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Sustentabilidade




                       Ecocliques
O fotógrafo Thomas Kremer percorreu dez estados brasileiros para registrar os efeitos da
ação humana no litoral do país. Aqui, comenta três momentos marcantes da sua jornada




C
                   riar nas pessoas a consciência de
                   que elas fazem parte do meio ambiente
                   e o modificam. Essa é a missão de cada                    Kremer ama
                                                                        fotografia, vela e
                   projeto desenvolvido pelo paulista                  mergulho, prática
                   Thomas Kremer, fotógrafo e produtor                da qual é instrutor.
                   cultural. Descendente de alemães,                 Não à toa, considera
                                                                        o Arquipélago de
                   hoje vive entre Munique e Hamburgo,
                                                                     Abrolhos (acima) um
mas sempre volta ao seu país natal para fazer duas coisas              destino ideal para
que ama: velejar e fotografar a natureza. Essas paixões                   gente como ele
resultaram em seu quarto livro, o recém-publicado
Navegando o Brasil, um relato fotográfico sobre os 9 mil    por geoposicionamento. Dessa forma, as fotos de
quilômetros do nosso litoral percorridos por Kremer em      Kremer poderão fornecer parâmetros concretos para
2012. A viagem começou em Santos (SP) e terminou em         detectar e avaliar futuras alterações na paisagem do lito-
Fortaleza. Foram quatro meses em trânsito e dez esta-       ral brasileiro provocadas por fenômenos socioeconômi-
dos visitados, por mar e por terra – neste caso, nunca      cos. Para CLAUDIA, Thomas elegeu três lugares que o
distante mais do que 80 quilômetros da costa. Os luga-      marcaram durante a expedição e comentou efeitos da
res clicados tiveram sua localização exata determinada      ação humana já percebidos em cada um deles.

                                                                                         ABRIL 2013   CLAUDIA     14 3
Sustentabilidade




 A seca em                                                      Resistência na
Ponta do Mel (RN)                                               Ilha de Vitória (SP)
“Era setembro e estava um calor sufocante em Mossoró            “O desenvolvimento do turismo, o crescimento demo-
(RN) quando parti de carro para fotografar os cavalos de        gráfico e a explosão imobiliária modificaram bastante a
pau, que são as bombas utilizadas para retirar petróleo em      paisagem e o cotidiano dos moradores do litoral paulista.
terra firme, no pré-sal. Com o clima de sertão, a terra é       A população local foi aos poucos perdendo espaço dentro
muito seca e a vegetação baixa e cheia de espinhos. Eu          do próprio hábitat. Isso começou na década de 1950 e se
seguia em direção a Areia Branca, município repleto de          intensificou ao longo dos anos. Hoje, é bem fácil ver as
salinas, falésias e dunas. Decidi incluir aquele lugar no meu   consequências desse processo em toda a costa do estado.
itinerário por causa da forte ação humana na natureza.          No entanto, algumas comunidades, em geral aquelas
Além dos cavalos de pau, existem as salinas. O que é extraí-    mais isoladas, lutaram e conseguiram manter seu estilo
do dali é levado para todo o Brasil desde 1802. A região        de vida e seus costumes – embora, inevitavelmente,
produz 95% de todo o sal obtido por evaporação solar no         tenha sido necessário fazer uma ou outra adaptação aos
Brasil. A apenas 8 quilômetros, a caminho da praia de           novos tempos. É o caso da Ilha de Vitória, no município
Ponta do Mel, cruzei com um casal em uma charrete sim-          de Ilhabela. Habitada por apenas 12 famílias, totalizan-
ples. Eles traziam dois tonéis com litros de água doce.         do cerca de 50 pessoas, é um pedaço de litoral onde o
No meio daquela estradinha de terra quase deserta, eles         cotidiano não é tão diferente do que sempre foi. Achei
me contaram que precisavam se locomover até cinco horas         interessante o fato de muita gente que conheci ali não
por dia para conseguir o recurso precioso. Ao sul daquele       desejar viver de outro modo. Dona Benedita, por exem-
local, passei por pequenas comunidades de pescadores e          plo, é uma senhora que nasceu na ilha e nunca pensou
                                                                                                                            Colaborou Bianca Castro




avistei animais mortos, principalmente vacas e jumentos.        em deixar sua terra natal. Eu me lembro bem de que ela
Fiquei impressionado com o isolamento da população e a          me disse: ‘Sair daqui pra quê? Outro dia, veio uma
beleza da paisagem árida. No fim do dia, descobri que a         mulher lá de São Paulo e ela me falou que, na cidade
Ponta do Mel fica em uma região bem singular: é o único         grande, tinha tudo, mas vivia com medo da violência, das
lugar do mundo onde o sertão vai até o mar.”                    enchentes... E eu não sei o que é viver com medo’.”

144   CLAUDIA     ABRIL 2013
As baleias em                                               Ocorre que a gordura, a proteína e os óleos presentes no

Abrolhos (BA)                                                corpo delas são bastante valiosos para a indústria far-
                                                             macêutica e cosmética. E essas baleias acabam sendo
“O pequeno arquipélago de águas claras e corais colori-      um alvo fácil para pescadores, pois a parte inferior delas
dos é uma área natural de reprodução de aves marinhas        é branca, visível quando submergem. Como podem
e diversas espécies de peixe. Escolhi fotografar o lugar,    pesar 40 toneladas e chegar a 19 metros, um exemplar
pois é um destino ideal para um instrutor de mergulho        apenas já rende bom lucro. Felizmente, porém, desde a
e capitão amador, como eu. Ainda mais que todos os           proibição da caça, a população vem se recuperando
anos, durante cinco meses, Abrolhos recebe visitantes        numericamente. É possível avistá-las após algumas
muito especiais: as baleias jubarte, que vão à região para   horas de navegação. Eu, por exemplo, cheguei a ver mais
se reproduzir e amamentar os filhotes, atraídas pelas        de dez em três horas. Ter a chance de ver de perto uma
águas mornas, de apenas 70 metros de profundidade.           baleia foi algo tão emocionante que me esqueci de foto-
Desde 2008, a espécie é protegida, uma vez que a caça        grafar. Somente na terceira vez é que consegui enqua-
estava dizimando a população de baleias da região.           drar, focar e clicar esse animal tão extraordinário.”




                                                                                         ABRIL 2013    CLAUDIA     14 5

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  • 1. Sustentabilidade Ecocliques O fotógrafo Thomas Kremer percorreu dez estados brasileiros para registrar os efeitos da ação humana no litoral do país. Aqui, comenta três momentos marcantes da sua jornada C riar nas pessoas a consciência de que elas fazem parte do meio ambiente e o modificam. Essa é a missão de cada Kremer ama fotografia, vela e projeto desenvolvido pelo paulista mergulho, prática Thomas Kremer, fotógrafo e produtor da qual é instrutor. cultural. Descendente de alemães, Não à toa, considera o Arquipélago de hoje vive entre Munique e Hamburgo, Abrolhos (acima) um mas sempre volta ao seu país natal para fazer duas coisas destino ideal para que ama: velejar e fotografar a natureza. Essas paixões gente como ele resultaram em seu quarto livro, o recém-publicado Navegando o Brasil, um relato fotográfico sobre os 9 mil por geoposicionamento. Dessa forma, as fotos de quilômetros do nosso litoral percorridos por Kremer em Kremer poderão fornecer parâmetros concretos para 2012. A viagem começou em Santos (SP) e terminou em detectar e avaliar futuras alterações na paisagem do lito- Fortaleza. Foram quatro meses em trânsito e dez esta- ral brasileiro provocadas por fenômenos socioeconômi- dos visitados, por mar e por terra – neste caso, nunca cos. Para CLAUDIA, Thomas elegeu três lugares que o distante mais do que 80 quilômetros da costa. Os luga- marcaram durante a expedição e comentou efeitos da res clicados tiveram sua localização exata determinada ação humana já percebidos em cada um deles. ABRIL 2013 CLAUDIA 14 3
  • 2. Sustentabilidade A seca em Resistência na Ponta do Mel (RN) Ilha de Vitória (SP) “Era setembro e estava um calor sufocante em Mossoró “O desenvolvimento do turismo, o crescimento demo- (RN) quando parti de carro para fotografar os cavalos de gráfico e a explosão imobiliária modificaram bastante a pau, que são as bombas utilizadas para retirar petróleo em paisagem e o cotidiano dos moradores do litoral paulista. terra firme, no pré-sal. Com o clima de sertão, a terra é A população local foi aos poucos perdendo espaço dentro muito seca e a vegetação baixa e cheia de espinhos. Eu do próprio hábitat. Isso começou na década de 1950 e se seguia em direção a Areia Branca, município repleto de intensificou ao longo dos anos. Hoje, é bem fácil ver as salinas, falésias e dunas. Decidi incluir aquele lugar no meu consequências desse processo em toda a costa do estado. itinerário por causa da forte ação humana na natureza. No entanto, algumas comunidades, em geral aquelas Além dos cavalos de pau, existem as salinas. O que é extraí- mais isoladas, lutaram e conseguiram manter seu estilo do dali é levado para todo o Brasil desde 1802. A região de vida e seus costumes – embora, inevitavelmente, produz 95% de todo o sal obtido por evaporação solar no tenha sido necessário fazer uma ou outra adaptação aos Brasil. A apenas 8 quilômetros, a caminho da praia de novos tempos. É o caso da Ilha de Vitória, no município Ponta do Mel, cruzei com um casal em uma charrete sim- de Ilhabela. Habitada por apenas 12 famílias, totalizan- ples. Eles traziam dois tonéis com litros de água doce. do cerca de 50 pessoas, é um pedaço de litoral onde o No meio daquela estradinha de terra quase deserta, eles cotidiano não é tão diferente do que sempre foi. Achei me contaram que precisavam se locomover até cinco horas interessante o fato de muita gente que conheci ali não por dia para conseguir o recurso precioso. Ao sul daquele desejar viver de outro modo. Dona Benedita, por exem- local, passei por pequenas comunidades de pescadores e plo, é uma senhora que nasceu na ilha e nunca pensou Colaborou Bianca Castro avistei animais mortos, principalmente vacas e jumentos. em deixar sua terra natal. Eu me lembro bem de que ela Fiquei impressionado com o isolamento da população e a me disse: ‘Sair daqui pra quê? Outro dia, veio uma beleza da paisagem árida. No fim do dia, descobri que a mulher lá de São Paulo e ela me falou que, na cidade Ponta do Mel fica em uma região bem singular: é o único grande, tinha tudo, mas vivia com medo da violência, das lugar do mundo onde o sertão vai até o mar.” enchentes... E eu não sei o que é viver com medo’.” 144 CLAUDIA ABRIL 2013
  • 3. As baleias em Ocorre que a gordura, a proteína e os óleos presentes no Abrolhos (BA) corpo delas são bastante valiosos para a indústria far- macêutica e cosmética. E essas baleias acabam sendo “O pequeno arquipélago de águas claras e corais colori- um alvo fácil para pescadores, pois a parte inferior delas dos é uma área natural de reprodução de aves marinhas é branca, visível quando submergem. Como podem e diversas espécies de peixe. Escolhi fotografar o lugar, pesar 40 toneladas e chegar a 19 metros, um exemplar pois é um destino ideal para um instrutor de mergulho apenas já rende bom lucro. Felizmente, porém, desde a e capitão amador, como eu. Ainda mais que todos os proibição da caça, a população vem se recuperando anos, durante cinco meses, Abrolhos recebe visitantes numericamente. É possível avistá-las após algumas muito especiais: as baleias jubarte, que vão à região para horas de navegação. Eu, por exemplo, cheguei a ver mais se reproduzir e amamentar os filhotes, atraídas pelas de dez em três horas. Ter a chance de ver de perto uma águas mornas, de apenas 70 metros de profundidade. baleia foi algo tão emocionante que me esqueci de foto- Desde 2008, a espécie é protegida, uma vez que a caça grafar. Somente na terceira vez é que consegui enqua- estava dizimando a população de baleias da região. drar, focar e clicar esse animal tão extraordinário.” ABRIL 2013 CLAUDIA 14 5