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O DESPERTAR DA CONSCIÊNCIA – O CAMINHO INTERIOR DOS PAIS



Introdução : Sobre a necessidade de um Despertar e a nova
Espiritualidade

Do despertar

No Ciclo de palestras intitulado ―Os Fundamentos Espirituais do Mundo
Exterior‖, Rudolf Steiner faz a seguinte advertência: ―Se a Ciência do Espírito
quiser realizar sua tarefa, antes de mais nada, faz-se necessário que ela se
torne a incentivadora para o estado de alerta pleno. Pois apenas saber das
coisas que acontecem no mundo sensorial e das leis que o intelecto consegue
compreender como existentes no mundo sensorial, isso, num sentido mais
elevado, significa dormir. A humanidade só está plenamente desperta quando
também consegue desenvolver conceitos, idéias sobre aquele mundo espiritual
que está ao nosso redor como o ar e a água, como as estrelas, o sol e a lua. E
assim como dormimos quando à noite estamos completamente entregues ao
processo corpóreo interior e não temos idéia do que existe ao redor no mundo
corpóreo exterior, assim também dormimos quando nos entregamos apenas ao
mundo sensorial exterior, ao mundo do intelecto e às leis do intelecto que dominam no
mundo sensorial exterior, e não temos idéia do que está à nossa volta como mundo
espiritual”.

Despertar para a realidade do espírito é de fato uma necessidade em nossa
época. E Steiner afirma isto veementemente quando declara que em relação ao
caos social e à crise em que vivemos ―não haverá ordem antes que uma
concepção científico-espiritual penetre nos corações humanos. Todo o resto
será mera aparência, todo o resto será paz aparentemente, sob a qual sempre
se acenderão novas chamas. Pois só surgirá ordem a partir deste caos quando
se compreender do quê este caos surgiu. E ele surgiu da concepção
desespiritualizada da realidade‖. (GA 177)

Sobre a natureza da crise e das forças que a engendram, Steiner, numa
palestra de 1919 (A Educação como uma força para mudança social – GA 192
e 296), diz que ―O homem moderno se ocupa bastante com questões sociais,
mas ele se encontra mal equipado para pensar a respeito delas, porque as
capacidades intelectuais de boa parte da sociedade estão paralisadas. A
grande maioria acredita que se pode superar os atuais problemas de ordem
social com o conhecimento e compreensão vigentes. Nós não os
sobrepujaremos, não podemos suplantá-los se não os abordarmos de uma
perspectiva espiritual.‖ E mais adiante ... “Olhemos, pois, mais detidamente
para o significado espiritual da industrialização. Tomemos, por exemplo, a
incorporação máxima do processo de industrialização: a máquina. Máquinas
diferem de tudo o mais que as pessoas encontram na vida normalmente, tal
como animais, plantas, etc. Vocês podem aplicar todo o seu pensamento
científico a um animal – eu nem quero mencionar os seres humanos neste
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contexto – e, não importa o quanto você o examine, ele ainda conserva um
aspecto de algo que poderíamos chamar de uma ―criatura de Deus‖. Você
jamais poderá descobrir inteiramente a essência de um animal. Este também é
o caso com as plantas ou cristais. Se você tomar todas as maravilhosas formas
dos cristais, terá de admitir que, embora com algum treinamento você possa
compreender algo de suas formações, haverá ainda uma infinidade de
aspectos dos cristais a que você voltará o olhar com espanto e não
compreenderá com o intelecto convencional.

Mas agora veja uma máquina – ela é perfeitamente transparente. Você pode
saber tudo sobre ela; nós aplicamos força aqui, os mancais de escora estão
aqui e ali, a quantidade de fricção é assim e assado, etc. Logo, você pode
calcular sua eficiência se você conhece todos os fatores envolvidos. Não há
nada sobre uma máquina que não possamos compreender com a razão e a
inteligência normal. Mas isto é especialmente importante para o
relacionamento dos homens com as máquinas. Se você já encontrou milhares
e milhares de pessoas que trabalham com máquinas, então certamente deve
saber o que as almas de tais pessoas têm lentamente absorvido. Você verá, ou
talvez somente pressinta o que tem penetrado furtivamente as almas de
pessoas assim, a partir destas máquinas espiritualmente transparentes. O que
torna essas máquinas tão devastadoras para as pessoas é sua transparência
espiritual: todas as forças e interações nas máquinas são tão transparentes,
tão claras à mente humana. E o problema é que a clareza mecânica extrai vida
do coração do homem, suga-lhe vitalidade anímica, torna as pessoas secas e
desumanas.

A combinação de ciência e máquinas ameaçará a civilização com três
formas de destruição se não nos unirmos o suficiente e nos voltarmos
para o supra-sensível. O ideal científico, isto é, moldar tudo segundo a
imagem astronômica, está ganhando um domínio cada vez maior. O ideal para
muitos é modelar todo o nosso entendimento da natureza conforme a imagem
astronômica do universo. Pensem como os químicos imaginam as moléculas.
Eles as imaginam como sendo compostas de átomos, e estes unidos uns aos
outros por certas forças, de sorte que o resultado é tal como pequenos
sistemas planetários. O ideal é explicar o mundo inteiro astronomicamente,
mas a meta da astronomia é visualizar a estrutura do universo como um
mecanismo. Some-se a isto todo o trabalho que se faz com máquinas!

Estas são as coisas que têm tido um efeito progressivamente intenso
desde meados do século XV e estão agora roubando aos seres humanos
sua própria humanidade. Se as pessoas levarem o pensamento
mecanicista e a indústria ao que resta da vida, então seus espíritos
tornar-se-ão mecanizados, suas almas dormentes e vegetabilizadas, e seus
corpos animalizados.

Vejam a América – epítome do espírito mecanizado. Olhem para a porção
oriental da Europa e Rússia; os impulsos e instintos que têm se mostrado
                                                                     Página 2
desenfreados por lá são terríveis, e eles resultam na animalização do corpo. Na
Europa central, encontramos o adormecimento da alma. Mecanização do
espírito, vegetabilização da alma e animalização do corpo – isto é o que
temos de enfrentar sem ilusões.”

Parece-me que em nosso dia-a-dia podemos perceber a manifestação destas
três forças como que insidiosamente se imiscuindo em nossas vidas. Podemos
senti-las nos episódios de vandalismo, na falta de interesse pelas necessidades
dos outros, na pouca compaixão, na intolerância, na sexualidade desenfreada
e prematura, no uso de entorpecentes como busca de gratificação ou
compensação para outras coisas, na visão reducionista e materialista do
mundo e do homem Elas atuam tal como germes patogênicos que encontrando
oportunidade para isso, penetram no organismo, colonizando-o, nele se
multiplicando e levando-o a adoecer. Nossos atos cometidos por influência
destas forças são como sinais e sintomas de uma infecção anímica. Ora, a
susceptibilidade do organismo está ligada a uma baixa da imunidade. Quando
as defesas orgânicas estão em ordem, quando a salutogênese é praticada,
dificilmente se adoece. Imaginemos agora nossa escola como um organismo
social-espiritual, um ser vivo.

Que significaria para ele uma boa imunidade? A imunidade é a expressão a
nível biológico do senso de identidade e missão de um ser. O sistema imune é
justamente aquele cujas células procuram distinguir o que lhe é próprio do
que lhe é estranho e então, englobar e eliminar o que não lhe pertence como
self. Ele funciona como um permanente estado de vigilância e atenção. Como
poderíamos então, enquanto organismo social, enquanto uma comunidade,
desenvolver ou adquirir uma boa imunidade, uma capacidade de reconhecer e
lidar adequadamente com a presença destas forças adversas?

Há uma linda história que nos pode responder a esta questão: trata-se da
história da ―Canção da Criança‖. (vide texto ao final). Ela nos fala da afirmação
da essência do Ser como se fora o reconhecimento e a lembrança da própria
canção; e indica uma realidade: quando buscamos nossa essência e vivemos a
partir dela não há em nós lugar para estas forças. Elas não encontram em nós
ressonância, e perdem o poder sobre nós. Despertemos, então, e busquemos a
nossa canção!

Sobre a Antiga e a Nova Espiritualidade

Houve tempo em que toda a vida exterior, quanto à sua estrutura social,
política e econômica, era organizada mediante a sabedoria que emanava dos
centros de mistérios. Naquele tempo estes centros de mistérios estavam
ligados a edifícios cúlticos erigidos no plano físico, e neles a consciência do
espiritual era cultivada através de purificação, instrução, e práticas
meditativas. Os templos do Espírito eram visíveis exteriormente. ―Hoje, quando
nossa vida se tornou tão desespiritualizada, esses templos não existem mais no
plano acessível aos olhos materiais. Mas existem espiritualmente por toda parte,

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e quem os procurar, quem desenvolver em si certas qualidades anímicas até um
grau elevado poderá encontrá-los”( Conhecimentos dos Mundos Superiores -GA
10). De acordo com Sergei Prokofieff, em seu livro ―May Human Beings Hear
it!‖, justamente a fim de que o maior número possível de seres humanos possa
encontrar tais templos a partir do poder da alma da consciência, a
Antroposofia foi trazida à Terra.

Ainda segundo Prokofieff, em verdade, todo o desenvolvimento da Antroposofia
ao longo dos vinte e um anos, começando em 1902 e indo até a Assembléia de
Natal em 1923, constituiu o processo de construção de um Templo Invisível,
no plano suprasensível. Os primeiros sete anos foram dedicados à
fundamentação de uma moderna ciência do espírito, de um caminho cognitivo
que pudesse levar do sensível ao supra-sensível. Foram os anos em que
Steiner escreveu suas obras básicas, culminando com a Ciência Oculta em
que dá a conhecer os primeiros frutos de uma investigação espiritual sobre o
Homem, sua origem, a morte, o destino, entre outros. Ele penetra na esfera
dos pensamentos cósmicos e os converte em pensamentos humanos
acessíveis a todos os que são dotados de um juízo sadio. Este primeiro setênio
do desenvolvimento da ciência espiritual é principalmente ligado ao Pensar e
corresponde no mundo espiritual ao primeiro estágio da construção do templo
supra-sensível dos novos mistérios, constituindo a estrutura de uma dupla
cúpula.

O segundo período de sete anos (1910 a 1916) assumiu um caráter totalmente
diferente do primeiro. Tudo quanto havia sido dado em forma conceitual era
agora vertido para uma forma imaginativa, artística. Foram os anos dos
dramas de mistérios, do surgimento da Arte da Fala e da Euritmia, da
renovação das artes culminando na construção do primeiro Goetheanum –
obra prima de arquitetura, escultura, pintura, enfim das artes plásticas
impulsionadas por um saber espiritual. Foi também o período da pesquisa
Cristológica e da proclamação da nova revelação do Cristo no Etérico. De um
ponto de vista mais esotérico, pode-se dizer que nesta fase Rudolf Steiner
penetrou na esfera das Imaginações Cósmicas transformando-as em
imaginações humanas acessíveis a todo indivíduo que possua alguma
sensibilidade artística e não esteja por demais contaminado pelo caráter
arimânico- mecanicista e materialista da época. Com isto, Rudolf Steiner
realizou a segunda etapa da construção do templo adicionando-lhe à cúpula,
as paredes erguidas a partir de imaginações cósmicas e humanas no mundo
etérico.

O terceiro período (1916 a 1923) foi marcado pelo estabelecimento das
iniciativas práticas inspiradas pela Antroposofia. Além dos impulsos de
renovação da vida religiosa (Comunidade de Cristãos) e do âmbito social
(Movimento para a Trimembração do Organismo Social), surgiram a educação
Waldorf, a medicina antroposófica, a farmacologia (Weleda), agricultura
biodinâmica, arquitetura orgânica, todas diretamente inspiradas a partir das

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fontes da Ciência Espiritual. Agora a Antroposofia penetrava o âmbito do
querer, a partir da força cósmica do Amor espiritual. Pois, em realidade, o
amor não é somente a expressão do sentir humano, mas a mais poderosa
força criadora, uma força tão poderosa que pode atuar na transformação e
espiritualização da matéria. Assim, nesta época, Steiner estabeleceu os
alicerces do Templo supra-sensível e completou-o ao final do terceiro setênio.
Seu fundamento consistia, portanto de Amor Cósmico e Humano.

À construção do templo, seguiu-se sua consagração aos poderes que guiam a
nossa evolução — o Ser do Cristo, Michael e o ser Antroposofia. Isto se deu
através do Congresso de Natal em 1923, um ponto crucial da história da
Antroposofia cujo teor e significado, entretanto, não vamos abordar agora, pois
nos levaria longe demais. Para nós, neste momento, basta saber que em
conexão com este acontecimento deu-se a Fundação dos Novos Mistérios
Cristãos; e todo aquele que a partir de sua livre vontade queira trilhar este
caminho de desenvolvimento conscientemente, pode encontrar a senda que
conduz ao templo do Ser Vivo Antropos-Sophia.

Resta-nos agora indagar, como o despertar para a busca de um caminho
interior no qual se procure cultivar a própria essência, a própria
espiritualidade se relaciona com a tarefa de educar os filhos?

Examinemos, pois, inicialmente, o significado de tornar-se Pai e Mãe, e o que
isto requer de cada um de nós.

O Significado de Ser Mãe ou Pai

De acordo com a Dra Michaela Gloecker, em seu Consultório Pediátrico, ―os
termos mãe, pai e filho sempre tiveram um significado duplo – um natural e
um ideal. Inicialmente, é a criança que faz a mãe ser mãe e o pai ser pai, por
meio da procriação, da concepção, da gestação e do parto. Nessa sucessão, a
mulher vivencia o processo de tornar-se mãe como um processo
predominantemente corporal, em que a criança se apodera dela e nela se
desenvolve. O homem, no entanto, embora tenha impulsionado o processo
fisicamente, vivencia o tornar-se pai principalmente no âmbito anímico. A ele
cabe o papel de acompanhar a gravidez e o parto com uma atitude de
observação sensível. O resultado sensato disso é que ele pode estar à
disposição para ajudar, não apenas nas semanas e meses após o parto, mas,
além disso, para cuidar da base existencial exterior da família em
desenvolvimento. No pai isso coincide com uma tendência instintiva. Ele fica
feliz em poder fazer algo para a proteção, a segurança e as necessidades da
mãe e da criança; fica magoado quando é impedido de realizar esses feitos, ou
quando seus esforços não são levados a sério. O elemento especificamente
paterno está na capacidade de estar presente interiormente e exteriormente,
quando a mãe e o filho necessitam dele, percebendo-os e levando-os em sua
consciência. Essa é a origem do profundo sentimento de pertinência, que
permite à mãe e ao filho sentirem-se protegidos animicamente.

                                                                       Página 5
Neste espaço anímico aberto pelo interesse paterno, as habilidades específicas
da mãe podem desenvolver-se com a maior efetividade possível: estas
consistem na prontidão e na abertura amorosas, necessárias para executar
com paciência e alegria os infinitos atos repetitivos requeridos pelo
crescimento da criança no período inicial. Dispensada, sempre que possível,
das preocupações materiais, a mãe pode dedicar-se livremente ao filho. Essa
situação se estende até o momento em que a criança desenvolve por si mesma
a tendência a passar regularmente algumas horas do dia em outros espaços
vitais, isto é, quando ela se torna madura para freqüentar o jardim de
infância. No caso de uma relação a três intacta, ela pode assimilar então, de
maneira marcante, o modo como dois adultos inteiramente diferentes lidam
entre si e com ela, possibilitando seu desenvolvimento como ser humano.

Reconhecendo as necessidades específicas para o desenvolvimento da criança
pequena, os órgãos oficiais instituíram a licença maternidade, com duração de
quatro meses.

Queremos salientar que ser mãe, isto é, estar de corpo e alma à disposição das
crianças durante o dia inteiro, representa uma atividade profissional
plenamente válida. Seria correto ter um reconhecimento financeiro a partir
dos recursos públicos! Quando, principalmente na fase pré-escolar as crianças
podem ter um verdadeiro lar, um espaço vital em que sejam percebidas e onde
alguém se dedique a elas, não sendo a mãe obrigada a trabalhar fora para
ganhar dinheiro, elas manifestam sua gratidão aos pais com saúde e alegria
de viver.

Por isso recomendamos, no interesse das crianças, que se aproveite esta
oportunidade sempre que possível. Nada pode substituir as vivências infantis
de proteção, confiança e relacionamento constante nos primeiros três anos.

Mesmo quando os pais dividem esta tarefa entre si, ainda se mantém um gesto
fundamental, ideal, dessa trindade: no centro, a criança, que exige e aceita
tudo com naturalidade, e a seu lado, os pais, que acompanham seu
desenvolvimento, alegram-se com seus progressos e, como retribuição,
recebem o amor e a confiança do filho.

Com isso tocamos o lado ideal do que significa ser pai e mãe: com toda a
naturalidade, a criança vive protegida e com plena confiança nos pais. Porém
a mãe e o pai são como que os representantes daquilo que em todas as
religiões foi venerado como aspectos divinos paterno e materno, ao lado do
elemento eternamente em devir e que, no cristianismo, tem sua designação
suprema na Santíssima Trindade. Quem quando criança, experimentou a
aceitação carinhosa e sem reservas de sua própria essência tal qual ela é, e
também o empenho para se atingir o que é puramente humano, verdadeiro e
bom, gosta de lembrar-se de sua infância mesmo que tenha sofrido pobreza e
penúria materiais. Jacques Lusseyran declarou em sua biografia que o amor


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que seus pais nutriam por ele, criança cega, era como a armadura mágica que,
uma vez colocada, protege por toda a vida.”

Assim, reconhecemos que há um ideal. Mas na prática, o que acontece? Será
que conseguimos honrar esta imagem de Pai e de Mãe? Será que conseguimos
ser assim? Vejamos...

O Desafio de Educar os Filhos

Educar os filhos é uma das tarefas mais instigantes, trabalhosas, e
estressantes do planeta. É também uma das mais importantes e gratificantes,
pois através dela se marca profundamente a próxima geração, influenciando-
lhe o coração, a alma, a consciência, a experiência de sentido e ligação, o
repertório de habilidades para a vida e os mais profundos sentimentos que
essa geração tem sobre si mesma e seu possível lugar num mundo em
transformação acelerada. Entretanto, quando nos tornamos pais, fazemos isso
praticamente sem qualquer preparação ou treino; muitas vezes com pouca ou
nenhuma orientação e apoio, e tudo isso num mundo que valoriza muito mais
o produzir do que o nutrir, o fazer do que o ser.

Tipicamente, o trabalho de criação dos filhos é uma jornada para a qual se
parte sem uma estratégia clara nem uma visão panorâmica do terreno, mais
ou menos com a postura intuitiva e otimista que assumimos diante de outras
situações da vida. Aprende-se com a prática. Não há de fato outra maneira.

É verdade que existem inúmeros ―manuais‖ sobre educação de filhos e que
podem até ser úteis como referência, mostrando-nos novas maneiras de ver as
situações ou tranqüilizando-nos ao comprovar, especialmente quando ainda
somos inexperientes, que há várias formas de lidar com as coisas e que não
estamos sós.

Mas o que estes livros não costumam abordar é a experiência interior do
trabalho de educar os filhos. Como não se deixar engolir por tantas dúvidas,
incertezas, inseguranças, problemas reais que enfrentamos na vida, momentos
de conflito interno ou com terceiros, inclusive com os próprios filhos? Esses
livros também não dizem como podemos nos tornar mais sensíveis e dar mais
valor às experiências interiores dos nossos filhos.

Para sermos pais conscienciosos, precisamos fazer um trabalho interior
conosco mesmos aliado ao trabalho exterior de criar e proteger nossas
crianças. O conselho técnico que podemos aprender nos livros para nos ajudar
no trabalho exterior precisa ser complementado por uma autoridade interna
que só podemos cultivar e conquistar em nós mesmos por meio da lapidação
de nossa experiência pessoal. Esta autoridade interna só se desenvolve
quando nos damos conta de que, apesar de todos os acontecimentos que
escapam ao nosso controle, continuamos sendo primordialmente através das
escolhas que fazemos em razão desses fatos, e através do que partiu de nós
mesmos, os autores de nossas vidas. Ao perceber isso, podemos acabar
                                                                      Página 7
reconhecendo o quanto é importante para nossos filhos e nós mesmos assumir
responsabilidade pela forma como vivemos nossa vida e pelas conseqüências
das escolhas que fazemos.

A autoridade e autenticidade interiores podem ser extraordinariamente
desenvolvidas se fizermos esse trabalho interior. Nossa autenticidade e nossa
sabedoria aumentam quando estamos conscientes das coisas que fazemos.
Quando temos nossa atenção presente em cada pensamento, ato ou palavra.
Com o tempo, podemos aprender a conhecer mais profundamente cada um de
nossos filhos e saber o que precisam e tomar a iniciativa de descobrir formas
apropriadas de educá-los promovendo seu crescimento em todos os sentidos.
Também podemos aprender a interpretar os sinais diversos e muitas vezes
enigmáticos que ás vezes eles nos enviam através de seu comportamento e
confiar em nossa capacidade de encontrar uma maneira adequada de agir.
Atenção, exame e consideração constantes são essenciais neste caminho.

Podemos nos tornar pais intencional ou inadvertidamente, mas, seja como for,
a paternidade e a maternidade são uma vocação. Na realidade, trata-se de
nada menos que uma disciplina espiritual rigorosa – a busca do ideal de
realização do que há de mais profundo e verdadeiro em nossa natureza como
seres humanos. O simples fato de nos tornarmos pais é um estímulo contínuo
para a manifestação do que temos em nós de melhor, mais amoroso, sábio e
carinhosos, para sermos as melhores pessoas que pudermos ser.

Lidar com filhos anuncia todo um conjunto novo de solicitações e mudanças
em nossas vidas, exigindo que renunciemos a muitas coisas conhecidas e que
assumamos outras tantas desconhecidas. Em geral contamos apenas com
nossos instintos humanos mais profundos e a bagagem que trazemos de
nossa infância, tanto a positiva quanto a negativa, para enfrentar o território
desconhecido de ter filhos e educá-los.

E assim como na vida quando nos vemos diante de pressões familiares, sociais
e culturais para observar normas em geral tácitas e inconscientes, e de todas
as tensões inerentes ao exercício da paternidade, apesar de nossas melhores
intenções e do amor que sentimos por eles, muitas vezes estamos ligados no
piloto automático. Além disso, quanto maior for nossa preocupação com o
tempo, a nossa pressa, tanto menor será o nosso contato com a riqueza, o viço
do momento presente Esse momento pode parecer demasiado comum,
rotineiro ou fugaz para merecer atenção, e vivendo assim, facilmente caímos
na armadilha do automatismo ilusório, enquanto mantemos a crença de que
tudo o que fazemos por eles é certo.

Uma atuação automática, não permeada pela atenção consciente pode causar
danos profundos ao desenvolvimento da criança. A atitude inconsciente em
relação à educação dos filhos também conspira para deter nosso crescimento
potencial como pais. Essa inconsciência traz, muitas vezes, tristeza,
oportunidades perdidas, sofrimento, ressentimento, censura, sentimentos de

                                                                        Página 8
autodesvalorização, e outras coisas mais. Se formos capazes de permanecer
despertos para os desafios e a vocação da paternidade/maternidade, isso não
precisa acontecer. Ao contrário, podemos usar todas as ocasiões que surgirem
com nossos filhos para derrubar barreiras em nossas próprias mentes, para
enxergar com mais clareza dentro de nós mesmos e estar presentes para eles
de modo mais efetivo.

Um dos grandes desafios de se educar filhos em nossa época vem do fato de
vivermos numa cultura que não valoriza muito o ofício da maternidade como
trabalho válido e honrado. Considera-se perfeitamente aceitável as pessoas
dedicarem-se integralmente às suas carreiras ou às suas relações, ou círculos
sociais, mas há bem pouco apoio, às vezes até críticas veladas ou mesmo
abertas à postura de quem escolhe dedicar-se aos filhos.

A sociedade como um todo, com seus valores e instituições que moldam e ao
mesmo tempo refletem o microcosmo de nossas mentes e valores individuais,
contribui muito para desvalorizar o trabalho de educação das crianças. Quem
recebe os maiores salários no país? Certamente não quem trabalha em
creches, nem os professores, cujo trabalho tanto apóia a tarefa dos pais. Onde
estão os exemplos, as redes de apoio, o trabalho compartilhado e o trabalho
em meio expediente para mães e pais que não se contentam em ficar apenas
umas poucas semanas com seus filhos recém-nascidos em casa? Onde estão
os subsídios para jovens pais, os cursos de pais, programas adequados de
licença paternidade e maternidade, que, por sua prevalência, nos mostram
que o trabalho de educar os filhos é da maior importância e é altamente
valorizado pela sociedade?

Certamente há coisas boas e razões para se ter esperança. Há também quem
veja sua função de pai/mãe como uma missão sagrada, e encontra maneiras
criativas e calorosas de orientar seus filhos e cuidar deles, muitas vezes
enfrentando grandes obstáculos e dificuldades. Existem também os que se
ocupam em criar programas e serviços de orientação às famílias, oferecer
conhecimento, alternativas saudáveis de recreação, e assim por diante.

Mas os problemas são desconcertantes e estão criando um ambiente social em
que é cada vez mais difícil para as famílias educar filhos saudáveis.
Manifestações tangíveis e diárias de amor, apoio, energia e interesse por parte
de adultos de carne e osso e respeitados estão-se tornando cada vez mais
raras hoje em dia.

Porém, se de um lado somos sujeitos a grandes forças sociais que moldam
nossas vidas e as vidas de nossos filhos, por outro, também temos a
capacidade como indivíduos de escolher conscientemente como vamos nos
relacionar com as circunstâncias e com a era em que vivemos. Todos nós
temos o potencial para traçar nossos caminhos, para viver com mais atenção e
intencionalidade, e para tentar ver e honrar as profundas necessidades
espirituais de nossos filhos e as nossas da melhor forma possível. Traçar um

                                                                       Página 9
caminho como esse para nós fica mais fácil quando temos uma estrutura
maior como parâmetro e entendemos o que estamos fazendo e o que precisa
ser feito – uma estrutura que pode nos ajudar no caminho, mesmo que as
coisas estejam sempre mudando e nossos próximos passos nem sempre sejam
evidentes. O conhecimento científico-espiritual pode fornecer parte desta
estrutura. A atenção pode complementá-lo.

Uma relação atenta com a integridade de nossa vida – isto é, com as nossas
experiências interiores e exteriores – é uma alternativa profundamente positiva
e prática ao modo de operação no piloto automático que adotamos tantas
vezes sem sequer perceber. Isso é particularmente importante para nós pais,
enquanto fazemos malabarismos para tentar atender a todas as exigências do
dia-a-dia e trabalhamos para sustentar nossos filhos e lhes dar aquilo de que
precisam num mundo cada vez mais desgastante e complexo.

O Exercício da Maternidade/Paternidade Atenta

A maternidade/paternidade atenta é uma convocação para o despertar de uma
nova consciência e uma nova intencionalidade para as possibilidades,
benefícios e desafios da tarefa de criar os filhos. Esta consciência, que vem a
ser atenção consciente, pode levar à compreensão mais profunda de nossos
filhos e de nós mesmos.

A atenção tem o potencial de penetrar no fundo das aparências e
comportamentos e nos permitir enxergar mais claramente e agir com mais
sabedoria e compaixão. Esta pode ser uma prática regeneradora e
transformadora.

Neste caminho, muitas vezes nossos filhos são como mestres, eternamente
desafiadores, sempre nos oferecendo oportunidades de fazer o trabalho interno
de compreender quem somos e quem eles são, para que possamos estar em
contato com o que é realmente importante e lhes dar aquilo de que necessitam
a fim de desvelar todo seu potencial. Ao longo desse processo, podemos
descobrir que esta consciência permanente pode nos liberar de alguns hábitos
de percepção e relacionamento mais limitadores, as camisas de força e as
prisões mentais que adquirimos ou construímos para nós mesmos.

Quanto mais conseguirmos ter em mente a beleza e completude intrínsecas de
nossos filhos, especialmente nos momentos em que isso nos é mais difícil,
tanto mais aprofundaremos nossa capacidade de agir atentamente.

Esses nossos ―professores‖ certamente nos oferecerão inúmeros momentos de
maravilhamento e felicidade, e oportunidades para os sentimentos mais
profundos de ligação e amor. E também evocarão nossas inseguranças,
testarão nossos limites, tocarão aqueles nossos pontos que temos medo de
tocar. Estão sempre como um espelho para que nos olhemos. Se estivermos
dispostos a prestar atenção, eles nos mostrarão o melhor da vida, inclusive
seu mistério, enquanto compartilhamos esta jornada com eles.
                                                                      Página 10
Para colocarmos essa atenção consciente em nosso relacionamento com
nossos filhos, é bom saber algo sobre ela: Essa atenção significa uma
consciência permanente desprovida de crítica. É algo que desenvolvemos
cultivando a capacidade de nos concentrar, intencionalmente, no momento
presente, e manter essa concentração da melhor forma possível.

Em geral, vivemos a maior parte do tempo ligados no piloto automático, sem
dar importância a muitas coisas importantes ou deixando-as passar
totalmente despercebidas, e julgando tudo o que experimentamos a partir de
opiniões apressadas e muitas vezes não ponderadas, baseadas no que
gostamos ou deixamos de gostar, no que queremos ou deixamos de querer.

A atenção consciente nos oferece um meio para nos concentrarmos no que
quer que estejamos fazendo a cada momento, e com isso, enxergarmos uma
realidade mais profunda por trás do véu de nossos gestos e pensamentos
automáticos.

A atenção consciente sempre esteve no cerne de todos os caminhos de
desenvolvimento espiritual. Ela é uma disciplina meditativa. É interessante
observar como no vocabulário grego existe uma grande proximidade entre as
palavras proseuchè – oração e prosochè – atenção. Como diz LeLoup, um
homem atento é já um homem que ora; ―nesse caso, a oração não é outra
coisa senão a atenção do coração à Presença Uma que transforma cada coisa
em um presente; um reconhecimento agudo e terno daquele que É em tudo o
que é...‖

Malebranche também disse: ―A atenção é a prece natural da alma‖.

E agora até mesmo a neurociência reconhece estas relações entre
oração/meditação e atenção através de estudos por ressonância magnética
que demonstram uma maior ativação de áreas do cérebro relacionadas com a
função atenção em estados meditativos e seus efeitos sobre a saúde.

Não é um acaso se os antigos terapeutas eram chamados grandes vigilantes;
os monges também se juntaram a eles nesse labor e é desta atenção que é
extraído seu conhecimento e louvor. Aliás, a atenção constitui o momento
único em que a inteligência e o coração podem estar juntos.

Diádoco de Fótice convida incessantemente a prestar atenção; disso, os
manuscritos de sua obra revelam: ―Quando um psiquismo (psichè) começa a
se purificar pela intensidade de sua atenção, nesse caso, como se fosse um
verdadeiro remédio de vida, ele sente o frêmito divino que o queima‖.

Aqui, a atenção é considerada como um remédio; trata-se do retorno ao Real.
A atenção é exatamente este caminho de retorno: ela faz-nos voltar desse
esquecimento do Ser; ainda mais, ela faz-nos sair do inferno que é a ausência
de misericórdia.


                                                                     Página 11
―... A atenção é neste caso, outro nome para dizer Amor, quando este não se
contenta com emoções ou boas vontades, mas torna-se o exercício cotidiano
de um encontro com o que é, com o que somos.

Através dos labirintos de nossas preocupações, seria necessário conservarmos
um fio de feliz vigilância. Sem essa vigilância, como poderíamos reconhecer a
Presença Una, sob suas múltiplas formas, e degustar seu sabor (sapienza)?
Como poderíamos cuidar do Ser?‖

O exercício da educação atenta envolve ter em mente o que é verdadeiramente
importante enquanto estamos executando as atividades do dia-a-dia com
nossas crianças. Na maior parte do tempo, podemos achar que precisamos
nos lembrar do que é isso, ou mesmo admitir que não o sabemos naquele
momento, pois é fácil perder o fio do sentido e o rumo de nossas vidas. Mas
mesmo nos momentos mais difíceis e às vezes terríveis que enfrentamos como
educadores, podemos cuidadosamente recuar e começar de novo,
perguntando-nos como se pela primeira vez, e vendo com novos olhos: ―O que
é verdadeiramente importante aqui?‖

De fato, ser atento na educação de crianças significa ver se podemos lembrar-
nos de colocar este tipo de concentração, abertura e sabedoria em todos os
momentos que temos com elas. E para isto, é preciso aprender a ficar em
silêncio dentro de nós mesmos. Na quietude, estamos mais preparados para
enxergar além do tumulto, nebulosidade e reatividade endêmicos em nossas
mentes, nos quais freqüentemente nos enredamos, e assim, desenvolver a
lucidez, a calma e a percepção, aproveitando essas coisas diretamente em
nosso trabalho com nossas crianças.

Como todo mundo, nós temos nossas necessidades e desejos, assim como as
crianças. E tanto em aspectos importantes como em aspectos banais, estas
necessidades podem ser muito diferentes e até conflitantes. E este choque de
necessidades, especialmente se estamos estressados, sobrecarregados e
esgotados, pode se tornar num cabo de guerra, uma competição, um medir
forças para ver quem sai ganhando.

Ao invés de competir com as crianças, os educadores atentos desenvolvem
uma consciência, exatamente em momentos assim, de como nossas
necessidades são interdependentes. O bem-estar das crianças afeta o nosso, e
o nosso afeta o deles. Isto é, se eles não estão bem nós sofremos, e se não
estamos bem, eles sofrem.

Isto significa que temos de estar sempre trabalhando para perceber as
necessidades deles assim como as nossas, tanto emocionais quanto físicas, e,
dependendo da idade deles, dialogar e chegar a acordos com eles e
internamente conosco, para que todo mundo consiga um pouco daquilo de
que mais necessita. Pela qualidade de nossa presença, nosso compromisso
com eles é sentido, mesmo nas horas mais difíceis. E com o tempo, podemos

                                                                     Página 12
fazer escolhas mais ditadas por essa ligação sincera, o que certamente
envolverá mais bondade e sabedoria.

Consideramos o trabalho dos educadores uma responsabilidade sagrada. Em
geral, espera-se dos pais e educadores que sejam nada menos que protetores,
nutridores, confortadores, professores, guias, companheiros, modelos e fontes
de amor e aceitação incondicionais. Bem sabemos que não conseguimos
corresponder totalmente a isso. Mas se pudermos ter em mente essa
concepção desse trabalho como uma responsabilidade sagrada, e colocarmos
um pouco de atenção no processo à medida que ele se desenvolve, é muito
mais provável que nossas respostas sejam guiadas por uma consciência do
que esse momento, ou esse menino ou menina _ nesse estágio de sua vida _
está nos pedindo, com seu ser e seu comportamento. Estando à altura desse
desafio, podemos não apenas acabar fazendo o que é melhor para eles, mas
também revelar e passar a conhecer o que temos de melhor e de mais
profundo.

A educação atenta requer o reconhecimento e identificação dos desafios que
enfrentamos diariamente na tentativa de fazer um trabalho consciente como
educadores. Neste exercício de atenção, a consciência tem de ser inclusiva.
Quer dizer, tem de incluir o reconhecimento de nossas próprias frustrações,
inseguranças e defeitos, nossos limites e limitações, e até nossos sentimentos
mais sombrios e destrutivos, e as maneiras como podemos nos sentir
esmagados ou desfeitos. Desafia-nos a trabalhar essas questões de forma
consciente e sistemática.

Assumir uma tarefa destas é pedir muito de nós mesmos. Pois em diversos
aspectos somos produtos e, às vezes, em maior ou menor grau, prisioneiros
dos fatos e circunstâncias de nossa infância. Já que a infância molda
significativamente nossa visão de mundo e de nós mesmos, nossas histórias
inevitavelmente moldarão nossa visão de nossas crianças e ―do que eles
merecem‖ ou de como devem ser tratados, ensinados e socializados. Mesmo
que às vezes não percebamos, somos muito apegados às nossas visões, sejam
elas quais forem, como se estivéssemos dominados por encantos poderosos.
Só quando percebemos esta característica é que podemos aproveitar o que
houve de bom, positivo e enriquecedor no modo como fomos educados , e
superar os aspectos que podem ter sido destrutivos e limitadores.

Para aqueles de nós que tiveram de se fechar, de não ver, de suprimir os
sentimentos para sobreviver à própria infância, tornar-se mais atento pode ser
especialmente difícil e doloroso. Nessas horas, em que somos governados por
nossos antigos demônios, em que vêm à tona crenças prejudiciais, padrões
destrutivos e pesadelos de nossa infância, e somos atormentados por
sentimentos negros e achamos que as coisas são ou pretas ou brancas, é
complicadíssimo parar e ver as coisas com novos olhos.



                                                                         Página 13
Mas o que conta não é a perfeição de resultados, e sim, a qualidade do esforço,
o sentido de compromisso. A educação atenta é um processo contínuo de
aprofundamento e refinamento da consciência e da habilidade de estarmos
presentes e agir com sabedoria. Não é uma tentativa de atingir objetivos ou
resultados fixos, por melhores que sejam. Uma parte importante deste
processo é justamente sermos compassivos conosco mesmos. Isto significa
enxergar e aceitar nossas limitações, cegueiras, nossa humanidade,
falibilidade, e trabalhar com estas deficiências de forma atenta, procurando
fazer o melhor possível.

Agora, é preciso que se diga, este é um trabalho para quem se interessa, de
verdade, pelo bem-estar e qualidade de vida das crianças. É para quem
realmente quer demonstrar amor através de seu ser e de seus atos cotidianos.
Não é provável que possamos fazer isto se não tivermos esta motivação como
ponto de partida. Assim, antes que vocês me perguntem ―Como podemos fazer
isso?‖ eu preciso perguntar: Vocês querem fazer isto? Por que se não formos
pessoas autênticas e em contato com a totalidade dos sentimentos que
experimentamos, não avançaremos neste caminho. Como todos nós sabemos,
há poucas respostas fáceis ou soluções simples no que diz respeito à educação
de seres humanos. Por outro lado, não se trata tanto de resultados perfeitos, e
sim, de amor em ação. De compromisso assumido em amor. De decidir o que
se quer e ser fiel a tal propósito com o melhor de nossas forças.

Mas para os que quiserem assumir este compromisso temos uma proposta e
um convite...

Como Podemos Fazer Isso?

Podemos tomar a resolução de empreender a busca cada um individualmente.
E certamente há uma dimensão deste trabalho que é individual e solitária.

Mas também podemos nos reunir num esforço conjunto e compartilhado, uma
vez que nos encontramos numa escola, numa pedagogia, que tem a intenção
de cultivar precisamente estes valores: a contínua ampliação do conhecimento
e a auto-educação.

Em verdade precisamos ainda confirmar nossa ―comum unidade‖ pelo livre
reconhecimento de um propósito comum. Do contrário seremos um
ajuntamento de pessoas que passam pelo mesmo lugar,pensam, sentem e
realizam coisas, mas não constituem de fato uma comum unidade, pois não
possuem uma consciência de pertencimento ao organismo social-espiritual
desta escola e sua missão, como mencionamos anteriormente. Não se
percebem como membros deste organismo.

Mas se o fizermos, se nos identificarmos como irmãos ou companheiros de
jornada, iguais aprendizes, talvez possamos realizar juntos um sonho: um
sonho que muitos já sonharam antes de mim. Muitos o vislumbraram
individualmente, mas para materializá-lo é preciso formar a comunidade da
                                                                      Página 14
visão; é preciso que um número suficiente de pessoas livremente queira apoiá-
lo em sua manifestação. Falo de uma Escola de Pais. De um movimento que
poderia fomentar o exercício do educador atento, consciencioso e responsável,
na medida em que oferece oportunidade para a aquisição de conhecimentos da
ciência espiritual que fundamentam a Pedagogia Waldorf,sobretudo a
antropologia,o estudo do homem, e para o treino da auto-observação, auto-
educação. Estudo, vivência, auto-educação.

Estamos começando... e precisamos fazer tudo com muito cuidado, pois a
pressa é inimiga da perfeição. E queremos fazer o que quer que façamos em
plena sintonia e harmonia com os professores, guardiões e praticantes destes
princípios, para que juntos criemos as condições pelas quais nossas crianças
poderão se desenvolver da melhor forma possível. Algumas oficinas já estão
acontecendo, outras virão no seu devido tempo.

Espero assim, com estas palavras acordar ao menos em alguns de vocês o
desejo de começar ou retomar e aprofundar, para os que já começaram, este
caminho interior dos pais.

Muito obrigada!




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



   1) Os Fundamentos Espirituais do Mundo Exterior – GA 177

      1ª conferência, Dornach, 29 de setembro de 1917

   2) O Conhecimento dos Mundos Superiores – A Iniciação - GA 10 1º
      capítulo

   3) A Educação como uma Força para a Mudança Social -- GA 296 1ª
      conferência, Dornach, 9 de Agosto de 1919

   4) ―A Canção da Criança‖ de Tolba Phanem

   5) May Human Beings Hear it! de Sergei Prokofieff capítulo 6

   6) Consultório Pediátrico de Michaela Gloecker e Wolfgang Goebel pgs 328
      e 329 da 3ª edição

   7) Nossos Filhos, Nossos Mestres de Myla e Jon Kabat-Zinn

   8) A Arte da Atenção de Jean Yves Leloup

   9) O Despertar da Consciência de Eckhart Tolle

                                                                     Página 15
A Canção da Criança



Quando uma mulher, de certa tribo da África, sabe que está grávida, segue
para a selva com outras mulheres e juntas rezam e meditam até que aparece a
―canção da criança‖.

Quando nasce a criança, a comunidade se junta e lhe cantam a sua canção.

 Logo, quando a criança começa sua educação, o povo se junta e lhe canta sua
canção.

Quando se torna adulto, a gente se junta novamente e canta.

Quando chega o momento do seu casamento a pessoa escuta a sua canção.

Finalmente, quando sua alma está para ir-se deste mundo, a família e amigos
aproximam-se e, igual como em seu nascimento, cantam a sua canção para
acompanhá-lo na "viagem".

"Nesta tribo da África há outra ocasião na qual os homens cantam a canção.

Se em algum momento da vida a pessoa comete um crime ou um ato social
aberrante, o levam até o centro do povoado e a gente da comunidade forma
um círculo ao seu redor.

Então lhe cantam a sua canção".

"A tribo reconhece que a correção para as condutas anti-sociais não é o
castigo; é o amor e a lembrança de sua verdadeira identidade.

Quando reconhecemos nossa própria canção já não temos desejos nem
necessidade de prejudicar ninguém.―

Teus amigos conhecem a "tua canção"

e a cantam quando a esqueces.

Aqueles que te amam não podem ser enganados pelos erros que cometes ou as
escuras imagens que mostras aos demais.

Eles recordam tua beleza quando te sentes feio;

tua totalidade quando estás quebrado;

tua inocência quando te sentes culpado

e teu propósito quando estás confuso.―

                                                  Tolba Phanem


                                                                     Página 16

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O despertar da consciência

  • 1. O DESPERTAR DA CONSCIÊNCIA – O CAMINHO INTERIOR DOS PAIS Introdução : Sobre a necessidade de um Despertar e a nova Espiritualidade Do despertar No Ciclo de palestras intitulado ―Os Fundamentos Espirituais do Mundo Exterior‖, Rudolf Steiner faz a seguinte advertência: ―Se a Ciência do Espírito quiser realizar sua tarefa, antes de mais nada, faz-se necessário que ela se torne a incentivadora para o estado de alerta pleno. Pois apenas saber das coisas que acontecem no mundo sensorial e das leis que o intelecto consegue compreender como existentes no mundo sensorial, isso, num sentido mais elevado, significa dormir. A humanidade só está plenamente desperta quando também consegue desenvolver conceitos, idéias sobre aquele mundo espiritual que está ao nosso redor como o ar e a água, como as estrelas, o sol e a lua. E assim como dormimos quando à noite estamos completamente entregues ao processo corpóreo interior e não temos idéia do que existe ao redor no mundo corpóreo exterior, assim também dormimos quando nos entregamos apenas ao mundo sensorial exterior, ao mundo do intelecto e às leis do intelecto que dominam no mundo sensorial exterior, e não temos idéia do que está à nossa volta como mundo espiritual”. Despertar para a realidade do espírito é de fato uma necessidade em nossa época. E Steiner afirma isto veementemente quando declara que em relação ao caos social e à crise em que vivemos ―não haverá ordem antes que uma concepção científico-espiritual penetre nos corações humanos. Todo o resto será mera aparência, todo o resto será paz aparentemente, sob a qual sempre se acenderão novas chamas. Pois só surgirá ordem a partir deste caos quando se compreender do quê este caos surgiu. E ele surgiu da concepção desespiritualizada da realidade‖. (GA 177) Sobre a natureza da crise e das forças que a engendram, Steiner, numa palestra de 1919 (A Educação como uma força para mudança social – GA 192 e 296), diz que ―O homem moderno se ocupa bastante com questões sociais, mas ele se encontra mal equipado para pensar a respeito delas, porque as capacidades intelectuais de boa parte da sociedade estão paralisadas. A grande maioria acredita que se pode superar os atuais problemas de ordem social com o conhecimento e compreensão vigentes. Nós não os sobrepujaremos, não podemos suplantá-los se não os abordarmos de uma perspectiva espiritual.‖ E mais adiante ... “Olhemos, pois, mais detidamente para o significado espiritual da industrialização. Tomemos, por exemplo, a incorporação máxima do processo de industrialização: a máquina. Máquinas diferem de tudo o mais que as pessoas encontram na vida normalmente, tal como animais, plantas, etc. Vocês podem aplicar todo o seu pensamento científico a um animal – eu nem quero mencionar os seres humanos neste Página 1
  • 2. contexto – e, não importa o quanto você o examine, ele ainda conserva um aspecto de algo que poderíamos chamar de uma ―criatura de Deus‖. Você jamais poderá descobrir inteiramente a essência de um animal. Este também é o caso com as plantas ou cristais. Se você tomar todas as maravilhosas formas dos cristais, terá de admitir que, embora com algum treinamento você possa compreender algo de suas formações, haverá ainda uma infinidade de aspectos dos cristais a que você voltará o olhar com espanto e não compreenderá com o intelecto convencional. Mas agora veja uma máquina – ela é perfeitamente transparente. Você pode saber tudo sobre ela; nós aplicamos força aqui, os mancais de escora estão aqui e ali, a quantidade de fricção é assim e assado, etc. Logo, você pode calcular sua eficiência se você conhece todos os fatores envolvidos. Não há nada sobre uma máquina que não possamos compreender com a razão e a inteligência normal. Mas isto é especialmente importante para o relacionamento dos homens com as máquinas. Se você já encontrou milhares e milhares de pessoas que trabalham com máquinas, então certamente deve saber o que as almas de tais pessoas têm lentamente absorvido. Você verá, ou talvez somente pressinta o que tem penetrado furtivamente as almas de pessoas assim, a partir destas máquinas espiritualmente transparentes. O que torna essas máquinas tão devastadoras para as pessoas é sua transparência espiritual: todas as forças e interações nas máquinas são tão transparentes, tão claras à mente humana. E o problema é que a clareza mecânica extrai vida do coração do homem, suga-lhe vitalidade anímica, torna as pessoas secas e desumanas. A combinação de ciência e máquinas ameaçará a civilização com três formas de destruição se não nos unirmos o suficiente e nos voltarmos para o supra-sensível. O ideal científico, isto é, moldar tudo segundo a imagem astronômica, está ganhando um domínio cada vez maior. O ideal para muitos é modelar todo o nosso entendimento da natureza conforme a imagem astronômica do universo. Pensem como os químicos imaginam as moléculas. Eles as imaginam como sendo compostas de átomos, e estes unidos uns aos outros por certas forças, de sorte que o resultado é tal como pequenos sistemas planetários. O ideal é explicar o mundo inteiro astronomicamente, mas a meta da astronomia é visualizar a estrutura do universo como um mecanismo. Some-se a isto todo o trabalho que se faz com máquinas! Estas são as coisas que têm tido um efeito progressivamente intenso desde meados do século XV e estão agora roubando aos seres humanos sua própria humanidade. Se as pessoas levarem o pensamento mecanicista e a indústria ao que resta da vida, então seus espíritos tornar-se-ão mecanizados, suas almas dormentes e vegetabilizadas, e seus corpos animalizados. Vejam a América – epítome do espírito mecanizado. Olhem para a porção oriental da Europa e Rússia; os impulsos e instintos que têm se mostrado Página 2
  • 3. desenfreados por lá são terríveis, e eles resultam na animalização do corpo. Na Europa central, encontramos o adormecimento da alma. Mecanização do espírito, vegetabilização da alma e animalização do corpo – isto é o que temos de enfrentar sem ilusões.” Parece-me que em nosso dia-a-dia podemos perceber a manifestação destas três forças como que insidiosamente se imiscuindo em nossas vidas. Podemos senti-las nos episódios de vandalismo, na falta de interesse pelas necessidades dos outros, na pouca compaixão, na intolerância, na sexualidade desenfreada e prematura, no uso de entorpecentes como busca de gratificação ou compensação para outras coisas, na visão reducionista e materialista do mundo e do homem Elas atuam tal como germes patogênicos que encontrando oportunidade para isso, penetram no organismo, colonizando-o, nele se multiplicando e levando-o a adoecer. Nossos atos cometidos por influência destas forças são como sinais e sintomas de uma infecção anímica. Ora, a susceptibilidade do organismo está ligada a uma baixa da imunidade. Quando as defesas orgânicas estão em ordem, quando a salutogênese é praticada, dificilmente se adoece. Imaginemos agora nossa escola como um organismo social-espiritual, um ser vivo. Que significaria para ele uma boa imunidade? A imunidade é a expressão a nível biológico do senso de identidade e missão de um ser. O sistema imune é justamente aquele cujas células procuram distinguir o que lhe é próprio do que lhe é estranho e então, englobar e eliminar o que não lhe pertence como self. Ele funciona como um permanente estado de vigilância e atenção. Como poderíamos então, enquanto organismo social, enquanto uma comunidade, desenvolver ou adquirir uma boa imunidade, uma capacidade de reconhecer e lidar adequadamente com a presença destas forças adversas? Há uma linda história que nos pode responder a esta questão: trata-se da história da ―Canção da Criança‖. (vide texto ao final). Ela nos fala da afirmação da essência do Ser como se fora o reconhecimento e a lembrança da própria canção; e indica uma realidade: quando buscamos nossa essência e vivemos a partir dela não há em nós lugar para estas forças. Elas não encontram em nós ressonância, e perdem o poder sobre nós. Despertemos, então, e busquemos a nossa canção! Sobre a Antiga e a Nova Espiritualidade Houve tempo em que toda a vida exterior, quanto à sua estrutura social, política e econômica, era organizada mediante a sabedoria que emanava dos centros de mistérios. Naquele tempo estes centros de mistérios estavam ligados a edifícios cúlticos erigidos no plano físico, e neles a consciência do espiritual era cultivada através de purificação, instrução, e práticas meditativas. Os templos do Espírito eram visíveis exteriormente. ―Hoje, quando nossa vida se tornou tão desespiritualizada, esses templos não existem mais no plano acessível aos olhos materiais. Mas existem espiritualmente por toda parte, Página 3
  • 4. e quem os procurar, quem desenvolver em si certas qualidades anímicas até um grau elevado poderá encontrá-los”( Conhecimentos dos Mundos Superiores -GA 10). De acordo com Sergei Prokofieff, em seu livro ―May Human Beings Hear it!‖, justamente a fim de que o maior número possível de seres humanos possa encontrar tais templos a partir do poder da alma da consciência, a Antroposofia foi trazida à Terra. Ainda segundo Prokofieff, em verdade, todo o desenvolvimento da Antroposofia ao longo dos vinte e um anos, começando em 1902 e indo até a Assembléia de Natal em 1923, constituiu o processo de construção de um Templo Invisível, no plano suprasensível. Os primeiros sete anos foram dedicados à fundamentação de uma moderna ciência do espírito, de um caminho cognitivo que pudesse levar do sensível ao supra-sensível. Foram os anos em que Steiner escreveu suas obras básicas, culminando com a Ciência Oculta em que dá a conhecer os primeiros frutos de uma investigação espiritual sobre o Homem, sua origem, a morte, o destino, entre outros. Ele penetra na esfera dos pensamentos cósmicos e os converte em pensamentos humanos acessíveis a todos os que são dotados de um juízo sadio. Este primeiro setênio do desenvolvimento da ciência espiritual é principalmente ligado ao Pensar e corresponde no mundo espiritual ao primeiro estágio da construção do templo supra-sensível dos novos mistérios, constituindo a estrutura de uma dupla cúpula. O segundo período de sete anos (1910 a 1916) assumiu um caráter totalmente diferente do primeiro. Tudo quanto havia sido dado em forma conceitual era agora vertido para uma forma imaginativa, artística. Foram os anos dos dramas de mistérios, do surgimento da Arte da Fala e da Euritmia, da renovação das artes culminando na construção do primeiro Goetheanum – obra prima de arquitetura, escultura, pintura, enfim das artes plásticas impulsionadas por um saber espiritual. Foi também o período da pesquisa Cristológica e da proclamação da nova revelação do Cristo no Etérico. De um ponto de vista mais esotérico, pode-se dizer que nesta fase Rudolf Steiner penetrou na esfera das Imaginações Cósmicas transformando-as em imaginações humanas acessíveis a todo indivíduo que possua alguma sensibilidade artística e não esteja por demais contaminado pelo caráter arimânico- mecanicista e materialista da época. Com isto, Rudolf Steiner realizou a segunda etapa da construção do templo adicionando-lhe à cúpula, as paredes erguidas a partir de imaginações cósmicas e humanas no mundo etérico. O terceiro período (1916 a 1923) foi marcado pelo estabelecimento das iniciativas práticas inspiradas pela Antroposofia. Além dos impulsos de renovação da vida religiosa (Comunidade de Cristãos) e do âmbito social (Movimento para a Trimembração do Organismo Social), surgiram a educação Waldorf, a medicina antroposófica, a farmacologia (Weleda), agricultura biodinâmica, arquitetura orgânica, todas diretamente inspiradas a partir das Página 4
  • 5. fontes da Ciência Espiritual. Agora a Antroposofia penetrava o âmbito do querer, a partir da força cósmica do Amor espiritual. Pois, em realidade, o amor não é somente a expressão do sentir humano, mas a mais poderosa força criadora, uma força tão poderosa que pode atuar na transformação e espiritualização da matéria. Assim, nesta época, Steiner estabeleceu os alicerces do Templo supra-sensível e completou-o ao final do terceiro setênio. Seu fundamento consistia, portanto de Amor Cósmico e Humano. À construção do templo, seguiu-se sua consagração aos poderes que guiam a nossa evolução — o Ser do Cristo, Michael e o ser Antroposofia. Isto se deu através do Congresso de Natal em 1923, um ponto crucial da história da Antroposofia cujo teor e significado, entretanto, não vamos abordar agora, pois nos levaria longe demais. Para nós, neste momento, basta saber que em conexão com este acontecimento deu-se a Fundação dos Novos Mistérios Cristãos; e todo aquele que a partir de sua livre vontade queira trilhar este caminho de desenvolvimento conscientemente, pode encontrar a senda que conduz ao templo do Ser Vivo Antropos-Sophia. Resta-nos agora indagar, como o despertar para a busca de um caminho interior no qual se procure cultivar a própria essência, a própria espiritualidade se relaciona com a tarefa de educar os filhos? Examinemos, pois, inicialmente, o significado de tornar-se Pai e Mãe, e o que isto requer de cada um de nós. O Significado de Ser Mãe ou Pai De acordo com a Dra Michaela Gloecker, em seu Consultório Pediátrico, ―os termos mãe, pai e filho sempre tiveram um significado duplo – um natural e um ideal. Inicialmente, é a criança que faz a mãe ser mãe e o pai ser pai, por meio da procriação, da concepção, da gestação e do parto. Nessa sucessão, a mulher vivencia o processo de tornar-se mãe como um processo predominantemente corporal, em que a criança se apodera dela e nela se desenvolve. O homem, no entanto, embora tenha impulsionado o processo fisicamente, vivencia o tornar-se pai principalmente no âmbito anímico. A ele cabe o papel de acompanhar a gravidez e o parto com uma atitude de observação sensível. O resultado sensato disso é que ele pode estar à disposição para ajudar, não apenas nas semanas e meses após o parto, mas, além disso, para cuidar da base existencial exterior da família em desenvolvimento. No pai isso coincide com uma tendência instintiva. Ele fica feliz em poder fazer algo para a proteção, a segurança e as necessidades da mãe e da criança; fica magoado quando é impedido de realizar esses feitos, ou quando seus esforços não são levados a sério. O elemento especificamente paterno está na capacidade de estar presente interiormente e exteriormente, quando a mãe e o filho necessitam dele, percebendo-os e levando-os em sua consciência. Essa é a origem do profundo sentimento de pertinência, que permite à mãe e ao filho sentirem-se protegidos animicamente. Página 5
  • 6. Neste espaço anímico aberto pelo interesse paterno, as habilidades específicas da mãe podem desenvolver-se com a maior efetividade possível: estas consistem na prontidão e na abertura amorosas, necessárias para executar com paciência e alegria os infinitos atos repetitivos requeridos pelo crescimento da criança no período inicial. Dispensada, sempre que possível, das preocupações materiais, a mãe pode dedicar-se livremente ao filho. Essa situação se estende até o momento em que a criança desenvolve por si mesma a tendência a passar regularmente algumas horas do dia em outros espaços vitais, isto é, quando ela se torna madura para freqüentar o jardim de infância. No caso de uma relação a três intacta, ela pode assimilar então, de maneira marcante, o modo como dois adultos inteiramente diferentes lidam entre si e com ela, possibilitando seu desenvolvimento como ser humano. Reconhecendo as necessidades específicas para o desenvolvimento da criança pequena, os órgãos oficiais instituíram a licença maternidade, com duração de quatro meses. Queremos salientar que ser mãe, isto é, estar de corpo e alma à disposição das crianças durante o dia inteiro, representa uma atividade profissional plenamente válida. Seria correto ter um reconhecimento financeiro a partir dos recursos públicos! Quando, principalmente na fase pré-escolar as crianças podem ter um verdadeiro lar, um espaço vital em que sejam percebidas e onde alguém se dedique a elas, não sendo a mãe obrigada a trabalhar fora para ganhar dinheiro, elas manifestam sua gratidão aos pais com saúde e alegria de viver. Por isso recomendamos, no interesse das crianças, que se aproveite esta oportunidade sempre que possível. Nada pode substituir as vivências infantis de proteção, confiança e relacionamento constante nos primeiros três anos. Mesmo quando os pais dividem esta tarefa entre si, ainda se mantém um gesto fundamental, ideal, dessa trindade: no centro, a criança, que exige e aceita tudo com naturalidade, e a seu lado, os pais, que acompanham seu desenvolvimento, alegram-se com seus progressos e, como retribuição, recebem o amor e a confiança do filho. Com isso tocamos o lado ideal do que significa ser pai e mãe: com toda a naturalidade, a criança vive protegida e com plena confiança nos pais. Porém a mãe e o pai são como que os representantes daquilo que em todas as religiões foi venerado como aspectos divinos paterno e materno, ao lado do elemento eternamente em devir e que, no cristianismo, tem sua designação suprema na Santíssima Trindade. Quem quando criança, experimentou a aceitação carinhosa e sem reservas de sua própria essência tal qual ela é, e também o empenho para se atingir o que é puramente humano, verdadeiro e bom, gosta de lembrar-se de sua infância mesmo que tenha sofrido pobreza e penúria materiais. Jacques Lusseyran declarou em sua biografia que o amor Página 6
  • 7. que seus pais nutriam por ele, criança cega, era como a armadura mágica que, uma vez colocada, protege por toda a vida.” Assim, reconhecemos que há um ideal. Mas na prática, o que acontece? Será que conseguimos honrar esta imagem de Pai e de Mãe? Será que conseguimos ser assim? Vejamos... O Desafio de Educar os Filhos Educar os filhos é uma das tarefas mais instigantes, trabalhosas, e estressantes do planeta. É também uma das mais importantes e gratificantes, pois através dela se marca profundamente a próxima geração, influenciando- lhe o coração, a alma, a consciência, a experiência de sentido e ligação, o repertório de habilidades para a vida e os mais profundos sentimentos que essa geração tem sobre si mesma e seu possível lugar num mundo em transformação acelerada. Entretanto, quando nos tornamos pais, fazemos isso praticamente sem qualquer preparação ou treino; muitas vezes com pouca ou nenhuma orientação e apoio, e tudo isso num mundo que valoriza muito mais o produzir do que o nutrir, o fazer do que o ser. Tipicamente, o trabalho de criação dos filhos é uma jornada para a qual se parte sem uma estratégia clara nem uma visão panorâmica do terreno, mais ou menos com a postura intuitiva e otimista que assumimos diante de outras situações da vida. Aprende-se com a prática. Não há de fato outra maneira. É verdade que existem inúmeros ―manuais‖ sobre educação de filhos e que podem até ser úteis como referência, mostrando-nos novas maneiras de ver as situações ou tranqüilizando-nos ao comprovar, especialmente quando ainda somos inexperientes, que há várias formas de lidar com as coisas e que não estamos sós. Mas o que estes livros não costumam abordar é a experiência interior do trabalho de educar os filhos. Como não se deixar engolir por tantas dúvidas, incertezas, inseguranças, problemas reais que enfrentamos na vida, momentos de conflito interno ou com terceiros, inclusive com os próprios filhos? Esses livros também não dizem como podemos nos tornar mais sensíveis e dar mais valor às experiências interiores dos nossos filhos. Para sermos pais conscienciosos, precisamos fazer um trabalho interior conosco mesmos aliado ao trabalho exterior de criar e proteger nossas crianças. O conselho técnico que podemos aprender nos livros para nos ajudar no trabalho exterior precisa ser complementado por uma autoridade interna que só podemos cultivar e conquistar em nós mesmos por meio da lapidação de nossa experiência pessoal. Esta autoridade interna só se desenvolve quando nos damos conta de que, apesar de todos os acontecimentos que escapam ao nosso controle, continuamos sendo primordialmente através das escolhas que fazemos em razão desses fatos, e através do que partiu de nós mesmos, os autores de nossas vidas. Ao perceber isso, podemos acabar Página 7
  • 8. reconhecendo o quanto é importante para nossos filhos e nós mesmos assumir responsabilidade pela forma como vivemos nossa vida e pelas conseqüências das escolhas que fazemos. A autoridade e autenticidade interiores podem ser extraordinariamente desenvolvidas se fizermos esse trabalho interior. Nossa autenticidade e nossa sabedoria aumentam quando estamos conscientes das coisas que fazemos. Quando temos nossa atenção presente em cada pensamento, ato ou palavra. Com o tempo, podemos aprender a conhecer mais profundamente cada um de nossos filhos e saber o que precisam e tomar a iniciativa de descobrir formas apropriadas de educá-los promovendo seu crescimento em todos os sentidos. Também podemos aprender a interpretar os sinais diversos e muitas vezes enigmáticos que ás vezes eles nos enviam através de seu comportamento e confiar em nossa capacidade de encontrar uma maneira adequada de agir. Atenção, exame e consideração constantes são essenciais neste caminho. Podemos nos tornar pais intencional ou inadvertidamente, mas, seja como for, a paternidade e a maternidade são uma vocação. Na realidade, trata-se de nada menos que uma disciplina espiritual rigorosa – a busca do ideal de realização do que há de mais profundo e verdadeiro em nossa natureza como seres humanos. O simples fato de nos tornarmos pais é um estímulo contínuo para a manifestação do que temos em nós de melhor, mais amoroso, sábio e carinhosos, para sermos as melhores pessoas que pudermos ser. Lidar com filhos anuncia todo um conjunto novo de solicitações e mudanças em nossas vidas, exigindo que renunciemos a muitas coisas conhecidas e que assumamos outras tantas desconhecidas. Em geral contamos apenas com nossos instintos humanos mais profundos e a bagagem que trazemos de nossa infância, tanto a positiva quanto a negativa, para enfrentar o território desconhecido de ter filhos e educá-los. E assim como na vida quando nos vemos diante de pressões familiares, sociais e culturais para observar normas em geral tácitas e inconscientes, e de todas as tensões inerentes ao exercício da paternidade, apesar de nossas melhores intenções e do amor que sentimos por eles, muitas vezes estamos ligados no piloto automático. Além disso, quanto maior for nossa preocupação com o tempo, a nossa pressa, tanto menor será o nosso contato com a riqueza, o viço do momento presente Esse momento pode parecer demasiado comum, rotineiro ou fugaz para merecer atenção, e vivendo assim, facilmente caímos na armadilha do automatismo ilusório, enquanto mantemos a crença de que tudo o que fazemos por eles é certo. Uma atuação automática, não permeada pela atenção consciente pode causar danos profundos ao desenvolvimento da criança. A atitude inconsciente em relação à educação dos filhos também conspira para deter nosso crescimento potencial como pais. Essa inconsciência traz, muitas vezes, tristeza, oportunidades perdidas, sofrimento, ressentimento, censura, sentimentos de Página 8
  • 9. autodesvalorização, e outras coisas mais. Se formos capazes de permanecer despertos para os desafios e a vocação da paternidade/maternidade, isso não precisa acontecer. Ao contrário, podemos usar todas as ocasiões que surgirem com nossos filhos para derrubar barreiras em nossas próprias mentes, para enxergar com mais clareza dentro de nós mesmos e estar presentes para eles de modo mais efetivo. Um dos grandes desafios de se educar filhos em nossa época vem do fato de vivermos numa cultura que não valoriza muito o ofício da maternidade como trabalho válido e honrado. Considera-se perfeitamente aceitável as pessoas dedicarem-se integralmente às suas carreiras ou às suas relações, ou círculos sociais, mas há bem pouco apoio, às vezes até críticas veladas ou mesmo abertas à postura de quem escolhe dedicar-se aos filhos. A sociedade como um todo, com seus valores e instituições que moldam e ao mesmo tempo refletem o microcosmo de nossas mentes e valores individuais, contribui muito para desvalorizar o trabalho de educação das crianças. Quem recebe os maiores salários no país? Certamente não quem trabalha em creches, nem os professores, cujo trabalho tanto apóia a tarefa dos pais. Onde estão os exemplos, as redes de apoio, o trabalho compartilhado e o trabalho em meio expediente para mães e pais que não se contentam em ficar apenas umas poucas semanas com seus filhos recém-nascidos em casa? Onde estão os subsídios para jovens pais, os cursos de pais, programas adequados de licença paternidade e maternidade, que, por sua prevalência, nos mostram que o trabalho de educar os filhos é da maior importância e é altamente valorizado pela sociedade? Certamente há coisas boas e razões para se ter esperança. Há também quem veja sua função de pai/mãe como uma missão sagrada, e encontra maneiras criativas e calorosas de orientar seus filhos e cuidar deles, muitas vezes enfrentando grandes obstáculos e dificuldades. Existem também os que se ocupam em criar programas e serviços de orientação às famílias, oferecer conhecimento, alternativas saudáveis de recreação, e assim por diante. Mas os problemas são desconcertantes e estão criando um ambiente social em que é cada vez mais difícil para as famílias educar filhos saudáveis. Manifestações tangíveis e diárias de amor, apoio, energia e interesse por parte de adultos de carne e osso e respeitados estão-se tornando cada vez mais raras hoje em dia. Porém, se de um lado somos sujeitos a grandes forças sociais que moldam nossas vidas e as vidas de nossos filhos, por outro, também temos a capacidade como indivíduos de escolher conscientemente como vamos nos relacionar com as circunstâncias e com a era em que vivemos. Todos nós temos o potencial para traçar nossos caminhos, para viver com mais atenção e intencionalidade, e para tentar ver e honrar as profundas necessidades espirituais de nossos filhos e as nossas da melhor forma possível. Traçar um Página 9
  • 10. caminho como esse para nós fica mais fácil quando temos uma estrutura maior como parâmetro e entendemos o que estamos fazendo e o que precisa ser feito – uma estrutura que pode nos ajudar no caminho, mesmo que as coisas estejam sempre mudando e nossos próximos passos nem sempre sejam evidentes. O conhecimento científico-espiritual pode fornecer parte desta estrutura. A atenção pode complementá-lo. Uma relação atenta com a integridade de nossa vida – isto é, com as nossas experiências interiores e exteriores – é uma alternativa profundamente positiva e prática ao modo de operação no piloto automático que adotamos tantas vezes sem sequer perceber. Isso é particularmente importante para nós pais, enquanto fazemos malabarismos para tentar atender a todas as exigências do dia-a-dia e trabalhamos para sustentar nossos filhos e lhes dar aquilo de que precisam num mundo cada vez mais desgastante e complexo. O Exercício da Maternidade/Paternidade Atenta A maternidade/paternidade atenta é uma convocação para o despertar de uma nova consciência e uma nova intencionalidade para as possibilidades, benefícios e desafios da tarefa de criar os filhos. Esta consciência, que vem a ser atenção consciente, pode levar à compreensão mais profunda de nossos filhos e de nós mesmos. A atenção tem o potencial de penetrar no fundo das aparências e comportamentos e nos permitir enxergar mais claramente e agir com mais sabedoria e compaixão. Esta pode ser uma prática regeneradora e transformadora. Neste caminho, muitas vezes nossos filhos são como mestres, eternamente desafiadores, sempre nos oferecendo oportunidades de fazer o trabalho interno de compreender quem somos e quem eles são, para que possamos estar em contato com o que é realmente importante e lhes dar aquilo de que necessitam a fim de desvelar todo seu potencial. Ao longo desse processo, podemos descobrir que esta consciência permanente pode nos liberar de alguns hábitos de percepção e relacionamento mais limitadores, as camisas de força e as prisões mentais que adquirimos ou construímos para nós mesmos. Quanto mais conseguirmos ter em mente a beleza e completude intrínsecas de nossos filhos, especialmente nos momentos em que isso nos é mais difícil, tanto mais aprofundaremos nossa capacidade de agir atentamente. Esses nossos ―professores‖ certamente nos oferecerão inúmeros momentos de maravilhamento e felicidade, e oportunidades para os sentimentos mais profundos de ligação e amor. E também evocarão nossas inseguranças, testarão nossos limites, tocarão aqueles nossos pontos que temos medo de tocar. Estão sempre como um espelho para que nos olhemos. Se estivermos dispostos a prestar atenção, eles nos mostrarão o melhor da vida, inclusive seu mistério, enquanto compartilhamos esta jornada com eles. Página 10
  • 11. Para colocarmos essa atenção consciente em nosso relacionamento com nossos filhos, é bom saber algo sobre ela: Essa atenção significa uma consciência permanente desprovida de crítica. É algo que desenvolvemos cultivando a capacidade de nos concentrar, intencionalmente, no momento presente, e manter essa concentração da melhor forma possível. Em geral, vivemos a maior parte do tempo ligados no piloto automático, sem dar importância a muitas coisas importantes ou deixando-as passar totalmente despercebidas, e julgando tudo o que experimentamos a partir de opiniões apressadas e muitas vezes não ponderadas, baseadas no que gostamos ou deixamos de gostar, no que queremos ou deixamos de querer. A atenção consciente nos oferece um meio para nos concentrarmos no que quer que estejamos fazendo a cada momento, e com isso, enxergarmos uma realidade mais profunda por trás do véu de nossos gestos e pensamentos automáticos. A atenção consciente sempre esteve no cerne de todos os caminhos de desenvolvimento espiritual. Ela é uma disciplina meditativa. É interessante observar como no vocabulário grego existe uma grande proximidade entre as palavras proseuchè – oração e prosochè – atenção. Como diz LeLoup, um homem atento é já um homem que ora; ―nesse caso, a oração não é outra coisa senão a atenção do coração à Presença Uma que transforma cada coisa em um presente; um reconhecimento agudo e terno daquele que É em tudo o que é...‖ Malebranche também disse: ―A atenção é a prece natural da alma‖. E agora até mesmo a neurociência reconhece estas relações entre oração/meditação e atenção através de estudos por ressonância magnética que demonstram uma maior ativação de áreas do cérebro relacionadas com a função atenção em estados meditativos e seus efeitos sobre a saúde. Não é um acaso se os antigos terapeutas eram chamados grandes vigilantes; os monges também se juntaram a eles nesse labor e é desta atenção que é extraído seu conhecimento e louvor. Aliás, a atenção constitui o momento único em que a inteligência e o coração podem estar juntos. Diádoco de Fótice convida incessantemente a prestar atenção; disso, os manuscritos de sua obra revelam: ―Quando um psiquismo (psichè) começa a se purificar pela intensidade de sua atenção, nesse caso, como se fosse um verdadeiro remédio de vida, ele sente o frêmito divino que o queima‖. Aqui, a atenção é considerada como um remédio; trata-se do retorno ao Real. A atenção é exatamente este caminho de retorno: ela faz-nos voltar desse esquecimento do Ser; ainda mais, ela faz-nos sair do inferno que é a ausência de misericórdia. Página 11
  • 12. ―... A atenção é neste caso, outro nome para dizer Amor, quando este não se contenta com emoções ou boas vontades, mas torna-se o exercício cotidiano de um encontro com o que é, com o que somos. Através dos labirintos de nossas preocupações, seria necessário conservarmos um fio de feliz vigilância. Sem essa vigilância, como poderíamos reconhecer a Presença Una, sob suas múltiplas formas, e degustar seu sabor (sapienza)? Como poderíamos cuidar do Ser?‖ O exercício da educação atenta envolve ter em mente o que é verdadeiramente importante enquanto estamos executando as atividades do dia-a-dia com nossas crianças. Na maior parte do tempo, podemos achar que precisamos nos lembrar do que é isso, ou mesmo admitir que não o sabemos naquele momento, pois é fácil perder o fio do sentido e o rumo de nossas vidas. Mas mesmo nos momentos mais difíceis e às vezes terríveis que enfrentamos como educadores, podemos cuidadosamente recuar e começar de novo, perguntando-nos como se pela primeira vez, e vendo com novos olhos: ―O que é verdadeiramente importante aqui?‖ De fato, ser atento na educação de crianças significa ver se podemos lembrar- nos de colocar este tipo de concentração, abertura e sabedoria em todos os momentos que temos com elas. E para isto, é preciso aprender a ficar em silêncio dentro de nós mesmos. Na quietude, estamos mais preparados para enxergar além do tumulto, nebulosidade e reatividade endêmicos em nossas mentes, nos quais freqüentemente nos enredamos, e assim, desenvolver a lucidez, a calma e a percepção, aproveitando essas coisas diretamente em nosso trabalho com nossas crianças. Como todo mundo, nós temos nossas necessidades e desejos, assim como as crianças. E tanto em aspectos importantes como em aspectos banais, estas necessidades podem ser muito diferentes e até conflitantes. E este choque de necessidades, especialmente se estamos estressados, sobrecarregados e esgotados, pode se tornar num cabo de guerra, uma competição, um medir forças para ver quem sai ganhando. Ao invés de competir com as crianças, os educadores atentos desenvolvem uma consciência, exatamente em momentos assim, de como nossas necessidades são interdependentes. O bem-estar das crianças afeta o nosso, e o nosso afeta o deles. Isto é, se eles não estão bem nós sofremos, e se não estamos bem, eles sofrem. Isto significa que temos de estar sempre trabalhando para perceber as necessidades deles assim como as nossas, tanto emocionais quanto físicas, e, dependendo da idade deles, dialogar e chegar a acordos com eles e internamente conosco, para que todo mundo consiga um pouco daquilo de que mais necessita. Pela qualidade de nossa presença, nosso compromisso com eles é sentido, mesmo nas horas mais difíceis. E com o tempo, podemos Página 12
  • 13. fazer escolhas mais ditadas por essa ligação sincera, o que certamente envolverá mais bondade e sabedoria. Consideramos o trabalho dos educadores uma responsabilidade sagrada. Em geral, espera-se dos pais e educadores que sejam nada menos que protetores, nutridores, confortadores, professores, guias, companheiros, modelos e fontes de amor e aceitação incondicionais. Bem sabemos que não conseguimos corresponder totalmente a isso. Mas se pudermos ter em mente essa concepção desse trabalho como uma responsabilidade sagrada, e colocarmos um pouco de atenção no processo à medida que ele se desenvolve, é muito mais provável que nossas respostas sejam guiadas por uma consciência do que esse momento, ou esse menino ou menina _ nesse estágio de sua vida _ está nos pedindo, com seu ser e seu comportamento. Estando à altura desse desafio, podemos não apenas acabar fazendo o que é melhor para eles, mas também revelar e passar a conhecer o que temos de melhor e de mais profundo. A educação atenta requer o reconhecimento e identificação dos desafios que enfrentamos diariamente na tentativa de fazer um trabalho consciente como educadores. Neste exercício de atenção, a consciência tem de ser inclusiva. Quer dizer, tem de incluir o reconhecimento de nossas próprias frustrações, inseguranças e defeitos, nossos limites e limitações, e até nossos sentimentos mais sombrios e destrutivos, e as maneiras como podemos nos sentir esmagados ou desfeitos. Desafia-nos a trabalhar essas questões de forma consciente e sistemática. Assumir uma tarefa destas é pedir muito de nós mesmos. Pois em diversos aspectos somos produtos e, às vezes, em maior ou menor grau, prisioneiros dos fatos e circunstâncias de nossa infância. Já que a infância molda significativamente nossa visão de mundo e de nós mesmos, nossas histórias inevitavelmente moldarão nossa visão de nossas crianças e ―do que eles merecem‖ ou de como devem ser tratados, ensinados e socializados. Mesmo que às vezes não percebamos, somos muito apegados às nossas visões, sejam elas quais forem, como se estivéssemos dominados por encantos poderosos. Só quando percebemos esta característica é que podemos aproveitar o que houve de bom, positivo e enriquecedor no modo como fomos educados , e superar os aspectos que podem ter sido destrutivos e limitadores. Para aqueles de nós que tiveram de se fechar, de não ver, de suprimir os sentimentos para sobreviver à própria infância, tornar-se mais atento pode ser especialmente difícil e doloroso. Nessas horas, em que somos governados por nossos antigos demônios, em que vêm à tona crenças prejudiciais, padrões destrutivos e pesadelos de nossa infância, e somos atormentados por sentimentos negros e achamos que as coisas são ou pretas ou brancas, é complicadíssimo parar e ver as coisas com novos olhos. Página 13
  • 14. Mas o que conta não é a perfeição de resultados, e sim, a qualidade do esforço, o sentido de compromisso. A educação atenta é um processo contínuo de aprofundamento e refinamento da consciência e da habilidade de estarmos presentes e agir com sabedoria. Não é uma tentativa de atingir objetivos ou resultados fixos, por melhores que sejam. Uma parte importante deste processo é justamente sermos compassivos conosco mesmos. Isto significa enxergar e aceitar nossas limitações, cegueiras, nossa humanidade, falibilidade, e trabalhar com estas deficiências de forma atenta, procurando fazer o melhor possível. Agora, é preciso que se diga, este é um trabalho para quem se interessa, de verdade, pelo bem-estar e qualidade de vida das crianças. É para quem realmente quer demonstrar amor através de seu ser e de seus atos cotidianos. Não é provável que possamos fazer isto se não tivermos esta motivação como ponto de partida. Assim, antes que vocês me perguntem ―Como podemos fazer isso?‖ eu preciso perguntar: Vocês querem fazer isto? Por que se não formos pessoas autênticas e em contato com a totalidade dos sentimentos que experimentamos, não avançaremos neste caminho. Como todos nós sabemos, há poucas respostas fáceis ou soluções simples no que diz respeito à educação de seres humanos. Por outro lado, não se trata tanto de resultados perfeitos, e sim, de amor em ação. De compromisso assumido em amor. De decidir o que se quer e ser fiel a tal propósito com o melhor de nossas forças. Mas para os que quiserem assumir este compromisso temos uma proposta e um convite... Como Podemos Fazer Isso? Podemos tomar a resolução de empreender a busca cada um individualmente. E certamente há uma dimensão deste trabalho que é individual e solitária. Mas também podemos nos reunir num esforço conjunto e compartilhado, uma vez que nos encontramos numa escola, numa pedagogia, que tem a intenção de cultivar precisamente estes valores: a contínua ampliação do conhecimento e a auto-educação. Em verdade precisamos ainda confirmar nossa ―comum unidade‖ pelo livre reconhecimento de um propósito comum. Do contrário seremos um ajuntamento de pessoas que passam pelo mesmo lugar,pensam, sentem e realizam coisas, mas não constituem de fato uma comum unidade, pois não possuem uma consciência de pertencimento ao organismo social-espiritual desta escola e sua missão, como mencionamos anteriormente. Não se percebem como membros deste organismo. Mas se o fizermos, se nos identificarmos como irmãos ou companheiros de jornada, iguais aprendizes, talvez possamos realizar juntos um sonho: um sonho que muitos já sonharam antes de mim. Muitos o vislumbraram individualmente, mas para materializá-lo é preciso formar a comunidade da Página 14
  • 15. visão; é preciso que um número suficiente de pessoas livremente queira apoiá- lo em sua manifestação. Falo de uma Escola de Pais. De um movimento que poderia fomentar o exercício do educador atento, consciencioso e responsável, na medida em que oferece oportunidade para a aquisição de conhecimentos da ciência espiritual que fundamentam a Pedagogia Waldorf,sobretudo a antropologia,o estudo do homem, e para o treino da auto-observação, auto- educação. Estudo, vivência, auto-educação. Estamos começando... e precisamos fazer tudo com muito cuidado, pois a pressa é inimiga da perfeição. E queremos fazer o que quer que façamos em plena sintonia e harmonia com os professores, guardiões e praticantes destes princípios, para que juntos criemos as condições pelas quais nossas crianças poderão se desenvolver da melhor forma possível. Algumas oficinas já estão acontecendo, outras virão no seu devido tempo. Espero assim, com estas palavras acordar ao menos em alguns de vocês o desejo de começar ou retomar e aprofundar, para os que já começaram, este caminho interior dos pais. Muito obrigada! REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1) Os Fundamentos Espirituais do Mundo Exterior – GA 177 1ª conferência, Dornach, 29 de setembro de 1917 2) O Conhecimento dos Mundos Superiores – A Iniciação - GA 10 1º capítulo 3) A Educação como uma Força para a Mudança Social -- GA 296 1ª conferência, Dornach, 9 de Agosto de 1919 4) ―A Canção da Criança‖ de Tolba Phanem 5) May Human Beings Hear it! de Sergei Prokofieff capítulo 6 6) Consultório Pediátrico de Michaela Gloecker e Wolfgang Goebel pgs 328 e 329 da 3ª edição 7) Nossos Filhos, Nossos Mestres de Myla e Jon Kabat-Zinn 8) A Arte da Atenção de Jean Yves Leloup 9) O Despertar da Consciência de Eckhart Tolle Página 15
  • 16. A Canção da Criança Quando uma mulher, de certa tribo da África, sabe que está grávida, segue para a selva com outras mulheres e juntas rezam e meditam até que aparece a ―canção da criança‖. Quando nasce a criança, a comunidade se junta e lhe cantam a sua canção. Logo, quando a criança começa sua educação, o povo se junta e lhe canta sua canção. Quando se torna adulto, a gente se junta novamente e canta. Quando chega o momento do seu casamento a pessoa escuta a sua canção. Finalmente, quando sua alma está para ir-se deste mundo, a família e amigos aproximam-se e, igual como em seu nascimento, cantam a sua canção para acompanhá-lo na "viagem". "Nesta tribo da África há outra ocasião na qual os homens cantam a canção. Se em algum momento da vida a pessoa comete um crime ou um ato social aberrante, o levam até o centro do povoado e a gente da comunidade forma um círculo ao seu redor. Então lhe cantam a sua canção". "A tribo reconhece que a correção para as condutas anti-sociais não é o castigo; é o amor e a lembrança de sua verdadeira identidade. Quando reconhecemos nossa própria canção já não temos desejos nem necessidade de prejudicar ninguém.― Teus amigos conhecem a "tua canção" e a cantam quando a esqueces. Aqueles que te amam não podem ser enganados pelos erros que cometes ou as escuras imagens que mostras aos demais. Eles recordam tua beleza quando te sentes feio; tua totalidade quando estás quebrado; tua inocência quando te sentes culpado e teu propósito quando estás confuso.― Tolba Phanem Página 16