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NERY, Ismael (1900-34). Nascido em Belém (PA) e falecido no Rio de Janeiro. Ismael Nery
possuía nas veias sangue lusitano, indígena e holandês. Aos dois anos veio para o Rio de
Janeiro, e tinha apenas 15 quando se matriculou na Escola Nacional de Belas Artes, da qual foi
aluno rebelde e inadaptado. Seu talento já então causava admiração a contemporâneos como
Lúcio Costa, consubstanciando-se numa quantidade de guaches e de aquarelas hoje perdidos.
De 1920 a 1921 esteve na Europa, estudando os Velhos Mestres em França e na Itália. Ao
regressar foi nomeado desenhista-arquiteto da antiga Diretoria do Patrimônio Nacional do
Ministério da Fazenda, casando-se em 1922 com Adalgisa Nery, com quem teria dois filhos.
Em 1927 fez sua segunda viagem à Europa, conhecendo então André Breton e Marc Chagall e
se ligando aos surrealistas. Em 1929 iria à Argentina e ao Uruguai. Caindo enfermo no ano
seguinte, com tuberculose pulmonar, foi internado em 1931 no Sanatório de Correias, onde
permaneceu dois anos. Em julho de 1933, aparentemente curado, passou a morar em
Teresópolis, logo retornando ao Rio. Mas em dezembro a tuberculose atacou-lhe a laringe,
falecendo o artista a 6 de abril de 1934, aos 33 anos. Envergava, na ocasião, o hábito
franciscano, com o qual foi enterrado.

Com Ismael Nery deparamo-nos com o caso, único na história da arte brasileira, de um grande
pintor para quem a pintura não representava senão uma preocupação secundária, porquanto à
filosofia e à poesia dedicava ele o melhor de seu esforço e de sua atenção. Chegou mesmo a
construir um sistema filosófico, que nunca escreveu, baseado, segundo Murilo Mendes, "na
abstração do Tempo e do Espaço, na seleção e cultivo dos elementos essenciais à existência,
na redução do Tempo à unidade, na evolução sobre si mesmo pela descoberta do próprio
essencial, na representação das noções permanentes que darão à arte a universalidade ". Era
o Essencialismo, de inspiração fundamente católica, neo-tomista. No que respeita à poesia,
deixou-nos Ismael Nery poemas em prosa - como O Ente dos Entes, Os Filhos de Deus e
sobretudo Testamento Espiritual - que se inscrevem entre o que de mais puro e elevado jamais
se escreveu entre nós. Príncipe do espírito, para Mário Pedrosa, pintor maldito do Modernismo
Brasileiro, no dizer de Antonio Bento, seu reconhecimento como um dos nossos maiores
pintores e desenhistas é relativamente recente - datando de não mais de 30 anos -, porquanto
em vida apenas realizou duas individuais - uma em Belém do Pará em 1928 e a segunda no
Rio de Janeiro em 1929 -, conseguindo vender, em ambas, um único quadro. Mesmo porque,
no depoimento de Manuel Bandeira, Ismael "negava a pé firme a qualidade de pintor".

Tendo começado a produzir num tempo em que a preocupação por uma temática nacionalista
empolgava alguns de nossos melhores artistas, Ismael Nery paradoxalmente nunca se
preocupou com tal busca por uma pintura brasileira, antes situando sua produção em plano
absolutamente internacional. Isso, e a circunstância de a figura humana ser o motivo exclusivo
de toda a sua obra - como o foi para Michelangelo e para Modigliani -, tornam-no pintor de
características ímpares no Brasil. Não se conhecem com efeito, de Ismael, paisagens,
naturezas-mortas, cenas de gênero, mas sim única e exclusivamente interpretações do corpo e
do rosto humanos, uma exigência do seu espírito sempre às voltas com elucubrações de
natureza antes filosófica que propriamente artística. O pintor que, quando estudante na Escola
Nacional de Belas Artes, comprazia-se em recriar a seu modo cópias em gesso de velhas
esculturas gregas e romanas, atingia assim um classicismo deliberado, no qual os corpos,
solitários ou em grupo, de homens e mulheres idealizados, eram, mais do que um pretexto para
o sutil diálogo entre formas, linhas e cores, a ilustração de seus ideais essencialistas e do seu
humanismo cristão. Seu classicismo é confirmado, aliás, pela admiração ilimitada que devotava
aos venezianos da Renascença, como Ticiano, Tintoretto e Veronese, bem como a
Michelangelo e Rafael, uma admiração que contrapunha (e mesmo antepunha) à que
consagrava a Chagall, Picasso e Max Ernst entre os modernos.

No que respeita à sua produção, pode a mesma ser dividida em três fases, em cada qual
predominando um estilo: expressionista, cubista e surrealista Cronologicamente, o
expressionismo de Nery estender-se-ia entre 1922 e 1923 apenas, época de execução do
Auto-Retrato como Toureiro, do Retrato de Murilo Mendes ou de A Espanhola. De 1924 a
1927, sob a influência da fase azul de Picasso, produziu Ismael Nery várias obras de
conotação cubista, em que também predominavam as tonalidades azuis (Retrato de Adalgisa
Nery, 1924). É comum, também, combinarem-se num mesmo quadro as duas tendências - a
expressionista e a cubista -, como ocorre no Nu Feminino de 1925, ou no Auto-Retrato, de
1926.
A fase surrealista vai de 1927 ao fim da vida do artista e se acha diretamente ligada a Chagall,
que parece ter devotado ao brasileiro, em Paris, amizade e admiração verdadeiras. Pertencem
a essa fase obras como o Auto-Retrato com a Torre Eifell e o Pão-de-Açúcar, a Cena
Surrealista, de 1928 ou Adalgisa com ramo de flores, de 1929. As formas desarticuladas de
corpos humanos, lado a lado com obras de conotação mais lírica (O Encontro, 1928) e outras
de inspiração religiosa (Anunciação, 1930), encerram o ciclo produtivo de Nery, cuja obra
como pintor é muito pequena: uma centena e meia de óleos, se tanto.

Do ponto de vista artístico não parece haver dúvidas de que o período cubista-expressionista
de Ismael é o mais importante, quer qualitativa, quer quantitativamente, de toda a sua
produção. Historicamente, porém, há que se levar em conta a circunstância de Ismael ter sido o
primeiro pintor surrealista brasileiro, introduzindo praticamente em nossa arte o insólito e o
irracional.

Ismael não foi apenas pintor: foi ainda desenhista extraordinário, e muitos são os que
concedem, a seus desenhos, dos quais sobrevivem algumas centenas, importância igual e até
superior à dos óleos. Seu maior exegeta, Murilo Mendes, a quem de resto se deve o resgate de
praticamente quanto nos ficou de tais desenhos (que, mal concluía, Ismael atirava ao cesto de
papéis, imprestáveis), afirma dos mesmos que constituem "um dos grandes patrimônios
culturais do Brasil", ao passo que Mário Pedrosa não hesita em afirmar que Ismael "revela,
sobretudo no desenho, os dons de especulação plástica, os maiores, talvez, da geração".

Um dos pontos mais elevados do desenho de Nery é a série de obras produzidas entre 1927 e
1929 sob o influxo de Marc Chagall. Em muitas aquarelas e guaches os personagens,
momentaneamente libertos da lei da gravidade, flutuam no espaço, enquanto casas e linha do
horizonte assumem posições antitetônicas. Num desses desenhos, de 1927, o pintor brasileiro
chegou mesmo a escrever, em sua finíssima caligrafia, a inscrição reveladora: Como meu
Amigo Chagall, tal a marca do artista russo naquele momento de sua evolução. Evocações de
sonhos, imagens que se interpenetram de corpos humanos, vísceras em arranjos inéditos,
estudos de formas humanas que se duplicam ou se desarvoram, mesmo certas alusões
críticas, satíricas ou bem-humoradas perpassam ainda por tais desenhos, nos quais a
qualidade maior, onipresente, é a fluência e a sensibilidade linear.

Projetos arquitetônicos e de arquitetura de interiores, trabalhos cenográficos e estudos de
trajes ocorrem ainda na produção gráfica de Ismael Nery, que pode bem ter assistido, ao tempo
de sua permanência em Paris, a espetáculos de balé e teatro de vanguarda. E há que falar
ainda no único livro que ilustrou: os Contos e poemas bíblicos, de Nélson Catunda, em 1925.

Personalidade genial, Ismael Nery morreu no momento em que mal dava início a uma carreira
inigualável. A que alturas não teria atingido, tivesse acaso vivido, como é lícito supor, mais 30,
35 anos Mesmo morrendo aos 33, contudo, deixou-nos um acervo inestimável de óleos e
desenhos, nos quais é fácil perceber a excepcionalidade de sua contribuição.

                              Composição cubista, guache, s/ data;
                                0,24 x 0,18, coleção particular.

                            Duas amigas, detalhe, óleo s/ tela, 1925.

                          Nu no cabide, óleo s/ cartão, cerca de 1927;
                            0,55 X 0,46, Palácio Bandeirantes, SP.

                                Figura, óleo s/ tela, cerca 1928;
                     1,05 X 0,70, Museu de Arte Contemporânea da USP.

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Nery, ismael

  • 1. NERY, Ismael (1900-34). Nascido em Belém (PA) e falecido no Rio de Janeiro. Ismael Nery possuía nas veias sangue lusitano, indígena e holandês. Aos dois anos veio para o Rio de Janeiro, e tinha apenas 15 quando se matriculou na Escola Nacional de Belas Artes, da qual foi aluno rebelde e inadaptado. Seu talento já então causava admiração a contemporâneos como Lúcio Costa, consubstanciando-se numa quantidade de guaches e de aquarelas hoje perdidos. De 1920 a 1921 esteve na Europa, estudando os Velhos Mestres em França e na Itália. Ao regressar foi nomeado desenhista-arquiteto da antiga Diretoria do Patrimônio Nacional do Ministério da Fazenda, casando-se em 1922 com Adalgisa Nery, com quem teria dois filhos. Em 1927 fez sua segunda viagem à Europa, conhecendo então André Breton e Marc Chagall e se ligando aos surrealistas. Em 1929 iria à Argentina e ao Uruguai. Caindo enfermo no ano seguinte, com tuberculose pulmonar, foi internado em 1931 no Sanatório de Correias, onde permaneceu dois anos. Em julho de 1933, aparentemente curado, passou a morar em Teresópolis, logo retornando ao Rio. Mas em dezembro a tuberculose atacou-lhe a laringe, falecendo o artista a 6 de abril de 1934, aos 33 anos. Envergava, na ocasião, o hábito franciscano, com o qual foi enterrado. Com Ismael Nery deparamo-nos com o caso, único na história da arte brasileira, de um grande pintor para quem a pintura não representava senão uma preocupação secundária, porquanto à filosofia e à poesia dedicava ele o melhor de seu esforço e de sua atenção. Chegou mesmo a construir um sistema filosófico, que nunca escreveu, baseado, segundo Murilo Mendes, "na abstração do Tempo e do Espaço, na seleção e cultivo dos elementos essenciais à existência, na redução do Tempo à unidade, na evolução sobre si mesmo pela descoberta do próprio essencial, na representação das noções permanentes que darão à arte a universalidade ". Era o Essencialismo, de inspiração fundamente católica, neo-tomista. No que respeita à poesia, deixou-nos Ismael Nery poemas em prosa - como O Ente dos Entes, Os Filhos de Deus e sobretudo Testamento Espiritual - que se inscrevem entre o que de mais puro e elevado jamais se escreveu entre nós. Príncipe do espírito, para Mário Pedrosa, pintor maldito do Modernismo Brasileiro, no dizer de Antonio Bento, seu reconhecimento como um dos nossos maiores pintores e desenhistas é relativamente recente - datando de não mais de 30 anos -, porquanto em vida apenas realizou duas individuais - uma em Belém do Pará em 1928 e a segunda no Rio de Janeiro em 1929 -, conseguindo vender, em ambas, um único quadro. Mesmo porque, no depoimento de Manuel Bandeira, Ismael "negava a pé firme a qualidade de pintor". Tendo começado a produzir num tempo em que a preocupação por uma temática nacionalista empolgava alguns de nossos melhores artistas, Ismael Nery paradoxalmente nunca se preocupou com tal busca por uma pintura brasileira, antes situando sua produção em plano absolutamente internacional. Isso, e a circunstância de a figura humana ser o motivo exclusivo de toda a sua obra - como o foi para Michelangelo e para Modigliani -, tornam-no pintor de características ímpares no Brasil. Não se conhecem com efeito, de Ismael, paisagens, naturezas-mortas, cenas de gênero, mas sim única e exclusivamente interpretações do corpo e do rosto humanos, uma exigência do seu espírito sempre às voltas com elucubrações de natureza antes filosófica que propriamente artística. O pintor que, quando estudante na Escola Nacional de Belas Artes, comprazia-se em recriar a seu modo cópias em gesso de velhas esculturas gregas e romanas, atingia assim um classicismo deliberado, no qual os corpos, solitários ou em grupo, de homens e mulheres idealizados, eram, mais do que um pretexto para o sutil diálogo entre formas, linhas e cores, a ilustração de seus ideais essencialistas e do seu humanismo cristão. Seu classicismo é confirmado, aliás, pela admiração ilimitada que devotava aos venezianos da Renascença, como Ticiano, Tintoretto e Veronese, bem como a Michelangelo e Rafael, uma admiração que contrapunha (e mesmo antepunha) à que consagrava a Chagall, Picasso e Max Ernst entre os modernos. No que respeita à sua produção, pode a mesma ser dividida em três fases, em cada qual predominando um estilo: expressionista, cubista e surrealista Cronologicamente, o expressionismo de Nery estender-se-ia entre 1922 e 1923 apenas, época de execução do Auto-Retrato como Toureiro, do Retrato de Murilo Mendes ou de A Espanhola. De 1924 a 1927, sob a influência da fase azul de Picasso, produziu Ismael Nery várias obras de conotação cubista, em que também predominavam as tonalidades azuis (Retrato de Adalgisa Nery, 1924). É comum, também, combinarem-se num mesmo quadro as duas tendências - a expressionista e a cubista -, como ocorre no Nu Feminino de 1925, ou no Auto-Retrato, de 1926.
  • 2. A fase surrealista vai de 1927 ao fim da vida do artista e se acha diretamente ligada a Chagall, que parece ter devotado ao brasileiro, em Paris, amizade e admiração verdadeiras. Pertencem a essa fase obras como o Auto-Retrato com a Torre Eifell e o Pão-de-Açúcar, a Cena Surrealista, de 1928 ou Adalgisa com ramo de flores, de 1929. As formas desarticuladas de corpos humanos, lado a lado com obras de conotação mais lírica (O Encontro, 1928) e outras de inspiração religiosa (Anunciação, 1930), encerram o ciclo produtivo de Nery, cuja obra como pintor é muito pequena: uma centena e meia de óleos, se tanto. Do ponto de vista artístico não parece haver dúvidas de que o período cubista-expressionista de Ismael é o mais importante, quer qualitativa, quer quantitativamente, de toda a sua produção. Historicamente, porém, há que se levar em conta a circunstância de Ismael ter sido o primeiro pintor surrealista brasileiro, introduzindo praticamente em nossa arte o insólito e o irracional. Ismael não foi apenas pintor: foi ainda desenhista extraordinário, e muitos são os que concedem, a seus desenhos, dos quais sobrevivem algumas centenas, importância igual e até superior à dos óleos. Seu maior exegeta, Murilo Mendes, a quem de resto se deve o resgate de praticamente quanto nos ficou de tais desenhos (que, mal concluía, Ismael atirava ao cesto de papéis, imprestáveis), afirma dos mesmos que constituem "um dos grandes patrimônios culturais do Brasil", ao passo que Mário Pedrosa não hesita em afirmar que Ismael "revela, sobretudo no desenho, os dons de especulação plástica, os maiores, talvez, da geração". Um dos pontos mais elevados do desenho de Nery é a série de obras produzidas entre 1927 e 1929 sob o influxo de Marc Chagall. Em muitas aquarelas e guaches os personagens, momentaneamente libertos da lei da gravidade, flutuam no espaço, enquanto casas e linha do horizonte assumem posições antitetônicas. Num desses desenhos, de 1927, o pintor brasileiro chegou mesmo a escrever, em sua finíssima caligrafia, a inscrição reveladora: Como meu Amigo Chagall, tal a marca do artista russo naquele momento de sua evolução. Evocações de sonhos, imagens que se interpenetram de corpos humanos, vísceras em arranjos inéditos, estudos de formas humanas que se duplicam ou se desarvoram, mesmo certas alusões críticas, satíricas ou bem-humoradas perpassam ainda por tais desenhos, nos quais a qualidade maior, onipresente, é a fluência e a sensibilidade linear. Projetos arquitetônicos e de arquitetura de interiores, trabalhos cenográficos e estudos de trajes ocorrem ainda na produção gráfica de Ismael Nery, que pode bem ter assistido, ao tempo de sua permanência em Paris, a espetáculos de balé e teatro de vanguarda. E há que falar ainda no único livro que ilustrou: os Contos e poemas bíblicos, de Nélson Catunda, em 1925. Personalidade genial, Ismael Nery morreu no momento em que mal dava início a uma carreira inigualável. A que alturas não teria atingido, tivesse acaso vivido, como é lícito supor, mais 30, 35 anos Mesmo morrendo aos 33, contudo, deixou-nos um acervo inestimável de óleos e desenhos, nos quais é fácil perceber a excepcionalidade de sua contribuição. Composição cubista, guache, s/ data; 0,24 x 0,18, coleção particular. Duas amigas, detalhe, óleo s/ tela, 1925. Nu no cabide, óleo s/ cartão, cerca de 1927; 0,55 X 0,46, Palácio Bandeirantes, SP. Figura, óleo s/ tela, cerca 1928; 1,05 X 0,70, Museu de Arte Contemporânea da USP.