O documento discute os métodos trifásico e bifásico para aplicação de penas no Brasil de acordo com a legislação. Apresenta as três fases para a dosimetria da pena privativa de liberdade - pena-base, agravantes/atenuantes e causas de aumento/diminuição - e as duas fases para a pena de multa - número de dias-multa e valor do dia-multa. Também discute critérios como culpabilidade, circunstâncias judiciais e condição econômica do condenado na determinação das penas.
1. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RGS
FACULDADE DE DIREITO
DIREITO PENAL III
PROFESSOR MARIO ROCHA LOPES FILHO
APLICAÇÃO DA PENA
1. Por propositura de Nelson Hungria, a legislação brasileira adota o
método trifásico para a dosimetria da pena privativa de liberdade e o
método bifásico para a mensuração da pena de multa.
Tem como fundamento legal, respectivamente, os artigos 68 (PPL) e 49,
§§ e 60, caput, e §§ (MULTA).
2. Em relação à PPL, leva-se em consideração, de início, o artigo 59,
que envolve 8 circunstâncias judiciais (Pena-base); em seguida, as
agravantes e atenuantes, previstas nos artigos 61, 65 e 66 (Pena
provisória), todos do CP e, por último, as causas de aumento e/ou
diminuição de pena (Pena definitiva);
3. Em relação à pena-base, é corolário lógico que o juiz, sob pena de
nulidade, observe todas as circunstâncias judiciais do artigo 59,
fundamentando cada item e revelando, assim, as razões pelas quais
(fundamentação - individualização) optou por determinada quantidade de
pena. É importante lembrar que a justificativa irá pacificar os dois lados
que estão envolvidos na sentença condenatória – de um lado o acusado,
que tem direito constitucional (ou uma garantia 1) de ter a pena
individualizada e fundamentada na forma da lei; de outro a sociedade,
representada, no mais das vezes, pelo MP;
4. critérios para a dosagem das penas: a lei não estabelece algo que não
seja o mínimo e o máximo da pena cominada à determinada infração para
a mensuração da pena-base, nem para as agravantes e atenuantes, somente
fixando percentuais que irão variar de 1/6 a 2/3 para as causas de
aumento ou diminuição da pena, confiando na prudente
discricionariedade motivada do magistrado;
1
AGUIAR JÚNIOR, Rui Rosado. Aplicação da Pena. Livraria do Advogado e all: 2013,
p. 12.
1
2. 5. individualização da pena-base – ponto de partida: embora
parte da doutrina repudie a política da pena mínima 2, é inegável que, do
ponto de vista democrático, o ponto de partida deve ser o mínimo da
pena cominada, algo que irá aumentar dependendo da valoração das
circunstâncias judiciais. Neste aspecto, a doutrina mais liberal sugere que a
valoração da pena-base parta da maior ou menor censura que receba o
agente do ponto de vista da culpabilidade. Assim, quanto mais censurável
for a conduta do imputado, maior será a sanção. Leva-se em conta, para
este juízo de valor, especialmente a capacidade de resistência de parte do
imputado em relação à prática da infração; por isso, o nível de informação
e de recursos, que possua o imputado, irá produzir maior ou menor
reprovação social pela conduta adotada. Exemplificando, um delito de
roubo perpetrado por quem tem curso superior e emprego fixo com
relevante remuneração, em tese, será sancionado mais gravemente do que
um indivíduo com instrução reduzida e com parcas oportunidades sociais.
É possível, ainda, que nos utilizemos do critério da preponderância das
circunstâncias judiciais. Assim, o maior ou menor número de
circunstâncias, respectivamente, irá produzir aumento de pena ou sua
manutenção nas proximidades do mínimo legal, merecendo o registro
que, neste caso, não haverá preponderância de umas sobre as outras. O
derradeiro critério, do termo médio, manifestamente injusto e ilegal, não
pode ser cogitado3, pois seu resultado, sempre direcionado à pena média,
acaba por produzir pena exagerada, pois em sendo alcançado valor
matemático a cada uma das operacionais, o resultado, havendo algumas
negativas, sempre será elevado e além do razoável; aliás, embora algumas
criações tenham sido feitas tendo o termo médio como referencia,
nenhuma delas encontra, em nosso juízo, respaldo legal; o legislador
confiou, no dizer de Roberto Lyra, no prudente arbítrio do juiz, algo
incompatível com a idéia de se partir de um termo médio, ou médio do
médio, para se dar valor matemático às circunstâncias judiciais. O critério
adequado deve partir, sempre, da prudente discricionariedade do
magistrado, daquilo que ele é como operador do direito e como pessoa,
com suas virtudes e defeitos, mas sem nenhum medo.
6. Em relação às circunstâncias judiciais, vale aqui a lembrança de Salo
de Carvalho e José António Paganella Boschi, que consideram a
culpabilidade o fator importante para a dosimetria da pena, pois as demais
circunstâncias têm relação com o fato ou envolvem direito penal do autor,
algo repudiado pela doutrina democrática;
2
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. RT: 2012, p. 417.
3
AGUIAR JÚNIOR, obra citada, p. 96.
2
3. 7. De outro lado, é inviável esquecer da realidade social e da realidade
do cárcere. Alguma “compensação” deverá ser contemplada na pena
especialmente quando estivermos diante de alguém com parcas
oportunidades sociais, algo que poderia ser considerada uma espécie de
co-culpabilidade pela omissão do Estado no referente aos vetores
essenciais – saúde, educação e oportunidade – antes do cárcere, e depois
no cárcere, algo demonstrável pelo excesso da população carcerária e as
miseráveis condições impostas na execução da pena;
8. Em relação às agravantes e atenuantes: a legislação não estabelece
valor matemático para tais circunstâncias legais, confiando na prudente
discricionariedade do magistrado; todavia, a doutrina que reputamos
equivocada, olvidando-se das circunstâncias acima referidas, refere o
percentual de 1/6 como ponto de partida, podendo ser mais, como Nucci
afirma, proporcional à pena aplicada, não se apercebendo que tais
aspectos são meramente secundários em relação à pena, jamais podendo
alcançar 1/6 da pena, que corresponde, em regra, ao menor percentual de
aumento ou diminuição de pena. Assim, se quiséssemos utilizar um
percentual, não poderia ser superior a 1/12 da pena-base aplicada;
9. Das agravantes e atenuantes, preponderam em relação às demais, a
reincidência, a confissão espontânea e a menoridade penal, ou maioridade
relativa (entre 18 e 21 anos); e esta circunstância é a mais significativa de
todas; de outro lado, a jurisprudência uniforme do STJ determina o
aumento de pena pela reincidência, algo que a 5ª Câmara do TJ não fazia,
e a Súmula 231 do mesmo tribunal (STJ) inviabiliza a redução da pena
abaixo do mínimo legal.
10. Na pena definitiva, determina o legislador que, em se tratando de
causas de aumento e/ou diminuição da parte especial, o juiz poderá se
limitar a um só aumento ou diminuição, prevalecendo sempre a causa que
mais aumente ou diminua. Aqui o verbo utilizado indica mera
possibilidade, preocupado o legislador com a possibilidade da pena zero.
De qualquer forma, o critério previsto no § único do artigo 68 não se
aplica para as causas de diminuição previstas na parte geral do CP e todas
deverão ser contempladas no cálculo.
11. Há três critérios para a dosagem das causas de aumento e
diminuição: a)todas as causas de aumento e diminuição devem incidir
sobre a pena-base, extraída na 2ª fase da fixação da pena; b) todas as
causas incidem umas sobre as outras; c) as causas de aumento incidem
sobre a pena extraída na 2ª fase e as de diminuição incidem umas sobre as
3
4. outras. O critério mais ajustado é o previsto na letra b e todas as causas
incidem umas sobre as outras, admitindo eventual compensação.
12. Em relação à pena de multa há duas fases: o número de dias-
multa e o valor do dia-multa. O número de dias-multa deverá guardar
proporcionalidade com a pena privativa de liberdade; o valor do dia-multa
deverá atender a condição econômica do apenado. Assim, quanto mais
abonado o agente, maior o valor do dia-multa.
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