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O NOIVADO DO SEPULCRO
Soares de Passos
1858 (1ª ed. em 1856)
BALADA
Vai alta a lua! na mansão da
morte
Já meia-noite com vagar soou;
Que paz tranquila; dos vaivéns
da sorte
Só tem descanso quem ali
baixou.
Que paz tranquila!... mas eis
longe, ao longe
Funérea campa com fragor
rangeu;
Branco fantasma semelhante a
um monge,
D'entre os sepulcros a cabeça
ergueu.
Ergueu-se, ergueu-se!... na
amplidão celeste
Campeia a lua com sinistra
luz;
O vento geme no feral cipreste,
O mocho pia na marmórea cruz.
Ergueu-se, ergueu-se!... com
sombrio espanto
Olhou em roda... não achou
ninguém...
Por entre as campas, arrastando
o manto,
Com lentos passos caminhou
além.
Chegando perto duma cruz
alçada,
Que entre ciprestes alvejava ao
fim,
Parou, sentou-se e com a voz
magoada
Os ecos tristes acordou assim:
"Mulher formosa, que adorei na
vida,
"E que na tumba não cessei
d'amar,
"Por que atraiçoas, desleal,
mentida,
"O amor eterno que te ouvi
jurar?
"Amor! engano que na campa
finda,
"Que a morte despe da ilusão
falaz:
"Quem d'entre os vivos se
lembrara ainda
"Do pobre morto que na terra
jaz?
"Abandonado neste chão
repousa
"Há já três dias, e não vens
aqui...
"Ai, quão pesada me tem sido a
lousa
"Sobre este peito que bateu por
ti!
"Ai, quão pesada me tem sido!" e
em meio,
A fronte exausta lhe pendeu na
mão,
E entre soluços arrancou do
seio
Fundo suspiro de cruel paixão.
"Talvez que rindo dos protestos
nossos,
"Gozes com outro d'infernal
prazer;
"E o olvido cobrirá meus ossos
"Na fria terra sem vingança ter!
– "Oh nunca, nunca!" de
saudade infinda
Responde um eco suspirando
além...
– "Oh nunca, nunca!" repetiu
ainda
Formosa virgem que em seus
braços tem.
Cobrem-lhe as formas divinas,
airosas,
Longas roupagens de nevada
cor;
Singela c'roa de virgínias rosas
Lhe cerca a fronte dum mortal
palor.
"Não, não perdeste meu amor
jurado:
"Vês este peito? reina a morte
aqui...
"É já sem forças, ai de mim,
gelado,
"Mas inda pulsa com amor por
ti.
"Feliz que pude acompanhar-te
ao fundo
"Da sepultura, sucumbindo à
dor:
"Deixei a vida... que importava
o mundo,
"O mundo em trevas sem a luz
do amor?
"Saudosa ao longe vês no céu a
lua?
– "Oh vejo sim... recordação
fatal!
– "Foi à luz dela que jurei ser
tua
"Durante a vida, e na mansão
final.
"Oh vem! se nunca te cingi ao
peito,
"Hoje o sepulcro nos reúne
enfim...
"Quero o repouso de teu frio
leito,
"Quero-te unido para sempre a
mim!"
E ao som dos pios do cantor
funéreo,
E à luz da lua de sinistro
alvor,
Junto ao cruzeiro, sepulcral
mistério
Foi celebrada, d'infeliz amor.
Quando risonho despontava o
dia,
Já desse drama nada havia
então,
Mais que uma tumba funeral
vazia,
Quebrada a lousa por ignota
mão.
Porém mais tarde, quando foi
volvido
Das sepulturas o gelado pó,
Dois esqueletos, um ao outro
unido,
Foram achados num sepulcro só.

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O noivado do sepulcro

  • 1. O NOIVADO DO SEPULCRO Soares de Passos 1858 (1ª ed. em 1856) BALADA Vai alta a lua! na mansão da morte Já meia-noite com vagar soou; Que paz tranquila; dos vaivéns da sorte Só tem descanso quem ali baixou. Que paz tranquila!... mas eis longe, ao longe Funérea campa com fragor rangeu; Branco fantasma semelhante a um monge, D'entre os sepulcros a cabeça ergueu. Ergueu-se, ergueu-se!... na amplidão celeste Campeia a lua com sinistra luz; O vento geme no feral cipreste, O mocho pia na marmórea cruz. Ergueu-se, ergueu-se!... com sombrio espanto Olhou em roda... não achou ninguém... Por entre as campas, arrastando o manto, Com lentos passos caminhou além. Chegando perto duma cruz alçada, Que entre ciprestes alvejava ao fim, Parou, sentou-se e com a voz magoada Os ecos tristes acordou assim: "Mulher formosa, que adorei na vida, "E que na tumba não cessei d'amar, "Por que atraiçoas, desleal, mentida, "O amor eterno que te ouvi jurar? "Amor! engano que na campa finda, "Que a morte despe da ilusão falaz: "Quem d'entre os vivos se lembrara ainda "Do pobre morto que na terra jaz? "Abandonado neste chão repousa "Há já três dias, e não vens aqui... "Ai, quão pesada me tem sido a lousa "Sobre este peito que bateu por ti!
  • 2. "Ai, quão pesada me tem sido!" e em meio, A fronte exausta lhe pendeu na mão, E entre soluços arrancou do seio Fundo suspiro de cruel paixão. "Talvez que rindo dos protestos nossos, "Gozes com outro d'infernal prazer; "E o olvido cobrirá meus ossos "Na fria terra sem vingança ter! – "Oh nunca, nunca!" de saudade infinda Responde um eco suspirando além... – "Oh nunca, nunca!" repetiu ainda Formosa virgem que em seus braços tem. Cobrem-lhe as formas divinas, airosas, Longas roupagens de nevada cor; Singela c'roa de virgínias rosas Lhe cerca a fronte dum mortal palor. "Não, não perdeste meu amor jurado: "Vês este peito? reina a morte aqui... "É já sem forças, ai de mim, gelado, "Mas inda pulsa com amor por ti. "Feliz que pude acompanhar-te ao fundo "Da sepultura, sucumbindo à dor: "Deixei a vida... que importava o mundo, "O mundo em trevas sem a luz do amor? "Saudosa ao longe vês no céu a lua? – "Oh vejo sim... recordação fatal! – "Foi à luz dela que jurei ser tua "Durante a vida, e na mansão final. "Oh vem! se nunca te cingi ao peito, "Hoje o sepulcro nos reúne enfim... "Quero o repouso de teu frio leito, "Quero-te unido para sempre a mim!" E ao som dos pios do cantor funéreo, E à luz da lua de sinistro alvor, Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério Foi celebrada, d'infeliz amor. Quando risonho despontava o
  • 3. dia, Já desse drama nada havia então, Mais que uma tumba funeral vazia, Quebrada a lousa por ignota mão. Porém mais tarde, quando foi volvido Das sepulturas o gelado pó, Dois esqueletos, um ao outro unido, Foram achados num sepulcro só.