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Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
128
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138 ATUALIZAÇÃO
CURRENT COMMENTS
INTERSUBJETIVIDADE: PERSPECTIVAS TEÓRICAS E IMPLICAÇÕES PARA
O DESENVOLVIMENTO INFANTIL INICIAL1
INTERSUBJECTIVITY: THEORETICAL APPROACHES AND IMPLICATIONS
FOR EARLY CHILD DEVELOPMENT
Susana Engelhard Nogueira
Maria Lucia Seidl de Moura
INTRODUÇÃO
As relações humanas envolvem, para serem
estabelecidas, um esforço contínuo de comu-
nicação. É através dela que se dá a possibilidade
de compartilhar idéias e experiências com base
em um plano interpessoal. Entender a comu-
nicação como um processo de transferência de
significados de um sujeito para outro exige pensá-
la como mais do que mera transmissão de dados.
Comunicação requer, tanto das pessoas que
oferecem pistas ou informações acerca de seus
estados internos (mentais e afetivos) quanto
daquelas que as captam, o envolvimento de certas
habilidades cognitivas a fim de que o intercâmbio
de significado seja estabelecido.
Para Penteado1
, o processo de comuni-
cação humana pressupõe alguns pontos es-
senciais: o envolvimento conjunto de parceiros,
Nogueira SE, Moura MLSd. Intersubjetividade: Perspectivas teóricas e implicações para o
desenvolvimento infantil inicial. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum 2007; 17(2): 128-138.
Resumo: O conceito de intersubjetividade tem sido abordado segundo diferentes interpretações
no campo da Psicologia. Este artigo tem como objetivo apresentar fundamentos teóricos desse
conceito, apontando sua utilização em estudos sobre o desenvolvimento infantil inicial nas
últimas décadas. Busca-se ainda discutir e comparar diferentes perspectivas teóricas que abordam
o papel da intersubjetividade e da interação social no desenvolvimento infantil. Entende-se que
as perspectivas discutidas não esgotam plenamente o tema, mas contribuem para uma reflexão
sobre como a intersubjetividade pode ser vista como aspecto indissociado de processos básicos
que envolvem reciprocidade como a comunicação inicial, interação social e afetividade.
Palavras-chave: Intersubjetividade. Interação social. Desenvolvimento infantil inicial.
*
Este artigo teve sua origem a partir da dissertação de mestrado intitulada “Atenção conjunta e intersubjetividade em
crianças autista e com desenvolvimento típico: Um estudo longitudinal e um estudo comparativo”, elaborada pela
primeira autora e orientada pela segunda, no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro – UERJ, 2005. susiengelhard@yahoo.com.br
significados compartilhados, e natureza simbó-
lica. Dentro deste contexto, tal processo está inti-
mamente relacionado a possibilidades de trocas
intersubjetivas, sendo importante pensar como se
caracterizam os primórdios da intersubjetividade
no desenvolvimento humano.
O conceito de intersubjetividade tem sido
utilizado com base em diferentes interpretações.
Isto porque, de acordo com Joppling2
, este
conceito tem ocupado lugar em debates filosóficos
acerca da dimensão social da consciência humana,
além de envolver discussões sobre outros temas
relacionados, como impulsos morais, religiosos,
significado compartilhado e autoconsciência.
Braten3
aponta que o conceito de intersub-
jetividadetememergidoexplícitaeimplicitamente
como denominador comum de abordagens sobre
engajamentos interpessoais na infância inicial, ao
levar em conta uma discussão sobre as pos-
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
129
sibilidades de compreensão por parte da criança
acerca do universo privado (pensamentos e sen-
timentos) de outros. Este autor ressalta que
intersubjetividade pode assumir três significados
distintos: 1) como senso de “comunhão” ou co-
participação interpessoal3
, estabelecido a partir
do engajamento conjunto de pessoas, que
mutuamente se ajustam e sintonizam expressões
e estados afetivos; 2) como envolvendo compor-
tamentos de atenção conjunta (sujeito-sujeito-
objeto) e domínios compartilhados de conversa-
ção lingüística4
; e, 3) como compreensão da
comunicação mediada por (meta) representações,
possibilitando a realização de inferências sobre
intenções, crenças e sentimentos alheios5
, além
de capacidade para imaginar, simular e “ler”
estados mentais de outros.
Na década de 1970, observações de díades
mãe-bebê mostraram que este último desde muito
cedo é capaz de exibir engajamentos sociais com
seus parceiros envolvendo a participação de
expressões faciais. Esta descoberta impulsionou
o desenvolvimento de pesquisas e a procura por
uma teoria satisfatória acerca da mente infantil.
É neste contexto que se destacam as contribuições
de Colwyn Trevarthen3
.
Trevarthen6
foi um dos primeiros pes-
quisadores a se dedicar a estudos que reportam
como a intersubjetividade pode estar presente nos
primeiros meses de vida do bebê. Este autor estu-
dou como a comunicação entre mãe e bebê é esta-
belecida durante os seis primeiros meses de idade
deste último. Ele observou que, já a partir dos
dois meses, os bebês são capazes de exibir dife-
renças significativas quanto às respostas dadas a
objetos e pessoas, exibindo diferentes comporta-
mentos com base no corpo, mãos e face quando
em presença de sorrisos e vocalizações de suas
mães. Da mesma maneira, diferenças também
foram observadas nas respostas oferecidas pelas
mães aos seus bebês, parecendo haver um estilo
de atividade mútua específico à díade.
Para chegar a esta discussão, Trevarthen7
considerou a importância dos estudos desenvol-
vidos inicialmente por Mary Catherine Bateson8
sobre protoconversações entre mães e bebês. Esta
autora estudou bebês com idades entre sete e
quinze semanas, na presença de suas mães, e
observou que os membros desta díade colabora-
vam entre si a partir de um padrão mais ou menos
alternado de comunicação. As mães tendiam a
falar sentenças breves com seus bebês, que lhes
respondiam através de vocalizações. Juntos, estes
parceiros pareciam apresentar um padrão de
comunicação similar a uma conversação, a que a
autora denominou de protoconversação.
Partindo destas contribuições, Trevarthen6
realizou análises minuciosas de registros em vídeo
de díades mãe-bebê e observou que bebês recém-
nascidos apresentavam comportamentos coe-
rentes, manifestando movimentos expressivos de
boca, mãos e olhos com ritmos específicos e em
sintonia à fala materna.Tais análises contribuíram
para que este autor argumentasse sobre a
existência de uma ritmicidade intrínseca essencial
na intercoordenação destas protoconversações.
Ao invés de apenas constituírem respostas com-
portamentais aparentemente reflexas, as ativi-
dades de olhar mútuo e sorriso passaram a ser
vistas como características deste processo, ao
serem utilizadas para regular o contato interpes-
soal. Desta forma, já seria possível observar
indícios de uma comunicação entre estes parceiros
desde períodos precoces da vida do bebê.
Dentro deste contexto, Trevarthen6
obser-
vou que recém-nascidos saudáveis tendiam a
responder com expressões e comportamentos a
seus parceiros, os quais, por sua vez, também
tendiam a atribuir significado a estes últimos em
termos de intenções e sentimentos. Tal dinâmica
comunicativa parece indicar que os adultos com
os quais o bebê interage são capazes de fazer
referência direta à existência de uma vida pessoal
subjetiva em períodos precoces do desenvolvi-
mento infantil.
Ao reunir evidências de pesquisas sobre o
cérebro e de suas análises acerca de protoconver-
sações estabelecidas por mães e seus bebês na
idade de dois meses, este autor considera que estes
últimos são dotados de um sistema cerebral que
os capacita a apresentar sintonia responsiva em
engajamentos regulados emocionalmente com
outros. Esta capacidade inata para estabelecer
engajamentos diádicos precoces foi por ele
denominada de intersubjetividade primária.
O fundamento básico do qual o autor se
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
130
utiliza para caracterizar a existência de uma
intersubjetividade precoce envolve a idéia de que
existe intencionalidade coerente e consciência
ativa na criança desde o seu nascimento. Assim,
segundo ele, o bebê já nasce com uma capacidade
socioemocional primária de participar afetiva-
mente de engajamentos sociais recíprocos e de
aprender através deles. Neste sentido, para que
os bebês possam compartilhar estados mentais
com outros parceiros é necessária a participação
de duas habilidades. A primeira refere-se à ca-
pacidade de exibir aos outros algumas evidên-
cias, mesmo que rudimentares, de consciência e
intencionalidade, identificadas como um atributo
denominado subjetividade.Asegunda envolve a
necessidade dos bebês serem capazes de adaptar
ou ajustar suas subjetividades às subjetividades
de outros, demonstrando intersubjetividade.
Trevarthen6
compreende a intersubjeti-
vidade como envolvendo o reconhecimento e a
coordenação de intenções presentes nas comuni-
cações mãe-bebê. Para isto, seria necessária a
ocorrência simultânea de duas atividades: a ado-
ção de um foco compartilhado de atenção por
ambos os parceiros, e uma concordância quanto
à natureza da comunicação. Durante o período
pré-linguístico de vida do bebê, a atividade de
compartilhar dá-se de maneira inerente ao con-
texto de expressões afetivas das interações diá-
dicas (intersubjetividade primária). Com isso, a
intersubjetividade é vivida em termos de afetos
presentes nas interações. Levar em conta tais
atividades implica um reposicionamento sobre o
modo de conceber a linguagem como única fonte
para uma comunicação social.
A idéia da existência de uma intersubje-
tividade infantil envolve uma teoria sobre como
as mentes humanas podem reconhecer intuiti-
vamente significados e impulsos umas nas outras,
com ou sem elaborações simbólicas ou cognitivas.
Trevarthen7
observou alguns aspectos importan-
tes que serviriam como base para formular e
apoiar esta teoria da intersubjetividade infantil.
Dentre estes aspectos, ele destacou os seguintes:
com um mês de vida, bebês exibem padrões de
comportamento diferentes em relação a objetos e
pessoas. Com os objetos, os comportamentos
tendem a ser de exploração e manipulação, en-
quanto com pessoas, parecem envolver reciproci-
dade e comunicação. Por volta dos dois ou três
meses, expressões emocionais de ambos os
parceiros podem acompanhar o estabelecimento
de protoconversações. Nos primeiros seis meses
de vida do bebê, este padrão de comunicação
desenvolve-se, passando a apresentar caracterís-
ticas e expectativas de reciprocidade, o que não
ocorre na relação com objetos. As emoções são
utilizadas nestas trocas não como reguladoras
propriamente do self infantil, mas como pistas
para o contato interpessoal e relacionamento.
Após os seis meses de idade do bebê,
começam a surgir evidências de comportamentos
de compartilhar interesses, havendo a possibi-
lidade de integração do mundo dos objetos com o
mundo social (início de interações triádicas). Já
por volta dos nove meses de idade, observa-se
uma transformação. A díade mãe-bebê é capaz
de incluir em suas interações um terceiro elemento
(objeto, pessoa ou evento interessante no ambien-
te) em uma referência compartilhada, constituindo
interações triádicas, a que Trevarthen e Hubley9
nomeiam de intersubjetividade secundária. Esta
última parece ser crucial para o desenvolvimento
de habilidade de atenção conjunta, interesse
compartilhado e tarefas cooperativas.
Ao considerar a existência de uma inter-
subjetividade precoce em bebês, este argumento
de Trevarthen7
encontrou rejeição e ceticismo
inicial no campo científico ao divergir radical-
mente das hipóteses tradicionais sobre egocentris-
mo propostas por Jean Piaget10
. Na perspectiva
de Trevarthen7
, o termo intersubjetividade envo-
lveria o bebê identificar o outro e a si mesmo
como sujeitos da experiência o que, por sua vez,
envolveria intencionalidade. Para o autor, os
comportamentos observados na infância inicial
marcariam uma capacidade inata para comu-
nicação assumida nas trocas face-a-face entre mãe
e bebê. Neste sentido, o que estaria em jogo não
seria tanto questionar se o desenvolvimento
infantil envolve aprendizagem ou dependência de
cuidados, e sim, a idéia de que o bebê já nasce
com competências que o capacitam a revelar e
negociar intenções, emoções, experiências e
significados estabelecidos nas relações com o
outro.
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
131
De uma maneira geral, é possível argu-
mentar que, apesar do bebê recém-nascido apre-
sentar um repertório de capacidades limitado, ele
parece vir ao mundo dotado de uma bagagem
inata que lhe permite expressar uma sensibilidade
social. Assim, algumas competências precoces
relacionadas à atenção e discriminação encon-
tram-se envolvidas neste processo e parecem
capacitar o bebê a responder seletivamente aos
eventos sociais11
.
Intersubjetividade e Interação Social:
contribuições de algumas perspectivas
contemporâneas
Os Diferentes Sensos de u e de outro
Stern12
dedicou-se a investigar a existência
de uma vida subjetiva em bebês, buscando
compreender como estes vivenciam a si mesmos
e aos outros, criando desde cedo um mundo inter-
pessoal. Neste contexto, o autor formulou sua
hipótese de uma experiência subjetiva de bebês,
tentando articular as contribuições de dois campos
distintos e por muito tempo separados: o das
pesquisas experimentais sobre bebês e suas
potencialidades, e o das inferências clínicas acerca
da experiência subjetiva infantil.
Ao longo do desenvolvimento, o bebê pode
experimentar mudanças significativas com rela-
ção às suas experiências subjetivas de eu e de
outro. Segundo o autor12
, tais experiências subje-
tivas consistem em diferentes “sensos de eu”. Ele
propõe que a idéia de senso de eu pode ser com-
preendida como uma forma de organização que
pode inicialmente existir em formas pré-verbais,
sem o envolvimento de consciência, mas que mais
tarde será verbalmente identificada por “eu”.
Gradativamente, conforme novos compor-
tamentos e capacidades vão sendo conquistados
pelo bebê, seu repertório vai sendo reorganizado
no sentido de formar outras experiências sub-
jetivas organizadoras em relação ao eu e ao outro.
É neste contexto que o autor argumenta que se
dá o surgimento e desenvolvimento de novos sen-
sos de eu.
Stern12
alerta para o fato de que os diferen-
tes sensos de eu ao longo do desenvolvimento
infantil não correspondem a fases que se superam
ou que são mutuamente excludentes e sim, que
coexistem como ativas por toda a vida humana.
Neste sentido, descreve os seguintes sensos de
eu: senso de eu emergente, senso de eu nuclear,
senso de eu subjetivo e senso de eu verbal.
O senso de eu emergente é descrito como
presente inicialmente no período que vai do
nascimento até os dois meses de idade do bebê,
em que não há uma confusão eu-outro ou um
estado de indiferenciação. Para o autor, o bebê
parece estar ativamente formando um senso de
eu, vivenciando diferentes oportunidades de
experiência, que ainda são sentidas como sepa-
radas e não relacionadas, havendo necessidade
da realização de uma integração. Quando ocorre
um encadeamento lógico entre suas experiências,
ou ainda, quando elas passam a ser assimiladas
ou conectadas de alguma forma, o bebê começa
a ter a emergência de uma organização, que nada
mais é, segundo Stern12
, do que uma forma de
aprendizagem. Neste sentido, no período de zero
a dois meses, os bebês não são passivos, mas estão
intensamente engajados em experiências sen-
soriais que constituem oportunidades de apren-
dizagem importantes. Com isso, ocorre uma busca
ativa e gradual de ordenação dos elementos de
suas experiências relacionadas tanto ao eu quanto
ao outro. Estas últimas, quando integradas, irão
conduzir a uma organização subjetiva nova,
denominada senso de eu nuclear.
O senso de eu nuclear é descrito por Stern12
como estando presente inicialmente no período
de dois a seis meses de vida do bebê. Para ele, em
contraste com algumas perspectivas que consi-
deram o bebê em um estado de indiferenciação
eu-outro13
, neste período o bebê experimenta o
seu corpo como uma entidade física, separada,
intencional e dotada de vida afetiva e história
própria. Além disso, os bebês estão ativamente
envolvidos com a criação de um mundo inter-
pessoal ao se mostrarem interessados e engajados
em interações sociais.
Neste sentido, os bebês possuem a expe-
riência subjetiva de se sentirem separados
fisicamente de suas mães, ambos como agentes
diferentes e com experiências afetivas distintas.
As experiências subjetivas organizadoras de um
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
132
senso de eu nuclear referem-se à auto-agência
(sentir-se como autor de suas ações e não-autor
das ações alheias, controle de suas ações e expec-
tativa de conseqüências acerca das mesmas);
autocoerência (senso de ser um todo físico, não
fragmentado e como ponto de ação integrada,
movendo-se ou imóvel); auto-afetividade (viven-
ciar qualidades internas afetivas com base em suas
experiências) e auto-história (senso de conti-
nuidade de si, apesar das mudanças que possam
ocorrer, além de identificação de regularidades
no curso de eventos).
Tais experiências subjetivas organizadoras
são resultantes do contato do bebê com o outro.
Neste período, diante da presença deste último é
comum o bebê se engajar em algumas atividades,
como o brincar de “esconde-esconde” ou “eu vou
te pegar”. Durante estas atividades, são vários
os estados experimentados pelo bebê: excitação,
suspense, alegria, prazer, medo, dentre outros.
Em ciclos repetitivos, as características e modula-
ções destas brincadeiras dirigidas pelo outro ao
bebê oferecem a este último experiências particu-
lares de intensidade de afeto que podem ser regula-
das pelo parceiro. Assim, a partir da mediação
interativa com o outro, o bebê pode ter a sua aten-
ção, curiosidade e engajamento cognitivo regula-
dos, o que significa considerar que suas auto-
experiências são dependentes deste contato social.
Entre os sete e nove meses de idade, Stern12
aponta que algo novo parece acontecer. Os bebês
parecem “descobrir” que suas experiências sub-
jetivas particulares podem ser compartilhadas
com o outro, seja em termos de intencionalidade
(querer algo) ou afetividade (sentir algo), embora
ainda sem um envolvimento de consciência. Para
que isso seja possível, o autor ressalta que os
bebês precisam realizar uma conquista cognitiva
importante: a idéia de que, assim como eles, outras
pessoas possuem mentes distintas e separadas.
O eu e o outro deixam de ser puramente sentidos
como entidades físicas distintas (nucleares) para
incluir estados mentais subjetivos.Assim, ambos
podem ser compreendidos como tendo afetos e
intenções que orientam seus comportamentos.
Surge, portanto, uma nova forma de orga-
nização denominada senso de eu subjetivo, com
base na qual o bebê encontra oportunidade de
relacionar-se intersubjetivamente, ou seja, apre-
sentar intersubjetividade. Stern12
pontua que
somente neste período a intersubjetividade faz-
se possível, entendendo-a como uma capacidade
para interpretar, combinar, comparar e sintonizar
com os estados mentais de outra pessoa. Ao
perceber que os outros podem ter uma mente dis-
tinta da sua, mas com estados mentais poten-
cialmente semelhantes aos seus, o bebê pode
atingir a possibilidade de comunicar isto sem pala-
vras, compartilhando suas experiências subjetivas
por meio de gestos, postura ou expressões faciais.
Aidéia de um relacionar-se intersubjetivo
de Stern12
aproxima-se da idéia de intersubjeti-
vidade secundária proposta por Trevarthen e
Hubley9
na medida em que as experiências subje-
tivas a serem compartilhadas envolvem um con-
texto triádico relacionado a um evento, pessoa
ou objeto. Ao não implicar necessariamente a
participação da linguagem, este novo senso de
eu apóia-se em algumas competências específicas
como compartilhar o foco de atenção, compar-
tilhar intenções e estados afetivos, dentre outras.
Mais tarde, em torno dos quinze a dezoito
meses de idade, o bebê começa a experimentar
uma nova forma de organização subjetiva. Trata-
se do senso de eu verbal. Este último é carac-
terizado por uma mudança importante: o bebê
passa a comunicar toda a sua bagagem de expe-
riências e conhecimentos acumulados ao longo
de seu desenvolvimento de uma maneira mais
objetivada, ou seja, através do uso da linguagem.
Deste modo, a partir do desenvolvimento da
capacidade de representação por símbolos, signi-
ficados agora podem ser comunicados, negocia-
dos e compartilhados de outra maneira. Neste
cenário, o brinquedo simbólico, a capacidade de
tomar o eu como objeto de reflexão e a possibili-
dade de realizar narrativas pessoais tornam-se
possíveis, marcando uma forma de relacionar-se
com o outro e com a cultura a partir de uma
natureza verbal.
É interessante notar que Stern12
apresenta
em suas formulações teóricas a idéia de que, desde
períodos precoces do desenvolvimento infantil, o
bebê está longe de se ver envolvido em um
processo de indiscriminação e indissociação eu-
outro. Para ilustrar seus argumentos, o autor se
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
133
utiliza inclusive das contribuições da literatura
acerca das competências iniciais de recém-nas-
cidos. Com base neste repertório de potenciali-
dades precoces, o autor destaca a importância da
sensibilidade e engajamento humanos em trocas
sociais, por meio das quais o bebê gradativamente
vai realizando conquistas cognitivas e afetivas,
capazes de conduzi-lo a novas e mais complexas
formas de organização subjetiva eu-mundo.
Apesar destas considerações, Stern12
distancia-
se em parte dos argumentos de Trevarthen7
não
somente ao considerar que os bebês não apre-
sentam consciência e intencionalidade inatas,
como também que os mesmos só são capazes de
apresentar intersubjetividade bem mais tardia-
mente (por volta dos nove meses), cujas caracte-
rísticas corresponderiam à intersubjetividade
secundária9
.
Cognição Social e os Vários Níveis de
Intersubjetividade
Rochat e Striano14
buscaram considerar as
contribuições de vários estudos acerca das com-
petências iniciais infantis, argumentando que os
bebês humanos são criaturas sociais desde seu
nascimento. Ao pensarem no processo de desen-
volvimento das habilidades sociais infantis, os
autores partem da pressuposição básica de que a
criança precisa apresentar comportamentos que
minimamente esbocem a emergência e o desen-
volvimento da compreensão de pessoas, e não
somente o desenvolvimento de seu conhecimento
sobre o mundo físico. Quando esta pressuposição
é assumida, tem-se como conseqüência a idéia de
que pessoas são mais complexas do que objetos,
e que o desenvolvimento de um conhecimento
social deverá estar baseado em processos especí-
ficos que refletem tal complexidade.
Estes autores argumentam que a noção de
alguns princípios físicos (por exemplo: o fato de
um objeto ter massa, ocupar lugar no espaço e
não poder estar em dois lugares ao mesmo tempo)
já parece estar presente nos primórdios do desen-
volvimento infantil, apesar de bebês com idades
variando entre dois a quatro meses de vida
apresentarem limitações sobre suas possibilidades
de atuação e exploração de objetos por conta de
uma gama ainda muito restrita de capacidades
como olhar, sugar, chorar, tocar e ouvir.
Para Rochat e Striano14
este conhecimento
de natureza física envolve uma obediência a leis,
organização e regularidades, não encontrando
necessariamente correspondência com um conhe-
cimento de natureza social.Assim, a compreensão
de pessoas (conhecimento do mundo social)
envolve um processo mais sofisticado se compara-
do ao conhecimento sobre o mundo físico. Os
modos desenvolvidos pelo bebê para adquirir um
conhecimento sobre pessoas não se reduzem aos
mesmos utilizados para alcançar um conhecimen-
to sobre o mundo físico. Este processo especial
que envolve a busca pelo conhecimento ou enten-
dimento acerca do mundo social recebe o nome
de cognição social.
A cognição social envolve a compreensão
de um universo privado acerca do outro; uma
sensibilidade em perceber, identificar e até respon-
der a emoções, afetos, intenções e comporta-
mentos. Estes autores ressaltam que a forma como
as crianças desenvolvem uma compreensão social
não se restringe apenas à observação isolada do
comportamento de outras pessoas ou mantendo-
se à parte das trocas sociais estabelecidas por
elas. Essa cognição social desenvolve-se através
do engajamento em trocas sociais, onde expe-
riências podem ser compartilhadas através de
reciprocidade14
.
Deste modo, a cognição social está relacio-
nada a um processo mais amplo através do qual
indivíduos, a partir de interações sociais e re-
ciprocidade, desenvolvem habilidades de moni-
torar, controlar e predizer o comportamento de
seus parceiros sociais. Com base nestes argu-
mentos, tais autores consideram que é justamente
a intersubjetividade que capta o sentido de
experiência compartilhada que emerge da re-
ciprocidade, concebendo-a como uma capaci-
dade a partir da qual experiências internas ou
mentais podem ser percebidas como passíveis
de serem compartilhadas.
A noção de intersubjetividade parece pres-
supor ainda a idéia de uma diferenciação entre o
self e o outro, onde atividades de comparar ou
projetar experiências privadas sobre as experi-
mentadas por terceiros tornam-se possíveis. Pode-
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
134
se, a partir desta pressuposição, realizar a se-
guinte indagação: De que maneira os bebês
começam a relacionar sua experiência privada à
experiência privada de outras pessoas?
De acordo com os argumentos de Rochat
e Striano14
, este início da cognição social seria
possível a partir da intersubjetividade.Ao consi-
derarem a possibilidade de uma vida subjetiva
presente em bebês desde a mais tenra idade, os
autores apontam que a intersubjetividade é
justamente aquilo que emerge e se desenvolve a
partir das primeiras trocas sociais, onde sentimen-
tos, afetos e emoções podem ser compartilhados.
Seguindo este raciocínio, as interações com
pessoas passam a ser vistas como o modo pelo
qual a intersubjetividade se desenvolve, já que é
através destas trocas sociais que estados internos
ou mentais de um parceiro podem ser comuni-
cados, compartilhados e “ecoados” nos do outro,
especialmentequandoháumengajamentoconjun-
to do foco de atenção sobre uma pessoa, objeto
ou evento específico no ambiente. São justamente
as repercussões (“ecos”) destes estados comunica-
dos pelo parceiro que tornam possível ao bebê
confrontar e relacionar as experiências que possui
de seu mundo privado com as do mundo alheio.
O bebê parece, então, desde muito cedo,
ser um participante ativo de um processo de
comunicação inicialmente facilitado por jogos de
interação face-a-face com sua mãe. Durante as
suas primeiras semanas de vida, o bebê já pode
apresentar uma forma primitiva de intersubjetivi-
dade, apoiada inicialmente em um repertório ainda
limitado e restrito de atividades, como o olhar e o
tocar. É ao longo do processo de desenvolvimento
da criança que a intersubjetividade vai assumindo
formas cada vez mais complexas em interações,
uma vez que a bagagem de competências do bebê
vai se ampliando, passando a incluir a capacidade
de focalizar a atenção ao outro, aos objetos e
eventos presentes no meio.
Com esses pressupostos, Rochat e Striano14
apresentam vários níveis de intersubjetividade e
condutas associadas, os quais denominam res-
pectivamente como período atencional, período
contemplativo e período intencional.
O período atencional corresponde às seis
primeiras semanas vividas pelo bebê após seu nas-
cimento, havendo a manifestação de uma sensi-
bilidade inata para estímulos sociais e certa
sintonia social, mas sem características explícitas
de intersubjetividade. Embora possam apresentar
indícios de uma diferenciação ainda rudimentar
e limitada entre o self e o ambiente, bebês neste
período não apresentam evidências explícitas de
consciência de si e de outros.
O período contemplativo está presente a
partir do segundo mês de vida, momento em que
os primeiros sinais de experiência compartilhada
começam a ser esboçados. Neste período pode
ser caracterizada uma intersubjetividade primária,
tal como Trevarthen e Hubley9
definiram, onde o
bebê, ao interagir com a mãe, começa a apresentar
indíciosdeumacapacidadedeorientarsuaatenção
para o rosto dela e atender às suas solicitações.
Tais atividades observadas inicialmente em um
contexto diádico de interações precoces ilustram a
chamada “revolução do segundo mês” na qual se
dá a emergência de um senso de experiência com-
partilhada (identificada aqui como sendo o próprio
conceito de intersubjetividade) e o início de uma
reciprocidade mais explícita com outros, configu-
randoumatransiçãoimportantenodesenvolvimen-
tocognitivosocial.Estemomentocaracterizaainda
o surgimento de um tipo de sorriso diferente
daquele com qualidades reflexas exibido por re-
cém-nascidos.Trata-sedosorrisosocial,cujafonte
de desencadeamento ou motivação é externa ao
bebê e passa a ser dirigido por ele a pessoas ou
eventos específicos no ambiente.
A intersubjetividade primária, que se
apresenta inicialmente em um contexto diádico,
sofre mudanças gradativas no decorrer do de-
senvolvimento do bebê, de modo que em torno
dos quatro meses de vida começam a surgir as
primeiras condutas que irão contribuir para a
futura emergência de uma intersubjetividade
secundária, havendo maior participação em jogos
e trocas mediadas por objetos.
Com relação ao início do período inten-
cional, este transcorre a partir dos nove meses de
idade e pode ser caracterizado por uma maior
sofisticação da capacidade do bebê em interagir de
maneira recíproca com seus parceiros e compar-
tilhar com eles suas experiências. As interações
triádicas(pessoa-pessoa-objeto)ganham destaque,
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
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umavezqueobebêapresentacapacidadededirigir
seu foco de atenção para pessoas e objetos,
podendocoordenaroumonitorarofocodeatenção
de seus parceiros em relação a estes últimos.
O desenvolvimento da intersubjetividade
parece ser importante para o surgimento gradativo
deumacompreensãoacercadasintençõesecrenças
que orientam comportamentos de outras pessoas,
permitindoqueestesúltimospossamsermonitora-
dos ou preditos em algum nível. Neste sentido, a
capacidadedacriançaemsecolocarnaperspectiva
do outro e predizer qual seria sua ação, sentimento
oureaçãopossivelmenteexperimentadosemdeter-
minada situação constitui uma tarefa necessária
para a aquisição de uma teoria da mente, a qual se
torna mais explícita a partir dos três anos de idade.
Integrando Diferentes Perspectivas Teóricas:
intersubjetividade e desenvolvimento infantil
Diante da discussão até o momento apre-
sentada, pode-se indagar: Como a criança chega
à intersubjetividade? Esta pergunta levantaria
diferentes respostas entre os autores abordados.
Para Trevarthen7
, o bebê teria uma capa-
cidade inata para comunicação em trocas sociais,
de modo que desde o seu nascimento já apresen-
taria subjetividade, entendida pelo autor em
termos de consciência e intencionalidade.Apartir
de trocas sociais inicialmente diádicas e pos-
teriormente triádicas, o bebê também poderia
regular sua subjetividade às subjetividades de seus
parceiros de maneira a apresentar precocemente
intersubjetividade. Em um primeiro momento,
esta última envolveria o reconhecimento e a
coordenação de intenções nas trocas mãe-bebês,
experimentadas em termos de afeto e recipro-
cidade e, em um segundo momento, por volta dos
oito ou nove meses, a coordenação da atenção e
intenção em trocas triádicas (mãe-bebê-objeto).
Stern12
, por sua vez, não considera inata a
capacidade subjetiva de consciência e intenciona-
lidade.Ao contrário, refere um processo gradual
em que as experiências subjetivas vão sendo
organizadas, constituindo diferentes sensos de eu-
outro com base em aprendizagens e processos
interativos. Inicialmente, não haveria intersubje-
tividade. Esta é identificada pelo autor como
possível apenas por volta dos sete a nove meses
deidade,momentoemqueobebêcomeçaadesen-
volver o senso de eu subjetivo, quando finalmente
subjetividade e intersubjetividade são atingidas,
embora sem um envolvimento de consciência.
Rochat e Striano14
enfatizam o papel das
interações iniciais para o surgimento e desenvol-
vimento da intersubjetividade infantil. Diferen-
temente da perspectiva de Trevarthen15
e aproxi-
mando-se um pouco das primeiras impressões de
Stern12
, estes autores não consideram consciência
e intencionalidade como qualidades inatas, assim
como a intersubjetividade.Apontam que, embora
esta última possa existir em algum nível implícito
ou rudimentar, não há evidências suficientes para
considerá-la como estando seguramente presente
desde o nascimento. Por outro lado, os argumen-
tos de Rochat e Striano14
aproximam-se das
colocações de Trevarthen15
e se afastam das
formulações teóricas de Stern12
no que se refere
à aceitação da existência de uma intersubjeti-
vidade primária, manifesta por volta dos dois
meses de idade em trocas sociais diádicas. A
seguir, é apresentada a Tabela 1 que esboça as
três perspectivas discutidas de modo comparativo.
De um modo geral, as diferentes perspectivas
apresentam uma discussão alternativa para a
compreensão do modo como gradativamente os
bebês vão alternando a distribuição da sua
atenção entre o mundo físico e o mundo social,
de modo a desenvolverem competências rela-
cionadas a um contexto triádico.
Tabela 1 - Diferentes Perspectivas Ontogenéticas sobre Intersubjetividade
Autores
Trevarthen (1974;1978)
Stern (1992)
Rochat e Striano (1999)
Períodos do desenvolvimento infantil
Nascimento
Capacidade inata para intersubjetividade
Sem evidências de intersubjetividade
inicial; Senso de eu emergente
Intersubjetividade ainda não explícita;
Período atencional
2 meses
Intersubjetividade primária
Não faz referência à
intersubjetividade; Senso de
eu nuclear
Intersubjetividade primária;
Período contemplativo
8/9meses
Intersubjetividade secundária
Intersubjetividade secundária;
Relacionar-se intersubjetivo;
Senso de eu subjetivo
Intersubjetividade secundária;
Período intencional
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
136
Stern12
hipotetiza que a intersubjetividade
pode ser atingida a partir da contribuição simul-
tânea de diferentes fatores: aquisições gradativas
de diversas potencialidades do bebê ao longo de
seu desenvolvimento, seu engajamento em trocas
sociais significativas e desenvolvimento de vín-
culos afetivos e de apego. Estes últimos seriam
vistos como recursos de uma natureza humana
predominantemente social, capazes de garantir a
sobrevivência da espécie.
Tais argumentos se assemelham às hipó-
teses de Rochat16
. Para este autor, os bebês recém-
nascidos apresentam um conjunto de competên-
cias que os tornam de algum modo sensíveis ao
universo social, parecendo nascerem preparados
para prestar atenção a pessoas.Tal bagagem inata
é percebida e estimulada pelos adultos cuidadores
com os quais o bebê interage. Estas interações
precoces, em geral de natureza face-a-face, pas-
sam por transformações ainda no primeiro ano
de vida do bebê. Isto porque os bebês, conforme
vão realizando algumas conquistas relativas a ha-
bilidades sensoriais, perceptivas e motoras,
passam a deslocar o seu foco de atenção (inicial-
mente voltado a seus parceiros) para os objetos e
eventos presentes no ambiente. Assim, ao invés
de só atentarem para seus cuidadores, os bebês
expandem o mundo sobre o qual prestam atenção,
podendo manipular e agir sobre os objetos.
Embora haja um aumento de interesse pelo
mundo físico, os bebês não se tornam alheios ao
mundo social, mantendo comportamentos respon-
sivos e de reciprocidade com seus parceiros. Tal
fato é identificado em um estudo descrito por
Rochat16
no qual foi observado que bebês com
quatro meses de idade tendem a apresentar uma
diminuição quanto ao número de episódios em que
estabelecem contatos oculares de longa duração
com seus cuidadores, passando a utilizar olhares
rápidos e alternados entre estes parceiros e os obje-
tos do meio como forma de distribuir a atenção.
Esta alternância do foco de atenção do bebê
entre objeto e parceiro social parece se dar como
uma tentativa de monitorar a proximidade relativa
a pessoas. Neste sentido, pode-se pensar como
se dá o processo de transição da intersubjetividade
primária à secundária. A proximidade social tão
evidente na intersubjetividade primária carac-
teriza um aspecto essencial de dependência do
bebê em relação ao outro para a sua sobrevivên-
cia. No entanto, esta mesma sobrevivência
depende de que o bebê seja capaz de atingir con-
quistas sensoriais e motoras, a fim de garantir
maiores possibilidades de locomoção e exploração
no ambiente. Este fato marcaria uma contradição,
porque consequentemente envolveria um afasta-
mento do bebê em relação ao adulto.
Curiosamente relacionado a este processo,
Rochat16
chama a atenção para a existência de
um vínculo afetivo de exclusividade entre o bebê
e os seus cuidadores em torno dos oito meses de
idade, ou seja, em um período anterior ao estabe-
lecimento deste contexto triádico explícito que
caracteriza uma intersubjetividade secundária.Tal
comportamento de apego poderia ser interpretado
como uma condição necessária para o bebê da
espécie humana desenvolver uma capacidade de
coordenação entre sua atenção voltada ao mundo
social (cuidadores) e ao mundo físico (objetos)
através do desenvolvimento de comportamentos
de atenção conjunta, a partir dos quais podem
ser estabelecidos episódios de cooperação e
engajamento compartilhado.Ao desenvolver tais
comportamentos, os bebês teriam maiores
chances de sobrevivência, na medida em que a
proximidade do outro ofereceria uma oportuni-
dade do mundo lhe ser gradativamente apre-
sentado, garantindo maior segurança e proteção
nestas tentativas de exploração.
Rochat16
hipotetiza, então, que parece estar
presente uma solução adaptativa, caracterizada
pela capacidade do bebê em desenvolver um
conjunto de comportamentos que permitem a ele
gradativamente integrar os seus parceiros sociais
a seus interesses de exploração dos objetos. Isto
caracterizaria um contexto triádico, onde compor-
tamentos de atenção conjunta podem ser utili-
zados (por exemplo: seguir o olhar, apontar ou
utilizar o outro como referência social).
Os próprios adultos com os quais o bebê
interage são ativos neste processo, ao apresen-
tarem o meio como algo interessante e seguro para
o bebê, através de gestos como o mostrar ou
apontar para alguns objetos ou eventos presentes
no ambiente. Assim, ao desenvolverem uma
intersubjetividade secundária, os bebês parecem
Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
137
exibir um conjunto de comportamentos que
indicam uma capacidade, mesmo que rudimentar,
de sintonizar com o foco de atenção do outro ou
de fazê-lo sintonizar com o seu próprio no
estabelecimento de interações triádicas.
A busca por uma correspondência entre
experiências privadas e as dos outros parceiros
parece ser a base para o desenvolvimento de uma
cognição social, onde levar em conta a perspectiva
do outro e coordená-la com a sua própria parece
ser possibilitada apenas com o desenvolvimento
da intersubjetividade. Assim, no contexto de
trocas sociais triádicas, são expressões ou evi-
dências de intersubjetividade alguns comporta-
mentos específicos, tais como: foco de atenção
compartilhado entre mãe e bebê, atividades de
mostrar algum objeto ou pessoa, apontar, imitar,
dentre outros. É esta gama de comportamentos
que se considera como atenção conjunta4
. A
emergência e o desenvolvimento de compor-
tamentos desta natureza estão intimamente rela-
cionados ao processo pelo qual os bebês atingem
uma intersubjetividade secundária.
Após esta tentativa de discussão e integra-
ção entre as diferentes perspectivas apresentadas,
pode-se argumentar que, se por um lado as hipó-
teses sobre a origem da intersubjetividade diver-
gem, por outro há um consenso básico: sendo inata
ou não, a intersubjetividade envolve um processo
que somente se desenvolve e se complexifica se
houver um contexto de troca com outro. Deste mo-
do, ao mesmo tempo em que a intersubjetividade é
dependente do contato social, ela também o funda-
menta,permitindoqueosparceirospossammutua-
mente ajustar suas ações comunicativas em algum
nível. É esta característica de sensibilidade social
evidenciada pela intersubjetividade que permite
uma maior compreensão do estabelecimento e
desenvolvimento de outros processos, tais como
interação social, afetividade e comunicação entre
osparceiros.Apesardarelevânciadestetema,tem-
se observado que a intersubjetividade tem sido
abordada mais amplamente apenas como um
constructo teórico, tornando-se um desafio para
os pesquisadores em psicologia do desenvolvi-
mento investigá-la empiricamente, especialmente
nodecorrerdosprimeirosmesesdevidadosbebês.
Há, portanto, a necessidade de que estudos em-
píricos sobre o tema possam ser realizados e, em
particular, de estudos brasileiros.
Abstract: The intersubjectivity concept has been approached according to different
interpretations in Psychology. The aim of this article is to present some theoretical bases pertaining
to this concept, pointing out how its use has been treated by early child development studies in
the last decades. We discuss and compare different theoretical perspectives that approach the
function of intersubjectivity and of social interaction in child development. These perspectives
may contribute to a conception of intersubjectivity as an inherent aspect in basic processes that
involve reciprocity, such as early communication, social interaction, and affectivity.
Keywords: Intersubjectivity. Social interaction. Early child development.
REFERÊNCIAS
1. Penteado JRW. A técnica da comunicação
humana. São Paulo: Pioneira; 1993.
2. Joppling D. Cognitive science, other minds
and the philosophy of dialogue. In: Neisser U,
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Cambridge University Press; 1993. p.290-309.
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revolution. In: Rochat P, editor. Early social
cognition: understanding others in the first
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month-old. New Scientist 1974; 2: 230-5.
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Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al.
138
infant intersubjectivity. In: Braten S, editor.
Intersubjectivity communication and emotion
in early ontogeny. Cambridge: Cambridge
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8. Bateson MC. The interpersonal context of
infant vocalization. Quarterly Progress Report
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1971; 100: 170-6.
9. Trevarthen C, Hubley P. Secondary
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acts of meaning in the first year. In: Lock A,
editor. Action, gesture and symbol: the
emergence of language. London: Academic
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10. Piaget J. The first year of life of the child. In:
Gruber HE, Vonèche JJ, editors. The essential
Piaget: an interpretive reference and guide.
Northvale/London: Jason Aronson; 1996.
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11. Seidl de Moura ML, Ribas AFP. Evidências
sobre características de bebês recém-nascidos:
um convite a reflexões teóricas. In: Seidl de
Moura ML, editor. O bebê do século XXI e a
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Casa do Psicólogo; 2004. p.21-59.
12. Stern D. O mundo interpessoal do bebê. Porto
Alegre: Artes Médicas; 1992.
13. Mahler M. As psicoses infantis e outros
estudos. Porto Alegre: Artes Médicas; 1983.
14. Rochat P, Striano T. Social-cognitive
development in the first year. In: Rochat P,
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others in the first months of life. Mahwah,
New Jersey & London: Lawrence Erlbaum;
1999. p.03-34.
15. Trevarthen C. Modes of perceiving and modes
of acting. In: Pick JH, editor. Psychological
modes of perceiving and processing
information. New Jersey: Erlbaum; 1978.
p.99-136.
16. Rochat P. The infant’s world. Cambridge:
Harvard University Press; 1991.
Recebido em 18/12/2006
Aprovado em 18/04/2007

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Intersubjetividade e desenvolvimento infantil: perspectivas teóricas

  • 1. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 128 Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138 ATUALIZAÇÃO CURRENT COMMENTS INTERSUBJETIVIDADE: PERSPECTIVAS TEÓRICAS E IMPLICAÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL INICIAL1 INTERSUBJECTIVITY: THEORETICAL APPROACHES AND IMPLICATIONS FOR EARLY CHILD DEVELOPMENT Susana Engelhard Nogueira Maria Lucia Seidl de Moura INTRODUÇÃO As relações humanas envolvem, para serem estabelecidas, um esforço contínuo de comu- nicação. É através dela que se dá a possibilidade de compartilhar idéias e experiências com base em um plano interpessoal. Entender a comu- nicação como um processo de transferência de significados de um sujeito para outro exige pensá- la como mais do que mera transmissão de dados. Comunicação requer, tanto das pessoas que oferecem pistas ou informações acerca de seus estados internos (mentais e afetivos) quanto daquelas que as captam, o envolvimento de certas habilidades cognitivas a fim de que o intercâmbio de significado seja estabelecido. Para Penteado1 , o processo de comuni- cação humana pressupõe alguns pontos es- senciais: o envolvimento conjunto de parceiros, Nogueira SE, Moura MLSd. Intersubjetividade: Perspectivas teóricas e implicações para o desenvolvimento infantil inicial. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum 2007; 17(2): 128-138. Resumo: O conceito de intersubjetividade tem sido abordado segundo diferentes interpretações no campo da Psicologia. Este artigo tem como objetivo apresentar fundamentos teóricos desse conceito, apontando sua utilização em estudos sobre o desenvolvimento infantil inicial nas últimas décadas. Busca-se ainda discutir e comparar diferentes perspectivas teóricas que abordam o papel da intersubjetividade e da interação social no desenvolvimento infantil. Entende-se que as perspectivas discutidas não esgotam plenamente o tema, mas contribuem para uma reflexão sobre como a intersubjetividade pode ser vista como aspecto indissociado de processos básicos que envolvem reciprocidade como a comunicação inicial, interação social e afetividade. Palavras-chave: Intersubjetividade. Interação social. Desenvolvimento infantil inicial. * Este artigo teve sua origem a partir da dissertação de mestrado intitulada “Atenção conjunta e intersubjetividade em crianças autista e com desenvolvimento típico: Um estudo longitudinal e um estudo comparativo”, elaborada pela primeira autora e orientada pela segunda, no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, 2005. susiengelhard@yahoo.com.br significados compartilhados, e natureza simbó- lica. Dentro deste contexto, tal processo está inti- mamente relacionado a possibilidades de trocas intersubjetivas, sendo importante pensar como se caracterizam os primórdios da intersubjetividade no desenvolvimento humano. O conceito de intersubjetividade tem sido utilizado com base em diferentes interpretações. Isto porque, de acordo com Joppling2 , este conceito tem ocupado lugar em debates filosóficos acerca da dimensão social da consciência humana, além de envolver discussões sobre outros temas relacionados, como impulsos morais, religiosos, significado compartilhado e autoconsciência. Braten3 aponta que o conceito de intersub- jetividadetememergidoexplícitaeimplicitamente como denominador comum de abordagens sobre engajamentos interpessoais na infância inicial, ao levar em conta uma discussão sobre as pos-
  • 2. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 129 sibilidades de compreensão por parte da criança acerca do universo privado (pensamentos e sen- timentos) de outros. Este autor ressalta que intersubjetividade pode assumir três significados distintos: 1) como senso de “comunhão” ou co- participação interpessoal3 , estabelecido a partir do engajamento conjunto de pessoas, que mutuamente se ajustam e sintonizam expressões e estados afetivos; 2) como envolvendo compor- tamentos de atenção conjunta (sujeito-sujeito- objeto) e domínios compartilhados de conversa- ção lingüística4 ; e, 3) como compreensão da comunicação mediada por (meta) representações, possibilitando a realização de inferências sobre intenções, crenças e sentimentos alheios5 , além de capacidade para imaginar, simular e “ler” estados mentais de outros. Na década de 1970, observações de díades mãe-bebê mostraram que este último desde muito cedo é capaz de exibir engajamentos sociais com seus parceiros envolvendo a participação de expressões faciais. Esta descoberta impulsionou o desenvolvimento de pesquisas e a procura por uma teoria satisfatória acerca da mente infantil. É neste contexto que se destacam as contribuições de Colwyn Trevarthen3 . Trevarthen6 foi um dos primeiros pes- quisadores a se dedicar a estudos que reportam como a intersubjetividade pode estar presente nos primeiros meses de vida do bebê. Este autor estu- dou como a comunicação entre mãe e bebê é esta- belecida durante os seis primeiros meses de idade deste último. Ele observou que, já a partir dos dois meses, os bebês são capazes de exibir dife- renças significativas quanto às respostas dadas a objetos e pessoas, exibindo diferentes comporta- mentos com base no corpo, mãos e face quando em presença de sorrisos e vocalizações de suas mães. Da mesma maneira, diferenças também foram observadas nas respostas oferecidas pelas mães aos seus bebês, parecendo haver um estilo de atividade mútua específico à díade. Para chegar a esta discussão, Trevarthen7 considerou a importância dos estudos desenvol- vidos inicialmente por Mary Catherine Bateson8 sobre protoconversações entre mães e bebês. Esta autora estudou bebês com idades entre sete e quinze semanas, na presença de suas mães, e observou que os membros desta díade colabora- vam entre si a partir de um padrão mais ou menos alternado de comunicação. As mães tendiam a falar sentenças breves com seus bebês, que lhes respondiam através de vocalizações. Juntos, estes parceiros pareciam apresentar um padrão de comunicação similar a uma conversação, a que a autora denominou de protoconversação. Partindo destas contribuições, Trevarthen6 realizou análises minuciosas de registros em vídeo de díades mãe-bebê e observou que bebês recém- nascidos apresentavam comportamentos coe- rentes, manifestando movimentos expressivos de boca, mãos e olhos com ritmos específicos e em sintonia à fala materna.Tais análises contribuíram para que este autor argumentasse sobre a existência de uma ritmicidade intrínseca essencial na intercoordenação destas protoconversações. Ao invés de apenas constituírem respostas com- portamentais aparentemente reflexas, as ativi- dades de olhar mútuo e sorriso passaram a ser vistas como características deste processo, ao serem utilizadas para regular o contato interpes- soal. Desta forma, já seria possível observar indícios de uma comunicação entre estes parceiros desde períodos precoces da vida do bebê. Dentro deste contexto, Trevarthen6 obser- vou que recém-nascidos saudáveis tendiam a responder com expressões e comportamentos a seus parceiros, os quais, por sua vez, também tendiam a atribuir significado a estes últimos em termos de intenções e sentimentos. Tal dinâmica comunicativa parece indicar que os adultos com os quais o bebê interage são capazes de fazer referência direta à existência de uma vida pessoal subjetiva em períodos precoces do desenvolvi- mento infantil. Ao reunir evidências de pesquisas sobre o cérebro e de suas análises acerca de protoconver- sações estabelecidas por mães e seus bebês na idade de dois meses, este autor considera que estes últimos são dotados de um sistema cerebral que os capacita a apresentar sintonia responsiva em engajamentos regulados emocionalmente com outros. Esta capacidade inata para estabelecer engajamentos diádicos precoces foi por ele denominada de intersubjetividade primária. O fundamento básico do qual o autor se
  • 3. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 130 utiliza para caracterizar a existência de uma intersubjetividade precoce envolve a idéia de que existe intencionalidade coerente e consciência ativa na criança desde o seu nascimento. Assim, segundo ele, o bebê já nasce com uma capacidade socioemocional primária de participar afetiva- mente de engajamentos sociais recíprocos e de aprender através deles. Neste sentido, para que os bebês possam compartilhar estados mentais com outros parceiros é necessária a participação de duas habilidades. A primeira refere-se à ca- pacidade de exibir aos outros algumas evidên- cias, mesmo que rudimentares, de consciência e intencionalidade, identificadas como um atributo denominado subjetividade.Asegunda envolve a necessidade dos bebês serem capazes de adaptar ou ajustar suas subjetividades às subjetividades de outros, demonstrando intersubjetividade. Trevarthen6 compreende a intersubjeti- vidade como envolvendo o reconhecimento e a coordenação de intenções presentes nas comuni- cações mãe-bebê. Para isto, seria necessária a ocorrência simultânea de duas atividades: a ado- ção de um foco compartilhado de atenção por ambos os parceiros, e uma concordância quanto à natureza da comunicação. Durante o período pré-linguístico de vida do bebê, a atividade de compartilhar dá-se de maneira inerente ao con- texto de expressões afetivas das interações diá- dicas (intersubjetividade primária). Com isso, a intersubjetividade é vivida em termos de afetos presentes nas interações. Levar em conta tais atividades implica um reposicionamento sobre o modo de conceber a linguagem como única fonte para uma comunicação social. A idéia da existência de uma intersubje- tividade infantil envolve uma teoria sobre como as mentes humanas podem reconhecer intuiti- vamente significados e impulsos umas nas outras, com ou sem elaborações simbólicas ou cognitivas. Trevarthen7 observou alguns aspectos importan- tes que serviriam como base para formular e apoiar esta teoria da intersubjetividade infantil. Dentre estes aspectos, ele destacou os seguintes: com um mês de vida, bebês exibem padrões de comportamento diferentes em relação a objetos e pessoas. Com os objetos, os comportamentos tendem a ser de exploração e manipulação, en- quanto com pessoas, parecem envolver reciproci- dade e comunicação. Por volta dos dois ou três meses, expressões emocionais de ambos os parceiros podem acompanhar o estabelecimento de protoconversações. Nos primeiros seis meses de vida do bebê, este padrão de comunicação desenvolve-se, passando a apresentar caracterís- ticas e expectativas de reciprocidade, o que não ocorre na relação com objetos. As emoções são utilizadas nestas trocas não como reguladoras propriamente do self infantil, mas como pistas para o contato interpessoal e relacionamento. Após os seis meses de idade do bebê, começam a surgir evidências de comportamentos de compartilhar interesses, havendo a possibi- lidade de integração do mundo dos objetos com o mundo social (início de interações triádicas). Já por volta dos nove meses de idade, observa-se uma transformação. A díade mãe-bebê é capaz de incluir em suas interações um terceiro elemento (objeto, pessoa ou evento interessante no ambien- te) em uma referência compartilhada, constituindo interações triádicas, a que Trevarthen e Hubley9 nomeiam de intersubjetividade secundária. Esta última parece ser crucial para o desenvolvimento de habilidade de atenção conjunta, interesse compartilhado e tarefas cooperativas. Ao considerar a existência de uma inter- subjetividade precoce em bebês, este argumento de Trevarthen7 encontrou rejeição e ceticismo inicial no campo científico ao divergir radical- mente das hipóteses tradicionais sobre egocentris- mo propostas por Jean Piaget10 . Na perspectiva de Trevarthen7 , o termo intersubjetividade envo- lveria o bebê identificar o outro e a si mesmo como sujeitos da experiência o que, por sua vez, envolveria intencionalidade. Para o autor, os comportamentos observados na infância inicial marcariam uma capacidade inata para comu- nicação assumida nas trocas face-a-face entre mãe e bebê. Neste sentido, o que estaria em jogo não seria tanto questionar se o desenvolvimento infantil envolve aprendizagem ou dependência de cuidados, e sim, a idéia de que o bebê já nasce com competências que o capacitam a revelar e negociar intenções, emoções, experiências e significados estabelecidos nas relações com o outro.
  • 4. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 131 De uma maneira geral, é possível argu- mentar que, apesar do bebê recém-nascido apre- sentar um repertório de capacidades limitado, ele parece vir ao mundo dotado de uma bagagem inata que lhe permite expressar uma sensibilidade social. Assim, algumas competências precoces relacionadas à atenção e discriminação encon- tram-se envolvidas neste processo e parecem capacitar o bebê a responder seletivamente aos eventos sociais11 . Intersubjetividade e Interação Social: contribuições de algumas perspectivas contemporâneas Os Diferentes Sensos de u e de outro Stern12 dedicou-se a investigar a existência de uma vida subjetiva em bebês, buscando compreender como estes vivenciam a si mesmos e aos outros, criando desde cedo um mundo inter- pessoal. Neste contexto, o autor formulou sua hipótese de uma experiência subjetiva de bebês, tentando articular as contribuições de dois campos distintos e por muito tempo separados: o das pesquisas experimentais sobre bebês e suas potencialidades, e o das inferências clínicas acerca da experiência subjetiva infantil. Ao longo do desenvolvimento, o bebê pode experimentar mudanças significativas com rela- ção às suas experiências subjetivas de eu e de outro. Segundo o autor12 , tais experiências subje- tivas consistem em diferentes “sensos de eu”. Ele propõe que a idéia de senso de eu pode ser com- preendida como uma forma de organização que pode inicialmente existir em formas pré-verbais, sem o envolvimento de consciência, mas que mais tarde será verbalmente identificada por “eu”. Gradativamente, conforme novos compor- tamentos e capacidades vão sendo conquistados pelo bebê, seu repertório vai sendo reorganizado no sentido de formar outras experiências sub- jetivas organizadoras em relação ao eu e ao outro. É neste contexto que o autor argumenta que se dá o surgimento e desenvolvimento de novos sen- sos de eu. Stern12 alerta para o fato de que os diferen- tes sensos de eu ao longo do desenvolvimento infantil não correspondem a fases que se superam ou que são mutuamente excludentes e sim, que coexistem como ativas por toda a vida humana. Neste sentido, descreve os seguintes sensos de eu: senso de eu emergente, senso de eu nuclear, senso de eu subjetivo e senso de eu verbal. O senso de eu emergente é descrito como presente inicialmente no período que vai do nascimento até os dois meses de idade do bebê, em que não há uma confusão eu-outro ou um estado de indiferenciação. Para o autor, o bebê parece estar ativamente formando um senso de eu, vivenciando diferentes oportunidades de experiência, que ainda são sentidas como sepa- radas e não relacionadas, havendo necessidade da realização de uma integração. Quando ocorre um encadeamento lógico entre suas experiências, ou ainda, quando elas passam a ser assimiladas ou conectadas de alguma forma, o bebê começa a ter a emergência de uma organização, que nada mais é, segundo Stern12 , do que uma forma de aprendizagem. Neste sentido, no período de zero a dois meses, os bebês não são passivos, mas estão intensamente engajados em experiências sen- soriais que constituem oportunidades de apren- dizagem importantes. Com isso, ocorre uma busca ativa e gradual de ordenação dos elementos de suas experiências relacionadas tanto ao eu quanto ao outro. Estas últimas, quando integradas, irão conduzir a uma organização subjetiva nova, denominada senso de eu nuclear. O senso de eu nuclear é descrito por Stern12 como estando presente inicialmente no período de dois a seis meses de vida do bebê. Para ele, em contraste com algumas perspectivas que consi- deram o bebê em um estado de indiferenciação eu-outro13 , neste período o bebê experimenta o seu corpo como uma entidade física, separada, intencional e dotada de vida afetiva e história própria. Além disso, os bebês estão ativamente envolvidos com a criação de um mundo inter- pessoal ao se mostrarem interessados e engajados em interações sociais. Neste sentido, os bebês possuem a expe- riência subjetiva de se sentirem separados fisicamente de suas mães, ambos como agentes diferentes e com experiências afetivas distintas. As experiências subjetivas organizadoras de um
  • 5. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 132 senso de eu nuclear referem-se à auto-agência (sentir-se como autor de suas ações e não-autor das ações alheias, controle de suas ações e expec- tativa de conseqüências acerca das mesmas); autocoerência (senso de ser um todo físico, não fragmentado e como ponto de ação integrada, movendo-se ou imóvel); auto-afetividade (viven- ciar qualidades internas afetivas com base em suas experiências) e auto-história (senso de conti- nuidade de si, apesar das mudanças que possam ocorrer, além de identificação de regularidades no curso de eventos). Tais experiências subjetivas organizadoras são resultantes do contato do bebê com o outro. Neste período, diante da presença deste último é comum o bebê se engajar em algumas atividades, como o brincar de “esconde-esconde” ou “eu vou te pegar”. Durante estas atividades, são vários os estados experimentados pelo bebê: excitação, suspense, alegria, prazer, medo, dentre outros. Em ciclos repetitivos, as características e modula- ções destas brincadeiras dirigidas pelo outro ao bebê oferecem a este último experiências particu- lares de intensidade de afeto que podem ser regula- das pelo parceiro. Assim, a partir da mediação interativa com o outro, o bebê pode ter a sua aten- ção, curiosidade e engajamento cognitivo regula- dos, o que significa considerar que suas auto- experiências são dependentes deste contato social. Entre os sete e nove meses de idade, Stern12 aponta que algo novo parece acontecer. Os bebês parecem “descobrir” que suas experiências sub- jetivas particulares podem ser compartilhadas com o outro, seja em termos de intencionalidade (querer algo) ou afetividade (sentir algo), embora ainda sem um envolvimento de consciência. Para que isso seja possível, o autor ressalta que os bebês precisam realizar uma conquista cognitiva importante: a idéia de que, assim como eles, outras pessoas possuem mentes distintas e separadas. O eu e o outro deixam de ser puramente sentidos como entidades físicas distintas (nucleares) para incluir estados mentais subjetivos.Assim, ambos podem ser compreendidos como tendo afetos e intenções que orientam seus comportamentos. Surge, portanto, uma nova forma de orga- nização denominada senso de eu subjetivo, com base na qual o bebê encontra oportunidade de relacionar-se intersubjetivamente, ou seja, apre- sentar intersubjetividade. Stern12 pontua que somente neste período a intersubjetividade faz- se possível, entendendo-a como uma capacidade para interpretar, combinar, comparar e sintonizar com os estados mentais de outra pessoa. Ao perceber que os outros podem ter uma mente dis- tinta da sua, mas com estados mentais poten- cialmente semelhantes aos seus, o bebê pode atingir a possibilidade de comunicar isto sem pala- vras, compartilhando suas experiências subjetivas por meio de gestos, postura ou expressões faciais. Aidéia de um relacionar-se intersubjetivo de Stern12 aproxima-se da idéia de intersubjeti- vidade secundária proposta por Trevarthen e Hubley9 na medida em que as experiências subje- tivas a serem compartilhadas envolvem um con- texto triádico relacionado a um evento, pessoa ou objeto. Ao não implicar necessariamente a participação da linguagem, este novo senso de eu apóia-se em algumas competências específicas como compartilhar o foco de atenção, compar- tilhar intenções e estados afetivos, dentre outras. Mais tarde, em torno dos quinze a dezoito meses de idade, o bebê começa a experimentar uma nova forma de organização subjetiva. Trata- se do senso de eu verbal. Este último é carac- terizado por uma mudança importante: o bebê passa a comunicar toda a sua bagagem de expe- riências e conhecimentos acumulados ao longo de seu desenvolvimento de uma maneira mais objetivada, ou seja, através do uso da linguagem. Deste modo, a partir do desenvolvimento da capacidade de representação por símbolos, signi- ficados agora podem ser comunicados, negocia- dos e compartilhados de outra maneira. Neste cenário, o brinquedo simbólico, a capacidade de tomar o eu como objeto de reflexão e a possibili- dade de realizar narrativas pessoais tornam-se possíveis, marcando uma forma de relacionar-se com o outro e com a cultura a partir de uma natureza verbal. É interessante notar que Stern12 apresenta em suas formulações teóricas a idéia de que, desde períodos precoces do desenvolvimento infantil, o bebê está longe de se ver envolvido em um processo de indiscriminação e indissociação eu- outro. Para ilustrar seus argumentos, o autor se
  • 6. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 133 utiliza inclusive das contribuições da literatura acerca das competências iniciais de recém-nas- cidos. Com base neste repertório de potenciali- dades precoces, o autor destaca a importância da sensibilidade e engajamento humanos em trocas sociais, por meio das quais o bebê gradativamente vai realizando conquistas cognitivas e afetivas, capazes de conduzi-lo a novas e mais complexas formas de organização subjetiva eu-mundo. Apesar destas considerações, Stern12 distancia- se em parte dos argumentos de Trevarthen7 não somente ao considerar que os bebês não apre- sentam consciência e intencionalidade inatas, como também que os mesmos só são capazes de apresentar intersubjetividade bem mais tardia- mente (por volta dos nove meses), cujas caracte- rísticas corresponderiam à intersubjetividade secundária9 . Cognição Social e os Vários Níveis de Intersubjetividade Rochat e Striano14 buscaram considerar as contribuições de vários estudos acerca das com- petências iniciais infantis, argumentando que os bebês humanos são criaturas sociais desde seu nascimento. Ao pensarem no processo de desen- volvimento das habilidades sociais infantis, os autores partem da pressuposição básica de que a criança precisa apresentar comportamentos que minimamente esbocem a emergência e o desen- volvimento da compreensão de pessoas, e não somente o desenvolvimento de seu conhecimento sobre o mundo físico. Quando esta pressuposição é assumida, tem-se como conseqüência a idéia de que pessoas são mais complexas do que objetos, e que o desenvolvimento de um conhecimento social deverá estar baseado em processos especí- ficos que refletem tal complexidade. Estes autores argumentam que a noção de alguns princípios físicos (por exemplo: o fato de um objeto ter massa, ocupar lugar no espaço e não poder estar em dois lugares ao mesmo tempo) já parece estar presente nos primórdios do desen- volvimento infantil, apesar de bebês com idades variando entre dois a quatro meses de vida apresentarem limitações sobre suas possibilidades de atuação e exploração de objetos por conta de uma gama ainda muito restrita de capacidades como olhar, sugar, chorar, tocar e ouvir. Para Rochat e Striano14 este conhecimento de natureza física envolve uma obediência a leis, organização e regularidades, não encontrando necessariamente correspondência com um conhe- cimento de natureza social.Assim, a compreensão de pessoas (conhecimento do mundo social) envolve um processo mais sofisticado se compara- do ao conhecimento sobre o mundo físico. Os modos desenvolvidos pelo bebê para adquirir um conhecimento sobre pessoas não se reduzem aos mesmos utilizados para alcançar um conhecimen- to sobre o mundo físico. Este processo especial que envolve a busca pelo conhecimento ou enten- dimento acerca do mundo social recebe o nome de cognição social. A cognição social envolve a compreensão de um universo privado acerca do outro; uma sensibilidade em perceber, identificar e até respon- der a emoções, afetos, intenções e comporta- mentos. Estes autores ressaltam que a forma como as crianças desenvolvem uma compreensão social não se restringe apenas à observação isolada do comportamento de outras pessoas ou mantendo- se à parte das trocas sociais estabelecidas por elas. Essa cognição social desenvolve-se através do engajamento em trocas sociais, onde expe- riências podem ser compartilhadas através de reciprocidade14 . Deste modo, a cognição social está relacio- nada a um processo mais amplo através do qual indivíduos, a partir de interações sociais e re- ciprocidade, desenvolvem habilidades de moni- torar, controlar e predizer o comportamento de seus parceiros sociais. Com base nestes argu- mentos, tais autores consideram que é justamente a intersubjetividade que capta o sentido de experiência compartilhada que emerge da re- ciprocidade, concebendo-a como uma capaci- dade a partir da qual experiências internas ou mentais podem ser percebidas como passíveis de serem compartilhadas. A noção de intersubjetividade parece pres- supor ainda a idéia de uma diferenciação entre o self e o outro, onde atividades de comparar ou projetar experiências privadas sobre as experi- mentadas por terceiros tornam-se possíveis. Pode-
  • 7. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 134 se, a partir desta pressuposição, realizar a se- guinte indagação: De que maneira os bebês começam a relacionar sua experiência privada à experiência privada de outras pessoas? De acordo com os argumentos de Rochat e Striano14 , este início da cognição social seria possível a partir da intersubjetividade.Ao consi- derarem a possibilidade de uma vida subjetiva presente em bebês desde a mais tenra idade, os autores apontam que a intersubjetividade é justamente aquilo que emerge e se desenvolve a partir das primeiras trocas sociais, onde sentimen- tos, afetos e emoções podem ser compartilhados. Seguindo este raciocínio, as interações com pessoas passam a ser vistas como o modo pelo qual a intersubjetividade se desenvolve, já que é através destas trocas sociais que estados internos ou mentais de um parceiro podem ser comuni- cados, compartilhados e “ecoados” nos do outro, especialmentequandoháumengajamentoconjun- to do foco de atenção sobre uma pessoa, objeto ou evento específico no ambiente. São justamente as repercussões (“ecos”) destes estados comunica- dos pelo parceiro que tornam possível ao bebê confrontar e relacionar as experiências que possui de seu mundo privado com as do mundo alheio. O bebê parece, então, desde muito cedo, ser um participante ativo de um processo de comunicação inicialmente facilitado por jogos de interação face-a-face com sua mãe. Durante as suas primeiras semanas de vida, o bebê já pode apresentar uma forma primitiva de intersubjetivi- dade, apoiada inicialmente em um repertório ainda limitado e restrito de atividades, como o olhar e o tocar. É ao longo do processo de desenvolvimento da criança que a intersubjetividade vai assumindo formas cada vez mais complexas em interações, uma vez que a bagagem de competências do bebê vai se ampliando, passando a incluir a capacidade de focalizar a atenção ao outro, aos objetos e eventos presentes no meio. Com esses pressupostos, Rochat e Striano14 apresentam vários níveis de intersubjetividade e condutas associadas, os quais denominam res- pectivamente como período atencional, período contemplativo e período intencional. O período atencional corresponde às seis primeiras semanas vividas pelo bebê após seu nas- cimento, havendo a manifestação de uma sensi- bilidade inata para estímulos sociais e certa sintonia social, mas sem características explícitas de intersubjetividade. Embora possam apresentar indícios de uma diferenciação ainda rudimentar e limitada entre o self e o ambiente, bebês neste período não apresentam evidências explícitas de consciência de si e de outros. O período contemplativo está presente a partir do segundo mês de vida, momento em que os primeiros sinais de experiência compartilhada começam a ser esboçados. Neste período pode ser caracterizada uma intersubjetividade primária, tal como Trevarthen e Hubley9 definiram, onde o bebê, ao interagir com a mãe, começa a apresentar indíciosdeumacapacidadedeorientarsuaatenção para o rosto dela e atender às suas solicitações. Tais atividades observadas inicialmente em um contexto diádico de interações precoces ilustram a chamada “revolução do segundo mês” na qual se dá a emergência de um senso de experiência com- partilhada (identificada aqui como sendo o próprio conceito de intersubjetividade) e o início de uma reciprocidade mais explícita com outros, configu- randoumatransiçãoimportantenodesenvolvimen- tocognitivosocial.Estemomentocaracterizaainda o surgimento de um tipo de sorriso diferente daquele com qualidades reflexas exibido por re- cém-nascidos.Trata-sedosorrisosocial,cujafonte de desencadeamento ou motivação é externa ao bebê e passa a ser dirigido por ele a pessoas ou eventos específicos no ambiente. A intersubjetividade primária, que se apresenta inicialmente em um contexto diádico, sofre mudanças gradativas no decorrer do de- senvolvimento do bebê, de modo que em torno dos quatro meses de vida começam a surgir as primeiras condutas que irão contribuir para a futura emergência de uma intersubjetividade secundária, havendo maior participação em jogos e trocas mediadas por objetos. Com relação ao início do período inten- cional, este transcorre a partir dos nove meses de idade e pode ser caracterizado por uma maior sofisticação da capacidade do bebê em interagir de maneira recíproca com seus parceiros e compar- tilhar com eles suas experiências. As interações triádicas(pessoa-pessoa-objeto)ganham destaque,
  • 8. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 135 umavezqueobebêapresentacapacidadededirigir seu foco de atenção para pessoas e objetos, podendocoordenaroumonitorarofocodeatenção de seus parceiros em relação a estes últimos. O desenvolvimento da intersubjetividade parece ser importante para o surgimento gradativo deumacompreensãoacercadasintençõesecrenças que orientam comportamentos de outras pessoas, permitindoqueestesúltimospossamsermonitora- dos ou preditos em algum nível. Neste sentido, a capacidadedacriançaemsecolocarnaperspectiva do outro e predizer qual seria sua ação, sentimento oureaçãopossivelmenteexperimentadosemdeter- minada situação constitui uma tarefa necessária para a aquisição de uma teoria da mente, a qual se torna mais explícita a partir dos três anos de idade. Integrando Diferentes Perspectivas Teóricas: intersubjetividade e desenvolvimento infantil Diante da discussão até o momento apre- sentada, pode-se indagar: Como a criança chega à intersubjetividade? Esta pergunta levantaria diferentes respostas entre os autores abordados. Para Trevarthen7 , o bebê teria uma capa- cidade inata para comunicação em trocas sociais, de modo que desde o seu nascimento já apresen- taria subjetividade, entendida pelo autor em termos de consciência e intencionalidade.Apartir de trocas sociais inicialmente diádicas e pos- teriormente triádicas, o bebê também poderia regular sua subjetividade às subjetividades de seus parceiros de maneira a apresentar precocemente intersubjetividade. Em um primeiro momento, esta última envolveria o reconhecimento e a coordenação de intenções nas trocas mãe-bebês, experimentadas em termos de afeto e recipro- cidade e, em um segundo momento, por volta dos oito ou nove meses, a coordenação da atenção e intenção em trocas triádicas (mãe-bebê-objeto). Stern12 , por sua vez, não considera inata a capacidade subjetiva de consciência e intenciona- lidade.Ao contrário, refere um processo gradual em que as experiências subjetivas vão sendo organizadas, constituindo diferentes sensos de eu- outro com base em aprendizagens e processos interativos. Inicialmente, não haveria intersubje- tividade. Esta é identificada pelo autor como possível apenas por volta dos sete a nove meses deidade,momentoemqueobebêcomeçaadesen- volver o senso de eu subjetivo, quando finalmente subjetividade e intersubjetividade são atingidas, embora sem um envolvimento de consciência. Rochat e Striano14 enfatizam o papel das interações iniciais para o surgimento e desenvol- vimento da intersubjetividade infantil. Diferen- temente da perspectiva de Trevarthen15 e aproxi- mando-se um pouco das primeiras impressões de Stern12 , estes autores não consideram consciência e intencionalidade como qualidades inatas, assim como a intersubjetividade.Apontam que, embora esta última possa existir em algum nível implícito ou rudimentar, não há evidências suficientes para considerá-la como estando seguramente presente desde o nascimento. Por outro lado, os argumen- tos de Rochat e Striano14 aproximam-se das colocações de Trevarthen15 e se afastam das formulações teóricas de Stern12 no que se refere à aceitação da existência de uma intersubjeti- vidade primária, manifesta por volta dos dois meses de idade em trocas sociais diádicas. A seguir, é apresentada a Tabela 1 que esboça as três perspectivas discutidas de modo comparativo. De um modo geral, as diferentes perspectivas apresentam uma discussão alternativa para a compreensão do modo como gradativamente os bebês vão alternando a distribuição da sua atenção entre o mundo físico e o mundo social, de modo a desenvolverem competências rela- cionadas a um contexto triádico. Tabela 1 - Diferentes Perspectivas Ontogenéticas sobre Intersubjetividade Autores Trevarthen (1974;1978) Stern (1992) Rochat e Striano (1999) Períodos do desenvolvimento infantil Nascimento Capacidade inata para intersubjetividade Sem evidências de intersubjetividade inicial; Senso de eu emergente Intersubjetividade ainda não explícita; Período atencional 2 meses Intersubjetividade primária Não faz referência à intersubjetividade; Senso de eu nuclear Intersubjetividade primária; Período contemplativo 8/9meses Intersubjetividade secundária Intersubjetividade secundária; Relacionar-se intersubjetivo; Senso de eu subjetivo Intersubjetividade secundária; Período intencional
  • 9. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 136 Stern12 hipotetiza que a intersubjetividade pode ser atingida a partir da contribuição simul- tânea de diferentes fatores: aquisições gradativas de diversas potencialidades do bebê ao longo de seu desenvolvimento, seu engajamento em trocas sociais significativas e desenvolvimento de vín- culos afetivos e de apego. Estes últimos seriam vistos como recursos de uma natureza humana predominantemente social, capazes de garantir a sobrevivência da espécie. Tais argumentos se assemelham às hipó- teses de Rochat16 . Para este autor, os bebês recém- nascidos apresentam um conjunto de competên- cias que os tornam de algum modo sensíveis ao universo social, parecendo nascerem preparados para prestar atenção a pessoas.Tal bagagem inata é percebida e estimulada pelos adultos cuidadores com os quais o bebê interage. Estas interações precoces, em geral de natureza face-a-face, pas- sam por transformações ainda no primeiro ano de vida do bebê. Isto porque os bebês, conforme vão realizando algumas conquistas relativas a ha- bilidades sensoriais, perceptivas e motoras, passam a deslocar o seu foco de atenção (inicial- mente voltado a seus parceiros) para os objetos e eventos presentes no ambiente. Assim, ao invés de só atentarem para seus cuidadores, os bebês expandem o mundo sobre o qual prestam atenção, podendo manipular e agir sobre os objetos. Embora haja um aumento de interesse pelo mundo físico, os bebês não se tornam alheios ao mundo social, mantendo comportamentos respon- sivos e de reciprocidade com seus parceiros. Tal fato é identificado em um estudo descrito por Rochat16 no qual foi observado que bebês com quatro meses de idade tendem a apresentar uma diminuição quanto ao número de episódios em que estabelecem contatos oculares de longa duração com seus cuidadores, passando a utilizar olhares rápidos e alternados entre estes parceiros e os obje- tos do meio como forma de distribuir a atenção. Esta alternância do foco de atenção do bebê entre objeto e parceiro social parece se dar como uma tentativa de monitorar a proximidade relativa a pessoas. Neste sentido, pode-se pensar como se dá o processo de transição da intersubjetividade primária à secundária. A proximidade social tão evidente na intersubjetividade primária carac- teriza um aspecto essencial de dependência do bebê em relação ao outro para a sua sobrevivên- cia. No entanto, esta mesma sobrevivência depende de que o bebê seja capaz de atingir con- quistas sensoriais e motoras, a fim de garantir maiores possibilidades de locomoção e exploração no ambiente. Este fato marcaria uma contradição, porque consequentemente envolveria um afasta- mento do bebê em relação ao adulto. Curiosamente relacionado a este processo, Rochat16 chama a atenção para a existência de um vínculo afetivo de exclusividade entre o bebê e os seus cuidadores em torno dos oito meses de idade, ou seja, em um período anterior ao estabe- lecimento deste contexto triádico explícito que caracteriza uma intersubjetividade secundária.Tal comportamento de apego poderia ser interpretado como uma condição necessária para o bebê da espécie humana desenvolver uma capacidade de coordenação entre sua atenção voltada ao mundo social (cuidadores) e ao mundo físico (objetos) através do desenvolvimento de comportamentos de atenção conjunta, a partir dos quais podem ser estabelecidos episódios de cooperação e engajamento compartilhado.Ao desenvolver tais comportamentos, os bebês teriam maiores chances de sobrevivência, na medida em que a proximidade do outro ofereceria uma oportuni- dade do mundo lhe ser gradativamente apre- sentado, garantindo maior segurança e proteção nestas tentativas de exploração. Rochat16 hipotetiza, então, que parece estar presente uma solução adaptativa, caracterizada pela capacidade do bebê em desenvolver um conjunto de comportamentos que permitem a ele gradativamente integrar os seus parceiros sociais a seus interesses de exploração dos objetos. Isto caracterizaria um contexto triádico, onde compor- tamentos de atenção conjunta podem ser utili- zados (por exemplo: seguir o olhar, apontar ou utilizar o outro como referência social). Os próprios adultos com os quais o bebê interage são ativos neste processo, ao apresen- tarem o meio como algo interessante e seguro para o bebê, através de gestos como o mostrar ou apontar para alguns objetos ou eventos presentes no ambiente. Assim, ao desenvolverem uma intersubjetividade secundária, os bebês parecem
  • 10. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 137 exibir um conjunto de comportamentos que indicam uma capacidade, mesmo que rudimentar, de sintonizar com o foco de atenção do outro ou de fazê-lo sintonizar com o seu próprio no estabelecimento de interações triádicas. A busca por uma correspondência entre experiências privadas e as dos outros parceiros parece ser a base para o desenvolvimento de uma cognição social, onde levar em conta a perspectiva do outro e coordená-la com a sua própria parece ser possibilitada apenas com o desenvolvimento da intersubjetividade. Assim, no contexto de trocas sociais triádicas, são expressões ou evi- dências de intersubjetividade alguns comporta- mentos específicos, tais como: foco de atenção compartilhado entre mãe e bebê, atividades de mostrar algum objeto ou pessoa, apontar, imitar, dentre outros. É esta gama de comportamentos que se considera como atenção conjunta4 . A emergência e o desenvolvimento de compor- tamentos desta natureza estão intimamente rela- cionados ao processo pelo qual os bebês atingem uma intersubjetividade secundária. Após esta tentativa de discussão e integra- ção entre as diferentes perspectivas apresentadas, pode-se argumentar que, se por um lado as hipó- teses sobre a origem da intersubjetividade diver- gem, por outro há um consenso básico: sendo inata ou não, a intersubjetividade envolve um processo que somente se desenvolve e se complexifica se houver um contexto de troca com outro. Deste mo- do, ao mesmo tempo em que a intersubjetividade é dependente do contato social, ela também o funda- menta,permitindoqueosparceirospossammutua- mente ajustar suas ações comunicativas em algum nível. É esta característica de sensibilidade social evidenciada pela intersubjetividade que permite uma maior compreensão do estabelecimento e desenvolvimento de outros processos, tais como interação social, afetividade e comunicação entre osparceiros.Apesardarelevânciadestetema,tem- se observado que a intersubjetividade tem sido abordada mais amplamente apenas como um constructo teórico, tornando-se um desafio para os pesquisadores em psicologia do desenvolvi- mento investigá-la empiricamente, especialmente nodecorrerdosprimeirosmesesdevidadosbebês. Há, portanto, a necessidade de que estudos em- píricos sobre o tema possam ser realizados e, em particular, de estudos brasileiros. Abstract: The intersubjectivity concept has been approached according to different interpretations in Psychology. The aim of this article is to present some theoretical bases pertaining to this concept, pointing out how its use has been treated by early child development studies in the last decades. We discuss and compare different theoretical perspectives that approach the function of intersubjectivity and of social interaction in child development. These perspectives may contribute to a conception of intersubjectivity as an inherent aspect in basic processes that involve reciprocity, such as early communication, social interaction, and affectivity. Keywords: Intersubjectivity. Social interaction. Early child development. REFERÊNCIAS 1. Penteado JRW. A técnica da comunicação humana. São Paulo: Pioneira; 1993. 2. Joppling D. Cognitive science, other minds and the philosophy of dialogue. In: Neisser U, editor. The perceived self. New York: Cambridge University Press; 1993. p.290-309. 3. Braten S. Introduction. In: Braten S, editor. Intersubjectivity communication and emotion in early ontogeny. Cambridge: Cambridge University Press; 1998. p.01-12. 4. Tomasello M. Social cognition before the revolution. In: Rochat P, editor. Early social cognition: understanding others in the first months of life. New Jersey: Lawrence Erlbaum; 1999. p.301-14. 5. Gopnik A, Meltzoff A. Imitation, cultural learning and the origins of “theory of mind”. Commentary. Behavioral and Brain Sciences 1993; 16: 521-3. 6. Trevarthen C. Conversations with a two- month-old. New Scientist 1974; 2: 230-5. 7. Trevarthen, C. The concept of foundations of
  • 11. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2007;17(2):128-138Susana Engelhard Nogueira, et al. 138 infant intersubjectivity. In: Braten S, editor. Intersubjectivity communication and emotion in early ontogeny. Cambridge: Cambridge University Press; 1998. p.15-46. 8. Bateson MC. The interpersonal context of infant vocalization. Quarterly Progress Report of the Research Laboratory of Electronics 1971; 100: 170-6. 9. Trevarthen C, Hubley P. Secondary intersubjectivity: confidence, confiding and acts of meaning in the first year. In: Lock A, editor. Action, gesture and symbol: the emergence of language. London: Academic Press; 1978. p.183-229. 10. Piaget J. The first year of life of the child. In: Gruber HE, Vonèche JJ, editors. The essential Piaget: an interpretive reference and guide. Northvale/London: Jason Aronson; 1996. p.199-214. (original publicado em 1927/1928). 11. Seidl de Moura ML, Ribas AFP. Evidências sobre características de bebês recém-nascidos: um convite a reflexões teóricas. In: Seidl de Moura ML, editor. O bebê do século XXI e a psicologia em desenvolvimento. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2004. p.21-59. 12. Stern D. O mundo interpessoal do bebê. Porto Alegre: Artes Médicas; 1992. 13. Mahler M. As psicoses infantis e outros estudos. Porto Alegre: Artes Médicas; 1983. 14. Rochat P, Striano T. Social-cognitive development in the first year. In: Rochat P, editor. Early social cognition: understanding others in the first months of life. Mahwah, New Jersey & London: Lawrence Erlbaum; 1999. p.03-34. 15. Trevarthen C. Modes of perceiving and modes of acting. In: Pick JH, editor. Psychological modes of perceiving and processing information. New Jersey: Erlbaum; 1978. p.99-136. 16. Rochat P. The infant’s world. Cambridge: Harvard University Press; 1991. Recebido em 18/12/2006 Aprovado em 18/04/2007