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FACULDADE ALVES FARIA
GRADUAÇÃO EM DIREITO
Eloi Costa Campos Junior
OS EFEITOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO NOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS
GOIÂNIA
NOVEMBRO DE 2014
FACULDADE ALVES FARIA
GRADUAÇÃO EM DIREITO
Eloi Costa Campos Júnior
OS EFEITOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO NOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS
Trabalho apresentado como exigência parcial
para conclusão da disciplina de Trabalho de
Conclusão de Curso I do Curso de Graduação
em Direito das Faculdades Alves Faria, sob a
orientação da Prof. Me. Aurélio Marcos
Silveira de Freitas.
GOIÂNIA
NOVEMBRO DE 2014
FACULDADE ALVES FARIA
GRADUAÇÃO EM DIREITO
Eloi Costa Campos Junior
OS EFEITOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO NOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS
AVALIADORES:
___________________________________________________________________________
Prof. Me. Aurélio Marcos Silveira de Freitas – ALFA
(Orientador)
___________________________________________________________________________
Prof. Me. Marcelo Lopes de Jesus - Leitor – ALFA
GOIÂNIA
NOVEMBRO DE 2014
Aos meus avós paternos e maternos, Donato e Ceci, Lúcia e Mamede “In
Memorian”, ao meu pai Eloi, minha mãe Sônia e minha querida irmã Daiana e ao meu
cunhado Fabrício, bem como minha namorada Ávily.
AGRADECIMENTOS
A Deus por ter me proporcionado essa valiosíssima oportunidade e por ter me
dado condições para concluir este curso.
Aos meus pais, por terem me apoiado em toda trajetória, não só acadêmica,
sempre me incentivando e acreditando em meu potencial, posto que sem eles eu não teria
conseguido alcançar este tão almejado sonho.
A minha irmã Daiana por sempre ter acreditado em mim e, de uma forma direta
ou indireta, ter me apoiado, pois sei que sempre torceu pelo meu sucesso.
A todos os meus amigos e colegas, especialmente Johnathan Gonçalves,
Guilherme e Johnatan Ferreira que foram companheiros e verdadeiros amigos em todos os
momentos, dentro e fora do ambiente acadêmico.
Aos meus Pastores Vilmar Felipe e Silvania.
A todos os meus professores, aos meus coordenadores Diogo e Bebel e ao meu
orientador Aurélio, que com muita destreza e tranqüilidade me conduziu à conclusão deste
trabalho.
Fui à floresta porque queria viver de verdade. Eu queria viver profundamente e
tirar toda a essência da vida. Fazer apodrecer tudo o que não era vida e não, quando eu
morrer, descobrir que não vivi.
Henry David Thoreau
(Frase tradicional de abertura das reuniões da Sociedade dos Poetas Mortos)
RESUMO
CAMPOS JÚNIOR, Eloi Costa. Efeitos do Neoconstitucionalismo nos direitos
fundamentais. Monografia, 2014. Graduação em Direito das Faculdades Alves Faria.
Goiânia, 2014.
Sabemos que a sociedade está cada vez mais complexa em suas relações, visto
que todos os dias surgem novos ideais e novas verdades que, até então, eram desconhecidas.
A todo o momento os pensamentos que, outrora, eram sustentáculo da harmonia social entram
em choque com o desenvolvimento e simplesmente são esquecidos. Diante dessa rápida
evolução é necessário um sistema de controle social, sendo indispensável um mecanismo de
solução de conflitos, e, diante desta necessidade, cria-se um sistema jurídico formado por leis
para que controle a sociedade e seus integrantes. Mas quando se tem todo um ordenamento
jurídico formado e este não é suficiente para satisfazer todos os anseios e necessidades, tem-
se então um grande problema: um sistema de controle social ineficaz, consequentemente um
grande risco para a existência e desenvolvimento desta sociedade, já que as leis não
conseguem acompanhar todas as mudanças e evoluções, estas estão totalmente fadadas ao
fracasso. Por isso, se faz necessário a criação de um modelo de interpretação de leis que
consiga compensar a defasagem de um determinado ordenamento jurídico diante das
transformações e evoluções. Por esta ótica, discorreremos, no presente trabalho, sobre o
movimento denominado neoconstitucionalismo que visa interpretar a lei de modo que consiga
trazer aos conflitos sociais a solução mais ponderada e razoável, utilizando-se dos princípios
gerais de direito, elencando algumas das vantagens desta atual concepção, mais precisamente
em relação aos direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal 1988, evidenciando
seus efeitos no direito brasileiro.
PALAVRAS-CHAVE: Constitucionalismo. Neoconstitucionalismo. Aplicação. Princípios.
Direitos e Garantias Fundamentais. Constituição Federal.
ABSTRACT
CAMPOS JÚNIOR, Eloi Costa. Neoconstitutionalism Effects on Fundamental Rights.
Monograph, 2014. Graduated in Law Colleges Alves Faria. Goiânia, 2014.
We know that society is increasingly complex in their relationships, since every
day brings new ideas and new truths that, until then, were unknown. At all times the thoughts
that once were the mainstay social harmony collide with the development and simply are
forgotten. Given this rapidly evolving a system of social control is necessary, and
indispensable means of resolving conflicts, and facing this requirement, it creates a legal
system composed of laws to control the society and its members. But when it has formed an
entire legal system and this is not enough to satisfy all the desires and needs, then has a big
problem: a system of social control ineffective, hence a big risk for the existence and
development of society, as that laws can not keep up with all the changes and developments,
these are totally doomed to failure. Therefore, the creation of a model of interpretation of laws
that can compensate for the lag of a particular jurisdiction before the changes and
developments is needed. For this perspective, we will discuss in this paper, about the
movement called neoconstitutionalism which aims to interpret the law so that it can bring to
social conflicts more thoughtful and reasonable solution, using the general principles of law,
listing some of the advantages of this current design, specifically in relation to fundamental
rights and guarantees of the Federal Constitution in 1988, showing their effects in Brazilian
law.
KEYWORDS: Constitutionalism. Neoconstitutionalism. Application. Principles.
Fundamental Rights and Guarantees. Federal Constitution.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 10
CAPÍTULO 1 NOÇÕES HISTÓRICAS DO NEOCONSTITUCIONALISMO.....12
1.1 NOÇÕES SOBRE O CONSTITITUCIONALISMO NA EUROPA....................... 12
1.2 O CONSTITUCIONALISMO NORTE-AMERICANO.......................................... 16
CAPÍTULO 2 VIAGENS DO CONSTITUCIONALISMO AO
NEOCONSTITUCIONALISMO.........................................................................20
2.1 CONSTITUCIONALISMO MODERNO............................................................... 20
2.2 NEOCONSTITUCIONALISMO – UMA VISÃO RECENTE E
EFICAZ..........................................................................................................................26
CAPÍTULO 3 APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO
EM CASOS CONCRETOS................................................................35
3.1 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: DIREITO AO
ESQUECIMENTO......................................................................................................... 35
3.2 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: LEGITIMIDADE DA
INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO CARACTERIZADA PELA ANENCEFALIA .... 40
3.3 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: UNIÕES
HOMOAFETIVAS......................................................................................................... 42
CONCLUSÃO................................................................................................................ 46
REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 49
10
INTRODUÇÃO
Ao escolher um tema que será objeto de estudos, nem sempre se escolhe
pelo grau de complexidade da matéria, mas sim pela utilidade e contribuição jurídica do
tema, e pautando-se nessa perspectiva, me deparei com o tema “neoconstitucionalismo”
que em primeira mão não parece ser tão atraente, mas diante do que vivenciamos
ultimamente em nossa sociedade, não poderia haver outra escolha senão a escolha do
tema “neoconstitucionalismo”.
Vivenciamos a liberdade da transformação em nossa sociedade em sua
forma clara e notável. As doutrinas, que outrora eram de grande estima entre os
estudiosos, já não são tão desejadas, e de braços dados com as leis, passam por uma
crise existencial.
Hoje pode-se dizer que tudo é novo, é “neo” é “pós”. Pós-modernidade,
Pós-positivismo, Neoconstitucionalismo. Os intérpretes e estudiosos se vêem imersos
no desenrolar deste cenário, operando em meio aos avanços de novos ideais e ideias,
não conseguindo, muitas das vezes, distingui-los e organizá-los, visto a rapidez e
complexidade das relações dos homens dentro de uma sociedade civilizada.
A velocidade das transformações, edições e alterações das leis já não
conseguem acompanhar a rapidez evolutiva da sociedade. As leis não conseguem mais
expressar a eficácia que deveria diante à complexidade das relações sociais. Por isso
acompanhar a mudança do modo de pensar dos indivíduos e adequá-los às leis não é
tarefa fácil.
Urge-se então a necessidade de se criar um remédio que cure as
consequências deixadas pela ineficácia da lei. Surge então o Neoconstitucionalismo.
Este movimento traz a constituição e seus princípios implícitos e explícitos
ao centro de nosso ordenamento jurídico pátrio, transcendendo aos outros ramos do
direito.
Nesse novo sistema os direitos fundamentais ganham grande relevância e
aplicabilidade, nunca vista antes, prescindindo de normatização infraconstitucional para
a sua eficácia. Esse movimento se mostra cristalino em nosso ordenamento jurídico, nas
decisões judiciais bem como em nossa maior corte judiciária, Supremo Tribunal
Federal, principalmente nas decisões de efeito “erga omnes” quando é necessário
ponderar direitos e garantias.
11
Pretende-se analisar esta nova percepção constitucional, atravessando o
passado e analisando as fronteiras que estão sendo rompidas à vista dos
questionamentos atuais.
Utilizando-se de exemplos para demonstrar a sua aplicabilidade e os
conflitos, outrora inexistentes, de normas constitucionais, e a carga principiológica que
vem sendo utilizada pelo intérprete para soluções favoráveis ao bom senso e
ponderação.
12
CAPÍTULO 1 NOÇÕES GERAIS DO CONSTITUCIONALISMO
1.1 NOÇÕES SOBRE O CONSTITITUCIONALISMO NA EUROPA
“Eu sou a Lei, eu sou o Estado; o Estado sou eu”
Luís XIV
Essa foi a frase proclamada pelo “Rei Sol”, como ficou conhecido um
monarca absolutista da França que teve seu reinado de 1643 a 1715. A frase caracteriza
muito bem a época conhecida como “Absolutismo”, típico regime da idade média.
No Absolutismo, o país era governado e regido basicamente pela vontade
arbitrária e irresponsável de um monarca, pelo que se acreditava, que lhe eram
outorgados poderes divinos de reinar sobre o povo e que suas decisões eram inspiradas
por Deus, e que contrariar a decisão de um Rei seria contrapor-se a vontade de Deus.
Como explica a doutrinadora Flávia Lages de Castro:
A teoria mais utilizada pelos monarcas absolutistas e seus seguidores para
justificar tamanho poder foi dada pelo Bispo Jacques Bossuet, Autor de
“Política Extraída da Sagrada Escritura”. Nessa Obra, afirma que a
autoridade do rei é sagrada, pois emana de Deus. A partir dessa afirmação
popularizou-se a ideia de que o rei é rei porque Deus quis e, se é da Vontade
Divina, não deve haver nenhum tipo de discussão acerca do assunto porque
seria, no mínimo, um pecado. (2011, p. 200).
Essa ideia fez com que os demais homens acreditassem no soberano e
acatassem suas ordens. No entanto, apenas o argumento de que o Rei era um
representante de Deus não seria capaz de fazer com que a massa camponesa se
submetesse as suas ordens por muito tempo.
Os monarcas, por muitos atemorizados, ao perceberem que seus argumentos
não poderiam durar muito tempo buscaram mecanismos para que pudessem controlar e
coagir a população de forma que se submetessem ao governo do monarca. Para isso, se
fez necessário que o nobre governante tivesse sob seu comando homens, cavalos e
armas. Ou seja, um exército completo, para que ficasse à disposição do rei e que
pudesse impor suas ordens a quem quer que fosse.
Para exercer o poder, os séculos posteriores a esse início de centralização
demonstraram que era necessário suprir várias necessidades da formação de
13
um Estado. Para a formação deste e seu efetivo controle era preciso obter
uma força de coerção, para tanto fazia-se necessário ter exército próprio e
permanente. (2011, p. 197-198).
Entretanto, sabe-se que nada é de graça. Então, para que o rei pudesse obter
todo seu exército, precisaria de dinheiro, diga-se, muito dinheiro. Por isso, o monarca
começa a tributar os seus súditos, a fim de manter o exército e consequentemente a sua
força coercitiva.
É nesse sentido as palavras de Flávia Lages de Castro:
Logo, primordial se tornou tributar os súditos de forma a conseguir ter um
fluxo de dinheiro suficiente para essa força de coerção e para o pagamento de
uma burocracia, já que, sem ela, ficava impossível tributar. (2011, p. 197-
198).
Paradoxal se torna essa concepção, visto que os camponeses mantinham,
por meio de pagamento de impostos, um exército que, na verdade, não estaria ali para
defendê-los, mas sim, para reprimi-los quando se fizesse necessário, ao bel-prazer do
monarca.
O Absolutismo melhor se configurou na França mais precisamente no
século XVII. Que também nas palavras de Flávia Lages de Castro “A França de Luiz
XIV, que não somente firmou que o Estado era ele como entrou para História com
‘Humilde’ apelido de ‘Rei Sol’, já que tudo girava em torno dele.” (2011, p. 198).
Mas, na verdade, o sistema absolutista, nas palavras do Professor Anderson
Perry:
Essencialmente, o absolutismo era apenas isto: um aparelho de dominação
feudal recolocado e reforçado, destinado a sujeitar as massas camponesas à
sua posição social tradicional (...) ele era a nova carapaça política de uma
nobreza atemorizada. (2014, p. 18)
Até poder-se-ia entabular o presente parágrafo nas primeiras linhas a serem
escritas, pois o que fez com que alguns homens fossem superiores a outros? Quem lhes
outorgou tal maestria sob os demais homens? Seria o próprio Deus? Mas o que de tão
especial possuíam tais homens a ponto de terem o poder de sobrepor sua própria
vontade aos seus semelhantes? Não aquele poder hereditário proveniente de um legado
familiar consanguíneo, e sim aquele poder primário, no qual o homem mal conhecia o
que era Estado ou Organizações. Por qual motivo os homens primitivos acreditaram que
14
existam homens superiores a si mesmos? Aqueles que ordenam valem mais do que
aqueles que realizam?
Essa resposta pode ser dada por Rousseau em seu artigo sobre a Origem da
Desigualdade (1754, p. 91), que conseguiu demonstrar com maestria a origem do poder
de uns homens sobre outros. In verbis:
O primeiro que, tendo cercado um terreno, se lembrou de dizer: Isto é meu, e
encontrou pessoas bastante simples para acreditá-lo, foi o verdadeiro
fundador da sociedade civil. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e
horrores não teriam poupado ao gênero humano aquele que, arrancando as
estacas ou tapando os buracos, tivesse gritado aos seus semelhantes: “Livrai-
vos de escutar esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos
são de todos, e a terra de ninguém!”. Parece, porém, que as coisas já tinham
chegado ao ponto de não mais poder ficar como estavam: porque essa ideia
de propriedade, dependendo muito de ideias anteriores que só puderam
nascer sucessivamente, não se formou de repente no espírito humano: foi
preciso fazer muitos progressos, adquirir muita indústria e luzes, transmiti-las
e aumentá-las de idade em idade, antes de chegar a esse último termo do
Estado de natureza. (1754, p. 91)
O trecho de Rousseau acima facilmente demonstra como foi a primeira
noção de poder do ser humano, que utilizando-se do que não era seu, para usurpar algo
de quem não tinha quase nada, quiçá, absolutamente nada. Há não ser, é claro, o espírito
de vida dado pelo próprio Deus.
Explica o grande filósofo francês (1754, p. 136) no final de sua obra que:
Os particulares voltam a ser iguais, porque nada são, e os súditos não tendo
outra lei senão a vontade do seu senhor, nem o senhor outra regra senão as
suas paixões, as noções do bem e os princípios da justiça desaparecem de ora
em diante. (1754, p. 136)
Em apertada síntese, buscou-se as linhas “supra”, demonstrar ao leitor de
forma tímida, a noção do absolutismo que deveras forjou o caminho ao longo da
história.
De forma clara se percebe que o sistema absolutista, nutrido simplesmente
pela vontade de uma pequena parcela da sociedade, não duraria muito tempo.
Os sentimentos de esperança intrínsecos nos seres humanos sempre lhes
proporcionavam criatividade para tentar buscar condições melhores de vida. Isso fez
com que a ideia de igualdade entre os seres humanos se fixasse cada vez mais na mente
dos cidadãos. Visto isso, assistiam “de camarote” as regalias franqueadas pela realeza
aos seus pares em jantares com muita fartura, quiçá, desperdícios em gastos absurdos
15
com o dinheiro que arrecadava com taxas e impostos, enquanto a maioria sequer obtinha
diariamente o básico para sua sobrevivência.
Nesse diapasão, os pensadores da época (chamados de iluministas)
começaram a se preocupar com coisas que antes se quer era levantado em discussão
entre os cidadãos, por exemplo: Igualdade entre os homens e diante da lei, liberdade,
cidadania, propriedade, tudo em busca de um bem coletivo.
Como se pode notar, as ideias de mudanças e de revolução não sugiram de
uma inspiração imediata, mas sim, de uma construção de ideias e pensamentos que
trariam à luz aquilo que outrora estava encoberto.
Nesse mesmo sentido são as palavras da professora Flávia Lages de Castro
em uma de suas obras: “Esses homens iluministas não criaram suas ideias (muitas delas
brilhantes) do nada. De fato, eles são herdeiros do Renascimento e, principalmente, da
revolução científica do século XVII”. (2011, p. 204).
Em suma, o Estado já não era tido como um “fim em si mesmo”, mas sim
um “meio” para o qual estava direcionado ao benefício dos cidadãos.
Impulsionados por esses pensamentos iluministas, rompe-se com o antigo
regime Absolutista Monárquico para aderir a uma nova proposta, que fora difundida
pelo iluminista Montesquieu, In verbis:
Há, em cada Estado, três espécies de poderes: o poder legislativo, o poder
executivo (...), e o executivo [Judiciário] das que dependem do direito civil.
Pelo primeiro, o príncipe ou magistrado faz leis por certo tempo ou para
sempre e corrige ou abroga as que são feitas. Pelo segundo, faz a paz ou a
guerra, envia ou recebe embaixadas, estabelece a segurança, previne as
invasões. Pelo terceiro, pune os crimes ou julga as querelas dos indivíduos.
Chamaremos este último o poder de julgar e, o outro, simplesmente, o poder
executivo do Estado. [...] Quando na mesma pessoa ou no mesmo corpo de
magistratura o poder Legislativo está reunido ao poder Executivo, não existe
liberdade, pois pode-se temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado
apenas estabeleçam leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Não haverá
também liberdade se o poder de julgar não estiver separados do poder
legislativos e do executivo. Se estiver ligado ao poder Legislativo, o poder
sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria
legislador. Se estivesse ligado ao poder Executivo, o juiz poderia ter a força
de um opressor. (2000, p. 205-206.).
Com a morte de Luiz XIV, sucede o trono Luiz XV (1715-1774) e em 10 de
maio de 1774 foi proclamado rei da França Luis XVI.
16
No lapso temporal de seu reinado acontece os primeiros lampejos da
Revolução Francesa impulsionada pelos pensamentos iluministas e consequentemente
o fim do absolutismo.
Com o início da Revolução Francesa, marcada principalmente pela queda da
Bastilha em 14 de julho de 1789 - uma fortaleza parisiense que fora usada nos séculos
XVII e XVIII como prisão – rompeu-se com o sistema absolutista e, inspirado pelas
ideias do iluminismo, migrou-se para o “Estado Constitucional”.
Nas preciosas palavras do Mestre Thiago Baldani Gomes de Fillipo, “com a
ascensão da burguesia, que culminou com a queda da Bastilha (14.07.1789), o Estado
Absoluto foi substituído pelo Estado Constitucional, deflagrando-se o
constitucionalismo.” (2010, p. 13).
O Constitucionalismo que, diga-se de passagem, foram vários, ainda que em
passos deslizantes começa a retirar da mão de uma só pessoa o poder de gerir o Estado,
conforme lhe aprouver, e começa a dar-lhe limitações por meio de uma constituição que
trazia em si os direitos fundamentais, sociais e os vinculava à atuação do Estado para
que promovesse o bem da coletividade, embasando-se, principalmente, nos direitos
fundamentais, como por exemplo, “principio da igualdade”.
O constitucionalismo liberal foi marcado pelo individualismo, proteção da
propriedade privada, separação dos poderes, contenção do aparato estatal e
valorização dos direitos humanos de primeira geração, sem alimentar,
contudo, nenhuma pretensão em operar grandes transformações sociais. (...)
Constituições dirigentes ou programáticas, que assimilaram direitos sociais e
incorporaram programas de atuação governamental, compelindo o Estado a
promover o bem-estar coletivo e a concretizar no plano material o princípio
da igualdade. (PUCCINELLI JÚNIOR, 2012, p. 25)
Finaliza-se, portanto, com o sistema absolutista, ingressando em um novo
movimento de limitação do poder e valorização dos direitos e garantias estampadas no
seio de uma constituição.
1.2 O CONSTITUCIONALISMO NORTE-AMERICANO
O trecho de uma entrevista com um combatente da Guerra de
Independência, citado por Flávia Lages de Castro, demonstra de forma clara a noção de
17
“revolução” que havia na mente de cada combatente que antecedeu a Revolução
Americana.
- Enfim, que houve? Qual foi a sua ideia quando decidiu lutar?
- Jovem, a nossa ideia quando nos lançamos contra esses casacas-vermelhas
era que nos governávamos a nós próprios e sempre achamos isso. Eles
achavam que não tínhamos esse direito. (CASTRO. 2011, p. 228)
Um Estado formado por uma metrópole e suas colônias, onde estas serviam
para trazer lucros à metrópole, o que não duraria muito tempo. Algo teria que acontecer.
E de fato, aconteceu. Deflagra-se, então, a revolução norte-americana.
O rompimento dos laços coloniais efetuados pela Independência dos Estados
Unidos da América do Norte foi um marco para todo o ocidente. Essa
Ruptura marcaria profundamente o processo de fim do antigo Regime. (...) A
formação do Estado norte-americano pode ser vista como diferenciada desde
os primórdios da colonização das 13 colônias (maneira que era chamada a
colônia inglesa na América). Mas não devemos considerar que essa
diferença residia no fato de que a Inglaterra desejava fazer uma “colônia de
povoamento” em oposição aos outros Estados colonizadores europeus que
faziam “colônias de exploração”. Toda colônia existia, por definição, para dar
lucros à metrópole, independentemente da maneira que esse lucro se
realizaria. O ideal era que a colônia tivesse como produzir mercadoria
complementares às mercadorias produzidas pela metrópole, assim ela poderia
comprar da metrópole e vender para esta dentro do Pacto colonial, que
obrigava a colônia a somente comercializar com sua metrópole,
potencializando lucros. (CASTRO, 2011, p. 223)
Entretanto, a última função a ser desempenhada pela colônia seria competir
com a própria metrópole, e fora isso que ocorrera a partir do século XVIII, onde o
comércio das 13 colônias se fortalece.
A partir do século XVIII, o comércio das 13 colônias chegou a tal ponto que
passou a concorrer com o comércio inglês e, indubitavelmente, era o último
papel reservado a uma colônia. (CASTRO, 2011, p. 225)
Por isso, a metrópole, utilizando-se de mecanismos de retaliação, fez com
que a colônia retornasse ao seu status quo, ou seja, deveria continuar a ser apenas uma
fonte de recursos para a metrópole. Começa-se, então, a tributar os produtos produzidos
pelas colônias e além do mais, a Inglaterra havia saído de uma guerra com a França,
conhecida como Guerra dos Sete Anos, que durou de 1756 a 1763, a qual mesmo saindo
vitoriosa, teve enormes gastos com a guerra e então nada seria mais óbvio do que
usurpar ainda mais das colônias para suprir tal déficit orçamentário.
18
Essa concorrência gerou atritos que engendraram uma necessidade, na
metrópole, de colocar a colônia no seu devido lugar, ou seja, como economia
subordinada, com vistas a dar lucros à metrópole. Além desses atritos, a
Inglaterra havia saído de uma guerra com a França (a Guerra dos Sente Anos
– 1756/1763) e, embora vitoriosa, teve enormes gastos com a campanha
militar e desejava que a colônia contribuísse para cobrir esse problema
orçamentário. Taxas foram aumentadas como a do açúcar (sugar Act de
1764) e a do selo (Stamp Act de 1765 – que exigia que todos os documentos
fossem selados bem como jornais, baralhos etc. A renda obtida no pagamento
desses selos iria para o governo inglês). Essas medidas, além de visarem
cobrir despesas, eram também uma forma de retaliação contra os colonos
que, na guerra dos Sete Anos, ajudaram os Franceses”. (CASTRO, 2011, p.
225)
Feito isso, instalou-se um clima de tensão entre os ingleses e os colonos, que
como resposta imediata a essa retaliação se reuniram e decidiram “boicotar o comércio
inglês” e em tentativas frustradas a Inglaterra viu escapar pelos dedos o poder sobre as
colônias.
Instalado o caos político em 4 de julho de 1776, promulga-se a Declaração
de Independência dos Estados Unidos. E então o que fazer para defendê-la? Como dar
total efetividade a Declaração de Independência dos Estados Unidos?
Necessariamente, urge-se a criação da Constituição dos Estados Unidos da
América que fora promulgada em 1787.
Tem-se, portanto, a deflagração do termo “constitucionalismo” na América,
com a sua primeira constituição escrita, tendo como características um texto codificado,
rígido e sintético.
De acordo com o Professor José Luiz Quadros de Magalhães em seu artigo:
De forma diferente do constitucionalismo inglês, nos Estados Unidos houve
um poder constituinte originário que produziu em 1787 um texto codificado,
rígido e sintético com aspecto essencialmente principiológico e inicialmente
político, incorporando a declaração de direitos individuais fundamentais a
partir da dez emendas que constituíram o Bill of Rights. O constitucionalismo
estadunidense criou o sistema de governo presidencial, o federalismo, o
controle difuso de constitucionalidade, mecanismo sofisticados de freios e
contrapesos e uma Suprema Corte que protege a Constituição, sendo sua
composição uma expressão do sistema controle entre os poderes separados.
(2004)
A partir daí, busca-se a limitação do poder e garantia de direitos dos
cidadãos americanos, visto que, de acordo com a referida Constituição, TODOS OS
HOMENS NASCEM LIVRES E IGUAIS EM DIREITO.
Evidencia-se nos dizeres acima que o fato de se criar uma constituição
escrita seria evidentemente a busca da igualdade entre os cidadãos, em que o Estado não
19
seria mais um fim em si mesmo, mas um meio capaz de buscar o bem estar de toda uma
coletividade.
O constitucionalismo norte americano muito contribuiu para que
desencadeasse, em diversos países, a necessidade de rompimento com o Antigo
Regime, buscando-se uma nova perspectiva acerca da interpretação das regras e
princípios.
Nesse sentido leciona o Professor José Luiz Quadros de Guimarães:
A história constitucional norte-americana reforça a ideia de uma Constituição
dinâmica, viva, que se reconstrói diariamente diante da complexidade das
sociedades contemporâneas. Uma Constituição presente em cada momento
da vida. Uma Constituição que é interpretação e não texto. A experiência
norte-americana nos revela uma nova dimensão da jurisdição constitucional,
presente em toda a manifestação do Direito. É tarefa do agente do Direito,
nas suas mais diversas funções, dizer a Constituição no caso concreto e
promover leituras constitucionalmente adequadas de todas as normas e fatos.
A vida é interpretação, não há texto que não seja interpretado. A
interpretação do mundo, dos fatos, das normas é inafastável. (2004)
Portanto, se conclui que o constitucionalismo norte-americano muito
contribuiu para a solidificação desta nova concepção em todo o mundo, transcendendo
as suas conseqüências por toda a America, concretizando, assim, os avanços almejados
por toda uma geração de homens, que permanece até hoje.
20
CAPÍTULO 2 VIAGENS DO CONSTITUCIONALISMO AO
NEOCONSTITUCIONALISMO
2.1CONSTITUCIONALISMO MODERNO
Das amarras da história antiga, tem-se o ponto de partida do
Constitucionalismo, donde a sua ideia central poderia ser considerado como o
movimento jurídico e político no intuito de se limitar o poder do Estado através da
criação de uma constituição.
A criação de uma constituição parecia ser a única saída, haja vista que com
a queda do sistema monárquico em que o soberano ou o rei, independentemente se certo
ou não, praticavam seus atos de governo guiados apenas pelo seu bel prazer, onde nada
nem ninguém os impedia. Eles eram totalmente “irresponsáveis” pelos seus atos e suas
atitudes eram vistas como “inspiradas por Deus”. Acreditava-se, ainda, que o soberano
fosse representante de Deus aqui na terra.
Por isso, lançaram mão desse novo sistema de governo inspirado pelas
ideias da Revolução Francesa, no qual uma Lei Maior limitaria o poder estatal e regeria
todos os seus atos, creditando aos cidadãos Direitos e Garantias outrora inexistentes.
Todavia, há quem acredita que constitucionalismo ocorrera muito antes da
própria Revolução Francesa, mais precisamente, na época do povo hebreu1
.
Segundo Dirley da Cunha Júnior a criação ou surgimento do
constitucionalismo ocorreu na Antiguidade Clássica. E, utilizando-se das palavras de
Karl Loewenstein2
, infere-se melhor acerca da origem do constitucionalismo.
A origem do constitucionalismo remonta à antiguidade Clássica, mais
especificamente, segunda Karl Loewensteins, ao povo hebreu, de onde
partiram as primeiras manifestações deste movimento constitucional em
busca de uma organização política da comunidade fundada na limitação do
poder absoluto. De fato, explica loewenstein que o regime teocrático dos
hebreus se caracterizou fundamentalmente a partida da ideia de que o
detentor do poder, longe de ostentar um poder absoluto e arbitrário, estava
1
O doutrinador Dirley da Cunha Júnior cita Karl Loewenstein se referindo a sua obra:
Teoria de La Constitución, na qual atribui ao povo hebreu as primeiras manifestações do
constitucionalismo.
2
Um filósofo nascido na Alemanha. Um dos pensadores mais significativos para o
Constitucionalismo.
21
limitado pela lei do senhor, que submetia igualmente os governantes e
governadores, radicando aí o modelo de constituição material daquele povo.
(2011, p. 33)
Daí se percebe que a Lei maior, a Constituição, que regia toda a sociedade
era a Lei do Senhor. É no mínimo curioso analisar que retrocedemos, visto que se na
época do povo hebreu (A.C.) já existia uma lei maior – uma constituição – que limitava
e vinculava os governantes e governados. No período mais recente (D.C.) volta-se ao
modelo monárquico e se exclui qualquer responsabilidade da pessoa do soberano e nada
nem ninguém faz juízo de seus atos. Daí percebe-se que este modelo de sociedade não
deveria prevalecer, então, voltamos a dar efetividade e importância a uma constituição.
Entretanto, não se dedicará ao delineamento de todo o rastro histórico do
constitucionalismo, mesmo porque não é este o objetivo do presente trabalho, mas
importante se faz explanar as suas características mais marcantes, onde o núcleo de
essência do constitucionalismo está na valorização da constituição escrita, que por meio
dela pode-se limitar e controlar o poder do Estado bem como a inserção de ideias
libertárias e direitos e garantias aos homens.
Importante ressaltar que o constitucionalismo não se preocupava somente
com a elaboração da constituição, pois nos dizeres do próprio doutrinador Dirley:
não pregava o constitucionalismo, advirta-se, a elaboração de constituições,
até porque, onde havia uma sociedade politicamente organizada já existia
uma Constituição fixando-lhe os fundamentos de sua organização. Isso
porque, em qualquer época e em qualquer lugar do mundo, havendo Estado,
sempre houve e sempre haverá um complexo de normas fundamentais que
dizem respeito com a sua estrutura, organização e atividade.” (2011, p. 33)
O autor conclui, revelando o núcleo e o motivo do surgimento do
constitucionalismo:
O constitucionalismo se despontou no mundo como um movimento político e
filosófico inspirado por ideias libertárias que reivindicou, desde seus
primeiros passos, um modelo de organização política lastreada no respeito
dos direitos dos governados e na limitação do poder dos governantes (2011,
p. 33)
Dito isto, acrescentamos que, historicamente, a “explosão” do
constitucionalismo, inspirado pelas ideias dos iluministas, irradiou os seus efeitos para
todo o mundo pela concepção da Constituição Norte-Americana de 1787 e pela
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Constituição Francesa de 1791. As ideias iluministas da época reforçaram ainda mais a
criação e consolidação do movimento constitucionalista.
Como bem leciona Dirley:
Após a Magna Carta inglesa o constitucionalismo deslanche em direção à
modernidade, ganhando novos contornos. A partir daí são elaborados
importantes documentos constitucionais (Petition of Rights, de 1628);
Habeas Corpus Act, de 1679; Bill of Rights, de 1689, etc.), todos com vistas
a realizar o discurso do movimento constitucionalista da época. No século
XVIII, o constitucionalismo ganha significativo reforço com as ideias
iluministas que serviram de combustível para as revoluções liberais (2011, p.
7 e 8)
E conclui os dizeres sobre o Constitucionalismo dizendo:
Enfim, o constitucionalismo moderno legitimou o aparecimento da chamada
constituição moderna, entendida como “a ordenação sistemática e racional da
comunidade política através de um documento escrito no qual se declaram as
liberdade e os direitos e se fixam os limites do poder políticos [...] O
constitucionalismo moderno, portanto, deve ser visto como uma aspiração a
uma Constituição escrita, que assegurasse a separação de Poderes e os
direitos fundamentais, como modo de se opor ao poder absoluto, próprio das
primeiras formas de Estado. Não é por acaso que as primeiras Constituições
do mundo tratam de oferecer resposta ao esquema do poder absoluto do
monarca, submetendo-o ao controle do parlamento. (2011, p. 8 e 9)
Neste processo de “reconstitucionalização” (diz-se isto pelo motivo da
humanidade já ter experimentado os sabores do constitucionalismo na época do povo
hebreu, como bem se descreveu acima), buscou-se a aproximação da lei e da moral, do
direito e da filosofia, em virtude do fracasso Liberalismo e posteriormente do
positivismo, associados ao Fascismo ocorrido na Itália e do genocídio praticado pelo
Nazismo na Alemanha.
Essa aproximação poder-se-á considerá-la como uma das mudanças que
ocorreram na antiga forma de se interpretar a constituição, quando não se acha toda a
solução na norma escrita e que, invariavelmente, o que ocorre com bastante frequência.
Nesta mesma senda, o doutrinador e Ministro do STF Luis Roberto Barroso
elencou algumas mudanças que acabaram por embalar a interpretação constitucional
tradicional, tema que será esmiuçado nas próximas páginas.
Permitir-nos-emos reservar o direito, nas linhas que se seguem, de elencar
ideias de alguns autores sobre o constitucionalismo sob a justificativa de aprimoramento
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de conhecimentos e até mesmo o sentimento de curiosidade que, provavelmente,
rodeará os leitores.
Para o doutrinador Pedro Lenza, o movimento denominado como
constitucionalismo, no que tange ao seu momento histórico, se deu na antiguidade, onde
os documentos e as características marcantes são a “Lei do Senhor” do povo hebreu.
Na idade Média, temos este marco com a Magna Carta de 1215. Na idade
Moderna temos os “pactos e forais ou cartas de franquias (exemplos: Petition of Rights
de 1628; Habeas Corpus Act de 1679; Bill of Rights de 1689; Act of Settlement de
1701).
E já, no Constitucionalismo Moderno, temos a Constituição Norte-
Americana de 1787 e a Constituição Francesa de 1791.
O Mestre conclui dizendo que “o constitucionalismo moderno representará
uma técnica específica de limitação do poder com fins garantísticos” e ainda se utiliza
das palavras de Kildare Gonçalves Carvalho “em termo jurídico, reporta-se a um
sistema normativo, enfeixado na constituição, e que se encontra acima dos detentores do
poder.” Acrescenta ainda uma perspectiva sociológica do Constitucionalismo:
“Representa um movimento social que dá sustentação à limitação do poder,
inviabilizando que os governantes possam fazer prevalecer seus interesses e regras na
condução do Estado.” (2013, p. 58)
Não se poderia traçar palavras sobre constitucionalismo sem mencionar as
palavras do Professor Jorge Miranda, o qual leciona:
“O Constitucionalismo – que não pode ser compreendido senão integrado
com as grandes correntes filosóficas, ideológicas e sociais dos séculos XVIII
e XIX – traduz exactamente certa ideia de Direito, a ideia de Direito liberal.”
(2000, p. 17)
Ainda acrescenta palavras sobre a importância da divisão dos poderes
suscitada por Montesquieu em sua obra “Do Espírito das Leis”:
Em vez de os indivíduos estarem à mercê do soberano, eles agora possuem
direitos contra ele, imprescritíveis e invioláveis. Em vez de um órgão único,
o Rei, passa a haver outros órgãos, tais como Assembleia ou Parlamento,
Ministros e Tribunais independentes – para que, como preconiza
Montesquieu, o poder limite o poder. Daí a necessidade duma Constituição
desenvolvida e complexa: pois quando o poder é mero atributo do Rei e os
indivíduos não são cidadãos, mas sim súbditos, não há grande necessidade de
estabelecer um pormenor regras do poder; mas, quando o poder é
decomposto em várias funções apelidadas de poderes do Estado, então é
24
mister estabelecer certas regras para dizer quais são os órgãos a que
competem essas funções, quais são as relações entre esses órgãos, qual o
regime dos titulares dos órgãos, etc.” (2000, p.17)
E finaliza sua contribuição delineando sobre a importância de uma
constituição, na qual a maioria dos doutrinadores concorda ser um meio de limitar o
poder do Estado e salvaguardar direitos e garantias dos indivíduos:
“A ideia de Constituição é de uma garantia e, ainda mais, de uma direcção da
garantia. Para o constitucionalismo, o fim está na protecção que se conquista
em favor dos indivíduos, dos homens cidadãos, e a Constituição não passa de
um meio para o atingir. O Estado Constitucional é o que entrega à
Constituição o prosseguir a salvaguardar da liberdade e dos direitos dos
cidadãos, depositando as virtualidades de melhoramento na observância dos
seus preceitos, por ela ser a primeira garantia desses direitos.” (2000, p. 18)
Desarrazoado seria se se terminasse estas delineações sobre o
constitucionalismo sem mencionarmos as palavras do Ministro Luis Roberto Barroso
em seu livro INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO.
O constitucionalismo chega vitorioso ao início do milênio, consagrado pelas
revoluções liberais e após haver disputado com inúmeras outras propostas
alternativas de construção de uma sociedade justa e de um Estado
democrático. (2009, p. 312)
Esclarece sobre os motivos do sucesso do constitucionalismo moderno:
A razão de seu sucesso está em ter conseguido oferecer ou, ao menos, incluir
no imaginário das pessoas: (i) legitimidade – soberania popular na formação
da vontade nacional, por meio do poder constituinte; (ii) limitação do poder –
repartição de competências, processos adequados de tomada de decisão,
respeitos aos direitos individuais, inclusive das minorias; (iii) valores –
incorporação à Constituição material das conquistas sociais, políticas e éticas
acumuladas no patrimônio da humanidade (2009, p. 312 e 313)
E conclui seus dizeres de forma a demonstrar as consequências positivas
que se tem com o Constitucionalismo moderno:
O constitucionalismo promove, assim, uma volta aos valores, uma
reaproximação entre ética e Direito. Para poderem beneficiar-se do amplo
instrumento do Direito, migrando da filosofia para o mundo jurídico, esses
valores compartilhados por toda a comunidade, em dado momento e lugar,
materializam-se em princípios, que passa a estar abrigados na Constituição,
explicita ou implicitamente. (2009, p. 328)
25
Destarte, percebe-se que o estado em que se encontra nação brasileira, ainda
que prematuramente, deve ser celebrado, haja vista recebermos de herança das gerações
passadas um Estado Democrático de Direito, e não somente um Estado de Direito.
Entretanto, importante se ressaltar que os reflexos do Constitucionalismo só
se deram no Brasil com a promulgação da Constituição de 1988, quebrando-se com o
antigo sistema autoritário militar e presenteando o Brasil com um período de
estabilidade jurídica nunca vista antes, como bem reforça Luis Roberto Barroso:
No caso brasileiro, o renascimento do direito constitucional se deu,
igualmente, no ambiente de reconstitucionalização do país, por ocasião da
discussão prévia, convocação, elaboração e promulgação da Constituição de
1988. Sem embargo de vicissitudes de maior ou menor gravidade no seu
texto, e da compulsão com que tem sido emendada ao longo dos anos, a
Constituição foi capaz de promover, de maneira bem sucedida, a travessia do
Estado brasileiro de um regime autoritário, intolerante e, por vezes, violento
para um Estado democrático de direito. Mais que isso: a Carta de 1988 tem
propiciado o mais longo período de estabilidade institucional da história
republicana do país. E não foram tempos banais. Ao longo da sua vigência,
destituiu-se por impeachment um Presidente da República, houve um grave
escândalo envolvendo a Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados,
foram afastados Senadores importantes no esquema de poder da República,
foi eleito um Presidente de oposição e do Partido dos Trabalhadores,
surgiram denúncias estridentes envolvendo esquemas de financiamento
eleitoral e de vantagens para parlamentares, em meio a outros episódios. Em
nenhum desses eventos houve a cogitação de qualquer solução que não fosse
o respeito à legalidade constitucional. Nessa matéria, percorremos em pouco
tempo todos os ciclos do atraso. (2013, p. 4)
O sentimento de mudanças e melhoras insculpido nos homens não foi capaz
de se contentar somente com o que o Constitucionalismo poderia oferecer-lhes.
A efetividade das normas programáticas e a simples execução de direitos
entabulados na constituição não se tornaram o bastante. Queríamos mais!
Constatou-se, então, a necessidade de um movimento que conseguisse
extrair da constituição escrita tudo aquilo que ela pudesse oferecer aos cidadãos. A
antiga política de “pão e circo” já não mais sustentava o estômago daqueles que tinham
fome por direitos de liberdade, da igualdade, da livre expressão e tantos outros
explícitos e implícitos na Constituição.
Assim foi a frase utilizada pela banda Titãs3
em uma de suas canções: “A
gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”.
3
Banda de rock brasileira, tendo como nome inicial “Titãs do iê-iê”, e posteriormente
conhecida como “Titãs”.
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Essa frase expressa muito bem a necessidade de melhoras que a sociedade
sempre buscou. Já não se quer somente o suficiente para se sobreviver, busca-se
“VIVER” de forma digna, embasado pelo princípio da dignidade da pessoa humana.
Portanto, um sistema de interpretação de normas no qual se enquadra o caso
concreto na norma já não é mais suficiente, pois a sociedade se desenvolve e a lei, por si
só, não consegue prever todas as possibilidades existentes de controvérsias na
sociedade.
A interpretação constitucional tradicional já não mais era suficiente para
suprir os anseios desta sociedade, pois é uma modalidade de interpretação jurídica em
que a norma deveria trazer no seu relato abstrato, a solução favorável e esperada para os
problemas jurídicos.
Neste modelo, os fatos existiam para serem enquadrados à norma,
permitindo o silogismo que, outrora, resolveria os problemas sociais. Por isso, nesse
ambiente, a solução dos problemas jurídicos não se encontra integralmente na norma.
Então, surge uma nova concepção intitulada como
“Neoconstitucionalismo”.
2.2 NEOCONSTITUCIONALISMO – UMA VISÃO RECENTE E EFICAZ
Consegue-se, nas palavras do Advogado e professor André Puccinelli
Júnior, conceituar o neoconstitucionalismo.
O neoconstitucionalismo, nasceu assim com a missão de edificar um Estado
Constitucional de Direito ou, para alguns, um Estado Democrático e Social
de Direito, que seja tributário da justiça distributiva e favoreça a positivação
e concretização de Direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais,
contemple o modelo normativo axiológico, absorva uma nova postura
hermenêutica voltada à legitimação das aspirações sociais e reconheça a força
normativa da Constituição, dando vazão à supremacia, imperatividade e
efetividade de suas normas. (2012, p. 27)
Acredita-se que o neoconstitucionalismo é bastante diverso no que tange aos
seus defensores. Nesse sentido, Daniel Sarmento diz “ser composto por positivistas e
não-positivistas, defensores da necessidade do uso do método na aplicação do Direito e
ferrenhos opositores do emprego de qualquer metodologia na hermenêutica jurídica,
adeptos do liberalismo político, comunitaristas e procedimentalistas” (2013, p.3).
27
O “neoconstitucionalismo” é um assunto recente para os juristas brasileiros,
visto que seus reflexos só repercutiram em nossa Constituição de 1988 e este conceito já
fora formulado, sobretudo na Itália e Espanha, respectivamente em 1947 e 1978.
Para o doutrinador Pedro Lenza, Neoconstitucionalismo busca não apenas
atrelar o constitucionalismo a ideia de limitação do poder político, mas, acima de tudo, a
eficácia da constituição, deixando o texto de ter um caráter meramente retórico,
passando a ser mais efetivo na concretização dos direitos fundamentais. (Lenza, 2011, p.
59)
Elencando ainda que “a partir do momento em que os valores são
constitucionalizados, o grande desafio do neoconstitucionalismo passa a ser encontrar
mecanismos para sua efetiva concretização” (2011, p. 61).
Por isso, podemos dizer que, no sistema do “neoconstitucionalismo”, os
direitos já entabulados na Constituição Federal de 1988 vêm carregados de um conteúdo
axiológico devendo (ao menos em tese) ter uma aplicação imediata.
Entretanto, não é o que se percebe na prática, pois a nação brasileira
caminha em passos lentos para trazer a realidade de seus cidadãos esses direitos já
adquiridos ao longo de nossa “democratização”. Posto que a supremacia e efetividade
de nossa constituição não surge com sua simples promulgação.
Neste sentido o brilhante ministro Gilmar Mendes relata:
O valor normativo supremo da Constituição não surge, bem se vê, de pronto,
como uma verdade autoevidente, mas é resultado de reflexões propiciadas
pelo desenvolvimento da História e pelo empenho em aperfeiçoar os meios
de controle do poder, em prol do aprimoramento dos suportes da convivência
social e política. Hoje, é possível falar em um momento de
constitucionalismo que se caracteriza pela superação da supremacia do
Parlamento. O instante atual é marcado pela superioridade da Constituição, a
que se subordinam todos os poderes por ela constituídos, garantida por
mecanismos jurisdicionais de controle de constitucionalidade (2011, p. 61).
Um compilado de ideias de KONRAD HESSE, intitulado como “DIE
NORMATIVE KRAFT DER VERFASSUNG” e traduzido pelo ministro Gilmar
Ferreira Mendes como “A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO”, faz uma
importante revelação sobre a força normativa de uma constituição:
Em 16 de abril de 1862, Ferdinand Lassalle proferiu, numa associação
liberal-progressita de Berlim, sua conferência sobre a essência da
constituição (Uber das Verfassungswesen). Segundo sua tese fundamenta,
questões constitucionais não são questões jurídica, mas sim questões
28
políticas. É que a Constituição de uma país expressa as relações de poder nele
dominantes: o poder militar, representado pelas Forças Armadas, o poder
social, representado pelos latifundiários, o poder econômico, representado
pela grande indústria e pelo grande capital, e, finalmente, ainda que não se
equipare ao significado dos demais, o poder intelectual, representado pela
consciência e pela cultura gerais. As relações fáticas resultantes da
conjugação desses fatores constituem a força ativa determinante das leis e das
instituições da sociedade, fazendo com que estas expressem, tão-somente, a
correlação de forças que resulta dos fatores reais de poder; esses fatores reais
do poder formam a Constituição real do país. Esse documento chamado
Constituição – a Constituição jurídica – não passa, nas palavras de Lassale,
de uma pedaço de papel. (2002, p. 45)
Com essas palavras acima elencadas, poderíamos chegar a refletir, e, com
facilidade, poderíamos perceber que ainda estamos em um processo lento de
reconhecimento de força normativa da constituição no sentido de concretizar direitos e
garantias fundamentais a todos os cidadãos, por conta da divisão social e cultural destes
próprios cidadãos. Separando-se aquilo que é moral daquilo que é legal, posto que
buscam simplesmente interesses pessoais e grupais em detrimento de um
desenvolvimento justo e igualitário para todos.
Acrescenta ainda que:
Assim, o Direito Constitucional não estaria a serviço de uma ordem estatal
justa, cumprindo-lhe tão-mente a miserável função – indigna de qualquer
ciência – de justificar as relações de poder dominantes. Se a Ciência da
Constituição adota essa tese e passa a admitir a Constituição real como
decisiva, tem-se a sua descaracterização como ciência normativa, operando-
se a sua conversão numa simples ciência do ser. (2002, p. 47)
Por isso, a normatividade da Constituição deve ser pautada em uma força
própria, motivadora e ordenadora da vida do Estado buscando sempre o entrelaçamento
da norma posta com a moral e a justiça, bem como demais ciências capazes de moldar a
constituição a uma real garantia de direitos dos cidadãos.
Portanto, a resposta para os problemas não se encontram exclusivamente na
norma posta e entabulada, devendo-se jungir a norma aos princípios jurídicos e a outros
conceitos e até mesmo a outras ciências.
O Ministro Luiz Roberto Barroso, em seu livro “O NOVO DIREITO
CONSTITUCIONAL BRASILEIRO”, oferece sua contribuição ao dizer:
Nesse ambiente em que a solução dos problemas jurídicos não se encontra
integralmente na norma jurídica, surge uma cultura jurídica pós-positivista.
De fato, se a resposta para os problemas não pode ser encontrada de maneira
completa no comando que esse encontra na legislação, é preciso procurá-la
29
em outro lugar. E, assim, supera-se a separação profunda que o positivismo
jurídico havia imposto entre o Direito e a Moral, entre o Direito e outros
domínios do conhecimento. Para achar a resposta que a norma não fornece, o
Direito precisa se aproximar da filosofia moral – em busca da justiça e de
outro valores -, da filosofia política – em busca de legitimidade democrática e
da realização de fins públicos que promovam o bem comum e, de certa
forma, também das ciências sociais aplicadas, como economia, psicologia e
sociologia. O pós-positivismo não retira a importância da lei, mas parte do
pressuposto de que o Direito não cabe integralmente na norma jurídica e,
mais que isso, que a justiça pode estar além dela. (2013, p. 64)
Interligando-se a interpretação jurídica à outras ciências de estudo, poder-
se-ia desencadear uma gama tão complexa de interpretações de soluções que ao fim não
resultariam em nada, senão em inúmeras posições e justificativas que no fim não
levariam a nenhuma solução concreta, por este motivo, deve-se realizar toda e qualquer
interpretação jurídica tendo como trilhos norteadores a Constituição, seus valores e
princípios.
Em dias anteriores a aceitação da concepção neoconstitucionalista não se
dava a devida importância aos fundamentos principiológicos, que, por sua vez, se
mostram cada vez mais atuantes no ordenamento jurídico pátrio. E é nessa esteira que
floresceu no ordenamento jurídico brasileiro a necessidade de se enxergar o direito de
uma nova ótica em especial da Constituição Federal.
Uma ótica que se utiliza das lentes chamadas “neoconstitucionalismo” que,
por sua vez difere do constitucionalismo, do qual se tinha como alicerce a limitação ao
poder autoritário, e, no neoconstitucionalismo ou constitucionalismo pós-moderno, ou,
ainda, pós-positivismo, tem como pilares essenciais a concretização das regras e
prevalência dos direitos fundamentais, bem como a normatividade dos princípios,
entabulados ou não na constituição.
Diz-se entabulados ou não pelo fato de que se um direito fundamental ou
um princípio, não estiver descrito de forma explícita na norma constitucional, ainda
assim, este deverá ser concretizado a favor dos cidadãos.
Nessa mesma senda, o doutrinador Kildare Gonçalves apud Pedro Lenza,
diz: “O caráter ideológico do constitucionalismo moderno era apenas o de limitar o
poder, o caráter ideológico do neoconstitucionalismo é o de concretizar os direitos
fundamentais”. (2011. p. 59)
Com o fracasso da concepção puramente “Constitucional”, posto que ela
limitava-se tão somente a estabelecer normas sobre a organização do Estado e limitação
do poder, urgiu-se a necessidade desta nova concepção neoconstitucional, relacionando
30
a norma ao Direito. Isso se deve por conta dos acontecimentos que abismaram toda a
humanidade, fruto da maior barbárie de todos os tempos, com o genocídio cometido
pelo Governo Socialista Alemão o que resultou em um holocausto que exterminou
milhões de judeus. Uma luz então se ascendeu! Não basta estar legalizado. Além de ser
legal, tem de ser moral.
Nestes mesmos trilhos caminha o Doutrinador Dirley da Cunha Júnior:
Um novo pensamento constitucional voltado a reconhecer a supremacia
material e axiológica da Constituição, cujo conteúdo, dotado de força
normativa e expansiva, passou a condicionar a validade e a compreensão de
todo o Direito e a estabelecer deveres de atuação para os órgãos de direção
política. Esse pensamento, que recebeu a sugestiva denominação de
neoconstitucionalismo, proporcionou o florescimento de um novo paradigma
jurídico: o Estado Constitucional de Direito. Isso se deveu notadamente em
razão do fracasso do Estado Legislativo de Direito, no âmbito do qual o
mundo, pasmado, testemunhou uma das maiores barbáries de todos os
tempos, com o genocídio cometido pelo governo nacional socialista alemão
provocando o holocausto que exterminou milhões de judeus, pelos nazistas,
entre 1939 e 1945, nos países ocupados pelas tropas do Reich Hitlerista. Com
efeito, até a Segunda Grande Guerra Mundial, a teoria jurídica vivia sob a
influência do Estado Legislativo de Direito, onde a Lei e o Princípio da
Legalidade eram as únicas fontes de legitimação do Direito, na medida em
que uma norma jurídica era válida não por ser justa, mas sim, exclusivamente
por haver sido posta por uma autoridade dotada de competência normativa.
(2011, p. 46)
Por isso, para os já citados doutrinadores, o neoconstitucionalismo, antes de
tudo, está para o fim de garantir aos cidadãos de que a constituição pátria seja
reconhecida tanto no aspecto material quanto axiológico, visando à valorização da
dignidade da pessoa humana e da promoção dos direitos fundamentais e sociais dos
cidadãos, enaltecendo, ainda, o reconhecimento de força normativa dos princípios.
A ideia de se concretizar direitos fundamentais do homem não é mero
pressuposto da norma escrita, visto que a legislação, por mais completa que seja, nunca
conseguirá abarcar todos os anseios da sociedade atual, que se mostra cada vez mais
complexa. Por isso, se faz necessário a junção entre Direito e a Moral, em busca do bem
comum.
Pois como bem explana Luiz Roberto Barroso: “O pós-positivismo não
retira a importância da lei, mas parte do pressuposto de que o Direito não mais cabe
integralmente na norma jurídica e, mais que isso, que a justiça pode estar além dela.”
(2013, p. 35)
31
Assim, floresce a ideia do neoconstitucionalismo que, através da
interpretação da norma jurídica, não visa mais a mera aplicação do caso concreto à
legislação e sim uma análise de princípios jurídicos com o fito de complementar aquilo
que a norma, por si só, não consegue: o deslinde das controvérsias humanas.
De parte isso, é válido anotar a distinção entre princípios e regras, haja vista
existir um consenso entre a doutrina geral de que princípios e regras (na visão
neoconstitucionalista) possuem o status de norma jurídica. Ambos são integrantes, sem
hierarquia, do sistema referencial do intérprete.
Os princípios trazem em si um conteúdo axiológico, e destacam-se como
normas que identificam valores a serem preservados ou fins a serem alcançados.
As regras e normas, por sua vez, restringem-se a traçar uma conduta. Elas
disciplinam uma determinada situação, quando ocorre e quando tem incidência. Para as
regras, vale a lógica do “tudo ou nada”.
Sendo possível assinalar que princípios são pautas genéricas, não aplicáveis
à maneira do “tudo ou nada”, são valorativos ou finalísticos, e as regras são descritivas
de conduta.
Não se pode dizer, entretanto, que, no neoconstitucionalismo, cabe-se a
ideia de pormenorizar a lei em prol de princípios.
A importância da lei não é retirada, apenas passa-se a uma análise de que a
justiça pode estar além dela.
Tem-se a ideia de que a solução para os problemas da sociedade não se
encontram inteiramente nas leis, sendo necessário que tanto as regras quanto os
princípios caminhem de mãos dadas com o objetivo de trazer solução às controvérsias
sociais.
Jamais se deve pormenorizar a lei em prol dos princípios, mas deve-se
enaltecer o papel dos princípios quando as leis não conseguem, por si só, solucionar os
conflitos sociais.
Então, poder-se-ia considerar que tantos os princípios quanto as leis estão
em um mesmo “pé de igualdade”. De forma mais ousada, pode-se dizer que os
princípios em relação as normas constitucionais estão também na mesma linha
hierárquica.
Com isso, conclui-se que tanto as leis quanto os princípios devem ser
considerados em uma mesma linha hierárquica, pois somente com a lei não se chegaria
32
a uma solução mais justa, muito menos caso se aplicassem apenas os princípios. Ambos
devem caminhar em um mesmo patamar de igualdade, onde um só se completa com o
outro.
Alegremo-nos, pois isso ocorre diariamente em nosso cotidiano, posto que
os reflexos do neoconstitucionalismo interfere cada vez mais nos julgamentos da maior
Corte Judiciária do País – Supremo Tribunal Federal – que se utiliza, muita das vezes,
de princípios que trazem em si uma carga axiológica para a interpretação e aplicação
das leis vigentes em nosso país.
A título de exemplo, suponha que algum presidente do nosso país, que já
tenha se candidatado a uma reeleição, queira concorrer a um terceiro mandato. A
Constituição Federal de 1988, em seu artigo XIV, §5º, é clara em aduzir que o
Presidente da República somente pode se candidatar a 01 (uma) reeleição.
Neste caso concreto, a Justiça Eleitoral teria indeferido o registro de
candidatura, por simples e singela aplicação de uma norma expressa. Mas nem sempre
as situações abrangem temas tão simples e sucintos.
Evolutivamente, ao longo do século XX, consolidou-se a convicção de que
o Direito, em uma grande quantidade de situações, não possui soluções pré-prontas.
Tais soluções devem ser construídas pelo intérprete – que anteriormente
apenas identificava a norma aplicável ao caso concreto – argumentativamente com
recursos e elementos externos ao sistema normativo.
Portanto, neste novo ambiente, mudam o papel dos fatos, da norma e
principalmente do intérprete. Incorpora-se um novo meio de lidar com situações mais
complexas, entre elas, a normatividade dos princípios, o choque de normas
constitucionais, a ponderação e a argumentação jurídica.
O autor Luís Roberto Barros (2013, p. 38) nos apresenta de forma simples e
completa, uma explanação em um caso concreto, bem diferente do exemplo citado. No
caso citado abaixo, não se conseguirá resolver o problema com o simples
enquadramento da norma ao fato.
O cantor Roberto Carlos foi a juízo para impedir a divulgação de uma
biografia não autorizada, invocando os seus direitos constitucionais de
imagem e de privacidade. O autor da obra defendeu-se fundado na sua
liberdade de expressão e no direito de informação, igualmente protegidos
constitucionalmente. Naturalmente, como os dois lados têm normas
constitucionais a seu favor, não é possível resolver esse problema mediante
subsunção dos fatos à norma aplicável, porque mais de uma postula a
incidência sobre a hipótese. Diante disso, a solução terá de ser construída
33
argumentativamente mediante ponderação, isto é, valoração de elementos do
caso concreto com vistas à produção da solução que melhor atenda ao caso
concreto. (2013, p. 38)
Todo o acima exposto potencializa a importância do debate acerca do
avanço do direito constitucional. As premissas de interpretação tradicional,
notadamente, deixaram de ser integralmente satisfatórias.
De parte disso, passou a ser percebido como um fato natural a existência de
colisões de normas constitucionais, tanto de princípios, como de direitos fundamentais.
O intérprete, portanto, passa a atuar como coparticipante do processo de
criação do direito, ao fazer valorações de sentido para as cláusulas abertas, realizando a
definição concreta entre escolhas possíveis.
Os princípios contêm uma maior carga valorativa, uma decisão política
relevante, um fundamente ético. O que acontece em uma ordem pluralista é a existência
de princípios que abrigam decisões, valores ou fundamentos diversos, por vezes
contrapostos.
A colisão entre princípios ou entre normas ou entre princípios e normas é
possível, e ainda, faz parte lógica do sistema.
E é neste ponto que o intérprete da norma deve tomar cuidado. À vista dos
elementos do caso concreto, o intérprete se defrontará com antagonismos inevitáveis. O
conhecimento principiológico deve partir de uma dimensão de peso ou importância.
A partir de determinado ponto da análise principiológica da realidade que se
quer determinar, surge um espaço de indeterminação, no qual a determinação do
conteúdo aplicável estará sujeita à concepção ideológica ou filosófica do intérprete.
De alguma forma, todos esses elementos devem ser considerados na medida
de sua importância e pertinência de modo que a solução final, a partir da identificação
das normas aplicáveis e compreensão dos fatos relevantes, sejam ponderadas. E é aí que
entra em ação a técnica da ponderação.
Como já assinalado anteriormente, os princípios podem ser aplicados com
maior ou menos intensidade à vista de circunstâncias jurídicas ou fáticas, sem que isso
afete sua validade.
Nesta técnica, os diferentes grupos de normas e a repercussão dos fatos do
caso concreto estarão sendo analisado de forma conjunta, a fim de apurar os pesos que
devem ser atribuídos aos diversos elementos em disputa, e por tal fato, o conjunto de
normas que deve preponderar sobre o caso.
34
Posto isso, o próximo passo é decidir qual a é intensidade desse grupo de
normas e se deve prevalecer em detrimento dos demais. Ou seja, a partir da gradução da
intensidade da solução escolhida, é necessário, ainda, escolher qual deve ser o grau
apropriado em que a solução deve ser aplicada.
Por isso todo o contexto deste processo intelectual está pautado no princípio
instrumental da proporcionalidade ou razoabilidade.
Conclui-se, portanto, que o intérprete da norma se utilizará destes métodos
da seguinte forma: I – identificando as normas pertinentes à serem aplicadas ao caso; II
– Seleção dos fatos relevantes e atribuição geral de pesos; III – a produção de uma
conclusão.
A solução passa a ser construída argumentativamente, mediante a técnica da
ponderação, como sendo a valoração de elementos do caso concreto, com vistas à
produção da solução que melhor atende a demanda.
Por isso podemos dizer que todos os valores compartilhados pela
comunidade como um todo, em dado momento e lugar, materializam-se em princípios,
que passam a ser abrigados pela Constituição, explicita ou implicitamente, devendo ser
respeitados como se norma fosse. Mesmo não tendo passado por um processo formal de
elaboração, tais valores (leia-se princípios) devem ser respeitados, visto que a norma
antes de tudo é criada no seio da comunidade, para somente então passar fazer parte de
um codex formalizado.
Portanto o neoconstitucionalismo não está para, simplesmente, a existência
de princípios e sim no seu reconhecimento pela ordem jurídica.
35
CAPÍTULO 3 APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO
EM CASOS CONCRETOS
3.1 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: DIREITO AO
ESQUECIMENTO
Muito se fala em neoconstitucionalismo e nos benefícios que trouxe a nossa
nova concepção de Estado Democrático de Direito, mas como entender algo tão
utópico? Até as presentes linhas traçadas, poderá o leitor não ter a total noção de como
se aplicar ou mesmo “manusear” o presente instituto, por isso traçaremos às linhas
vindouras a aplicação do neoconstitucionalismo a casos práticos e como essa nova
concepção influenciou a decisão dos mesmos.
Iniciar-se-á, portanto, traçando uma relação entre a visão neoconstitucional
e o direito ao esquecimento, que por sinal se mostra um tema em ascensão não só no
ordenamento jurídico brasileiro, mas sim em todo mundo, saltando as linhas fronteiriças
e se interligando, como se o direito fosse – o que é verdade – um só no mundo todo.
Se os movimentos revolucionários com muita dificuldade conseguiram
entabular em uma constituição os direitos de cada cidadão, como conceber a ideia de
julgar um caso concreto sem se embasar inteiramente na Constituição? Como entender
isso? Sendo que buscou-se a preço de sangue a normatização de direitos e depois vem o
julgador e aplica bases principiológicas para julgar um caso concreto? Não seria um
retrocesso? Onde estaria a segurança jurídica?
Se antes a grande preocupação era garantir a efetivação dos direitos
cravados em uma constituição, hoje não mais se vê por esta ótica. Pois o genocídio
ocorrido em 1939 e 1945 estava totalmente de acordo com a lei, notadamente, no
governo nacional socialista alemão que exterminou quase toda uma raça de judeus.
Nota-se então que poderia ocorrer um sistema absolutista maquiado de
democracia, já que o governante poderia impor suas vontades em uma constituição e
assim satisfazer os seus anseios com o pretexto de estar cumprindo a lei.
Nas palavras do doutrinador Dirley Cunha Júnior:
Esse pensamento, que recebeu a sugestiva denominação de
neoconstitucionalismo, proporcionou o florescimento de um novo paradigma
jurídico: o Estado Constitucional de Direito. Isso se deveu notadamente em
36
razão do fracasso do Estado Legislativo de Direito, no âmbito do qual o
mundo, pasmado, testemunhou uma das maiores barbáries de todos os
tempos, com o genocídio cometido pelo governo nacional socialista alemão
provocando o holocausto que exterminou milhões de judeus, pelos nazistas,
entre 1939 e 1945, nos países ocupados pelas tropas Reich Hitlerista. (2011,
p. 40)
O direito ao esquecimento, em apertada síntese, seria o direito que uma
determinada pessoa possui de fazer com que fatos ocorridos em sua vida, mesmo que
verdadeiros, não sejam publicados ou expostos a outras pessoas, causando assim
transtornos e/ou sofrimento a essa pessoa.
Como exemplo, destaca-se o clássico caso “Lebach” que fora julgado pelo
Tribunal Constitucional Alemão. A história acontece na cidade de Lebach, onde 4
soldados alemães foram assassinados e após os deslinde do processo 3 réus foram
condenados, sendo que 2 foram condenados à prisão perpétua e o terceiro a seis anos de
reclusão. O terceiro réu cumpriu integralmente sua pena e quando estava prestes a
deixar a prisão ficou sabendo que uma emissora de TV iria exibir um programa sobre o
crime ocorrido, mostrando fotos dos condenados e insinuando que estes eram
homossexuais. Diante disso, ele ingressou com uma ação inibitória para impedir a
exibição do programa.
A discussão chegou ao Tribunal Constitucional Alemão que julgou
procedente a ação, sustentando que o direito à personalidade ou mesmo a intimidade
não admite que a imprensa explore o criminoso e sua vida por tempo ilimitado.
Notando-se assim que o princípio da proteção da personalidade deveria prevalecer sobre
à liberdade de informação, uma vez que não haveria mais interesse atual naquela
informação, posto que o crime já estava solucionado e julgado há anos.
A emissora não teria direito de apenas reproduzir suas notícias já publicadas
há alguns anos? O réu teria o direito de que não mais publicassem notícias sobre seus
atos já praticados?
Tendo em vista que no movimento Neoconstitucional, a constituição não
tem apenas uma carga descritiva, mas sim axiológica, buscando a concretização de seus
valores e a garantia de condições dignas mínimas de cada cidadão, devendo-se, então,
imprimir em cada caso concreto os valores consubstanciados na Constituição.
Por isso, ao se contrapor o direito à liberdade de informação e o da
intimidade ou privacidade, por exemplo, devem-se resguardar as condições de
37
dignidade e dos direitos ao menos nos patamares mínimos. E é nesse sentido que
explana o doutrinador Pedro Lenza:
Conforme anotou Barcellos, completando, do ponto de vista material,
destaca-se um outro elemento na ideia de constitucionalismo: “(ii) a expansão
de conflitos específicos e gerais entre as opções normativas e filosóficas
existentes dentro do próprio sistema constitucional”. Sem dúvida, os valores
constitucionalizados poderão entrar em choque, seja de modo específico
(por exemplo, a liberdade de informação e de expressão e a intimidade,
honra e vida privada), seja de modo geral, no que, conforme afirma, diz
respeito “ao próprio papel da Constituição. Em uma visão substancialista
(a constituição deveria impor um conjunto de decisões valorativas que se
consideram essenciais e consensuais), ou mesmo designada de
procedimentalista (a constituição deve garantir o funcionamento adequado do
sistema de participação democrático, ficando a cargo da maioria, em cada
momento histórico, a definição de seus valores e de suas próprias convicções
materiais), em relação a qualquer das posições que se filie, mesmo no
procedimentalismo deverão ser resguardados as condições de dignidade e
dos direitos dentro, ao menos, de patamares mínimos. (2011, p. 61-62)
Ou seja, independentemente da linhagem de pensamento ao qual qualquer
um se filie, deve-se resguardar as condições mínimas de dignidade da pessoa humana.
Essa é a visão do neoconstitucionalismo. Buscar não somente aquilo que o
texto de uma lei diz, mas também o que a ética, o direito, a moral e a justiça
resguardam. A saber, a proteção aos direitos fundamentais e principalmente a dignidade
da pessoa humana.
Ademais, foi especialmente decisivo para o delineamento desse novo Direito
Constitucional, o reconhecimento da força normativa dos princípios, situação
que tem propiciado a reaproximação entre o Direito e a Ética, o Direito e a
Moral, o Direito e a Justiça e demais valores substantivos, a revelar a
importância do homem e sua ascendência a filtro axiológico de todo o
sistema político e jurídico, com a consequente proteção dos direitos
fundamentais e da dignidade da pessoa humana (CUNHA JÚNIOR, 2011, p.
42)
Pelo fato de que o direito ao esquecimento contrapõe muitas vezes
princípios entabulados em uma mesma carta magna, o neoconstitucionalismo surge para
trazer uma relativização, tanto pela dimensão normativa quanto pela axiológica, para
que se fundam e se reconheçam os direitos de cada um sob uma dupla dimensão
normativo-axiológico embasada na dignidade da pessoa humana e nos direitos
fundamentais.
A emergência do neoconstitucionalismo logrou propiciar o reconhecimento
da dupla dimensão normativo-axiológico das Constituições contemporâneas,
38
ensejando a consolidação de uma teoria jurídica material ou substancial
assentada na dignidade da pessoa humana e nos direitos fundamentais. Nesse
contexto, o discurso jurídico, antes associado a uma concepção formal e
procedimentalista, evolui para alcançar uma vertente substancialista
preocupada com a realização dos valores constitucionais (CUNHA JÚNIOR,
2011, p. 42)
A visão neoconstitucionalista, agora em ascensão no meio jurídico, muito há
que contribuir para a aplicação de direitos consagrados na constituição em uma esteira
principiológica. Buscando, como já fora dito supra, o reconhecimento da dupla
dimensão normativo-axiológico, para que não seja aplicado o direito ad libitum do
julgador, mas sim pelo âmago de cada norma que traz consigo a esperança de justiça
creditada aos revolucionários que romperam com os antigos sistemas absolutistas,
buscando o seu verdadeiro sentido. A saber: a dignidade da pessoa humana.
Existem muitos outros exemplos recentes sobre essa questão de “direito ao
esquecimento” como o caso da XUXA VS GOOGLE no qual a “rainha dos baixinhos”
quer que sejam removidas da rede mundial de computadores insinuações de seu nome à
prática de pedofilia ou qualquer prática criminosa.
O caso foi decidido pelo STF, do qual o ministro Celso de Mello negou o
recurso da apresentadora Xuxa e manteve a permissão do Google de revelar fotos e
vídeos da apresentadora após pesquisa que relacionam seu nome à pedofilia.
O STJ utilizou os argumentos de que “não se pode, sob o pretexto de
dificultar a propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na ‘web’ reprimir o direito da
coletividade à informação”
Um caso, não menos curioso, foi o da chacina da Candelária, que aconteceu
em 1993, em frente a igreja da Candelária no estado do Rio de Janeiro, onde um grupo
de policiais a paisana abriram fogo contra setenta crianças e adolescentes que dormiam
nas escadarias da igreja. Três policiais foram condenados e dois foram absolvidos.
A Rede Globo Comunicações exibiu 13 anos após a Chacina, no programa
“Linha Direta”, um documentário em rede nacional sobre o ocorrido naquela madrugada
de julho de 1993.
Percebemos, neste caso, que direitos e princípios se colidem, de um lado
temos a liberdade de imprensa e direito a informação e de outro direito da
personalidade e da honra. Então, o intérprete da lei, utilizando-se da técnica de
interpretação da lei abraçado pelo neoconstitucionalismo, fará a identificação das
normas pertinentes, a seleção dos fatos relevantes e, por fim, produzirá uma conclusão.
39
Importante, portanto, trazer à baila este tão importante julgado:
RECURSO ESPECIAL nº 1.334.097 – RJ (2012/0144910-7)
RELATOR: MINISTRO LUIZ FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE: GLOBO COMUNICAÇÕES E PARTICIPAÇÕES S/A
RECORRIDO: JURANDIR GOMES DE FRANÇA
EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL – CONTITUCIONAL.
LIBERDADE DE IMPRESA VS. DIREITOS DA PERSONALIDADE.
LITIGIO DE SOLUÇÃO TRANSVERSAL. COMPETÊNCIA DO
SUPRIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DOCUMENTÁRIO EXIBIDO EM
RENE NACIONAL. LINHA DIRETA-JUSTIÇA. SEQUÊNCIA DE
HOMICÍDIOS CONHECIDA COMO CHACINA DA CANDELÁRIA.
REPORTAGEM QUE REACENDE O TEMA TREZE ANOS DEPOIS DO
FATO. VEICULAÇÃO INCONSENTIDA DE NOME E IMAGEM DE
INDICIADO NOS CRIMES. ABSOLVIÇÃO POSTERIOR POR
NEGATIVA DE AUTORIA. DIREITO AO EQUECIMENTO DOS
CONDENADOS QUE CUMPRIRAM PENA E DOS ABSOLVIDOS.
ACOLHIMENTO. DECORRÊNCIA DA PROTEÇÃO LEGAL E
CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DAS
LIMITAÇÕES POSITIVIDAS À ATIVIDADE INFORMATIVA.
PRESUNÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL DE RESSOCIALIZAÇÃO
DA PESSOA. PONDERAÇÃO DE VALORES. PRECEDENTES DE
DIREITO COMPARADO. (grifou-se)
Analisando o processo em epígrafe, a decisão que negou provimento ao
Recurso Especial interposto pela Rede Globo de Comunicações, merece grande
destaque pelo brilhantismo sentencial, In Verbis:
O momento é de novas e necessárias reflexões, das quais podem mesmo
advir novos direitos ou novas perspectivais sobre velhos direitos revisitados.
(...)
Assim, a liberdade de imprensa há de ser analisadas a partir de dois
paradigmas jurídicos bem distantes um do outro. O primeiro, de completo
menosprezo tanto da dignidade da pessoa humana quanto de liberdade de
imprensa; e o segundo, o atual, de dupla tutela constitucional de ambos os
valores.
Nesse passo, a explícita contenção constitucional à liberdade de informação,
fundada na inviolabilidade da vida privada, intimidade, honra, imagem e, de
resto, nos valores da pessoa e da família, prevista no art. 220, §1º, art. 221 e
no §3º do art. 222 da carta de 1988, parece sinalizar que, no conflito
aparente entre esses bens jurídicos de especialíssima grandeza, há, de
regra, uma inclinação ou predileção constitucional para soluções
protetivas da pessoa humana, embora o melhor equacionamento deva
sempre observar as particularidades do caso concreto. Essa constatação
se mostra consentânea com o fato de que, a despeito de a informação livre de
censura ter sido inserida no seleto grupo de direitos fundamentais (art 5º,
inciso IX), a Constituição Federal mostrou sua vocação antropocêntrica no
momento em que gravou, já na porta de entrada (art. 1º, inciso III), a
dignidade da pessoa humana como - mais que um direito – um fundamento
da República, uma lente pela qual devem ser interpretados os demais direitos
posteriormente reconhecidos. Exegese dos arts. 11, 20 e 21do Código Civil
de 2002. Aplicação da filosofia Kantiana, base da teoria da dignidade da
pessoa humana, segundo a qual o ser humano tem um valor em si que
supera o das “coisas humanas”.
40
Tal abordagem ganha cada vez mais importância na medida em que as
contraposições constitucionais tem se tornado uma realidade no âmbito jurídico. A
ampliação da abordagem de uma visão que vai contra a operação lógica dedutiva, na
qual o juiz faria a subsunção dos fatos à norma, pronunciando a consequência jurídica
nele já existente.
3.2 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: LEGITIMIDADE DA
INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO CARACTERIZADA PELA ANENCEFALIA
A Anencefalia é uma má-formação fetal, devido a um problema no
fechamento do tubo neural, caracterizada pela ausência parcial do encéfalo e da calota
craniana. Na prática, não é a total ausência de cérebro no feto, e sim a má formação
deste, que pode se dar em graus variados. A Anencefalia geralmente é utilizada para
caracterizar uma má formação fetal do cérebro, Sendo quase impossível a viabilidade de
vida extrauterina.
Diante da constatação de anencefalia, a interrupção da gravidez pela mãe,
poderia ser criminalizada? Poder-se-ia considerar uma atitude antijurídica?
Óbvio que o nosso legislador de 1940 (data da promulgação do atual código
penal) não conseguiria prever tal fato, que, por demais, hoje já se tornou corriqueiro.
Poder-se-ia então, levar a mãe que interrompe a gravidez, por saber que o
feto não teria perspectiva de vida extrauterina, às grades de uma prisão já que esta
provocou um aborto espontâneo?
Se tomarmos o mesmo caminho dos juristas dos séculos passados para
interpretar o caso concreto, simplesmente aplicaríamos a norma descrita e obviamente
levaríamos a mãe, que por demais já sofre muito com o aborto, a outro sofrimento, de
ter a sua liberdade cerceada.
A luz sempre brilha no fim do túnel.
É nesse compasso que se forma a necessidade de uma nova concepção para
enxergar e interpretar as leis, logo surgiu o neoconstitucionalismo.
41
A nossa Suprema Corte no acórdão de Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental nº 54, se pronunciou sobre a legitimidade da mulher poder
interromper a gestação após o diagnóstico, se assim o desejasse.
Esmiuçando o caso trazido à baila, o Ministro Luís Roberto Barroso, em sua
obra intitulada: O NOVO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO, traz a sua
contribuição no seguinte sentido:
“O caso era difícil por três razões típicas. Em primeiro lugar, pela
ambiguidade da linguagem: determinar se o sentido e alcance do direito à
vida englobava ou não um feto inviável. Em segundo lugar, pela existência
de uma colisão de direitos fundamentais: admitindo-se que houvesse, de fato,
um direito à vida potencial por parte do feto, ele se contraporia ao direito da
mãe de não se submeter a um sofrimento que considere inútil, com
repercussão sobre a sua integridade física e psíquica. E, em terceiro lugar, um
descordo moral: em todas as questões que envolvem interrupção da gestação
e aborto, contrapõem-se os defensores da liberdade de escolha da mulher –
isto é, o exercício de sua liberdade reprodutiva – e os que consideram que o
direito à vida é absoluto e se estende ao feto, sendo ilegítima a decisão da
mãe de se interromper a gestação. O supremo Tribunal Federal decidiu que a
interrupção da gestação no caso de feto anencefálico é fato atípico, em razão
da ausência de potencialidade de vida do feto. Como consequência,
reconheceu o direito de a mulher interromper a gestação em tal hipótese,
independentemente de autorização judicial.” (2013, p. 48)
Por isso, embasando-se nos pilares do neoconstitucionalismo resultou em
um deslinde satisfatório no presente caso. Percebe-se que se contrapôs a legislação
ordinária (Código Penal) ao o principio constitucional da dignidade da pessoa humana,
e tivemos como mediador, para equilibrar essa contraposição, os alicerces do
neoconstitucionalismo, que analisou a aplicação da lei ao caso concreto não pelo
simples encaixe do caso concreto à norma jurídica. Este caso foi além. Analisou-se não
a letra fria, mas valorizou-se o âmago do principio constitucional da dignidade da
pessoa humana.
Equalizou-se a lei e os princípios, pois obrigar uma mulher levar a gestação
até o fim de um feto anencefálico, sem a possibilidade de vida extrauterina, violaria as
dimensões do direito à integridade física, moral e psicológica.
Importante salientar que, antes da prolação do acórdão, que permite o aborto
de feto anencefálico, em audiência pública, vários foram os argumentos, teses e teorias,
uns a favor e outros contra a legitimidade do pedido. Tanto é verdade que, no acórdão
prolatado pelo Ministro Marco Aurélio em sua página vinte e dois (22), o Deputado
42
Federal Luiz Bassuma, presidente da frente parlamentar em Defesa da Vida,
manifestou-se contra o Aborto alegando ser uma violação do direito à vida.
“A seguir, o então Deputado Federal Luiz Bassuma, Presidente da Frente
Parlamentar em Defesa da Vida – Contra o Aborto manifestou-se a favor do
direito inviolável à vida. Acrescentou que, recentemente, o Estado brasileiro
referendou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência –
circunstância que alcançaria a situação dos anencéfalos –, mediante a qual se
impõe à República Federativa do Brasil e à sociedade o dever de assegurar o
direito de igualdade de oportunidade aos deficientes.” (2013, p. 96)
Verificamos com isso a aplicabilidade latente do neoconstitucionalismo,
que, mais uma vez conseguiu suplantar as mazelas de uma lei totalmente arcaica e
equilibrá-la com os princípios pertinentes ao caso.
3.3 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: UNIÕES
HOMOAFETIVAS
Importante se faz, antes de concluir o presente capítulo, relacionar o
neoconstitucionalismo à legitimidade das uniões homoafetivas, que por sinal, já não é
algo tão atual assim, visto que o julgamento do vertente caso ocorrera no dia 4 e 5 de
maio de 2011.
O então governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral ficou sabendo de um
estudo realizado acerca da temática e quis levar o pedido ao STF, para que a união
estável de pessoas do mesmo sexo estivessem sujeitas ao mesmo regime jurídico das
uniões estáveis convencionais.
Entretanto, o Governador do Estado do Rio de Janeiro no que tange a
propositura de ADPF, possui apenas legitimidade especial, ou seja, ele precisa
demonstrar que a questão a ser discutida teria repercussão específica e direta no âmbito
do Estado, então com isso ele precisaria demonstrar a pertinência temática.
Então, para justificar a propositura da ação, utilizou-se do Decreto-Lei
estadual nº 220, de 18.08.1975 (Estatuto dos Servidores Civis do Estado do Rio de
Janeiro) que prevê o direito de licença do servidor em caso de doença de pessoas da
família ou para acompanhar o cônjuge em missão de trabalho. Então este foi o motivo!
O Governo precisava determinar se cônjuge e pessoa da família incluíam ou não os
parceiros em uniões homoafetivas.
43
O Ministro Gilmar Mendes não recebeu o pedido como ADPF, mas sim
como ADI sob o nº 142.
A presente ação foi ajuizada em Fevereiro de 2008 recheada de argumentos
e fundamentos para justificar o deferimento do pedido.
Mas se a lei não reza sobre tal possibilidade, nem se quer cogita essa
questão, como então que o julgador irá deferir tal pedido ?
Ele não estaria criando possibilidades que não se encontram na lei?
Obviamente que não. É sabido que o julgador, sendo a lei omissa, pode
utilizar-se da analogia, dos costumes, e dos princípios gerais de direito para suprir a
lacuna na lei.
Mais uma vez entra em cena, de forma discreta, a utilização dos conceitos
do neoconstitucionalismo para suplantar a falta da lei positivada, visto que, como já fora
dito em linhas anteriores, o Direito não pode estar contido simplesmente na lei, mas está
além dela.
Como bem relata o Ministro Luis Roberto Barroso em seu artigo
“Diferentes, mas iguais”:
No direito positivo brasileiro, inexiste regra específica sobre a matéria. A
Constituição de 1988, que procurou organizar uma sociedade sem
preconceito e sem discriminação, fundada na igualdade de todos, não contém
norma expressa acerca da liberdade de orientação sexual. Como
consequência natural, também não faz menção às uniões homoafetivas. Faz
referência, no entanto, às uniões heterossexuais, reconhecendo como entidade
familiar a união estável entre o homem e a mulher. O Código Civil, por sua
vez, ao disciplinar o tema da união estável, seguiu a mesma linha. (2013, p.
432)
Ele justifica a aceitação da união homoafetiva com o seguinte argumento:
A tese principal é a de que um conjunto de princípios constitucionais impõe
a inclusão das uniões homoafetivas no regime jurídico da união estável, por
se tratar de uma espécie em relação ao gênero. A tese acessória é a de que,
ainda quando não fosse uma imposição do texto constitucional, a
equiparação de regimes jurídicos decorreria de uma regra de hermenêutica:
na lacuna da lei, deve-se integrar a ordem jurídica mediante o emprego da
analogia. Como as características essenciais da união estável previstas no
Código Civil estão presentes nas uniões estáveis entre pessoas do mesmo
sexo, o tratamento jurídico deve ser o mesmo. (2013, p. 431)
Utilizando-se de uma base principiológica a presente ação denunciou
violação a princípios já há muito tempo consagrados em nosso ordenamento jurídico,
44
então não poderia o julgador, por mais ortodoxo que fosse, fechar os olhos à aplicação
destes princípios, que caso o pedido fosse indeferido, estariam sendo feridos de morte.
Os princípios elencados na Ação Direta de Inconstitucionalidade para
embasá-la foram: o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da igualdade,
do direito à liberdade, do qual decorre a proteção à autonomia privada, bem como o
princípio da segurança jurídica.
Barroso explana em sua magnífica obra sobre a aplicação, no vertente caso,
de cada princípio elencado.
Princípio da igualdade:
A constituição Federal de 1988 consagra o princípio da igualdade e
condena de forma expressa todas as formas de preconceito e discriminação.
A menção a tais valores vem desde o preâmbulo da Carta, que enuncia o
propósito de se constituir uma “sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos”
(...)
Tal conjunto normativo é explicito e inequívoco: a Constituição proíbe
todas as formas de preconceitos e discriminação, binômio no qual hão de
estar abrangidos o menosprezo ou a desequiparação fundada na orientação
sexual das pessoas.
(...)
De qualquer forma, porém, não seria necessário elencar razões para
impedir o tratamento diferenciados. A lógica é exatamente a inversa.
Onde não exista motivo legítimo a exigir distinção, a regra há de ser o
tratamento igualitário. (2013, p. 432 e 433) (Grifei)
Sobre o direito à liberdade, do qual decorre a autonomia privada, seria
necessário trazer toda a explicação contida na ilustríssima obra, mas nos ateremos a um
ponto crucial:
A autonomia privada pode certamente ser limitada, mas não
caprichosamente. O princípio da razoabilidade ou proporcionalidade [...]
exige a imposição de restrições seja justificada pela promoção de outros bens
jurídicos de mesma hierarquia, igualmente tutelados pela ordem jurídica.
(...)
Ocorre, porém, que o não reconhecimento das uniões estáveis entre pessoas
do mesmo sexo não promove nenhum bem jurídico que mereça proteção em
um ambiente republicano. Ao contrário, atende majoritárias, mas que não se
impõem como juridicamente vinculantes em uma sociedade democrática e
pluralista, regida por uma constituição que condena toda e qualquer forma de
preconceito. (2013, p. 434 e 435)
Encerramos as citações das fundamentações trazidas à baila não por serem
menos importantes, mas porque as já apresentadas superam toda e qualquer dúvida
acerca da devida aplicação destes princípios para tutelar o direito de reconhecimento das
uniões homoafetivas.
45
Com isso, podemos verificar que o direito nunca esteve e nunca estará
contido integralmente na normal positivada, sendo necessária a ponderação do
intérprete entre os princípios e as leis, visto que uma anda de mãos dadas com a outra e
uma só se completa com a outra.
46
CONCLUSÃO
Diante o exposto, verificamos que o sistema absolutista conseguiu, não por
pouco tempo, controlar a sociedade e submetê-la às ordens de um monarca absoluto,
com argumentos de que o soberano era representante de Deus na Terra e que a vontade
deste era inspirada por Deus, e que contrariar a vontade do monarca absoluto seria o
mesmo que não acatar as ordens divinas. Esses argumentos perduraram por muito
tempo, a fim de controlar a sociedade para que caminhasse nos trilhos da vontade do
monarca. Mas, fadado estava este sistema de controle social, pois, sendo o homem um
animal político, jamais se contentaria em simplesmente obedecer as ordens de alguém.
O sistema absolutista notadamente viria a sucumbir em pouco tempo, e não
foi diferente, com as ideias iluministas concebendo a Revolução Francesa, esse sistema
de controle social se extinguiu (apesar que ainda, em alguns países, existe governo
absolutista). Com o intuito de se limitar o poder que, outrora, era absoluto instituiu-se
em meio a sociedade uma constituição, que deveria ser respeitada e seguida a risca para
trazer benefícios a toda coletividade.
Surge então o Constitucionalismo, primeiramente na America do Norte, em
meados de 1789 e posteriormente na frança em 1791. O Constitucionalismo trazia em
seu bojo uma estrutura constitucional para limitar o poder do soberano, instituindo
direitos e garantias a todos os cidadãos. O que valia era a lei, era o que estava escrito.
Provavelmente, traumatizados pelos danos advindos de um governos absolutista, queria
fazer valer as normas constitucionais a todo o custo. Entretanto, mais uma vez, esse
sistema não foi suficiente para resolver todas as complexas relações sociais dos seres
humanos, visto que o direito não se encaixava perfeitamente na norma escrita. O
legislador ordinário, por mais que se esforçasse, não conseguiria jamais acompanhar
toda a transformação que a sociedade vinha sofrendo, e sempre ficaríamos com um
sistema jurídico defasado. As leis seriam criadas, comportamentos seriam normatizados
e tipificados, mas nessa corrida da evolução entre a sociedade e a lei, esta última sempre
seria perdedora. Ela jamais conseguiria acompanhar as mudanças que diariamente
aconteciam no seio da sociedade. Será que isso nos remete a alguma situação familiar?
Obviamente que sim! Observemos o nosso ordenamento jurídico, que está muito aquém
do que deveria estar. Exemplos existem vários: o nosso atual Código Penal é do ano de
1940, Código Tributário Nacional é de 1966, A lei que regula a matéria de utilização de
47
cheques também é de 1966 e por último, a lei que regula as operações cambiais é de de
1908. Exemplos não nos falta para verificarmos que o corpo legislativo pátrio, por mais
empenhado que fosse não conseguiria satisfazer todas as modificações existentes na
sociedade, e quando consegue, é de maneira atrasada.
Com isso, se viu a necessidade de um movimento mais autêntico capaz de
dar ao intérprete da lei condições de equilibrar direitos e garantias, conseguindo assim
dar uma solução justa para o caso concreto. O intérprete da lei não poderia ser um mero
aplicador da lei, pois se assim fosse não seria necessário juízes togados, que se
submetem a um concurso público, deveras muito concorrido, para simplesmente aplicar
a lei ao caso concreto. Poderia se, então, criar um programa de computador no qual
necessitaria unicamente de uma pessoa para preencher os campos solicitados e assim, de
forma matemática, enquadraria o caso concreto à lei aplicável. Mas isso não seria justo!
Não seria justo, pois, o computador jamais conseguiria ter a sensibilidade de um ser
humano que verifica, antes de tudo, as causas e os motivos determinantes de qualquer
conduta típica.
Por isso, ergue-se em nosso meio um movimento que entrega ao intérprete
da lei essa liberdade, de ser sensível ao caso concreto, podendo julgar as controvérsias
da vida não somente com a letra fria da lei, mas com a superfície aveludada dos
princípios.
O movimento denominado neoconstitucionalismo entrega ao intérprete da
lei uma margem maior de liberdade, traz a constituição, juntamente com seus princípios,
ao centro do ordenamento jurídico pátrio. O neoconstitucionalismo traz à constituição
uma carga não somente ideológica, como também axiológica, primando por valores
insculpidos na carta magna. Então, em um caso concreto, quando se está diante de
direitos contrapostos, o neoconstituinalismo concede ao intérprete um poder de
ponderação de direitos, podendo aplicar os princípios e, se for necessário, colocá-los
acima da própria lei. Visto que direito não está contido integralmente contido na norma
escrita, mas também se encontra nos valores e princípios já entabulados na constituição.
O neoconstitucionalismo, portanto, busca a junção das normas e dos
princípios, e, porque não dizer, com outras ciências, fazendo com que o conjunto de
leis, ao serem aplicadas, não produza apenas resultados matemáticos, mais sim
humanos, valorizando sempre o ser humano e fazendo com que todos entendam que não
estamos aqui para, simplesmente, obedecer a lei, mas que ela fora criada para o nosso
48
benefício, imprimindo no homem valores que ao longo da vida podem ser esquecidos
ou menosprezados, resultando em uma sociedade mais harmônica e desenvolvida, para
que consigamos atingir o ápice da existência humana, mesmo que em baixa escala, pois
ainda estamos longe disso, e entendermos que todos somos iguais, sem distinção de cor,
raça, credo ou posição social, filhos de um mesmo criador.
49
REFERÊNCIAS
ANDERSON, Perry. Linhagens do Estado Absolutista. 2. ed. São Paulo: Brasiliense,
1989, p. 18. Disponível em:
<http://minhateca.com.br/alcides.deabreu/Documentos/Livros+Hist*c3*b3ria+em+pdf/
Perry+Anderson+-+Linhagens+Do+Estado+Absolutista,5141920.pdf> Acesso em: 20
mar. 2014.
BARROSO,Luís Roberto. O Novo Direito Constitucional Brasileiro. 1 ed. Belo
Horizonte. Fórum 2013.
______. Interpretação e aplicação da Constituição. 7ª ed. São Paulo. Saraiva. 2009,
p. 305-345
______. Diferentes, mas iguais: o reconhecimento jurídico das relações
homoafetivas no Brasil. Disponível em:
http://www.direitopublico.com.br/pdf_seguro/diferentes_iguais_lrbarroso.pdf Acesso
em 29 out. 2014.
______. Neoconstitucionalismo e Constituicionalização do Direito. Disponívels em :
http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-
content/themes/LRB/pdf/neoconstitucionalismo_e_constitucionalizacao_do_direito_pt.p
df Acesso em 23 out. 2014.
CASTRO, Flávia Lages de. História do Direito. 8. ed. Rio de Janeiro: 2011, p. 197-
207.
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 5 ed. São Paulo.
JusPodivm, 2011. p. 40-43.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Míni Aurélio: o dicionário da língua
portuguesa. 8 ed. Curitiba. Positiva. 2010.
FILIPPO, Thiago Baldani Gomes de. Do Constitucionalismo ao
Neoconstitucionalismo. Paraná: 2010. Disponível em:
http://uenp.edu.br/index.php/prograd-tcc/doc_view/1918-thiago-baldani-gomes-de-
fillipo. Acesso em: 18 mar. 2014.
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Neoconstitucionalismo - Os efeitos do neoconstitucionalismo nos direitos fundamentais

  • 1. FACULDADE ALVES FARIA GRADUAÇÃO EM DIREITO Eloi Costa Campos Junior OS EFEITOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO NOS DIREITOS FUNDAMENTAIS GOIÂNIA NOVEMBRO DE 2014
  • 2. FACULDADE ALVES FARIA GRADUAÇÃO EM DIREITO Eloi Costa Campos Júnior OS EFEITOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO NOS DIREITOS FUNDAMENTAIS Trabalho apresentado como exigência parcial para conclusão da disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso I do Curso de Graduação em Direito das Faculdades Alves Faria, sob a orientação da Prof. Me. Aurélio Marcos Silveira de Freitas. GOIÂNIA NOVEMBRO DE 2014
  • 3. FACULDADE ALVES FARIA GRADUAÇÃO EM DIREITO Eloi Costa Campos Junior OS EFEITOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO NOS DIREITOS FUNDAMENTAIS AVALIADORES: ___________________________________________________________________________ Prof. Me. Aurélio Marcos Silveira de Freitas – ALFA (Orientador) ___________________________________________________________________________ Prof. Me. Marcelo Lopes de Jesus - Leitor – ALFA GOIÂNIA NOVEMBRO DE 2014
  • 4. Aos meus avós paternos e maternos, Donato e Ceci, Lúcia e Mamede “In Memorian”, ao meu pai Eloi, minha mãe Sônia e minha querida irmã Daiana e ao meu cunhado Fabrício, bem como minha namorada Ávily.
  • 5. AGRADECIMENTOS A Deus por ter me proporcionado essa valiosíssima oportunidade e por ter me dado condições para concluir este curso. Aos meus pais, por terem me apoiado em toda trajetória, não só acadêmica, sempre me incentivando e acreditando em meu potencial, posto que sem eles eu não teria conseguido alcançar este tão almejado sonho. A minha irmã Daiana por sempre ter acreditado em mim e, de uma forma direta ou indireta, ter me apoiado, pois sei que sempre torceu pelo meu sucesso. A todos os meus amigos e colegas, especialmente Johnathan Gonçalves, Guilherme e Johnatan Ferreira que foram companheiros e verdadeiros amigos em todos os momentos, dentro e fora do ambiente acadêmico. Aos meus Pastores Vilmar Felipe e Silvania. A todos os meus professores, aos meus coordenadores Diogo e Bebel e ao meu orientador Aurélio, que com muita destreza e tranqüilidade me conduziu à conclusão deste trabalho.
  • 6. Fui à floresta porque queria viver de verdade. Eu queria viver profundamente e tirar toda a essência da vida. Fazer apodrecer tudo o que não era vida e não, quando eu morrer, descobrir que não vivi. Henry David Thoreau (Frase tradicional de abertura das reuniões da Sociedade dos Poetas Mortos)
  • 7. RESUMO CAMPOS JÚNIOR, Eloi Costa. Efeitos do Neoconstitucionalismo nos direitos fundamentais. Monografia, 2014. Graduação em Direito das Faculdades Alves Faria. Goiânia, 2014. Sabemos que a sociedade está cada vez mais complexa em suas relações, visto que todos os dias surgem novos ideais e novas verdades que, até então, eram desconhecidas. A todo o momento os pensamentos que, outrora, eram sustentáculo da harmonia social entram em choque com o desenvolvimento e simplesmente são esquecidos. Diante dessa rápida evolução é necessário um sistema de controle social, sendo indispensável um mecanismo de solução de conflitos, e, diante desta necessidade, cria-se um sistema jurídico formado por leis para que controle a sociedade e seus integrantes. Mas quando se tem todo um ordenamento jurídico formado e este não é suficiente para satisfazer todos os anseios e necessidades, tem- se então um grande problema: um sistema de controle social ineficaz, consequentemente um grande risco para a existência e desenvolvimento desta sociedade, já que as leis não conseguem acompanhar todas as mudanças e evoluções, estas estão totalmente fadadas ao fracasso. Por isso, se faz necessário a criação de um modelo de interpretação de leis que consiga compensar a defasagem de um determinado ordenamento jurídico diante das transformações e evoluções. Por esta ótica, discorreremos, no presente trabalho, sobre o movimento denominado neoconstitucionalismo que visa interpretar a lei de modo que consiga trazer aos conflitos sociais a solução mais ponderada e razoável, utilizando-se dos princípios gerais de direito, elencando algumas das vantagens desta atual concepção, mais precisamente em relação aos direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal 1988, evidenciando seus efeitos no direito brasileiro. PALAVRAS-CHAVE: Constitucionalismo. Neoconstitucionalismo. Aplicação. Princípios. Direitos e Garantias Fundamentais. Constituição Federal.
  • 8. ABSTRACT CAMPOS JÚNIOR, Eloi Costa. Neoconstitutionalism Effects on Fundamental Rights. Monograph, 2014. Graduated in Law Colleges Alves Faria. Goiânia, 2014. We know that society is increasingly complex in their relationships, since every day brings new ideas and new truths that, until then, were unknown. At all times the thoughts that once were the mainstay social harmony collide with the development and simply are forgotten. Given this rapidly evolving a system of social control is necessary, and indispensable means of resolving conflicts, and facing this requirement, it creates a legal system composed of laws to control the society and its members. But when it has formed an entire legal system and this is not enough to satisfy all the desires and needs, then has a big problem: a system of social control ineffective, hence a big risk for the existence and development of society, as that laws can not keep up with all the changes and developments, these are totally doomed to failure. Therefore, the creation of a model of interpretation of laws that can compensate for the lag of a particular jurisdiction before the changes and developments is needed. For this perspective, we will discuss in this paper, about the movement called neoconstitutionalism which aims to interpret the law so that it can bring to social conflicts more thoughtful and reasonable solution, using the general principles of law, listing some of the advantages of this current design, specifically in relation to fundamental rights and guarantees of the Federal Constitution in 1988, showing their effects in Brazilian law. KEYWORDS: Constitutionalism. Neoconstitutionalism. Application. Principles. Fundamental Rights and Guarantees. Federal Constitution.
  • 9. SUMÁRIO INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 10 CAPÍTULO 1 NOÇÕES HISTÓRICAS DO NEOCONSTITUCIONALISMO.....12 1.1 NOÇÕES SOBRE O CONSTITITUCIONALISMO NA EUROPA....................... 12 1.2 O CONSTITUCIONALISMO NORTE-AMERICANO.......................................... 16 CAPÍTULO 2 VIAGENS DO CONSTITUCIONALISMO AO NEOCONSTITUCIONALISMO.........................................................................20 2.1 CONSTITUCIONALISMO MODERNO............................................................... 20 2.2 NEOCONSTITUCIONALISMO – UMA VISÃO RECENTE E EFICAZ..........................................................................................................................26 CAPÍTULO 3 APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO EM CASOS CONCRETOS................................................................35 3.1 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: DIREITO AO ESQUECIMENTO......................................................................................................... 35 3.2 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: LEGITIMIDADE DA INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO CARACTERIZADA PELA ANENCEFALIA .... 40 3.3 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: UNIÕES HOMOAFETIVAS......................................................................................................... 42 CONCLUSÃO................................................................................................................ 46 REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 49
  • 10. 10 INTRODUÇÃO Ao escolher um tema que será objeto de estudos, nem sempre se escolhe pelo grau de complexidade da matéria, mas sim pela utilidade e contribuição jurídica do tema, e pautando-se nessa perspectiva, me deparei com o tema “neoconstitucionalismo” que em primeira mão não parece ser tão atraente, mas diante do que vivenciamos ultimamente em nossa sociedade, não poderia haver outra escolha senão a escolha do tema “neoconstitucionalismo”. Vivenciamos a liberdade da transformação em nossa sociedade em sua forma clara e notável. As doutrinas, que outrora eram de grande estima entre os estudiosos, já não são tão desejadas, e de braços dados com as leis, passam por uma crise existencial. Hoje pode-se dizer que tudo é novo, é “neo” é “pós”. Pós-modernidade, Pós-positivismo, Neoconstitucionalismo. Os intérpretes e estudiosos se vêem imersos no desenrolar deste cenário, operando em meio aos avanços de novos ideais e ideias, não conseguindo, muitas das vezes, distingui-los e organizá-los, visto a rapidez e complexidade das relações dos homens dentro de uma sociedade civilizada. A velocidade das transformações, edições e alterações das leis já não conseguem acompanhar a rapidez evolutiva da sociedade. As leis não conseguem mais expressar a eficácia que deveria diante à complexidade das relações sociais. Por isso acompanhar a mudança do modo de pensar dos indivíduos e adequá-los às leis não é tarefa fácil. Urge-se então a necessidade de se criar um remédio que cure as consequências deixadas pela ineficácia da lei. Surge então o Neoconstitucionalismo. Este movimento traz a constituição e seus princípios implícitos e explícitos ao centro de nosso ordenamento jurídico pátrio, transcendendo aos outros ramos do direito. Nesse novo sistema os direitos fundamentais ganham grande relevância e aplicabilidade, nunca vista antes, prescindindo de normatização infraconstitucional para a sua eficácia. Esse movimento se mostra cristalino em nosso ordenamento jurídico, nas decisões judiciais bem como em nossa maior corte judiciária, Supremo Tribunal Federal, principalmente nas decisões de efeito “erga omnes” quando é necessário ponderar direitos e garantias.
  • 11. 11 Pretende-se analisar esta nova percepção constitucional, atravessando o passado e analisando as fronteiras que estão sendo rompidas à vista dos questionamentos atuais. Utilizando-se de exemplos para demonstrar a sua aplicabilidade e os conflitos, outrora inexistentes, de normas constitucionais, e a carga principiológica que vem sendo utilizada pelo intérprete para soluções favoráveis ao bom senso e ponderação.
  • 12. 12 CAPÍTULO 1 NOÇÕES GERAIS DO CONSTITUCIONALISMO 1.1 NOÇÕES SOBRE O CONSTITITUCIONALISMO NA EUROPA “Eu sou a Lei, eu sou o Estado; o Estado sou eu” Luís XIV Essa foi a frase proclamada pelo “Rei Sol”, como ficou conhecido um monarca absolutista da França que teve seu reinado de 1643 a 1715. A frase caracteriza muito bem a época conhecida como “Absolutismo”, típico regime da idade média. No Absolutismo, o país era governado e regido basicamente pela vontade arbitrária e irresponsável de um monarca, pelo que se acreditava, que lhe eram outorgados poderes divinos de reinar sobre o povo e que suas decisões eram inspiradas por Deus, e que contrariar a decisão de um Rei seria contrapor-se a vontade de Deus. Como explica a doutrinadora Flávia Lages de Castro: A teoria mais utilizada pelos monarcas absolutistas e seus seguidores para justificar tamanho poder foi dada pelo Bispo Jacques Bossuet, Autor de “Política Extraída da Sagrada Escritura”. Nessa Obra, afirma que a autoridade do rei é sagrada, pois emana de Deus. A partir dessa afirmação popularizou-se a ideia de que o rei é rei porque Deus quis e, se é da Vontade Divina, não deve haver nenhum tipo de discussão acerca do assunto porque seria, no mínimo, um pecado. (2011, p. 200). Essa ideia fez com que os demais homens acreditassem no soberano e acatassem suas ordens. No entanto, apenas o argumento de que o Rei era um representante de Deus não seria capaz de fazer com que a massa camponesa se submetesse as suas ordens por muito tempo. Os monarcas, por muitos atemorizados, ao perceberem que seus argumentos não poderiam durar muito tempo buscaram mecanismos para que pudessem controlar e coagir a população de forma que se submetessem ao governo do monarca. Para isso, se fez necessário que o nobre governante tivesse sob seu comando homens, cavalos e armas. Ou seja, um exército completo, para que ficasse à disposição do rei e que pudesse impor suas ordens a quem quer que fosse. Para exercer o poder, os séculos posteriores a esse início de centralização demonstraram que era necessário suprir várias necessidades da formação de
  • 13. 13 um Estado. Para a formação deste e seu efetivo controle era preciso obter uma força de coerção, para tanto fazia-se necessário ter exército próprio e permanente. (2011, p. 197-198). Entretanto, sabe-se que nada é de graça. Então, para que o rei pudesse obter todo seu exército, precisaria de dinheiro, diga-se, muito dinheiro. Por isso, o monarca começa a tributar os seus súditos, a fim de manter o exército e consequentemente a sua força coercitiva. É nesse sentido as palavras de Flávia Lages de Castro: Logo, primordial se tornou tributar os súditos de forma a conseguir ter um fluxo de dinheiro suficiente para essa força de coerção e para o pagamento de uma burocracia, já que, sem ela, ficava impossível tributar. (2011, p. 197- 198). Paradoxal se torna essa concepção, visto que os camponeses mantinham, por meio de pagamento de impostos, um exército que, na verdade, não estaria ali para defendê-los, mas sim, para reprimi-los quando se fizesse necessário, ao bel-prazer do monarca. O Absolutismo melhor se configurou na França mais precisamente no século XVII. Que também nas palavras de Flávia Lages de Castro “A França de Luiz XIV, que não somente firmou que o Estado era ele como entrou para História com ‘Humilde’ apelido de ‘Rei Sol’, já que tudo girava em torno dele.” (2011, p. 198). Mas, na verdade, o sistema absolutista, nas palavras do Professor Anderson Perry: Essencialmente, o absolutismo era apenas isto: um aparelho de dominação feudal recolocado e reforçado, destinado a sujeitar as massas camponesas à sua posição social tradicional (...) ele era a nova carapaça política de uma nobreza atemorizada. (2014, p. 18) Até poder-se-ia entabular o presente parágrafo nas primeiras linhas a serem escritas, pois o que fez com que alguns homens fossem superiores a outros? Quem lhes outorgou tal maestria sob os demais homens? Seria o próprio Deus? Mas o que de tão especial possuíam tais homens a ponto de terem o poder de sobrepor sua própria vontade aos seus semelhantes? Não aquele poder hereditário proveniente de um legado familiar consanguíneo, e sim aquele poder primário, no qual o homem mal conhecia o que era Estado ou Organizações. Por qual motivo os homens primitivos acreditaram que
  • 14. 14 existam homens superiores a si mesmos? Aqueles que ordenam valem mais do que aqueles que realizam? Essa resposta pode ser dada por Rousseau em seu artigo sobre a Origem da Desigualdade (1754, p. 91), que conseguiu demonstrar com maestria a origem do poder de uns homens sobre outros. In verbis: O primeiro que, tendo cercado um terreno, se lembrou de dizer: Isto é meu, e encontrou pessoas bastante simples para acreditá-lo, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não teriam poupado ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou tapando os buracos, tivesse gritado aos seus semelhantes: “Livrai- vos de escutar esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos, e a terra de ninguém!”. Parece, porém, que as coisas já tinham chegado ao ponto de não mais poder ficar como estavam: porque essa ideia de propriedade, dependendo muito de ideias anteriores que só puderam nascer sucessivamente, não se formou de repente no espírito humano: foi preciso fazer muitos progressos, adquirir muita indústria e luzes, transmiti-las e aumentá-las de idade em idade, antes de chegar a esse último termo do Estado de natureza. (1754, p. 91) O trecho de Rousseau acima facilmente demonstra como foi a primeira noção de poder do ser humano, que utilizando-se do que não era seu, para usurpar algo de quem não tinha quase nada, quiçá, absolutamente nada. Há não ser, é claro, o espírito de vida dado pelo próprio Deus. Explica o grande filósofo francês (1754, p. 136) no final de sua obra que: Os particulares voltam a ser iguais, porque nada são, e os súditos não tendo outra lei senão a vontade do seu senhor, nem o senhor outra regra senão as suas paixões, as noções do bem e os princípios da justiça desaparecem de ora em diante. (1754, p. 136) Em apertada síntese, buscou-se as linhas “supra”, demonstrar ao leitor de forma tímida, a noção do absolutismo que deveras forjou o caminho ao longo da história. De forma clara se percebe que o sistema absolutista, nutrido simplesmente pela vontade de uma pequena parcela da sociedade, não duraria muito tempo. Os sentimentos de esperança intrínsecos nos seres humanos sempre lhes proporcionavam criatividade para tentar buscar condições melhores de vida. Isso fez com que a ideia de igualdade entre os seres humanos se fixasse cada vez mais na mente dos cidadãos. Visto isso, assistiam “de camarote” as regalias franqueadas pela realeza aos seus pares em jantares com muita fartura, quiçá, desperdícios em gastos absurdos
  • 15. 15 com o dinheiro que arrecadava com taxas e impostos, enquanto a maioria sequer obtinha diariamente o básico para sua sobrevivência. Nesse diapasão, os pensadores da época (chamados de iluministas) começaram a se preocupar com coisas que antes se quer era levantado em discussão entre os cidadãos, por exemplo: Igualdade entre os homens e diante da lei, liberdade, cidadania, propriedade, tudo em busca de um bem coletivo. Como se pode notar, as ideias de mudanças e de revolução não sugiram de uma inspiração imediata, mas sim, de uma construção de ideias e pensamentos que trariam à luz aquilo que outrora estava encoberto. Nesse mesmo sentido são as palavras da professora Flávia Lages de Castro em uma de suas obras: “Esses homens iluministas não criaram suas ideias (muitas delas brilhantes) do nada. De fato, eles são herdeiros do Renascimento e, principalmente, da revolução científica do século XVII”. (2011, p. 204). Em suma, o Estado já não era tido como um “fim em si mesmo”, mas sim um “meio” para o qual estava direcionado ao benefício dos cidadãos. Impulsionados por esses pensamentos iluministas, rompe-se com o antigo regime Absolutista Monárquico para aderir a uma nova proposta, que fora difundida pelo iluminista Montesquieu, In verbis: Há, em cada Estado, três espécies de poderes: o poder legislativo, o poder executivo (...), e o executivo [Judiciário] das que dependem do direito civil. Pelo primeiro, o príncipe ou magistrado faz leis por certo tempo ou para sempre e corrige ou abroga as que são feitas. Pelo segundo, faz a paz ou a guerra, envia ou recebe embaixadas, estabelece a segurança, previne as invasões. Pelo terceiro, pune os crimes ou julga as querelas dos indivíduos. Chamaremos este último o poder de julgar e, o outro, simplesmente, o poder executivo do Estado. [...] Quando na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistratura o poder Legislativo está reunido ao poder Executivo, não existe liberdade, pois pode-se temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado apenas estabeleçam leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Não haverá também liberdade se o poder de julgar não estiver separados do poder legislativos e do executivo. Se estiver ligado ao poder Legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria legislador. Se estivesse ligado ao poder Executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor. (2000, p. 205-206.). Com a morte de Luiz XIV, sucede o trono Luiz XV (1715-1774) e em 10 de maio de 1774 foi proclamado rei da França Luis XVI.
  • 16. 16 No lapso temporal de seu reinado acontece os primeiros lampejos da Revolução Francesa impulsionada pelos pensamentos iluministas e consequentemente o fim do absolutismo. Com o início da Revolução Francesa, marcada principalmente pela queda da Bastilha em 14 de julho de 1789 - uma fortaleza parisiense que fora usada nos séculos XVII e XVIII como prisão – rompeu-se com o sistema absolutista e, inspirado pelas ideias do iluminismo, migrou-se para o “Estado Constitucional”. Nas preciosas palavras do Mestre Thiago Baldani Gomes de Fillipo, “com a ascensão da burguesia, que culminou com a queda da Bastilha (14.07.1789), o Estado Absoluto foi substituído pelo Estado Constitucional, deflagrando-se o constitucionalismo.” (2010, p. 13). O Constitucionalismo que, diga-se de passagem, foram vários, ainda que em passos deslizantes começa a retirar da mão de uma só pessoa o poder de gerir o Estado, conforme lhe aprouver, e começa a dar-lhe limitações por meio de uma constituição que trazia em si os direitos fundamentais, sociais e os vinculava à atuação do Estado para que promovesse o bem da coletividade, embasando-se, principalmente, nos direitos fundamentais, como por exemplo, “principio da igualdade”. O constitucionalismo liberal foi marcado pelo individualismo, proteção da propriedade privada, separação dos poderes, contenção do aparato estatal e valorização dos direitos humanos de primeira geração, sem alimentar, contudo, nenhuma pretensão em operar grandes transformações sociais. (...) Constituições dirigentes ou programáticas, que assimilaram direitos sociais e incorporaram programas de atuação governamental, compelindo o Estado a promover o bem-estar coletivo e a concretizar no plano material o princípio da igualdade. (PUCCINELLI JÚNIOR, 2012, p. 25) Finaliza-se, portanto, com o sistema absolutista, ingressando em um novo movimento de limitação do poder e valorização dos direitos e garantias estampadas no seio de uma constituição. 1.2 O CONSTITUCIONALISMO NORTE-AMERICANO O trecho de uma entrevista com um combatente da Guerra de Independência, citado por Flávia Lages de Castro, demonstra de forma clara a noção de
  • 17. 17 “revolução” que havia na mente de cada combatente que antecedeu a Revolução Americana. - Enfim, que houve? Qual foi a sua ideia quando decidiu lutar? - Jovem, a nossa ideia quando nos lançamos contra esses casacas-vermelhas era que nos governávamos a nós próprios e sempre achamos isso. Eles achavam que não tínhamos esse direito. (CASTRO. 2011, p. 228) Um Estado formado por uma metrópole e suas colônias, onde estas serviam para trazer lucros à metrópole, o que não duraria muito tempo. Algo teria que acontecer. E de fato, aconteceu. Deflagra-se, então, a revolução norte-americana. O rompimento dos laços coloniais efetuados pela Independência dos Estados Unidos da América do Norte foi um marco para todo o ocidente. Essa Ruptura marcaria profundamente o processo de fim do antigo Regime. (...) A formação do Estado norte-americano pode ser vista como diferenciada desde os primórdios da colonização das 13 colônias (maneira que era chamada a colônia inglesa na América). Mas não devemos considerar que essa diferença residia no fato de que a Inglaterra desejava fazer uma “colônia de povoamento” em oposição aos outros Estados colonizadores europeus que faziam “colônias de exploração”. Toda colônia existia, por definição, para dar lucros à metrópole, independentemente da maneira que esse lucro se realizaria. O ideal era que a colônia tivesse como produzir mercadoria complementares às mercadorias produzidas pela metrópole, assim ela poderia comprar da metrópole e vender para esta dentro do Pacto colonial, que obrigava a colônia a somente comercializar com sua metrópole, potencializando lucros. (CASTRO, 2011, p. 223) Entretanto, a última função a ser desempenhada pela colônia seria competir com a própria metrópole, e fora isso que ocorrera a partir do século XVIII, onde o comércio das 13 colônias se fortalece. A partir do século XVIII, o comércio das 13 colônias chegou a tal ponto que passou a concorrer com o comércio inglês e, indubitavelmente, era o último papel reservado a uma colônia. (CASTRO, 2011, p. 225) Por isso, a metrópole, utilizando-se de mecanismos de retaliação, fez com que a colônia retornasse ao seu status quo, ou seja, deveria continuar a ser apenas uma fonte de recursos para a metrópole. Começa-se, então, a tributar os produtos produzidos pelas colônias e além do mais, a Inglaterra havia saído de uma guerra com a França, conhecida como Guerra dos Sete Anos, que durou de 1756 a 1763, a qual mesmo saindo vitoriosa, teve enormes gastos com a guerra e então nada seria mais óbvio do que usurpar ainda mais das colônias para suprir tal déficit orçamentário.
  • 18. 18 Essa concorrência gerou atritos que engendraram uma necessidade, na metrópole, de colocar a colônia no seu devido lugar, ou seja, como economia subordinada, com vistas a dar lucros à metrópole. Além desses atritos, a Inglaterra havia saído de uma guerra com a França (a Guerra dos Sente Anos – 1756/1763) e, embora vitoriosa, teve enormes gastos com a campanha militar e desejava que a colônia contribuísse para cobrir esse problema orçamentário. Taxas foram aumentadas como a do açúcar (sugar Act de 1764) e a do selo (Stamp Act de 1765 – que exigia que todos os documentos fossem selados bem como jornais, baralhos etc. A renda obtida no pagamento desses selos iria para o governo inglês). Essas medidas, além de visarem cobrir despesas, eram também uma forma de retaliação contra os colonos que, na guerra dos Sete Anos, ajudaram os Franceses”. (CASTRO, 2011, p. 225) Feito isso, instalou-se um clima de tensão entre os ingleses e os colonos, que como resposta imediata a essa retaliação se reuniram e decidiram “boicotar o comércio inglês” e em tentativas frustradas a Inglaterra viu escapar pelos dedos o poder sobre as colônias. Instalado o caos político em 4 de julho de 1776, promulga-se a Declaração de Independência dos Estados Unidos. E então o que fazer para defendê-la? Como dar total efetividade a Declaração de Independência dos Estados Unidos? Necessariamente, urge-se a criação da Constituição dos Estados Unidos da América que fora promulgada em 1787. Tem-se, portanto, a deflagração do termo “constitucionalismo” na América, com a sua primeira constituição escrita, tendo como características um texto codificado, rígido e sintético. De acordo com o Professor José Luiz Quadros de Magalhães em seu artigo: De forma diferente do constitucionalismo inglês, nos Estados Unidos houve um poder constituinte originário que produziu em 1787 um texto codificado, rígido e sintético com aspecto essencialmente principiológico e inicialmente político, incorporando a declaração de direitos individuais fundamentais a partir da dez emendas que constituíram o Bill of Rights. O constitucionalismo estadunidense criou o sistema de governo presidencial, o federalismo, o controle difuso de constitucionalidade, mecanismo sofisticados de freios e contrapesos e uma Suprema Corte que protege a Constituição, sendo sua composição uma expressão do sistema controle entre os poderes separados. (2004) A partir daí, busca-se a limitação do poder e garantia de direitos dos cidadãos americanos, visto que, de acordo com a referida Constituição, TODOS OS HOMENS NASCEM LIVRES E IGUAIS EM DIREITO. Evidencia-se nos dizeres acima que o fato de se criar uma constituição escrita seria evidentemente a busca da igualdade entre os cidadãos, em que o Estado não
  • 19. 19 seria mais um fim em si mesmo, mas um meio capaz de buscar o bem estar de toda uma coletividade. O constitucionalismo norte americano muito contribuiu para que desencadeasse, em diversos países, a necessidade de rompimento com o Antigo Regime, buscando-se uma nova perspectiva acerca da interpretação das regras e princípios. Nesse sentido leciona o Professor José Luiz Quadros de Guimarães: A história constitucional norte-americana reforça a ideia de uma Constituição dinâmica, viva, que se reconstrói diariamente diante da complexidade das sociedades contemporâneas. Uma Constituição presente em cada momento da vida. Uma Constituição que é interpretação e não texto. A experiência norte-americana nos revela uma nova dimensão da jurisdição constitucional, presente em toda a manifestação do Direito. É tarefa do agente do Direito, nas suas mais diversas funções, dizer a Constituição no caso concreto e promover leituras constitucionalmente adequadas de todas as normas e fatos. A vida é interpretação, não há texto que não seja interpretado. A interpretação do mundo, dos fatos, das normas é inafastável. (2004) Portanto, se conclui que o constitucionalismo norte-americano muito contribuiu para a solidificação desta nova concepção em todo o mundo, transcendendo as suas conseqüências por toda a America, concretizando, assim, os avanços almejados por toda uma geração de homens, que permanece até hoje.
  • 20. 20 CAPÍTULO 2 VIAGENS DO CONSTITUCIONALISMO AO NEOCONSTITUCIONALISMO 2.1CONSTITUCIONALISMO MODERNO Das amarras da história antiga, tem-se o ponto de partida do Constitucionalismo, donde a sua ideia central poderia ser considerado como o movimento jurídico e político no intuito de se limitar o poder do Estado através da criação de uma constituição. A criação de uma constituição parecia ser a única saída, haja vista que com a queda do sistema monárquico em que o soberano ou o rei, independentemente se certo ou não, praticavam seus atos de governo guiados apenas pelo seu bel prazer, onde nada nem ninguém os impedia. Eles eram totalmente “irresponsáveis” pelos seus atos e suas atitudes eram vistas como “inspiradas por Deus”. Acreditava-se, ainda, que o soberano fosse representante de Deus aqui na terra. Por isso, lançaram mão desse novo sistema de governo inspirado pelas ideias da Revolução Francesa, no qual uma Lei Maior limitaria o poder estatal e regeria todos os seus atos, creditando aos cidadãos Direitos e Garantias outrora inexistentes. Todavia, há quem acredita que constitucionalismo ocorrera muito antes da própria Revolução Francesa, mais precisamente, na época do povo hebreu1 . Segundo Dirley da Cunha Júnior a criação ou surgimento do constitucionalismo ocorreu na Antiguidade Clássica. E, utilizando-se das palavras de Karl Loewenstein2 , infere-se melhor acerca da origem do constitucionalismo. A origem do constitucionalismo remonta à antiguidade Clássica, mais especificamente, segunda Karl Loewensteins, ao povo hebreu, de onde partiram as primeiras manifestações deste movimento constitucional em busca de uma organização política da comunidade fundada na limitação do poder absoluto. De fato, explica loewenstein que o regime teocrático dos hebreus se caracterizou fundamentalmente a partida da ideia de que o detentor do poder, longe de ostentar um poder absoluto e arbitrário, estava 1 O doutrinador Dirley da Cunha Júnior cita Karl Loewenstein se referindo a sua obra: Teoria de La Constitución, na qual atribui ao povo hebreu as primeiras manifestações do constitucionalismo. 2 Um filósofo nascido na Alemanha. Um dos pensadores mais significativos para o Constitucionalismo.
  • 21. 21 limitado pela lei do senhor, que submetia igualmente os governantes e governadores, radicando aí o modelo de constituição material daquele povo. (2011, p. 33) Daí se percebe que a Lei maior, a Constituição, que regia toda a sociedade era a Lei do Senhor. É no mínimo curioso analisar que retrocedemos, visto que se na época do povo hebreu (A.C.) já existia uma lei maior – uma constituição – que limitava e vinculava os governantes e governados. No período mais recente (D.C.) volta-se ao modelo monárquico e se exclui qualquer responsabilidade da pessoa do soberano e nada nem ninguém faz juízo de seus atos. Daí percebe-se que este modelo de sociedade não deveria prevalecer, então, voltamos a dar efetividade e importância a uma constituição. Entretanto, não se dedicará ao delineamento de todo o rastro histórico do constitucionalismo, mesmo porque não é este o objetivo do presente trabalho, mas importante se faz explanar as suas características mais marcantes, onde o núcleo de essência do constitucionalismo está na valorização da constituição escrita, que por meio dela pode-se limitar e controlar o poder do Estado bem como a inserção de ideias libertárias e direitos e garantias aos homens. Importante ressaltar que o constitucionalismo não se preocupava somente com a elaboração da constituição, pois nos dizeres do próprio doutrinador Dirley: não pregava o constitucionalismo, advirta-se, a elaboração de constituições, até porque, onde havia uma sociedade politicamente organizada já existia uma Constituição fixando-lhe os fundamentos de sua organização. Isso porque, em qualquer época e em qualquer lugar do mundo, havendo Estado, sempre houve e sempre haverá um complexo de normas fundamentais que dizem respeito com a sua estrutura, organização e atividade.” (2011, p. 33) O autor conclui, revelando o núcleo e o motivo do surgimento do constitucionalismo: O constitucionalismo se despontou no mundo como um movimento político e filosófico inspirado por ideias libertárias que reivindicou, desde seus primeiros passos, um modelo de organização política lastreada no respeito dos direitos dos governados e na limitação do poder dos governantes (2011, p. 33) Dito isto, acrescentamos que, historicamente, a “explosão” do constitucionalismo, inspirado pelas ideias dos iluministas, irradiou os seus efeitos para todo o mundo pela concepção da Constituição Norte-Americana de 1787 e pela
  • 22. 22 Constituição Francesa de 1791. As ideias iluministas da época reforçaram ainda mais a criação e consolidação do movimento constitucionalista. Como bem leciona Dirley: Após a Magna Carta inglesa o constitucionalismo deslanche em direção à modernidade, ganhando novos contornos. A partir daí são elaborados importantes documentos constitucionais (Petition of Rights, de 1628); Habeas Corpus Act, de 1679; Bill of Rights, de 1689, etc.), todos com vistas a realizar o discurso do movimento constitucionalista da época. No século XVIII, o constitucionalismo ganha significativo reforço com as ideias iluministas que serviram de combustível para as revoluções liberais (2011, p. 7 e 8) E conclui os dizeres sobre o Constitucionalismo dizendo: Enfim, o constitucionalismo moderno legitimou o aparecimento da chamada constituição moderna, entendida como “a ordenação sistemática e racional da comunidade política através de um documento escrito no qual se declaram as liberdade e os direitos e se fixam os limites do poder políticos [...] O constitucionalismo moderno, portanto, deve ser visto como uma aspiração a uma Constituição escrita, que assegurasse a separação de Poderes e os direitos fundamentais, como modo de se opor ao poder absoluto, próprio das primeiras formas de Estado. Não é por acaso que as primeiras Constituições do mundo tratam de oferecer resposta ao esquema do poder absoluto do monarca, submetendo-o ao controle do parlamento. (2011, p. 8 e 9) Neste processo de “reconstitucionalização” (diz-se isto pelo motivo da humanidade já ter experimentado os sabores do constitucionalismo na época do povo hebreu, como bem se descreveu acima), buscou-se a aproximação da lei e da moral, do direito e da filosofia, em virtude do fracasso Liberalismo e posteriormente do positivismo, associados ao Fascismo ocorrido na Itália e do genocídio praticado pelo Nazismo na Alemanha. Essa aproximação poder-se-á considerá-la como uma das mudanças que ocorreram na antiga forma de se interpretar a constituição, quando não se acha toda a solução na norma escrita e que, invariavelmente, o que ocorre com bastante frequência. Nesta mesma senda, o doutrinador e Ministro do STF Luis Roberto Barroso elencou algumas mudanças que acabaram por embalar a interpretação constitucional tradicional, tema que será esmiuçado nas próximas páginas. Permitir-nos-emos reservar o direito, nas linhas que se seguem, de elencar ideias de alguns autores sobre o constitucionalismo sob a justificativa de aprimoramento
  • 23. 23 de conhecimentos e até mesmo o sentimento de curiosidade que, provavelmente, rodeará os leitores. Para o doutrinador Pedro Lenza, o movimento denominado como constitucionalismo, no que tange ao seu momento histórico, se deu na antiguidade, onde os documentos e as características marcantes são a “Lei do Senhor” do povo hebreu. Na idade Média, temos este marco com a Magna Carta de 1215. Na idade Moderna temos os “pactos e forais ou cartas de franquias (exemplos: Petition of Rights de 1628; Habeas Corpus Act de 1679; Bill of Rights de 1689; Act of Settlement de 1701). E já, no Constitucionalismo Moderno, temos a Constituição Norte- Americana de 1787 e a Constituição Francesa de 1791. O Mestre conclui dizendo que “o constitucionalismo moderno representará uma técnica específica de limitação do poder com fins garantísticos” e ainda se utiliza das palavras de Kildare Gonçalves Carvalho “em termo jurídico, reporta-se a um sistema normativo, enfeixado na constituição, e que se encontra acima dos detentores do poder.” Acrescenta ainda uma perspectiva sociológica do Constitucionalismo: “Representa um movimento social que dá sustentação à limitação do poder, inviabilizando que os governantes possam fazer prevalecer seus interesses e regras na condução do Estado.” (2013, p. 58) Não se poderia traçar palavras sobre constitucionalismo sem mencionar as palavras do Professor Jorge Miranda, o qual leciona: “O Constitucionalismo – que não pode ser compreendido senão integrado com as grandes correntes filosóficas, ideológicas e sociais dos séculos XVIII e XIX – traduz exactamente certa ideia de Direito, a ideia de Direito liberal.” (2000, p. 17) Ainda acrescenta palavras sobre a importância da divisão dos poderes suscitada por Montesquieu em sua obra “Do Espírito das Leis”: Em vez de os indivíduos estarem à mercê do soberano, eles agora possuem direitos contra ele, imprescritíveis e invioláveis. Em vez de um órgão único, o Rei, passa a haver outros órgãos, tais como Assembleia ou Parlamento, Ministros e Tribunais independentes – para que, como preconiza Montesquieu, o poder limite o poder. Daí a necessidade duma Constituição desenvolvida e complexa: pois quando o poder é mero atributo do Rei e os indivíduos não são cidadãos, mas sim súbditos, não há grande necessidade de estabelecer um pormenor regras do poder; mas, quando o poder é decomposto em várias funções apelidadas de poderes do Estado, então é
  • 24. 24 mister estabelecer certas regras para dizer quais são os órgãos a que competem essas funções, quais são as relações entre esses órgãos, qual o regime dos titulares dos órgãos, etc.” (2000, p.17) E finaliza sua contribuição delineando sobre a importância de uma constituição, na qual a maioria dos doutrinadores concorda ser um meio de limitar o poder do Estado e salvaguardar direitos e garantias dos indivíduos: “A ideia de Constituição é de uma garantia e, ainda mais, de uma direcção da garantia. Para o constitucionalismo, o fim está na protecção que se conquista em favor dos indivíduos, dos homens cidadãos, e a Constituição não passa de um meio para o atingir. O Estado Constitucional é o que entrega à Constituição o prosseguir a salvaguardar da liberdade e dos direitos dos cidadãos, depositando as virtualidades de melhoramento na observância dos seus preceitos, por ela ser a primeira garantia desses direitos.” (2000, p. 18) Desarrazoado seria se se terminasse estas delineações sobre o constitucionalismo sem mencionarmos as palavras do Ministro Luis Roberto Barroso em seu livro INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO. O constitucionalismo chega vitorioso ao início do milênio, consagrado pelas revoluções liberais e após haver disputado com inúmeras outras propostas alternativas de construção de uma sociedade justa e de um Estado democrático. (2009, p. 312) Esclarece sobre os motivos do sucesso do constitucionalismo moderno: A razão de seu sucesso está em ter conseguido oferecer ou, ao menos, incluir no imaginário das pessoas: (i) legitimidade – soberania popular na formação da vontade nacional, por meio do poder constituinte; (ii) limitação do poder – repartição de competências, processos adequados de tomada de decisão, respeitos aos direitos individuais, inclusive das minorias; (iii) valores – incorporação à Constituição material das conquistas sociais, políticas e éticas acumuladas no patrimônio da humanidade (2009, p. 312 e 313) E conclui seus dizeres de forma a demonstrar as consequências positivas que se tem com o Constitucionalismo moderno: O constitucionalismo promove, assim, uma volta aos valores, uma reaproximação entre ética e Direito. Para poderem beneficiar-se do amplo instrumento do Direito, migrando da filosofia para o mundo jurídico, esses valores compartilhados por toda a comunidade, em dado momento e lugar, materializam-se em princípios, que passa a estar abrigados na Constituição, explicita ou implicitamente. (2009, p. 328)
  • 25. 25 Destarte, percebe-se que o estado em que se encontra nação brasileira, ainda que prematuramente, deve ser celebrado, haja vista recebermos de herança das gerações passadas um Estado Democrático de Direito, e não somente um Estado de Direito. Entretanto, importante se ressaltar que os reflexos do Constitucionalismo só se deram no Brasil com a promulgação da Constituição de 1988, quebrando-se com o antigo sistema autoritário militar e presenteando o Brasil com um período de estabilidade jurídica nunca vista antes, como bem reforça Luis Roberto Barroso: No caso brasileiro, o renascimento do direito constitucional se deu, igualmente, no ambiente de reconstitucionalização do país, por ocasião da discussão prévia, convocação, elaboração e promulgação da Constituição de 1988. Sem embargo de vicissitudes de maior ou menor gravidade no seu texto, e da compulsão com que tem sido emendada ao longo dos anos, a Constituição foi capaz de promover, de maneira bem sucedida, a travessia do Estado brasileiro de um regime autoritário, intolerante e, por vezes, violento para um Estado democrático de direito. Mais que isso: a Carta de 1988 tem propiciado o mais longo período de estabilidade institucional da história republicana do país. E não foram tempos banais. Ao longo da sua vigência, destituiu-se por impeachment um Presidente da República, houve um grave escândalo envolvendo a Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados, foram afastados Senadores importantes no esquema de poder da República, foi eleito um Presidente de oposição e do Partido dos Trabalhadores, surgiram denúncias estridentes envolvendo esquemas de financiamento eleitoral e de vantagens para parlamentares, em meio a outros episódios. Em nenhum desses eventos houve a cogitação de qualquer solução que não fosse o respeito à legalidade constitucional. Nessa matéria, percorremos em pouco tempo todos os ciclos do atraso. (2013, p. 4) O sentimento de mudanças e melhoras insculpido nos homens não foi capaz de se contentar somente com o que o Constitucionalismo poderia oferecer-lhes. A efetividade das normas programáticas e a simples execução de direitos entabulados na constituição não se tornaram o bastante. Queríamos mais! Constatou-se, então, a necessidade de um movimento que conseguisse extrair da constituição escrita tudo aquilo que ela pudesse oferecer aos cidadãos. A antiga política de “pão e circo” já não mais sustentava o estômago daqueles que tinham fome por direitos de liberdade, da igualdade, da livre expressão e tantos outros explícitos e implícitos na Constituição. Assim foi a frase utilizada pela banda Titãs3 em uma de suas canções: “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”. 3 Banda de rock brasileira, tendo como nome inicial “Titãs do iê-iê”, e posteriormente conhecida como “Titãs”.
  • 26. 26 Essa frase expressa muito bem a necessidade de melhoras que a sociedade sempre buscou. Já não se quer somente o suficiente para se sobreviver, busca-se “VIVER” de forma digna, embasado pelo princípio da dignidade da pessoa humana. Portanto, um sistema de interpretação de normas no qual se enquadra o caso concreto na norma já não é mais suficiente, pois a sociedade se desenvolve e a lei, por si só, não consegue prever todas as possibilidades existentes de controvérsias na sociedade. A interpretação constitucional tradicional já não mais era suficiente para suprir os anseios desta sociedade, pois é uma modalidade de interpretação jurídica em que a norma deveria trazer no seu relato abstrato, a solução favorável e esperada para os problemas jurídicos. Neste modelo, os fatos existiam para serem enquadrados à norma, permitindo o silogismo que, outrora, resolveria os problemas sociais. Por isso, nesse ambiente, a solução dos problemas jurídicos não se encontra integralmente na norma. Então, surge uma nova concepção intitulada como “Neoconstitucionalismo”. 2.2 NEOCONSTITUCIONALISMO – UMA VISÃO RECENTE E EFICAZ Consegue-se, nas palavras do Advogado e professor André Puccinelli Júnior, conceituar o neoconstitucionalismo. O neoconstitucionalismo, nasceu assim com a missão de edificar um Estado Constitucional de Direito ou, para alguns, um Estado Democrático e Social de Direito, que seja tributário da justiça distributiva e favoreça a positivação e concretização de Direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, contemple o modelo normativo axiológico, absorva uma nova postura hermenêutica voltada à legitimação das aspirações sociais e reconheça a força normativa da Constituição, dando vazão à supremacia, imperatividade e efetividade de suas normas. (2012, p. 27) Acredita-se que o neoconstitucionalismo é bastante diverso no que tange aos seus defensores. Nesse sentido, Daniel Sarmento diz “ser composto por positivistas e não-positivistas, defensores da necessidade do uso do método na aplicação do Direito e ferrenhos opositores do emprego de qualquer metodologia na hermenêutica jurídica, adeptos do liberalismo político, comunitaristas e procedimentalistas” (2013, p.3).
  • 27. 27 O “neoconstitucionalismo” é um assunto recente para os juristas brasileiros, visto que seus reflexos só repercutiram em nossa Constituição de 1988 e este conceito já fora formulado, sobretudo na Itália e Espanha, respectivamente em 1947 e 1978. Para o doutrinador Pedro Lenza, Neoconstitucionalismo busca não apenas atrelar o constitucionalismo a ideia de limitação do poder político, mas, acima de tudo, a eficácia da constituição, deixando o texto de ter um caráter meramente retórico, passando a ser mais efetivo na concretização dos direitos fundamentais. (Lenza, 2011, p. 59) Elencando ainda que “a partir do momento em que os valores são constitucionalizados, o grande desafio do neoconstitucionalismo passa a ser encontrar mecanismos para sua efetiva concretização” (2011, p. 61). Por isso, podemos dizer que, no sistema do “neoconstitucionalismo”, os direitos já entabulados na Constituição Federal de 1988 vêm carregados de um conteúdo axiológico devendo (ao menos em tese) ter uma aplicação imediata. Entretanto, não é o que se percebe na prática, pois a nação brasileira caminha em passos lentos para trazer a realidade de seus cidadãos esses direitos já adquiridos ao longo de nossa “democratização”. Posto que a supremacia e efetividade de nossa constituição não surge com sua simples promulgação. Neste sentido o brilhante ministro Gilmar Mendes relata: O valor normativo supremo da Constituição não surge, bem se vê, de pronto, como uma verdade autoevidente, mas é resultado de reflexões propiciadas pelo desenvolvimento da História e pelo empenho em aperfeiçoar os meios de controle do poder, em prol do aprimoramento dos suportes da convivência social e política. Hoje, é possível falar em um momento de constitucionalismo que se caracteriza pela superação da supremacia do Parlamento. O instante atual é marcado pela superioridade da Constituição, a que se subordinam todos os poderes por ela constituídos, garantida por mecanismos jurisdicionais de controle de constitucionalidade (2011, p. 61). Um compilado de ideias de KONRAD HESSE, intitulado como “DIE NORMATIVE KRAFT DER VERFASSUNG” e traduzido pelo ministro Gilmar Ferreira Mendes como “A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO”, faz uma importante revelação sobre a força normativa de uma constituição: Em 16 de abril de 1862, Ferdinand Lassalle proferiu, numa associação liberal-progressita de Berlim, sua conferência sobre a essência da constituição (Uber das Verfassungswesen). Segundo sua tese fundamenta, questões constitucionais não são questões jurídica, mas sim questões
  • 28. 28 políticas. É que a Constituição de uma país expressa as relações de poder nele dominantes: o poder militar, representado pelas Forças Armadas, o poder social, representado pelos latifundiários, o poder econômico, representado pela grande indústria e pelo grande capital, e, finalmente, ainda que não se equipare ao significado dos demais, o poder intelectual, representado pela consciência e pela cultura gerais. As relações fáticas resultantes da conjugação desses fatores constituem a força ativa determinante das leis e das instituições da sociedade, fazendo com que estas expressem, tão-somente, a correlação de forças que resulta dos fatores reais de poder; esses fatores reais do poder formam a Constituição real do país. Esse documento chamado Constituição – a Constituição jurídica – não passa, nas palavras de Lassale, de uma pedaço de papel. (2002, p. 45) Com essas palavras acima elencadas, poderíamos chegar a refletir, e, com facilidade, poderíamos perceber que ainda estamos em um processo lento de reconhecimento de força normativa da constituição no sentido de concretizar direitos e garantias fundamentais a todos os cidadãos, por conta da divisão social e cultural destes próprios cidadãos. Separando-se aquilo que é moral daquilo que é legal, posto que buscam simplesmente interesses pessoais e grupais em detrimento de um desenvolvimento justo e igualitário para todos. Acrescenta ainda que: Assim, o Direito Constitucional não estaria a serviço de uma ordem estatal justa, cumprindo-lhe tão-mente a miserável função – indigna de qualquer ciência – de justificar as relações de poder dominantes. Se a Ciência da Constituição adota essa tese e passa a admitir a Constituição real como decisiva, tem-se a sua descaracterização como ciência normativa, operando- se a sua conversão numa simples ciência do ser. (2002, p. 47) Por isso, a normatividade da Constituição deve ser pautada em uma força própria, motivadora e ordenadora da vida do Estado buscando sempre o entrelaçamento da norma posta com a moral e a justiça, bem como demais ciências capazes de moldar a constituição a uma real garantia de direitos dos cidadãos. Portanto, a resposta para os problemas não se encontram exclusivamente na norma posta e entabulada, devendo-se jungir a norma aos princípios jurídicos e a outros conceitos e até mesmo a outras ciências. O Ministro Luiz Roberto Barroso, em seu livro “O NOVO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO”, oferece sua contribuição ao dizer: Nesse ambiente em que a solução dos problemas jurídicos não se encontra integralmente na norma jurídica, surge uma cultura jurídica pós-positivista. De fato, se a resposta para os problemas não pode ser encontrada de maneira completa no comando que esse encontra na legislação, é preciso procurá-la
  • 29. 29 em outro lugar. E, assim, supera-se a separação profunda que o positivismo jurídico havia imposto entre o Direito e a Moral, entre o Direito e outros domínios do conhecimento. Para achar a resposta que a norma não fornece, o Direito precisa se aproximar da filosofia moral – em busca da justiça e de outro valores -, da filosofia política – em busca de legitimidade democrática e da realização de fins públicos que promovam o bem comum e, de certa forma, também das ciências sociais aplicadas, como economia, psicologia e sociologia. O pós-positivismo não retira a importância da lei, mas parte do pressuposto de que o Direito não cabe integralmente na norma jurídica e, mais que isso, que a justiça pode estar além dela. (2013, p. 64) Interligando-se a interpretação jurídica à outras ciências de estudo, poder- se-ia desencadear uma gama tão complexa de interpretações de soluções que ao fim não resultariam em nada, senão em inúmeras posições e justificativas que no fim não levariam a nenhuma solução concreta, por este motivo, deve-se realizar toda e qualquer interpretação jurídica tendo como trilhos norteadores a Constituição, seus valores e princípios. Em dias anteriores a aceitação da concepção neoconstitucionalista não se dava a devida importância aos fundamentos principiológicos, que, por sua vez, se mostram cada vez mais atuantes no ordenamento jurídico pátrio. E é nessa esteira que floresceu no ordenamento jurídico brasileiro a necessidade de se enxergar o direito de uma nova ótica em especial da Constituição Federal. Uma ótica que se utiliza das lentes chamadas “neoconstitucionalismo” que, por sua vez difere do constitucionalismo, do qual se tinha como alicerce a limitação ao poder autoritário, e, no neoconstitucionalismo ou constitucionalismo pós-moderno, ou, ainda, pós-positivismo, tem como pilares essenciais a concretização das regras e prevalência dos direitos fundamentais, bem como a normatividade dos princípios, entabulados ou não na constituição. Diz-se entabulados ou não pelo fato de que se um direito fundamental ou um princípio, não estiver descrito de forma explícita na norma constitucional, ainda assim, este deverá ser concretizado a favor dos cidadãos. Nessa mesma senda, o doutrinador Kildare Gonçalves apud Pedro Lenza, diz: “O caráter ideológico do constitucionalismo moderno era apenas o de limitar o poder, o caráter ideológico do neoconstitucionalismo é o de concretizar os direitos fundamentais”. (2011. p. 59) Com o fracasso da concepção puramente “Constitucional”, posto que ela limitava-se tão somente a estabelecer normas sobre a organização do Estado e limitação do poder, urgiu-se a necessidade desta nova concepção neoconstitucional, relacionando
  • 30. 30 a norma ao Direito. Isso se deve por conta dos acontecimentos que abismaram toda a humanidade, fruto da maior barbárie de todos os tempos, com o genocídio cometido pelo Governo Socialista Alemão o que resultou em um holocausto que exterminou milhões de judeus. Uma luz então se ascendeu! Não basta estar legalizado. Além de ser legal, tem de ser moral. Nestes mesmos trilhos caminha o Doutrinador Dirley da Cunha Júnior: Um novo pensamento constitucional voltado a reconhecer a supremacia material e axiológica da Constituição, cujo conteúdo, dotado de força normativa e expansiva, passou a condicionar a validade e a compreensão de todo o Direito e a estabelecer deveres de atuação para os órgãos de direção política. Esse pensamento, que recebeu a sugestiva denominação de neoconstitucionalismo, proporcionou o florescimento de um novo paradigma jurídico: o Estado Constitucional de Direito. Isso se deveu notadamente em razão do fracasso do Estado Legislativo de Direito, no âmbito do qual o mundo, pasmado, testemunhou uma das maiores barbáries de todos os tempos, com o genocídio cometido pelo governo nacional socialista alemão provocando o holocausto que exterminou milhões de judeus, pelos nazistas, entre 1939 e 1945, nos países ocupados pelas tropas do Reich Hitlerista. Com efeito, até a Segunda Grande Guerra Mundial, a teoria jurídica vivia sob a influência do Estado Legislativo de Direito, onde a Lei e o Princípio da Legalidade eram as únicas fontes de legitimação do Direito, na medida em que uma norma jurídica era válida não por ser justa, mas sim, exclusivamente por haver sido posta por uma autoridade dotada de competência normativa. (2011, p. 46) Por isso, para os já citados doutrinadores, o neoconstitucionalismo, antes de tudo, está para o fim de garantir aos cidadãos de que a constituição pátria seja reconhecida tanto no aspecto material quanto axiológico, visando à valorização da dignidade da pessoa humana e da promoção dos direitos fundamentais e sociais dos cidadãos, enaltecendo, ainda, o reconhecimento de força normativa dos princípios. A ideia de se concretizar direitos fundamentais do homem não é mero pressuposto da norma escrita, visto que a legislação, por mais completa que seja, nunca conseguirá abarcar todos os anseios da sociedade atual, que se mostra cada vez mais complexa. Por isso, se faz necessário a junção entre Direito e a Moral, em busca do bem comum. Pois como bem explana Luiz Roberto Barroso: “O pós-positivismo não retira a importância da lei, mas parte do pressuposto de que o Direito não mais cabe integralmente na norma jurídica e, mais que isso, que a justiça pode estar além dela.” (2013, p. 35)
  • 31. 31 Assim, floresce a ideia do neoconstitucionalismo que, através da interpretação da norma jurídica, não visa mais a mera aplicação do caso concreto à legislação e sim uma análise de princípios jurídicos com o fito de complementar aquilo que a norma, por si só, não consegue: o deslinde das controvérsias humanas. De parte isso, é válido anotar a distinção entre princípios e regras, haja vista existir um consenso entre a doutrina geral de que princípios e regras (na visão neoconstitucionalista) possuem o status de norma jurídica. Ambos são integrantes, sem hierarquia, do sistema referencial do intérprete. Os princípios trazem em si um conteúdo axiológico, e destacam-se como normas que identificam valores a serem preservados ou fins a serem alcançados. As regras e normas, por sua vez, restringem-se a traçar uma conduta. Elas disciplinam uma determinada situação, quando ocorre e quando tem incidência. Para as regras, vale a lógica do “tudo ou nada”. Sendo possível assinalar que princípios são pautas genéricas, não aplicáveis à maneira do “tudo ou nada”, são valorativos ou finalísticos, e as regras são descritivas de conduta. Não se pode dizer, entretanto, que, no neoconstitucionalismo, cabe-se a ideia de pormenorizar a lei em prol de princípios. A importância da lei não é retirada, apenas passa-se a uma análise de que a justiça pode estar além dela. Tem-se a ideia de que a solução para os problemas da sociedade não se encontram inteiramente nas leis, sendo necessário que tanto as regras quanto os princípios caminhem de mãos dadas com o objetivo de trazer solução às controvérsias sociais. Jamais se deve pormenorizar a lei em prol dos princípios, mas deve-se enaltecer o papel dos princípios quando as leis não conseguem, por si só, solucionar os conflitos sociais. Então, poder-se-ia considerar que tantos os princípios quanto as leis estão em um mesmo “pé de igualdade”. De forma mais ousada, pode-se dizer que os princípios em relação as normas constitucionais estão também na mesma linha hierárquica. Com isso, conclui-se que tanto as leis quanto os princípios devem ser considerados em uma mesma linha hierárquica, pois somente com a lei não se chegaria
  • 32. 32 a uma solução mais justa, muito menos caso se aplicassem apenas os princípios. Ambos devem caminhar em um mesmo patamar de igualdade, onde um só se completa com o outro. Alegremo-nos, pois isso ocorre diariamente em nosso cotidiano, posto que os reflexos do neoconstitucionalismo interfere cada vez mais nos julgamentos da maior Corte Judiciária do País – Supremo Tribunal Federal – que se utiliza, muita das vezes, de princípios que trazem em si uma carga axiológica para a interpretação e aplicação das leis vigentes em nosso país. A título de exemplo, suponha que algum presidente do nosso país, que já tenha se candidatado a uma reeleição, queira concorrer a um terceiro mandato. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo XIV, §5º, é clara em aduzir que o Presidente da República somente pode se candidatar a 01 (uma) reeleição. Neste caso concreto, a Justiça Eleitoral teria indeferido o registro de candidatura, por simples e singela aplicação de uma norma expressa. Mas nem sempre as situações abrangem temas tão simples e sucintos. Evolutivamente, ao longo do século XX, consolidou-se a convicção de que o Direito, em uma grande quantidade de situações, não possui soluções pré-prontas. Tais soluções devem ser construídas pelo intérprete – que anteriormente apenas identificava a norma aplicável ao caso concreto – argumentativamente com recursos e elementos externos ao sistema normativo. Portanto, neste novo ambiente, mudam o papel dos fatos, da norma e principalmente do intérprete. Incorpora-se um novo meio de lidar com situações mais complexas, entre elas, a normatividade dos princípios, o choque de normas constitucionais, a ponderação e a argumentação jurídica. O autor Luís Roberto Barros (2013, p. 38) nos apresenta de forma simples e completa, uma explanação em um caso concreto, bem diferente do exemplo citado. No caso citado abaixo, não se conseguirá resolver o problema com o simples enquadramento da norma ao fato. O cantor Roberto Carlos foi a juízo para impedir a divulgação de uma biografia não autorizada, invocando os seus direitos constitucionais de imagem e de privacidade. O autor da obra defendeu-se fundado na sua liberdade de expressão e no direito de informação, igualmente protegidos constitucionalmente. Naturalmente, como os dois lados têm normas constitucionais a seu favor, não é possível resolver esse problema mediante subsunção dos fatos à norma aplicável, porque mais de uma postula a incidência sobre a hipótese. Diante disso, a solução terá de ser construída
  • 33. 33 argumentativamente mediante ponderação, isto é, valoração de elementos do caso concreto com vistas à produção da solução que melhor atenda ao caso concreto. (2013, p. 38) Todo o acima exposto potencializa a importância do debate acerca do avanço do direito constitucional. As premissas de interpretação tradicional, notadamente, deixaram de ser integralmente satisfatórias. De parte disso, passou a ser percebido como um fato natural a existência de colisões de normas constitucionais, tanto de princípios, como de direitos fundamentais. O intérprete, portanto, passa a atuar como coparticipante do processo de criação do direito, ao fazer valorações de sentido para as cláusulas abertas, realizando a definição concreta entre escolhas possíveis. Os princípios contêm uma maior carga valorativa, uma decisão política relevante, um fundamente ético. O que acontece em uma ordem pluralista é a existência de princípios que abrigam decisões, valores ou fundamentos diversos, por vezes contrapostos. A colisão entre princípios ou entre normas ou entre princípios e normas é possível, e ainda, faz parte lógica do sistema. E é neste ponto que o intérprete da norma deve tomar cuidado. À vista dos elementos do caso concreto, o intérprete se defrontará com antagonismos inevitáveis. O conhecimento principiológico deve partir de uma dimensão de peso ou importância. A partir de determinado ponto da análise principiológica da realidade que se quer determinar, surge um espaço de indeterminação, no qual a determinação do conteúdo aplicável estará sujeita à concepção ideológica ou filosófica do intérprete. De alguma forma, todos esses elementos devem ser considerados na medida de sua importância e pertinência de modo que a solução final, a partir da identificação das normas aplicáveis e compreensão dos fatos relevantes, sejam ponderadas. E é aí que entra em ação a técnica da ponderação. Como já assinalado anteriormente, os princípios podem ser aplicados com maior ou menos intensidade à vista de circunstâncias jurídicas ou fáticas, sem que isso afete sua validade. Nesta técnica, os diferentes grupos de normas e a repercussão dos fatos do caso concreto estarão sendo analisado de forma conjunta, a fim de apurar os pesos que devem ser atribuídos aos diversos elementos em disputa, e por tal fato, o conjunto de normas que deve preponderar sobre o caso.
  • 34. 34 Posto isso, o próximo passo é decidir qual a é intensidade desse grupo de normas e se deve prevalecer em detrimento dos demais. Ou seja, a partir da gradução da intensidade da solução escolhida, é necessário, ainda, escolher qual deve ser o grau apropriado em que a solução deve ser aplicada. Por isso todo o contexto deste processo intelectual está pautado no princípio instrumental da proporcionalidade ou razoabilidade. Conclui-se, portanto, que o intérprete da norma se utilizará destes métodos da seguinte forma: I – identificando as normas pertinentes à serem aplicadas ao caso; II – Seleção dos fatos relevantes e atribuição geral de pesos; III – a produção de uma conclusão. A solução passa a ser construída argumentativamente, mediante a técnica da ponderação, como sendo a valoração de elementos do caso concreto, com vistas à produção da solução que melhor atende a demanda. Por isso podemos dizer que todos os valores compartilhados pela comunidade como um todo, em dado momento e lugar, materializam-se em princípios, que passam a ser abrigados pela Constituição, explicita ou implicitamente, devendo ser respeitados como se norma fosse. Mesmo não tendo passado por um processo formal de elaboração, tais valores (leia-se princípios) devem ser respeitados, visto que a norma antes de tudo é criada no seio da comunidade, para somente então passar fazer parte de um codex formalizado. Portanto o neoconstitucionalismo não está para, simplesmente, a existência de princípios e sim no seu reconhecimento pela ordem jurídica.
  • 35. 35 CAPÍTULO 3 APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO EM CASOS CONCRETOS 3.1 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: DIREITO AO ESQUECIMENTO Muito se fala em neoconstitucionalismo e nos benefícios que trouxe a nossa nova concepção de Estado Democrático de Direito, mas como entender algo tão utópico? Até as presentes linhas traçadas, poderá o leitor não ter a total noção de como se aplicar ou mesmo “manusear” o presente instituto, por isso traçaremos às linhas vindouras a aplicação do neoconstitucionalismo a casos práticos e como essa nova concepção influenciou a decisão dos mesmos. Iniciar-se-á, portanto, traçando uma relação entre a visão neoconstitucional e o direito ao esquecimento, que por sinal se mostra um tema em ascensão não só no ordenamento jurídico brasileiro, mas sim em todo mundo, saltando as linhas fronteiriças e se interligando, como se o direito fosse – o que é verdade – um só no mundo todo. Se os movimentos revolucionários com muita dificuldade conseguiram entabular em uma constituição os direitos de cada cidadão, como conceber a ideia de julgar um caso concreto sem se embasar inteiramente na Constituição? Como entender isso? Sendo que buscou-se a preço de sangue a normatização de direitos e depois vem o julgador e aplica bases principiológicas para julgar um caso concreto? Não seria um retrocesso? Onde estaria a segurança jurídica? Se antes a grande preocupação era garantir a efetivação dos direitos cravados em uma constituição, hoje não mais se vê por esta ótica. Pois o genocídio ocorrido em 1939 e 1945 estava totalmente de acordo com a lei, notadamente, no governo nacional socialista alemão que exterminou quase toda uma raça de judeus. Nota-se então que poderia ocorrer um sistema absolutista maquiado de democracia, já que o governante poderia impor suas vontades em uma constituição e assim satisfazer os seus anseios com o pretexto de estar cumprindo a lei. Nas palavras do doutrinador Dirley Cunha Júnior: Esse pensamento, que recebeu a sugestiva denominação de neoconstitucionalismo, proporcionou o florescimento de um novo paradigma jurídico: o Estado Constitucional de Direito. Isso se deveu notadamente em
  • 36. 36 razão do fracasso do Estado Legislativo de Direito, no âmbito do qual o mundo, pasmado, testemunhou uma das maiores barbáries de todos os tempos, com o genocídio cometido pelo governo nacional socialista alemão provocando o holocausto que exterminou milhões de judeus, pelos nazistas, entre 1939 e 1945, nos países ocupados pelas tropas Reich Hitlerista. (2011, p. 40) O direito ao esquecimento, em apertada síntese, seria o direito que uma determinada pessoa possui de fazer com que fatos ocorridos em sua vida, mesmo que verdadeiros, não sejam publicados ou expostos a outras pessoas, causando assim transtornos e/ou sofrimento a essa pessoa. Como exemplo, destaca-se o clássico caso “Lebach” que fora julgado pelo Tribunal Constitucional Alemão. A história acontece na cidade de Lebach, onde 4 soldados alemães foram assassinados e após os deslinde do processo 3 réus foram condenados, sendo que 2 foram condenados à prisão perpétua e o terceiro a seis anos de reclusão. O terceiro réu cumpriu integralmente sua pena e quando estava prestes a deixar a prisão ficou sabendo que uma emissora de TV iria exibir um programa sobre o crime ocorrido, mostrando fotos dos condenados e insinuando que estes eram homossexuais. Diante disso, ele ingressou com uma ação inibitória para impedir a exibição do programa. A discussão chegou ao Tribunal Constitucional Alemão que julgou procedente a ação, sustentando que o direito à personalidade ou mesmo a intimidade não admite que a imprensa explore o criminoso e sua vida por tempo ilimitado. Notando-se assim que o princípio da proteção da personalidade deveria prevalecer sobre à liberdade de informação, uma vez que não haveria mais interesse atual naquela informação, posto que o crime já estava solucionado e julgado há anos. A emissora não teria direito de apenas reproduzir suas notícias já publicadas há alguns anos? O réu teria o direito de que não mais publicassem notícias sobre seus atos já praticados? Tendo em vista que no movimento Neoconstitucional, a constituição não tem apenas uma carga descritiva, mas sim axiológica, buscando a concretização de seus valores e a garantia de condições dignas mínimas de cada cidadão, devendo-se, então, imprimir em cada caso concreto os valores consubstanciados na Constituição. Por isso, ao se contrapor o direito à liberdade de informação e o da intimidade ou privacidade, por exemplo, devem-se resguardar as condições de
  • 37. 37 dignidade e dos direitos ao menos nos patamares mínimos. E é nesse sentido que explana o doutrinador Pedro Lenza: Conforme anotou Barcellos, completando, do ponto de vista material, destaca-se um outro elemento na ideia de constitucionalismo: “(ii) a expansão de conflitos específicos e gerais entre as opções normativas e filosóficas existentes dentro do próprio sistema constitucional”. Sem dúvida, os valores constitucionalizados poderão entrar em choque, seja de modo específico (por exemplo, a liberdade de informação e de expressão e a intimidade, honra e vida privada), seja de modo geral, no que, conforme afirma, diz respeito “ao próprio papel da Constituição. Em uma visão substancialista (a constituição deveria impor um conjunto de decisões valorativas que se consideram essenciais e consensuais), ou mesmo designada de procedimentalista (a constituição deve garantir o funcionamento adequado do sistema de participação democrático, ficando a cargo da maioria, em cada momento histórico, a definição de seus valores e de suas próprias convicções materiais), em relação a qualquer das posições que se filie, mesmo no procedimentalismo deverão ser resguardados as condições de dignidade e dos direitos dentro, ao menos, de patamares mínimos. (2011, p. 61-62) Ou seja, independentemente da linhagem de pensamento ao qual qualquer um se filie, deve-se resguardar as condições mínimas de dignidade da pessoa humana. Essa é a visão do neoconstitucionalismo. Buscar não somente aquilo que o texto de uma lei diz, mas também o que a ética, o direito, a moral e a justiça resguardam. A saber, a proteção aos direitos fundamentais e principalmente a dignidade da pessoa humana. Ademais, foi especialmente decisivo para o delineamento desse novo Direito Constitucional, o reconhecimento da força normativa dos princípios, situação que tem propiciado a reaproximação entre o Direito e a Ética, o Direito e a Moral, o Direito e a Justiça e demais valores substantivos, a revelar a importância do homem e sua ascendência a filtro axiológico de todo o sistema político e jurídico, com a consequente proteção dos direitos fundamentais e da dignidade da pessoa humana (CUNHA JÚNIOR, 2011, p. 42) Pelo fato de que o direito ao esquecimento contrapõe muitas vezes princípios entabulados em uma mesma carta magna, o neoconstitucionalismo surge para trazer uma relativização, tanto pela dimensão normativa quanto pela axiológica, para que se fundam e se reconheçam os direitos de cada um sob uma dupla dimensão normativo-axiológico embasada na dignidade da pessoa humana e nos direitos fundamentais. A emergência do neoconstitucionalismo logrou propiciar o reconhecimento da dupla dimensão normativo-axiológico das Constituições contemporâneas,
  • 38. 38 ensejando a consolidação de uma teoria jurídica material ou substancial assentada na dignidade da pessoa humana e nos direitos fundamentais. Nesse contexto, o discurso jurídico, antes associado a uma concepção formal e procedimentalista, evolui para alcançar uma vertente substancialista preocupada com a realização dos valores constitucionais (CUNHA JÚNIOR, 2011, p. 42) A visão neoconstitucionalista, agora em ascensão no meio jurídico, muito há que contribuir para a aplicação de direitos consagrados na constituição em uma esteira principiológica. Buscando, como já fora dito supra, o reconhecimento da dupla dimensão normativo-axiológico, para que não seja aplicado o direito ad libitum do julgador, mas sim pelo âmago de cada norma que traz consigo a esperança de justiça creditada aos revolucionários que romperam com os antigos sistemas absolutistas, buscando o seu verdadeiro sentido. A saber: a dignidade da pessoa humana. Existem muitos outros exemplos recentes sobre essa questão de “direito ao esquecimento” como o caso da XUXA VS GOOGLE no qual a “rainha dos baixinhos” quer que sejam removidas da rede mundial de computadores insinuações de seu nome à prática de pedofilia ou qualquer prática criminosa. O caso foi decidido pelo STF, do qual o ministro Celso de Mello negou o recurso da apresentadora Xuxa e manteve a permissão do Google de revelar fotos e vídeos da apresentadora após pesquisa que relacionam seu nome à pedofilia. O STJ utilizou os argumentos de que “não se pode, sob o pretexto de dificultar a propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na ‘web’ reprimir o direito da coletividade à informação” Um caso, não menos curioso, foi o da chacina da Candelária, que aconteceu em 1993, em frente a igreja da Candelária no estado do Rio de Janeiro, onde um grupo de policiais a paisana abriram fogo contra setenta crianças e adolescentes que dormiam nas escadarias da igreja. Três policiais foram condenados e dois foram absolvidos. A Rede Globo Comunicações exibiu 13 anos após a Chacina, no programa “Linha Direta”, um documentário em rede nacional sobre o ocorrido naquela madrugada de julho de 1993. Percebemos, neste caso, que direitos e princípios se colidem, de um lado temos a liberdade de imprensa e direito a informação e de outro direito da personalidade e da honra. Então, o intérprete da lei, utilizando-se da técnica de interpretação da lei abraçado pelo neoconstitucionalismo, fará a identificação das normas pertinentes, a seleção dos fatos relevantes e, por fim, produzirá uma conclusão.
  • 39. 39 Importante, portanto, trazer à baila este tão importante julgado: RECURSO ESPECIAL nº 1.334.097 – RJ (2012/0144910-7) RELATOR: MINISTRO LUIZ FELIPE SALOMÃO RECORRENTE: GLOBO COMUNICAÇÕES E PARTICIPAÇÕES S/A RECORRIDO: JURANDIR GOMES DE FRANÇA EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL – CONTITUCIONAL. LIBERDADE DE IMPRESA VS. DIREITOS DA PERSONALIDADE. LITIGIO DE SOLUÇÃO TRANSVERSAL. COMPETÊNCIA DO SUPRIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DOCUMENTÁRIO EXIBIDO EM RENE NACIONAL. LINHA DIRETA-JUSTIÇA. SEQUÊNCIA DE HOMICÍDIOS CONHECIDA COMO CHACINA DA CANDELÁRIA. REPORTAGEM QUE REACENDE O TEMA TREZE ANOS DEPOIS DO FATO. VEICULAÇÃO INCONSENTIDA DE NOME E IMAGEM DE INDICIADO NOS CRIMES. ABSOLVIÇÃO POSTERIOR POR NEGATIVA DE AUTORIA. DIREITO AO EQUECIMENTO DOS CONDENADOS QUE CUMPRIRAM PENA E DOS ABSOLVIDOS. ACOLHIMENTO. DECORRÊNCIA DA PROTEÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DAS LIMITAÇÕES POSITIVIDAS À ATIVIDADE INFORMATIVA. PRESUNÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL DE RESSOCIALIZAÇÃO DA PESSOA. PONDERAÇÃO DE VALORES. PRECEDENTES DE DIREITO COMPARADO. (grifou-se) Analisando o processo em epígrafe, a decisão que negou provimento ao Recurso Especial interposto pela Rede Globo de Comunicações, merece grande destaque pelo brilhantismo sentencial, In Verbis: O momento é de novas e necessárias reflexões, das quais podem mesmo advir novos direitos ou novas perspectivais sobre velhos direitos revisitados. (...) Assim, a liberdade de imprensa há de ser analisadas a partir de dois paradigmas jurídicos bem distantes um do outro. O primeiro, de completo menosprezo tanto da dignidade da pessoa humana quanto de liberdade de imprensa; e o segundo, o atual, de dupla tutela constitucional de ambos os valores. Nesse passo, a explícita contenção constitucional à liberdade de informação, fundada na inviolabilidade da vida privada, intimidade, honra, imagem e, de resto, nos valores da pessoa e da família, prevista no art. 220, §1º, art. 221 e no §3º do art. 222 da carta de 1988, parece sinalizar que, no conflito aparente entre esses bens jurídicos de especialíssima grandeza, há, de regra, uma inclinação ou predileção constitucional para soluções protetivas da pessoa humana, embora o melhor equacionamento deva sempre observar as particularidades do caso concreto. Essa constatação se mostra consentânea com o fato de que, a despeito de a informação livre de censura ter sido inserida no seleto grupo de direitos fundamentais (art 5º, inciso IX), a Constituição Federal mostrou sua vocação antropocêntrica no momento em que gravou, já na porta de entrada (art. 1º, inciso III), a dignidade da pessoa humana como - mais que um direito – um fundamento da República, uma lente pela qual devem ser interpretados os demais direitos posteriormente reconhecidos. Exegese dos arts. 11, 20 e 21do Código Civil de 2002. Aplicação da filosofia Kantiana, base da teoria da dignidade da pessoa humana, segundo a qual o ser humano tem um valor em si que supera o das “coisas humanas”.
  • 40. 40 Tal abordagem ganha cada vez mais importância na medida em que as contraposições constitucionais tem se tornado uma realidade no âmbito jurídico. A ampliação da abordagem de uma visão que vai contra a operação lógica dedutiva, na qual o juiz faria a subsunção dos fatos à norma, pronunciando a consequência jurídica nele já existente. 3.2 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: LEGITIMIDADE DA INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO CARACTERIZADA PELA ANENCEFALIA A Anencefalia é uma má-formação fetal, devido a um problema no fechamento do tubo neural, caracterizada pela ausência parcial do encéfalo e da calota craniana. Na prática, não é a total ausência de cérebro no feto, e sim a má formação deste, que pode se dar em graus variados. A Anencefalia geralmente é utilizada para caracterizar uma má formação fetal do cérebro, Sendo quase impossível a viabilidade de vida extrauterina. Diante da constatação de anencefalia, a interrupção da gravidez pela mãe, poderia ser criminalizada? Poder-se-ia considerar uma atitude antijurídica? Óbvio que o nosso legislador de 1940 (data da promulgação do atual código penal) não conseguiria prever tal fato, que, por demais, hoje já se tornou corriqueiro. Poder-se-ia então, levar a mãe que interrompe a gravidez, por saber que o feto não teria perspectiva de vida extrauterina, às grades de uma prisão já que esta provocou um aborto espontâneo? Se tomarmos o mesmo caminho dos juristas dos séculos passados para interpretar o caso concreto, simplesmente aplicaríamos a norma descrita e obviamente levaríamos a mãe, que por demais já sofre muito com o aborto, a outro sofrimento, de ter a sua liberdade cerceada. A luz sempre brilha no fim do túnel. É nesse compasso que se forma a necessidade de uma nova concepção para enxergar e interpretar as leis, logo surgiu o neoconstitucionalismo.
  • 41. 41 A nossa Suprema Corte no acórdão de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54, se pronunciou sobre a legitimidade da mulher poder interromper a gestação após o diagnóstico, se assim o desejasse. Esmiuçando o caso trazido à baila, o Ministro Luís Roberto Barroso, em sua obra intitulada: O NOVO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO, traz a sua contribuição no seguinte sentido: “O caso era difícil por três razões típicas. Em primeiro lugar, pela ambiguidade da linguagem: determinar se o sentido e alcance do direito à vida englobava ou não um feto inviável. Em segundo lugar, pela existência de uma colisão de direitos fundamentais: admitindo-se que houvesse, de fato, um direito à vida potencial por parte do feto, ele se contraporia ao direito da mãe de não se submeter a um sofrimento que considere inútil, com repercussão sobre a sua integridade física e psíquica. E, em terceiro lugar, um descordo moral: em todas as questões que envolvem interrupção da gestação e aborto, contrapõem-se os defensores da liberdade de escolha da mulher – isto é, o exercício de sua liberdade reprodutiva – e os que consideram que o direito à vida é absoluto e se estende ao feto, sendo ilegítima a decisão da mãe de se interromper a gestação. O supremo Tribunal Federal decidiu que a interrupção da gestação no caso de feto anencefálico é fato atípico, em razão da ausência de potencialidade de vida do feto. Como consequência, reconheceu o direito de a mulher interromper a gestação em tal hipótese, independentemente de autorização judicial.” (2013, p. 48) Por isso, embasando-se nos pilares do neoconstitucionalismo resultou em um deslinde satisfatório no presente caso. Percebe-se que se contrapôs a legislação ordinária (Código Penal) ao o principio constitucional da dignidade da pessoa humana, e tivemos como mediador, para equilibrar essa contraposição, os alicerces do neoconstitucionalismo, que analisou a aplicação da lei ao caso concreto não pelo simples encaixe do caso concreto à norma jurídica. Este caso foi além. Analisou-se não a letra fria, mas valorizou-se o âmago do principio constitucional da dignidade da pessoa humana. Equalizou-se a lei e os princípios, pois obrigar uma mulher levar a gestação até o fim de um feto anencefálico, sem a possibilidade de vida extrauterina, violaria as dimensões do direito à integridade física, moral e psicológica. Importante salientar que, antes da prolação do acórdão, que permite o aborto de feto anencefálico, em audiência pública, vários foram os argumentos, teses e teorias, uns a favor e outros contra a legitimidade do pedido. Tanto é verdade que, no acórdão prolatado pelo Ministro Marco Aurélio em sua página vinte e dois (22), o Deputado
  • 42. 42 Federal Luiz Bassuma, presidente da frente parlamentar em Defesa da Vida, manifestou-se contra o Aborto alegando ser uma violação do direito à vida. “A seguir, o então Deputado Federal Luiz Bassuma, Presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Vida – Contra o Aborto manifestou-se a favor do direito inviolável à vida. Acrescentou que, recentemente, o Estado brasileiro referendou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – circunstância que alcançaria a situação dos anencéfalos –, mediante a qual se impõe à República Federativa do Brasil e à sociedade o dever de assegurar o direito de igualdade de oportunidade aos deficientes.” (2013, p. 96) Verificamos com isso a aplicabilidade latente do neoconstitucionalismo, que, mais uma vez conseguiu suplantar as mazelas de uma lei totalmente arcaica e equilibrá-la com os princípios pertinentes ao caso. 3.3 A APLICAÇÃO DO NEOCONSTITUCIONALISMO: UNIÕES HOMOAFETIVAS Importante se faz, antes de concluir o presente capítulo, relacionar o neoconstitucionalismo à legitimidade das uniões homoafetivas, que por sinal, já não é algo tão atual assim, visto que o julgamento do vertente caso ocorrera no dia 4 e 5 de maio de 2011. O então governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral ficou sabendo de um estudo realizado acerca da temática e quis levar o pedido ao STF, para que a união estável de pessoas do mesmo sexo estivessem sujeitas ao mesmo regime jurídico das uniões estáveis convencionais. Entretanto, o Governador do Estado do Rio de Janeiro no que tange a propositura de ADPF, possui apenas legitimidade especial, ou seja, ele precisa demonstrar que a questão a ser discutida teria repercussão específica e direta no âmbito do Estado, então com isso ele precisaria demonstrar a pertinência temática. Então, para justificar a propositura da ação, utilizou-se do Decreto-Lei estadual nº 220, de 18.08.1975 (Estatuto dos Servidores Civis do Estado do Rio de Janeiro) que prevê o direito de licença do servidor em caso de doença de pessoas da família ou para acompanhar o cônjuge em missão de trabalho. Então este foi o motivo! O Governo precisava determinar se cônjuge e pessoa da família incluíam ou não os parceiros em uniões homoafetivas.
  • 43. 43 O Ministro Gilmar Mendes não recebeu o pedido como ADPF, mas sim como ADI sob o nº 142. A presente ação foi ajuizada em Fevereiro de 2008 recheada de argumentos e fundamentos para justificar o deferimento do pedido. Mas se a lei não reza sobre tal possibilidade, nem se quer cogita essa questão, como então que o julgador irá deferir tal pedido ? Ele não estaria criando possibilidades que não se encontram na lei? Obviamente que não. É sabido que o julgador, sendo a lei omissa, pode utilizar-se da analogia, dos costumes, e dos princípios gerais de direito para suprir a lacuna na lei. Mais uma vez entra em cena, de forma discreta, a utilização dos conceitos do neoconstitucionalismo para suplantar a falta da lei positivada, visto que, como já fora dito em linhas anteriores, o Direito não pode estar contido simplesmente na lei, mas está além dela. Como bem relata o Ministro Luis Roberto Barroso em seu artigo “Diferentes, mas iguais”: No direito positivo brasileiro, inexiste regra específica sobre a matéria. A Constituição de 1988, que procurou organizar uma sociedade sem preconceito e sem discriminação, fundada na igualdade de todos, não contém norma expressa acerca da liberdade de orientação sexual. Como consequência natural, também não faz menção às uniões homoafetivas. Faz referência, no entanto, às uniões heterossexuais, reconhecendo como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher. O Código Civil, por sua vez, ao disciplinar o tema da união estável, seguiu a mesma linha. (2013, p. 432) Ele justifica a aceitação da união homoafetiva com o seguinte argumento: A tese principal é a de que um conjunto de princípios constitucionais impõe a inclusão das uniões homoafetivas no regime jurídico da união estável, por se tratar de uma espécie em relação ao gênero. A tese acessória é a de que, ainda quando não fosse uma imposição do texto constitucional, a equiparação de regimes jurídicos decorreria de uma regra de hermenêutica: na lacuna da lei, deve-se integrar a ordem jurídica mediante o emprego da analogia. Como as características essenciais da união estável previstas no Código Civil estão presentes nas uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo, o tratamento jurídico deve ser o mesmo. (2013, p. 431) Utilizando-se de uma base principiológica a presente ação denunciou violação a princípios já há muito tempo consagrados em nosso ordenamento jurídico,
  • 44. 44 então não poderia o julgador, por mais ortodoxo que fosse, fechar os olhos à aplicação destes princípios, que caso o pedido fosse indeferido, estariam sendo feridos de morte. Os princípios elencados na Ação Direta de Inconstitucionalidade para embasá-la foram: o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da igualdade, do direito à liberdade, do qual decorre a proteção à autonomia privada, bem como o princípio da segurança jurídica. Barroso explana em sua magnífica obra sobre a aplicação, no vertente caso, de cada princípio elencado. Princípio da igualdade: A constituição Federal de 1988 consagra o princípio da igualdade e condena de forma expressa todas as formas de preconceito e discriminação. A menção a tais valores vem desde o preâmbulo da Carta, que enuncia o propósito de se constituir uma “sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos” (...) Tal conjunto normativo é explicito e inequívoco: a Constituição proíbe todas as formas de preconceitos e discriminação, binômio no qual hão de estar abrangidos o menosprezo ou a desequiparação fundada na orientação sexual das pessoas. (...) De qualquer forma, porém, não seria necessário elencar razões para impedir o tratamento diferenciados. A lógica é exatamente a inversa. Onde não exista motivo legítimo a exigir distinção, a regra há de ser o tratamento igualitário. (2013, p. 432 e 433) (Grifei) Sobre o direito à liberdade, do qual decorre a autonomia privada, seria necessário trazer toda a explicação contida na ilustríssima obra, mas nos ateremos a um ponto crucial: A autonomia privada pode certamente ser limitada, mas não caprichosamente. O princípio da razoabilidade ou proporcionalidade [...] exige a imposição de restrições seja justificada pela promoção de outros bens jurídicos de mesma hierarquia, igualmente tutelados pela ordem jurídica. (...) Ocorre, porém, que o não reconhecimento das uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo não promove nenhum bem jurídico que mereça proteção em um ambiente republicano. Ao contrário, atende majoritárias, mas que não se impõem como juridicamente vinculantes em uma sociedade democrática e pluralista, regida por uma constituição que condena toda e qualquer forma de preconceito. (2013, p. 434 e 435) Encerramos as citações das fundamentações trazidas à baila não por serem menos importantes, mas porque as já apresentadas superam toda e qualquer dúvida acerca da devida aplicação destes princípios para tutelar o direito de reconhecimento das uniões homoafetivas.
  • 45. 45 Com isso, podemos verificar que o direito nunca esteve e nunca estará contido integralmente na normal positivada, sendo necessária a ponderação do intérprete entre os princípios e as leis, visto que uma anda de mãos dadas com a outra e uma só se completa com a outra.
  • 46. 46 CONCLUSÃO Diante o exposto, verificamos que o sistema absolutista conseguiu, não por pouco tempo, controlar a sociedade e submetê-la às ordens de um monarca absoluto, com argumentos de que o soberano era representante de Deus na Terra e que a vontade deste era inspirada por Deus, e que contrariar a vontade do monarca absoluto seria o mesmo que não acatar as ordens divinas. Esses argumentos perduraram por muito tempo, a fim de controlar a sociedade para que caminhasse nos trilhos da vontade do monarca. Mas, fadado estava este sistema de controle social, pois, sendo o homem um animal político, jamais se contentaria em simplesmente obedecer as ordens de alguém. O sistema absolutista notadamente viria a sucumbir em pouco tempo, e não foi diferente, com as ideias iluministas concebendo a Revolução Francesa, esse sistema de controle social se extinguiu (apesar que ainda, em alguns países, existe governo absolutista). Com o intuito de se limitar o poder que, outrora, era absoluto instituiu-se em meio a sociedade uma constituição, que deveria ser respeitada e seguida a risca para trazer benefícios a toda coletividade. Surge então o Constitucionalismo, primeiramente na America do Norte, em meados de 1789 e posteriormente na frança em 1791. O Constitucionalismo trazia em seu bojo uma estrutura constitucional para limitar o poder do soberano, instituindo direitos e garantias a todos os cidadãos. O que valia era a lei, era o que estava escrito. Provavelmente, traumatizados pelos danos advindos de um governos absolutista, queria fazer valer as normas constitucionais a todo o custo. Entretanto, mais uma vez, esse sistema não foi suficiente para resolver todas as complexas relações sociais dos seres humanos, visto que o direito não se encaixava perfeitamente na norma escrita. O legislador ordinário, por mais que se esforçasse, não conseguiria jamais acompanhar toda a transformação que a sociedade vinha sofrendo, e sempre ficaríamos com um sistema jurídico defasado. As leis seriam criadas, comportamentos seriam normatizados e tipificados, mas nessa corrida da evolução entre a sociedade e a lei, esta última sempre seria perdedora. Ela jamais conseguiria acompanhar as mudanças que diariamente aconteciam no seio da sociedade. Será que isso nos remete a alguma situação familiar? Obviamente que sim! Observemos o nosso ordenamento jurídico, que está muito aquém do que deveria estar. Exemplos existem vários: o nosso atual Código Penal é do ano de 1940, Código Tributário Nacional é de 1966, A lei que regula a matéria de utilização de
  • 47. 47 cheques também é de 1966 e por último, a lei que regula as operações cambiais é de de 1908. Exemplos não nos falta para verificarmos que o corpo legislativo pátrio, por mais empenhado que fosse não conseguiria satisfazer todas as modificações existentes na sociedade, e quando consegue, é de maneira atrasada. Com isso, se viu a necessidade de um movimento mais autêntico capaz de dar ao intérprete da lei condições de equilibrar direitos e garantias, conseguindo assim dar uma solução justa para o caso concreto. O intérprete da lei não poderia ser um mero aplicador da lei, pois se assim fosse não seria necessário juízes togados, que se submetem a um concurso público, deveras muito concorrido, para simplesmente aplicar a lei ao caso concreto. Poderia se, então, criar um programa de computador no qual necessitaria unicamente de uma pessoa para preencher os campos solicitados e assim, de forma matemática, enquadraria o caso concreto à lei aplicável. Mas isso não seria justo! Não seria justo, pois, o computador jamais conseguiria ter a sensibilidade de um ser humano que verifica, antes de tudo, as causas e os motivos determinantes de qualquer conduta típica. Por isso, ergue-se em nosso meio um movimento que entrega ao intérprete da lei essa liberdade, de ser sensível ao caso concreto, podendo julgar as controvérsias da vida não somente com a letra fria da lei, mas com a superfície aveludada dos princípios. O movimento denominado neoconstitucionalismo entrega ao intérprete da lei uma margem maior de liberdade, traz a constituição, juntamente com seus princípios, ao centro do ordenamento jurídico pátrio. O neoconstitucionalismo traz à constituição uma carga não somente ideológica, como também axiológica, primando por valores insculpidos na carta magna. Então, em um caso concreto, quando se está diante de direitos contrapostos, o neoconstituinalismo concede ao intérprete um poder de ponderação de direitos, podendo aplicar os princípios e, se for necessário, colocá-los acima da própria lei. Visto que direito não está contido integralmente contido na norma escrita, mas também se encontra nos valores e princípios já entabulados na constituição. O neoconstitucionalismo, portanto, busca a junção das normas e dos princípios, e, porque não dizer, com outras ciências, fazendo com que o conjunto de leis, ao serem aplicadas, não produza apenas resultados matemáticos, mais sim humanos, valorizando sempre o ser humano e fazendo com que todos entendam que não estamos aqui para, simplesmente, obedecer a lei, mas que ela fora criada para o nosso
  • 48. 48 benefício, imprimindo no homem valores que ao longo da vida podem ser esquecidos ou menosprezados, resultando em uma sociedade mais harmônica e desenvolvida, para que consigamos atingir o ápice da existência humana, mesmo que em baixa escala, pois ainda estamos longe disso, e entendermos que todos somos iguais, sem distinção de cor, raça, credo ou posição social, filhos de um mesmo criador.
  • 49. 49 REFERÊNCIAS ANDERSON, Perry. Linhagens do Estado Absolutista. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 18. Disponível em: <http://minhateca.com.br/alcides.deabreu/Documentos/Livros+Hist*c3*b3ria+em+pdf/ Perry+Anderson+-+Linhagens+Do+Estado+Absolutista,5141920.pdf> Acesso em: 20 mar. 2014. BARROSO,Luís Roberto. O Novo Direito Constitucional Brasileiro. 1 ed. Belo Horizonte. Fórum 2013. ______. Interpretação e aplicação da Constituição. 7ª ed. São Paulo. Saraiva. 2009, p. 305-345 ______. Diferentes, mas iguais: o reconhecimento jurídico das relações homoafetivas no Brasil. Disponível em: http://www.direitopublico.com.br/pdf_seguro/diferentes_iguais_lrbarroso.pdf Acesso em 29 out. 2014. ______. Neoconstitucionalismo e Constituicionalização do Direito. Disponívels em : http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp- content/themes/LRB/pdf/neoconstitucionalismo_e_constitucionalizacao_do_direito_pt.p df Acesso em 23 out. 2014. CASTRO, Flávia Lages de. História do Direito. 8. ed. Rio de Janeiro: 2011, p. 197- 207. CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 5 ed. São Paulo. JusPodivm, 2011. p. 40-43. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Míni Aurélio: o dicionário da língua portuguesa. 8 ed. Curitiba. Positiva. 2010. FILIPPO, Thiago Baldani Gomes de. Do Constitucionalismo ao Neoconstitucionalismo. Paraná: 2010. Disponível em: http://uenp.edu.br/index.php/prograd-tcc/doc_view/1918-thiago-baldani-gomes-de- fillipo. Acesso em: 18 mar. 2014.