1. O romantismo em Portugal surgiu no início do século XIX, influenciado pelo contexto político e social pós-invasões francesas.
2. Almeida Garrett e Alexandre Herculano foram figuras centrais na implantação do romantismo, após exílios onde conceberam uma nova literatura nacional e popular.
3. O romantismo português procurou afirmar a identidade cultural portuguesa e contribuir para o renascimento do país, através da literatura e das artes.
1. Condições para o surgimento do Romantismo em
Portugal
A. Culturais
• Surgimento a partir de 1836 como escola, com as suas publicações e com o seu
público;
• As traduções da novelística estrangeira: Voltaire, Walter Scott, Alexandre
Dumas (filho), preparam o público português para acolher o romance e as
novelas nacionais, que vão ser influenciadas por todos eles;
• O romantismo português não se pode dissociar da Revolução Liberal de 1820,
da derrota dos absolutistas e das reformas institucionais, e, por isso, reveste-se
de particularidades únicas;
• Tem como chefes patriotas Garrett e Herculano, liberais de alma e coração,
dedicados à reconstrução nacional, à reconstrução da grande Pátria através da
Literatura, combatendo a decadência e a humilhação que o País vivia na altura.
Chora-se o passado grandioso e deposita-se nos patriotas liberais esperanças de
liberdade e de renascimento;
• Herculano aviva a consciência nacional, revive a literatura oral e a novela
renasce modernizada, com o contributo de Garrett e Camilo;
• Restauração do Teatro;
• Criação de uma escola de historiadores preocupados com o rigor científico;
• Incentiva-se o jornalismo e coloquializa-se a linguagem;
• A literatura é avassalada por uma linguagem corrente, mais acessível aos
estratos sociais populares que estão na origem de todas as modificações políticas
e sociais, históricas e culturais do séc. XIX.
B. Políticas
• Implantação do Regime Liberal;
• Abertura do país ao resto da Europa;
• Abolição da censura;
• Desenvolvimento dos meios de comunicação principalmente dos transportes
ferroviários que aproximam Portugal dos grandes centros europeus.
C. Sociais
• Importação de modas e gostos estrangeiros (Inglaterra, França e Alemanha);
• Ruína dos fabricantes nacionais;
• Aumento da nova aristocracia;
• Modificações sociais a nível das classes populares.
Características Gerais do Romantismo
• Desenvolvimento de uma literatura confessional, que se presta à exibição do EU
e do indivíduo como único e original em sentimentos e imaginação;
• Desenvolvimento e defesa da teoria de Rousseau, afirmado o indivíduo como
naturalmente bom e posteriormente corrompido pela sociedade;
1
2. • Glorificam-se e exaltam-se os tipos sociais marginais: o pirata, o bandido, o
fora-de-lei. Perante a impotência de alcançar aquilo que deseja, nasce no
romântico uma revolta metafísica e social que vai levar à sua identificação com
figuras míticas e bíblicas como Prometeu, os Titãs, Satã, etc…;
• O EU é tudo, aspira ao Absoluto e procura transcender a sua condição humana
(influência do idealismo alemão);
• O Homem é descrito na sua dimensão individual, egocêntrica, sem preocupações
morais;
• O EU romântico sofre de uma nostalgia profunda (sehnsucht) e busca algo de
distante no tempo e no espaço, que se concretiza pelo retomar no tempo da Idade
Média e pela procura de espaços exóticos, orientais, mergulhados no fantástico e
no sonho;
• Valoriza-se o nacionalismo estético, a cultura regional, a tradição;
• Surge o pessimismo, o fatalismo popular, a metafísica do pecado, da penitência
e do resgate (porque não se alcança o Absoluto);
• Os sentimentos são levados ao exagero: fala-se de amor, de ciúme, de vingança,
de desespero e de morte;
• A mulher é personificação da fragilidade, da pureza, do espírito de sacrifício e
de tão idealizada acaba por se tornar um símbolo;
• A mulher pode estar na origem de tudo o que existe de maldito no herói
romântico;
• A "mulher anjo" opõe-se à "mulher diabo".
Classicismo Romantismo
Predomínio do sentimento (coração,
Predomínio da Razão e da Inteligência
sensibilidade) e da Imaginação
A objectividade, o impessoal A subjectividade, o pessoal
Culto da antiguidade greco-latina Culto da Idade Média (lendas e tradições) e
(mitologias, personagens, lendas) intervenção na realidade contemporânea
Equilíbrio, disciplina, clareza, ordenação Arrebatamento e exaltação
Representação do homem carregado de
Representação do homem equilibrado,
traumas, indisciplinado, instável e
saudável, moralista, disciplinado e
egocentrista, sem grandes preocupações
optimista
morais e pessimista
Herói individualista e solitário revoltado
Gosto pela vida em sociedade
contra a sociedade
As realidades certas e a ausência de
A incerteza, a insatisfação e a angústia
preocupações espirituais
A mulher anjo (um ser quase divino) e a
A mulher como deusa, reflexo do amor
mulher demónio (fatal, sedutora, que
divino (platonismo)
destrói todos aqueles que encanta)
Amor racional e intelectualizado Amor sentimental e sensorial
Natureza luminosa, colorida, alegre, suave Natureza sombria, melancólica (Outono e
(Primavera e Verão) Inverno)
Preferência pelo crepuscular e pelo
Preferência pelo diurno (luz solar) nocturno (penumbra, sombras, luar), que
propiciam o sonho e a meditação
Paisagem convencional, aprazível, bucólica Paisagem natural, livre, rude, selvática,
2
3. e equilibrada ("locus amoenus") agreste ("locus horrendus")
Paisagem condicionada pela presença ou
A paisagem é um estado de alma
ausência da mulher amada (petrarquismo)
Preferência pelo belo aristocrático quase Preferência pelo belo horrível, quotidiano e
inatingível vulgar
Versificação rígida e unidade estrófica Versificação livre e variedade estrófica
Linguagem seleccionada, pouco acessível Linguagem acessível, por vezes oralizante
O hibridismo dos géneros: valorização de
A pureza dos géneros: a separação do formas literárias novas (o drama romântico
sublime (tragédia) e do grotesco (comédia). e o romance); a aliança do sublime e do
grotesco.
Em Portugal o processo de instauração do romantismo foi lento e incerto.
Enquanto o romantismo de Delacroix avançava já para um projecto renascentista
e o realismo tomava forma no horizonte parisiense, o romantismo português
procurava ainda afirmar-se.
A implantação do romantismo em Portugal ocorre num contexto sociopolítico.
São os anos posteriores às invasões francesas, que tinham originado o refúgio da
corte portuguesa no Brasil e é também o tempo em que o desejo de
independência dessa colónia ganha força. Na metrópole multiplicam-se as lojas
maçónicas e germinam os ideais liberais.
Travam-se as lutas civis entre miguelistas e liberais, e, por duas vezes, depois da
Vilafrancada e da Abjuração da Carta, muitos partidários de D. Pedro tiveram de
exilar-se em Inglaterra e França. Dois desses partidários eram os jovens
escritores Almeida Garrett e Alexandre Herculano.
Segundo alguns autores, o romantismo afirmou-se entre nós como uma cultura
de importação. Só compensou distâncias e atrasos pela via indirecta dos exílios a
que se sujeitaram Garrett e Herculano. Foi longe da pátria que estes autores
conceberam a ideia de criar uma literatura nova, de carácter nacional e popular.
Em 1825 Garrett publicou o poema Camões que passa a ser considerado o ponto
de partida para a fixação da cronologia do romantismo português.
Garrett e Herculano entendiam a literatura como tarefa cívica, como meio de
acção pedagógica ("A abolição dos conventos destruíra o sistema dos estudos; e
se cumpria aos governos organizar a instrução pública, era obrigação dos
escritores novos continuar a obra dos frades." Oliveira Martins)
Portugal era um país pequeno e decaído, saudoso da grandeza perdida. Esses
patriotas, confiantes nas virtudes da liberdade, propunham-se contribuir para um
renascimento pátrio.
O romantismo constitui uma tomada de consciência e uma conquista dum senso
histórico e dum senso crítico novo aplicado aos fenómenos da cultura. Começa-
se a relacionar o Homem com o meio a que pertence e a época de que é produto.
("O instável Carlos das viagens é o expoente de uma época de crise, um
moderno que sofre de duplicidade amorosa e acaba por se emburguesar,
passando de alma sensível a barão." Jacinto Prado Coelho)
3
4. Em Portugal, tal como na Europa, o romantismo manifestou-se também na
pintura e na arquitectura. A evolução, na pintura, do neoclassicismo para o
romantismo foi lenta e tormentosa, só tardiamente ganhou expressão entre nós.
Não existiam mestres, o seu surgimento é o resultado do amor que os jovens
artistas tinham à natureza. ("Deve ser no meio dos campos, em frente das
maravilhas da vegetação e dos mais variados episódios da criação animada,
que as ideias do pintor voam e se multiplicam." J. M. Andrade Ferreira)
Vários pintores se destacaram, mas Auguste Roquemont foi o primeiro a fixar na
tela cenas de costumes populares. Tomás da Anunciação, João Cristino da Silva
e Metrass são outros nomes importantes da pintura romântica. Este último,
Metrass, traduz nos seus quadros uma nova situação sentimental, com um
dramatismo ao mesmo tempo empolgante e mórbido. O melhor exemplo desse
gosto é o célebre Só Deus, considerado por alguns a mais poderosa imagem do
romantismo português.
A arquitectura do período romântico em Portugal surgiu, a par com a Europa,
por via Inglesa. O monumento mais representativo do espírito romântico é o
Palácio da Pena, em Sintra. A serra de Sintra sempre empolgou as almas
românticas, Garrett em 1925 escrevia:
1.Valorização do povo e da sua sabedoria antiquíssima, expressa no tesouro das suas
tradições ou do seu folclore.
2. Forte acentuação do carácter original das culturas nacionais expressos nos valores
literários e artísticos específicos, na sua história, nos seus mitos, no que, enfim,
constitui a sua identidade.
3. Uma atitude intelectual de idealismo filosófico.
4. Uma tendência para o individualismo, isto é, para a expressão do intimismo e de
uma visão do mundo sempre focalizada pelo “eu”, pelo predomínio do universo
interior do artista. Temas como os da solidão, da noite, do amor e da morte foram
naturalmente preferidos.
5. Um interesse exacerbado pelo indivíduo onde se concentram as linhas de força de
uma humanidade que começa e acaba no protagonista do drama humano, que é o
“herói” de uma epopeia sem fim, “comissário” de um Deus desconhecido ou “o
eleito da transcendência” para modificar o destino.
6. Uma atitude crítica perante a razão absolutista, daí decorrendo a valorização
psicológica do sentimento, da imaginação e da intuição.
7. Um desejo de fuga ao quotidiano, ao material e à realidade, levando naturalmente
à busca do maravilhoso, pela pesquisa de lendas e mitos, e ao mistério do universo.
8. Uma noção de um além de coisas visíveis que leva ao carácter vago, secreto,
nebuloso dos cenários românticos, mostrando ruínas, indícios, presenças
inexplicáveis.
9. Um liberalismo radical, não violento, porque se dirige a libertação interior dos
homens; liberdade individual, liberdade popular e liberdade nacional são as etapas
para um dinamismo evolutivo.
10. Uma religiosidade muito livre que vai do cristianismo ao culto de qualquer outra
religião desde que contribua para a realização secreta do ser humano.
4