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Introdução 
Seções plenárias – Sessões Plenárias 
Reuniões de Comitê – Comissões Parlamentares 
O modelo deliberativo da democracia foi desenvolvido 
inicialmente em um nível filosófico normativo1. Muitas 
alegações foram feitas sobre os antecedentes favoráveis e as 
consequências benéficas de um grau de deliberação elevado. Nos 
últimos anos, algumas dessas alegações foram submetidas a 
testes empíricos. Neste livro, ocupo-me da interação entre os 
aspectos normativos e empíricos da deliberação. Naturalmente, 
os dados empíricos não podem resolver problemas normativos, 
mas podem trazer novas luzes sobre tais questões. Eu venho do 
mundo empírico, portanto não pretendo escrever como um 
filósofo profissional. Ao invés disso, adotarei a perspectiva de um 
cidadão engajado no sentido da acepção no francês para citoyen 
engagé. Iniciarei meu posicionamento normativo não com 
premissas filosóficas definitivas. Antes, prosseguirei com 
reflexões pragmáticas sobre o que os resultados empíricos podem 
significar para o papel da deliberação em uma democracia viável. 
Permita-me esclarecer já de partida que não penso que a 
democracia viável deva consistir meramente em deliberação. 
Portanto, o conceito de democracia deliberativa no título deste 
livro não significa que esta forma de democracia consista 
unicamente em deliberação: significa simplesmente que a 
1 De acordo com algumas leituras, Aristóteles já havia formulado um argumento 
deliberativo normativo; ver, por exemplo, James Lindley Wilson, "Deliberation, 
Democracy, and the Rule of Reason in Aristotle's Politics," Amer ican Pol i t ica l 
Science Review 105 (2011), 259-74. 
1
2 
deliberação desempenha um papel importante. Além da 
deliberação, a democracia viável deve ter espaço, em particular, 
para eleições competitivas, trocas estratégicas, votos 
agregadores e protestos nas ruas. A chave é encontrar a 
combinação certa de todos esses elementos, e isso dependerá do 
contexto. Argumento que, nessa combinação, o papel da 
deliberação frequentemente não é forte o bastante e precisa ser 
fortalecido. 
Mais especificamente, a análise empírica deve permitir 
responder a perguntas como as seguintes: Até que ponto e sob 
quais circunstâncias normas e valores privilegiados pelos teóricos 
da deliberação podem ser colocados em prática? Existem trocas 
entre os vários elementos da deliberação de tal maneira que, 
uma vez postas em prática, certos elementos permaneçam em 
tensão com os demais? Até onde é possível melhorar a 
viabilidade da deliberação? A deliberação é compatível com 
outras metas valiosas? Quais são os custos de oportunidade da 
deliberação? Maiores graus de deliberação significam redução de 
resultados? Que relação causal se estabelece entre a deliberação 
e resultados da política? Quais são os modelos democráticos 
alternativos à deliberação? Se obtivermos boas respostas para 
tais questões, será mais fácil formular um juízo de como os 
princípios morais privilegiados pelos teóricos da deliberação 
deveriam ser aplicados no mundo real das políticas. Neste 
sentido, este livro deveria mostrar como a pesquisa empírica 
pode provocar reflexões sobre valores normativos. Tais reflexões 
são postuladas de maneira concisa por Thomas Saretzki, que 
escreve: "O que podemos e devemos tentar formular é uma 
reflexão crítica e uma concepção cooperativa dos aspectos 
empíricos e normativos da democracia deliberativa2". Nesse 
mesmo caminho, Michael A. Neblo et al. esperam que "muitos 
dos grandes avanços em nosso entendimento da deliberação 
provavelmente serão resultado do alinhamento cuidadoso entre 
questionamentos normativos e empíricos de uma forma que 
2 Thomas Saretzki, "From Bargaining to Arguing, from Strategic to Communicative 
Action? Theoretical Perspectives, Analytical Distinctions and Methodological 
Problems in Empirical Studies of Deliberative Processes," paper apresentado no 
Center for European Studies, University of Oslo, December 4, 2008, p. 38.
permita que ambos dialoguem entre si em termos mutuamente 
interpretáveis"3. Maija Setala postula ainda que os estudos dos 
filósofos da deliberação "deveriam ser empiricamente 
constrastáveis, já que fazem abstrações a partir do mundo real 
como se fossem experimentos"4. Simon Niemeyer alega que "a 
'chegada da era' da democracia deliberativa requer a interação 
entre insight teórico e pesquisa empírica"5. 
Se o mundo empírico não corresponde aos ideais normativos, 
poder-se-ia argumentar que o mundo empírico precisa ser 
modificado. Poder-se-ia ainda argumentar, entretanto, que os 
ideais normativos precisam ser ajustados ao mundo como ele é. 
Mostrarei que sempre há tensão entre os ideais deliberativos e a 
práxis da deliberação. E é exatamente em torno dessa tensão se 
organiza este livro. Para dar conta da interação entre as questões 
normativas e empíricas mais visíveis, cada capítulo está 
organizado em três seções. As primeiras seções abordam a 
literatura da deliberação baseada na filosofia normativa. Não se 
trata de oferecer uma visão geral introdutória da literatura, mas 
de apresentar as controvérsias mais importantes entre os 
teóricos da deliberação. Tendo sido educado inicialmente como 
historiador, permanecerei o mais próximo possível dos textos, 
deixando que os teóricos falem por suas próprias palavras. Nas 
segundas seções discuto a pesquisa empírica relevante para 
essas controvérsias, incluindo nossa própria pesquisa. Nas 
terceiras seções, discuto as possíveis implicações normativas, 
relacionando os dados empíricos às controvérsias filosóficas. 
(a) O modelo teórico da deliberação 
Na literatura filosófica, o modelo deliberativo da democracia é 
comumente construído como ideal "regulatório", algo que, de 
3 Michael A. Neblo, Kevin M. Esterling, Ryan P. Kennedy, David M.J. Lazer, and Anand 
E. Sokhey, "Who Wants to Deliberate: And Why?," Amer ican Pol i t ica l Science 
Review 104 (2010), 566. 
4 Maija Setala and Kaisa Herne, "Normative Theory and Experimental Research in 
the Study of Deliberative Mini-Publics," paper presented at the Workshop on the 
Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 
5 Simon Niemeyer, "Deliberation and the Public Sphere: Minipublics and 
Democratization," paper apresentado no Workshop on Unity and Diversity in 
Deliberative Democracy, University of Bern, October 4, 2008, p. 2. 
3
4 
acordo com Jane Mansbridge, "é impossível de ser alcançado em 
sua plenitude, mas que permanece como ideal ao qual, 
mantendo-se as condições, poder-se-ia considerar uma prática 
determinada mais ou menos próxima"6. Esta perspectiva segue 
Immanuel Kant, que define "princípio regulatório" como um 
padrão "com o qual podemos nos comparar, julgando-nos e, 
portanto, aprimorando-nos, mesmo que nunca possamos 
atingi-lo7". Jürgen Habermas escreve no contexto das 
"pressuposições da pragmática do discurso"8. O tipo ideal de 
deliberação pode ser melhor compreendido se comparado com o 
tipo ideal de troca estratégica. No mundo real da política, 
predomina comumente uma mistura dos dois tipos ideais (Obs: 
Lili- tipo ideal da pragmática do discurso e tipo ideal de 
troca estratégica). Antes de abordarmos os tipos mistos, seria 
útil do ponto de vista conceitual apresentar primeiramente os 
dois tipos ideais. No tipo ideal da troca estratégica, os atores 
políticos têm preferências fixadas. Eles sabem o que querem 
quando adentram o processo político. Fazem manobras para 
atingir resultados que estejam o mais próximo possível de suas 
preferências. Engajam-se na realização de acordos sob a máxima 
"se você me der isto, eu te darei aquilo". Para fortalecer suas 
posições nas trocas, podem trabalhar com promessas e ameaças. 
(Lili – isso é PODER, e não deliberação) Idealmente, a troca 
estratégica resulta em situações de equilíbrio em que as partes 
sempre ganham e nas quais, graças à negociação mutuamente 
benéfica, todos acabam numa situação melhor do que a que 
tinham antes. Em modelos sofisticados de troca estratégica, os 
atores não são necessariamente sempre egoístas. Eles podem 
também, por exemplo, se preocupar pelo bem-estar das futuras 
gerações como preferência pessoal. Se houver novos dados 
disponíveis, esses atores poderão também mudar suas 
6 Jane Mansbridge with James Bohman, Simone Chambers, David Estlund, Andreas 
Follesdal, Archon Fung, Christina Lafont, Bernard Manin, and José Luis Marti, "The 
Place of Self-Interest and the Role of Power in Deliberative Democracy," Journal of 
Pol i t i cal Phi losophy 18 (2010), 65, footnote 3. 
7 Immanuel Kant, Cr i t ique of Pure Reason, ed. Paul Guyer and Allen W. Wood 
(New York: Cambridge University Press, 1998 [1781]), p. 552. 
8 Jürgen Habermas, On the Pragmat i cs of Communicat ion (Cambridge: 
Polity Press, 1998).
preferências. Novas pesquisas sobre os perigos de dirigir carros, 
por exemplo, podem mudar a preferência dos atores para que se 
abandonem os carros e se utilizem, em substituição, o transporte 
público. Nesses modelos sofisticados de troca estratégica, a base 
continua sendo a orientação dos atores por suas preferências 
individuais, independentemente de quais sejam essas 
preferências. 
Em contraposição, no tipo ideal da deliberação as 
preferências não estão fixadas, mas abertas, e os atores estão 
dispostos a ceder à força do melhor argumento. O importante no 
debate político é o quão convincente são os argumentos dos 
diferentes atores. Os atores tentam convencer os outros através 
de bons argumentos, mas também estão abertos a serem 
convencidos pelos argumentos dos demais. Portanto, ocorre um 
processo de aprendizagem no sentido de que os atores 
apreendem no debate comum quais são os melhores argumentos. 
Não está claro no começo quais são os melhores argumentos, 
mas espera-se que os melhores argumentos emirjam do diálogo 
mútuo. Neste sentido, os atores aprendem a pensar e a agir de 
novas maneiras. A deliberação pode produzir rupturas com 
o passado. Mansbridge resume a essência do modelo 
deliberativo de maneira sucinta: "Concluímos destacando que a 
'deliberação' não é uma simples conversa. Na situação ideal, a 
deliberação democrática rejeita o poder coercitivo no processo de 
toma de decisões. A tarefa central é a justificação mútua. 
Idealmente, os participantes do processo de deliberação estão 
engajados, com respeito mútuo, como cidadãos livres e iguais em 
busca de termos de cooperação justos."9 Esta definição se 
aproxima do significado inicial de deliberare no Latim, onde 
significa pesar, ponderar, considerar e refletir. Como assinala 
Robert E. Goodin, a deliberação nesses moldes pode também ter 
lugar individualmente na reflexão interna. Goodin considera que 
tal deliberação é particularmente frutífera antes e depois da 
deliberação em grupo10. Nessa mesma direção, Thomas Flynn e 
John Parkinson argumentam, da perspectiva da psicologia social, 
9 Mansbridge et al . , "The Place of Self-Interest," 94. 
10 Robert E. Goodin, Ref lect ive Democracy (Oxford University Press, 2003), p. 
38. 
5
6 
que a deliberação interna pode ser potencializada se confrontar 
deliberadores ideais imaginados11. Bernard Reber insiste de uma 
maneira especialmente enfática que a deliberação individual 
deveria ocorrer antes da deliberação em grupo, já que do 
contrário existe o risco de que a argumentação não seja coerente. 
Em primeiro lugar, os atores devem ter claro suas normas éticas 
para poderem se engajar com outros em processos de 
deliberação frutíferos.12 
Durante muito tempo o interesse acadêmico concentrou-se 
predominantemente no modelo de troca estratégica (Lobby, 
Advocacy etc). Mais recentemente, entretanto, o modelo 
deliberativo tem atraído mais a atenção. Alain Noël afirma: 
O estudo predominante da política foi o estudo dos interesses, instituições 
e da força, com foco nas trocas e no poder, com alguma atenção 
ocasional para as ideias, consideradas como variáveis intervenientes. Nos 
últimos anos, o estudo da deliberação democrática retomou uma 
compreensão mais tradicional da política como fórum no qual ideias e 
argumentos são trocados, evoluem ao longo do tempo e são importantes 
em si mesmas.13 
Ainda há muitos cientistas políticos que insistem em que a 
política se resume a trocas estratégicas. Como formular um caso 
no qual a deliberação não seja simplesmente um conceito 
filosófico ideal, mas de fato presente no mundo real da política? 
Deixe-me exemplificar esta questão com o conflito da Irlanda do 
Norte, especificamente com o Acordo de Belfast de 1998 e sua 
implementação. Ian O'Flynn oferece a seguinte interpretação: 
No fundo, os nacionalistas irlandeses o endossaram porque o acordo 
acolheu a promessa de unificação da Irlanda, enquanto que os unionistas 
britânicos o endossaram porque acolhia a melhor oportunidade de 
reconciliação dos nacionalistas com a união. A importância do acordo, 
11 John Parkinson and Thomas Flynn, "Deliberation, Team Reasoning, and the 
Idealized Interlocutor: Why It May Be Better to Debate with Imagined Others," paper 
presented at the Workshop on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. 
Gallen, 12 April 12-17, 2011. Bernard Reber, "Les risques de l'exposition à la deliberation des autres," 
Ar chi ves de phi losophie du droi t 54 (2011), 261-81. 
13 Alain Noël, "Democratic Deliberation in a Multinational Federation," Cr i t i cal 
Review of Internat ional Social and Pol i t ica l Phi lo sophy 9 (2006), 432.
contudo, é que ambos conjuntos de aspirações são sustentados por 
um compromisso compartilhado de princípios de 
autodeterminação, igualdade democrática, tolerância e respeito 
mútuo. São esses princípios que conferem ao acordo legitimidade 
aos olhos dos cidadãos comuns e da comunidade internacional, e 
que sustentam a esperança pela paz e estabilidade duradoura14. 
Como O'Flynn sabe que não apenas poder e interesses, mas 
também a deliberação com tolerância e respeito mútuo 
desempenharam seu papel? Ele mergulhou no processo de 
decisão, estudando documentos e conduzindo entrevistas. Outros 
acadêmicos, entretanto, baseando-se em fontes semelhantes, 
vêm apenas interesses e poder em jogo15. Quem está com a 
razão? Penso que nenhum dos dois lados pode provar seus 
argumentos de maneira definitiva. Toda análise dependerá 
sempre da visão de mundo de quem a conduz, e a maneira 
como cada um de nós vê o mundo depende em grande 
parte de como fomos socializados. Alguns dispõem de 
esquemas cognitivos que os levam a ver as políticas 
puramente como um jogo de poder. Para outros, os esquemas 
cognitivos funcionam de tal forma que também vêm a 
deliberação em jogo. Não estou dizendo que o axioma da política 
como um puro jogo de poder não seja plausível. Simplesmente 
considero plausível o axioma de que a política não é unicamente 
um puro jogo e poder. Enquanto escrevia este livro, li a 
autobiografia de Nelson Mandela. Fiquei impressionado ao ver 
que no capítulo da conclusão ele oferece uma visão de mundo 
segundo a qual o coração humano está aberto para os outros: 
Eu sempre soube que no fundo do coração humano existe 
misericórdia e generosidade. Ninguém nasce odiando 
outra pessoa por causa da cor da pele, antecedentes ou 
religião. As pessoas devem aprender a odiar, e se podem 
aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o 
amor emerge no coração humano com maior 
14 Ian O'Flynn, "Divided Societies and Deliberative Democracy," Br i t i sh Journal 
of Pol i t i cal Science 37 (2007), 741. Ver também Ian O'Flynn, Del iberat i ve 
Democracy and Divided Societ ies (Edinburgh University Press, 2006). 
15 Ver, por exemplo, alguns artigos em Rupert Taylor (ed.), Consociat ional 
Theory: McGar ry and O'Leary and the Nor thern I reland Conf l ict 
(London: Routledge, 2009). 
7
naturalidade do que seu oposto. Mesmo nos momentos 
mais sombrios na prisão, quando meus camaradas e eu 
fomos levados até nossos limites, eu ainda via um 
lampejo de humanidade nos guardas, talvez apenas por 
um segundo, mas o suficiente para me tranquilizar e me 
manter vivo. A bondade do homem é uma chama que 
pode ser ocultada, mas nunca extinguida 16. 
Essa visão de mundo de Mandela é precisamente o tipo de visão 
sobre a qual a pesquisa da deliberação foi construída. Ainda que 
Mandela tenha sido tratado com crueldade pelos guardas brancos 
na prisão, ele foi capaz de ver neles, em algumas ocasiões, um 
lampejo de humanidade. Ele nunca desistiu completamente da 
chama da bondade humana. Concordo com Mandela em que essa 
chama permanece muitas vezes oculta, sem que possa ser 
completamente extinguida. A esperança nessa chama é a 
base de um programa de pesquisa gratificante, pelo 
menos para mim e para muitos dos meus colegas teóricos 
da deliberação. 
Como Mauro Barisione me mostrou17, é na base do modelo 
deliberativo que as suposições devem permanecer abertas para 
serem desafiadas. Portanto, a suposição da bondade humana não 
pode ser tomada como uma meta-suposição não desafiável. Com 
isso, entretanto, a lógica da deliberação coloca em risco seus 
próprios fundamentos. Barisione certamente tem razão em 
destacar isto já que, de fato, um dos pressupostos básicos da 
deliberação é que tudo deve estar aberto para novos desafios. 
Minha resposta é que as agendas de pesquisa devem 
partir de algum pressuposto básico sobre a natureza 
humana, e o pressuposto da minha agenda é que, apesar 
de toda a maldade que há no mundo, ao menos alguns 
seres humanos têm, em algum momento, um senso de 
bondade que os leva realmente a se preocuparem pelo 
bem-estar dos demais. Aceito que outros pesquisadores não 
compartilhem esse pressuposto e criem suas próprias agendas de 
16 Nelson Mandela, Long Walk to Freedom (New York: Little, Brown and Company, 
1995), p. 622. 
17 Personal communication, July 30, 2011. 
8
pesquisa. Afinal de contas, a boa pesquisa se beneficia da 
competição, incluindo a competição por pressupostos básicos 
sobre a natureza humana. 
Tendo estabelecido por que faz sentido trabalhar com o modelo 
deliberativo, passarei agora a tratá-lo com maior detalhe. Em 
primeiro lugar, tratarei da questão do vocabulário. Alguns 
teóricos como Dennis F. Thompson18, Joshua Cohen19 e Claudia 
Landwehr e Katharina Holzinger20 utilizam o termo "deliberação" 
somente para fóruns nos quais é necessário tomar uma decisão, 
como comitês parlamentares, mas não, por exemplo, para 
discussões que ocorrem na televisão ou entre vizinhos. 
Mansbridge propõe "usar adjetivos para fazer uma distinção 
importante entre a deliberação em fóruns, empoderados para a 
toma de decisões vinculantes, e outras formas de decisão"21. Para 
situações nas quais é preciso tomar decisões vinculantes, ela 
sugere usar a expressão "deliberação empoderada". Para os 
casos em que não se busca a toma de decisões vinculantes, 
Mansbridge utiliza outras distinções com a ajuda de outros 
adjetivos, como "deliberação consultiva" para "fóruns 
empoderados somente para aconselhamento de uma autoridade 
decisória" ou "deliberação pública" para "fóruns abertos ao 
público, mas que não geram decisões vinculantes, como 
audiências públicas"22. Mansbridge utiliza ainda outros adjetivos 
para fazer outras distinções no campo da deliberação. Concordo 
com Thompson, Cohen, Landwehr, Holzinger e Mansbridge em 
que é necessário fazer distinções importantes. Prefiro, entretanto, 
18 Para Thompson, deliberação significa "discussão orientada à toma de decisão". 
Dennis F. Thompson, "Deliberative Democratic Theory and Empirical Political 
Science," Annual Review of Political Science 11 (2008), 503-4. 
19 Para Cohen, significa "ponderar as razões relevantes para tomar uma decisão 
com vistas a que a decisão esteja baseada na ponderação". Joshua Cohen, 
"Deliberative Democracy," in Shawn W. Rosenberg (ed.), Par t icipat ion and 
Democracy: Can the People Govern? (New York: Palgrave Macmillan, 
2200 07), p. 219. Claudia Landwehr and Katharina Holzinger, "Institutional Determinants of 
Deliberative Interaction," European Pol i t ica l Science Review 2 (2010), 
373-400. 
21 Jane Mansbridge, "Everyday Talk Goes Viral," paper presented at the annual 
meeting of the American Political Science Association, Washington, DC, September 
2-5, 2010. 
22 Mansbridge, "Everyday Talk Goes Viral." 
9
10 
usar o termo deliberação de forma genérica para depois 
caracterizar verbalmente os fóruns nos quais a deliberação 
ocorre. Quando escrevo, por exemplo, no capítulo 8, sobre 
a deliberação nos meios de comunicação, não uso a 
expressão "deliberação midiática". Ao invés disso, 
caracterizo o meio específico no qual estou interessado, 
como por exemplo, deliberação em jornais de elite, 
deliberação em jornais de boulevard ou deliberação na 
Internet. 
Uma vez esclarecidas essas questões terminológicas, passarei 
a tratar mais especificamente do modelo de deliberação em suas 
variadas expressões. Ainda que exista consenso entre os teóricos 
da deliberação sobre o princípio geral de que os argumentos 
deveriam ser importantes para a discussão política, existem 
desacordos bastante fortes em como esse princípio deveria ser 
implementado. Mansbridge assinala que esses desacordos 
tornaram-se maiores nos últimos anos23. Hoje, o conceito de 
deliberação é um conceito bastante fluido. Jensen Sass e 
John S. Dryzek vêm a deliberação como prática cultural 
"com significado e significância que variam 
substancialmente entre contextos e ao longo do tempo... 
Portanto, a forma como a deliberação é vista na América 
do Norte ou na Europa Ocidental difere muito da maneira 
como aparece em Botswana, Madagascar ou Iêmen"24. 
Dada tal variação, Sass e Dryzek consideram adequado 
não usar definições universais de deliberação, mas 
adaptar tais definições aos respectivos contextos 
históricos e culturais25. Com essa ampla orientação de 
pesquisa, não é de se surpreender que o desacordo a respeito da 
definição exata de deliberação seja cada vez maior. Farei uma 
aproximação geral breve a tais desacordos sobre definições, que 
23 Jane Mansbridge, "Recent Advances in Deliberative Theory," paper presentado no 
Max Weber Workshop on Deliberation in Politics na New York University, October 29, 
2010. 
24 Jensen Sass and John S. Dryzek, "Deliberative Cultures," paper presented at the 
Workshop on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 
12-17, 2011, p. 4. 
25 Sass and Dryzek, "Deliberative Cultures," p. 11.
serão discutidos posteriormente em maior detalhe nos 
respectivos capítulos. 
Um dos pontos de desacordo diz respeito a quão intensamente 
cidadãos comuns deveriam estar envolvidos no processo 
deliberativo. Por um lado está o argumento que defende que os 
cidadãos comuns deveriam participar tanto quanto possível dos 
processos deliberativos. Na vida diária, discutem-se assuntos 
políticos na família, entre amigos e vizinhos, no trabalho e em 
clubes e associações. Neste sentido, os cidadãos comuns são 
também atores políticos e deveria ser aplicado o princípio de que 
estão dispostos a serem convencidos pela força do melhor 
argumento. Portanto, no âmbito dos cidadãos, a formação de 
opiniões ocorre de maneira reflexiva. Essas opiniões decorrentes 
da reflexão são comunicadas aos líderes políticos através de 
diferentes canais como encontros pessoais, reuniões públicas, 
mídia e Internet. Por outro lado, alguns teóricos consideram que a 
participação de todos os cidadãos comuns no processo 
deliberativo é totalmente irrealista. De seu ponto de vista, seria 
mais realista esperar que todos os cidadãos tivessem a 
oportunidade de participar, sendo que na prática apenas um 
pequeno número de pessoas poderá participar 
regularmente das deliberações políticas, por exemplo em 
míni-públicos compostos aleatoriamente. 
Há ainda desacordo sobre a justificativa de argumentos para a 
deliberação: SE os argumentos precisam ser justificados de 
forma racional, lógica e elaborada ou se as narrativas das 
histórias de vida podem também servir como justificativas 
para a deliberação. Os argumentos apresentados de maneira 
racional, lógica e elaborada podem ser avaliados com base na 
lógica formal. Permitir somente argumentos racionais, lógicos e 
elaborados origina críticas de teóricos que argumentam que tal 
definição discrimina as pessoas que têm pouca habilidade em 
racionalização. Dado o espírito inclusivo do modelo de 
deliberação, essas pessoas também deveriam poder participar do 
processo político. Se há, por exemplo, uma reunião da direção de 
uma escola pública numa comunidade local, o fato de que os pais 
contem histórias sobre os graves problemas de consumo de 
drogas que seus filhos apresentam também deveriam contar 
11
12 
como justificativas deliberativas. Contar essas histórias pessoais 
envolverá muita emoção e empatia não autorizadas na 
aproximação puramente racional da deliberação. 
Há também desacordo sobre se, na deliberação, todos os 
argumentos devem dizer respeito ao interesse público ou se 
argumentos relacionados a interesses privados ou específicos de 
um grupo devem ser considerados. A qualidade do ar é um 
exemplo de interesse público, já que todos nos beneficiamos 
desse bem. Alguns teóricos argumentam que somente as 
questões de interesse público pertencem ao discurso deliberativo. 
Outros, contudo, incluiriam interesses individuais e grupais. Por 
exemplo, estabelecer padrões de qualidade do ar mais estritos 
geraria desemprego e provocaria sofrimento para os 
trabalhadores da indústria automobilística. Falando em termos 
gerais, não é fácil distinguir entre interesse público e interesse 
grupal. Interesses grupais como o dos trabalhadores da indústria 
automobilística podem atravessar as fronteiras nacionais, por 
exemplo entre os Estados Unidos e o Canadá. No que diz respeito 
a certos assuntos, vários países ou o mundo todo compartilham 
um interesse público comum. Portanto, os conceitos de interesse 
público e interesse grupal não podem ser considerados 
unicamente no interior das fronteiras dos estados nacionais. 
Qualquer argumento pode ser considerado na 
deliberação? Novamente, temos aqui desacordo. Alguns teóricos 
adotam a posição de que todos os argumentos, 
independentemente de parecerem ofensivos, devem ser 
ouvidos com respeito e tomados com seriedade. Uma crítica 
a essa posição é que se um dado argumento viola os direitos 
humanos fundamentais, seu mérito não deveria ser considerado 
de forma alguma. Se alguém oferecer, por exemplo, um 
posicionamento racista, seu argumento não deveria ser discutido 
por princípio porque viola um direito humano fundamental. Ainda 
que tal posicionamento não deva ser discutido, poder-se-ia ainda 
argumentar que existe obrigação de justificar por que se trata de 
um posicionamento racista e, portanto, sua discussão fica vetada. 
Outro ponto de desacordo diz respeito a se a deliberação 
necessariamente deve terminar em consenso. Por um lado, 
existe a expectativa de que pessoas razoáveis
conseguirão entrar em acordo sob a força de diferentes 
argumentos, de forma que o consenso seria um resultado 
natural. Esta visão está baseada no pressuposto de que por trás 
das preferências individuais existe um núcleo básico de 
racionalidade evidente para o indivíduo quando somente as 
habilidades de raciocínio são utilizadas. Portanto, o consenso 
deveria ser construído sobre as mesmas razões. Uma forma mais 
branda de entender a argumentação para consenso é que os 
atores podem ter diferentes razões para chegar ao consenso. Por 
outro lado, existe também a visão que defende que certos valores 
profundamente assentados podem vir a ser tão irreconciliáveis 
que, apesar de todas as referências à racionalidade, não serão 
possíveis ou nem mesmo desejáveis. Existe também, contra a 
ideia de consenso, o argumento pragmático que considera que as 
limitações de tempo frequentemente impossibilitam que a 
conversa siga até que todos estejam de acordo. Em algumas 
ocasiões é preciso recorrer à votação, colocando-se assim parte 
dos participantes numa minoria. A chave para a deliberação é 
que as opiniões das minorias perdedoras sejam tratadas com 
respeito e devidamente consideradas. É também importante que 
as decisões sejam consideradas, na maior parte, falíveis, e 
possam ser retomadas mais adiante quando novas informações e 
novos argumentos surgirem. 
Para alguns teóricos, a boa deliberação pressupõe 
transparência e abertura aos olhos públicos, enquanto que outros 
teóricos destacam que sob certas condições, a deliberação pode 
se beneficiar de discussões nos bastidores que possam ser mais 
sérias e menos apoteóticas. Tais teóricos apontam também que a 
deliberação nos bastidores pode auxiliar na deliberação posterior 
sob os olhos públicos. 
Os teóricos também discordam a respeito da importância da 
sinceridade na deliberação. Alguns não estão muito interessados 
em saber por que alguém se engaja na deliberação. O que 
importa, de acordo com esta visão, é se os participantes mostram 
respeito pelos argumentos dos demais, independentemente de se 
esse respeito é oferecido de forma sincera ou não. Em contraste, 
outros teóricos vêm na sinceridade o elemento chave da 
deliberação. A deliberação não verdadeira seria tão somente uma 
13
14 
estratégia retórica inteligente. Demonstrar respeito pelos 
argumentos dos demais poderia simplesmente ser mais um entre 
outros interesses particulares. Isso eliminaria a essência da 
deliberação, que também possui um valor intrínseco importante 
para a auto-atualização, e esse valor poderia ser negado pela 
falta de sinceridade. 
Espero que este livro traga alguma luz para essas controvérsias 
presentes na literatura teórica sobre deliberação. É certamente 
possível que os dados empíricos a serem apresentados não 
resolvam as controvérsias. A maneira como alguém define um 
conceito dependerá de sua agenda de pesquisa e essa agenda, 
por outra parte, dependerá das normas de valores do 
pesquisador. Considerar, por exemplo, a narração de histórias 
como deliberação dependerá, entre outras coisas, da noção que 
essa pessoa tenha sobre racionalidade. Ainda que os dados 
empíricos não possam resolver tais controvérsias, podem ajudar a 
esclarecer as relações empíricas e causais entre os diferentes 
elementos da deliberação. Por exemplo, poderíamos dizer que 
uma justificativa lógica, racional e elaborada dos argumentos de 
alguém conduz a maior ou menor respeito pelos argumentos dos 
demais do que os argumentos justificados por uma história 
pessoal? Os dados empíricos podem também mostrar como os 
antecedentes e consequentes da deliberação podem variar 
dependendo da definição de deliberação. 
(b) Pesquisa empírica em deliberação 
Afinal de contas, quais são os dados empíricos que usarei para 
trazer à luz controvérsias normativas sobre o modelo de 
democracia deliberativa? Na literatura é possível encontrar dados 
de observação e experimentais. Em nosso grupo de pesquisa 
usamos ambos os métodos. Começamos com dados de 
observações de debates parlamentares na Alemanha, Suíça, 
Reino Unido e Estados Unidos. Essas análises foram discutidas em 
um livro anterior, publicado pela Cambridge University Press in 
200426. Para medir o grau de deliberação em ambas as 
26 Jürg Steiner, André Bächtiger, Markus Spörndli, and Marco R. Steenbergen, 
Del iberat i ve Pol i t ic s in Act ion: Analys ing Par l iamentary Di scour se 
(Cambridge University Press, 2005).
seções plenárias e reuniões de comitês desenvolvemos um 
índice que chamamos de Índice de Qualidade do 
Discurso (IQD, DQI em inglês), que cobria inicialmente os 
seguintes aspectos da deliberação (a forma como o IQD é 
empregado na prática será tratada em outro lugar27): 
1. participação no debate; 
2. grau de justificativa dos argumentos; 
3. conteúdo da justificativa dos argumentos; 
4. respeito demonstrado por outros grupos; 
5. respeito demonstrado pelas demandas de outros 
participantes; 
6. respeito demonstrado pelos contra-argumentos de 
outros participantes; 
7.mudanças de posição durante o debate. 
Os teóricos críticos e pós-modernos preocupam-se sobre qualquer 
tentativa de medir a qualidade da deliberação28. Eles 
argumentam que as medidas da deliberação nunca são objetivas, 
mas sempre interpretações subjetivas. Não nego que nossa 
codificação esteja sujeita à interpretação. Ao longo da 
apresentação do IQD em nosso livro explicitamos claramente que 
"medir a qualidade do discurso requer interpretação. É necessário 
conhecer a cultura da instituição política, o contexto do debate e 
a natureza do assunto em discussão"29. A interpretação, para 
ser certeira, nunca pode obter objetividade absoluta. Não 
se trata de escolher entre objetividade e subjetividade. 
(Roberto Gondo – sobre a minha Subjetividade) Nenhum 
pesquisador sério das ciências sociais declarou ter alcançado a 
verdade objetiva. Todas as interpretações contêm elementos 
subjetivos, mas as interpretações não são todas iguais. Nem tudo 
27 André Bächtiger, Jürg Steiner, and John Gastil, "The Discourse Quality Index 
Approach to Measuring Deliberation," in Lyn Carson, John Gastil, Ron Lubenski, and 
Janette Hartz-Karp (eds.), The Aus t ral ian Ci t i zens ' Par l iament and the 
Future of Del iberat ive Democracy (College Park: Penn State University 
Press, forthcoming). 
28 Ver, por exemplo Martin King, "A Critical Assessment of Steenbergen et al.'s 
Discourse Quality Index," Roundhouse: A Journal of Cr i t ical Theory and 
Pract i ce 1 (2009), online: www.essl.leeds.ac.uk/roundhouse, pp. 
6-7. 
29 Steiner et al . , Del iberat i ve Pol i t ic s in Act ion, p. 60. 
15
16 
funciona. O critério para uma interpretação acadêmica frutífera é 
se é exitosa para a obtenção de algum grau de intersubjetividade, 
resultando em um grau suficiente de confiabilidade entre 
codificadores. É isso que obtemos em nossa pesquisa com o IQD. 
O IDQ sempre foi considerado um instrumento de medida 
flexível que precisa ser adaptado a projetos de pesquisa 
específicos. Sou a favor desse pluralismo em métodos de 
pesquisa, que correspondem a uma aplicação do discurso 
deliberativo sobre como fazer pesquisa em deliberação. É 
precisamente o lugar onde se dá a boa deliberação que 
ninguém no mundo diz observar com absoluta 
objetividade. Isso vale também para a pesquisa acadêmica em 
deliberação. 
Feita a tentativa de medir o grau de deliberação dos debates 
parlamentares, observamos as causalidades dos antecedentes e 
consequentes da variação no grau de deliberação. No que diz 
respeito aos antecedentes, estávamos interessados 
principalmente nos aspectos institucionais e examinamos as 
seguintes dimensões: 
1. instituições que favoreciam o consenso versus 
instituições que favoreciam a competição; 
2. atores de veto forte ou fraco; 
3. sistemas parlamentares e sistemas presidencialistas; 
4. primeiras e segundas câmaras parlamentares; 
5. arenas públicas e arenas não-públicas. 
Observamos também as questões substantivas em debate, 
colocando foco sobre a dimensão das questões polarizadas 
versus questões não polarizadas. No que diz respeito às 
consequências da variação no grau de deliberação, examinamos 
os aspectos formais e substantivos dos resultados da decisão. No 
aspecto formal, debruçamos nosso foco sobre se as decisões 
foram tomadas com unanimidade ou por voto majoritário. No 
aspecto substantivo, questionamos até que ponto os resultados 
da decisão correspondem ao critério de justiça social. 
Deixe-me agora descrever como organizaremos as seções 
empíricas em cada capítulo. No início da maior parte das seções 
empíricas, voltarei sobre nosso estudo anterior sobre debates
parlamentares, mas somente naquilo que os resultados 
mostraram sobre controvérsias filosóficas, ajudando-me a 
fundamentar minhas conclusões normativas. Depois continuo 
com uma ampla revisão da literatura empírica sobre deliberação. 
Portanto, levo em consideração todos os estudos que pude reunir 
nos quais o grau de deliberação é realmente medido e não 
meramente assumido. Tento oferecer, na medida do possível, 
uma revisão completa da pesquisa na qual o grau de deliberação 
é medido de forma suficientemente confiável e válida. Por 
necessidade, alguns países estão mais cobertos do que outros, e 
algumas dimensões conflitantes mais do que outras. Ao final da 
seção sobre dados empíricos, apresento resultados de 
experimentos recentes sobre deliberação que nosso grupo de 
pesquisa realizou na Colômbia, Bósnia-Herzegovina, Bélgica, 
União Europeia e Finlândia. 
Por que foram escolhidos justamente esses países? A 
maior parte da literatura empírica existente sobre 
deliberação provém de democracias estáveis tais como 
Alemanha, Holanda, França e Canadá. Esses dados empíricos são 
úteis para se pensar de maneira geral sobre a democracia 
deliberativa. Contudo, a deliberação se faz mais necessária 
justamente nos países profundamente divididos por conflitos 
militares internos. Naturalmente, é mais difícil obter deliberação 
nesses países. O máximo que se pode esperar, provavelmente, é 
que as pessoas queiram reconhecer que as posições adotadas ao 
outro lado da profunda divisão também são legítimas, ainda que 
não concordem com elas. Quando esse reconhecimento é 
obtido, o outro lado é humanizado, o que poderia tornar 
menos provável que alguém atirasse e matasse ao outro lado da 
profunda cisão. Se olharmos para o mundo atual, os verdadeiros 
pontos problemáticos são países profundamente divididos e 
envolvidos em conflitos militares internos. Minha esperança é que 
a aproximação deliberativa possa oferecer algo a esses países de 
forma que possam a aprender a lidar pacificamente com seus 
conflitos. Portanto, minha esperança está mais ligada aos 
cidadãos comuns do que a líderes políticos, que muitas vezes só 
estão interessados em manter cisões profundas para 
17
18 
permanecerem dos no nos spodoers. Aessstiumd,o so efosctoá no nível do cidadão. 
A Colômbia corresponde exatamente ao meu interesse de 
pesquisa, com combates militares em curso entre guerrilhas de 
esquerda e paramilitares de direita. Na Bósnia-Herzegovina, com 
cisões profundas entre servos, croatas e bósnios, a guerra civil 
acabou, mas suas consequências ainda são muito perceptíveis. 
Incluímos também a Bélgica, onde a divisão linguística entre 
flamengos e valões é cada dia maior, ainda que até o momento 
não tenha resultado em violência política. O caso da Bélgica é um 
caso limite para meu objetivo de pesquisa principal e será 
interessante ver até que ponto o grau de deliberação 
difere na Bélgica da Colômbia e da Bósnia-Herzegovina. 
Incluímos a Finlândia como um caso real de contraste, com 
pequenas divisões entre falantes de finlandês e sueco. A União 
Europeia, finalmente, é um caso interessante em si mesmo, com 
muitas guerras entre os países-membros no passado, e com 
relações ainda às vezes complicadas entre alguns membros na 
atualidade. 
Não apresentarei uma análise completamente detalhada 
dos nossos experimentos nesses quatro países e União 
Europeia, limitando-me ao que é útil para este livro 
orientado para o aspecto normativo. Um livro em 
coautoria, orientado à análise e intitulado Potential for 
Deliberation Across Deep Divisions (Potencial para 
deliberação aravés de cisões profundas) está sendo 
preparado. Os colaboradores de cada parte das pesquisas 
experimentais são: 
• Maria Clara Jaramillo (Colômbia); 
• Juan Ugarriza (Colômbia); 
• Simona Mameli (Bósnia-Herzegovina); 
• Didier Caluwaerts (Bélgica); 
• Marlene Gerber (Európolis); 
• Staffan Himmelroos (Finlândia). 
Por que escolhemos o método experimental? Um método de 
pesquisa possível teria sido usar sondagens perguntando às
pessoas o quão deliberativas elas são quando conversam sobre 
política na família, com amigos e vizinhos e no ambiente de 
trabalho. Tais sondagens introduzem o risco de que os 
participantes digam o que é socialmente desejável, ou seja, que 
eles são deliberativos quando falam de política mostrando, por 
exemplo, respeito pela opinião dos demais e vontade de acatar o 
melhor argumento. Tendo em vista o problema que isso 
representa para a pesquisa em questão, optamos pelo desenho 
experimental como método. Isso significa concretamente que 
reunimos cidadãos comuns para discutir sobre um tópico 
em particular. Os participantes tiveram que preencher 
questionários antes e depois dos experimentos. As 
discussões foram gravadas e codificadas com um IQD 
expandido que o leitor encontrará no Apêndice. Vejamos 
agora os desenhos de pesquisa utilizados nos cinco casos 
de teste. 
Desenho de pesquisa para a Colômbia 
Maria Clara Jaramillo e Juan Ugarriza foram responsáveis pela 
porção da pesquisa correspondente à Colômbia. Eles planejaram, 
inicialmente, desenvolver a pesquisa com estudantes 
universitários, o que do ponto de vista organizacional teria sido 
relativamente simples. Mas optaram por um desafio maior, onde 
a deliberação é particularmente mais difícil de ocorrer e, 
portanto, mais necessária. Encontraram esse desafio nos 
ex-combatentes do conflito armado interno. Ocorre que, 
quando Jaramillo e Ugarriza iniciaram sua pesquisa, o 
governo colombiano tinha um programa de desarticulação 
em andamento. Esse programa foi aplicado aos 
combatentes de grupos de guerrilha esquerdistas 
(particularmente as FARC, Fuerzas Armadas 
Revolucionarias de Colombia e alguns grupos de guerrilha 
menores) e das forças paramilitares de extrema direita. 
Estariam ex-combatentes que há pouco estavam dando 
tiros uns nos outros dispostos a participar juntos de 
experimentos sobre deliberação? Esse foi o desafio no 
início da pesquisa, que exigiu muita paciência, entusiasmo 
19
20 
e habilidade por parte de Jaramillo e Ugarriza para 
finalmente organizar 28 experimentos com um total de 
342 participantes. 
Para conseguir remuneração econômica, os ex-combatentes 
tiveram que participar de um programa de reintegração da 
Agência do Alto Comissariado para a Reintegração. Psicólogos e 
assistentes sociais agiram como orientadores e os 
ex-combatentes tiveram que participar duas vezes por mês de 
sessões de grupo com eles. Focamos nossa pesquisa na região da 
grande Bogotá, onde cerca de 3.000 ex-combatentes 
participavam do programa de reintegração. Eram, na maioria, 
homens com pouco grau de instrução. Inicialmente tentamos 
selecionar uma amostra aleatória para participação no estudo. 
Mas os orientadores nos advertiram sobre os problemas de 
segurança, já que muitos dos ex-combatentes estavam 
gravemente traumatizados e, portanto, eram violentos ou 
perturbados. Havia também um problema de motivação: na 
primeira fase da pesquisa, muitos ex-combatentes convidados 
para o estudo simplesmente não apareceram. Os orientadores 
nos ajudaram com uma solução que oferecia aos ex-combatentes 
os incentivos necessários para participar dos estudos. Eles 
poderiam substituir as sessões quinzenais pela participação em 
um único estudo e ainda receberiam a remuneração econômica. 
O fato de os estudos terem lugar nos consultórios dos 
orientadores também ajudou. Os orientadores permaneceram por 
perto para o caso de ocorrer alguma manifestação violenta. 
Graças à Agência do Alto Comissionado para a 
Reintegração, obtivemos dados aproximados sobre o total 
da população de 3000 ex-combatentes na região de 
Bogotá em termos de gênero, idade e grau de instrução. 
Para tais critérios, os 342 ex-combatentes que 
participaram dos estudos correspondiam, grosso modo, ao 
total da população de ex-combatentes da região de 
Bogotá30. Isso era reconfortante, apesar de que não podíamos 
30 Dos ex-combatentes participantes dos nossos experimentos, 15 por cento eram 
mulheres, em comparação com 16 por cento na população total de ex-combatentes 
na região de Bogotá. Cerca de 30 por cento dos participantes nos experimentos 
tinham entre 18 e 25 anos de idade, comparados com 37 por cento região de 
Bogotá. No que diz respeito à educação, é preciso diferenciar entre ex-guerrilheiros
afirmar que os ex-combatentes participantes correspondiam a 
uma amostra aleatória da população total de ex-combatentes. 
Quão grandes eram as diferenças entre os ex-guerrilheiros e 
ex-paramilitares que se voluntariaram para participar dos 
experimentos? Como hipótese nula, assumimos que não 
havia diferenças. Essa hipótese é até certo ponto plausível 
porque poderia ser que os ex-combatentes não estivessem 
ideologicamente orientados, mas estivessem 
simplesmente procurando por um trabalho remunerado e 
não se importariam com o lado ao qual teriam que se unir. 
Isso poderia ter sido fatal para os propósitos dos nossos 
estudos, já que estávamos interessados em estudar as 
discussões políticas através de cisões profundas. A 
hipótese nula pode ser rejeitada. Os ex-guerrilheiros 
estavam sobrerrepresentados no grupo de idade mais 
jovem e tinham também mais mulheres do que os 
ex-paramilitares. No que diz respeito ao grau de instrução e à 
classe social, os ex-guerrilheiros tinham menor grau de 
escolarização formal e eram mais pobres do que os 
paramilitares31. As grandes diferenças políticas existentes entre 
os dois grupos foi particularmente importante para a 
interpretação dos resultados. Os ex-guerrilheiros provinham 
em muito maior medida de famílias de esquerda, enquanto 
os ex-paramilitares provinham principalmente de famílias 
de direita. Dessa forma, o envolvimento dos ex-combatentes 
com um dos dois lados do conflito não ocorreu por acaso. O 
indicador mais claro das divisões ainda profundas entre os dois 
grupos veio à luz em resposta à pergunta sobre suas atitudes em 
relação aos combatentes que ainda lutam na selva. Ainda que os 
participantes dos experimentos tinha abandonado seus antigos 
camaradas, expressaram uma atitude mais positiva em relação 
ao seu próprio lado do que em relação ao outro. Isso não era 
necessariamente esperado, já que poderíamos imaginar que os 
e ex-paramilitares. Entre os ex-guerrilheiros participantes, 60 por cento tinham 11 
anos de escolaridade ou menos, para 64 por cento no total de ex-guerrilheiros em 
toda a região de Bogotá. No caso dos ex-paramilitares, os números ficam entre 41 e 
36 por cento. 
31 É preciso considerar, entretanto, que os ex-guerrilheiros receberam algum grau 
de educação informal durante o tempo em que permaneceram no campo. 
21
22 
ex-combatentes abandonaram as lutas porque não concordavam 
mais com a causa de seu lado. Ainda que alguns tenham deixado 
as lutas por isso, a maioria ainda tinha mais simpatia por seu 
próprio lado do que pelo outro. Provavelmente saíram das 
selvas porque já estavam fartos de lutar e se sentiram 
atraídos pelos benefícios dos programas governamentais 
de reconciliação. A conclusão de todos esses dados é que os 
participantes dos estudos formaram dois grupos diferentes, não 
somente no que diz respeito às características demográficas, mas 
também no sentido político. 
Como desenho experimental ideal, cada experimento deveria 
ter incluído o mesmo número de participantes com a mesma 
distribuição entre ex-guerrilheiros e ex-paramilitares. Mas dadas 
todas as dificuldades de adesão, estávamos distantes de 
conseguir atingir esse ideal. Não era uma situação de 
laboratório onde é possível manter tudo sob controle. Para 
aprender sobre os ex-combatentes, era o melhor que podíamos 
fazer. Nas ciências sociais, as questões realmente interessantes 
quase nunca podem ser estudadas em situações totalmente 
controladas, de forma que é preciso partir para desenhos menos 
perfeccionistas. Antes e depois dos experimentos, os 
participantes tiveram que preencher questionários sobre 
características demográficas e políticas, assim como questões de 
cunho psicológico. Esses dados ajudarão a testar as hipóteses 
sobre os antecedentes e consequências das variações no grau de 
deliberação entre os 28 estudos e também no âmbito da 
participação individual. Institucionalmente, o desenho de 
pesquisa incluiu variações, sendo que a metade dos grupos não 
tinha que tomar nenhuma decisão no final do experimento, 
enquanto que a outra metade deveria decidir entre um conjunto 
de recomendações sobre o futuro da Colômbia para enviar para o 
Alto Comissariado para a Reintegração. A metade dessas 
decisões deveria ser tomada por voto majoritário e a outra 
metade por unanimidade. As cartas foram efetivamente enviadas 
para o Alto Comissariado de forma que para a metade dos 
estudos as discussões tiveram relevância política imediata, 
enquanto que para a outra metade as discussões não produziram 
efeitos externos imediatos.
Para a organização prática dos estudos, logo no início Jaramillo 
e Ugarriza estabeleceram o seguinte tópico de discussão: "Quais 
são as suas recomendações para que a Colômbia tenha um futuro 
de paz, no qual as pessoas de esquerda, de direita, guerrilheiros 
e paramilitares possam viver juntos em paz?" Em contraste com 
outros experimentos do gênero, e em particular a "Sondagem 
Deliberativa"32, nenhum material de briefing foi oferecido antes 
sobre o assunto a ser discutido. Além disso, em contraste ainda 
com esse mesmo estudo, os moderadores não intervieram para 
incentivar o comportamento deliberativo. Estávamos 
interessados, de fato, em ver até que ponto os ex-combatentes 
estavam dispostos e capacitados para se comportar de forma 
deliberativa sem nenhum tipo de ajuda externa. Se, por exemplo, 
alguns participantes não falaram durante todo o experimento, os 
moderadores não pediriam que falassem. Ou, quando as opiniões 
foram expressadas sem justificativas, os moderadores não 
perguntaram por que tais opiniões foram sustentadas. Portanto, a 
discussão flutuou livremente nos limites de um tópico 
amplamente formulado. Não fornecer material ou informação 
sobre os experimentos antes e o fato de que os moderadores não 
interviessem nas discussões eliminou dois possíveis fatores que 
poderiam confundir nossa análise causal. Depois de 45 minutos, 
Jaramillo e Ugarriza finalizaram a discussão. 
Desenho de pesquisa para a Bósnia-Herzegovina – sábado 
18/05/2013 
A Bósnia-Herzegovina, com seu recente conflito armado interno, 
também foi um lugar difícil para a realização dos experimentos. A 
responsável por esta parte do projeto foi Simona Mameli . Ela 
organizou um experimento de teste preliminar em Sarajevo, mas 
chegou à conclusão de que não era um bom lugar para 
desenvolver sua pesquisa. O motivo foi que ela se deparou com 
muitas famílias etnicamente mistas, o que dificultou a 
formação de grupos com cisões profundas. Mameli escolheu 
então dois lugares onde a guerra civil foi particularmente feroz, 
Srebrenica e Stolac. Em Srebrenica, como bem se sabe, um 
32 Veja abaixo o desenho experimental Európolis. 
23
24 
grande número de homens muçulmanos foram brutalmente 
assassinados pelos sérvios. Na Bósnia-Herzegovina, os 
muçulmanos preferem ser chamados de bósnios, e não querem 
ser identificados com a religião. Eu também usarei esse termo. 
Stolac apresenta uma cisão profunda entre croatas e 
bósnios. Stolac fica próxima da mais conhecida cidade de 
Mostar. Os dois lugares sofreram lutas sangrentas. Mameli 
decidiu realizar seus experimentos em Stolac porque Mostar 
tornou-se um destino turístico demais. 
O desenho experimental utilizado na 
Bósnia-Herzegovina foi basicamente o mesmo usado na 
Colômbia no sentido de que não foram fornecidos 
materiais informativos antes e de que os moderadores não 
intervieram para incentivar o comportamento 
deliberativo. Em Srebrenica, Mameli organizou seis 
experimentos com 40 participantes: 22 mulheres e 18 
homens. Em três experimentos ela selecionou os 
participantes utilizando um método denominado 
"caminhada aleatória" (também conhecido como 
"caminhada do bêbado"). Para tanto ela caminhou pelas 
ruas de Srebrenica e abordou pessoas de forma aleatória, 
convidando-as para participar dos experimentos. Teria sido 
melhor extrair amostras aleatórias a partir de listas de habitantes 
de Srebrenica sérvios e bósnios, mas como não existem tais 
listas, a caminhada aleatória foi o segundo melhor método de 
seleção disponível. Ao adotar a caminhada aleatória para a 
seleção de participantes, Mameli deparou-se com duas 
dificuldades. Uma delas estava relacionada ao padrão de vida da 
população bósnia. Os bósnios são maioria em Srebrenica, mas 
muitos só estão formalmente registrados na cidade e preferem 
passar a maior parte to tempo em outro lugar. Mameli encontrou 
muitas casas de bósnios vazias. Parece que muitos voltam 
somente para as eleições ou eventos comemorativos do 
genocídio, pois as memórias traumáticas fazem com que seja 
muito difícil para eles morar em Srebrenica. Aparentemente os 
bósnios mais moderados tendem a viver permanentemente em 
Srebrenica. Para os experimentos, isto significou que 
provavelmente a amostra estava composta mais por bósnios
moderados. Esse viés ocorreu também na Colômbia, onde, 
como vimos antes, os ex-combatentes mais violentos e 
psicologicamente abalados tiveram que ser excluídos dos 
estudos. Isto não é o ideal do ponto de vista do desenho 
experimental, mas assim é a vida nas sociedades que 
enfrentam conflitos armados internos atuais ou recentes. A 
segunda dificuldade relacionada à busca de participantes através 
da caminhada aleatória foi que algumas pessoas, tanto servios 
como bósnios, não quiseram participar ou, nos casos em que 
prometeram comparecer, não apareceram. 
Para os outros três experimentos realizados em Srebrenica 
queríamos que os participantes tivessem sido expostos a um 
programa de reconciliação e construção de paz para examinar se 
a participação em tais programas faria alguma diferença no 
comportamento demonstrado nos experimentos. O Centro para o 
Diálogo de Nansen, uma ONG norueguesa, tem um programa 
assim. Seu principal objetivo é "contribuir com a reconciliação e 
com a construção da paz através do diálogo interétnico"33. A 
equipe do centro ajudou no recrutamento de pessoas que 
poderiam participar em suas atividades, tornando a seleção o 
mais aleatória possível. Algumas das pessoas recrutadas pelo 
Centro para o Diálogo de Nansen também não compareceram. 
Portanto, assim como na Colômbia, os seis grupos experimentais 
de Srebrenica tiveram tamanhos diferentes e nem sempre o 
mesmo número de sérvios e bósnios. Uma vez mais, foi o melhor 
que pudemos fazer num lugar onde ocorreu o pior genocídio na 
Europa desde a Segunda Guerra Mundial. De certa forma foi uma 
surpresa que Mameli conseguisse realizar os seis experimentos, 
já que poderíamos esperar que fosse impossível encontrar sérvios 
e bósnios que quisessem se sentar juntos na mesma mesa. 
A organização prática dos experimentos em Srebrenica 
foi basicamente a mesma adotada na Colômbia. Os 
participantes tiveram que preencher questionários antes e 
depois dos experimentos. Com exceção de algumas 
adaptações locais, os questionários foram os mesmos usados na 
Colômbia. No início de cada experimento, Mameli, assistida por 
33 Consulte www.nansen-dialogue.net/content. 
25
26 
um amigo da região, ofereceu o tópico de discussão, que 
consistia em formular recomendações para um futuro melhor na 
Bósnia-Herzegovina. Os participantes teriam que formular em 
comum acordo um conjunto de recomendações para enviar para 
o Alto Representante da Bósnia e Herzegovina. Diferentemente 
da Colômbia, essa decisão teria que ser tomada em todos os 
experimentos. Houve também microexperimentos para introduzir 
outra variável de controle. Contrariamente à Colômbia, onde, por 
razões de segurança as discussões foram somente gravadas em 
áudio, os experimentos realizados em Srebrenica foram gravados 
em áudio e vídeo. 
Em Stolac, os experimentos foram organizados da mesma 
forma que em Srebrenica. Como já foi mencionado, a cidade está 
profundamente dividida entre croatas e bósnios. Os croatas são 
maioria, e o prefeito pertence a um partido nacionalista croata. 
Supõe-se que haja certa partilha de poder com o partido 
nacionalista bósnio, mas os resultados não são nada bons. Há 
bandeiras croatas por todas as partes, causando ressentimento 
entre os bósnios. Como em Srebrenica, há um sentimento geral 
de cansaço e desilusão. O Alto Comissário visitou a cidade no ano 
anterior e ouviu os problemas da população, mas nada mudou 
desde sua visita. Com isso os habitantes de Stolac não só estão 
frustrados com sua própria administração local, mas também com 
os "internacionais", que pareciam tornar as coisas ainda piores. 
Simona Mameli, novamente assistida por um amigo familiarizado 
com a situação, conseguiu também realizar os seis experimentos 
em Stolac com um total de 35 participantes: 20 mulheres e 15 
homens. Como em Srebrenica, a metade dos participantes dos 
experimentos foi recrutada pelo Centro para o Diálogo de Nansen 
e a outra metade através do percurso aleatório pelas ruas da 
cidade. Novamente, nem todas as pessoas que prometeram 
comparecer o fizeram, de forma que o número de participantes 
sofreu variações e croatas e bósnios não estavam sempre em 
igualdade numérica. Como em Srebrenica, provavelmente houve 
um viés em favor da moderação entre os que participaram dos 
experimentos.
Desenho de pesquisa para a Bélgica 
A Bélgica enfrenta uma divisão cada vez mais profunda 
entre flamengos (que falam holandês) e valões (que falam 
francês). Em contraste com a Colômbia e com a 
Bósnia-Herzegovina, nunca houve nenhum conflito armado 
entre os dois grupos linguísticos, de forma que foi mais fácil 
organizar os experimentos. Um fator que ajudou 
particularmente foi que Didier 
Caluwaerts, o organizador dos 
experimentos, pôde confiar numa agência 
de pesquisa com experiência em realizar 
pela Internet pesquisas sociais34. Com base 
nessas pesquisas, Caluwaerts selecionou pessoas a serem 
convidadas para participar dos experimentos, usando o método 
de amostragem baseado na heterogeneidade. Ele queria que em 
cada grupo experimental houvesse suficiente variedade com 
relação a gênero, idade e grau de instrução. Além disso, ele 
queria que cada grupo contivesse participantes que mostrassem 
sentimentos positivos ou negativos sobre o outro lado da divisão 
linguística. Caluwaerts realizou um total de 9 experimentos, 
convidando 90 pessoas para participar, das quais 83 
efetivamente compareceram. Em cada experimento havia ao 
menos 8 participantes. Como na Colômbia e na 
Bósnia-Herzegovina, não foi fornecido nenhum material 
antes, os moderadores não intervieram, e os participantes 
tiveram que preencher questionários antes e depois dos 
experimentos. Três experimentos apresentaram 
homogeneidade flamenga, três apresentaram homogeneidade 
valã e outros três eram heterogêneos nos dois lados. 
Similarmente à Colômbia e Bósnia-Herzegovina, o tópico de 
discussão foi formulado da seguinte forma abrangente: "Como 
você vê as relações futuras entre os grupos linguísticos na 
Bélgica?" Os grupos tiveram que tomar uma decisão a respeito do 
34 Didier Caluwaerts, "Deliberation across Linguistic Divides: Why It May Be 
Better to Debate with Imagined Others," paper apresentado no Workshop sobre 
Fronteiras da Deliberação, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 
27
28 
seguinte: em três grupos por maioria simples, em três por maioria 
de dois terços e em outros três por unanimidade. Combinando a 
composição linguística dos grupos e as regras de decisão 
obtém-se uma tabela de 9 células (3 x 3) com um experimento 
em cada campo. Na primeira rodada dos experimentos, de 
somente alguns minutos, os participantes tiveram que dizer em 
uma ou duas palavras-chave o que consideravam ser o problema 
ou fato mais importante na Bélgica. Na segunda rodada, de 
aproximadamente uma hora e meia, a discussão era livre. Na 
terceira rodada, também de uma hora e meia aproximadamente, 
os participantes tinham que discutir tópicos específicos sobre a 
política atual da Bélgica no que diz respeito à questão linguística. 
Era necessário tomar decisões depois da segunda e da terceira 
rodadas. Os experimentos foram realizados em um sábado na 
University Foundation em Bruxelas, que não mantém nenhum 
vínculo com nenhuma organização política. Nos três grupos 
linguisticamente mistos, houve tradução simultânea. Nos grupos 
flamencos, Caluwaerts, falante nativo da língua holandesa, foi o 
moderador. Nos grupos valões o moderador foi um falante da 
língua francesa e nos grupos mistos a moderação foi realizada 
por falantes de francês e flamenco. 
Desenho de pesquisa para o projeto Európolis da União 
Europeia 
Depois de três estados nação profundamente divididos, passo 
agora para o nível supranacional da União Europeia (UE). 
Historicamente, os estados membros da UE enfrentaram, em 
muitas ocasiões, cisões profundas produzidas pela guerra. Hoje 
ainda existem divisões profundas entre alguns estados membros, 
como por exemplo entre a Hungria e a Eslováquia no que diz 
respeito à situação dos húngaros na Eslováquia. Para realizar os 
experimentos entre cidadãos europeus comuns, nossa equipe de 
pesquisa foi convidada a juntar-se ao projeto Európolis e a 
codificar as discussões com nosso IQD. Este projeto está baseado 
na ideia de sondagem deliberativa desenvolvida por James S.
Fishkin e Robert C. Luskin35. Eles fizeram as seguintes perguntas: 
"O que aconteceria se o grau de 
deliberação pudesse ser elevado, se não 
para todo o público, ao menos para uma 
amostra aleatória da população? O que 
ocorreria se a sondagem pudesse se tornar 
deliberativa?" A resposta que oferecem é a 
seguinte: "A sondagem deliberativa explora 
estas possibilidades ao expor amostras 
aleatórias a informações balanceadas, 
incentivando as pessoas a ponderar entre 
argumentos opostos nas discussões com 
interlocutores heterogêneos, obtendo 
assim opiniões mais consideradas.36" A 
ideia de sondagem deliberativa foi posta 
em prática muitas vezes, por exemplo no 
ano 2000 de uma forma particularmente 
elaborada na Dinamarca, antes do 
referendo sobre o euro37. 
O projeto Európolis faz parte do 7º Programa de 
Enquadramento da UE e está coordenado por Pierangelo 
Isernia da Universidade de Siena. Em 29-31 de maio de 2009, 
348 pessoas aleatoriamente selecionadas dos 27 estados 
membros da UE se reuniram em Bruxelas e discutiram em 25 
pequenos grupos primeiro sobre a imigração de fora da UE e 
depois sobre as mudanças climáticas. Não era necessário tomar 
decisões no encerramento das discussões dos grupos pequenos. 
Houve também sessões plenárias com especialistas e políticos. 
Os participantes tiveram que preencher quatro 
questionários: um em seus países de origem, outro 
quando chegassem a Bruxelas, um terceiro ao sair de 
35 James S. Fishkin and Robert C. Luskin, "Experimenting with a Democratic 
Ideal: Deliberative Polling and Public Opinion," Acta Pol i t i ca 40 (2005), 284-98. 
36 Fishkin and Luskin, "Experimenting with a Democratic Ideal," 287. 
37 Kasper M. Hansen, Del iberat ive Democracy and Opinion Format ion 
(Odensee: University Press of Southern Denmark), p. 2004. 
29
30 
Bruxelas e o quarto ao retornarem para seus países. É 
importante observar que em todos os projetos 
organizados pela sondagem deliberativa 
foi feito um esforço especial para criar condições favoráveis para 
a deliberação. 
Neste sentido, o desenho da pesquisa é diferente do 
desenho adotado na Colômbia, Bósnia-Herzegovina e 
Bélgica, onde não fizemos nenhum esforço especial para 
criar condições favoráveis à deliberação. No projeto 
Európolis, foi tudo diferente. No dia anterior ao evento, os 
moderadores foram treinados em longas sessões. Eram na 
maioria jovens acadêmicos com ótimas habilidades linguísticas, 
de diferentes países da UE. Ainda que recebessem a informação 
de que não deveriam intervir de forma substantiva nas 
discussões, os moderadores foram instruídos para tornar as 
discussões o mais deliberativas possível, por exemplo, 
incentivando todos a falarem, a justificarem seus 
argumentos e a respeitarem os argumentos dos demais. 
Outro fator que também contribuiria para a boa 
deliberação no Európolis foi a informação anterior 
fornecida aos participantes em uma cartilha de 40 páginas 
contendo informações sobre a UE e os dois assuntos a 
serem discutidos. Do ponto de vista gráfico, os principais 
fatores e os argumentos foram apresentados de forma 
profissional. Ainda que não se tenha testado se os participantes 
leram o material, a maioria indicou tê-lo feito ao preencher seus 
questionários. Comparando o desenho com a Colômbia, 
Bósnia-Herzegovina e Bélgica, devemos ficar atentos ao fato do 
desenho do projeto Európolis ter sido muito diferente. Por outro 
lado, isso tornou as comparações diretas um problema. Contudo, 
a fortaleza das nossas conclusões está justamente no fato de 
estarem baseadas em dois desenhos de pesquisa diferentes. 
Todas as discussões do Európolis foram gravadas em áudio. A 
natureza multilíngue dos participantes constituiu um problema 
especial, exigindo a tradução simultânea por intérpretes 
profissionais. Para tornar a tradução gerenciável, houve apenas 
duas ou três línguas representadas por grupo. Um dos idiomas foi
escolhido para a gravação nas vozes originais e os outros 
somente na tradução. Este método tem a desvantagem de que os 
codificadores não puderam ouvir possíveis emoções nas vozes 
originais dos participantes dos quais somente a tradução foi 
gravada. Codificar e analisar os 25 grupos em suas discussões 
sobre imigração e mudança climática levará um bom tempo, 
sendo coberto em outras publicações futuras. Neste livro, tomo 
como base a análise que Marlène Gerber et al. fez para ECPR 
Joint Sessions em St. Gallen, em abril de 201138. Foram 
investigados 9 dos 25 grupos e somente nas sessões sobre 
imigração, deixando de fora a mudança climática. Escolheram 
grupos nos quais o idioma gravado, no original ou na tradução, foi 
o alemão, o francês ou o polonês. Nos grupos de polonês, 
pudemos contar com o apoio de uma falante nativa de polonês. 
Suas transcrições foram traduzidas para o inglês de forma que 
pudemos verificar a confiabilidade de sua codificação. A 
discussão sobre imigração veio antes do que a discussão sobre 
mudança climática. A primeira sessão sobre imigração em 
pequenos grupos teve lugar na sexta-feira, 29 de maio de 2009 
às 16:00h, durando aproximadamente uma hora com um 
intervalo para café e continuando depois por mais uma hora 
aproximadamente. No dia seguinte, às 9 horas, houve uma 
sessão plenária sobre imigração com especialistas com uma hora 
e meia de duração. Depois de um intervalo houve mais uma 
sessão de pequenos grupos, que passou rapidamente do assunto 
imigração para questões políticas mais gerais, de forma que nós a 
omitimos da codificação. 
Desenho de pesquisa para a Finlândia 
Uso a Finlândia como caso controle para os três países 
fortemente divididos e a UE como caso especial em si mesmo. A 
Finlândia é um país homogêneo com uma pequena minoria sueca 
que, contudo, não causa nenhum problema interlinguístico 
relevante. A Finlândia pode também ser caracterizada como uma 
38 Marlène Gerber, André Báchtiger, Susumu Shikano, Simon Reber, and Samuel 
Rohr, "How Deliberative Are Deliberative Opinion Polls? Why It May Be Better to 
Debate with Imagined Others," paper apresentado no Workshop sobre Fronteiras da 
Deliberação, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 
31
32 
sociedade de consenso. Por isso serve bem como caso controle 
para testar em que medida nossas conclusões sobre os países 
profundamente cindidos são específicas de cada caso ou são 
aplicáveis também a uma sociedade de consenso homogêneo. 
Assim como ocorreu no projeto Európolis, nos juntamos ao projeto 
finlandês quando já estava em andamento. Foi lançado 
inicialmente na Abo Akademi University em Turku por um grupo 
de pesquisa liderado por Kimmo Grönland, Maija Setälä e Kaisa 
Herne39. A codificação e a análise com uma versão modificada do 
IQD foram feitas por Staffan Himmelroos 4 0. Os participantes dos 
experimentos finlandeses constituíram uma amostra aleatória da 
região de Turku. Em novembro de 2006, eles discutiram em oito 
grupos se deveria ser construída na Finlândia a sexta planta 
nuclear. Cada sessão experimental durou aproximadamente três 
horas e terminou com uma decisão por voto ou consenso. Foram 
90 participantes, totalizando 1.189 atos de fala relevantes 
relacionados à questão nuclear. Como no Európolis, mas 
diferentemente dos experimentos realizados na Colômbia, 
Bósnia-Herzegovina e Bélgica, o projeto Finlândia contou com 
esforços especiais que contribuíram para condições favoráveis à 
deliberação. Os participantes receberam material sobre energia 
nuclear antes e puderam se encontrar com especialistas 
representantes de diferentes interesses no assunto. No começo 
das discussões em cada grupo, foram estabelecidas regras de 
base para lembrar os participantes de que deveriam falar e 
respeitar os pontos de vista dos outros. As discussões foram 
lideradas por facilitadores treinados que foram instruídos para 
não influenciar nos pontos de vista dos participantes, mas para 
intervir caso se perdesse o foco da discussão ou as características 
de deliberação se perdessem. 
39 Kimmo Grönland, Maija Setälä, and Kaisa Herne, "Deliberation and Civic Virtue: 
Lessons from a Citizen Deliberation Experiment," European Pol i t ica l Science 
Review 2 (2010), 95-117. 
40 Staffan Himmelroos, "Democratically Speaking: Can Citizen Deliberation Be 
Considered Fair and Equal?," paper apresentado no Workshop sobre Fronteiras da 
Deliberação, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011.
(c) A prática da deliberação 
Escrevi este livro para que fosse também relevante para a prática 
política. Nos últimos anos, a deliberação tem se tornado 
proeminente na prática política com esforços para engajar mais 
os cidadãos comuns no processo político. Esses esforços se 
subscrevem a etiquetas como míni-púBlicos, jurados de cidadãos, 
reuniões de consenso, células de planejamento e outros. Tais 
esforços na prática política precisam ser acompanhadas de 
pesquisas empíricas e normativas sistemáticas sobre deliberação. 
É exatamente com isso que espero que este livro possa 
contribuir. Qual é o apelo da deliberação cidadã para a prática 
política? Um dos apelos importantes é garantir maior legitimidade 
às decisões políticas. Muitos cidadãos tendem a não confiar 
nos políticos no que diz respeito a tomar decisões para o 
bem público. Existe um amplo grau de suspeita de que muitos 
políticos sejam guiados unicamente por seus interesses de 
carreira ou sejam, ainda, corruptos. Essa suspeita é 
alimentada pela maneira como a mídia tende a cobrir os 
assuntos políticos. Em meio a esse cinismo, reclama-se de um 
déficit democrático. A estratégia óbvia para contra-restar esse 
déficit é envolver mais os cidadãos comuns no processo político. 
Dessa forma, as decisões políticas deveriam se tornar mais 
aceitáveis para o público geral. É uma hipótese que merece ser 
testada. Outro apelo importante para permitir que cidadãos 
comuns deliberem sobre questões políticas é a expectativa de 
que ideias novas sejam introduzidas, conduzindo a melhores 
resultados na formulação de políticas. Os cidadãos não querem 
mais aceitar que os políticos, por terem autoridade, saibam mais. 
De fato, em muitos lugares a reputação dos políticos é 
desalentadoramente ruim. Ao mesmo tempo, muitos cidadãos 
são especialistas em suas áreas de atuação profissional e trazem 
experiências da vida privada relevantes para muitas decisões 
políticas. 
A esperança de se obter resultados políticos melhores e mais 
legítimos originou muitos esforços para envolver os cidadãos 
comuns no processo político de formas mais plenas e 
sistemáticas. Apresento como exemplo disso o projeto do 
33
34 
Conselho Regional da Toscana41. Em 2007, a prefeitura 
promulgou a Lei Regional nº 69, intitulada "Regras para a 
Promoção da Participação na Formulação de Políticas Locais e 
Regionais"42. Trechos importantes sobre o quanto essa lei era 
necessária dizem o seguinte: 
• A participação na formulação e realização de políticas 
locais e regionais é um direito de todos. Esta lei promove 
proativamente formas e instrumentos de participação 
democrática para que isto se traduza em direito efetivo 
disponibilizando recursos como dinheiro e suporte 
metodológico. 
• A lei incentiva a iniciativa autônoma de grupos sociais 
organizados como autoridades locais, escolas e empresas 
para que formulem projetos que melhorem a participação 
cidadã. 
Com tais formulações, os legisladores da Toscana apresentarão 
uma agenda deliberativa para a região. Eles enfatizam uma forma 
de participação democrática na qual os cidadãos comuns 
discutem assuntos políticos e comunicam suas opiniões às 
autoridades locais. É também num espírito deliberativo que todos 
os interesses deverão ser ouvidos no processo político e que o 
conhecimento político dos cidadãos melhore para que possam 
oferecer justificativas bem desenvolvida em seus argumentos. Em 
suma, uma nova cultura cívica deveria emergir na Toscana de 
acordo com os objetivos dessa lei. Antonio Floridia e Rodolfo 
Lewanski, dois acadêmicos da deliberação envolvidos no projeto 
comentam: 
A Toscana tornou-se um "laboratório" notável para testar empiricamente 
a validade da participação deliberativa no mundo real, verificando os 
efeitos e possíveis benefícios de sua institucionalização, e aplicando um 
modelo específico cujo objetivo é fazer não apenas com que o governo 
representativo e míni-públicos coexistam, mas que sejam realmente 
41 Para uma descrição do projeto, ver Antonio Floridia e Rodolfo Lewanski, 
"Institutionalizating Deliberative Democracy: The Tuscany Laboratory," paper 
apresentado no Workshop on the Effects of Participatory Innovations, ECPR Joint 
Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 
42 Ver www.consiglio.regione.toscana.it/partecipazione. O site 
contém também uma versão da lei em inglês.
complementares e mutuamente recursivos no cumprimento das leis. De 
uma forma ou de outra, os resultados serão relevantes para aqueles que, 
sejam acadêmicos, praticantes, políticos ou governantes, estejam 
interessados em tais inovações para a democracia43. 
Para implementar a lei, o Conselho Regional deveria apontar "um 
especialista em direito público e ciência política com experiência 
comprovada nos métodos e práticas participativos". Isso 
aconteceu em 1 de outubro de 2008, com a indicação de Rodolfo 
Lewanski, um cientista político da Universidade de Bolonha com 
amplo histórico de publicações no campo da deliberação44. Ele 
lidera a Autorita per la Partecipazione (Autoridade para a 
Participação), com uma equipe que o ajuda a executar seus 
deveres. Nos três anos que se passaram de 2008 a 2010, foram 
concedidos fundos de 2.138.775 euros. A média de concessões foi 
de 31.453 euros45. Comunidades locais, escolas, empresas e 
qualquer grupo formal ou infomal de cidadãos comuns 
podem solicitar fundos. É dever da Autoridade para a 
Participação avaliar as solicitações e decidir quem será 
beneficiado. Uma vez finalizado um projeto, a Autoridade para a 
Participação deverá determinar em que medida as metas 
estabelecidas para o projeto foram atingidas. 
Como exemplo de projeto concreto, uso a comunidade local de 
Piombino, localizada na costa do Mar da Ligúria. O assunto era a 
renovação da Piazza Bovio (praça da cidade), localizada numa 
rocha à beira do mar. Ao invés de deixar a decisão nas mãos de 
técnicos especialistas e das autoridades locais, os cidadãos de 
Piombino envolveram-se intensamente no processo de decisão. 
As condições eram particularmente favoráveis para a deliberação, 
uma vez que as preferências dos cidadãos ainda não estavam 
fortemente cristalizadas, não dependiam de afiliações grupais 
fortes e não promoviam apelos à identidade. Discutirei, mais 
adiante no livro, casos nos quais as condições para a deliberação 
43 Floridia e Lewanski, "Institutionalizing Deliberative Democracy," p. 2. 
44 Conheço Rodolfo Lewanski pessoalmente, e portanto, conheço bem seu 
trabalho no Conselho Regional. 
45 Floridia and Lewanski, "Institutionalizing Deliberative Democracy," tabela 1 no 
Anexo. 
35
36 
eram menos favoráveis. A modo de introdução, parece-me 
apropriado começar com um caso no qual as condições eram 
favoráveis à deliberação, analisando o que ocorre sob tais 
circunstâncias. 
O projeto Piombino transcorreu de abril a dezembro de 2008. 
Em abril, foram distribuídos folhetos em vários lugares como a 
praça do mercado, informando a população sobre o projeto. Na 
noite de 9 de maio, uma assembleia informativa sobre o projeto 
contou com a presença de membros da equipe da Autoridade 
para a Participação. Com o prefeito da cidade, os membros da 
equipe apresentaram as metas do projeto: em conversa com os 
técnicos especialistas, os cidadãos deveriam encontrar a melhor 
solução para a renovação da Piazza Bovio. Portanto, todos os 
participantes deveriam expressar livremente suas opiniões, e 
todas as opiniões deveriam ser respeitadas. As discussões 
ocorreram em pequenos grupos formados por, no máximo, 
dez participantes. Por um lado, os participantes foram 
selecionados aleatoriamente em listas oficiais da cidade. Por 
outro lado, habitantes da cidade puderam se apresentar 
voluntariamente para participar. Assim, foram formados cinco 
grupos. Cada grupo se encontrou três vezes entre maio e 
outubro. Nesses encontros, técnicos especialistas da cidade 
(engenheiros e arquitetos) estiveram disponíveis para obter 
informação caso os cidadãos desejassem. Era importante, 
entretanto, que esses técnicos especialistas não liderassem as 
discussões. Ao invés disso, um dos cidadãos desempenhou a 
função de moderador. Depois de cada encontro, as discussões 
foram resumidas em um relatório que continha os argumentos 
articulados nas discussões. No início de cada discussão de grupo, 
pedia-se aos participantes que dissessem o que a Piazza Bovio 
significava para eles. As respostas foram uniformemente 
positivas. Por exemplo: 
• a praça serve como vínculo entre as gerações, contribui 
para a identidade da cidade, estamos orgulhosos dela; 
• na rocha que se projeta sobre o mar, a praça abre a 
cidade para as belezas da natureza, como uma janela para a 
amplidão infinita do mundo;
• a praça é um espaço social onde os moradores da cidade 
se encontram e é especial para os amantes; 
• a praça é um lugar tranquilo onde as pessoas podem refletir 
calmamente. 
Apesar dessas reações geralmente positivas, as discussões 
grupais trouxeram muitas sugestões de melhora, 
especificamente: 
• A iluminação deveria ser reduzida para que as estrelas 
pudessem ser melhor apreciadas à noite, especialmente da 
extremidade externa da praça. Esta sugestão sofreu objeções, 
já que a redução da iluminação poderia colocar em risco a 
segurança, especialmente para os mais idosos ou pessoas com 
deficiências. Para dar conta desses argumentos conflitantes, 
seguiu-se com uma discussão sobre formas de iluminação. 
Sugeriu-se que se usassem mais luzes no solo e menos luzes 
para o alto. Sugeriu-se também que se utilizasse energia solar 
para a iluminação da praça. 
• Para o pavimento da praça foram feitas várias sugestões 
referentes à cor e ao material a ser usado. Os participantes 
foram detalhistas ao ponto de sugerirem, por exemplo, que se 
usassem materiais que permitissem que a goma de mascar das 
crianças pudesse ser removida. 
• Houve uma discussão vívida sobre o número e tipo de árvores a 
serem plantadas. Aqui, mais uma vez, os participantes tiveram 
que enfrentar critérios conflitantes. Por um lado, as árvores 
deveriam ser frondosas, mas não deveriam ocultar a vista do 
mar. As árvores escolhidas não deveriam danificar o pavimento 
com suas raízes. 
Ao discutir esses e muitos outros assuntos, os grupos tentaram 
chegar a um consenso ou ao menos a posições majoritárias. As 
posições minoritárias, entretanto, também foram incluídas nos 
relatórios dos grupos. Assim, uma voz solitária demandava que 
todos os bancos fossem retirados da praza; apesar dessa 
demanda não obter suporte algum, foi mencionada no relatório 
do grupo. Um elemento particularmente inovador do projeto em 
sua totalidade foi o envolvimento das crianças das escolas de 
37
38 
Piombino. Depois de excursões escolares para a praça, as 
crianças tiveram que fazer desenhos de como a praça deveria 
ficar. Esses desenhos, frequentemente cheios de cores e alegria, 
foram exibidos e também publicados no site da cidade. Desta 
forma, as crianças aprenderam uma boa lição sobre a prática da 
política através de um caso muito concreto de formulação de 
políticas. 
O projeto terminou em dezembro de 2008, quando toda a 
população de Piombino foi convidada para ser informada sobre os 
resultados das discussões em grupo. Nessa ocasião, as 
autoridades locais prometeram levar em consideração as 
sugestões formuladas nos grupos, o que de fato foi feito, 
especialmente nos aspectos para os quais havia consenso sobre 
como a praça deveria ficar. Os cidadãos foram incentivados a 
continuar envolvidos também no processo de planejamento e 
execução da renovação da praça. Do ponto de vista da 
deliberação, é importante observar que, de acordo com os 
relatórios dos grupos, as discussões foram conduzidas com 
seriedade e respeito, ponderando-se cuidadosamente os 
argumentos e com disposição dos participantes para mudarem de 
posição caso se confrontassem com novas informações e bons 
argumentos. Às vezes, as discussões deliberativas são 
organizadas sem nenhum vínculo com debate público em curso. 
Como veremos mais adiante neste livro, tais discussões 
flutuantes sem ponto de chegada também são valiosas ao 
contribuírem com o desenvolvimento político individual dos 
participantes. Neste capítulo, entretanto, quero apresentar com 
Piombino um caso no qual as discussões dos cidadãos faziam 
parte de um processo político em curso. Desta forma, quero 
enfatizar que a deliberação cidadã pode muito bem ter relevância 
política. 
Apresentei um exemplo que mostra como cidadãos comuns 
podem ser envolvidos em questões de política deliberativa. Uma 
onda de empreendimentos como este vem ocorrendo em 
muitas partes do mundo nos últimos anos. É óbvio que há a 
necessidade de engajar mais os cidadãos e mais plenamente no 
debate político. Para a comunidade acadêmica, o desafio está em
pesquisar as condições nas quais essas experiências em 
deliberação cidadã podem ter sucesso. Abordarei esse desafio 
nos próximos capítulos. No último capítulo, voltarei para a prática 
da deliberação. 
39
40 
STEINER, Jürg. The Foundations of 
Deliberative Democracy. Empirical Research 
and Normative Implications. Cambridge : 
Cambridge University Press, 2012. 
Francine Altheman 
Capítulo 1 
A participação dos cidadãos na deliberação 
a) Controvérsias normativas na literatura 
Há consenso entre os teóricos deliberativos de 
que cidadãos comuns devem ter a oportunidade 
de fazer parte da política deliberativa, mas há 
controvérsia sobre quantos cidadãos devem 
realmente fazê-lo. Por um lado, há uma posição 
normativa ideal de que todos os cidadãos devem 
estar envolvidos em políticas deliberativas. Em 
suas vidas cotidianas, eles devem discutir 
assuntos políticos entre seus familiares, com os 
amigos e vizinhos, no local de trabalho, e nos 
clubes e associações. Essas discussões devem 
ter um caráter deliberativo no sentido de os 
participantes se voltarem para a força do melhor 
argumento. Como consequência, a formação de 
opinião entre a população comum se daria de 
uma forma reflexiva. Essas opiniões refletidas 
[opinião pública] são então comunicadas aos 
líderes políticos por meio de uma variedade de 
canais como encontros pessoais, eventos 
públicos, a mídia, e a Internet. Essa posição
participativa é defendida por Jürgen Habermas, 
que argumenta que todos os afetados por uma 
decisão política devemser incluídos na 
deliberação (Inklusion aller Betroffenen).46 Desde 
que decisões importantes, por exemplo sobre o 
meio ambiente ou assistência médica, que afeta 
todo mundo, a posição habermasiana é de que 
todo mundo deve participar da deliberação de 
tais questões. Habermas espera que a 
deliberação entre cidadãos comuns terá 
influência em eleições, legislação e poder 
administrativo, desde que “o fluxo 
comunicacional que serpeia entre formação 
pública da vontade, decisões institucionalizadas 
e deliberações legislativas garantea 
transformação do poder produzido 
comunicativamente, e da influência adquirida 
através da publicidade, em poder aplicável 
administrativamente pelo caminho da 
legislação.” Nesse caso, cidadãos devem ser uma 
grande força de compensação contra as duas 
tradicionais influências políticas, “dinheiro e 
poder administrativo”.47 
Alguns teóricos consideram como utópico que 
praticamente todos os cidadãos irão sempre 
participar da política deliberativa. Portanto, como 
esses teóricos argumentam, tem que se pensar 
sobre um modo mais real de envolver os líderes 
populares na deliberação de questões políticas. 
Eles colocam suas esperanças nos chamados 
41 
46 Jürgen Habermas, Ach, Europa (Frankfurt a.M.: 
Suhurkamp, 2008), p. 148. 
47 Jürgen Habermas, Between Facts and Norms: 
Contributions to a Discourse Theory of Law and Democracy 
(Cambridge, MA: MIT Press, 1996), p. 299.
42 
mini-públicos, os quais eles entendem como 
grupos de cidadãos escolhidos aleatoriamente. 
James S. Fishkin, um teórico importante, está na 
vanguarda desse movimento com a ideia do 
Voto Deliberativo.48 A questão crucial é o 
que a deliberação em mini-públicos desse 
tipo significa para o sistema político em 
grande escala. Fishkin espera que os 
participantes nesses mini-públicos peguem o 
gosto pela deliberação e, em seus contextos 
pessoais, façam com que outros cidadãos se 
engajem em atividades deliberativas. Ele 
também espera que a opinião dos líderes que 
emergem dos participantes desses mini-públicos 
possa refletir as opiniões dos outros cidadãos. 
Em todos esses casos, a deliberação em 
mini-públicos deve se espalhar para um grande 
número de cidadãos. 
Maija Setälä também reflete sobre o papel dos 
mini-públicos no processo de decisão política.49 
Ela adverte que “mini-públicos deliberativos são 
frequentemente considerados pelas autoridades 
públicas em uma base ad hoc,” e isso levanta 
para Setälä “questões sobre motivações além 
deles. As recomendações a que chegam o debate 
dos mini-públicos são normalmente ignoradas.” 
De acordo com Setälä, “o impacto dos 
mini-públicos poderia ser reforçado pela 
institucionalização de sua utilização e 
48 James S. Fishkin, When the People Speak : Deliberative 
Democracy and Public Consultation (Oxford University 
Press, 2009). 
49 Maija Setälä, “Designing Issue-Focused Forms of Citizen 
Participation”, artigo apresentado na Conferência da 
Democracia: uma perspectiva cidadã, Âbo, Maio 25-27, 
2010, p. 15.
43 
desenvolvendo formas em que tais 
recomendações fossem tratadas nas 
instituições representativas.”50 
Erika Cellini et al. vai um passo além que 
Setälä quando alerta que a organização dos 
mini-públicos pode ser mal utilizada para 
distrair a atenção das reais decisões 
tomadas pelos públicos das arenas.51 Como 
exemplo eles citam a decisão tomada na 
região da Toscana sobre a política de 
saúde: enquanto o governo organizou 
mini-públicos para discutir sobre a 
distribuição dos custos da saúde, ele 
decidiu ao mesmo tempo sobre a 
reorganização de todo o sistema hospitalar 
na região. Desse modo, os mini-públicos 
afastaram a atenção de onde a real tomada 
de decisão estava ocorrendo. Cellini et al. 
também demonstra que esses mini-públicos, que 
foram anunciados pelos organizadores como 
representativos quando não eram, tinham uma 
forte representação de pessoas altamente 
educadas e politicamente ativas. O fato é que 
não foi aos mini-públicos, representados por 
cidadãos comuns, o poder de influenciar a 
política de saúde na região. Em primeiro lugar, 
os cidadãos comuns não estavam 
devidamente representados e, segundo, os 
mini-públicos não tiveram nenhuma 
50 Setälä, “Designing Issue-Focused Forms of Citizen 
Participation”, p. 15. 
51 Erika Cellini, Anna Carola Freschi, and Vittorio Mete, “Chi 
delibera? Alla ricerca del significato politico di un 
‘esperienza partecipativo-deliberativo’,” Rivista Italiana di 
Scienza Politica 40 (2010), 138: “distrazione dell’attenzione 
del pubblico dalle sedi dove si negoziano gli interessi.”
44 
influência sobre o curso de tomada de 
decisão das autoridades políticas. 
Um problema especial para o critério de 
igualdade de participação no processo 
deliberativo é como lidar com os cientistas e 
outros especialistas. Alfred Moore alerta “que o 
ideal de igualdade entre os cidadãos para 
participar da deliberação de problemas que lhes 
afeta está em tensão com as desigualdades de 
conhecimento que são inerentes às sociedades 
complexas.”52 Ele considera essa tensão como 
inevitável; portanto, “a questão não é se a 
autoridade especialista faz parte do sistema 
deliberativo, mas como ela será integrada e se 
essa integração é objeto de padrões 
deliberativos.”53 Moore contrasta a tecnocracia 
com um modelo de democracia das autoridades 
especialistas. O modelo democrático, em 
contraste, coloca “a autoridade especialista ao 
julgamento do público de um jeito que desafia 
algumas defesas tecnocratas no papel da 
expertise política, mesmo que não implique uma 
rejeição do valor da autoridade especialista nas 
políticas”.54 Como exemplo ele menciona os 
ativistas da Aids que “desenvolveram uma 
expertise e foram capazes de forçar seus pontos 
de vista nas discussões de estratégias de 
tratamento e o caminho dos experimentos”.55 
Como um princípio geral, Moore quer “ser capaz 
52 Alfred Moore, “Questioning Deference: Expert Authority 
in a Deliberative System”, artigo apresentado no encontro 
anual da Midwest Political Science Association, Chicago, 
Março 31-Abril 3, 2011, p. 14. 
53 Moore, “Questioning Deference,” p. 14. 
54 Moore, “Questioning Deference,” pp. 4-5. 
55 Moore, “Questioning Deference,” p. 13.
de um tipo de crítica que fundamenta a 
autoridade especialista na ausência de mera 
deferência cega”.56 
John Parkinson alerta que com todo o foco nos 
mini-públicos, nós não devemos nos esquecer do 
nível macro. Ele quer olhar “para o público 
racional e formador de opinião que está em e 
entre as sociedades democráticas todos os dias 
em vez de estar apenas confinada no julgamento 
dos cidadãos.” Parkinson preocupa-se que 
“tecnocratas assumiram e transformaram a 
democracia deliberativa em apenas um 
conjunto de ferramentas para pesquisar, 
mesmo que manipulando, o usuário dos 
serviços públicos.”57 Como consequência dessa 
tendência, Parkinson vê o perigo de a 
democracia deliberativa perder “seu grande 
potencial crítico”.58 Ele quer ver como a 
deliberação funciona não somente em 
mini-públicos, mas também em grandes 
sociedades. Jane Mansbridge et al. reafirma que 
deve-se também olhar para como a deliberação 
funciona em grandes sociedades. 
Para entender o grande objetivo da deliberação, 
é necessário ir além dos estudos sobre 
instituições individuais e processos para 
examinar suas interações no sistema como um 
todo. Reconhecemos que a maioria das 
democracias é uma complexa entidade com uma 
56 Moore, “Questioning Deference”, p. 14. 
57 John Parkinson, “Conceptualising and Mapping the 
Deliberative Society,” artigo apresentado na Political 
Association Conference, Edinburgh, 2010, pp. 14-15. 
58 Parkinson, “Conceptualising and Mapping the 
Deliberative Society,” p. 2. 
45
46 
variedade de instituições, associações, e espaços 
de contestação política, incluindo as redes 
informais, a mídia, os grupos organizados de 
defesa, escolas, fundações, instituições privadas 
e não lucrativas, legislaturas, agências 
executivas e os tribunais. Assim, nós defendemos 
o que pode ser chamado de um sistema próximo 
do que é a democracia deliberativa.59 
Mansbridge et al. enfatiza que no sistema 
deliberativo nem todos os elementos precisam 
ter uma natureza deliberativa: “por exemplo, 
retórica altamente partidária, mesmo 
violando alguns ideais deliberativos como o 
respeito mútuo e de ajustamento, pode, 
contudo, ajudar a cumprir outros ideais 
deliberativos, como a inclusão”.60 Para 
ilustrar sua abordagem, Mansbridge et al. NÃO 
CONCORDO. 
olhe atentamente para os protestos. Protestos 
frequentemente aparecem para violar diversas 
normas da deliberação. Primeiro, os 
manifestantes usam slogans para provocar o 
entusiasmo e transmitir uma mensagem 
dramática que frequentemente minam a sutileza 
epistêmica. Segundo, quando um protesto 
implicitamente ou explicitamente ameaça 
promover sanções ou impõe cotas, ele age como 
uma forma de coerção. Terceiro, protestos por 
59 Jane Mansbridge, James Bohman, Simone Chambers, 
Tom Christiano, Archon Fung, John Parkinson, Dennis 
Thompson, and Mark Warren, “A Systemic Approach to 
Deliberative Democracy”, artigo apresentado no Workshop 
on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. 
Gallen, Abril 12-17, 2011. 
60 Mansbridge et al., “A Systemic Approach to Deliberative 
Democracy”, p. 3.
47 
vezes envolvem níveis de rompimento e 
contestação que deixam de atender as normas 
da deliberação de civilidade e respeito mútuo, 
[mas] protestos podem ser interessantes para 
corrigir as desigualdades no acesso ao debate 
trazendo mais vozes e interesses ao processo de 
decisão.61 
Pensar em deliberação em termos sistêmicos é 
um exercício útil, mas isso torna mais difícil de 
identificar o que é deliberativo e o que não é. 
Tomando a ilustração de Mansbridge et al., uma 
ação de protesto pode parecer como 
não-deliberativa no âmbito micro mas como 
contributiva à deliberação no âmbito sistêmico, 
mas não é fácil determinar se uma ação de 
protesto em particular contribui para a 
deliberação no âmbito sistêmico. 
Stefan Rummens também tem um olhar 
sistêmico e argumenta que uma boa 
deliberação em todos os tipos de fóruns e 
redes não é suficiente para a democracia 
deliberativa, que deve ser fortemente 
respaldada pelas instituições 
representativas tradicionais. Para ele, 
“políticas representativas proporcionam um 
debate político com uma narrativa estruturada 
que faz o processo político ser particularmente 
visível e acessível para uma grande audiência”.62 
61Mansbridge et al., “A Systemic Approach to Deliberative 
Democracy”, p. 25. 
62 Stefan Rummens, “Staging Deliberation: the role of 
representative institutions in the deliberative democratic 
process”, artigo apresentado no Workshop on the Frontiers 
of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, Abril 12-17, 
2011, p. 20. Prestes a ser publicado no Journal of Political
48 
Apesar de todas as controvérsias entre os 
teóricos, eles concordam que os cidadãos devem 
estar envolvidos em política e, tanto quanto 
possível, em um nível de igualdade. Como Dennis 
F. Thompson coloca: “Igualdade de participação 
requer que nenhuma pessoa ou grupo de 
favorecidos domine completamente o processo 
de debate racional [ação comunicativa], mesmo 
se os sujeitos do debate não estejam 
rigorosamente em igualdade de poder e 
prestígio.”63 Jane Mansbridge coloca a mesma 
ideia como segue: “A deliberação deve, 
idealmente, ser aberta a todos os afetados pela 
decisão. Os participantes devem ter igual 
oportunidade para influenciar o processo, ter 
iguais recursos, e serem protegidos por direitos 
básicos”.64 A questão é somente quantos 
cidadãos são atualmente capazes e dispostos a 
participar desse modo em processos políticos. 
Enquanto Habermas salienta o ideal de que todos 
os cidadãos deliberam em um nível de igualdade 
e sem constrangimentos [coerções], teóricos 
como Fishkin vê esse ideal como utópico e pensa 
em modos de aumentar a quantidade e 
qualidade de participação dos cidadãos na 
política deliberativa. Mansbridge também 
reconhece que o ideal que ela propõe nas 
Philosophy. 
63 Dennis F. Thompson, “Deliberative Democratic Theory 
and Empirical Political Science”, Annual Review of Political 
Science 11 (2008), 527. 
64 Jane Mansbridge com James Bohman, Simone Chambers, 
David Estlund, Andreas Follesdal, Archon Fung, Christina 
Lafont, Bernard Manin e José Luis Marti, “The Place of 
Self-Interest and the Role of Power in Deliberative 
Democracy”, Journal of Political Philosophy 18 (2010), 2.
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The Foundations of Deliberative Democracy - Traducao livre

  • 1. Introdução Seções plenárias – Sessões Plenárias Reuniões de Comitê – Comissões Parlamentares O modelo deliberativo da democracia foi desenvolvido inicialmente em um nível filosófico normativo1. Muitas alegações foram feitas sobre os antecedentes favoráveis e as consequências benéficas de um grau de deliberação elevado. Nos últimos anos, algumas dessas alegações foram submetidas a testes empíricos. Neste livro, ocupo-me da interação entre os aspectos normativos e empíricos da deliberação. Naturalmente, os dados empíricos não podem resolver problemas normativos, mas podem trazer novas luzes sobre tais questões. Eu venho do mundo empírico, portanto não pretendo escrever como um filósofo profissional. Ao invés disso, adotarei a perspectiva de um cidadão engajado no sentido da acepção no francês para citoyen engagé. Iniciarei meu posicionamento normativo não com premissas filosóficas definitivas. Antes, prosseguirei com reflexões pragmáticas sobre o que os resultados empíricos podem significar para o papel da deliberação em uma democracia viável. Permita-me esclarecer já de partida que não penso que a democracia viável deva consistir meramente em deliberação. Portanto, o conceito de democracia deliberativa no título deste livro não significa que esta forma de democracia consista unicamente em deliberação: significa simplesmente que a 1 De acordo com algumas leituras, Aristóteles já havia formulado um argumento deliberativo normativo; ver, por exemplo, James Lindley Wilson, "Deliberation, Democracy, and the Rule of Reason in Aristotle's Politics," Amer ican Pol i t ica l Science Review 105 (2011), 259-74. 1
  • 2. 2 deliberação desempenha um papel importante. Além da deliberação, a democracia viável deve ter espaço, em particular, para eleições competitivas, trocas estratégicas, votos agregadores e protestos nas ruas. A chave é encontrar a combinação certa de todos esses elementos, e isso dependerá do contexto. Argumento que, nessa combinação, o papel da deliberação frequentemente não é forte o bastante e precisa ser fortalecido. Mais especificamente, a análise empírica deve permitir responder a perguntas como as seguintes: Até que ponto e sob quais circunstâncias normas e valores privilegiados pelos teóricos da deliberação podem ser colocados em prática? Existem trocas entre os vários elementos da deliberação de tal maneira que, uma vez postas em prática, certos elementos permaneçam em tensão com os demais? Até onde é possível melhorar a viabilidade da deliberação? A deliberação é compatível com outras metas valiosas? Quais são os custos de oportunidade da deliberação? Maiores graus de deliberação significam redução de resultados? Que relação causal se estabelece entre a deliberação e resultados da política? Quais são os modelos democráticos alternativos à deliberação? Se obtivermos boas respostas para tais questões, será mais fácil formular um juízo de como os princípios morais privilegiados pelos teóricos da deliberação deveriam ser aplicados no mundo real das políticas. Neste sentido, este livro deveria mostrar como a pesquisa empírica pode provocar reflexões sobre valores normativos. Tais reflexões são postuladas de maneira concisa por Thomas Saretzki, que escreve: "O que podemos e devemos tentar formular é uma reflexão crítica e uma concepção cooperativa dos aspectos empíricos e normativos da democracia deliberativa2". Nesse mesmo caminho, Michael A. Neblo et al. esperam que "muitos dos grandes avanços em nosso entendimento da deliberação provavelmente serão resultado do alinhamento cuidadoso entre questionamentos normativos e empíricos de uma forma que 2 Thomas Saretzki, "From Bargaining to Arguing, from Strategic to Communicative Action? Theoretical Perspectives, Analytical Distinctions and Methodological Problems in Empirical Studies of Deliberative Processes," paper apresentado no Center for European Studies, University of Oslo, December 4, 2008, p. 38.
  • 3. permita que ambos dialoguem entre si em termos mutuamente interpretáveis"3. Maija Setala postula ainda que os estudos dos filósofos da deliberação "deveriam ser empiricamente constrastáveis, já que fazem abstrações a partir do mundo real como se fossem experimentos"4. Simon Niemeyer alega que "a 'chegada da era' da democracia deliberativa requer a interação entre insight teórico e pesquisa empírica"5. Se o mundo empírico não corresponde aos ideais normativos, poder-se-ia argumentar que o mundo empírico precisa ser modificado. Poder-se-ia ainda argumentar, entretanto, que os ideais normativos precisam ser ajustados ao mundo como ele é. Mostrarei que sempre há tensão entre os ideais deliberativos e a práxis da deliberação. E é exatamente em torno dessa tensão se organiza este livro. Para dar conta da interação entre as questões normativas e empíricas mais visíveis, cada capítulo está organizado em três seções. As primeiras seções abordam a literatura da deliberação baseada na filosofia normativa. Não se trata de oferecer uma visão geral introdutória da literatura, mas de apresentar as controvérsias mais importantes entre os teóricos da deliberação. Tendo sido educado inicialmente como historiador, permanecerei o mais próximo possível dos textos, deixando que os teóricos falem por suas próprias palavras. Nas segundas seções discuto a pesquisa empírica relevante para essas controvérsias, incluindo nossa própria pesquisa. Nas terceiras seções, discuto as possíveis implicações normativas, relacionando os dados empíricos às controvérsias filosóficas. (a) O modelo teórico da deliberação Na literatura filosófica, o modelo deliberativo da democracia é comumente construído como ideal "regulatório", algo que, de 3 Michael A. Neblo, Kevin M. Esterling, Ryan P. Kennedy, David M.J. Lazer, and Anand E. Sokhey, "Who Wants to Deliberate: And Why?," Amer ican Pol i t ica l Science Review 104 (2010), 566. 4 Maija Setala and Kaisa Herne, "Normative Theory and Experimental Research in the Study of Deliberative Mini-Publics," paper presented at the Workshop on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 5 Simon Niemeyer, "Deliberation and the Public Sphere: Minipublics and Democratization," paper apresentado no Workshop on Unity and Diversity in Deliberative Democracy, University of Bern, October 4, 2008, p. 2. 3
  • 4. 4 acordo com Jane Mansbridge, "é impossível de ser alcançado em sua plenitude, mas que permanece como ideal ao qual, mantendo-se as condições, poder-se-ia considerar uma prática determinada mais ou menos próxima"6. Esta perspectiva segue Immanuel Kant, que define "princípio regulatório" como um padrão "com o qual podemos nos comparar, julgando-nos e, portanto, aprimorando-nos, mesmo que nunca possamos atingi-lo7". Jürgen Habermas escreve no contexto das "pressuposições da pragmática do discurso"8. O tipo ideal de deliberação pode ser melhor compreendido se comparado com o tipo ideal de troca estratégica. No mundo real da política, predomina comumente uma mistura dos dois tipos ideais (Obs: Lili- tipo ideal da pragmática do discurso e tipo ideal de troca estratégica). Antes de abordarmos os tipos mistos, seria útil do ponto de vista conceitual apresentar primeiramente os dois tipos ideais. No tipo ideal da troca estratégica, os atores políticos têm preferências fixadas. Eles sabem o que querem quando adentram o processo político. Fazem manobras para atingir resultados que estejam o mais próximo possível de suas preferências. Engajam-se na realização de acordos sob a máxima "se você me der isto, eu te darei aquilo". Para fortalecer suas posições nas trocas, podem trabalhar com promessas e ameaças. (Lili – isso é PODER, e não deliberação) Idealmente, a troca estratégica resulta em situações de equilíbrio em que as partes sempre ganham e nas quais, graças à negociação mutuamente benéfica, todos acabam numa situação melhor do que a que tinham antes. Em modelos sofisticados de troca estratégica, os atores não são necessariamente sempre egoístas. Eles podem também, por exemplo, se preocupar pelo bem-estar das futuras gerações como preferência pessoal. Se houver novos dados disponíveis, esses atores poderão também mudar suas 6 Jane Mansbridge with James Bohman, Simone Chambers, David Estlund, Andreas Follesdal, Archon Fung, Christina Lafont, Bernard Manin, and José Luis Marti, "The Place of Self-Interest and the Role of Power in Deliberative Democracy," Journal of Pol i t i cal Phi losophy 18 (2010), 65, footnote 3. 7 Immanuel Kant, Cr i t ique of Pure Reason, ed. Paul Guyer and Allen W. Wood (New York: Cambridge University Press, 1998 [1781]), p. 552. 8 Jürgen Habermas, On the Pragmat i cs of Communicat ion (Cambridge: Polity Press, 1998).
  • 5. preferências. Novas pesquisas sobre os perigos de dirigir carros, por exemplo, podem mudar a preferência dos atores para que se abandonem os carros e se utilizem, em substituição, o transporte público. Nesses modelos sofisticados de troca estratégica, a base continua sendo a orientação dos atores por suas preferências individuais, independentemente de quais sejam essas preferências. Em contraposição, no tipo ideal da deliberação as preferências não estão fixadas, mas abertas, e os atores estão dispostos a ceder à força do melhor argumento. O importante no debate político é o quão convincente são os argumentos dos diferentes atores. Os atores tentam convencer os outros através de bons argumentos, mas também estão abertos a serem convencidos pelos argumentos dos demais. Portanto, ocorre um processo de aprendizagem no sentido de que os atores apreendem no debate comum quais são os melhores argumentos. Não está claro no começo quais são os melhores argumentos, mas espera-se que os melhores argumentos emirjam do diálogo mútuo. Neste sentido, os atores aprendem a pensar e a agir de novas maneiras. A deliberação pode produzir rupturas com o passado. Mansbridge resume a essência do modelo deliberativo de maneira sucinta: "Concluímos destacando que a 'deliberação' não é uma simples conversa. Na situação ideal, a deliberação democrática rejeita o poder coercitivo no processo de toma de decisões. A tarefa central é a justificação mútua. Idealmente, os participantes do processo de deliberação estão engajados, com respeito mútuo, como cidadãos livres e iguais em busca de termos de cooperação justos."9 Esta definição se aproxima do significado inicial de deliberare no Latim, onde significa pesar, ponderar, considerar e refletir. Como assinala Robert E. Goodin, a deliberação nesses moldes pode também ter lugar individualmente na reflexão interna. Goodin considera que tal deliberação é particularmente frutífera antes e depois da deliberação em grupo10. Nessa mesma direção, Thomas Flynn e John Parkinson argumentam, da perspectiva da psicologia social, 9 Mansbridge et al . , "The Place of Self-Interest," 94. 10 Robert E. Goodin, Ref lect ive Democracy (Oxford University Press, 2003), p. 38. 5
  • 6. 6 que a deliberação interna pode ser potencializada se confrontar deliberadores ideais imaginados11. Bernard Reber insiste de uma maneira especialmente enfática que a deliberação individual deveria ocorrer antes da deliberação em grupo, já que do contrário existe o risco de que a argumentação não seja coerente. Em primeiro lugar, os atores devem ter claro suas normas éticas para poderem se engajar com outros em processos de deliberação frutíferos.12 Durante muito tempo o interesse acadêmico concentrou-se predominantemente no modelo de troca estratégica (Lobby, Advocacy etc). Mais recentemente, entretanto, o modelo deliberativo tem atraído mais a atenção. Alain Noël afirma: O estudo predominante da política foi o estudo dos interesses, instituições e da força, com foco nas trocas e no poder, com alguma atenção ocasional para as ideias, consideradas como variáveis intervenientes. Nos últimos anos, o estudo da deliberação democrática retomou uma compreensão mais tradicional da política como fórum no qual ideias e argumentos são trocados, evoluem ao longo do tempo e são importantes em si mesmas.13 Ainda há muitos cientistas políticos que insistem em que a política se resume a trocas estratégicas. Como formular um caso no qual a deliberação não seja simplesmente um conceito filosófico ideal, mas de fato presente no mundo real da política? Deixe-me exemplificar esta questão com o conflito da Irlanda do Norte, especificamente com o Acordo de Belfast de 1998 e sua implementação. Ian O'Flynn oferece a seguinte interpretação: No fundo, os nacionalistas irlandeses o endossaram porque o acordo acolheu a promessa de unificação da Irlanda, enquanto que os unionistas britânicos o endossaram porque acolhia a melhor oportunidade de reconciliação dos nacionalistas com a união. A importância do acordo, 11 John Parkinson and Thomas Flynn, "Deliberation, Team Reasoning, and the Idealized Interlocutor: Why It May Be Better to Debate with Imagined Others," paper presented at the Workshop on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, 12 April 12-17, 2011. Bernard Reber, "Les risques de l'exposition à la deliberation des autres," Ar chi ves de phi losophie du droi t 54 (2011), 261-81. 13 Alain Noël, "Democratic Deliberation in a Multinational Federation," Cr i t i cal Review of Internat ional Social and Pol i t ica l Phi lo sophy 9 (2006), 432.
  • 7. contudo, é que ambos conjuntos de aspirações são sustentados por um compromisso compartilhado de princípios de autodeterminação, igualdade democrática, tolerância e respeito mútuo. São esses princípios que conferem ao acordo legitimidade aos olhos dos cidadãos comuns e da comunidade internacional, e que sustentam a esperança pela paz e estabilidade duradoura14. Como O'Flynn sabe que não apenas poder e interesses, mas também a deliberação com tolerância e respeito mútuo desempenharam seu papel? Ele mergulhou no processo de decisão, estudando documentos e conduzindo entrevistas. Outros acadêmicos, entretanto, baseando-se em fontes semelhantes, vêm apenas interesses e poder em jogo15. Quem está com a razão? Penso que nenhum dos dois lados pode provar seus argumentos de maneira definitiva. Toda análise dependerá sempre da visão de mundo de quem a conduz, e a maneira como cada um de nós vê o mundo depende em grande parte de como fomos socializados. Alguns dispõem de esquemas cognitivos que os levam a ver as políticas puramente como um jogo de poder. Para outros, os esquemas cognitivos funcionam de tal forma que também vêm a deliberação em jogo. Não estou dizendo que o axioma da política como um puro jogo de poder não seja plausível. Simplesmente considero plausível o axioma de que a política não é unicamente um puro jogo e poder. Enquanto escrevia este livro, li a autobiografia de Nelson Mandela. Fiquei impressionado ao ver que no capítulo da conclusão ele oferece uma visão de mundo segundo a qual o coração humano está aberto para os outros: Eu sempre soube que no fundo do coração humano existe misericórdia e generosidade. Ninguém nasce odiando outra pessoa por causa da cor da pele, antecedentes ou religião. As pessoas devem aprender a odiar, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o amor emerge no coração humano com maior 14 Ian O'Flynn, "Divided Societies and Deliberative Democracy," Br i t i sh Journal of Pol i t i cal Science 37 (2007), 741. Ver também Ian O'Flynn, Del iberat i ve Democracy and Divided Societ ies (Edinburgh University Press, 2006). 15 Ver, por exemplo, alguns artigos em Rupert Taylor (ed.), Consociat ional Theory: McGar ry and O'Leary and the Nor thern I reland Conf l ict (London: Routledge, 2009). 7
  • 8. naturalidade do que seu oposto. Mesmo nos momentos mais sombrios na prisão, quando meus camaradas e eu fomos levados até nossos limites, eu ainda via um lampejo de humanidade nos guardas, talvez apenas por um segundo, mas o suficiente para me tranquilizar e me manter vivo. A bondade do homem é uma chama que pode ser ocultada, mas nunca extinguida 16. Essa visão de mundo de Mandela é precisamente o tipo de visão sobre a qual a pesquisa da deliberação foi construída. Ainda que Mandela tenha sido tratado com crueldade pelos guardas brancos na prisão, ele foi capaz de ver neles, em algumas ocasiões, um lampejo de humanidade. Ele nunca desistiu completamente da chama da bondade humana. Concordo com Mandela em que essa chama permanece muitas vezes oculta, sem que possa ser completamente extinguida. A esperança nessa chama é a base de um programa de pesquisa gratificante, pelo menos para mim e para muitos dos meus colegas teóricos da deliberação. Como Mauro Barisione me mostrou17, é na base do modelo deliberativo que as suposições devem permanecer abertas para serem desafiadas. Portanto, a suposição da bondade humana não pode ser tomada como uma meta-suposição não desafiável. Com isso, entretanto, a lógica da deliberação coloca em risco seus próprios fundamentos. Barisione certamente tem razão em destacar isto já que, de fato, um dos pressupostos básicos da deliberação é que tudo deve estar aberto para novos desafios. Minha resposta é que as agendas de pesquisa devem partir de algum pressuposto básico sobre a natureza humana, e o pressuposto da minha agenda é que, apesar de toda a maldade que há no mundo, ao menos alguns seres humanos têm, em algum momento, um senso de bondade que os leva realmente a se preocuparem pelo bem-estar dos demais. Aceito que outros pesquisadores não compartilhem esse pressuposto e criem suas próprias agendas de 16 Nelson Mandela, Long Walk to Freedom (New York: Little, Brown and Company, 1995), p. 622. 17 Personal communication, July 30, 2011. 8
  • 9. pesquisa. Afinal de contas, a boa pesquisa se beneficia da competição, incluindo a competição por pressupostos básicos sobre a natureza humana. Tendo estabelecido por que faz sentido trabalhar com o modelo deliberativo, passarei agora a tratá-lo com maior detalhe. Em primeiro lugar, tratarei da questão do vocabulário. Alguns teóricos como Dennis F. Thompson18, Joshua Cohen19 e Claudia Landwehr e Katharina Holzinger20 utilizam o termo "deliberação" somente para fóruns nos quais é necessário tomar uma decisão, como comitês parlamentares, mas não, por exemplo, para discussões que ocorrem na televisão ou entre vizinhos. Mansbridge propõe "usar adjetivos para fazer uma distinção importante entre a deliberação em fóruns, empoderados para a toma de decisões vinculantes, e outras formas de decisão"21. Para situações nas quais é preciso tomar decisões vinculantes, ela sugere usar a expressão "deliberação empoderada". Para os casos em que não se busca a toma de decisões vinculantes, Mansbridge utiliza outras distinções com a ajuda de outros adjetivos, como "deliberação consultiva" para "fóruns empoderados somente para aconselhamento de uma autoridade decisória" ou "deliberação pública" para "fóruns abertos ao público, mas que não geram decisões vinculantes, como audiências públicas"22. Mansbridge utiliza ainda outros adjetivos para fazer outras distinções no campo da deliberação. Concordo com Thompson, Cohen, Landwehr, Holzinger e Mansbridge em que é necessário fazer distinções importantes. Prefiro, entretanto, 18 Para Thompson, deliberação significa "discussão orientada à toma de decisão". Dennis F. Thompson, "Deliberative Democratic Theory and Empirical Political Science," Annual Review of Political Science 11 (2008), 503-4. 19 Para Cohen, significa "ponderar as razões relevantes para tomar uma decisão com vistas a que a decisão esteja baseada na ponderação". Joshua Cohen, "Deliberative Democracy," in Shawn W. Rosenberg (ed.), Par t icipat ion and Democracy: Can the People Govern? (New York: Palgrave Macmillan, 2200 07), p. 219. Claudia Landwehr and Katharina Holzinger, "Institutional Determinants of Deliberative Interaction," European Pol i t ica l Science Review 2 (2010), 373-400. 21 Jane Mansbridge, "Everyday Talk Goes Viral," paper presented at the annual meeting of the American Political Science Association, Washington, DC, September 2-5, 2010. 22 Mansbridge, "Everyday Talk Goes Viral." 9
  • 10. 10 usar o termo deliberação de forma genérica para depois caracterizar verbalmente os fóruns nos quais a deliberação ocorre. Quando escrevo, por exemplo, no capítulo 8, sobre a deliberação nos meios de comunicação, não uso a expressão "deliberação midiática". Ao invés disso, caracterizo o meio específico no qual estou interessado, como por exemplo, deliberação em jornais de elite, deliberação em jornais de boulevard ou deliberação na Internet. Uma vez esclarecidas essas questões terminológicas, passarei a tratar mais especificamente do modelo de deliberação em suas variadas expressões. Ainda que exista consenso entre os teóricos da deliberação sobre o princípio geral de que os argumentos deveriam ser importantes para a discussão política, existem desacordos bastante fortes em como esse princípio deveria ser implementado. Mansbridge assinala que esses desacordos tornaram-se maiores nos últimos anos23. Hoje, o conceito de deliberação é um conceito bastante fluido. Jensen Sass e John S. Dryzek vêm a deliberação como prática cultural "com significado e significância que variam substancialmente entre contextos e ao longo do tempo... Portanto, a forma como a deliberação é vista na América do Norte ou na Europa Ocidental difere muito da maneira como aparece em Botswana, Madagascar ou Iêmen"24. Dada tal variação, Sass e Dryzek consideram adequado não usar definições universais de deliberação, mas adaptar tais definições aos respectivos contextos históricos e culturais25. Com essa ampla orientação de pesquisa, não é de se surpreender que o desacordo a respeito da definição exata de deliberação seja cada vez maior. Farei uma aproximação geral breve a tais desacordos sobre definições, que 23 Jane Mansbridge, "Recent Advances in Deliberative Theory," paper presentado no Max Weber Workshop on Deliberation in Politics na New York University, October 29, 2010. 24 Jensen Sass and John S. Dryzek, "Deliberative Cultures," paper presented at the Workshop on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011, p. 4. 25 Sass and Dryzek, "Deliberative Cultures," p. 11.
  • 11. serão discutidos posteriormente em maior detalhe nos respectivos capítulos. Um dos pontos de desacordo diz respeito a quão intensamente cidadãos comuns deveriam estar envolvidos no processo deliberativo. Por um lado está o argumento que defende que os cidadãos comuns deveriam participar tanto quanto possível dos processos deliberativos. Na vida diária, discutem-se assuntos políticos na família, entre amigos e vizinhos, no trabalho e em clubes e associações. Neste sentido, os cidadãos comuns são também atores políticos e deveria ser aplicado o princípio de que estão dispostos a serem convencidos pela força do melhor argumento. Portanto, no âmbito dos cidadãos, a formação de opiniões ocorre de maneira reflexiva. Essas opiniões decorrentes da reflexão são comunicadas aos líderes políticos através de diferentes canais como encontros pessoais, reuniões públicas, mídia e Internet. Por outro lado, alguns teóricos consideram que a participação de todos os cidadãos comuns no processo deliberativo é totalmente irrealista. De seu ponto de vista, seria mais realista esperar que todos os cidadãos tivessem a oportunidade de participar, sendo que na prática apenas um pequeno número de pessoas poderá participar regularmente das deliberações políticas, por exemplo em míni-públicos compostos aleatoriamente. Há ainda desacordo sobre a justificativa de argumentos para a deliberação: SE os argumentos precisam ser justificados de forma racional, lógica e elaborada ou se as narrativas das histórias de vida podem também servir como justificativas para a deliberação. Os argumentos apresentados de maneira racional, lógica e elaborada podem ser avaliados com base na lógica formal. Permitir somente argumentos racionais, lógicos e elaborados origina críticas de teóricos que argumentam que tal definição discrimina as pessoas que têm pouca habilidade em racionalização. Dado o espírito inclusivo do modelo de deliberação, essas pessoas também deveriam poder participar do processo político. Se há, por exemplo, uma reunião da direção de uma escola pública numa comunidade local, o fato de que os pais contem histórias sobre os graves problemas de consumo de drogas que seus filhos apresentam também deveriam contar 11
  • 12. 12 como justificativas deliberativas. Contar essas histórias pessoais envolverá muita emoção e empatia não autorizadas na aproximação puramente racional da deliberação. Há também desacordo sobre se, na deliberação, todos os argumentos devem dizer respeito ao interesse público ou se argumentos relacionados a interesses privados ou específicos de um grupo devem ser considerados. A qualidade do ar é um exemplo de interesse público, já que todos nos beneficiamos desse bem. Alguns teóricos argumentam que somente as questões de interesse público pertencem ao discurso deliberativo. Outros, contudo, incluiriam interesses individuais e grupais. Por exemplo, estabelecer padrões de qualidade do ar mais estritos geraria desemprego e provocaria sofrimento para os trabalhadores da indústria automobilística. Falando em termos gerais, não é fácil distinguir entre interesse público e interesse grupal. Interesses grupais como o dos trabalhadores da indústria automobilística podem atravessar as fronteiras nacionais, por exemplo entre os Estados Unidos e o Canadá. No que diz respeito a certos assuntos, vários países ou o mundo todo compartilham um interesse público comum. Portanto, os conceitos de interesse público e interesse grupal não podem ser considerados unicamente no interior das fronteiras dos estados nacionais. Qualquer argumento pode ser considerado na deliberação? Novamente, temos aqui desacordo. Alguns teóricos adotam a posição de que todos os argumentos, independentemente de parecerem ofensivos, devem ser ouvidos com respeito e tomados com seriedade. Uma crítica a essa posição é que se um dado argumento viola os direitos humanos fundamentais, seu mérito não deveria ser considerado de forma alguma. Se alguém oferecer, por exemplo, um posicionamento racista, seu argumento não deveria ser discutido por princípio porque viola um direito humano fundamental. Ainda que tal posicionamento não deva ser discutido, poder-se-ia ainda argumentar que existe obrigação de justificar por que se trata de um posicionamento racista e, portanto, sua discussão fica vetada. Outro ponto de desacordo diz respeito a se a deliberação necessariamente deve terminar em consenso. Por um lado, existe a expectativa de que pessoas razoáveis
  • 13. conseguirão entrar em acordo sob a força de diferentes argumentos, de forma que o consenso seria um resultado natural. Esta visão está baseada no pressuposto de que por trás das preferências individuais existe um núcleo básico de racionalidade evidente para o indivíduo quando somente as habilidades de raciocínio são utilizadas. Portanto, o consenso deveria ser construído sobre as mesmas razões. Uma forma mais branda de entender a argumentação para consenso é que os atores podem ter diferentes razões para chegar ao consenso. Por outro lado, existe também a visão que defende que certos valores profundamente assentados podem vir a ser tão irreconciliáveis que, apesar de todas as referências à racionalidade, não serão possíveis ou nem mesmo desejáveis. Existe também, contra a ideia de consenso, o argumento pragmático que considera que as limitações de tempo frequentemente impossibilitam que a conversa siga até que todos estejam de acordo. Em algumas ocasiões é preciso recorrer à votação, colocando-se assim parte dos participantes numa minoria. A chave para a deliberação é que as opiniões das minorias perdedoras sejam tratadas com respeito e devidamente consideradas. É também importante que as decisões sejam consideradas, na maior parte, falíveis, e possam ser retomadas mais adiante quando novas informações e novos argumentos surgirem. Para alguns teóricos, a boa deliberação pressupõe transparência e abertura aos olhos públicos, enquanto que outros teóricos destacam que sob certas condições, a deliberação pode se beneficiar de discussões nos bastidores que possam ser mais sérias e menos apoteóticas. Tais teóricos apontam também que a deliberação nos bastidores pode auxiliar na deliberação posterior sob os olhos públicos. Os teóricos também discordam a respeito da importância da sinceridade na deliberação. Alguns não estão muito interessados em saber por que alguém se engaja na deliberação. O que importa, de acordo com esta visão, é se os participantes mostram respeito pelos argumentos dos demais, independentemente de se esse respeito é oferecido de forma sincera ou não. Em contraste, outros teóricos vêm na sinceridade o elemento chave da deliberação. A deliberação não verdadeira seria tão somente uma 13
  • 14. 14 estratégia retórica inteligente. Demonstrar respeito pelos argumentos dos demais poderia simplesmente ser mais um entre outros interesses particulares. Isso eliminaria a essência da deliberação, que também possui um valor intrínseco importante para a auto-atualização, e esse valor poderia ser negado pela falta de sinceridade. Espero que este livro traga alguma luz para essas controvérsias presentes na literatura teórica sobre deliberação. É certamente possível que os dados empíricos a serem apresentados não resolvam as controvérsias. A maneira como alguém define um conceito dependerá de sua agenda de pesquisa e essa agenda, por outra parte, dependerá das normas de valores do pesquisador. Considerar, por exemplo, a narração de histórias como deliberação dependerá, entre outras coisas, da noção que essa pessoa tenha sobre racionalidade. Ainda que os dados empíricos não possam resolver tais controvérsias, podem ajudar a esclarecer as relações empíricas e causais entre os diferentes elementos da deliberação. Por exemplo, poderíamos dizer que uma justificativa lógica, racional e elaborada dos argumentos de alguém conduz a maior ou menor respeito pelos argumentos dos demais do que os argumentos justificados por uma história pessoal? Os dados empíricos podem também mostrar como os antecedentes e consequentes da deliberação podem variar dependendo da definição de deliberação. (b) Pesquisa empírica em deliberação Afinal de contas, quais são os dados empíricos que usarei para trazer à luz controvérsias normativas sobre o modelo de democracia deliberativa? Na literatura é possível encontrar dados de observação e experimentais. Em nosso grupo de pesquisa usamos ambos os métodos. Começamos com dados de observações de debates parlamentares na Alemanha, Suíça, Reino Unido e Estados Unidos. Essas análises foram discutidas em um livro anterior, publicado pela Cambridge University Press in 200426. Para medir o grau de deliberação em ambas as 26 Jürg Steiner, André Bächtiger, Markus Spörndli, and Marco R. Steenbergen, Del iberat i ve Pol i t ic s in Act ion: Analys ing Par l iamentary Di scour se (Cambridge University Press, 2005).
  • 15. seções plenárias e reuniões de comitês desenvolvemos um índice que chamamos de Índice de Qualidade do Discurso (IQD, DQI em inglês), que cobria inicialmente os seguintes aspectos da deliberação (a forma como o IQD é empregado na prática será tratada em outro lugar27): 1. participação no debate; 2. grau de justificativa dos argumentos; 3. conteúdo da justificativa dos argumentos; 4. respeito demonstrado por outros grupos; 5. respeito demonstrado pelas demandas de outros participantes; 6. respeito demonstrado pelos contra-argumentos de outros participantes; 7.mudanças de posição durante o debate. Os teóricos críticos e pós-modernos preocupam-se sobre qualquer tentativa de medir a qualidade da deliberação28. Eles argumentam que as medidas da deliberação nunca são objetivas, mas sempre interpretações subjetivas. Não nego que nossa codificação esteja sujeita à interpretação. Ao longo da apresentação do IQD em nosso livro explicitamos claramente que "medir a qualidade do discurso requer interpretação. É necessário conhecer a cultura da instituição política, o contexto do debate e a natureza do assunto em discussão"29. A interpretação, para ser certeira, nunca pode obter objetividade absoluta. Não se trata de escolher entre objetividade e subjetividade. (Roberto Gondo – sobre a minha Subjetividade) Nenhum pesquisador sério das ciências sociais declarou ter alcançado a verdade objetiva. Todas as interpretações contêm elementos subjetivos, mas as interpretações não são todas iguais. Nem tudo 27 André Bächtiger, Jürg Steiner, and John Gastil, "The Discourse Quality Index Approach to Measuring Deliberation," in Lyn Carson, John Gastil, Ron Lubenski, and Janette Hartz-Karp (eds.), The Aus t ral ian Ci t i zens ' Par l iament and the Future of Del iberat ive Democracy (College Park: Penn State University Press, forthcoming). 28 Ver, por exemplo Martin King, "A Critical Assessment of Steenbergen et al.'s Discourse Quality Index," Roundhouse: A Journal of Cr i t ical Theory and Pract i ce 1 (2009), online: www.essl.leeds.ac.uk/roundhouse, pp. 6-7. 29 Steiner et al . , Del iberat i ve Pol i t ic s in Act ion, p. 60. 15
  • 16. 16 funciona. O critério para uma interpretação acadêmica frutífera é se é exitosa para a obtenção de algum grau de intersubjetividade, resultando em um grau suficiente de confiabilidade entre codificadores. É isso que obtemos em nossa pesquisa com o IQD. O IDQ sempre foi considerado um instrumento de medida flexível que precisa ser adaptado a projetos de pesquisa específicos. Sou a favor desse pluralismo em métodos de pesquisa, que correspondem a uma aplicação do discurso deliberativo sobre como fazer pesquisa em deliberação. É precisamente o lugar onde se dá a boa deliberação que ninguém no mundo diz observar com absoluta objetividade. Isso vale também para a pesquisa acadêmica em deliberação. Feita a tentativa de medir o grau de deliberação dos debates parlamentares, observamos as causalidades dos antecedentes e consequentes da variação no grau de deliberação. No que diz respeito aos antecedentes, estávamos interessados principalmente nos aspectos institucionais e examinamos as seguintes dimensões: 1. instituições que favoreciam o consenso versus instituições que favoreciam a competição; 2. atores de veto forte ou fraco; 3. sistemas parlamentares e sistemas presidencialistas; 4. primeiras e segundas câmaras parlamentares; 5. arenas públicas e arenas não-públicas. Observamos também as questões substantivas em debate, colocando foco sobre a dimensão das questões polarizadas versus questões não polarizadas. No que diz respeito às consequências da variação no grau de deliberação, examinamos os aspectos formais e substantivos dos resultados da decisão. No aspecto formal, debruçamos nosso foco sobre se as decisões foram tomadas com unanimidade ou por voto majoritário. No aspecto substantivo, questionamos até que ponto os resultados da decisão correspondem ao critério de justiça social. Deixe-me agora descrever como organizaremos as seções empíricas em cada capítulo. No início da maior parte das seções empíricas, voltarei sobre nosso estudo anterior sobre debates
  • 17. parlamentares, mas somente naquilo que os resultados mostraram sobre controvérsias filosóficas, ajudando-me a fundamentar minhas conclusões normativas. Depois continuo com uma ampla revisão da literatura empírica sobre deliberação. Portanto, levo em consideração todos os estudos que pude reunir nos quais o grau de deliberação é realmente medido e não meramente assumido. Tento oferecer, na medida do possível, uma revisão completa da pesquisa na qual o grau de deliberação é medido de forma suficientemente confiável e válida. Por necessidade, alguns países estão mais cobertos do que outros, e algumas dimensões conflitantes mais do que outras. Ao final da seção sobre dados empíricos, apresento resultados de experimentos recentes sobre deliberação que nosso grupo de pesquisa realizou na Colômbia, Bósnia-Herzegovina, Bélgica, União Europeia e Finlândia. Por que foram escolhidos justamente esses países? A maior parte da literatura empírica existente sobre deliberação provém de democracias estáveis tais como Alemanha, Holanda, França e Canadá. Esses dados empíricos são úteis para se pensar de maneira geral sobre a democracia deliberativa. Contudo, a deliberação se faz mais necessária justamente nos países profundamente divididos por conflitos militares internos. Naturalmente, é mais difícil obter deliberação nesses países. O máximo que se pode esperar, provavelmente, é que as pessoas queiram reconhecer que as posições adotadas ao outro lado da profunda divisão também são legítimas, ainda que não concordem com elas. Quando esse reconhecimento é obtido, o outro lado é humanizado, o que poderia tornar menos provável que alguém atirasse e matasse ao outro lado da profunda cisão. Se olharmos para o mundo atual, os verdadeiros pontos problemáticos são países profundamente divididos e envolvidos em conflitos militares internos. Minha esperança é que a aproximação deliberativa possa oferecer algo a esses países de forma que possam a aprender a lidar pacificamente com seus conflitos. Portanto, minha esperança está mais ligada aos cidadãos comuns do que a líderes políticos, que muitas vezes só estão interessados em manter cisões profundas para 17
  • 18. 18 permanecerem dos no nos spodoers. Aessstiumd,o so efosctoá no nível do cidadão. A Colômbia corresponde exatamente ao meu interesse de pesquisa, com combates militares em curso entre guerrilhas de esquerda e paramilitares de direita. Na Bósnia-Herzegovina, com cisões profundas entre servos, croatas e bósnios, a guerra civil acabou, mas suas consequências ainda são muito perceptíveis. Incluímos também a Bélgica, onde a divisão linguística entre flamengos e valões é cada dia maior, ainda que até o momento não tenha resultado em violência política. O caso da Bélgica é um caso limite para meu objetivo de pesquisa principal e será interessante ver até que ponto o grau de deliberação difere na Bélgica da Colômbia e da Bósnia-Herzegovina. Incluímos a Finlândia como um caso real de contraste, com pequenas divisões entre falantes de finlandês e sueco. A União Europeia, finalmente, é um caso interessante em si mesmo, com muitas guerras entre os países-membros no passado, e com relações ainda às vezes complicadas entre alguns membros na atualidade. Não apresentarei uma análise completamente detalhada dos nossos experimentos nesses quatro países e União Europeia, limitando-me ao que é útil para este livro orientado para o aspecto normativo. Um livro em coautoria, orientado à análise e intitulado Potential for Deliberation Across Deep Divisions (Potencial para deliberação aravés de cisões profundas) está sendo preparado. Os colaboradores de cada parte das pesquisas experimentais são: • Maria Clara Jaramillo (Colômbia); • Juan Ugarriza (Colômbia); • Simona Mameli (Bósnia-Herzegovina); • Didier Caluwaerts (Bélgica); • Marlene Gerber (Európolis); • Staffan Himmelroos (Finlândia). Por que escolhemos o método experimental? Um método de pesquisa possível teria sido usar sondagens perguntando às
  • 19. pessoas o quão deliberativas elas são quando conversam sobre política na família, com amigos e vizinhos e no ambiente de trabalho. Tais sondagens introduzem o risco de que os participantes digam o que é socialmente desejável, ou seja, que eles são deliberativos quando falam de política mostrando, por exemplo, respeito pela opinião dos demais e vontade de acatar o melhor argumento. Tendo em vista o problema que isso representa para a pesquisa em questão, optamos pelo desenho experimental como método. Isso significa concretamente que reunimos cidadãos comuns para discutir sobre um tópico em particular. Os participantes tiveram que preencher questionários antes e depois dos experimentos. As discussões foram gravadas e codificadas com um IQD expandido que o leitor encontrará no Apêndice. Vejamos agora os desenhos de pesquisa utilizados nos cinco casos de teste. Desenho de pesquisa para a Colômbia Maria Clara Jaramillo e Juan Ugarriza foram responsáveis pela porção da pesquisa correspondente à Colômbia. Eles planejaram, inicialmente, desenvolver a pesquisa com estudantes universitários, o que do ponto de vista organizacional teria sido relativamente simples. Mas optaram por um desafio maior, onde a deliberação é particularmente mais difícil de ocorrer e, portanto, mais necessária. Encontraram esse desafio nos ex-combatentes do conflito armado interno. Ocorre que, quando Jaramillo e Ugarriza iniciaram sua pesquisa, o governo colombiano tinha um programa de desarticulação em andamento. Esse programa foi aplicado aos combatentes de grupos de guerrilha esquerdistas (particularmente as FARC, Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia e alguns grupos de guerrilha menores) e das forças paramilitares de extrema direita. Estariam ex-combatentes que há pouco estavam dando tiros uns nos outros dispostos a participar juntos de experimentos sobre deliberação? Esse foi o desafio no início da pesquisa, que exigiu muita paciência, entusiasmo 19
  • 20. 20 e habilidade por parte de Jaramillo e Ugarriza para finalmente organizar 28 experimentos com um total de 342 participantes. Para conseguir remuneração econômica, os ex-combatentes tiveram que participar de um programa de reintegração da Agência do Alto Comissariado para a Reintegração. Psicólogos e assistentes sociais agiram como orientadores e os ex-combatentes tiveram que participar duas vezes por mês de sessões de grupo com eles. Focamos nossa pesquisa na região da grande Bogotá, onde cerca de 3.000 ex-combatentes participavam do programa de reintegração. Eram, na maioria, homens com pouco grau de instrução. Inicialmente tentamos selecionar uma amostra aleatória para participação no estudo. Mas os orientadores nos advertiram sobre os problemas de segurança, já que muitos dos ex-combatentes estavam gravemente traumatizados e, portanto, eram violentos ou perturbados. Havia também um problema de motivação: na primeira fase da pesquisa, muitos ex-combatentes convidados para o estudo simplesmente não apareceram. Os orientadores nos ajudaram com uma solução que oferecia aos ex-combatentes os incentivos necessários para participar dos estudos. Eles poderiam substituir as sessões quinzenais pela participação em um único estudo e ainda receberiam a remuneração econômica. O fato de os estudos terem lugar nos consultórios dos orientadores também ajudou. Os orientadores permaneceram por perto para o caso de ocorrer alguma manifestação violenta. Graças à Agência do Alto Comissionado para a Reintegração, obtivemos dados aproximados sobre o total da população de 3000 ex-combatentes na região de Bogotá em termos de gênero, idade e grau de instrução. Para tais critérios, os 342 ex-combatentes que participaram dos estudos correspondiam, grosso modo, ao total da população de ex-combatentes da região de Bogotá30. Isso era reconfortante, apesar de que não podíamos 30 Dos ex-combatentes participantes dos nossos experimentos, 15 por cento eram mulheres, em comparação com 16 por cento na população total de ex-combatentes na região de Bogotá. Cerca de 30 por cento dos participantes nos experimentos tinham entre 18 e 25 anos de idade, comparados com 37 por cento região de Bogotá. No que diz respeito à educação, é preciso diferenciar entre ex-guerrilheiros
  • 21. afirmar que os ex-combatentes participantes correspondiam a uma amostra aleatória da população total de ex-combatentes. Quão grandes eram as diferenças entre os ex-guerrilheiros e ex-paramilitares que se voluntariaram para participar dos experimentos? Como hipótese nula, assumimos que não havia diferenças. Essa hipótese é até certo ponto plausível porque poderia ser que os ex-combatentes não estivessem ideologicamente orientados, mas estivessem simplesmente procurando por um trabalho remunerado e não se importariam com o lado ao qual teriam que se unir. Isso poderia ter sido fatal para os propósitos dos nossos estudos, já que estávamos interessados em estudar as discussões políticas através de cisões profundas. A hipótese nula pode ser rejeitada. Os ex-guerrilheiros estavam sobrerrepresentados no grupo de idade mais jovem e tinham também mais mulheres do que os ex-paramilitares. No que diz respeito ao grau de instrução e à classe social, os ex-guerrilheiros tinham menor grau de escolarização formal e eram mais pobres do que os paramilitares31. As grandes diferenças políticas existentes entre os dois grupos foi particularmente importante para a interpretação dos resultados. Os ex-guerrilheiros provinham em muito maior medida de famílias de esquerda, enquanto os ex-paramilitares provinham principalmente de famílias de direita. Dessa forma, o envolvimento dos ex-combatentes com um dos dois lados do conflito não ocorreu por acaso. O indicador mais claro das divisões ainda profundas entre os dois grupos veio à luz em resposta à pergunta sobre suas atitudes em relação aos combatentes que ainda lutam na selva. Ainda que os participantes dos experimentos tinha abandonado seus antigos camaradas, expressaram uma atitude mais positiva em relação ao seu próprio lado do que em relação ao outro. Isso não era necessariamente esperado, já que poderíamos imaginar que os e ex-paramilitares. Entre os ex-guerrilheiros participantes, 60 por cento tinham 11 anos de escolaridade ou menos, para 64 por cento no total de ex-guerrilheiros em toda a região de Bogotá. No caso dos ex-paramilitares, os números ficam entre 41 e 36 por cento. 31 É preciso considerar, entretanto, que os ex-guerrilheiros receberam algum grau de educação informal durante o tempo em que permaneceram no campo. 21
  • 22. 22 ex-combatentes abandonaram as lutas porque não concordavam mais com a causa de seu lado. Ainda que alguns tenham deixado as lutas por isso, a maioria ainda tinha mais simpatia por seu próprio lado do que pelo outro. Provavelmente saíram das selvas porque já estavam fartos de lutar e se sentiram atraídos pelos benefícios dos programas governamentais de reconciliação. A conclusão de todos esses dados é que os participantes dos estudos formaram dois grupos diferentes, não somente no que diz respeito às características demográficas, mas também no sentido político. Como desenho experimental ideal, cada experimento deveria ter incluído o mesmo número de participantes com a mesma distribuição entre ex-guerrilheiros e ex-paramilitares. Mas dadas todas as dificuldades de adesão, estávamos distantes de conseguir atingir esse ideal. Não era uma situação de laboratório onde é possível manter tudo sob controle. Para aprender sobre os ex-combatentes, era o melhor que podíamos fazer. Nas ciências sociais, as questões realmente interessantes quase nunca podem ser estudadas em situações totalmente controladas, de forma que é preciso partir para desenhos menos perfeccionistas. Antes e depois dos experimentos, os participantes tiveram que preencher questionários sobre características demográficas e políticas, assim como questões de cunho psicológico. Esses dados ajudarão a testar as hipóteses sobre os antecedentes e consequências das variações no grau de deliberação entre os 28 estudos e também no âmbito da participação individual. Institucionalmente, o desenho de pesquisa incluiu variações, sendo que a metade dos grupos não tinha que tomar nenhuma decisão no final do experimento, enquanto que a outra metade deveria decidir entre um conjunto de recomendações sobre o futuro da Colômbia para enviar para o Alto Comissariado para a Reintegração. A metade dessas decisões deveria ser tomada por voto majoritário e a outra metade por unanimidade. As cartas foram efetivamente enviadas para o Alto Comissariado de forma que para a metade dos estudos as discussões tiveram relevância política imediata, enquanto que para a outra metade as discussões não produziram efeitos externos imediatos.
  • 23. Para a organização prática dos estudos, logo no início Jaramillo e Ugarriza estabeleceram o seguinte tópico de discussão: "Quais são as suas recomendações para que a Colômbia tenha um futuro de paz, no qual as pessoas de esquerda, de direita, guerrilheiros e paramilitares possam viver juntos em paz?" Em contraste com outros experimentos do gênero, e em particular a "Sondagem Deliberativa"32, nenhum material de briefing foi oferecido antes sobre o assunto a ser discutido. Além disso, em contraste ainda com esse mesmo estudo, os moderadores não intervieram para incentivar o comportamento deliberativo. Estávamos interessados, de fato, em ver até que ponto os ex-combatentes estavam dispostos e capacitados para se comportar de forma deliberativa sem nenhum tipo de ajuda externa. Se, por exemplo, alguns participantes não falaram durante todo o experimento, os moderadores não pediriam que falassem. Ou, quando as opiniões foram expressadas sem justificativas, os moderadores não perguntaram por que tais opiniões foram sustentadas. Portanto, a discussão flutuou livremente nos limites de um tópico amplamente formulado. Não fornecer material ou informação sobre os experimentos antes e o fato de que os moderadores não interviessem nas discussões eliminou dois possíveis fatores que poderiam confundir nossa análise causal. Depois de 45 minutos, Jaramillo e Ugarriza finalizaram a discussão. Desenho de pesquisa para a Bósnia-Herzegovina – sábado 18/05/2013 A Bósnia-Herzegovina, com seu recente conflito armado interno, também foi um lugar difícil para a realização dos experimentos. A responsável por esta parte do projeto foi Simona Mameli . Ela organizou um experimento de teste preliminar em Sarajevo, mas chegou à conclusão de que não era um bom lugar para desenvolver sua pesquisa. O motivo foi que ela se deparou com muitas famílias etnicamente mistas, o que dificultou a formação de grupos com cisões profundas. Mameli escolheu então dois lugares onde a guerra civil foi particularmente feroz, Srebrenica e Stolac. Em Srebrenica, como bem se sabe, um 32 Veja abaixo o desenho experimental Európolis. 23
  • 24. 24 grande número de homens muçulmanos foram brutalmente assassinados pelos sérvios. Na Bósnia-Herzegovina, os muçulmanos preferem ser chamados de bósnios, e não querem ser identificados com a religião. Eu também usarei esse termo. Stolac apresenta uma cisão profunda entre croatas e bósnios. Stolac fica próxima da mais conhecida cidade de Mostar. Os dois lugares sofreram lutas sangrentas. Mameli decidiu realizar seus experimentos em Stolac porque Mostar tornou-se um destino turístico demais. O desenho experimental utilizado na Bósnia-Herzegovina foi basicamente o mesmo usado na Colômbia no sentido de que não foram fornecidos materiais informativos antes e de que os moderadores não intervieram para incentivar o comportamento deliberativo. Em Srebrenica, Mameli organizou seis experimentos com 40 participantes: 22 mulheres e 18 homens. Em três experimentos ela selecionou os participantes utilizando um método denominado "caminhada aleatória" (também conhecido como "caminhada do bêbado"). Para tanto ela caminhou pelas ruas de Srebrenica e abordou pessoas de forma aleatória, convidando-as para participar dos experimentos. Teria sido melhor extrair amostras aleatórias a partir de listas de habitantes de Srebrenica sérvios e bósnios, mas como não existem tais listas, a caminhada aleatória foi o segundo melhor método de seleção disponível. Ao adotar a caminhada aleatória para a seleção de participantes, Mameli deparou-se com duas dificuldades. Uma delas estava relacionada ao padrão de vida da população bósnia. Os bósnios são maioria em Srebrenica, mas muitos só estão formalmente registrados na cidade e preferem passar a maior parte to tempo em outro lugar. Mameli encontrou muitas casas de bósnios vazias. Parece que muitos voltam somente para as eleições ou eventos comemorativos do genocídio, pois as memórias traumáticas fazem com que seja muito difícil para eles morar em Srebrenica. Aparentemente os bósnios mais moderados tendem a viver permanentemente em Srebrenica. Para os experimentos, isto significou que provavelmente a amostra estava composta mais por bósnios
  • 25. moderados. Esse viés ocorreu também na Colômbia, onde, como vimos antes, os ex-combatentes mais violentos e psicologicamente abalados tiveram que ser excluídos dos estudos. Isto não é o ideal do ponto de vista do desenho experimental, mas assim é a vida nas sociedades que enfrentam conflitos armados internos atuais ou recentes. A segunda dificuldade relacionada à busca de participantes através da caminhada aleatória foi que algumas pessoas, tanto servios como bósnios, não quiseram participar ou, nos casos em que prometeram comparecer, não apareceram. Para os outros três experimentos realizados em Srebrenica queríamos que os participantes tivessem sido expostos a um programa de reconciliação e construção de paz para examinar se a participação em tais programas faria alguma diferença no comportamento demonstrado nos experimentos. O Centro para o Diálogo de Nansen, uma ONG norueguesa, tem um programa assim. Seu principal objetivo é "contribuir com a reconciliação e com a construção da paz através do diálogo interétnico"33. A equipe do centro ajudou no recrutamento de pessoas que poderiam participar em suas atividades, tornando a seleção o mais aleatória possível. Algumas das pessoas recrutadas pelo Centro para o Diálogo de Nansen também não compareceram. Portanto, assim como na Colômbia, os seis grupos experimentais de Srebrenica tiveram tamanhos diferentes e nem sempre o mesmo número de sérvios e bósnios. Uma vez mais, foi o melhor que pudemos fazer num lugar onde ocorreu o pior genocídio na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. De certa forma foi uma surpresa que Mameli conseguisse realizar os seis experimentos, já que poderíamos esperar que fosse impossível encontrar sérvios e bósnios que quisessem se sentar juntos na mesma mesa. A organização prática dos experimentos em Srebrenica foi basicamente a mesma adotada na Colômbia. Os participantes tiveram que preencher questionários antes e depois dos experimentos. Com exceção de algumas adaptações locais, os questionários foram os mesmos usados na Colômbia. No início de cada experimento, Mameli, assistida por 33 Consulte www.nansen-dialogue.net/content. 25
  • 26. 26 um amigo da região, ofereceu o tópico de discussão, que consistia em formular recomendações para um futuro melhor na Bósnia-Herzegovina. Os participantes teriam que formular em comum acordo um conjunto de recomendações para enviar para o Alto Representante da Bósnia e Herzegovina. Diferentemente da Colômbia, essa decisão teria que ser tomada em todos os experimentos. Houve também microexperimentos para introduzir outra variável de controle. Contrariamente à Colômbia, onde, por razões de segurança as discussões foram somente gravadas em áudio, os experimentos realizados em Srebrenica foram gravados em áudio e vídeo. Em Stolac, os experimentos foram organizados da mesma forma que em Srebrenica. Como já foi mencionado, a cidade está profundamente dividida entre croatas e bósnios. Os croatas são maioria, e o prefeito pertence a um partido nacionalista croata. Supõe-se que haja certa partilha de poder com o partido nacionalista bósnio, mas os resultados não são nada bons. Há bandeiras croatas por todas as partes, causando ressentimento entre os bósnios. Como em Srebrenica, há um sentimento geral de cansaço e desilusão. O Alto Comissário visitou a cidade no ano anterior e ouviu os problemas da população, mas nada mudou desde sua visita. Com isso os habitantes de Stolac não só estão frustrados com sua própria administração local, mas também com os "internacionais", que pareciam tornar as coisas ainda piores. Simona Mameli, novamente assistida por um amigo familiarizado com a situação, conseguiu também realizar os seis experimentos em Stolac com um total de 35 participantes: 20 mulheres e 15 homens. Como em Srebrenica, a metade dos participantes dos experimentos foi recrutada pelo Centro para o Diálogo de Nansen e a outra metade através do percurso aleatório pelas ruas da cidade. Novamente, nem todas as pessoas que prometeram comparecer o fizeram, de forma que o número de participantes sofreu variações e croatas e bósnios não estavam sempre em igualdade numérica. Como em Srebrenica, provavelmente houve um viés em favor da moderação entre os que participaram dos experimentos.
  • 27. Desenho de pesquisa para a Bélgica A Bélgica enfrenta uma divisão cada vez mais profunda entre flamengos (que falam holandês) e valões (que falam francês). Em contraste com a Colômbia e com a Bósnia-Herzegovina, nunca houve nenhum conflito armado entre os dois grupos linguísticos, de forma que foi mais fácil organizar os experimentos. Um fator que ajudou particularmente foi que Didier Caluwaerts, o organizador dos experimentos, pôde confiar numa agência de pesquisa com experiência em realizar pela Internet pesquisas sociais34. Com base nessas pesquisas, Caluwaerts selecionou pessoas a serem convidadas para participar dos experimentos, usando o método de amostragem baseado na heterogeneidade. Ele queria que em cada grupo experimental houvesse suficiente variedade com relação a gênero, idade e grau de instrução. Além disso, ele queria que cada grupo contivesse participantes que mostrassem sentimentos positivos ou negativos sobre o outro lado da divisão linguística. Caluwaerts realizou um total de 9 experimentos, convidando 90 pessoas para participar, das quais 83 efetivamente compareceram. Em cada experimento havia ao menos 8 participantes. Como na Colômbia e na Bósnia-Herzegovina, não foi fornecido nenhum material antes, os moderadores não intervieram, e os participantes tiveram que preencher questionários antes e depois dos experimentos. Três experimentos apresentaram homogeneidade flamenga, três apresentaram homogeneidade valã e outros três eram heterogêneos nos dois lados. Similarmente à Colômbia e Bósnia-Herzegovina, o tópico de discussão foi formulado da seguinte forma abrangente: "Como você vê as relações futuras entre os grupos linguísticos na Bélgica?" Os grupos tiveram que tomar uma decisão a respeito do 34 Didier Caluwaerts, "Deliberation across Linguistic Divides: Why It May Be Better to Debate with Imagined Others," paper apresentado no Workshop sobre Fronteiras da Deliberação, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 27
  • 28. 28 seguinte: em três grupos por maioria simples, em três por maioria de dois terços e em outros três por unanimidade. Combinando a composição linguística dos grupos e as regras de decisão obtém-se uma tabela de 9 células (3 x 3) com um experimento em cada campo. Na primeira rodada dos experimentos, de somente alguns minutos, os participantes tiveram que dizer em uma ou duas palavras-chave o que consideravam ser o problema ou fato mais importante na Bélgica. Na segunda rodada, de aproximadamente uma hora e meia, a discussão era livre. Na terceira rodada, também de uma hora e meia aproximadamente, os participantes tinham que discutir tópicos específicos sobre a política atual da Bélgica no que diz respeito à questão linguística. Era necessário tomar decisões depois da segunda e da terceira rodadas. Os experimentos foram realizados em um sábado na University Foundation em Bruxelas, que não mantém nenhum vínculo com nenhuma organização política. Nos três grupos linguisticamente mistos, houve tradução simultânea. Nos grupos flamencos, Caluwaerts, falante nativo da língua holandesa, foi o moderador. Nos grupos valões o moderador foi um falante da língua francesa e nos grupos mistos a moderação foi realizada por falantes de francês e flamenco. Desenho de pesquisa para o projeto Európolis da União Europeia Depois de três estados nação profundamente divididos, passo agora para o nível supranacional da União Europeia (UE). Historicamente, os estados membros da UE enfrentaram, em muitas ocasiões, cisões profundas produzidas pela guerra. Hoje ainda existem divisões profundas entre alguns estados membros, como por exemplo entre a Hungria e a Eslováquia no que diz respeito à situação dos húngaros na Eslováquia. Para realizar os experimentos entre cidadãos europeus comuns, nossa equipe de pesquisa foi convidada a juntar-se ao projeto Európolis e a codificar as discussões com nosso IQD. Este projeto está baseado na ideia de sondagem deliberativa desenvolvida por James S.
  • 29. Fishkin e Robert C. Luskin35. Eles fizeram as seguintes perguntas: "O que aconteceria se o grau de deliberação pudesse ser elevado, se não para todo o público, ao menos para uma amostra aleatória da população? O que ocorreria se a sondagem pudesse se tornar deliberativa?" A resposta que oferecem é a seguinte: "A sondagem deliberativa explora estas possibilidades ao expor amostras aleatórias a informações balanceadas, incentivando as pessoas a ponderar entre argumentos opostos nas discussões com interlocutores heterogêneos, obtendo assim opiniões mais consideradas.36" A ideia de sondagem deliberativa foi posta em prática muitas vezes, por exemplo no ano 2000 de uma forma particularmente elaborada na Dinamarca, antes do referendo sobre o euro37. O projeto Európolis faz parte do 7º Programa de Enquadramento da UE e está coordenado por Pierangelo Isernia da Universidade de Siena. Em 29-31 de maio de 2009, 348 pessoas aleatoriamente selecionadas dos 27 estados membros da UE se reuniram em Bruxelas e discutiram em 25 pequenos grupos primeiro sobre a imigração de fora da UE e depois sobre as mudanças climáticas. Não era necessário tomar decisões no encerramento das discussões dos grupos pequenos. Houve também sessões plenárias com especialistas e políticos. Os participantes tiveram que preencher quatro questionários: um em seus países de origem, outro quando chegassem a Bruxelas, um terceiro ao sair de 35 James S. Fishkin and Robert C. Luskin, "Experimenting with a Democratic Ideal: Deliberative Polling and Public Opinion," Acta Pol i t i ca 40 (2005), 284-98. 36 Fishkin and Luskin, "Experimenting with a Democratic Ideal," 287. 37 Kasper M. Hansen, Del iberat ive Democracy and Opinion Format ion (Odensee: University Press of Southern Denmark), p. 2004. 29
  • 30. 30 Bruxelas e o quarto ao retornarem para seus países. É importante observar que em todos os projetos organizados pela sondagem deliberativa foi feito um esforço especial para criar condições favoráveis para a deliberação. Neste sentido, o desenho da pesquisa é diferente do desenho adotado na Colômbia, Bósnia-Herzegovina e Bélgica, onde não fizemos nenhum esforço especial para criar condições favoráveis à deliberação. No projeto Európolis, foi tudo diferente. No dia anterior ao evento, os moderadores foram treinados em longas sessões. Eram na maioria jovens acadêmicos com ótimas habilidades linguísticas, de diferentes países da UE. Ainda que recebessem a informação de que não deveriam intervir de forma substantiva nas discussões, os moderadores foram instruídos para tornar as discussões o mais deliberativas possível, por exemplo, incentivando todos a falarem, a justificarem seus argumentos e a respeitarem os argumentos dos demais. Outro fator que também contribuiria para a boa deliberação no Európolis foi a informação anterior fornecida aos participantes em uma cartilha de 40 páginas contendo informações sobre a UE e os dois assuntos a serem discutidos. Do ponto de vista gráfico, os principais fatores e os argumentos foram apresentados de forma profissional. Ainda que não se tenha testado se os participantes leram o material, a maioria indicou tê-lo feito ao preencher seus questionários. Comparando o desenho com a Colômbia, Bósnia-Herzegovina e Bélgica, devemos ficar atentos ao fato do desenho do projeto Európolis ter sido muito diferente. Por outro lado, isso tornou as comparações diretas um problema. Contudo, a fortaleza das nossas conclusões está justamente no fato de estarem baseadas em dois desenhos de pesquisa diferentes. Todas as discussões do Európolis foram gravadas em áudio. A natureza multilíngue dos participantes constituiu um problema especial, exigindo a tradução simultânea por intérpretes profissionais. Para tornar a tradução gerenciável, houve apenas duas ou três línguas representadas por grupo. Um dos idiomas foi
  • 31. escolhido para a gravação nas vozes originais e os outros somente na tradução. Este método tem a desvantagem de que os codificadores não puderam ouvir possíveis emoções nas vozes originais dos participantes dos quais somente a tradução foi gravada. Codificar e analisar os 25 grupos em suas discussões sobre imigração e mudança climática levará um bom tempo, sendo coberto em outras publicações futuras. Neste livro, tomo como base a análise que Marlène Gerber et al. fez para ECPR Joint Sessions em St. Gallen, em abril de 201138. Foram investigados 9 dos 25 grupos e somente nas sessões sobre imigração, deixando de fora a mudança climática. Escolheram grupos nos quais o idioma gravado, no original ou na tradução, foi o alemão, o francês ou o polonês. Nos grupos de polonês, pudemos contar com o apoio de uma falante nativa de polonês. Suas transcrições foram traduzidas para o inglês de forma que pudemos verificar a confiabilidade de sua codificação. A discussão sobre imigração veio antes do que a discussão sobre mudança climática. A primeira sessão sobre imigração em pequenos grupos teve lugar na sexta-feira, 29 de maio de 2009 às 16:00h, durando aproximadamente uma hora com um intervalo para café e continuando depois por mais uma hora aproximadamente. No dia seguinte, às 9 horas, houve uma sessão plenária sobre imigração com especialistas com uma hora e meia de duração. Depois de um intervalo houve mais uma sessão de pequenos grupos, que passou rapidamente do assunto imigração para questões políticas mais gerais, de forma que nós a omitimos da codificação. Desenho de pesquisa para a Finlândia Uso a Finlândia como caso controle para os três países fortemente divididos e a UE como caso especial em si mesmo. A Finlândia é um país homogêneo com uma pequena minoria sueca que, contudo, não causa nenhum problema interlinguístico relevante. A Finlândia pode também ser caracterizada como uma 38 Marlène Gerber, André Báchtiger, Susumu Shikano, Simon Reber, and Samuel Rohr, "How Deliberative Are Deliberative Opinion Polls? Why It May Be Better to Debate with Imagined Others," paper apresentado no Workshop sobre Fronteiras da Deliberação, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 31
  • 32. 32 sociedade de consenso. Por isso serve bem como caso controle para testar em que medida nossas conclusões sobre os países profundamente cindidos são específicas de cada caso ou são aplicáveis também a uma sociedade de consenso homogêneo. Assim como ocorreu no projeto Európolis, nos juntamos ao projeto finlandês quando já estava em andamento. Foi lançado inicialmente na Abo Akademi University em Turku por um grupo de pesquisa liderado por Kimmo Grönland, Maija Setälä e Kaisa Herne39. A codificação e a análise com uma versão modificada do IQD foram feitas por Staffan Himmelroos 4 0. Os participantes dos experimentos finlandeses constituíram uma amostra aleatória da região de Turku. Em novembro de 2006, eles discutiram em oito grupos se deveria ser construída na Finlândia a sexta planta nuclear. Cada sessão experimental durou aproximadamente três horas e terminou com uma decisão por voto ou consenso. Foram 90 participantes, totalizando 1.189 atos de fala relevantes relacionados à questão nuclear. Como no Európolis, mas diferentemente dos experimentos realizados na Colômbia, Bósnia-Herzegovina e Bélgica, o projeto Finlândia contou com esforços especiais que contribuíram para condições favoráveis à deliberação. Os participantes receberam material sobre energia nuclear antes e puderam se encontrar com especialistas representantes de diferentes interesses no assunto. No começo das discussões em cada grupo, foram estabelecidas regras de base para lembrar os participantes de que deveriam falar e respeitar os pontos de vista dos outros. As discussões foram lideradas por facilitadores treinados que foram instruídos para não influenciar nos pontos de vista dos participantes, mas para intervir caso se perdesse o foco da discussão ou as características de deliberação se perdessem. 39 Kimmo Grönland, Maija Setälä, and Kaisa Herne, "Deliberation and Civic Virtue: Lessons from a Citizen Deliberation Experiment," European Pol i t ica l Science Review 2 (2010), 95-117. 40 Staffan Himmelroos, "Democratically Speaking: Can Citizen Deliberation Be Considered Fair and Equal?," paper apresentado no Workshop sobre Fronteiras da Deliberação, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011.
  • 33. (c) A prática da deliberação Escrevi este livro para que fosse também relevante para a prática política. Nos últimos anos, a deliberação tem se tornado proeminente na prática política com esforços para engajar mais os cidadãos comuns no processo político. Esses esforços se subscrevem a etiquetas como míni-púBlicos, jurados de cidadãos, reuniões de consenso, células de planejamento e outros. Tais esforços na prática política precisam ser acompanhadas de pesquisas empíricas e normativas sistemáticas sobre deliberação. É exatamente com isso que espero que este livro possa contribuir. Qual é o apelo da deliberação cidadã para a prática política? Um dos apelos importantes é garantir maior legitimidade às decisões políticas. Muitos cidadãos tendem a não confiar nos políticos no que diz respeito a tomar decisões para o bem público. Existe um amplo grau de suspeita de que muitos políticos sejam guiados unicamente por seus interesses de carreira ou sejam, ainda, corruptos. Essa suspeita é alimentada pela maneira como a mídia tende a cobrir os assuntos políticos. Em meio a esse cinismo, reclama-se de um déficit democrático. A estratégia óbvia para contra-restar esse déficit é envolver mais os cidadãos comuns no processo político. Dessa forma, as decisões políticas deveriam se tornar mais aceitáveis para o público geral. É uma hipótese que merece ser testada. Outro apelo importante para permitir que cidadãos comuns deliberem sobre questões políticas é a expectativa de que ideias novas sejam introduzidas, conduzindo a melhores resultados na formulação de políticas. Os cidadãos não querem mais aceitar que os políticos, por terem autoridade, saibam mais. De fato, em muitos lugares a reputação dos políticos é desalentadoramente ruim. Ao mesmo tempo, muitos cidadãos são especialistas em suas áreas de atuação profissional e trazem experiências da vida privada relevantes para muitas decisões políticas. A esperança de se obter resultados políticos melhores e mais legítimos originou muitos esforços para envolver os cidadãos comuns no processo político de formas mais plenas e sistemáticas. Apresento como exemplo disso o projeto do 33
  • 34. 34 Conselho Regional da Toscana41. Em 2007, a prefeitura promulgou a Lei Regional nº 69, intitulada "Regras para a Promoção da Participação na Formulação de Políticas Locais e Regionais"42. Trechos importantes sobre o quanto essa lei era necessária dizem o seguinte: • A participação na formulação e realização de políticas locais e regionais é um direito de todos. Esta lei promove proativamente formas e instrumentos de participação democrática para que isto se traduza em direito efetivo disponibilizando recursos como dinheiro e suporte metodológico. • A lei incentiva a iniciativa autônoma de grupos sociais organizados como autoridades locais, escolas e empresas para que formulem projetos que melhorem a participação cidadã. Com tais formulações, os legisladores da Toscana apresentarão uma agenda deliberativa para a região. Eles enfatizam uma forma de participação democrática na qual os cidadãos comuns discutem assuntos políticos e comunicam suas opiniões às autoridades locais. É também num espírito deliberativo que todos os interesses deverão ser ouvidos no processo político e que o conhecimento político dos cidadãos melhore para que possam oferecer justificativas bem desenvolvida em seus argumentos. Em suma, uma nova cultura cívica deveria emergir na Toscana de acordo com os objetivos dessa lei. Antonio Floridia e Rodolfo Lewanski, dois acadêmicos da deliberação envolvidos no projeto comentam: A Toscana tornou-se um "laboratório" notável para testar empiricamente a validade da participação deliberativa no mundo real, verificando os efeitos e possíveis benefícios de sua institucionalização, e aplicando um modelo específico cujo objetivo é fazer não apenas com que o governo representativo e míni-públicos coexistam, mas que sejam realmente 41 Para uma descrição do projeto, ver Antonio Floridia e Rodolfo Lewanski, "Institutionalizating Deliberative Democracy: The Tuscany Laboratory," paper apresentado no Workshop on the Effects of Participatory Innovations, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, April 12-17, 2011. 42 Ver www.consiglio.regione.toscana.it/partecipazione. O site contém também uma versão da lei em inglês.
  • 35. complementares e mutuamente recursivos no cumprimento das leis. De uma forma ou de outra, os resultados serão relevantes para aqueles que, sejam acadêmicos, praticantes, políticos ou governantes, estejam interessados em tais inovações para a democracia43. Para implementar a lei, o Conselho Regional deveria apontar "um especialista em direito público e ciência política com experiência comprovada nos métodos e práticas participativos". Isso aconteceu em 1 de outubro de 2008, com a indicação de Rodolfo Lewanski, um cientista político da Universidade de Bolonha com amplo histórico de publicações no campo da deliberação44. Ele lidera a Autorita per la Partecipazione (Autoridade para a Participação), com uma equipe que o ajuda a executar seus deveres. Nos três anos que se passaram de 2008 a 2010, foram concedidos fundos de 2.138.775 euros. A média de concessões foi de 31.453 euros45. Comunidades locais, escolas, empresas e qualquer grupo formal ou infomal de cidadãos comuns podem solicitar fundos. É dever da Autoridade para a Participação avaliar as solicitações e decidir quem será beneficiado. Uma vez finalizado um projeto, a Autoridade para a Participação deverá determinar em que medida as metas estabelecidas para o projeto foram atingidas. Como exemplo de projeto concreto, uso a comunidade local de Piombino, localizada na costa do Mar da Ligúria. O assunto era a renovação da Piazza Bovio (praça da cidade), localizada numa rocha à beira do mar. Ao invés de deixar a decisão nas mãos de técnicos especialistas e das autoridades locais, os cidadãos de Piombino envolveram-se intensamente no processo de decisão. As condições eram particularmente favoráveis para a deliberação, uma vez que as preferências dos cidadãos ainda não estavam fortemente cristalizadas, não dependiam de afiliações grupais fortes e não promoviam apelos à identidade. Discutirei, mais adiante no livro, casos nos quais as condições para a deliberação 43 Floridia e Lewanski, "Institutionalizing Deliberative Democracy," p. 2. 44 Conheço Rodolfo Lewanski pessoalmente, e portanto, conheço bem seu trabalho no Conselho Regional. 45 Floridia and Lewanski, "Institutionalizing Deliberative Democracy," tabela 1 no Anexo. 35
  • 36. 36 eram menos favoráveis. A modo de introdução, parece-me apropriado começar com um caso no qual as condições eram favoráveis à deliberação, analisando o que ocorre sob tais circunstâncias. O projeto Piombino transcorreu de abril a dezembro de 2008. Em abril, foram distribuídos folhetos em vários lugares como a praça do mercado, informando a população sobre o projeto. Na noite de 9 de maio, uma assembleia informativa sobre o projeto contou com a presença de membros da equipe da Autoridade para a Participação. Com o prefeito da cidade, os membros da equipe apresentaram as metas do projeto: em conversa com os técnicos especialistas, os cidadãos deveriam encontrar a melhor solução para a renovação da Piazza Bovio. Portanto, todos os participantes deveriam expressar livremente suas opiniões, e todas as opiniões deveriam ser respeitadas. As discussões ocorreram em pequenos grupos formados por, no máximo, dez participantes. Por um lado, os participantes foram selecionados aleatoriamente em listas oficiais da cidade. Por outro lado, habitantes da cidade puderam se apresentar voluntariamente para participar. Assim, foram formados cinco grupos. Cada grupo se encontrou três vezes entre maio e outubro. Nesses encontros, técnicos especialistas da cidade (engenheiros e arquitetos) estiveram disponíveis para obter informação caso os cidadãos desejassem. Era importante, entretanto, que esses técnicos especialistas não liderassem as discussões. Ao invés disso, um dos cidadãos desempenhou a função de moderador. Depois de cada encontro, as discussões foram resumidas em um relatório que continha os argumentos articulados nas discussões. No início de cada discussão de grupo, pedia-se aos participantes que dissessem o que a Piazza Bovio significava para eles. As respostas foram uniformemente positivas. Por exemplo: • a praça serve como vínculo entre as gerações, contribui para a identidade da cidade, estamos orgulhosos dela; • na rocha que se projeta sobre o mar, a praça abre a cidade para as belezas da natureza, como uma janela para a amplidão infinita do mundo;
  • 37. • a praça é um espaço social onde os moradores da cidade se encontram e é especial para os amantes; • a praça é um lugar tranquilo onde as pessoas podem refletir calmamente. Apesar dessas reações geralmente positivas, as discussões grupais trouxeram muitas sugestões de melhora, especificamente: • A iluminação deveria ser reduzida para que as estrelas pudessem ser melhor apreciadas à noite, especialmente da extremidade externa da praça. Esta sugestão sofreu objeções, já que a redução da iluminação poderia colocar em risco a segurança, especialmente para os mais idosos ou pessoas com deficiências. Para dar conta desses argumentos conflitantes, seguiu-se com uma discussão sobre formas de iluminação. Sugeriu-se que se usassem mais luzes no solo e menos luzes para o alto. Sugeriu-se também que se utilizasse energia solar para a iluminação da praça. • Para o pavimento da praça foram feitas várias sugestões referentes à cor e ao material a ser usado. Os participantes foram detalhistas ao ponto de sugerirem, por exemplo, que se usassem materiais que permitissem que a goma de mascar das crianças pudesse ser removida. • Houve uma discussão vívida sobre o número e tipo de árvores a serem plantadas. Aqui, mais uma vez, os participantes tiveram que enfrentar critérios conflitantes. Por um lado, as árvores deveriam ser frondosas, mas não deveriam ocultar a vista do mar. As árvores escolhidas não deveriam danificar o pavimento com suas raízes. Ao discutir esses e muitos outros assuntos, os grupos tentaram chegar a um consenso ou ao menos a posições majoritárias. As posições minoritárias, entretanto, também foram incluídas nos relatórios dos grupos. Assim, uma voz solitária demandava que todos os bancos fossem retirados da praza; apesar dessa demanda não obter suporte algum, foi mencionada no relatório do grupo. Um elemento particularmente inovador do projeto em sua totalidade foi o envolvimento das crianças das escolas de 37
  • 38. 38 Piombino. Depois de excursões escolares para a praça, as crianças tiveram que fazer desenhos de como a praça deveria ficar. Esses desenhos, frequentemente cheios de cores e alegria, foram exibidos e também publicados no site da cidade. Desta forma, as crianças aprenderam uma boa lição sobre a prática da política através de um caso muito concreto de formulação de políticas. O projeto terminou em dezembro de 2008, quando toda a população de Piombino foi convidada para ser informada sobre os resultados das discussões em grupo. Nessa ocasião, as autoridades locais prometeram levar em consideração as sugestões formuladas nos grupos, o que de fato foi feito, especialmente nos aspectos para os quais havia consenso sobre como a praça deveria ficar. Os cidadãos foram incentivados a continuar envolvidos também no processo de planejamento e execução da renovação da praça. Do ponto de vista da deliberação, é importante observar que, de acordo com os relatórios dos grupos, as discussões foram conduzidas com seriedade e respeito, ponderando-se cuidadosamente os argumentos e com disposição dos participantes para mudarem de posição caso se confrontassem com novas informações e bons argumentos. Às vezes, as discussões deliberativas são organizadas sem nenhum vínculo com debate público em curso. Como veremos mais adiante neste livro, tais discussões flutuantes sem ponto de chegada também são valiosas ao contribuírem com o desenvolvimento político individual dos participantes. Neste capítulo, entretanto, quero apresentar com Piombino um caso no qual as discussões dos cidadãos faziam parte de um processo político em curso. Desta forma, quero enfatizar que a deliberação cidadã pode muito bem ter relevância política. Apresentei um exemplo que mostra como cidadãos comuns podem ser envolvidos em questões de política deliberativa. Uma onda de empreendimentos como este vem ocorrendo em muitas partes do mundo nos últimos anos. É óbvio que há a necessidade de engajar mais os cidadãos e mais plenamente no debate político. Para a comunidade acadêmica, o desafio está em
  • 39. pesquisar as condições nas quais essas experiências em deliberação cidadã podem ter sucesso. Abordarei esse desafio nos próximos capítulos. No último capítulo, voltarei para a prática da deliberação. 39
  • 40. 40 STEINER, Jürg. The Foundations of Deliberative Democracy. Empirical Research and Normative Implications. Cambridge : Cambridge University Press, 2012. Francine Altheman Capítulo 1 A participação dos cidadãos na deliberação a) Controvérsias normativas na literatura Há consenso entre os teóricos deliberativos de que cidadãos comuns devem ter a oportunidade de fazer parte da política deliberativa, mas há controvérsia sobre quantos cidadãos devem realmente fazê-lo. Por um lado, há uma posição normativa ideal de que todos os cidadãos devem estar envolvidos em políticas deliberativas. Em suas vidas cotidianas, eles devem discutir assuntos políticos entre seus familiares, com os amigos e vizinhos, no local de trabalho, e nos clubes e associações. Essas discussões devem ter um caráter deliberativo no sentido de os participantes se voltarem para a força do melhor argumento. Como consequência, a formação de opinião entre a população comum se daria de uma forma reflexiva. Essas opiniões refletidas [opinião pública] são então comunicadas aos líderes políticos por meio de uma variedade de canais como encontros pessoais, eventos públicos, a mídia, e a Internet. Essa posição
  • 41. participativa é defendida por Jürgen Habermas, que argumenta que todos os afetados por uma decisão política devemser incluídos na deliberação (Inklusion aller Betroffenen).46 Desde que decisões importantes, por exemplo sobre o meio ambiente ou assistência médica, que afeta todo mundo, a posição habermasiana é de que todo mundo deve participar da deliberação de tais questões. Habermas espera que a deliberação entre cidadãos comuns terá influência em eleições, legislação e poder administrativo, desde que “o fluxo comunicacional que serpeia entre formação pública da vontade, decisões institucionalizadas e deliberações legislativas garantea transformação do poder produzido comunicativamente, e da influência adquirida através da publicidade, em poder aplicável administrativamente pelo caminho da legislação.” Nesse caso, cidadãos devem ser uma grande força de compensação contra as duas tradicionais influências políticas, “dinheiro e poder administrativo”.47 Alguns teóricos consideram como utópico que praticamente todos os cidadãos irão sempre participar da política deliberativa. Portanto, como esses teóricos argumentam, tem que se pensar sobre um modo mais real de envolver os líderes populares na deliberação de questões políticas. Eles colocam suas esperanças nos chamados 41 46 Jürgen Habermas, Ach, Europa (Frankfurt a.M.: Suhurkamp, 2008), p. 148. 47 Jürgen Habermas, Between Facts and Norms: Contributions to a Discourse Theory of Law and Democracy (Cambridge, MA: MIT Press, 1996), p. 299.
  • 42. 42 mini-públicos, os quais eles entendem como grupos de cidadãos escolhidos aleatoriamente. James S. Fishkin, um teórico importante, está na vanguarda desse movimento com a ideia do Voto Deliberativo.48 A questão crucial é o que a deliberação em mini-públicos desse tipo significa para o sistema político em grande escala. Fishkin espera que os participantes nesses mini-públicos peguem o gosto pela deliberação e, em seus contextos pessoais, façam com que outros cidadãos se engajem em atividades deliberativas. Ele também espera que a opinião dos líderes que emergem dos participantes desses mini-públicos possa refletir as opiniões dos outros cidadãos. Em todos esses casos, a deliberação em mini-públicos deve se espalhar para um grande número de cidadãos. Maija Setälä também reflete sobre o papel dos mini-públicos no processo de decisão política.49 Ela adverte que “mini-públicos deliberativos são frequentemente considerados pelas autoridades públicas em uma base ad hoc,” e isso levanta para Setälä “questões sobre motivações além deles. As recomendações a que chegam o debate dos mini-públicos são normalmente ignoradas.” De acordo com Setälä, “o impacto dos mini-públicos poderia ser reforçado pela institucionalização de sua utilização e 48 James S. Fishkin, When the People Speak : Deliberative Democracy and Public Consultation (Oxford University Press, 2009). 49 Maija Setälä, “Designing Issue-Focused Forms of Citizen Participation”, artigo apresentado na Conferência da Democracia: uma perspectiva cidadã, Âbo, Maio 25-27, 2010, p. 15.
  • 43. 43 desenvolvendo formas em que tais recomendações fossem tratadas nas instituições representativas.”50 Erika Cellini et al. vai um passo além que Setälä quando alerta que a organização dos mini-públicos pode ser mal utilizada para distrair a atenção das reais decisões tomadas pelos públicos das arenas.51 Como exemplo eles citam a decisão tomada na região da Toscana sobre a política de saúde: enquanto o governo organizou mini-públicos para discutir sobre a distribuição dos custos da saúde, ele decidiu ao mesmo tempo sobre a reorganização de todo o sistema hospitalar na região. Desse modo, os mini-públicos afastaram a atenção de onde a real tomada de decisão estava ocorrendo. Cellini et al. também demonstra que esses mini-públicos, que foram anunciados pelos organizadores como representativos quando não eram, tinham uma forte representação de pessoas altamente educadas e politicamente ativas. O fato é que não foi aos mini-públicos, representados por cidadãos comuns, o poder de influenciar a política de saúde na região. Em primeiro lugar, os cidadãos comuns não estavam devidamente representados e, segundo, os mini-públicos não tiveram nenhuma 50 Setälä, “Designing Issue-Focused Forms of Citizen Participation”, p. 15. 51 Erika Cellini, Anna Carola Freschi, and Vittorio Mete, “Chi delibera? Alla ricerca del significato politico di un ‘esperienza partecipativo-deliberativo’,” Rivista Italiana di Scienza Politica 40 (2010), 138: “distrazione dell’attenzione del pubblico dalle sedi dove si negoziano gli interessi.”
  • 44. 44 influência sobre o curso de tomada de decisão das autoridades políticas. Um problema especial para o critério de igualdade de participação no processo deliberativo é como lidar com os cientistas e outros especialistas. Alfred Moore alerta “que o ideal de igualdade entre os cidadãos para participar da deliberação de problemas que lhes afeta está em tensão com as desigualdades de conhecimento que são inerentes às sociedades complexas.”52 Ele considera essa tensão como inevitável; portanto, “a questão não é se a autoridade especialista faz parte do sistema deliberativo, mas como ela será integrada e se essa integração é objeto de padrões deliberativos.”53 Moore contrasta a tecnocracia com um modelo de democracia das autoridades especialistas. O modelo democrático, em contraste, coloca “a autoridade especialista ao julgamento do público de um jeito que desafia algumas defesas tecnocratas no papel da expertise política, mesmo que não implique uma rejeição do valor da autoridade especialista nas políticas”.54 Como exemplo ele menciona os ativistas da Aids que “desenvolveram uma expertise e foram capazes de forçar seus pontos de vista nas discussões de estratégias de tratamento e o caminho dos experimentos”.55 Como um princípio geral, Moore quer “ser capaz 52 Alfred Moore, “Questioning Deference: Expert Authority in a Deliberative System”, artigo apresentado no encontro anual da Midwest Political Science Association, Chicago, Março 31-Abril 3, 2011, p. 14. 53 Moore, “Questioning Deference,” p. 14. 54 Moore, “Questioning Deference,” pp. 4-5. 55 Moore, “Questioning Deference,” p. 13.
  • 45. de um tipo de crítica que fundamenta a autoridade especialista na ausência de mera deferência cega”.56 John Parkinson alerta que com todo o foco nos mini-públicos, nós não devemos nos esquecer do nível macro. Ele quer olhar “para o público racional e formador de opinião que está em e entre as sociedades democráticas todos os dias em vez de estar apenas confinada no julgamento dos cidadãos.” Parkinson preocupa-se que “tecnocratas assumiram e transformaram a democracia deliberativa em apenas um conjunto de ferramentas para pesquisar, mesmo que manipulando, o usuário dos serviços públicos.”57 Como consequência dessa tendência, Parkinson vê o perigo de a democracia deliberativa perder “seu grande potencial crítico”.58 Ele quer ver como a deliberação funciona não somente em mini-públicos, mas também em grandes sociedades. Jane Mansbridge et al. reafirma que deve-se também olhar para como a deliberação funciona em grandes sociedades. Para entender o grande objetivo da deliberação, é necessário ir além dos estudos sobre instituições individuais e processos para examinar suas interações no sistema como um todo. Reconhecemos que a maioria das democracias é uma complexa entidade com uma 56 Moore, “Questioning Deference”, p. 14. 57 John Parkinson, “Conceptualising and Mapping the Deliberative Society,” artigo apresentado na Political Association Conference, Edinburgh, 2010, pp. 14-15. 58 Parkinson, “Conceptualising and Mapping the Deliberative Society,” p. 2. 45
  • 46. 46 variedade de instituições, associações, e espaços de contestação política, incluindo as redes informais, a mídia, os grupos organizados de defesa, escolas, fundações, instituições privadas e não lucrativas, legislaturas, agências executivas e os tribunais. Assim, nós defendemos o que pode ser chamado de um sistema próximo do que é a democracia deliberativa.59 Mansbridge et al. enfatiza que no sistema deliberativo nem todos os elementos precisam ter uma natureza deliberativa: “por exemplo, retórica altamente partidária, mesmo violando alguns ideais deliberativos como o respeito mútuo e de ajustamento, pode, contudo, ajudar a cumprir outros ideais deliberativos, como a inclusão”.60 Para ilustrar sua abordagem, Mansbridge et al. NÃO CONCORDO. olhe atentamente para os protestos. Protestos frequentemente aparecem para violar diversas normas da deliberação. Primeiro, os manifestantes usam slogans para provocar o entusiasmo e transmitir uma mensagem dramática que frequentemente minam a sutileza epistêmica. Segundo, quando um protesto implicitamente ou explicitamente ameaça promover sanções ou impõe cotas, ele age como uma forma de coerção. Terceiro, protestos por 59 Jane Mansbridge, James Bohman, Simone Chambers, Tom Christiano, Archon Fung, John Parkinson, Dennis Thompson, and Mark Warren, “A Systemic Approach to Deliberative Democracy”, artigo apresentado no Workshop on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, Abril 12-17, 2011. 60 Mansbridge et al., “A Systemic Approach to Deliberative Democracy”, p. 3.
  • 47. 47 vezes envolvem níveis de rompimento e contestação que deixam de atender as normas da deliberação de civilidade e respeito mútuo, [mas] protestos podem ser interessantes para corrigir as desigualdades no acesso ao debate trazendo mais vozes e interesses ao processo de decisão.61 Pensar em deliberação em termos sistêmicos é um exercício útil, mas isso torna mais difícil de identificar o que é deliberativo e o que não é. Tomando a ilustração de Mansbridge et al., uma ação de protesto pode parecer como não-deliberativa no âmbito micro mas como contributiva à deliberação no âmbito sistêmico, mas não é fácil determinar se uma ação de protesto em particular contribui para a deliberação no âmbito sistêmico. Stefan Rummens também tem um olhar sistêmico e argumenta que uma boa deliberação em todos os tipos de fóruns e redes não é suficiente para a democracia deliberativa, que deve ser fortemente respaldada pelas instituições representativas tradicionais. Para ele, “políticas representativas proporcionam um debate político com uma narrativa estruturada que faz o processo político ser particularmente visível e acessível para uma grande audiência”.62 61Mansbridge et al., “A Systemic Approach to Deliberative Democracy”, p. 25. 62 Stefan Rummens, “Staging Deliberation: the role of representative institutions in the deliberative democratic process”, artigo apresentado no Workshop on the Frontiers of Deliberation, ECPR Joint Sessions, St. Gallen, Abril 12-17, 2011, p. 20. Prestes a ser publicado no Journal of Political
  • 48. 48 Apesar de todas as controvérsias entre os teóricos, eles concordam que os cidadãos devem estar envolvidos em política e, tanto quanto possível, em um nível de igualdade. Como Dennis F. Thompson coloca: “Igualdade de participação requer que nenhuma pessoa ou grupo de favorecidos domine completamente o processo de debate racional [ação comunicativa], mesmo se os sujeitos do debate não estejam rigorosamente em igualdade de poder e prestígio.”63 Jane Mansbridge coloca a mesma ideia como segue: “A deliberação deve, idealmente, ser aberta a todos os afetados pela decisão. Os participantes devem ter igual oportunidade para influenciar o processo, ter iguais recursos, e serem protegidos por direitos básicos”.64 A questão é somente quantos cidadãos são atualmente capazes e dispostos a participar desse modo em processos políticos. Enquanto Habermas salienta o ideal de que todos os cidadãos deliberam em um nível de igualdade e sem constrangimentos [coerções], teóricos como Fishkin vê esse ideal como utópico e pensa em modos de aumentar a quantidade e qualidade de participação dos cidadãos na política deliberativa. Mansbridge também reconhece que o ideal que ela propõe nas Philosophy. 63 Dennis F. Thompson, “Deliberative Democratic Theory and Empirical Political Science”, Annual Review of Political Science 11 (2008), 527. 64 Jane Mansbridge com James Bohman, Simone Chambers, David Estlund, Andreas Follesdal, Archon Fung, Christina Lafont, Bernard Manin e José Luis Marti, “The Place of Self-Interest and the Role of Power in Deliberative Democracy”, Journal of Political Philosophy 18 (2010), 2.