 1. DA DECISÃO EM ANÁLISE O Diário da Justiça da União de Seção I, nº 77, de 26 de abril de 2005, publicou ementa de decisão do Superior Tribunal Militar na apelação n° 2004.01.049793-5 – RJ, julgado em 10 de março de 2005, a qual pelas circunstâncias do fato merece uma análise detalhada à comunidade interessada no direito penal militar. A ementa da decisão ficou assim vasada: “Ementa. Apelação. Recusa de obediência (CPM, art. 163). Militar que, livre e conscientemente, se recusa a cumprir ordem de superior hierárquico para que trocasse o uniforme. Reconhecimento por parte do acusado de que a ordem era legal, tendo praticado o delito na presença de outros militares, com reflexos negativos para a disciplina militar. Negado provimento ao apelo defensivo. Decisão unânime” (STM – Ap. n° 2004.01.049793-5/RJ, Rel. Min. Gen Ex Valdésio Guilherme de Figueiredo). O processo iniciou-se por denúncia do MPM, dando conta que um 2° Sargento do Exército, em data de 13 de janeiro de 2003, por volta das 07:30h tendo recebido ordem de um 1° Sargento (superior imediato) para que trocasse o uniforme de instrução pelo de educação
  • 2. física (em razão de que as atividades diárias do Batalhão haviam sido alteradas), negou-se a cumpri-la, alegando que só trocaria de roupa após a verificação das faltas de seu pelotão. A determinação foi reiterada e novamente o denunciado recusou-se a cumpri-la, sendo que a recusa fora presenciada por outros militares. Consta igualmente do inteiro teor do acórdão que o acusado foi submetido a julgamento em 27 de setembro de 2004, tendo sido condenado pelo fato já descrito anteriormente, em que pese ter sido absolvido de duas outras imputações de cunho semelhante, que não cabem aqui serem analisadas. Mas o Conselho de Justiça resolveu, ainda, conceder ao acusado a suspensão condicional da pena, pelo prazo de dois (2) anos, fundamentando que “não se justifica manter um sargento na prisão quando pode ser útil no cumprimento de suas tarefas. É melhor para a Administração Militar e qualquer ato de indisciplina pode ser recolhido à prisão”. Da sentença recorreu apenas o réu, transitada a decisão em julgado para o MPM. 2. A RECUSA DE OBEDIÊNCIA E A VEDAÇÃO LEGAL DE CONCESSÃO DO SURSIS O crime de recusa de obediência (art. 163, CPM) pelo qual o réu foi condenado em 1ª instância, está previsto no capítulo V - DA INSUBORDINAÇÃO, do Título II - DOS CRIMES CONTRA A AUTORIDADE OU DISCIPLINA MILITAR. Os bens juridicamente tutelados pelo Código Penal Militar são a autoridade e a disciplina Militar. Considerando-se que as Forças Armadas (art. 142, CF) e de igual forma as Forças Auxiliares (art. 42, CF) são instituições permanentes e regulares baseadas na HIERARQUIA e na DISCIPLINA, não é difícil de verificar a necessidade da previsão dos tipos penais que integram o Título II do Código Penal Militar.
  • 3. Dentro dessa ótica, o CPM, ao tratar da Suspensão Condicional da Pena (o sursis), VEDOU por expressa disposição legal, em seu art. 88, a concessão do benefício: I) ao condenado por crime militar em tempo de guerra e; II) em tempo de paz, ao condenado por crime contra a segurança nacional; de aliciação e incitamento; de violência contra superior, oficial de dia, de serviço ou de quanto, sentinela, vigia ou plantão; de desrespeito a superior; de insubordinação, ou de deserção. Como já referimos alhures , o artigo 88 encontra sua justificação no entendimento de que há casos em que o interesse da Pátria ou das Instituições Militares (Forças Armadas e Polícias Militares) está acima dos próprios fundamentos da suspensão condicional da pena que deve ser executada para servir de exemplo e dissuadir a repetição do crime. Desta forma, o Conselho de Justiça estava legalmente impedido de conceder o sursis ao condenado. Todavia, tendo o Ministério Público de 1° Grau se conformado com a decisão, e como o recurso fora apenas do réu, era impossível ao Tribunal cassar o benefício ilegalmente concedido, em função da prevalência da regra que proíbe a reformatio in pejus. Esta circunstância já havia sido anotada pelo representante do MPM que atuou em 2° grau, o Subprocurador-Geral de Justiça Militar Edmar Jorge de Almeida, ao referir em seu parecer que “a rigor, a condenação imposta já o favorece de maneira inusual, excluindo a incriminação em condutas idênticas e concedendo benefício expressamente vedado em lei, cuja manutenção apenas se concretizará ante a lamentável omissão do representante do Ministério Público Militar que oficiou no Processo”. Por sua vez, constou do corpo do v. acórdão que “andou mal o Conselho Permanente de Justiça para o Exército quando da concessão da suspensão condicional da pena a réu condenado por infração ao artigo 163, à revelia do artigo 88, tudo do CPM; se o legislador estabeleceu tal vedação, certamente objetivava maior preservação da hierarquia e da disciplina, contra o que, lamentavelmente, o MPM não se insurgiu...”.
  • 4. Todavia, há que se notar que o presente processo demonstrou a ocorrência de fato raro na Justiça Militar, ou seja, um graduado foi condenado por ter se insubordinado contra outro graduado, demonstrando-se assim que “a disciplina é a rigorosa observação e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento regular e harmônico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes desse organismo”, na exata acepção do parágrafo 2° do artigo 14, do Estatuto dos Militares. Bem por isso, o e. relator Min. Gen Ex Valdésio Guilherme de Figueiredo fez consignar de seu voto o seguinte: “creio tratar-se de uma decisão histórica pois é normal a condenação de praça por insubordinação a oficial; entretanto, neste caso, a insubordinação ocorreu entre praças, o que está a revelar o necessário resgate da autoridade do sargento”.