2. Quando um poeta descreve a
Lua, suas impressões se dispõem de maneira
especial, conforme a subjetividade de suas
sensações.
3. Quando um cientista descreve o mesmo
objeto, submete-o à interpretação
informativa, impessoal e científica. Assim, a
Lua, que para o poeta seria “uma inspiração
romântica”, para o cientista é “o
satélite natural da Terra”.
4. Dessa forma, temos as funções da linguagem
que apontam o direcionamento da mensagem
para um ou mais elementos do circuito
da comunicação.
5. Qualquer produção discursiva, linguística
(oral ou escrita) ou extralinguística (pintura,
música, fotografia, propaganda, cinema,
teatro etc.) apresenta funções da linguagem.
9. O elemento que conduz o discurso para o
receptor é o canal (no nosso caso, o canal é o
papel).
10. Os fatos, os objetos ou imagens, os juízos ou
raciocínios que o emissor expõe ou sobre os
quais discorre constituem o referente.
11. A língua que o emissor utiliza (no nosso
caso, obrigatoriamente, a língua portuguesa)
constitui o código.
12. Assim, através de um canal, o emissor
transmite ao receptor, em um código comum,
uma mensagem, que se reporta a um
contexto ou referente.
13. Nesse mecanismo, temos:
Num CONTEXTO, o EMISSOR (codificador)
elabora uma MENSAGEM, através de
um CÓDIGO,
veiculada por um CANAL para um
RECEPTOR (decodificador).
14. A ênfase num elemento do circuito de
comunicação determina a função de
linguagem que lhe corresponde:
15. ELEMENTO DA COMUNICAÇÃO FUNÇÃO DA LINGUAGEM
CONTEXTO REFERENCIAL
EMISSOR EMOTIVA
RECEPTOR CONATIVA
MENSAGEM POÉTICA
CÓDIGO METALINGUÍSTICA
CANAL FÁTICA
16.
17. Evidencia o assunto, o objeto, os fatos, os
juízos. É a linguagem da comunicação. Faz
referência a um contexto, ou seja, a uma
informação sem qualquer envolvimento de
quem a produz ou de quem a recebe. Não há
preocupação com estilo; sua intenção é
unicamente informar.
18. É a linguagem das redações escolares,
principalmente das dissertações, das
narrações não-fictícias e das descrições
objetivas. Caracteriza também o discurso
científico, o jornalístico e a correspondência
comercial.
19. Exemplo:
Todo brasileiro tem direito à aposentadoria. Mas
nem todos têm direitos iguais. Um milhão e meio
de funcionários públicos, aposentados por regimes
especiais, consomem mais recursos do que os
quinze milhões de trabalhadores aposentados pelo
INSS. Enquanto a média dos benefícios aos
aposentados do INSS é de 2,1 salários mínimos, nos
regimes especiais tem gente que ganha mais de
100 salários mínimos.
(Programa Nacional de Desestatização)
20. Quando há ênfase no emissor (lª pessoa) e na
expressão direta de suas emoções e atitudes,
temos a função emotiva, também chamada
expressiva ou de exteriorização psíquica.
21. Ela é linguisticamente representada por
interjeições, adjetivos, signos de pontuação
(tais como exclamações, reticências) e
agressão verbal (insultos, termos de baixo
calão), que representam a marca subjetiva de
quem fala.
22. Exemplo:
Oh? como és linda, mulher que passas
Que me sacias e suplicias
Dentro das noites, dentro dos dias?
(Vinícius de Moraes)
23. Observe que em “Luís, você é mesmo um
burro!”, a frase perde seu caráter informativo
(já que Luís não é uma pessoa transformada
em animal) e enfatiza o emotivo, pois revela o
estado emocional do emissor.
24. As canções populares amorosas, as novelas e
qualquer expressão artística que deixe
transparecer o estado emocional do emissor
também pertencem à função emotiva.
25. Não adianta nem tentar
Me esquecer
Durante muito tempo em sua vida
Eu vou viver
(Roberto Carlos & Erasmo Carlos)
26. Sinto que viver é inevitável. Posso na
primavera ficar horas sentada filmando,
apenas sendo. Ser às vezes sangra. Mas não
há como não sangrar pois é no sangue que
sinto a primavera. Dói. A primavera me dá
coisas. Dá do que viver E sinto que um dia na
primavera é que vou morrer. De amor
pungente e coração enfraquecido.
(Clarice Lispector)
27. É aquela que busca mobilizar a atenção do
receptor, produzindo um apelo ou uma
ordem.
28. Pode ser:
volitiva, revelando assim uma vontade (“Por
favor, eu gostaria que você se retirasse.”)
ou imperativa, que é a característica
fundamental da propaganda.
29. Encontra no vocativo e no imperativo sua
expressão gramatical mais autêntica.
30. Exemplos:
◦ Antônio, venha cá!
◦ Compre um e leve três.
◦ Beba Coca-Cola.
◦ Se o terreno é difícil, use uma solução
inteligente: Mercedes-Benz.
31. Se a ênfase está no canal, para checar sua
recepção ou para manter a conexão entre os
falantes, temos a função fática. Nas fórmulas
ritualizadas da comunicação, os recursos
fáticos são comuns.
33. Observe os recursos fáticos que, embora
característicos da linguagem oral,
ganham expressividade na música:
34. Alô, alô marciano
Aqui quem fala é da Terra.
(Rita Lee & Roberto de Carvalho)
35. Blá, Blá, Blá, Blá, Blá
Blá, Blá, Blá, Blá
Ti, Ti, Ti, Ti, Ti,
Ti, Ti, Ti, Ti
Tá tudo muito bom, bom!
Tá tudo muito bem, bem!
(Evandro Mesquita)
36. A função metalinguística visa à tradução do
código ou à elaboração do discurso, seja ele
linguístico (a escrita ou a oralidade), seja
extralinguístico (música, cinema, pintura,
gestualidade etc. — chamados códigos
complexos).
37. Assim, é a mensagem que fala de sua própria
produção discursiva. Um livro convertido em
filme apresenta um processo de
metalinguagem, uma pintura que mostra o
próprio artista executando a tela, um poema que
fala do ato de escrever, um conto ou romance
que discorre sobre a própria linguagem são
igualmente metalinguísticos. O dicionário é
metalinguístico por excelência.
38. Exemplos:
— Foi assim que sempre se fez. A literatura é a
literatura, Seu Paulo. A gente discute, briga, trata de
negócios naturalmente, mas arranjar palavras com
tinta é outra coisa. Se eu fosse escrever como falo,
ninguém me lia.
(Graciliano Ramos)
39. A palavra é o homem mesmo, Estamos feitos
de palavras. Elas são a única realidade ou, ao
menos, o único testemunho de nossa
realidade.
(Octávio Paz)
40. Lutar com palavras é a luta mais vã. Entanto
lutamos mal rompe a manhã.
(Carlos Drummond de Andrade)
41. “Anuncie seu produto: a propaganda é a arma
do negócio.” Nesse exemplo, temos a função
metalinguística (a propaganda fala do ato de
anunciar), a conativa (a expressão aliciante do
verbo anunciar no imperativo) e a poética (na
renovação de um clichê, conferindo-lhe um
efeito especial).
42. Quando a mensagem se volta para seu
processo de estruturação, para os seus
próprios constituintes, tendo em vista
produzir um efeito estético, através de
desvios da norma ou de combinatórias
inovadoras da linguagem, temos a função
poética, que pode ocorrer num texto em
prosa ou em verso, ou ainda na fotografia, na
música, no teatro, no cinema, na pintura.
43. Enfim, em qualquer modalidade discursiva
que apresente uma maneira especial de
elaborar o código, de trabalhar a palavra.
44. Que não há forma de pensar ou crer
De imaginar sonhar ou de sentir
Nem rasgo de loucura
Que ouse pôr a alma humana frente a frente
Com isso que uma vez visto e sentido
Me mudou, qual ao universo o sol
Falhasse súbito, sem duração
No acabar..
(Fernando Pessoa)
45. Pois então tu mataste o Jaguadarte!
Vem aos meus braços, homenino meu!
Oh dia fremular! Bravooh! Bravarte!
Ele se ria jubileu.
Era briluz. As lesmolisas touvas
Roldavam e relvian nos gramilvos.
Estavam mimsicais as pintalouvas
E os momirratos davam grilvos.
(Lewis Carrol, traduzido por Augusto de
Campos.)