Este documento discute a importância de uma transição para uma economia verde e inclusiva para combater a pobreza, as desigualdades e as mudanças climáticas. Defende que os políticos devem apoiar atividades econômicas sustentáveis e colocar o bem-estar humano e ambiental acima dos interesses instalados. A Conferência de Paris sobre o clima é vista como uma oportunidade crucial para um acordo que limite o aquecimento global.
A Ciência (que) quer salvar a Humanidade – porque em breve será tarde demais
A Economia Verde e Inclusiva de Jorge Moreira, Revista O Instalador 235
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Opinião
AMBIENTE E ENERGIAS RENOVÁVEIS
A Economia Verde e Inclusiva
Já nos resta pouco tempo. Tempo para combater as alterações climáticas.
Tempo para garantir um crescimento verde, resiliente ao clima e sustentável.
Tempo para lançar uma revolução das energias limpas
.
Ban Ki-Moon
Texto_Jorge Moreira [Ambientalista]
Fotos_Arquivo
alterações climáticas. Todas estas Metas
encontram-se interligadas e a conse-
cução de uma traz benefícios para as
outras. De uma forma holística, estas
Metas impulsionam a atual sociedade,
sustentada por uma economia com resul-
tados ambientais dramáticos e submissa
a interesses financeiros autistas, para um
modelo económico verde e inclusivo, que
No passado mês de setembro, na cimeira
das Nações Unidas sobre o desenvolvi-
mento sustentável, foram definidas as 17
Metas Globais de ação até 2030. Uma
agenda trabalhada por governos e ONG
de todo o mundo que tenciona acabar
com a pobreza, promover a prosperidade
e o bem-estar de todos os seres huma-
nos, proteger o ambiente e combater as
recoloque cada ser humano no cerne
das preocupações e em harmonia com o
ambiente.
Pelo menos desde 1990 assistimos a uma
redução da extrema pobreza nos países
em desenvolvimento. Contudo, este
flagelo é inadmissível no século XXI, face
ao imenso luxo e desperdício observado
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como os restantes 99% e a situação
agravou-se substancialmente durante a
crise económica. Da mesma forma, con-
tinua-se a assistir à exploração exaustiva
dos recursos naturais, à degradação
generalizada da qualidade do ar, água e
solos e ao aquecimento global antropo-
génico. Só com uma economia verde e
inclusiva é possível minorar os impactes
ambientais das atividades económicas,
libertar cidadãos reféns de corporações
que exploram desenfreadamente capital
humano e natural e empoderar pessoas
em atividades económicas sustentáveis.
Uma economia verde e inclusiva significa
uma economia sustentável, equitativa,
resiliente, ecoeficiente, limpa, descar-
bonizada, responsável, justa, circular
e intergeracional. Capaz de criar pros-
peridade económica e bem-estar para
todos os seres humanos e, ao mesmo
nos países desenvolvidos e, infelizmente,
há ainda um enorme percurso até con-
seguirmos eliminá-la por completo. Haja
vontade real! Paralelamente, a iniquidade
continua a existir mesmo onde se verifi-
cou um acentuado progresso perante os
níveis de pobreza. Este facto deve mere-
cer especial atenção por parte de todos
nós, porque o rendimento laboral é mui-
tas vezes sinónimo de exploração. Mas,
engana-se quem imagina uma estrada
completamente desimpedida, que leva os
mais pobres ao sucesso socioeconómi-
co. O aumento significativo da população
mundial, as políticas económicas cen-
tradas nas minorias ricas, as alterações
climáticas e a degradação dos serviços
de ecossistema são barreiras bem difí-
ceis de superar pelos mais vulneráveis.
E, segundo um relatório sobre a riqueza
mundial divulgado pelo Crédit Suisse, 1%
da população mundial tem tanto dinheiro
tempo, preservar e recuperar a natureza.
Incentiva a governança, envolvendo e
capacitando todos os cidadãos, mesmo
os menos qualificados, em atividades
económicas conscientes e eticamente
cuidadas, sem esquecer as gerações
futuras de poderem usufruir dos mes-
mos recursos e dos melhores serviços
ecossistémicos.
Uma economia verde e inclusiva não é
compatível com a perpetuação do modelo
vigente centrado no lucro per si, no poder
centralizado e nos combustíveis fósseis.
Depois de garantidas as justas remune-
rações e o bem-estar dos colaboradores,
o lucro deve ser q.b. para permitir a inves-
tigação e o desenvolvimento salutar da
empresa. Também não é conciliável com
a exploração de seres humanos pobres
ou em idade escolar (segundo os parâ-
metros dos países industrializados), onde
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a atividade é, em muitos casos, altamente
nociva e realizada em ambientes degra-
dados. Da mesma forma, o verde não é
consociável com a poluição ou a emissão
maciça de gases com efeito de estufa, o
colapso dos stocks naturais, o sofrimento
animal e o ecocídio. Nem tampouco com
consumos e resíduos elevados. Assim,
a economia verde e inclusiva deve ser
capaz de fornecer bens e serviços social
e ecologicamente cuidadosos a um preço
justo. Isto é: incluir o valor real do trabalho
humano e a raridade na natureza; ter em
conta os consumos energéticos e da
água; o uso eficiente dos recursos natu-
rais; o tratamento efetivo dos resíduos de
produção e outros elementos/compostos
danosos para o ambiente; incluir produ-
tos, cujos resíduos no fim do ciclo de vida
sejam reaproveitados na elaboração de
novos e nunca serem de obsolescência
programada. Por conseguinte não se
trata de colocar o marketing a funcionar,
esverdear uma componente do processo
e colocar um bem ou serviço como verde
e inclusivo, como se verifica na maior
parte dos casos. Trata-se de munir os
agentes económicos micros e macros
de um conjunto complexo de elementos
com cuidados socioambientais efetivos
que desemboque no verdadeiro desen-
volvimento sustentável. Um desenvolvi-
mento que evidencie o que de melhor a
humanidade pode ser, desconstruindo
um desenvolvimento tecnocrata gélido
abstraído do bem-estar de cada ser
humano. Não confundir o abandono da
técnica, que deve estar ao serviço de um
mundo humano e natural adorável, belo,
limpo e saudável. Um mundo democráti-
co, pacífico, solidário, movido a energias
renováveis, com o florescimento sadio da
natureza silvestre, com cidades inteligen-
tes focadas no bem-estar integral e uma
agricultura segura, saudável, eticamente
correta e em consonância com os ciclos
naturais.
Alguns exemplos de economia verde utili-
zam estruturas naturais para filtrar a água
ou removeram poluentes sem recorrerem
a técnicas industriais, que têm muitas
vezes impactos e consumos elevados. A
engenharia natural recupera rios e solos
com o recurso a materiais e mão de obra
local. Comunidades autossustentadas,
técnicas de agricultura biológica para
comércio local, empresas ecoeficientes
com produção de bens saudáveis para o
ser humano e a natureza, ecoresorts e fi-
nanceiras que incluam políticas socioam-
bientais exigentes e compensem clientes
com comportamentos ecológicos, são
Há ainda um enorme percurso até conseguirmos eliminar a pobreza por completo
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alguns exemplos considerados. Lamen-
tavelmente, todas as atividades reconhe-
cidas têm de ter a respetiva certificação
verde, o que traz custos adicionais aos
bens e produtos com cuidados ambien-
tais especiais. Não se trata de estar con-
tra às certificações, que além de criarem
emprego e dinamizarem a economia
verde, dão garantias ao consumidor final.
Contudo, não deveriam ser as entidades
com atividades insustentáveis a terem
certificação e pagarem por isso? Então,
não é que as atividades económicas que
prestam um excelente serviço social e
ambiental ainda têm de pagar por serem
boas? O ónus encontra-se invertido.
Certamente que ao aplicarem-se taxas às
atividades descuidadas, elas acabariam
por mudar as suas políticas de produ-
ção. Outra incongruência da economia
tradicional é dar valor a um conjunto de
árvores mortas e (quase) nenhum valor a
uma floresta viva, capaz de proporcionar
serviços de ecossistema que suportam
a vida, regulam o clima, armazenam a
água, purificam o ar, controlam pragas e
doenças e inspiram os nossos sentidos.
Falta associar um valor económico real
aos sistemas ecológicos que propor-
cionam serviços ambientais. Com esta
medida, muitos espaços naturais seriam,
obviamente, recuperados e preservados.
Todavia, esta medida deverá ser imple-
mentada até melhor solução, porque os
mecanismos económicos são os mesmos
da atualidade. E, embora o sistema seja
mais justo e equilibrado, na vida real não
devemos reduzir tudo a um valor econó-
mico. A vida de um ser senciente, um rio,
uma montanha ou uma floresta nativa não
têm preço. Estas coisas não podem ser
traduzidas pelo valor que uma só espécie
pode cegamente e interesseiramente dar.
A economia verde está na base do com-
bate à corrupção, à pobreza, à iniquidade
e às atividades antropogénicas nocivas
ao ambiente. A transição para uma
economia verde vai alavancar o emprego.
Novos postos vão ser criados face às
oportunidades e exigências técnicas
naturais, que irão exceder o número de
perdas de emprego daqueles que ainda
executam atividades insustentáveis.
Nestes casos, será necessário o inves-
timento na requalificação dos respetivos
colaboradores. As muitas oportunidades
de empregabilidade, a consequente viva-
cidade dos novos mercados verdes e o
eventual colapso da economia tradicional
mundial - perante as consequências das
alterações e adaptações climáticas (se
nada for feito) - deverão ser argumentos
mais que suficientes para uma viragem
do paradigma político e económico.
Portanto, quando os políticos apoiam
certos programas com grande impacte
ambiental em prol da economia e das
pessoas ou são incompetentes ou estão
em conivência com os promotores des-
ses programas. Da mesma forma, a crise
económica não deve servir para baixar
o nível da exigência ambiental. Os polí-
ticos devem perder o medo das políticas
ambientais, porque só estas garantem
um futuro para a humanidade. Devem
combater a inércia dos interesses insta-
lados e abrirem-se à ecoinovação para
salvarem a Terra. Eles terão agora uma
excelente oportunidade para mostrarem
ao mundo que podem fazer a diferença
- reaproximar a economia das pessoas e
colocá-la em harmonia com a natureza.
Na Conferência das Partes da Conven-
ção-Quadro das Nações Unidas sobre
as Alterações Climáticas, a realizar-se em
Paris, no final deste mês e início do próxi-
mo, os políticos e líderes mundiais terão
um desafio sem precedentes: um acordo
internacional para conter o aquecimento
global abaixo de 2°C. Esta meta implica
o recurso a políticas orientadas para a
economia verde e inclusiva. Faço votos
que o acordo seja alcançado.
Paz a todos os seres