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Regina Gouveia
Σε ευ νο φοσσε προφεσσορα δε Φσιχα ...
Algumas reflexões sobre práticas lectivas
1999
2
A todos os meus alunos que ao longo de toda a minha carreira, me têm
estimulado com as suas questões, com as suas dúvidas, com a sua
curiosidade.
Aos professores estagiários, pelos desafios que cada ano aceitam
partilhar comigo.
A muitos professores, não apenas de Física e Química, e de todos os
níveis de ensino, pelos debates que comigo tantas vezes têm mantido e
pelos momentos de reflexão que me têm propiciado.
Ao Fernando, ao Miguel, ao Nuno, à Teresa e à Cláudia pela forma como
acarinharam este meu projecto.
Finalmente, mas de uma forma muito especial, à Professora Doutora
Nilza Costa que, apesar dos seus múltiplos afazeres, me deu a honra de
analisar criticamente este livro.
Agradeço...
3
4
Agradeço... 3
Índice 5
Siglas utilizadas 7
Prefácio 9
Em jeito de introdução.... 11
1-Por que razão há tantos alunos com dificuldades na aprendizagem da
Física/Química ?
15
2-O que é importante que os alunos aprendam ? 17
3-A que atribuir a falta de reflexão dos alunos perante grande parte das questões
que lhes são colocadas ?
19
4-Por que razão os alunos opõem resistência à mudança de concepções ? 31
5-Por que se fala hoje tanto na importância da contextualização ? 35
6-Qual a importância das actividades experimentais nas aulas de Física/Química
?
41
7-Que coerência deve existir entre o que pretendemos ensinar e o que
pretendemos avaliar ?
51
8-Como construir estratégias de ensino-aprendizagem ? 59
Em jeito de conclusão.... 79
Referências bibliográficas 81
Índice
5
6
No texto poderão eventualmente ser encontradas as seguintes siglas:
CA- concepções alternativas
cc- corrente contínua
ca- corrente alterna
CTO- Casa termicamente optimizada
CTS- Ciência/Tecnologia/Sociedade
EDP- Electricidade de Portugal
FCUP- Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
FEUP- Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto
FQ- Físico-Químicas
GIRA- Grupo de informação e recreação astronómica
GIRP - Grupo de Investigação em Resolução de Problemas
RP- Resolução de problemas
SMAS- Serviços Municipalizados de águas e saneamento
TE- Trabalho experimental
TLF- Técnicas Laboratoriais de Física
UE- União Europeia
Siglas Utilizadas
7
8
O Livro “Se eu não fosse professora de Física...”, de Regina Gouveia, foi lido por
mim do princípio ao fim sem qualquer cansaço e as paragens que existiram serviram
tão só para me fazer reflectir. Ao lê-lo foi crescendo em mim a ideia da sua grande
pertinência, nomeadamente para todos aqueles que de algum modo estão envolvidos
no ensino da Física e da Química (FQ), nas nossas escolas básicas e secundárias, e
que desejam que ele seja cada vez mais um ensino de qualidade. Assim, pensei
principalmente em Professores e futuros Professores de FQ, mas pensei também em
Investigadores Educacionais (e da Didáctica da Física e da Química, em particular) e
em Pais dos nossos alunos. Certamente que todos esses diferentes intervenientes
educativos ao ler o Livro irão sentir que o seu cerne é contribuir para que o ensino
ministrado tenha significado para os nossos alunos e que os ajude a desenvolverem-se
não só enquanto alunos mas, também, enquanto futuros cidadãos que se espera
responsáveis. Ele ajudará certamente a que cada um de nós possa fazer algo nesse
sentido também.
Muitos têm sido os estudos de investigação em Didáctica que têm procurado
contribuir para a finalidade acima enunciada, no entanto, é também conhecido que a
mensagem dos investigadores não tem chegado, como o desejado, aos seus principais
destinatários (nomeadamente, professores e alunos). O Livro que agora se publica tem
a vantagem de “dizer” essa mensagem utilizando uma linguagem simples, mas
rigorosa e fundamentada, e ilustrada com múltiplas situações práticas que ajudarão,
muito certamente, a dar forma às ideias avançadas. Essas situações, conforme a
autora refere, não pretendem ser receitas a seguir pelos professores mas tão só
propostas que, por um lado consubstanciam as perspectivas inovadoras apresentadas
e, por outro, poderão ajudar os professores e educadores a delinear estratégias em
consonância com as mesmas. Muitas delas, senão todas, são situações reais,
experienciadas pela autora ao longo da sua vida profissional. Este elemento
certamente ajudará a dar credibilidade quanto è exequibilidade do que é proposto.
Aqueles que desejarem aprofundar mais as ideias avançadas poderão prosseguir a sua
leitura através da vasta bibliografia que é citada ao longo do texto e referenciada no
final do Livro.
Ao longo da minha experiência profissional, enquanto formadora de professores
e investigadora em Didáctica da Física, tem vindo a crescer em mim a ideia da
necessidade de cada vez mais nos esforçarmos para que o nosso discurso tenha
Prefácio
9
relevância para o ensino e para os seus protagonistas. Penso sinceramente que
Regina Gouveia o conseguiu neste Livro. Não tenho qualquer dúvida que aconselharei
a sua leitura a todos aqueles que daqui para a frente comigo trabalharem.
Aveiro, 02 de Setembro de 1999
(Nilza Costa)
(Professora Associada da Universidade de Aveiro, especialidade Didáctica da Física)
10
Sou professora de Física e Química e comecei por sê-lo um pouco por acaso.
Até ao 5º ano do Liceu (actual 9º ano de escolaridade) gostei genericamente de todas
as disciplinas à excepção de História. A isso não devem ter sido alheias por um lado a
minha má memória e por outro a má experiência que tive com a maior parte dos
professores da disciplina. Em 3 anos tive 5 professores e desses apenas dois não
apresentavam a história como uma sucessão de datas, factos e nomes, para mim um
tanto desconexos. Mas não é da disciplina de História que pretendo falar; se a cito é
porque pretendo enfatizar a importância do professor na aprendizagem dos alunos.
Voltaremos mais tarde a este ponto.
Retomando o fio condutor, dizia que até ao 5º ano praticamente todas as
disciplinas me interessavam, mas a matemática exercia sobre mim um fascínio maior
que qualquer das outras. Chegada ao fim do 5º ano, impôs-se a opção entre as Letras
e as Ciências; o gosto pela matemática decidiu a minha opção- optei pelas ciências.
Ao longo dos 6º e 7º anos, comecei a pensar no curso que gostaria de tirar. Só se me
apresentavam duas opções- Medicina e Matemática. A primeira, motivada
essencialmente pela generosidade e pelo idealismo que se tem quando se é jovem.
Para mim ser médica era a melhor forma que encontrava de poder ajudar os outros. A
segunda decorria do meu gosto quer pela matemática, quer por ensinar- desde
pequena em minha casa havia colegas de ano, ou mais atrasados, a quem eu, com
muito gosto, tirava dúvidas. No 7º ano (actual 11º) tive um professor excepcional a
matemática e pensava decidir-me pelas matemáticas. Foi esse professor que me
entusiasmou acerca de um curso de que lá, numa cidade de província, nunca ouvira
falar- engenharia química. Matriculei-me em engenharia química, mas ainda antes do
início das aulas, resolvi mudar para matemáticas. Estive uma tarde inteira na bicha
(...) Andar no mundo
é como atravessar o continente negro
do berço à contracosta.
Vai-se crescendo e andando.
Sonhando enquanto é tempo(...)
In “Poema da Selva”, Novos Poemas Póstumos de António
Gedeão, 1ª edição, 1990, Edições João Sá da Costa, Lisboa
Em jeito de introdução....
11
(na altura era assim que se dizia) da secretaria, a fim de requerer a mudança, mas
não cheguei a ser atendida. Desisti da mudança e estive dois anos em engenharia
química. No fim do segundo ano, decidi mudar, não para matemáticas mas para
Físico-Químicas, a fim de aproveitar o máximo de cadeiras feitas. Durante todo o
curso, as cadeiras de que mais gostei foram as de Matemática, seguindo-se as de
Física. Quando acabei o curso e comecei a leccionar num Liceu (como se chamava na
altura), ao sentir necessidade de explicar aos alunos o significado físico de alguns
conceitos, apercebi-me de que, até aí, eu tinha visto a física mais como uma
matemática aplicada, do que uma disciplina autónoma. Tive que reestudá- la de outro
modo e comecei então a aperceber-me de como a física é uma disciplina fascinante.
Isso de modo algum significa que saiba interpretar fisicamente muitos fenómenos,
significa apenas que tento interpretá-los e não apenas reduzi-los a meras equações
matemáticas.
Porque razão conto isto? Li um dia uma entrevista a um professor em que uma
das perguntas era:
-O que gostaria de ser se não fosse professor?
Ao que o professor respondeu:
- Gostaria de o ser.
Achei a resposta muito interessante e dei comigo a pensar que se um dia me
perguntassem o que eu gostaria de ser se não fosse professora de Física também
responderia: Gostaria de sê-lo. Se ser professor é sempre uma tarefa aliciante, apesar
de todos os “senãos”, ser professor de Física é, em meu entender, duplamente
aliciante. Mas de imediato, reflecti: Se eu nunca tivesse sido professora de Física, por
certo não saberia como é fascinante sê-lo e por isso não poderia responder desse modo.
É por esse motivo, que gostaria de mostrar aos professores, essencialmente aos que
se iniciam, que ensinar física é uma tarefa belíssima que vale a pena enfrentar.
Mas se é certo que há já algum tempo pensava em partilhar alguma da minha
experiência profissional, foi a partir da leitura do artigo de José Martin Toscano “El
análisis y la comunicación de experiencias. Algunos exemplos y recursos”, publicado
no número 13 da revista “Alambique” de Julho de 1997, que as ideias começaram a
ser passadas para o papel. E porquê? A resposta poderá ser encontrada nos extractos
que transcrevo, embora traduzidos:
É curioso o facto de que os professores e professoras que já há alguns anos
estamos ligados, de uma ou outra forma, a processos de inovação nos centros, temos
frequentemente a sensação de que cada vez que iniciamos algum tipo de experiência,
partimos quase do zero. Se recorremos a bibliografia (revistas, livros, etc.,) é difícil
encontrar referentes práticos que nos possam esclarecer, ou seja, outras experiências
desenvolvidas e sistematizadas por outros professores e professoras, em outros
contextos escolares.(...)
12
(...) Talvez a razão fundamental resida em que o nosso pensamento está configurado
mais para a acção, para a intervenção do que para a análise e a reflexão. Pois escrever
exige uma disciplina mental que requer, por sua vez, aprendizagem e treino. (...) Porque
também existe a sensação de banalidade do que dizemos quando pensamos num
possível público ao qual não estamos habituados quando pensamos no juízo de outras
pessoas... (...) Mas também temos aprendido que vale a pena realizar esse esforço. Se
não queremos começar sempre do zero, se não queremos ficar apenas no imaginar uma
mudança na escola, quando realmente tudo continua na mesma, um dos pilares sobre
os quais podemos ir construindo essa mudança, é a difusão e a análise de experiências
inovadoras que a exemplifiquem.
(...) Assumimos então não só a responsabilidade de tentar mudar mas a de mostrar aos
demais como o fazemos concretamente.
Tenho vindo a fazer referência á minha condição de professora de Física. É
óbvio que os professores de Física são genericamente também professores de Química,
por isso ao longo do livro serão feitas algumas reflexões no que respeita ao ensino-
aprendizagem da Química. Mas embora eu ache a Química interessante, nunca
consegui que produzisse em mim o mesmo “encantamento” que a Física. Há, por
certo, muitos professores de Química que pensam acerca dela o mesmo que eu penso
sobre a Física. A eles lanço o desafio de nos darem o seu testemunho.
Finalmente gostaria de referir que este livro não tem, nem pode ter, qualquer
outra pretensão que não seja sensibilizar os professores para uma reflexão sobre as
suas práticas. Para isso incluirei uma bibliografia relativamente extensa que
permitirá fundamentar muitas das propostas vigentes, no âmbito do ensino das
Ciências, particularmente da Física e da Química.
13
14
O insucesso de muitos alunos em Física/Química não é de hoje. Até à década
de 70, o que então se designava por ensino secundário, estava dividido em três ciclos:
o 1º correspondia aos actuais 5º e 6º anos de escolaridade, o 2º aos 7º, 8º e 9º e
finalmente o 3º ao 10 e 11º. No 2º ciclo as disciplinas estavam organizadas em duas
secções- Letras e Ciências. Para concluir o 5º ano, os alunos teriam que ter aprovação
nas duas secções mas podiam reprovar a uma disciplina de cada secção, a não ser
que quisessem continuar estudos. Neste caso, apenas poderiam reprovar a uma
disciplina numa das secções. Na secção de Ciências, quando os alunos passavam
reprovados a uma disciplina, essa disciplina, quase sem excepção, ou era Ciências
Físico-Químicas ou era Matemática. Mas o facto de o insucesso nestas disciplinas vir
de longe não pode, de modo algum, ser visto como uma fatalidade irremediável. Daí
que a questão colocada no início do capítulo: “Porque razão há tantos alunos com
insucesso na aprendizagem da Física/Química? “ seja pertinente.
As razões do insucesso dos alunos na Física/Química são inúmeras, pelo que
responder a esta questão não é tarefa fácil. Genericamente os professores atribuem
esse insucesso a causas que lhes são exteriores- falta de conhecimentos de
matemática, falta de domínio da língua, falta de hábitos de trabalho, falta de
capacidades cognitivas adequadas, existência de múltiplas áreas de interesse para os
jovens (televisão, vídeo, cinema, discotecas, jogos de computador, internet, etc) que
entram em concorrência com a escola e com os quais esta tem dificuldade em
competir. Obviamente que todos estes factores podem ser responsáveis pelo insucesso
mas, não é menos verdade que também os professores podem contribuir para esse
mesmo insucesso, quando ignoram as ideias prévias dos alunos, apresentam a
matéria de uma forma descontextualizada, privilegiam o uso de algoritmos e da
mecanização, não estimulam nos alunos capacidades como problematizar, seleccionar,
propor explicações, elaborar projectos, etc. Também para tudo isto os professores
Que língua estrangeira é esta
que me roça a flor do ouvido,
um vozear sem sentido
que nenhum sentido empresta?(...)
In “ Desencontro”, Poesias Completas de António Gedeão,
1968, Portugália Editora, Lisboa
1 - Por que razão há tantos alunos com dificuldades na
aprendizagem da Física/Química ?
15
invocam razões, algumas delas poderosas. Se existe uma feroz competição pelo acesso
ao ensino superior, e se os exames privilegiam o uso de algoritmos e a mecanização, e
apenas pretendem avaliar o conhecimento conceptual, como poderão os professores
ter em conta, particularmente no Ensino Secundário, os conhecimentos processual e
atitudinal? E será que não existem razões para privilegiar os conceitos em detrimento
das capacidades, das atitudes, dos valores? Creio que a resposta a esta última
questão, só pode ser NÃO. Quando penso na imensidão de conceitos que aprendi ao
longo de toda a minha vida, particularmente nas escolas (primária, secundária,
superior) e na pequeníssima percentagem dos mesmos que ainda recordo, sou
forçada a concluir que não foi, por parte das escolas, um bom investimento. Não quero
com isto significar que não se devam ensinar os conceitos, nas creio que é igualmente
importante investir no desenvolvimento de capacidades (cognitivas e manipulativas) e
valores. Por outro lado, considero que as mudanças institucionais dificilmente
ocorrem sem pressão dos cidadãos, pelo que se queremos que o sistema mude,
teremos que ser nós a mudar e a exercer pressão com vista à mudança.
Alguns estudos feitos em outros países revelam que alunos, a quem a Física e a
Química tenham sido ensinadas através de estratégias inovadoras, obtêm melhores
resultados mesmo em provas tradicionais, pelo que parece não haver razões para
temermos as mudanças. E se há mudanças que implicam alterações radicais nas
estratégias de ensino-aprendizagem, há outras que implicam pequenas alterações. Em
capítulos posteriores voltaremos a abordar este ponto bem como outros anteriormente
focados.
16
Uma das principais críticas que se faz hoje ao ensino a todos os níveis,
e em particular nos Estados Unidos, é que os alunos não aprendem a raciocinar e a
pensar criticamente (Hurd, 1989). Creio que este aspecto poderá ser constatado em
muitos outros países, nomeadamente no nosso. Efectivamente, se colocarmos aos
alunos um exercício como o que se indica a seguir, muito provavelmente obteremos
respostas que evidenciam o que acaba de ser referido.
Um corpo, com a massa de 2kg, cai da altura de 5m.
1- Calcula:
1.1- o tempo que demora cair
1.2- a velocidade com que atinge o solo
2- Indica, justificando, se o corpo atingiria mais rapidamente o solo caso a sua
massa fosse dupla.
Apesar de terem usado na resolução das questões 1.1 e 1.2 fórmulas em que
não intervém a massa do corpo, muitos alunos provavelmente responderão sim na
questão 2, dada a concepção alternativa de que um corpo cai tanto mais depressa
quanto mais pesado for. A resolução do exercício é feita de forma mecânica, pelo que
os alunos se limitam a usar a fórmula adequada a cada uma das alíneas sem qualquer
reflexão sobre a questão global.
Esta falta de reflexão, bem como a resistência oferecida pelos alunos à
mudança conceptual são, por certo, responsáveis por muito do insucesso no ensino-
aprendizagem das Ciências. No campo da investigação educacional tem-se vindo a
verificar uma mudança progressiva de paradigma, conduzindo a concepções sobre o
ensino das ciências que valorizam a construção de saberes, e o desenvolvimento de
capacidades e atitudes que permitam, por um lado, uma adaptação ao ritmo de
mudança dos nossos dias e, por outro, tomadas de decisão conscientes sobre
problemas locais e globais. Martins e Veiga (1999), consideram que a Escola deve
O Universo é feito essencialmente de coisa
nenhuma
intervalos, distâncias, buracos, porosidade etérea.
Espaço vazio, em suma. O resto é a matéria.(...)
In “ Máquina do mundo”, Poesias Completas de António
Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa
2- O que é importante que os alunos aprendam?
17
promover não só a construção de saberes necessários a uma compreensão adequada
desses problemas, mas também hábitos de reflexão e questionamento. Hurd (1987)
considera que devem ser dadas aos alunos oportunidades para integrarem uma
informação científica válida na formulação de julgamentos éticos. O ensino-
aprendizagem das Ciências deve, pois, ser entendido mais como um processo do que
como um produto de informações, factos, modelos, teorias, que muitos autores,
nomeadamente Yager (1992) incluem no que designam por domínio conceptual. Em
muitos estudos aparece a referência a outros domínios de conhecimentos, para além
do conceptual, nomeadamente os domínios processual e atitudinal ( Yager, 1992;
Sánchez Blanco, 1997). No domínio atitudinal incluem-se sentimentos, valores e
tomadas de decisão, enquanto que no processual se incluem processos como observar,
descrever, classificar, seleccionar, organizar, prever, inferir, controlar variáveis,
formular hipóteses, elaborar projectos. Alguns autores (por exemplo Beyer,
Presseissen, Quellmalz, Ratths et al, citados por Cruz, 1989) referem-se a estes
processos falando em capacidades, e distinguindo, por vezes, entre capacidades
elementares e complexas. Nestas últimas incluem resolver problemas, tomar decisões,
avaliar, etc .
A necessidade de valorizar não apenas o conhecimento conceptual mas
também os conhecimentos processual e atitudinal, deve levar a uma reflexão por parte
de todos aqueles que estão envolvidos no ensino aprendizagem da ciência, muito em
particular os professores.
A este propósito, não posso deixar de citar Hurd (1987), pp 55, que termina
assim o seu artigo “Ciência- Tecnologia- Sociedade: um novo contexto para o ensino da
ciência no secundário”:
Desde que começou a ler este artigo a quantidade de novo conhecimento
entretanto gerado dá para encher 25 volumes da Enciclopédia Britânica- o ritmo médio é
de 27 volumes em cada 30 minutos, dia e noite, semana após semana (....) Muito do que
um estudante precisará de saber para usar na vida e no trabalho ainda não foi
descoberto. O que é que isto significa para o ensino da ciência? Significa que as
capacidades e a arte de aprender tornam-se os objectivos principais do ensino-
aprendizagem da ciência de forma a que os estudantes possam ficar para sempre bem
educados. Numa idade de informação, cada estudante deve adquirir a capacidade para
identificar nova informação, avaliar o seu valor e ser capaz de controlar a sua
capacidade para usar adequadamente este conhecimento.
18
Uma das áreas em que os alunos apresentam muitas dificuldades é a resolução
de Problemas (RP). Também aqui os professores atribuem essas dificuldades a várias
causas, muito em particular às dificuldades matemáticas, no entanto raramente
referem a didáctica utilizada. Mas será que essa não é uma das principais causas?
Por várias vezes coloquei as questões A e B em testes sumativos para alunos
de 9ºano e cheguei inclusivamente a colocá-las a alunos de 10 º ano.
Questão A
Calcula a potência de uma máquina de lavar louça, sabendo que durante um programa
de lavagem de 1,5 h consome 1,8 kWh .
Questão B
A tabela anexa contem informações quanto ao modo como a família Silva utiliza dois dos
seus electrodomésticos .
Arca frigorífica Temperatura interior igual a -15 ºC ; consumo médio diário igual a
1,2 kWh
Máquina da
louça
Um programa diário a 40 ºC ; consumo médio diário igual a 1,2
kWh
Considera a seguinte afirmação: A potência da máquina da louça da família Silva é
superior à potência da sua arca frigorífica
Manifesta a tua concordância ou discordância com a afirmação, indicando razões
justificativas.
(...) Põe-se o Sol porque o seu movimento é relativo.
Derrama cores porque os meus olhos vêem.
Mas por que será belo o pôr do Sol? (...)
In “Poema das coisas belas”, Poemas Póstumos de António
Gedeão, 1ª edição, 1984, Edições João Sá da Costa, Lisboa
3-A que atribuir a falta de reflexão dos alunos perante
grande parte das questões que lhes são colocadas?
19
A questão A, foi resolvida em média por 50 % dos alunos no 9º ano e 90% no
10º ano, mas no que respeita à questão B, quer num ano, quer no outro, ou nenhum
aluno resolveu ou apenas um ou dois conseguiram resolvê-la. De entre as respostas
à questão B, citam-se, por ex. :
A potência da máquina é maior porque funciona a temperatura mais elevada
A potência da máquina é maior porque 40 é maior que -15
A potência da máquina é 55 vezes maior
A potência da máquina é 25 vezes maior
A potência é igual porque gastam o mesmo
A potência do frigorífico é maior porque "fazer frio" gasta muita energia
As duas questões envolvem a aplicação de um mesmo conceito e apresentam a
mesma dificuldade matemática mas, perante dados em excesso, a maior parte dos
alunos é incapaz de seleccionar os dados relevantes, tal como é incapaz de ir buscar
ao seu quotidiano outros dados de que necessita.
Passo agora a descrever uma outra situação, que teve lugar numa turma de
11º ano quando a corrente eléctrica fazia parte do respectivo programa. Foi colocada
num teste diagnóstico a seguinte questão:
Questão C
Considera o circuito esquematizado. Qual deverá ser a indicação do amperímetro A2
sabendo que A1 indica 0,2 A?
A1 20 Ω A2
Um dos alunos (com média de 16), chamou-me várias vezes insistindo que
precisava de mais dados e acabou por escrever no teste(sic) :
O problema não pode ser resolvido porque faltam dados e a lei de Ohm não
"encaixa".
A preocupação do aluno era utilizar um algoritmo, sem qualquer análise
qualitativa prévia do problema.
No âmbito da investigação levada a cabo em 1995/1996, dentro do meu
projecto de licença sabática (Gouveia, 1995), foi apresentada a questão anexa a
alunos de Físico-Químicas, de 9º, 10º e 12º anos:
20
Questão D
As seis caixas representadas na figura contêm diferentes substâncias, mas há duas
caixas com uma mesma substância . Pretende-se que identifiques essas duas caixas e
que justifiques a tua escolha.
As caixas A,B,C são idênticas entre si e cada uma, vazia, pesa 100 g. As caixas D,E,F
são idênticas entre si e cada uma, vazia, pesa 50 g.
Curiosamente em todos os anos houve respostas incorrectas, mas as respostas
X e Y anexas merecem particular reflexão.:
Resposta X(sic)
O problema até pode ser fácil mas é confuso e foi a 1ª vez que tive um deste
género
Resposta Y(sic)
caixa A- 200 g x 50 cm3 = 10000
caixa B- 200 g x 50 cm3 = 10000
Eu não me lembro bem, mas acho que se tinha de multiplicar o volume pelo peso.
Se assim for é a caixa A e D
Também neste caso a preocupação dos alunos foi utilizar um algoritmo, sem
qualquer análise qualitativa prévia do problema.
As situações E e F que se descrevem a seguir ocorreram em provas de
avaliação. Numa prova global de 10ºano foi colocada a questão:
A
O volume
de substância
na caixa é
50 cm 3
e a caixa cheia
pesa 300 g
B
O volume
de substância
na caixa é
100 cm 3
e a caixa cheia
pesa 300 g
C
O volume
de substância
na caixa é
200 cm 3
e a caixa cheia
pesa 250 g
D
O volume
de substância
na caixa é
50 cm 3
e a caixa cheia
pesa 250 g
E
O volume
de substância
na caixa é
100 cm 3
e a caixa cheia
pesa 300 g
F
O volume
de substância
na caixa
é 200 cm3
e a caixa cheia
pesa 250 g
21
Questão E
Um corpo de massa 0,4 kg está apoiado numa
superfície horizontal. Sobre ele actuam as forças F de
intensidade 8N e a força de atrito A de intensidade 2N.
.....
60 º
F
B C
1.4-Qual a variação de energia cinética sofrida pelo corpo no trajecto referido na alínea
1.21? Justifique devidamente.
Um aluno respondeu (sic):
Não é possível resolver pela fórmula Ec= ½ mv2 porque não temos o volume e não
é possível resolver pela fórmula W = ∆ Ec porque há atrito
Mais uma vez emerge a preocupação em utilizar um algoritmo, sem qualquer
reflexão acerca do mesmo.
Num exame de equivalência à frequência, na disciplina de TLF, bloco I, uma
das questões era:
Questão F
Uma das técnicas de construção civil para aproveitamento
solar é a utilização de paredes de Trombe que consistem no
seguinte. Na fachada (F) de uma casa, é colocada uma
espécie de janela em vidro (V), por trás da qual existe um
parede de betão(P), enegrecida. Por trás dessa parede existe
o compartimento a aquecer. Muitas vezes a parede P tem
duas aberturas, uma superior A, e outra inferior B. Nesta
técnica de construção está patente a atenção dada á
transferência de energia, como calor, por condução,
convecção e radiação
F
A
V P
Compartimento
B
1-Indique, justificando da forma mais completa possível se, numa parede de Trombe,
os três processos de transferência de energia como calor, assumem igual importância
2-Indique, justificando, porque razão as paredes de Trombe são feitas em betão e não
em alumínio
A fim de responder á questão, apresentava-se, no início do teste, a seguinte
informação:
Ao longo da prova poderão ser úteis os dados contidos na tabela anexa
Água Alumínio Betão
capacidade térmica mássica (J kg-1 0C-1) 4186 900 3350
condutibilidade térmica ( W m-1 0C-1) 0,61 237 20
coeficiente de dilatação volumétrica (0C-1) 210 x 10 -6 72 x 10 -6 30 x 10 -6
1 O trajecto correspondia a um deslocamento de 3,0 m de B para C.
22
Na resposta à alínea 1 da questão, um aluno com média de 18, que pretendia
melhoria de nota, a propósito da condução, respondeu (sic):
A água contida na parede é má condutora térmica e o betão de que é feita a
parede também..
A resposta parece evidenciar, mais uma vez, a dificuldade de seleccionar os
dados necessários á resolução do problema.
Situações como as referidas foram por certo vivenciadas já por muitos
professores de Física e Química dos Ensinos Básico e Secundário e a sua explicação
poderá encontrar-se, pelo menos parcialmente, no tipo de questões que
habitualmente se colocam aos alunos. Se analisarmos a maior parte dos exercícios
propostos em manuais, em fichas de trabalho, em fichas de avaliação sumativa ou em
pontos de exame, podemos constatar que genericamente os dados estão lá todos e em
número estritamente necessário. Aos alunos basta encontrar uma ou mais fórmulas
que permitam ligar aqueles dados. Por que não passar a incluir dados em excesso
para que os alunos tenham que seleccionar quais os relevantes para o exercício em
causa? Com esta pequena alteração, o aluno vai desenvolver o seu conhecimento
processual, ao desenvolver a capacidade de seleccionar. E se a questão for colocada
numa aula normal, por que não apresentá-la com falta de dados para que o aluno
possa desenvolver capacidades mais complexas? Vários autores, entre eles Gil Pérez
et al (1988) referem a importância de apresentar aos alunos questões em que há
insuficiência de dados. Outros autores, entre eles Kempa, (1986), citado por Jiménez
(1995), referem também a importância do excesso de dados, considerando pouco
adequadas as questões em que se apresenta aos alunos apenas a informação
essencial para a sua solução. A insuficiência e/ou o excesso de dados obrigarão
necessariamente a uma reflexão qualitativa prévia necessária à resolução das
questões propostas aos alunos.
Um outro aspecto que importa também salientar é que a apresentação de um
exercício que vai sendo desdobrado em muitas alíneas, apresenta porventura mais
desvantagens que vantagens. O aluno resolve cada uma das alíneas, não vendo a
questão global que se lhe coloca. Podemos detectar facilmente o que acaba de ser
referido com o exercício apresentado no início do capítulo anterior.
A propósito do que tem vindo a ser referido, Kulm (1990), admite que os
professores muitas vezes pensam que ensinam resolução de problemas mas o que
ensinam são fundamentalmente exercícios Embora não exista uma fronteira definida
entre exercício e problema (Watts, 1993; Lopes, 1994), há características que estão
essencialmente presentes no problema e não o estão no exercício. O quadro da figura
1, (Gouveia et al, 1995), sintetiza essas características.
23
Figura 1: Características de exercícios e problemas
Exercício Problema
 dados explícitos e em número
necessário e suficiente
 resolução única
 solução única
 obstáculo reduzido; questões de
orientação
 aluno-sujeito passivo da aprendizagem
 pode ser resolvido mediante a
recordação, reprodução ou aplicação
de um algoritmo
 dados não explícitos (implícitos na
descrição da situação)
 vários caminhos para a resolução
 várias soluções possíveis
 grande obstáculo
 aluno-sujeito activo da
aprendizagem
 envolve capacidades cognitivas,
metacognitivas, afectivas e
psicomotoras
A transformação de exercícios em problemas é, a meu ver, uma tarefa aliciante
que recomendo a todos os professores. Vejamos alguns exemplos:
1-A questão B referida no início do capítulo não é mais que um problema
criado a partir do exercício proposto na questão A. Ao introduzir dados em excesso
num exercício estamos a dar um passo para o transformar num problema, criando
condições para que o aluno desenvolva, não só conhecimento conceptual mas também
processual.
2-Vejamos um outro exemplo de transformação de um exercício em problema,
desta vez no âmbito da Química
Questão G
Supõe que tens 44, 0 g de dióxido de carbono. Calcula o nº de moléculas existentes
nessa massa bem como o volume PTN ocupado pela mesma
Questão H
Calcula o nº de moléculas existentes numa botija de gás das utilizadas no laboratório,
bem como o volume de gás que se libertaria da botija se a deixássemos esvaziar
completamente.
Enquanto que a questão G é um exercício (o aluno não necessita de fazer
qualquer análise qualitativa prévia), a questão H é um problema. O aluno terá que
fazer uma análise prévia da situação que o levará a formular questões tais como:
Qual é o gás?
Qual a massa de gás contida na botija?
24
A resposta poderá ser dada a partir de um excerto de um folheto da Galp
(Figura 2), que o aluno terá que analisar a fim de seleccionar a informação relevante.
Em geral o aluno, de início, selecciona também informação não relevante como sejam
as dimensões da botija, a partir das quais pretende calcular o volume de gás. A
discussão que se deve criar à volta deste problema deverá levar a que o aluno
reconheça posteriormente o desconhecimento de alguns dados (por ex. as condições
de pressão e temperatura no laboratório) e a irrelevância de outros, bem como a razão
de ser dessa irrelevância.
25
Figura 2- Excerto de um folheto informativo
(Incluir Figura 2)
26
3-Vejamos ainda um outro exemplo de transformação de exercício (questão I)
em problema (questão J)2
Questão I
Um Porsche 911 Turbo atinge a velocidade de 100 km/h, a partir do repouso, em 4,9 s.
Supõe que o movimento é rectilíneo e calcula, para o intervalo de tempo referido:
1-a aceleração média
2-o espaço percorrido, supondo a aceleração constante
Questão J
Um condutor, que mora a 150 m de uma via rápida, sai de casa no seu SEAT AROSA
1.0 e ao entrar na via rápida é autuado por conduzir a uma velocidade superior à
permitida na referida via. Em tribunal é ilibado, tendo os argumentos da defesa incidido
fundamentalmente em características do carro. Quais terão sido os argumentos da
defesa?
Características do SEAT AROSA 1.0
Peso: 864 kg
Dimensões:
comprimento-3,536 m; largura- 1,460 m; altura-2,323 m
velocidade máxima : 150 km/h
Aceleração (0-100 km/h): 16,9 s
Consumo(litros aos 100 km) : estrada (100-110 km/h)- 4,5;
Auto-estrada(120-130 km/h)-6,3; cidade – 5,8
Condições de ensaio: auto-estrada e estrada com trânsito médio. Cidade com trânsito.
Piso seco, vento moderado. Duas pessoas a bordo
(adaptado da Revista ACP, nº12, Dezembro de 1997, pp31)
As duas questões envolvem fundamentalmente os mesmos conceitos, mas a
questão J, para além de estar contextualizada, permite desenvolver uma série de
capacidades tais como:
 seleccionar informação relevante
 analisar criticamente a informação (por exemplo interpretar a informação
relativa à aceleração e identificar a falta de informação quanto à velocidade
máxima permitida numa via rápida)
2 Estas questões foram já discutidas em sessões de formação (Relatório Final da Acção PII-482, Programa
Ciência Viva, Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa, Universidade de Aveiro, Set. 99)
27
 analisar cuidadosamente os resultados à luz das hipóteses e dos casos
limite
4- Ainda uma outra situação, em que se comparam as questões L e M.
Questão L
Introduziu-se uma resistência de aquecimento de potência 300 W num recipiente com
300 g de água. Calcula a elevação de temperatura da água sabendo que a resistência
esteve ligada durante 6 min.
Questão M
Uma resistência de aquecimento de potência 300 W esteve ligada durante 6 min numa
cafeteira com 300 g de água. Será que a água ferveu?
Na primeira questão o aluno limita-se a aplicar fórmulas e obtém o resultado
86 ºC para a variação de temperatura. Esta resposta é absurda por duas razões:
 o aluno admitiu que toda a energia foi transferida para a água, o que é absurdo
com uma cafeteira;
 por outro lado o aluno não sabe qual era a temperatura inicial da água; se
eventualmente fosse, por exemplo 20 ºC, e tendo o aluno admitido que toda a
energia foi transferida para a água, a energia fornecida teria sido suficiente
para que a água entrasse em ebulição, pelo que a variação de temperatura não
seria a calculada.
A segunda questão obriga o aluno a reflectir pelo menos sobre este segundo
aspecto, mas se o aluno for habituado a raciocinar sobre problemas reais, irá
responder que não tem dados suficientes pois desconhece que fracção de energia foi
efectivamente utilizada no aquecimento da água.
É óbvio que toda esta análise podia ser feita relativamente à questão L e nessa
altura não teria sido um exercício mas, na realidade, exercícios como o proposto na
questão L são colocados muitas vezes, sem a preocupação de que o resultado seja
viável numa situação real, pretendendo-se apenas como resposta o equivalente aos
ditos 86 ºC.
De tudo o que foi referido emerge um aspecto muito importante; é preciso adoptar
uma prática pedagógico-didáctica que leve os alunos a começar por um estudo
qualitativo da situação. A situação que a seguir se descreve evidencia, mais uma vez,
a falta de análise qualitativa prévia. A questão (adaptada a partir de outra
apresentada por Gil et al (1992) é a seguinte:
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Questão N
Um móvel desloca-se segundo uma trajectória rectilínea, de acordo com a equação
s = 25 + 40t – 5 t2 . Se se deslocar durante 6s poderá atingir um obstáculo colocado na
trajectória a 100m da origem ?
Muitos alunos responderão que não, precisamente por falta da referida análise
qualitativa prévia.
A importância no sucesso dos alunos, destes aspectos que têm vindo a ser
referidos, é revelada por vários estudos, um deles realizado também por Gil Pérez et al,
(1988), com alunos pertencentes a dois grupos. Um dos grupos (chamemos-lhe I)
incluía alunos que tinham sido submetidos a estratégias privilegiando a resolução de
problemas e o outro grupo (II) incluía alunos submetidos a estratégias privilegiando a
resolução de exercícios. A todos os alunos foi proposta a resolução de exercícios
idênticos aos habitualmente propostos nos manuais. Os alunos do grupo I obtiveram
melhores resultados que os do grupo II. Os alunos deste grupo II revelaram não fazer
uma análise qualitativa prévia cuidada pois foram os que primeiro começaram a
utilizar as fórmulas tal como utilizaram imediatamente os dados sem reflexão sobre a
sua pertinência.
O que anteriormente foi referido não significa que não se proponha aos alunos
a resolução de exercícios. O que se pretende é sensibilizar para a necessidade de dar
menos ênfase à resolução de exercícios e enfatizar a resolução de problemas.
29
30
À luz da perspectiva construtivista, vigente no ensino- aprendizagem das
Ciências, aprender pressupõe um processo de construção do conhecimento por parte
dos alunos que devem desempenhar um papel activo na sua aprendizagem. O
conhecimento informal do aluno sobre o mundo que o rodeia, vai condicionar de
forma decisiva as novas aprendizagens, pelo que no ensino das Ciências, é
fundamental ter em conta as ideias e as explicações sobre os fenómenos naturais que os
alunos trazem para a escola e que, muitas vezes, não são capazes de explicitar (Martins
e Veiga, 1999, pp 26). Estas concepções, vulgarmente designadas por concepções
alternativas (CA)3, têm constituído uma das principais (senão a principal) linha de
investigação em didáctica das ciências nos últimos anos. Felizmente para nós,
professores de Física, existem inúmeros estudos sobre CA dos alunos, nomeadamente
em relação aos conteúdos que leccionamos. Alguns desses estudos têm sido feitos em
Portugal. Citam-se, entre outros, Vasconcelos (1985), Caldeira et al (1991), Neto et al
(1991), Veiga (1991).
Concepções alternativas dos alunos são frequentemente encontradas nas
práticas lectivas. Vejamos algumas ainda no âmbito da Física:
F1-Perante uma mesa com pés metálicos e tampo de madeira, os alunos, muito
provavelmente, dirão que o tampo está a uma temperatura superior, porque os
metais são mais frios que a madeira.
3 Existem outras terminologias, por exemplo, ideias prévias, versões privadas, pre-concepções.
(...) Eu queria agradecer-te , Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu, e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste,
ia jurar- que disparate, Galileo!-
-e jurava a pés juntos, e apostava a cabeça
sem a menor hesitação-
que os corpos caem tanto mais depressa
quanto mais pesados são.(...)
In, “Poema para Galileo”, Poesias Completas de António
Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa
4-Por que razão os alunos opõem resistência à mudança de
concepções ?
31
F2-Perante um circuito não ramificado, os alunos consideram, genericamente,
que a intensidade de corrente vai diminuindo ao longo do circuito
F3-Genericamente os alunos consideram que, num corpo que foi lançado
verticalmente no ar, actua durante a subida uma força vertical ascendente.
F4-Muitos alunos consideram que perante dois corpos idênticos, um negro e
um branco, colocados num ambiente aquecido, o negro aumentará mais
rapidamente a temperatura, mas consideram também que a temperatura desse
corpo irá, em seguida, baixar mais lentamente.
F5-Perante a questão “ Se para um pic-nic quiséssemos levar uma taça com um
gelado, seria boa ideia embrulhá-la num cobertor? ” a esmagadora maioria dos
alunos responderá “Não pois o cobertor aquece”4
F6-Perante uma lente plano convexa (por exemplo) os alunos consideram,
frequentemente, que a imagem obtida será diferente se voltarmos para o
objecto a face curva ou a face plana.
F7-Se apresentarmos aos alunos dois cubos maciços, de igual volume, um de
chumbo e outro de alumínio, muitos consideram que, colocados num
recipiente com água, o primeiro deslocará um maior volume desta.
Também no âmbito da Química têm sido identificadas inúmeras CA. Em
Portugal existem vários estudos, entre os quais Cachapuz et Ribeiro (1986), Pereira
(1990), Martins (1988), Martins (1993).
Na nossa prática pedagógico-didáctica tivemos, por certo, oportunidade de
“encontrar” algumas dessas concepções. Vejamos alguns exemplos:
Q1- Para explicar a dissolução de uma substância os alunos mais jovens
dizem, por vezes, que derreteu.
Q2- Quando numa reacção se liberta um gás surgem por vezes descrições tais
como: está a “efervescer”, está a ferver, está a formar-se ar, está a sair fumo.
Q3- Mesmo no curso complementar aparecem alunos que consideram que a
água é uma mistura “porque tem oxigénio e hidrogénio”.
Q4- Muitos alunos consideram que a combustão (por exemplo da lenha na
lareira) é uma reacção endotérmica porque “é preciso fornecer energia para
arder”.
O episódio que passo a referir passou-se há uns anos, dava eu uma aula sobre
a conservação da massa a alunos de 8º ano. Foi-lhes apresentado um sistema
constituído por um matraz fechado, contendo no seu interior aparas de zinco (no
fundo) e um tubo de ensaio pequeno com ácido clorídrico, e foram-lhes pedidas
previsões sobre o que aconteceria à massa do sistema se a dada altura se inclinasse o
matraz, de modo a que o ácido e o zinco reagissem. Os alunos sabiam que na reacção
4
Esta mesma resposta já me tem sido dada por professores estagiários, no início do seu estágio
32
se formava um gás e a maior parte previu que a massa diminuiria, com o fundamento
de que se formava um gás e os gases são “leves”. A dada altura, encontrava-me eu
junto de um grupo observando os alunos na realização da experiência, quando ouço,
vinda de outro grupo, a seguinte conversa:
Aluno X- Agora pesa o mesmo.
Aluno Y- Regista menos; a professora não viu.
Este episódio ilustra bem quão poderosas podem ser as concepções
alternativas, o que é facilmente comprovado em muitas situações. Quantos adultos,
eventualmente licenciados, não responderão a F1 tal qual respondem os nossos
alunos? E porquê? Uma das razões reside em que muitas CA representam explicações
satisfatórias para o que se observa. Assim, a concepção subjacente a F1 parece
explicar a diferente sensação que temos ao tocar no tampo ou nos pés da mesa.
Também F2 parece explicar o termos que pagar a factura à EDP todos os meses. É por
isso que o professor deve estar consciente das concepções alternativas dos alunos a
fim de poder provocar conflitos cognitivos que ajudem os alunos a pô-las em causa.
Ainda relativamente a F1 e à explicação dos alunos, podemos questioná-los. E se a
mesa estivesse ao Sol num dia quente de Verão ? De seguida devemos propor-lhes que
meçam a temperatura do tampo e dos pés da mesa. Relativamente a F2, devemos
propor-lhes que meçam a intensidade da corrente em diferentes pontos do circuito.
Mas voltaremos ainda a estes aspectos, em capítulos posteriores.
33
34
A recomendação mais frequentemente feita para a reforma do ensino das
ciências exige que os conceitos e os processos de raciocínio tecnológico sejam
integrados no curriculum por se reconhecer que certos aspectos da tecnologia são a
melhor forma de preencher a lacuna entre a ciência e a sociedade e de ligar a ciência
com os aspectos da vida quotidiana (Hurd, 1987). Uma tal perspectiva de abordagem
curricular, relacionando Ciência-Tecnologia-Sociedade é conhecida habitualmente pela
perspectiva CTS. Nesta perspectiva assume particular importância a contextualização.
Se os conceitos forem apresentados de uma forma descontextualizada, dificilmente se
tornarão significativos para os alunos.
É habitual, a este propósito, ouvir os professores referirem que usam sempre
exemplos reais nas suas aulas. Mas será que o fazem da melhor maneira? Yager e
McCormack, citados por Yager (1992), pp5, considerando cinco domínios de
importância para o ensino das ciências (figura 3) referem que, numa perspectiva CTS,
dever-se-á começar pelo domínio das aplicações/conexões, para chegar ao domínio
dos conceitos, contrariamente à prática mais corrente em que se parte do domínio
dos conceitos para chegar ao das aplicações/conexões. Por outras palavras, o ensino
das Ciências deve privilegiar a resposta a situações - problema, em vez de privilegiar
a apresentação de exemplos de aplicação. No entanto, é esta última concepção que
emerge na maior parte das práticas lectivas e dos manuais - apresentam-se os
conceitos e no fim algumas aplicações. A perspectiva CTS para o ensino das Ciências
implica que os conhecimentos possam ser desenvolvidos a partir de contextos de
relevância social, de modo a que os alunos reconheçam utilidade na aprendizagem.
Esta nova perspectiva do ensino–aprendizagem das Ciências implica,
necessariamente, mudança de concepções por parte dos professores.
Niels Armstrong pôs os pés na Lua
e a Humanidade inteira saudou nele
o Homem Novo
No calendário da História sublinhou-se
com espesso traço o memorável feito(....)
In “Poema do Homem Novo”, Novos Poemas Póstumos de António
Gedeão, 1ª edição, 1990, Edições João Sá da Costa,, Lisboa
5-Porque se fala hoje tanto na importância da
contextualização?
35
Figura 3: Domínios CTS para ensino e avaliação
Mundo da sociedade
Aplicações
Criatividade
Conceitos
Processos
Atitudes
Conexões
Mundo dos alunos
Para Gil Pérez (1993), as estratégias de mudança conceptual mais coerentes
com a orientação construtivista e com as características do raciocínio científico são as
que colocam a aprendizagem como o tratamento de situações problemáticas abertas
que os alunos considerem de interesse. Tais estratégias, facilitam a exploração das
interacções CTS.
Há vários estudos que podem ajudar os professores a delinear estratégias
numa perspectiva CTS.
Cachapuz et al (1989), por exemplo, descrevem uma estratégia de ensino do
conceito de reacção química, a partir de um problema ambiental. As situações que se
36
seguem relatam a utilização de situações problemáticas para o ensino de outros
conceitos5.
1- Na disciplina de TLF, bloco I, na unidade Calor, logo na primeira aula, os
alunos começam por ver um vídeo sobre a CTO (casa termicamente optimizada) do
Porto onde é enfatizada a utilização da tijoleira no piso inferior da casa. Os alunos são
levados a formular questões e entre elas deve-se fazer emergir a questão “ Não seria
melhor usar cortiça?”. A partir daqui é muito provável que vá emergir a concepção
alternativa subjacente a F1(capítulo 4). Os alunos deverão verificar experimentalmente
que um pedaço de cortiça e um de tijoleira, colocados na sala de aula, estão á mesma
temperatura , o que deve fazer emergir outra questão: “Então por que nos parece mais
fria a tijoleira?”. Será então proposta aos alunos uma actividade experimental que
consiste no seguinte:
Será aquecida uma placa metálica e sobre ela serão colocadas duas
placas de iguais dimensões, uma de cortiça e outra de tijoleira. Os
alunos irão medindo regularmente a temperatura em cada uma das
placas (de metal, de cortiça e de tijoleira) e posteriormente construirão
um gráfico com os dados recolhidos.
A interpretação do gráfico proporcionará a exploração de conceitos tais como
condutibilidade térmica, equilíbrio térmico, calor. Os alunos poderão verificar que a
cortiça é pior condutora térmica que a tijoleira mas continuam sem saber explicar
por que razão na CTO esta foi colocada. Será então proposta uma nova actividade em
que os alunos vão verificar que um pedaço de tijoleira pode armazenar energia que
posteriormente pode ceder. Na interpretação dos resultados da actividade serão
discutidos os conceitos de capacidade térmica e capacidade térmica mássica. Perante
tabelas contendo capacidades térmicas mássicas, condutibilidades térmicas e
densidades de vários materiais, entre eles a tijoleira e a cortiça, os alunos deverão
conseguir responder à questão inicialmente levantada.
A partir de questões formuladas com base ainda no vídeo sobre a CTO,
anteriormente referido, ou numa visita à mesma, é possível fazer com que os alunos
levantem questões que permitirão tratar ainda todos os conceitos previstos na
unidade, ao mesmo tempo que se estimula o desenvolvimento dos conhecimentos
processual e atitudinal.
2- Um outro exemplo, este no âmbito da Química. Em 1994/1995 foi-me
atribuída uma turma de 8ºano, por sinal bastante difícil, com muitos alunos
desinteressados e indisciplinados. Passei todo o primeiro período a criar um ambiente
favorável ao trabalho. Começámos o programa pela Física pelo que só em fins do 2º
período entrámos na Química. Comecei o seu estudo levando para a aula uma notícia
5 A autora tem utilizado algumas destas estratégias e acompanhado a utilização de outras, por exemplo,
por professores estagiários
37
assustadora sobre a poluição do rio Trancão. Os alunos interessaram-se por saber se
a situação do Douro seria semelhante. Fizemos então várias actividades,
nomeadamente: recolha de amostras de água do Douro, visita à Estação Elevatória de
Lever, onde é captada a água que abastece o Porto, visita aos laboratórios de
Física/Química e de Microbiologia dos SMAS (serviços municipalizados de águas e
saneamento). Recolhidas as amostras de água foram sendo pedidas aos alunos
sugestões de como, por exemplo, se poderia saber se tinha materiais dissolvidos.
Foram então surgindo os processos físicos de separação. Posteriormente quando das
visitas de estudo, particularmente aos laboratórios do SMAS, os alunos puderam ver
que alguns dos processos eram aí utilizados. Ainda na visita aos SMAS foi fornecida
uma tabela com referência aos iões pesquisados na água e às concentrações
admissíveis. Os alunos quiseram saber o que significava toda aquela simbologia (Cl-,
Na+, mg/L, etc). Novamente os conceitos foram explorados a partir de questões
formuladas pelos alunos. Estudaram-se depois outras águas, através de rótulos de
garrafas. Foram assim sendo consolidados alguns conceitos, ao mesmo tempo que
surgiam novas questões, uma delas a partir da referência ao pH, nos referidos
rótulos. Foram sendo construídos novos conceitos, ao mesmo tempo que se foi
desenvolvendo todo um conhecimento processual e atitudinal. Relativamente a este
último é interessante referir que na visita ao SMAS, a técnica que a orientou elogiou os
alunos, considerando-os muito interessados. Este aspecto é tanto mais curioso
quanto, como disse atrás, se tratava de alunos de uma turma considerada difícil.
Ainda sobre a importância dos contextos, Porrúa e Pérez-Froiz (1993), citados
por Martins e Veiga (1999), pp22, consideram que a Ciência não se produz fora do
contexto social; a sociedade influencia a Ciência e vice-versa; a Ciência é uma
construção social e está vinculada a um determinado contexto histórico, em que existe
uma relação dialéctica entre Ciência, Tecnologia e Sociedade. A propósito dos contextos
históricos, Sequeira e Leite (1988), referem que a história da Ciência pode contribuir
para melhorar o ensino das Ciências. Pessoalmente considero extraordinariamente
formativo que os nossos alunos compreendam que todo o conhecimento de que hoje
dispomos é fruto de muita investigação e trabalho árduo ao longo dos tempos. Creio
que este aspecto não é muito realçado. Talvez por isso, já me tenha acontecido por
mais que uma vez, e até com alunos considerados bons, que ao realizarem uma
actividade experimental e ao confrontaram os resultados com aqueles que seriam de
esperar tendo em conta o referente teórico em que se apoiavam, refiram no relatório:
“Aqui a lei não se verifica”. Creio, aliás, que pedir aos alunos para verificar uma lei,
não é uma proposta razoável e poderá induzir respostas como a que foi referida.
Considero mais razoável pedir aos alunos que verifiquem se os dados obtidos estão em
38
coerência com a lei e pedir-lhes que proponham explicações para a incoerência, caso
esta se verifique.
O que acabo de referir não significa que se deva dar aos alunos a ideia de que
as teorias científicas são infalíveis. Bem pelo contrário, é importante enfatizar que o
erro é inerente à própria ciência, mas a refutação de uma lei não pode ser feita só
porque, numa dada actividade, os resultados parecem não estar em concordância com
essa lei.
39
40
A resposta à questão colocada no início deste capítulo não é linear. Cachapuz
(1989), a este propósito, propõe uma reflexão que passa pela(s) resposta(s) a três
questões:
i- o que pretendo eu com uma dada experiência?
ii- que formato de trabalho experimental é o mais adequado?
iii- não haverá outros métodos mais vantajosos para atingir esses
mesmos objectivos?
Por sua vez Garret (1995) considera que a maioria das actividades que
propomos nas nossas classes de ciências tem pouco a ver com os problemas que
encontramos na vida diária pelo que, pelo menos à primeira vista , é difícil ver como
poderá ajudar os nossos alunos nas suas actividades quotidianas aquilo que lhes
pedimos nas classes de ciências ou numa actividade de laboratório. Nesta linha,
Hodson (1994) considera que é necessário reconceptualizar o Trabalho Experimental
e que isso implica uma redefinição e reorientação do conceito de trabalho prático6 e
uma melhor adaptação da actividade aos seguintes objectivos:
 aprendizagem da ciência - aquisição e desenvolvimento de conhecimentos
teóricos e conceptuais;
 aprendizagem sobre a natureza da ciência - desenvolvimento de um
conhecimento da natureza e dos métodos da ciência e consciencialização
das interacções entre ciência e sociedade;
 prática da ciência - desenvolvimento de conhecimentos técnicos sobre a
investigação científica e a Resolução de Problemas.
6 As designações trabalho de laboratório, trabalho prático e trabalho experimental são por vezes
identificadas; no entanto, alguns autores dão, nomeadamente ao trabalho prático, uma significação mais
lata, podendo o mesmo abranger outras actividades para além do trabalho experimental
Transcendente (que transcende) ?
Sobre-humano (além do humano.) ?
Oh feliz de quem entende,
De quem busca e surpreende
Os pontos, a recta e o plano !(...)
In “ Sou assim”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968,
Portugália Editora, Lisboa
6- Qual a importância das actividades experimentais nas
aulas de Física/Química?
41
O referido autor considera que os professores usam frequentemente o
Trabalho Experimental de forma irreflectida sobreutilizando-o7 e infrautilizando-o,
dado que grande parte das actividades por eles desenvolvidas são mal concebidas e
carecem de valor educativo real. Hodson considera que a actividade praticada deste
modo resultará improdutiva e o Trabalho Experimental inútil, do ponto de vista
pedagógico-didáctico; daí a necessidade de reconceptualizar o Trabalho Experimental.
Cachapuz (1995) considera ainda que a riqueza educativa do ensino
experimental das Ciências não é compatível com protocolos experimentais
estereotipados pelo que sugere algumas “pistas” para a implementação do Trabalho
Experimental coerente com a perspectiva de trabalho científico nomeadamente o uso
de situações problemáticas com diferentes graus de abertura, integrando percursos
de pesquisa.
Também Martins e Veiga (1999) se referem à necessidade de planificar as
actividades experimentais a partir do tratamento de situações problemáticas abertas,
susceptíveis de mobilizarem os alunos para o desenvolvimento de um plano
experimental coerente e não indicado pelo professor (pp 40).
Garcia Barros et al (1995), consideram que a educação científica não deve
limitar-se a introduzir leis e teorias mas deve também aproximar os alunos do
trabalho científico, entendido este não apenas como actividades práticas tradicionais,
assimiladas geralmente ao trabalho de laboratório. Citando Driver, 1989, Hodson,
1992, Tobin, 1990 e Woolnough, 1991, Garcia Barros et al (1995) referem que
actualmente a investigação especializada propõe uma alteração ao tratamento do
trabalho prático que o torne mais coerente com a própria epistemologia da ciência e
com a visão construtivista da aprendizagem.
Esta concepção de Trabalho Experimental que tem vindo a ser apresentada
insere-se no âmbito da Resolução de Problemas. Mas nem todo o Trabalho
Experimental constitui actividade de Resolução de Problemas. Entre outros autores,
Vinas et Lozano (1994) referem-se a outros formatos de Trabalho Experimental que
designam por:
 experiências (experiências qualitativas, breves e directas, cuja finalidade é
proporcionar conhecimento tácito de fenómenos a fim de possibilitar a
posterior compreensão de conceitos abstractos, ou ainda ilustrar conceitos
teóricos já introduzidos para os tornar significativos);
 experiências ilustrativas8 (actividades mais complexas e menos directas
que as experiências, que podem ser qualitativas ou quantitativas e
requerem controle de variáveis).
7 A referência à sobreutilização surge tendo em conta muitos países, como por exemplo Inglaterra, em que
se utiliza muito o trabalho experimental
8 Os autores designam-nas por “experimentos ilustrativos”
42
Quer as experiências quer as experiências ilustrativas podem constituir
demonstrações feitas pelo professor e em qualquer das circunstâncias estas
actividades podem desempenhar um papel importante para a construção dos
conceitos mas, para que tal aconteça, há que estimular os alunos mediante
perguntas adequadas para fazer emergir as suas concepções a fim de as explorar,
desenvolver e modificar. Isso implica, por um lado a exploração do aspecto qualitativo,
muitas vezes subestimado e, por outro, uma adequação das actividades, onde
importa dar ênfase à previsão-observação-explicação. Gunstone et al (1988), citados
por Hodson (1994) e Gunstone (1991), citado por Viñas e Lozano (1994), dão muita
importância a estas tarefas de previsão-observação-explicação- tarefas de Gunstone-
que para além do desenvolvimento do conhecimento processual, poderão favorecer a
criação de conflitos cognitivos e contribuir para uma mudança conceptual.
Do que foi referido ressalta que o TE deve ser pensado mais em qualidade do
que em quantidade. A este propósito, Hodson (1994) refere que grande parte do TE
convencional contribui para distrair os alunos dos conceitos importantes, podendo
dificultar a aquisição e o desenvolvimento dos conceitos. Daí que o autor proponha
“menos prática e mais reflexão” (pp306).
É pois importante que a selecção de actividades experimentais tenha em conta
alguns critérios, nomeadamente:
 que não criem “ruído” (o que acontece muitas vezes com experiências muito
sofisticadas, de difícil montagem ou acompanhadas de um protocolo que
não foi precedido de reflexão por parte dos alunos)
 que permitam o desenvolvimento dos conhecimentos conceptual,
processual e atitudinal.
Tendo em conta o que acaba de ser referido, vão ser apresentadas algumas
actividades experimentais, cujo mérito residirá essencialmente na reflexão que
podem proporcionar.
Actividade 1
Esta actividade, proposta a alunos de 10ºano inclui-se ( constitui a ficha 6)
num dos momentos da planificação para a unidade 29 a apresentar
pormenorizadamente no capítulo 8.
De actividades devem ter sido propostas aos alunos anteriormente, deverá
surgir a necessidade de explorar um pouco mais a relação entre as grandezas I e V.
Serão fornecidas aos alunos, para análise, tabelas e/ou gráficos com dados sobre a
9 Unidade 2- Transferência e conversão de energia num circuito eléctrico percorrido por uma corrente em
regime estacionário”
43
variação I = I(V) para condutores óhmicos e não óhmicos. De seguida ser-lhes-á
proposta uma questão, para resolverem através de uma actividade experimental.
A “resistência que te é fornecida será um condutor óhmico?
1-Planeia uma experiência que permita responder à questão levantada; discute o
planeamento com os colegas e com a professora
2-Executa a experiência planeada, solicitando o material de que necessites
3- Mede, com um ohmímetro a resistência da “resistência” de carvão
4-Usa, para a resistência que te é fornecida, a informação contida no teu livro
sobre o código de cores
5- Propõe uma resposta para a questão levantada no início
Actividade 2
Esta actividade, posterior à actividade 1, destina-se também a alunos de 10º
ano e inclui-se ainda num dos momentos da mesma planificação 2 ( constitui a ficha
7), a apresentar no capítulo 8.
Começa por ler as informações contidas no casquilho da lâmpada que te é
fornecida? Qual será o significado dessas informações?
Debate com os teus colegas antes de se proceder a um debate alargado na
turma.
Supõe agora que realizavas a seguinte experiência:
1-Calcular, por via experimental, a resistência da lâmpada fornecida tendo em
conta a relação R = V/I
2-Medir a resistência da lâmpada com um ohmímetro.
3-Calcular a resistência da lâmpada tendo em conta as indicações do fabricante
4-Comparar os valores obtidos em 1,2,3
Prevê os resultados que deves obter, fundamentando
Realiza experiência e confronta os resultados com as previsões
Formula questões que te tenham surgido pós a realização desta actividade
Nestas duas actividades emergem conceitos referidos ao longo deste livro;
assim na 1ª actividade é proposta uma actividade investigativa, enquanto que na 2ª
actividade se utiliza a sequência “Prever- observar- explicar”.
O confronto dos resultados destas actividades tem-se mostrado estimulante
para os alunos, pois enquanto que na actividade 1 os valores obtidos são
razoavelmente concordantes, na actividade 2 o valor obtido com o ohmímetro é muito
44
inferior aos outros dois. Isto levará os alunos a formular questões cuja exploração (a
fazer no capítulo 8), é potencialmente muito rica quer do ponto de vista conceptual,
quer processual e atitudinal.
Actividade 3
Esta actividade pode ser proposta a alunos de 9º ano no âmbito do estudo da
unidade “Produção e Consumo de Energia”. O professor poderá levar para a aula uma
cafeteira eléctrica das que têm revestimento metálico. Com os alunos deverá começar
por levantar questões
Como é aquecida a água ?
Por que razão a resistência está no fundo?
Por que razão a asa não é em metal?
Por que razão é polida a cafeteira?
O que acontece à energia “fornecida” pela resistência eléctrica ?
Como podemos calcular essa energia?
Como podemos calcular a energia transferida para a água?
Depois de um debate seguido de exposição por parte do professor, será
proposta a seguinte actividade experimental:
Dispões de um vaso metálico, um cronómetro, uma resistência de aquecimento
de potência 300 W e um termómetro.
1ª Parte
1-Planeia uma experiência que permita calcular a energia transformada na
resistência, que não foi aproveitada para o aquecimento da água. Discute o
planeamento com os colegas e com a professora
2-Executa a experiência planeada
3- Interpreta os resultados obtidos
2ª Parte
Como poderias proceder de modo a aumentar a fracção de energia aproveitada
para o aquecimento da água?
3ª Parte10
Após o debate que se seguiu à questão colocada na 2ª parte:
1-Realiza novamente a experiência planeada na 1ª parte, mas usando desta vez
um calorímetro.
2-Comenta os resultados obtidos ao longo de toda a actividade.
3-Indica sugestões que poderiam ser dadas aos construtores de cafeteiras
eléctricas, para aumentarem a “eficácia” das mesmas.
10 A actividade proposta nesta 3ª parte só será apresentada aos alunos, após a conclusão da 1ªe da 2ª parte
45
Esta actividade muito simples, enquadrada numa perspectiva CTS, permite
desenvolver uma série de conceitos (convexão, condução, radiação, potência, energia,
calor, temperatura, conservação e degradação de energia) e uma série de capacidades
e atitudes numa perspectiva de educação para a cidadania.
Actividade 4
A experiência que descrevo a seguir é, em meu entender, uma experiência
interessante, numa perspectiva CTS, a propor no 10 º ano, na unidade 2, e que
poderá ajudar os alunos a consolidar os conceitos de potência eléctrica e potência
térmica. É realizada com uma “resistência” de aquecimento, daquelas que muitas
vezes usamos em casa para aquecer água, e que têm indicadas a potência e a tensão a
que funciona
Observa a resistência de aquecimento que te é fornecida
1-Identifica características da mesma
2-Planeia uma experiência que te permita verificar se a respectiva potência
motora é a indicada pelo fabricante
3-Planeia ainda uma experiência que te permita calcular a sua potência térmica.
4-Prevê, fundamentando, se deve existir alguma relação entre os valores da
potência obtidos em 2 e 3
5-Observa a experiência a realizar pela professora ; recolhe, organiza e trata os
dados
Esta experiência não deve ser realizada pelos alunos porque o circuito inclui
uma tomada e, se não houver cuidado, os terminais da ficha da resistência de
aquecimento, podem ficar “ a descoberto”. Os alunos devem propor a medição de V e I
para medir a potência motora. Se na escola houver um wattímetro, a medição de P= VI
será feita directamente no aparelho e nesse caso será interessante que os alunos
reflictam nas ligações a fazer para o intercalar no circuito. Caso não haja wattímetro,
será montado, sempre em interacção com os alunos, um circuito de modo a poder
medir V e I. Dado que não estão habituados a intercalar num circuito, dispositivos
como o proposto, os alunos têm evidenciado alguma dificuldade em fazer sugestões,
pelo que se requer uma grande interacção com eles. Curiosamente emerge, por vezes,
a concepção errónea de que dentro do cabo da resistência de aquecimento existe um
só fio. Os alunos devem também propor a medição de R com um ohmímetro para
calcular P = RI2, tal como devem fazer previsões relativamente à relação entre os
valores das duas potências. Acontece que geralmente o valor obtido para a potência
térmica é ligeiramente diferente do obtido para a potência eléctrica, o que levará a um
debate muito interessante com os alunos, que deverão propor razões para a
discrepância observada.
46
Actividade 5
Ainda numa perspectiva CTS, a actividade que aqui se descreve, poderá ser
utilizada no 8º ano, na unidade “Nós e o mundo material”, para introduzir e/ou
aplicar conceitos.
Apresentar-se-ão vários rótulos de embalagens de leite e pedir-se-á aos alunos
que formulem questões.
(Incluir figura)
Algumas das questões que importa fazer emergir são:
 Porque razão são diferentes as informações contidas nos diferentes rótulos?
 Será que a soma das massas dos constituintes referidos em cada rótulo,
pode corresponder à massa de leite contido na respectiva embalagem?
Colocadas estas questões deve surgir outra:
 Que outros constituintes terá então o leite?
47
A primeira questão permite explorar (introduzir ou revisitar) os conceitos de
substância, mistura, solução, soluto, solvente, concentração em massa. A segunda e
a terceira questões permitirão explorar, para além dos conceitos anteriormente
referidos, processos físicos de separação, particularmente a destilação. A terceira
questão e o debate que se lhe deve seguir, deverão conduzir às actividades
experimentais A51 e A52, seguintes:
A51
Planeia uma experiência que permita calcular a massa de água contida num dos
pacotes de leite a que se referem os rótulos.
Realiza a actividade planeada após discussão no grupo e com a professora
Confronta os resultados obtidos pelo teu grupo , com os obtidos pelos colegas 11
A52
Planeia uma experiência que te permita verificar que o leite contem água.
Realiza a actividade planeada após discussão no grupo e com a professora.
Confronta os resultados obtidos pelo teu grupo , com os obtidos pelos colegas
Estas actividades, para além de contribuírem para a construção/reconstrução
de conceitos, deverão levar ao desenvolvimento de conhecimento processual. Assim,
para além de planear experiências os alunos deverão interpretar informação, formular
questões ( por ex: Poderemos considerar que no leite apenas existem a água e os
constituintes referidos nos rótulos ?), propor explicações, medir, executar, analisar
resultados.
Relativamente a A51, espera-se que os alunos planeiem a medição da massa da
embalagem cheia e vazia ( para isso o professor deverá levar embalagens já vazias dos
respectivos “leites” para além de uma embalagem cheia de cada um).
Relativamente a A52, o professor deverá ir colocando questões aos alunos, que
os ajudarão a fazer o planeamento. Algumas dessas questões poderão ser: Como
explicar que no testo de uma panela, por exemplo com sopa, se formem gotículas
líquidas transparentes? Em alguns países a água doce é obtida a partir da água do
mar; como se poderá proceder?
Concluída toda a actividade poderão ainda consolidar-se os conceitos de
densidade, ponto de ebulição, substância e mistura, explorando questões tais como:
Terá sentido falar genericamente em densidade do leite? Porque razão os outros
constituintes do leite, para além da água, não “apareceram” no destilado?
Actividade 6
Grande parte das escolas têm hoje marcadores electromagnéticos,
fundamentalmente para estudo de movimentos e transformações de energia
11 Cada grupo deverá fazer o estudo de um dos “leites” em causa
48
mecânica. Mais importante que a utilização do equipamento (que obviamente tem que
ser utilizado pelo menos uma vez pelos alunos para perceberem como se obtêm as
fitas marcadas), é a interpretação das fitas, pelo que se os alunos já tiverem usado o
equipamento, o professor pode realizar previamente as experiências, fotocopiar as
fitas obtidas e propor aos alunos a sua interpretação. É precisamente isso que se
descreve nesta actividade
Nesta actividade vais reflectir sobre uma experiência realizada com uma
montagem que já utilizaste em experiências anteriores
6V ~
e
M h B
a b calha
F B
F-fita M-marcador h- haste e-elástico B-bases de suportes
1ª Parte
Supõe que realizavas a seguinte experiência
1-Utilizando a montagem, segurar com fita cola, no carrinho, cerca de 70 cm de fita com a
face mais clara voltada para cima;
2-Fazer passar a fita entre a e b , no marcador;
3-Fazer na calha uma marca que identifique a posição inicial do elástico;
4-Colocar o carrinho encostado ao parafuso e fazer passar pela haste, h, o elástico
(marcar na calha a posição do ponto do elástico mais afastado das bases B). Segurar o
carrinho para evitar que se desloque;
4-Ligar a caixa de alimentação e simultaneamente largar o carrinho;
5- Imobilizar o carrinho quando se estiver a aproximar do fim da calha, para evitar que
caia; desligar então a caixa de alimentação;
Prevê qual deve ser o aspecto da fita depois de marcada nas condições da experiência,
fundamentando as previsões
Observa a fita obtida12 e confronta os resultados com as previsões
(incluir desenho)
início fim
Propõe uma explicação para o aspecto da fita
Propõe uma estratégia de resolução para o seguinte problema: Houve conservação da
energia mecânica na transferência de energia do elástico para o carrinho?
Utiliza a estratégia, depois de discutida no grupo e com a professora, na resolução do
problema proposto
12 A fita só será apresentada aos alunos após terem feito previsões
49
Esta actividade é interessante por permitir aos alunos reflectir sobre o seu
próprio pensar. Assim, na resposta ao problema, muitos alunos dizem logo que não
houve conservação de energia dado que a fita mostra que o movimento a partir de
dada altura é “ amortecido” . Ora a questão que lhes é proposta refere-se à eventual
dissipação de energia durante a transformação de energia potencial do elástico em
energia cinética do carro e não à dissipação posterior devida ao atrito com a calha.
Também o aspecto da fita permite reflexões interessantes que vale a pena explorar
com os alunos.
 Por que razão, de início, cresce o afastamento entre as marcas?
 Por que razão o afastamento entre as marcas decresce
posteriormente?
 Como calcular a energia cinética máxima adquirida pelo carro?
 Que relação deve ter essa energia com a variação de energia
potencial do elástico?
 Como calcular essa variação de energia potencial?
Mais do que pela realização da experiência, esta actividade vale pela reflexão
que pode proporcionar. Daí que o que importa não seja realizar muitas experiências,
mas realizar experiências, cuja exploração permita o desenvolvimento de
conhecimentos, capacidades e atitudes.
A finalizar este capítulo gostaria de referir o seguinte: Planear actividades
experimentais a propor aos alunos é uma tarefa estimulante, mas que envolve algum
tempo na preparação. Há no entanto, tal como já emergiu no capítulo 3, a propósito
da modificação de exercícios em problemas, pequenas alterações que podemos
introduzir nas nossas práticas e que não são difíceis de implementar. Trata-se, neste
caso, de preceder os protocolos estereotipados, de uma reflexão por parte dos alunos,
usando as tarefas de Gunstone (prevê-observa-explica), como acabou de ser ilustrado
nas actividades 2 e 6 e se ilustrará novamente no capítulo 8.
50
A resposta à questão colocada no início deste capítulo parece óbvia, no entanto
nem sempre isso acontece. Assim, e tendo em conta que no ensino-aprendizagem da
Física, nas práticas lectivas vigentes, genericamente se enfatiza a aprendizagem de
conceitos, seria de esperar que a classificação atribuída à resposta a uma questão
colocada para avaliação, decorresse do facto de um aluno evidenciar ou não essa
aprendizagem. Os exemplos 1 e 2, seguintes, mostram que nem sempre isso acontece.
1- Numa prova global foi colocado o seguinte exercício:
Considere as configurações electrónicas dos átomos X ,Y,Z e W (as letras
não correspondem a símbolos químicos)
X: K2La2Lb6Ma1 Z: K2La2Lb6Ma2Mb6 Na1
Y: K2La2Lb6Ma2Mb5 W: K2La2Lb6Ma2Na2 Nb2
..........
2.3-Indique, justificando, qual dos elementos X ou Y apresenta maior
raio atómico
2.4- Indique, justificando, qual dos elementos X ou Z apresenta maior
energia de ionização.
Um determinado aluno responde correctamente á questão 2.3 e na resposta a
2.4 escreve(sic):
O elemento Y pois a sua carga nuclear é superior à de X, e como o raio
atómico é menor que em X a distância ao núcleo é menor, logo era
necessário fornecer mais energia a um átomo Y gasoso para este perder o
electrão, apesar de a sua blindagem ser superior ao do X.
Não há, não
duas folhas iguais em toda a criação.
Ou nervura a menos, ou célula a mais,
não há de certeza, duas folhas iguais(...)
(...) Nas formas presentes,
nos actos distantes,
mesmo semelhantes
são sempre diferentes(...)
In “Pastoral”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968,
Portugália Editora, Lisboa
7- Que coerência deve existir entre o que pretendemos ensinar
e o que pretendemos avaliar?
51
Não foi atribuída qualquer cotação na resposta. É óbvio que se pedia para
comparar X com Z e o aluno compara X com Y( eventualmente influenciado pela alínea
anterior ). Mas importa reflectir sobre o seguinte:
O que se pretendia avaliar com esta questão era essencialmente o
conhecimento conceptual, dado que na matriz da prova há apenas referência a
conceitos; se assim era, não deveria o aluno, dado que evidencia ter compreendido os
conceitos, ter tido alguma cotação na resposta?
2-Nos critérios de classificação de uma questão, é habitual atribuir-se cotação
à simples escrita de uma fórmula, podendo essa cotação atingir 20 a 25 % da cotação
total. Acho que este aspecto deveria ser ponderado. A resposta dada por um aluno à
questão E (ver capítulo 3): Não é possível resolver pela fórmula Ec= ½ mv2 porque não
temos o volume, mostra como a simples escrita da fórmula não dá qualquer
informação sobre o conhecimento conceptual do aluno.
Situações de avaliação como as que acabam de ser referidas ocorrem muitas
vezes pelo que deveriam ser alvo de reflexão cuidada.
O problema da avaliação é um problema muito complexo, mas é indiscutível
que se deve avaliar o conhecimento que se pretendeu ensinar.
E se, como é desejável tendo em conta tudo o que foi referido nos capítulos
anteriores, os professores devem ensinar não apenas conhecimento conceptual,
deverão avaliar os alunos também nos outros domínios do conhecimento. Como fazê-
lo? Em primeiro lugar elaborando um plano de avaliação que deve incluir vários
meios (observação dos alunos no desempenho das tarefas de sala de aula,
nomeadamente nas actividades experimentais, técnicas interrogativas, dados de auto
e hetero-avaliação dos alunos, relatórios, portfolios, trabalhos de pesquisa, etc) e não
quase exclusivamente os testes sumativos. Sánchez et al, 1995, referem que numa
perspectiva construtivista da aprendizagem, particularmente por investigação, se
devem considerar como situações de avaliação todas aquelas em que os alunos podem
avaliar os seus avanços, expor as suas dificuldades e/ou necessidades a outros
grupos de alunos e/ou aos professores. Mas a prática de sala de aula é, em geral,
bastante diferente. Em muitas escolas secundárias é habitual haver, nos princípios de
Novembro, uma primeira reunião de conselho de turma. Nessa reunião trocam-se
impressões sobre a turma e é muito frequente ouvir dos professores o seguinte
comentário: Quanto à avaliação ainda não tenho dados porque ainda não dei teste. Isto
revela a exagerada importância atribuída aos testes sumativos. Não sendo os testes os
instrumentos mais adequados para avaliar o pensamento dos alunos (Kulm, 1990), a
sua utilização fica um pouco comprometida e tanto mais quanto as questões que
habitualmente se colocam nos testes são geralmente meros exercícios.
52
Relativamente à observação no trabalho na sala de aula e aos testes sumativos,
gostaria de acrescentar um pouco mais. Foi referida anteriormente a importância da
observação dos alunos no desempenho das tarefas de sala de aula, nomeadamente
nas actividades experimentais
Essa avaliação deve ser sistematizada e a forma de a sistematizar depende de
vários factores (nível etário dos alunos, capacidades ou destrezas a desenvolver, etc).
A ficha anexa (figura 4) é um exemplo que poderá servir de base a uma reflexão.
Figura 4- Ficha de observação e avaliação do trabalho experimental
Identificação do aluno
1ª Parte13
Identificação do problema
/Estratégia de resolução/
Planeamento experimental
Previsão e fundamentação
Análise dos resultados
Resposta ao problema/conclusões
2ª parte14
Manipula correctamente o equipamento
Respeita as normas de segurança
Faz observações cuidadas
Respeita o protocolo
Regista organizadamente os dados
Distribui adequadamente o tempo na realização das tarefas
Utiliza e organiza adequadamente o espaço de trabalho
Observações-
Relatório-
13 É preenchida de forma descritiva e depende do tipo de trabalho proposto; o preenchimento da 1ª linha
terá lugar se se tratar de um trabalho investigativo; o preenchimento da 2ª linha terá lugar se se tratar de
uma tarefa de Gunstone; a referência a estas tarefas surgiu no capítulo 6
14 É preenchida usando uma escala de classificação (1 a 4)
53
Relativamente aos testes e tendo em conta algumas das considerações acima
tecidas, há já alguns anos que os testes que proponho aos alunos são, por vezes, com
consulta do livro, dos apontamentos que tiram nas aulas, bem como de outros
elementos de que os alunos queiram dispor. Um dos objectivos é levar a que os alunos
não memorizem um conjunto de fórmulas sem lhes atribuir qualquer significado.
Apesar de nunca ter feito um estudo objectivo sobre esta prática, não me parece que
traga malefícios para a aprendizagem dos alunos, bem antes pelo contrário. É óbvio,
que as questões propostas nesse testes não podem ser de aplicação directa das
fórmulas15, mas precisamente porque o não são, devem levar à avaliação de
capacidades que importa desenvolver. Um teste de consulta pode ter ainda vantagens
relativamente ao conhecimento atitudinal; os alunos deixam de ter a preocupação de
fazer cábulas para usar clandestinamente no teste.
No fim do ano lectivo 1998/1999 apresentei aos alunos, todos de 10 º ano, num total
de 38 (12 de TLF e 26 de FQ) um questionário (figura 5) para saber qual a opinião
que tinham sobre os testes de consulta. Os resultados, que se apresentam a seguir ao
questionário, não podem, de modo algum ser generalizáveis (a amostra é muito
pequena e o contexto em que a experiência tem decorrido é um contexto particular),
mas, e insisto mais uma vez, com este livro apenas pretendo lançar pistas para
reflexão.
15 No capítulo 8 serão apresentadas algumas questões que poderão ser colocadas em testes de consulta
54
Figura 5- Questionário colocado aos alunos sobre testes de consulta
Ao longo deste ano foram propostos testes sumativos em que podias fazer
consulta de livros, apontamentos, etc. Gostaria de saber a tua opinião sobre
esta prática. Nesse sentido agradecia-te que respondesses ao questionário
anexo. Nas questões de resposta condicionada assinala com X o rectângulo
correspondente à tua resposta. Nas questões de resposta livre, deves escrever o
que pensas relativamente à questão proposta. Não deves identificar-te, pois o
que interessa é a opinião genérica dos alunos e não a de cada um em
particular. Obrigada desde já.
1- Consideras que os testes de consulta conduzem a que os alunos:
Sim Não
1.1-estudem menos porque sabem que podem utilizar os
elementos de consulta durante o teste
1.2-estudem mais conscientemente pois sabem que não têm
que se preocupar com a memorização
1.3-se habituem a seleccionar informação
1.4-se habituem a pesquisar
1.5-resolvam o teste com mais seriedade, sem a preocupação de
copiar
1.6-estejam mais calmos durante a resolução do teste
1.7-tenham melhores resultados porque os testes são mais
fáceis
1.8-tenham piores resultados porque os testes são mais difíceis
2-Concordas com testes de consulta em Físico-Químicas/TLF? Justifica tua
resposta
3-Se respondeste afirmativamente à questão 2, indica, justificando, se vias
vantagens em que em outras disciplinas os referidos testes fossem utilizados e,
em caso afirmativo, quais seriam essas disciplinas
55
Tratamento das respostas ao questionário
Relativamente à questão 1, o tratamento dos resultados conduziu à construção
do gráfico anexo
Da análise do gráfico emerge que uma maioria significativa dos alunos
considera que o facto de o teste ser de consulta não conduz a que se estude menos,
não afecta significativamente os resultados e conduz a que se vá mais calmo para o
teste, se estude mais conscientemente, se desenvolvam as competências de
seleccionar informação e pesquisar, e a atitude de resolver o teste com mais seriedade.
Relativamente à questão 2, 92% dos alunos respondeu sim. Dos restantes, 4%
dos alunos responderam não e 4% responderam que era indiferente. Dada a dimensão
da amostra não é possível categorizar as justificações das respostas; foram no entanto
“agrupadas” as de significado idêntico.
Para o “sim” temos:
 Vai-se mais calmo e confiante para os testes
 É um bom artifício para compreender a matéria
 É um bom artifício para não se copiar
 A consulta motiva para a disciplina
Para o não temos:
 Fazem pensar que não é preciso estudar tanto
 Não adianta fazer consultas durante o teste
 Na prova global não há consulta
 Um teste de consulta para quem não estuda é um mau teste
Para a resposta indiferente há apenas uma justificação
 Não tem influência na nota
Relativamente à questão 3, a maior parte dos alunos indica várias disciplinas,
pelo que as respostas estão assim distribuídas:
Resposta à questão 1 do questionário
0
20
40
60
80
100
1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.7 1.8
Questão
Percentagemde
respostas
SIM
NÂO
56
Ciências da Terra e da Vida 13%
Nenhuma 17%
Técnicas laboratoriais de Química 21%
Filosofia 25%
Matemática 58%
Físico-Químicas16 83%
Quase a terminar este capítulo gostaria de citar um episódio que vem referido
no artigo "Assessing Student Growth in Mathematical Problem Solving (Lester e Kroll,
1990, pp 54) .
Quando FranK Lester fazia uma comunicação para um grupo de supervisores e
coordenadores curriculares de matemática, sobre a RP no ensino dessa disciplina,
um dos participantes fez o seguinte comentário:
"Por muito que eu goste do que está a dizer, receio que nenhuma das suas
ideias tenha sucesso a não ser que os professores mudem as suas práticas
avaliativas e o estado mude os seus programas de testagem".
Essa necessidade de mudança é referida por muitos autores, entre eles
Fernandes, (1994):
A avaliação faz parte integrante do desenvolvimento do currículo e só faz real
sentido se os professores a utilizarem para que o ensino e a aprendizagem sejam
sistematicamente reformulados e melhorados (pp 17)
Retomo o que referi no capítulo 1; considero que as mudanças institucionais
dificilmente ocorrem sem pressão dos cidadãos, pelo que se queremos que o sistema
mude, teremos que ser nós a mudar e a exercer pressão com vista à mudança.
Estas considerações poderão ser sintetizadas numa frase: "É mais fácil que a
avaliação mude o currículo do que o currículo mude a avaliação". E mudar a avaliação
significa utilizar estratégias de avaliação que privilegiem várias técnicas e
instrumentos e não dar ênfase quase exclusiva aos testes. Relativamente a estes será
de privilegiar a colocação de problemas e não apenas a de exercícios.
16 A referência à disciplina de Físico-Químicas surge, obviamente, apenas nos alunos de TLF
57
58
Na planificação de uma unidade didáctica, ou de uma fracção da mesma, é
importante ter em conta diferentes propostas emergentes de várias linhas de
investigação no ensino-aprendizagem das Ciências, nomeadamente os aspectos
referidos ao longo dos capítulos anteriores. Assim, para cada unidade a planificar, o
professor deverá fazer uma pesquisa bibliográfica sobre CA dos alunos em relação aos
conceitos a explorar. A identificação dessas CA será fundamental para a selecção de
actividades a incluir na planificação, tendo em vista, por exemplo, provocar conflitos
cognitivos. Será também importante que ao seleccionar as actividades o professor
reflicta sobre os conhecimentos processual e atitudinal a desenvolver e a avaliar. O
esquema anexo (figura 6), sem pretender ser um algoritmo a utilizar, pretende
sistematizar o que foi referido.
Eles não sabem que o sonho é (...)
(...) passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
Desembarque em foguetão
na superfície lunar.(...)
In “ Pedra Filosofal”, Poesias Completas de António Gedeão,
1968, Portugália Editora, Lisboa
8- Como construir estratégias de ensino-aprendizagem ?
59
Figura 6- Aspectos que devem ser tidos em conta ao elaborar uma planificação
1-Identificação de conteúdos
2-Identifcação de conhecimento
conceptual a construir/
reconstruir.
Nível de desenvolvimento
Programas
Oficiais
Conteúdos
disciplinares
3-Pesquisa sobre concepções
alternativas dos alunos
Desenvolvimento
cognitivo
e aprendizagem
4-Selecção do conhecimento
processual e atitudinal a desenvolver
Referentes
teóricos
Concepções
alternativas
5-Escolha de estratégias Perspectiva CTS
6-Estratégia centrada na resolução de
problemas
Resolução
de problemas
7-Escolha de uma situação física que
permita criar contextos problemáticos
Avaliação
História e Filosofia
das Ciências
Apresentarei agora uma planificação construída tendo por base o
anteriormente referido e em que as estratégias utilizadas assentaram num modelo
proposto por Lopes(1994). De acordo com o modelo de Lopes (1994), todo o processo
na sala de aula deve ser iniciado por exploração e problematização a partir de
situações problemáticas, trazidas do exterior, do conhecimento e do agrado dos
alunos. A partir das referidas situações irão ser criados contextos problemáticos que
originarão uma rede de problemas e actividades. O ambiente criado deverá envolver os
alunos e, consequentemente, propiciar o crescimento progressivo do conhecimento
conceptual e o desenvolvimento de capacidades.
Entende-se precisamente por contexto problemático um ambiente de ensino
aprendizagem criado na sala de aula, a partir de situações problemáticas, que podem
ser notícias, objectos, filmes, etc. cuja exploração originará uma rede de problemas e
Comment [M1]:
60
questões que vão permitir um envolvimento dos alunos. Pretende-se que este
ambiente favoreça o crescimento do conhecimento (conceptual, processual e
atitudinal).
Descrição pormenorizada de uma estratégia utilizada para o estudo da
corrente eléctrica no 10º ano
Na planificação que vou apresentar, relativa à unidade “Corrente eléctrica” de
10 ºano, foram criados quatro contextos problemáticos. Começou-se por apresentar
um diaporama aos alunos que conduziu a um debate onde emergiram entre outros
aspectos, a importância da energia eléctrica e alguns dados relativos à evolução
histórica. A exploração deste contexto (contexto 1) fez emergir as regras de segurança,
que por sua vez fez emergir o uso do busca-pólos e o risco de se ligarem vários
electrodomésticos a uma mesma tomada. Surgiram então dois contextos um centrado
no problema “ Como funciona um busca-pólos? “(Contexto 2) e o outro no problema “
Por que razão é perigoso ligar vários electrodomésticos a uma mesma tomada?”
(Contexto 3). Após a exploração destes contextos surgiu um quarto centrado no
problema “O que acontece quando um receptor não é puramente resistivo?” (contexto
4). A exploração destes contextos permitiu construir/reconstruir todos os conceitos
propostos no programa.
Apenas será descrita em pormenor a planificação relativa ao contexto criado
pelo problema “Como funciona um busca-pólos?”17 Antes de apresentar a estratégia,
gostaria de referir como surgiu a ideia da utilização do busca-pólos. Em 1994/1995
uma professora estagiária, após ter dado um aula ao 8º ano entrou no gabinete de
estágio, onde me encontrava com mais dois estagiários, uma jovem da Licenciatura em
Química e um jovem da Licenciatura em Física, e disse:
Uma aluna perguntou-me como funciona um busca-pólos, mas eu não soube
responder.
Nem soube a professora, nem nenhum de nós. Resolvemos então desmontar
um busca-pólos e apercebemo-nos como a partir do estudo do seu funcionamento
muitos conceitos poderiam ser explorados.
Foi assim que surgiu a ideia de construir a estratégia que se passa a
descrever18.
 Quando se pergunta aos alunos como funciona um busca-pólos,
geralmente eles referem a utilização prática, mas poucos têm “coragem” de
o utilizar numa tomada. Acresce ainda, que alguns dos “corajosos”, quando
vão utilizá-lo, têm a preocupação de apenas tocar na parte plástica do
17 São incluídas , no fim da planificação, as fichas de trabalho apresentadas aos alunos
18 A primeira estratégia criada a partir do busca-pólos, descrita em Gouveia (1995) foi implementada na
disciplina de TLF, bloco III; posteriormente sofreu várias alterações
61
invólucro. Quando o professor ou algum aluno se propõe a utilizá-lo de
forma correcta levantam-se logo vozes interrogativas: “E não vão apanhar
um choque ?”
 Após a utilização pede-se então aos alunos que prevejam como será
constituído (ainda antes de o desmontar). Geralmente é referida uma
lâmpada e pouco mais. De seguida distribui-se a cada grupo de trabalho
um busca-pólos desmontável e pede-se aos alunos que o desmontem e
proponham agora uma nova explicação para o seu funcionamento.
 Quando desmontado, em cima da mesa ficam uma mola, um parafuso, um
tubo de descarga e um corpo cilíndrico acastanhado (nos busca-pólos que
utilizo, a resistência de carvão não apresenta código de cores mas este aspecto)
e os alunos começam a propor explicações, que geralmente são as seguintes:
Há uma bobina (a mola), uma lâmpada (o tubo de descarga) e um íman (a
resistência). É-lhes proposto planear uma experiência para testar o “íman”.
Geralmente os alunos aproximam-no de clips e concluem que não deve ser
íman.
 Seguir-se- á agora um debate em que os alunos acabam por concluir que todos
aqueles corpos têm que ser condutores e por isso oferecerão resistência à
passagem da corrente. Surgem então as seguintes previsões quanto à
resistência: a bobina deve ter uma resistência muito grande para deixar passar
pouca corrente e não apanharmos um choque, o resto deve ter uma pequena
resistência. Com um ohmímetro os alunos irão verificar que as suas previsões
estão erradas.
 Ao verificarem que a resistência do “cilindro” é muito elevada querem saber
como é constituído e ao constatarem que o alcance do ohmímetro não permite
medir a resistência da lâmpada os alunos observam-na mais atentamente e
geralmente referem que está fundida dados que os dois eléctrodos no tubo de
descarga estão afastados. É- lhes então proposto que testem esta previsão. Os
alunos vão novamente montar o busca-pólos e quase invariavelmente
perguntam:
“ É importante a ordem porque se montam as peças? È que já não me lembro
como estavam.19
Como resposta é- lhes dito para montarem como entenderem (mais tarde ser-
lhes-á proposta uma tarefa com base nesta questão- ficha 5 em anexo). Após a
19 Aqui emerge nitidamente a CA subjacente a F2, capítulo 4
62
montagem os alunos vêem, com algum espanto que a lâmpada acende e
querem saber como aquela lâmpada funciona.
A exploração de algumas das questões que foram surgindo vai levar a uma série de
actividades (fichas 1,2,3) que permitirão explorar conceitos como: condução nos
metais (mola e parafuso), nos semicondutores (a partir da resistência de carvão), nos
gases (a partir do tubo de descarga)20 e nos electrólitos (a partir da condução pelo
corpo humano)21.
 O facto de o busca-pólos acender quando se encosta à “fase” da tomada mas
não quando se encosta ao “neutro” permitirá explorar o conceito de diferença
de potencial. O uso de uma tomada de ca, levará a uma breve distinção entre
corrente alterna e contínua (ficha 4) e aos conceitos de corrente estacionária e
intensidade da corrente. A actividade proposta na ficha 5, servirá para
introduzir a lei de Pouillet. O debate que se lhe seguirá deverá ajudar os alunos
a compreender a diferença entre intensidade da corrente (que se conserva ao
longo do circuito) e energia eléctrica que “diminui” ao transformar-se no
circuito.
 Da actividade proposta na ficha 3 surgirá a necessidade de explorar um pouco
mais a relação entre as grandezas I e V. Serão fornecidas aos alunos tabelas
e/ou gráficos com dados sobre a variação I = I(V) para condutores óhmicos e
não óhmicos. Poderá fornecer-se aos alunos uma resistência de carvão e pedir-
lhes o planeamento de uma experiência que permita concluir se essa
resistência se comporta ou não como condutor óhmico. Realizada a experiência
e tratados os dados obtidos, os alunos deverão confrontar o valor obtido para o
cociente V/I com o valor de R, lido com base na interpretação do código de
cores e com o valor medido com o ohmímetro (esta actividade foi apresentada
como actividade 1, no capítulo 6). Será altura de explorar o significado da
razão R = V/I e do significado de R = V/I = constante.
 A referência à condição “a temperatura constante” necessária ao
estabelecimento correcto da lei de Ohm, emergirá conjuntamente das
actividade 6 e 7 (estas actividade foram apresentadas como actividades 1 e 2,
no capítulo 6). A análise dos resultados conjuntos destas actividades levará a
uma primeira abordagem do conceito de resistividade, da sua variação com a
20 Se possível, o professor deverá fazer aqui uma demonstração experimental usando a bobina de Runkorff e
experiências sobre descargas em gases rarefeitos
21 Não são sugeridas aqui actividades experimentais porque foi feita a transferência para as realizadas sobre
condução eléctrica em soluções aquosas de ácidos bases e sais, quando do estudo das reacções ácido-base,
na Química
Se eu não fosse professora de física. algumas reflexões sobre práticas letivas
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Se eu não fosse professora de física. algumas reflexões sobre práticas letivas

  • 1. Regina Gouveia Σε ευ νο φοσσε προφεσσορα δε Φσιχα ... Algumas reflexões sobre práticas lectivas 1999
  • 2. 2 A todos os meus alunos que ao longo de toda a minha carreira, me têm estimulado com as suas questões, com as suas dúvidas, com a sua curiosidade. Aos professores estagiários, pelos desafios que cada ano aceitam partilhar comigo. A muitos professores, não apenas de Física e Química, e de todos os níveis de ensino, pelos debates que comigo tantas vezes têm mantido e pelos momentos de reflexão que me têm propiciado. Ao Fernando, ao Miguel, ao Nuno, à Teresa e à Cláudia pela forma como acarinharam este meu projecto. Finalmente, mas de uma forma muito especial, à Professora Doutora Nilza Costa que, apesar dos seus múltiplos afazeres, me deu a honra de analisar criticamente este livro. Agradeço...
  • 3. 3
  • 4. 4 Agradeço... 3 Índice 5 Siglas utilizadas 7 Prefácio 9 Em jeito de introdução.... 11 1-Por que razão há tantos alunos com dificuldades na aprendizagem da Física/Química ? 15 2-O que é importante que os alunos aprendam ? 17 3-A que atribuir a falta de reflexão dos alunos perante grande parte das questões que lhes são colocadas ? 19 4-Por que razão os alunos opõem resistência à mudança de concepções ? 31 5-Por que se fala hoje tanto na importância da contextualização ? 35 6-Qual a importância das actividades experimentais nas aulas de Física/Química ? 41 7-Que coerência deve existir entre o que pretendemos ensinar e o que pretendemos avaliar ? 51 8-Como construir estratégias de ensino-aprendizagem ? 59 Em jeito de conclusão.... 79 Referências bibliográficas 81 Índice
  • 5. 5
  • 6. 6 No texto poderão eventualmente ser encontradas as seguintes siglas: CA- concepções alternativas cc- corrente contínua ca- corrente alterna CTO- Casa termicamente optimizada CTS- Ciência/Tecnologia/Sociedade EDP- Electricidade de Portugal FCUP- Faculdade de Ciências da Universidade do Porto FEUP- Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto FQ- Físico-Químicas GIRA- Grupo de informação e recreação astronómica GIRP - Grupo de Investigação em Resolução de Problemas RP- Resolução de problemas SMAS- Serviços Municipalizados de águas e saneamento TE- Trabalho experimental TLF- Técnicas Laboratoriais de Física UE- União Europeia Siglas Utilizadas
  • 7. 7
  • 8. 8 O Livro “Se eu não fosse professora de Física...”, de Regina Gouveia, foi lido por mim do princípio ao fim sem qualquer cansaço e as paragens que existiram serviram tão só para me fazer reflectir. Ao lê-lo foi crescendo em mim a ideia da sua grande pertinência, nomeadamente para todos aqueles que de algum modo estão envolvidos no ensino da Física e da Química (FQ), nas nossas escolas básicas e secundárias, e que desejam que ele seja cada vez mais um ensino de qualidade. Assim, pensei principalmente em Professores e futuros Professores de FQ, mas pensei também em Investigadores Educacionais (e da Didáctica da Física e da Química, em particular) e em Pais dos nossos alunos. Certamente que todos esses diferentes intervenientes educativos ao ler o Livro irão sentir que o seu cerne é contribuir para que o ensino ministrado tenha significado para os nossos alunos e que os ajude a desenvolverem-se não só enquanto alunos mas, também, enquanto futuros cidadãos que se espera responsáveis. Ele ajudará certamente a que cada um de nós possa fazer algo nesse sentido também. Muitos têm sido os estudos de investigação em Didáctica que têm procurado contribuir para a finalidade acima enunciada, no entanto, é também conhecido que a mensagem dos investigadores não tem chegado, como o desejado, aos seus principais destinatários (nomeadamente, professores e alunos). O Livro que agora se publica tem a vantagem de “dizer” essa mensagem utilizando uma linguagem simples, mas rigorosa e fundamentada, e ilustrada com múltiplas situações práticas que ajudarão, muito certamente, a dar forma às ideias avançadas. Essas situações, conforme a autora refere, não pretendem ser receitas a seguir pelos professores mas tão só propostas que, por um lado consubstanciam as perspectivas inovadoras apresentadas e, por outro, poderão ajudar os professores e educadores a delinear estratégias em consonância com as mesmas. Muitas delas, senão todas, são situações reais, experienciadas pela autora ao longo da sua vida profissional. Este elemento certamente ajudará a dar credibilidade quanto è exequibilidade do que é proposto. Aqueles que desejarem aprofundar mais as ideias avançadas poderão prosseguir a sua leitura através da vasta bibliografia que é citada ao longo do texto e referenciada no final do Livro. Ao longo da minha experiência profissional, enquanto formadora de professores e investigadora em Didáctica da Física, tem vindo a crescer em mim a ideia da necessidade de cada vez mais nos esforçarmos para que o nosso discurso tenha Prefácio
  • 9. 9 relevância para o ensino e para os seus protagonistas. Penso sinceramente que Regina Gouveia o conseguiu neste Livro. Não tenho qualquer dúvida que aconselharei a sua leitura a todos aqueles que daqui para a frente comigo trabalharem. Aveiro, 02 de Setembro de 1999 (Nilza Costa) (Professora Associada da Universidade de Aveiro, especialidade Didáctica da Física)
  • 10. 10 Sou professora de Física e Química e comecei por sê-lo um pouco por acaso. Até ao 5º ano do Liceu (actual 9º ano de escolaridade) gostei genericamente de todas as disciplinas à excepção de História. A isso não devem ter sido alheias por um lado a minha má memória e por outro a má experiência que tive com a maior parte dos professores da disciplina. Em 3 anos tive 5 professores e desses apenas dois não apresentavam a história como uma sucessão de datas, factos e nomes, para mim um tanto desconexos. Mas não é da disciplina de História que pretendo falar; se a cito é porque pretendo enfatizar a importância do professor na aprendizagem dos alunos. Voltaremos mais tarde a este ponto. Retomando o fio condutor, dizia que até ao 5º ano praticamente todas as disciplinas me interessavam, mas a matemática exercia sobre mim um fascínio maior que qualquer das outras. Chegada ao fim do 5º ano, impôs-se a opção entre as Letras e as Ciências; o gosto pela matemática decidiu a minha opção- optei pelas ciências. Ao longo dos 6º e 7º anos, comecei a pensar no curso que gostaria de tirar. Só se me apresentavam duas opções- Medicina e Matemática. A primeira, motivada essencialmente pela generosidade e pelo idealismo que se tem quando se é jovem. Para mim ser médica era a melhor forma que encontrava de poder ajudar os outros. A segunda decorria do meu gosto quer pela matemática, quer por ensinar- desde pequena em minha casa havia colegas de ano, ou mais atrasados, a quem eu, com muito gosto, tirava dúvidas. No 7º ano (actual 11º) tive um professor excepcional a matemática e pensava decidir-me pelas matemáticas. Foi esse professor que me entusiasmou acerca de um curso de que lá, numa cidade de província, nunca ouvira falar- engenharia química. Matriculei-me em engenharia química, mas ainda antes do início das aulas, resolvi mudar para matemáticas. Estive uma tarde inteira na bicha (...) Andar no mundo é como atravessar o continente negro do berço à contracosta. Vai-se crescendo e andando. Sonhando enquanto é tempo(...) In “Poema da Selva”, Novos Poemas Póstumos de António Gedeão, 1ª edição, 1990, Edições João Sá da Costa, Lisboa Em jeito de introdução....
  • 11. 11 (na altura era assim que se dizia) da secretaria, a fim de requerer a mudança, mas não cheguei a ser atendida. Desisti da mudança e estive dois anos em engenharia química. No fim do segundo ano, decidi mudar, não para matemáticas mas para Físico-Químicas, a fim de aproveitar o máximo de cadeiras feitas. Durante todo o curso, as cadeiras de que mais gostei foram as de Matemática, seguindo-se as de Física. Quando acabei o curso e comecei a leccionar num Liceu (como se chamava na altura), ao sentir necessidade de explicar aos alunos o significado físico de alguns conceitos, apercebi-me de que, até aí, eu tinha visto a física mais como uma matemática aplicada, do que uma disciplina autónoma. Tive que reestudá- la de outro modo e comecei então a aperceber-me de como a física é uma disciplina fascinante. Isso de modo algum significa que saiba interpretar fisicamente muitos fenómenos, significa apenas que tento interpretá-los e não apenas reduzi-los a meras equações matemáticas. Porque razão conto isto? Li um dia uma entrevista a um professor em que uma das perguntas era: -O que gostaria de ser se não fosse professor? Ao que o professor respondeu: - Gostaria de o ser. Achei a resposta muito interessante e dei comigo a pensar que se um dia me perguntassem o que eu gostaria de ser se não fosse professora de Física também responderia: Gostaria de sê-lo. Se ser professor é sempre uma tarefa aliciante, apesar de todos os “senãos”, ser professor de Física é, em meu entender, duplamente aliciante. Mas de imediato, reflecti: Se eu nunca tivesse sido professora de Física, por certo não saberia como é fascinante sê-lo e por isso não poderia responder desse modo. É por esse motivo, que gostaria de mostrar aos professores, essencialmente aos que se iniciam, que ensinar física é uma tarefa belíssima que vale a pena enfrentar. Mas se é certo que há já algum tempo pensava em partilhar alguma da minha experiência profissional, foi a partir da leitura do artigo de José Martin Toscano “El análisis y la comunicación de experiencias. Algunos exemplos y recursos”, publicado no número 13 da revista “Alambique” de Julho de 1997, que as ideias começaram a ser passadas para o papel. E porquê? A resposta poderá ser encontrada nos extractos que transcrevo, embora traduzidos: É curioso o facto de que os professores e professoras que já há alguns anos estamos ligados, de uma ou outra forma, a processos de inovação nos centros, temos frequentemente a sensação de que cada vez que iniciamos algum tipo de experiência, partimos quase do zero. Se recorremos a bibliografia (revistas, livros, etc.,) é difícil encontrar referentes práticos que nos possam esclarecer, ou seja, outras experiências desenvolvidas e sistematizadas por outros professores e professoras, em outros contextos escolares.(...)
  • 12. 12 (...) Talvez a razão fundamental resida em que o nosso pensamento está configurado mais para a acção, para a intervenção do que para a análise e a reflexão. Pois escrever exige uma disciplina mental que requer, por sua vez, aprendizagem e treino. (...) Porque também existe a sensação de banalidade do que dizemos quando pensamos num possível público ao qual não estamos habituados quando pensamos no juízo de outras pessoas... (...) Mas também temos aprendido que vale a pena realizar esse esforço. Se não queremos começar sempre do zero, se não queremos ficar apenas no imaginar uma mudança na escola, quando realmente tudo continua na mesma, um dos pilares sobre os quais podemos ir construindo essa mudança, é a difusão e a análise de experiências inovadoras que a exemplifiquem. (...) Assumimos então não só a responsabilidade de tentar mudar mas a de mostrar aos demais como o fazemos concretamente. Tenho vindo a fazer referência á minha condição de professora de Física. É óbvio que os professores de Física são genericamente também professores de Química, por isso ao longo do livro serão feitas algumas reflexões no que respeita ao ensino- aprendizagem da Química. Mas embora eu ache a Química interessante, nunca consegui que produzisse em mim o mesmo “encantamento” que a Física. Há, por certo, muitos professores de Química que pensam acerca dela o mesmo que eu penso sobre a Física. A eles lanço o desafio de nos darem o seu testemunho. Finalmente gostaria de referir que este livro não tem, nem pode ter, qualquer outra pretensão que não seja sensibilizar os professores para uma reflexão sobre as suas práticas. Para isso incluirei uma bibliografia relativamente extensa que permitirá fundamentar muitas das propostas vigentes, no âmbito do ensino das Ciências, particularmente da Física e da Química.
  • 13. 13
  • 14. 14 O insucesso de muitos alunos em Física/Química não é de hoje. Até à década de 70, o que então se designava por ensino secundário, estava dividido em três ciclos: o 1º correspondia aos actuais 5º e 6º anos de escolaridade, o 2º aos 7º, 8º e 9º e finalmente o 3º ao 10 e 11º. No 2º ciclo as disciplinas estavam organizadas em duas secções- Letras e Ciências. Para concluir o 5º ano, os alunos teriam que ter aprovação nas duas secções mas podiam reprovar a uma disciplina de cada secção, a não ser que quisessem continuar estudos. Neste caso, apenas poderiam reprovar a uma disciplina numa das secções. Na secção de Ciências, quando os alunos passavam reprovados a uma disciplina, essa disciplina, quase sem excepção, ou era Ciências Físico-Químicas ou era Matemática. Mas o facto de o insucesso nestas disciplinas vir de longe não pode, de modo algum, ser visto como uma fatalidade irremediável. Daí que a questão colocada no início do capítulo: “Porque razão há tantos alunos com insucesso na aprendizagem da Física/Química? “ seja pertinente. As razões do insucesso dos alunos na Física/Química são inúmeras, pelo que responder a esta questão não é tarefa fácil. Genericamente os professores atribuem esse insucesso a causas que lhes são exteriores- falta de conhecimentos de matemática, falta de domínio da língua, falta de hábitos de trabalho, falta de capacidades cognitivas adequadas, existência de múltiplas áreas de interesse para os jovens (televisão, vídeo, cinema, discotecas, jogos de computador, internet, etc) que entram em concorrência com a escola e com os quais esta tem dificuldade em competir. Obviamente que todos estes factores podem ser responsáveis pelo insucesso mas, não é menos verdade que também os professores podem contribuir para esse mesmo insucesso, quando ignoram as ideias prévias dos alunos, apresentam a matéria de uma forma descontextualizada, privilegiam o uso de algoritmos e da mecanização, não estimulam nos alunos capacidades como problematizar, seleccionar, propor explicações, elaborar projectos, etc. Também para tudo isto os professores Que língua estrangeira é esta que me roça a flor do ouvido, um vozear sem sentido que nenhum sentido empresta?(...) In “ Desencontro”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa 1 - Por que razão há tantos alunos com dificuldades na aprendizagem da Física/Química ?
  • 15. 15 invocam razões, algumas delas poderosas. Se existe uma feroz competição pelo acesso ao ensino superior, e se os exames privilegiam o uso de algoritmos e a mecanização, e apenas pretendem avaliar o conhecimento conceptual, como poderão os professores ter em conta, particularmente no Ensino Secundário, os conhecimentos processual e atitudinal? E será que não existem razões para privilegiar os conceitos em detrimento das capacidades, das atitudes, dos valores? Creio que a resposta a esta última questão, só pode ser NÃO. Quando penso na imensidão de conceitos que aprendi ao longo de toda a minha vida, particularmente nas escolas (primária, secundária, superior) e na pequeníssima percentagem dos mesmos que ainda recordo, sou forçada a concluir que não foi, por parte das escolas, um bom investimento. Não quero com isto significar que não se devam ensinar os conceitos, nas creio que é igualmente importante investir no desenvolvimento de capacidades (cognitivas e manipulativas) e valores. Por outro lado, considero que as mudanças institucionais dificilmente ocorrem sem pressão dos cidadãos, pelo que se queremos que o sistema mude, teremos que ser nós a mudar e a exercer pressão com vista à mudança. Alguns estudos feitos em outros países revelam que alunos, a quem a Física e a Química tenham sido ensinadas através de estratégias inovadoras, obtêm melhores resultados mesmo em provas tradicionais, pelo que parece não haver razões para temermos as mudanças. E se há mudanças que implicam alterações radicais nas estratégias de ensino-aprendizagem, há outras que implicam pequenas alterações. Em capítulos posteriores voltaremos a abordar este ponto bem como outros anteriormente focados.
  • 16. 16 Uma das principais críticas que se faz hoje ao ensino a todos os níveis, e em particular nos Estados Unidos, é que os alunos não aprendem a raciocinar e a pensar criticamente (Hurd, 1989). Creio que este aspecto poderá ser constatado em muitos outros países, nomeadamente no nosso. Efectivamente, se colocarmos aos alunos um exercício como o que se indica a seguir, muito provavelmente obteremos respostas que evidenciam o que acaba de ser referido. Um corpo, com a massa de 2kg, cai da altura de 5m. 1- Calcula: 1.1- o tempo que demora cair 1.2- a velocidade com que atinge o solo 2- Indica, justificando, se o corpo atingiria mais rapidamente o solo caso a sua massa fosse dupla. Apesar de terem usado na resolução das questões 1.1 e 1.2 fórmulas em que não intervém a massa do corpo, muitos alunos provavelmente responderão sim na questão 2, dada a concepção alternativa de que um corpo cai tanto mais depressa quanto mais pesado for. A resolução do exercício é feita de forma mecânica, pelo que os alunos se limitam a usar a fórmula adequada a cada uma das alíneas sem qualquer reflexão sobre a questão global. Esta falta de reflexão, bem como a resistência oferecida pelos alunos à mudança conceptual são, por certo, responsáveis por muito do insucesso no ensino- aprendizagem das Ciências. No campo da investigação educacional tem-se vindo a verificar uma mudança progressiva de paradigma, conduzindo a concepções sobre o ensino das ciências que valorizam a construção de saberes, e o desenvolvimento de capacidades e atitudes que permitam, por um lado, uma adaptação ao ritmo de mudança dos nossos dias e, por outro, tomadas de decisão conscientes sobre problemas locais e globais. Martins e Veiga (1999), consideram que a Escola deve O Universo é feito essencialmente de coisa nenhuma intervalos, distâncias, buracos, porosidade etérea. Espaço vazio, em suma. O resto é a matéria.(...) In “ Máquina do mundo”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa 2- O que é importante que os alunos aprendam?
  • 17. 17 promover não só a construção de saberes necessários a uma compreensão adequada desses problemas, mas também hábitos de reflexão e questionamento. Hurd (1987) considera que devem ser dadas aos alunos oportunidades para integrarem uma informação científica válida na formulação de julgamentos éticos. O ensino- aprendizagem das Ciências deve, pois, ser entendido mais como um processo do que como um produto de informações, factos, modelos, teorias, que muitos autores, nomeadamente Yager (1992) incluem no que designam por domínio conceptual. Em muitos estudos aparece a referência a outros domínios de conhecimentos, para além do conceptual, nomeadamente os domínios processual e atitudinal ( Yager, 1992; Sánchez Blanco, 1997). No domínio atitudinal incluem-se sentimentos, valores e tomadas de decisão, enquanto que no processual se incluem processos como observar, descrever, classificar, seleccionar, organizar, prever, inferir, controlar variáveis, formular hipóteses, elaborar projectos. Alguns autores (por exemplo Beyer, Presseissen, Quellmalz, Ratths et al, citados por Cruz, 1989) referem-se a estes processos falando em capacidades, e distinguindo, por vezes, entre capacidades elementares e complexas. Nestas últimas incluem resolver problemas, tomar decisões, avaliar, etc . A necessidade de valorizar não apenas o conhecimento conceptual mas também os conhecimentos processual e atitudinal, deve levar a uma reflexão por parte de todos aqueles que estão envolvidos no ensino aprendizagem da ciência, muito em particular os professores. A este propósito, não posso deixar de citar Hurd (1987), pp 55, que termina assim o seu artigo “Ciência- Tecnologia- Sociedade: um novo contexto para o ensino da ciência no secundário”: Desde que começou a ler este artigo a quantidade de novo conhecimento entretanto gerado dá para encher 25 volumes da Enciclopédia Britânica- o ritmo médio é de 27 volumes em cada 30 minutos, dia e noite, semana após semana (....) Muito do que um estudante precisará de saber para usar na vida e no trabalho ainda não foi descoberto. O que é que isto significa para o ensino da ciência? Significa que as capacidades e a arte de aprender tornam-se os objectivos principais do ensino- aprendizagem da ciência de forma a que os estudantes possam ficar para sempre bem educados. Numa idade de informação, cada estudante deve adquirir a capacidade para identificar nova informação, avaliar o seu valor e ser capaz de controlar a sua capacidade para usar adequadamente este conhecimento.
  • 18. 18 Uma das áreas em que os alunos apresentam muitas dificuldades é a resolução de Problemas (RP). Também aqui os professores atribuem essas dificuldades a várias causas, muito em particular às dificuldades matemáticas, no entanto raramente referem a didáctica utilizada. Mas será que essa não é uma das principais causas? Por várias vezes coloquei as questões A e B em testes sumativos para alunos de 9ºano e cheguei inclusivamente a colocá-las a alunos de 10 º ano. Questão A Calcula a potência de uma máquina de lavar louça, sabendo que durante um programa de lavagem de 1,5 h consome 1,8 kWh . Questão B A tabela anexa contem informações quanto ao modo como a família Silva utiliza dois dos seus electrodomésticos . Arca frigorífica Temperatura interior igual a -15 ºC ; consumo médio diário igual a 1,2 kWh Máquina da louça Um programa diário a 40 ºC ; consumo médio diário igual a 1,2 kWh Considera a seguinte afirmação: A potência da máquina da louça da família Silva é superior à potência da sua arca frigorífica Manifesta a tua concordância ou discordância com a afirmação, indicando razões justificativas. (...) Põe-se o Sol porque o seu movimento é relativo. Derrama cores porque os meus olhos vêem. Mas por que será belo o pôr do Sol? (...) In “Poema das coisas belas”, Poemas Póstumos de António Gedeão, 1ª edição, 1984, Edições João Sá da Costa, Lisboa 3-A que atribuir a falta de reflexão dos alunos perante grande parte das questões que lhes são colocadas?
  • 19. 19 A questão A, foi resolvida em média por 50 % dos alunos no 9º ano e 90% no 10º ano, mas no que respeita à questão B, quer num ano, quer no outro, ou nenhum aluno resolveu ou apenas um ou dois conseguiram resolvê-la. De entre as respostas à questão B, citam-se, por ex. : A potência da máquina é maior porque funciona a temperatura mais elevada A potência da máquina é maior porque 40 é maior que -15 A potência da máquina é 55 vezes maior A potência da máquina é 25 vezes maior A potência é igual porque gastam o mesmo A potência do frigorífico é maior porque "fazer frio" gasta muita energia As duas questões envolvem a aplicação de um mesmo conceito e apresentam a mesma dificuldade matemática mas, perante dados em excesso, a maior parte dos alunos é incapaz de seleccionar os dados relevantes, tal como é incapaz de ir buscar ao seu quotidiano outros dados de que necessita. Passo agora a descrever uma outra situação, que teve lugar numa turma de 11º ano quando a corrente eléctrica fazia parte do respectivo programa. Foi colocada num teste diagnóstico a seguinte questão: Questão C Considera o circuito esquematizado. Qual deverá ser a indicação do amperímetro A2 sabendo que A1 indica 0,2 A? A1 20 Ω A2 Um dos alunos (com média de 16), chamou-me várias vezes insistindo que precisava de mais dados e acabou por escrever no teste(sic) : O problema não pode ser resolvido porque faltam dados e a lei de Ohm não "encaixa". A preocupação do aluno era utilizar um algoritmo, sem qualquer análise qualitativa prévia do problema. No âmbito da investigação levada a cabo em 1995/1996, dentro do meu projecto de licença sabática (Gouveia, 1995), foi apresentada a questão anexa a alunos de Físico-Químicas, de 9º, 10º e 12º anos:
  • 20. 20 Questão D As seis caixas representadas na figura contêm diferentes substâncias, mas há duas caixas com uma mesma substância . Pretende-se que identifiques essas duas caixas e que justifiques a tua escolha. As caixas A,B,C são idênticas entre si e cada uma, vazia, pesa 100 g. As caixas D,E,F são idênticas entre si e cada uma, vazia, pesa 50 g. Curiosamente em todos os anos houve respostas incorrectas, mas as respostas X e Y anexas merecem particular reflexão.: Resposta X(sic) O problema até pode ser fácil mas é confuso e foi a 1ª vez que tive um deste género Resposta Y(sic) caixa A- 200 g x 50 cm3 = 10000 caixa B- 200 g x 50 cm3 = 10000 Eu não me lembro bem, mas acho que se tinha de multiplicar o volume pelo peso. Se assim for é a caixa A e D Também neste caso a preocupação dos alunos foi utilizar um algoritmo, sem qualquer análise qualitativa prévia do problema. As situações E e F que se descrevem a seguir ocorreram em provas de avaliação. Numa prova global de 10ºano foi colocada a questão: A O volume de substância na caixa é 50 cm 3 e a caixa cheia pesa 300 g B O volume de substância na caixa é 100 cm 3 e a caixa cheia pesa 300 g C O volume de substância na caixa é 200 cm 3 e a caixa cheia pesa 250 g D O volume de substância na caixa é 50 cm 3 e a caixa cheia pesa 250 g E O volume de substância na caixa é 100 cm 3 e a caixa cheia pesa 300 g F O volume de substância na caixa é 200 cm3 e a caixa cheia pesa 250 g
  • 21. 21 Questão E Um corpo de massa 0,4 kg está apoiado numa superfície horizontal. Sobre ele actuam as forças F de intensidade 8N e a força de atrito A de intensidade 2N. ..... 60 º F B C 1.4-Qual a variação de energia cinética sofrida pelo corpo no trajecto referido na alínea 1.21? Justifique devidamente. Um aluno respondeu (sic): Não é possível resolver pela fórmula Ec= ½ mv2 porque não temos o volume e não é possível resolver pela fórmula W = ∆ Ec porque há atrito Mais uma vez emerge a preocupação em utilizar um algoritmo, sem qualquer reflexão acerca do mesmo. Num exame de equivalência à frequência, na disciplina de TLF, bloco I, uma das questões era: Questão F Uma das técnicas de construção civil para aproveitamento solar é a utilização de paredes de Trombe que consistem no seguinte. Na fachada (F) de uma casa, é colocada uma espécie de janela em vidro (V), por trás da qual existe um parede de betão(P), enegrecida. Por trás dessa parede existe o compartimento a aquecer. Muitas vezes a parede P tem duas aberturas, uma superior A, e outra inferior B. Nesta técnica de construção está patente a atenção dada á transferência de energia, como calor, por condução, convecção e radiação F A V P Compartimento B 1-Indique, justificando da forma mais completa possível se, numa parede de Trombe, os três processos de transferência de energia como calor, assumem igual importância 2-Indique, justificando, porque razão as paredes de Trombe são feitas em betão e não em alumínio A fim de responder á questão, apresentava-se, no início do teste, a seguinte informação: Ao longo da prova poderão ser úteis os dados contidos na tabela anexa Água Alumínio Betão capacidade térmica mássica (J kg-1 0C-1) 4186 900 3350 condutibilidade térmica ( W m-1 0C-1) 0,61 237 20 coeficiente de dilatação volumétrica (0C-1) 210 x 10 -6 72 x 10 -6 30 x 10 -6 1 O trajecto correspondia a um deslocamento de 3,0 m de B para C.
  • 22. 22 Na resposta à alínea 1 da questão, um aluno com média de 18, que pretendia melhoria de nota, a propósito da condução, respondeu (sic): A água contida na parede é má condutora térmica e o betão de que é feita a parede também.. A resposta parece evidenciar, mais uma vez, a dificuldade de seleccionar os dados necessários á resolução do problema. Situações como as referidas foram por certo vivenciadas já por muitos professores de Física e Química dos Ensinos Básico e Secundário e a sua explicação poderá encontrar-se, pelo menos parcialmente, no tipo de questões que habitualmente se colocam aos alunos. Se analisarmos a maior parte dos exercícios propostos em manuais, em fichas de trabalho, em fichas de avaliação sumativa ou em pontos de exame, podemos constatar que genericamente os dados estão lá todos e em número estritamente necessário. Aos alunos basta encontrar uma ou mais fórmulas que permitam ligar aqueles dados. Por que não passar a incluir dados em excesso para que os alunos tenham que seleccionar quais os relevantes para o exercício em causa? Com esta pequena alteração, o aluno vai desenvolver o seu conhecimento processual, ao desenvolver a capacidade de seleccionar. E se a questão for colocada numa aula normal, por que não apresentá-la com falta de dados para que o aluno possa desenvolver capacidades mais complexas? Vários autores, entre eles Gil Pérez et al (1988) referem a importância de apresentar aos alunos questões em que há insuficiência de dados. Outros autores, entre eles Kempa, (1986), citado por Jiménez (1995), referem também a importância do excesso de dados, considerando pouco adequadas as questões em que se apresenta aos alunos apenas a informação essencial para a sua solução. A insuficiência e/ou o excesso de dados obrigarão necessariamente a uma reflexão qualitativa prévia necessária à resolução das questões propostas aos alunos. Um outro aspecto que importa também salientar é que a apresentação de um exercício que vai sendo desdobrado em muitas alíneas, apresenta porventura mais desvantagens que vantagens. O aluno resolve cada uma das alíneas, não vendo a questão global que se lhe coloca. Podemos detectar facilmente o que acaba de ser referido com o exercício apresentado no início do capítulo anterior. A propósito do que tem vindo a ser referido, Kulm (1990), admite que os professores muitas vezes pensam que ensinam resolução de problemas mas o que ensinam são fundamentalmente exercícios Embora não exista uma fronteira definida entre exercício e problema (Watts, 1993; Lopes, 1994), há características que estão essencialmente presentes no problema e não o estão no exercício. O quadro da figura 1, (Gouveia et al, 1995), sintetiza essas características.
  • 23. 23 Figura 1: Características de exercícios e problemas Exercício Problema  dados explícitos e em número necessário e suficiente  resolução única  solução única  obstáculo reduzido; questões de orientação  aluno-sujeito passivo da aprendizagem  pode ser resolvido mediante a recordação, reprodução ou aplicação de um algoritmo  dados não explícitos (implícitos na descrição da situação)  vários caminhos para a resolução  várias soluções possíveis  grande obstáculo  aluno-sujeito activo da aprendizagem  envolve capacidades cognitivas, metacognitivas, afectivas e psicomotoras A transformação de exercícios em problemas é, a meu ver, uma tarefa aliciante que recomendo a todos os professores. Vejamos alguns exemplos: 1-A questão B referida no início do capítulo não é mais que um problema criado a partir do exercício proposto na questão A. Ao introduzir dados em excesso num exercício estamos a dar um passo para o transformar num problema, criando condições para que o aluno desenvolva, não só conhecimento conceptual mas também processual. 2-Vejamos um outro exemplo de transformação de um exercício em problema, desta vez no âmbito da Química Questão G Supõe que tens 44, 0 g de dióxido de carbono. Calcula o nº de moléculas existentes nessa massa bem como o volume PTN ocupado pela mesma Questão H Calcula o nº de moléculas existentes numa botija de gás das utilizadas no laboratório, bem como o volume de gás que se libertaria da botija se a deixássemos esvaziar completamente. Enquanto que a questão G é um exercício (o aluno não necessita de fazer qualquer análise qualitativa prévia), a questão H é um problema. O aluno terá que fazer uma análise prévia da situação que o levará a formular questões tais como: Qual é o gás? Qual a massa de gás contida na botija?
  • 24. 24 A resposta poderá ser dada a partir de um excerto de um folheto da Galp (Figura 2), que o aluno terá que analisar a fim de seleccionar a informação relevante. Em geral o aluno, de início, selecciona também informação não relevante como sejam as dimensões da botija, a partir das quais pretende calcular o volume de gás. A discussão que se deve criar à volta deste problema deverá levar a que o aluno reconheça posteriormente o desconhecimento de alguns dados (por ex. as condições de pressão e temperatura no laboratório) e a irrelevância de outros, bem como a razão de ser dessa irrelevância.
  • 25. 25 Figura 2- Excerto de um folheto informativo (Incluir Figura 2)
  • 26. 26 3-Vejamos ainda um outro exemplo de transformação de exercício (questão I) em problema (questão J)2 Questão I Um Porsche 911 Turbo atinge a velocidade de 100 km/h, a partir do repouso, em 4,9 s. Supõe que o movimento é rectilíneo e calcula, para o intervalo de tempo referido: 1-a aceleração média 2-o espaço percorrido, supondo a aceleração constante Questão J Um condutor, que mora a 150 m de uma via rápida, sai de casa no seu SEAT AROSA 1.0 e ao entrar na via rápida é autuado por conduzir a uma velocidade superior à permitida na referida via. Em tribunal é ilibado, tendo os argumentos da defesa incidido fundamentalmente em características do carro. Quais terão sido os argumentos da defesa? Características do SEAT AROSA 1.0 Peso: 864 kg Dimensões: comprimento-3,536 m; largura- 1,460 m; altura-2,323 m velocidade máxima : 150 km/h Aceleração (0-100 km/h): 16,9 s Consumo(litros aos 100 km) : estrada (100-110 km/h)- 4,5; Auto-estrada(120-130 km/h)-6,3; cidade – 5,8 Condições de ensaio: auto-estrada e estrada com trânsito médio. Cidade com trânsito. Piso seco, vento moderado. Duas pessoas a bordo (adaptado da Revista ACP, nº12, Dezembro de 1997, pp31) As duas questões envolvem fundamentalmente os mesmos conceitos, mas a questão J, para além de estar contextualizada, permite desenvolver uma série de capacidades tais como:  seleccionar informação relevante  analisar criticamente a informação (por exemplo interpretar a informação relativa à aceleração e identificar a falta de informação quanto à velocidade máxima permitida numa via rápida) 2 Estas questões foram já discutidas em sessões de formação (Relatório Final da Acção PII-482, Programa Ciência Viva, Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa, Universidade de Aveiro, Set. 99)
  • 27. 27  analisar cuidadosamente os resultados à luz das hipóteses e dos casos limite 4- Ainda uma outra situação, em que se comparam as questões L e M. Questão L Introduziu-se uma resistência de aquecimento de potência 300 W num recipiente com 300 g de água. Calcula a elevação de temperatura da água sabendo que a resistência esteve ligada durante 6 min. Questão M Uma resistência de aquecimento de potência 300 W esteve ligada durante 6 min numa cafeteira com 300 g de água. Será que a água ferveu? Na primeira questão o aluno limita-se a aplicar fórmulas e obtém o resultado 86 ºC para a variação de temperatura. Esta resposta é absurda por duas razões:  o aluno admitiu que toda a energia foi transferida para a água, o que é absurdo com uma cafeteira;  por outro lado o aluno não sabe qual era a temperatura inicial da água; se eventualmente fosse, por exemplo 20 ºC, e tendo o aluno admitido que toda a energia foi transferida para a água, a energia fornecida teria sido suficiente para que a água entrasse em ebulição, pelo que a variação de temperatura não seria a calculada. A segunda questão obriga o aluno a reflectir pelo menos sobre este segundo aspecto, mas se o aluno for habituado a raciocinar sobre problemas reais, irá responder que não tem dados suficientes pois desconhece que fracção de energia foi efectivamente utilizada no aquecimento da água. É óbvio que toda esta análise podia ser feita relativamente à questão L e nessa altura não teria sido um exercício mas, na realidade, exercícios como o proposto na questão L são colocados muitas vezes, sem a preocupação de que o resultado seja viável numa situação real, pretendendo-se apenas como resposta o equivalente aos ditos 86 ºC. De tudo o que foi referido emerge um aspecto muito importante; é preciso adoptar uma prática pedagógico-didáctica que leve os alunos a começar por um estudo qualitativo da situação. A situação que a seguir se descreve evidencia, mais uma vez, a falta de análise qualitativa prévia. A questão (adaptada a partir de outra apresentada por Gil et al (1992) é a seguinte:
  • 28. 28 Questão N Um móvel desloca-se segundo uma trajectória rectilínea, de acordo com a equação s = 25 + 40t – 5 t2 . Se se deslocar durante 6s poderá atingir um obstáculo colocado na trajectória a 100m da origem ? Muitos alunos responderão que não, precisamente por falta da referida análise qualitativa prévia. A importância no sucesso dos alunos, destes aspectos que têm vindo a ser referidos, é revelada por vários estudos, um deles realizado também por Gil Pérez et al, (1988), com alunos pertencentes a dois grupos. Um dos grupos (chamemos-lhe I) incluía alunos que tinham sido submetidos a estratégias privilegiando a resolução de problemas e o outro grupo (II) incluía alunos submetidos a estratégias privilegiando a resolução de exercícios. A todos os alunos foi proposta a resolução de exercícios idênticos aos habitualmente propostos nos manuais. Os alunos do grupo I obtiveram melhores resultados que os do grupo II. Os alunos deste grupo II revelaram não fazer uma análise qualitativa prévia cuidada pois foram os que primeiro começaram a utilizar as fórmulas tal como utilizaram imediatamente os dados sem reflexão sobre a sua pertinência. O que anteriormente foi referido não significa que não se proponha aos alunos a resolução de exercícios. O que se pretende é sensibilizar para a necessidade de dar menos ênfase à resolução de exercícios e enfatizar a resolução de problemas.
  • 29. 29
  • 30. 30 À luz da perspectiva construtivista, vigente no ensino- aprendizagem das Ciências, aprender pressupõe um processo de construção do conhecimento por parte dos alunos que devem desempenhar um papel activo na sua aprendizagem. O conhecimento informal do aluno sobre o mundo que o rodeia, vai condicionar de forma decisiva as novas aprendizagens, pelo que no ensino das Ciências, é fundamental ter em conta as ideias e as explicações sobre os fenómenos naturais que os alunos trazem para a escola e que, muitas vezes, não são capazes de explicitar (Martins e Veiga, 1999, pp 26). Estas concepções, vulgarmente designadas por concepções alternativas (CA)3, têm constituído uma das principais (senão a principal) linha de investigação em didáctica das ciências nos últimos anos. Felizmente para nós, professores de Física, existem inúmeros estudos sobre CA dos alunos, nomeadamente em relação aos conteúdos que leccionamos. Alguns desses estudos têm sido feitos em Portugal. Citam-se, entre outros, Vasconcelos (1985), Caldeira et al (1991), Neto et al (1991), Veiga (1991). Concepções alternativas dos alunos são frequentemente encontradas nas práticas lectivas. Vejamos algumas ainda no âmbito da Física: F1-Perante uma mesa com pés metálicos e tampo de madeira, os alunos, muito provavelmente, dirão que o tampo está a uma temperatura superior, porque os metais são mais frios que a madeira. 3 Existem outras terminologias, por exemplo, ideias prévias, versões privadas, pre-concepções. (...) Eu queria agradecer-te , Galileo, a inteligência das coisas que me deste. Eu, e quantos milhões de homens como eu a quem tu esclareceste, ia jurar- que disparate, Galileo!- -e jurava a pés juntos, e apostava a cabeça sem a menor hesitação- que os corpos caem tanto mais depressa quanto mais pesados são.(...) In, “Poema para Galileo”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa 4-Por que razão os alunos opõem resistência à mudança de concepções ?
  • 31. 31 F2-Perante um circuito não ramificado, os alunos consideram, genericamente, que a intensidade de corrente vai diminuindo ao longo do circuito F3-Genericamente os alunos consideram que, num corpo que foi lançado verticalmente no ar, actua durante a subida uma força vertical ascendente. F4-Muitos alunos consideram que perante dois corpos idênticos, um negro e um branco, colocados num ambiente aquecido, o negro aumentará mais rapidamente a temperatura, mas consideram também que a temperatura desse corpo irá, em seguida, baixar mais lentamente. F5-Perante a questão “ Se para um pic-nic quiséssemos levar uma taça com um gelado, seria boa ideia embrulhá-la num cobertor? ” a esmagadora maioria dos alunos responderá “Não pois o cobertor aquece”4 F6-Perante uma lente plano convexa (por exemplo) os alunos consideram, frequentemente, que a imagem obtida será diferente se voltarmos para o objecto a face curva ou a face plana. F7-Se apresentarmos aos alunos dois cubos maciços, de igual volume, um de chumbo e outro de alumínio, muitos consideram que, colocados num recipiente com água, o primeiro deslocará um maior volume desta. Também no âmbito da Química têm sido identificadas inúmeras CA. Em Portugal existem vários estudos, entre os quais Cachapuz et Ribeiro (1986), Pereira (1990), Martins (1988), Martins (1993). Na nossa prática pedagógico-didáctica tivemos, por certo, oportunidade de “encontrar” algumas dessas concepções. Vejamos alguns exemplos: Q1- Para explicar a dissolução de uma substância os alunos mais jovens dizem, por vezes, que derreteu. Q2- Quando numa reacção se liberta um gás surgem por vezes descrições tais como: está a “efervescer”, está a ferver, está a formar-se ar, está a sair fumo. Q3- Mesmo no curso complementar aparecem alunos que consideram que a água é uma mistura “porque tem oxigénio e hidrogénio”. Q4- Muitos alunos consideram que a combustão (por exemplo da lenha na lareira) é uma reacção endotérmica porque “é preciso fornecer energia para arder”. O episódio que passo a referir passou-se há uns anos, dava eu uma aula sobre a conservação da massa a alunos de 8º ano. Foi-lhes apresentado um sistema constituído por um matraz fechado, contendo no seu interior aparas de zinco (no fundo) e um tubo de ensaio pequeno com ácido clorídrico, e foram-lhes pedidas previsões sobre o que aconteceria à massa do sistema se a dada altura se inclinasse o matraz, de modo a que o ácido e o zinco reagissem. Os alunos sabiam que na reacção 4 Esta mesma resposta já me tem sido dada por professores estagiários, no início do seu estágio
  • 32. 32 se formava um gás e a maior parte previu que a massa diminuiria, com o fundamento de que se formava um gás e os gases são “leves”. A dada altura, encontrava-me eu junto de um grupo observando os alunos na realização da experiência, quando ouço, vinda de outro grupo, a seguinte conversa: Aluno X- Agora pesa o mesmo. Aluno Y- Regista menos; a professora não viu. Este episódio ilustra bem quão poderosas podem ser as concepções alternativas, o que é facilmente comprovado em muitas situações. Quantos adultos, eventualmente licenciados, não responderão a F1 tal qual respondem os nossos alunos? E porquê? Uma das razões reside em que muitas CA representam explicações satisfatórias para o que se observa. Assim, a concepção subjacente a F1 parece explicar a diferente sensação que temos ao tocar no tampo ou nos pés da mesa. Também F2 parece explicar o termos que pagar a factura à EDP todos os meses. É por isso que o professor deve estar consciente das concepções alternativas dos alunos a fim de poder provocar conflitos cognitivos que ajudem os alunos a pô-las em causa. Ainda relativamente a F1 e à explicação dos alunos, podemos questioná-los. E se a mesa estivesse ao Sol num dia quente de Verão ? De seguida devemos propor-lhes que meçam a temperatura do tampo e dos pés da mesa. Relativamente a F2, devemos propor-lhes que meçam a intensidade da corrente em diferentes pontos do circuito. Mas voltaremos ainda a estes aspectos, em capítulos posteriores.
  • 33. 33
  • 34. 34 A recomendação mais frequentemente feita para a reforma do ensino das ciências exige que os conceitos e os processos de raciocínio tecnológico sejam integrados no curriculum por se reconhecer que certos aspectos da tecnologia são a melhor forma de preencher a lacuna entre a ciência e a sociedade e de ligar a ciência com os aspectos da vida quotidiana (Hurd, 1987). Uma tal perspectiva de abordagem curricular, relacionando Ciência-Tecnologia-Sociedade é conhecida habitualmente pela perspectiva CTS. Nesta perspectiva assume particular importância a contextualização. Se os conceitos forem apresentados de uma forma descontextualizada, dificilmente se tornarão significativos para os alunos. É habitual, a este propósito, ouvir os professores referirem que usam sempre exemplos reais nas suas aulas. Mas será que o fazem da melhor maneira? Yager e McCormack, citados por Yager (1992), pp5, considerando cinco domínios de importância para o ensino das ciências (figura 3) referem que, numa perspectiva CTS, dever-se-á começar pelo domínio das aplicações/conexões, para chegar ao domínio dos conceitos, contrariamente à prática mais corrente em que se parte do domínio dos conceitos para chegar ao das aplicações/conexões. Por outras palavras, o ensino das Ciências deve privilegiar a resposta a situações - problema, em vez de privilegiar a apresentação de exemplos de aplicação. No entanto, é esta última concepção que emerge na maior parte das práticas lectivas e dos manuais - apresentam-se os conceitos e no fim algumas aplicações. A perspectiva CTS para o ensino das Ciências implica que os conhecimentos possam ser desenvolvidos a partir de contextos de relevância social, de modo a que os alunos reconheçam utilidade na aprendizagem. Esta nova perspectiva do ensino–aprendizagem das Ciências implica, necessariamente, mudança de concepções por parte dos professores. Niels Armstrong pôs os pés na Lua e a Humanidade inteira saudou nele o Homem Novo No calendário da História sublinhou-se com espesso traço o memorável feito(....) In “Poema do Homem Novo”, Novos Poemas Póstumos de António Gedeão, 1ª edição, 1990, Edições João Sá da Costa,, Lisboa 5-Porque se fala hoje tanto na importância da contextualização?
  • 35. 35 Figura 3: Domínios CTS para ensino e avaliação Mundo da sociedade Aplicações Criatividade Conceitos Processos Atitudes Conexões Mundo dos alunos Para Gil Pérez (1993), as estratégias de mudança conceptual mais coerentes com a orientação construtivista e com as características do raciocínio científico são as que colocam a aprendizagem como o tratamento de situações problemáticas abertas que os alunos considerem de interesse. Tais estratégias, facilitam a exploração das interacções CTS. Há vários estudos que podem ajudar os professores a delinear estratégias numa perspectiva CTS. Cachapuz et al (1989), por exemplo, descrevem uma estratégia de ensino do conceito de reacção química, a partir de um problema ambiental. As situações que se
  • 36. 36 seguem relatam a utilização de situações problemáticas para o ensino de outros conceitos5. 1- Na disciplina de TLF, bloco I, na unidade Calor, logo na primeira aula, os alunos começam por ver um vídeo sobre a CTO (casa termicamente optimizada) do Porto onde é enfatizada a utilização da tijoleira no piso inferior da casa. Os alunos são levados a formular questões e entre elas deve-se fazer emergir a questão “ Não seria melhor usar cortiça?”. A partir daqui é muito provável que vá emergir a concepção alternativa subjacente a F1(capítulo 4). Os alunos deverão verificar experimentalmente que um pedaço de cortiça e um de tijoleira, colocados na sala de aula, estão á mesma temperatura , o que deve fazer emergir outra questão: “Então por que nos parece mais fria a tijoleira?”. Será então proposta aos alunos uma actividade experimental que consiste no seguinte: Será aquecida uma placa metálica e sobre ela serão colocadas duas placas de iguais dimensões, uma de cortiça e outra de tijoleira. Os alunos irão medindo regularmente a temperatura em cada uma das placas (de metal, de cortiça e de tijoleira) e posteriormente construirão um gráfico com os dados recolhidos. A interpretação do gráfico proporcionará a exploração de conceitos tais como condutibilidade térmica, equilíbrio térmico, calor. Os alunos poderão verificar que a cortiça é pior condutora térmica que a tijoleira mas continuam sem saber explicar por que razão na CTO esta foi colocada. Será então proposta uma nova actividade em que os alunos vão verificar que um pedaço de tijoleira pode armazenar energia que posteriormente pode ceder. Na interpretação dos resultados da actividade serão discutidos os conceitos de capacidade térmica e capacidade térmica mássica. Perante tabelas contendo capacidades térmicas mássicas, condutibilidades térmicas e densidades de vários materiais, entre eles a tijoleira e a cortiça, os alunos deverão conseguir responder à questão inicialmente levantada. A partir de questões formuladas com base ainda no vídeo sobre a CTO, anteriormente referido, ou numa visita à mesma, é possível fazer com que os alunos levantem questões que permitirão tratar ainda todos os conceitos previstos na unidade, ao mesmo tempo que se estimula o desenvolvimento dos conhecimentos processual e atitudinal. 2- Um outro exemplo, este no âmbito da Química. Em 1994/1995 foi-me atribuída uma turma de 8ºano, por sinal bastante difícil, com muitos alunos desinteressados e indisciplinados. Passei todo o primeiro período a criar um ambiente favorável ao trabalho. Começámos o programa pela Física pelo que só em fins do 2º período entrámos na Química. Comecei o seu estudo levando para a aula uma notícia 5 A autora tem utilizado algumas destas estratégias e acompanhado a utilização de outras, por exemplo, por professores estagiários
  • 37. 37 assustadora sobre a poluição do rio Trancão. Os alunos interessaram-se por saber se a situação do Douro seria semelhante. Fizemos então várias actividades, nomeadamente: recolha de amostras de água do Douro, visita à Estação Elevatória de Lever, onde é captada a água que abastece o Porto, visita aos laboratórios de Física/Química e de Microbiologia dos SMAS (serviços municipalizados de águas e saneamento). Recolhidas as amostras de água foram sendo pedidas aos alunos sugestões de como, por exemplo, se poderia saber se tinha materiais dissolvidos. Foram então surgindo os processos físicos de separação. Posteriormente quando das visitas de estudo, particularmente aos laboratórios do SMAS, os alunos puderam ver que alguns dos processos eram aí utilizados. Ainda na visita aos SMAS foi fornecida uma tabela com referência aos iões pesquisados na água e às concentrações admissíveis. Os alunos quiseram saber o que significava toda aquela simbologia (Cl-, Na+, mg/L, etc). Novamente os conceitos foram explorados a partir de questões formuladas pelos alunos. Estudaram-se depois outras águas, através de rótulos de garrafas. Foram assim sendo consolidados alguns conceitos, ao mesmo tempo que surgiam novas questões, uma delas a partir da referência ao pH, nos referidos rótulos. Foram sendo construídos novos conceitos, ao mesmo tempo que se foi desenvolvendo todo um conhecimento processual e atitudinal. Relativamente a este último é interessante referir que na visita ao SMAS, a técnica que a orientou elogiou os alunos, considerando-os muito interessados. Este aspecto é tanto mais curioso quanto, como disse atrás, se tratava de alunos de uma turma considerada difícil. Ainda sobre a importância dos contextos, Porrúa e Pérez-Froiz (1993), citados por Martins e Veiga (1999), pp22, consideram que a Ciência não se produz fora do contexto social; a sociedade influencia a Ciência e vice-versa; a Ciência é uma construção social e está vinculada a um determinado contexto histórico, em que existe uma relação dialéctica entre Ciência, Tecnologia e Sociedade. A propósito dos contextos históricos, Sequeira e Leite (1988), referem que a história da Ciência pode contribuir para melhorar o ensino das Ciências. Pessoalmente considero extraordinariamente formativo que os nossos alunos compreendam que todo o conhecimento de que hoje dispomos é fruto de muita investigação e trabalho árduo ao longo dos tempos. Creio que este aspecto não é muito realçado. Talvez por isso, já me tenha acontecido por mais que uma vez, e até com alunos considerados bons, que ao realizarem uma actividade experimental e ao confrontaram os resultados com aqueles que seriam de esperar tendo em conta o referente teórico em que se apoiavam, refiram no relatório: “Aqui a lei não se verifica”. Creio, aliás, que pedir aos alunos para verificar uma lei, não é uma proposta razoável e poderá induzir respostas como a que foi referida. Considero mais razoável pedir aos alunos que verifiquem se os dados obtidos estão em
  • 38. 38 coerência com a lei e pedir-lhes que proponham explicações para a incoerência, caso esta se verifique. O que acabo de referir não significa que se deva dar aos alunos a ideia de que as teorias científicas são infalíveis. Bem pelo contrário, é importante enfatizar que o erro é inerente à própria ciência, mas a refutação de uma lei não pode ser feita só porque, numa dada actividade, os resultados parecem não estar em concordância com essa lei.
  • 39. 39
  • 40. 40 A resposta à questão colocada no início deste capítulo não é linear. Cachapuz (1989), a este propósito, propõe uma reflexão que passa pela(s) resposta(s) a três questões: i- o que pretendo eu com uma dada experiência? ii- que formato de trabalho experimental é o mais adequado? iii- não haverá outros métodos mais vantajosos para atingir esses mesmos objectivos? Por sua vez Garret (1995) considera que a maioria das actividades que propomos nas nossas classes de ciências tem pouco a ver com os problemas que encontramos na vida diária pelo que, pelo menos à primeira vista , é difícil ver como poderá ajudar os nossos alunos nas suas actividades quotidianas aquilo que lhes pedimos nas classes de ciências ou numa actividade de laboratório. Nesta linha, Hodson (1994) considera que é necessário reconceptualizar o Trabalho Experimental e que isso implica uma redefinição e reorientação do conceito de trabalho prático6 e uma melhor adaptação da actividade aos seguintes objectivos:  aprendizagem da ciência - aquisição e desenvolvimento de conhecimentos teóricos e conceptuais;  aprendizagem sobre a natureza da ciência - desenvolvimento de um conhecimento da natureza e dos métodos da ciência e consciencialização das interacções entre ciência e sociedade;  prática da ciência - desenvolvimento de conhecimentos técnicos sobre a investigação científica e a Resolução de Problemas. 6 As designações trabalho de laboratório, trabalho prático e trabalho experimental são por vezes identificadas; no entanto, alguns autores dão, nomeadamente ao trabalho prático, uma significação mais lata, podendo o mesmo abranger outras actividades para além do trabalho experimental Transcendente (que transcende) ? Sobre-humano (além do humano.) ? Oh feliz de quem entende, De quem busca e surpreende Os pontos, a recta e o plano !(...) In “ Sou assim”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa 6- Qual a importância das actividades experimentais nas aulas de Física/Química?
  • 41. 41 O referido autor considera que os professores usam frequentemente o Trabalho Experimental de forma irreflectida sobreutilizando-o7 e infrautilizando-o, dado que grande parte das actividades por eles desenvolvidas são mal concebidas e carecem de valor educativo real. Hodson considera que a actividade praticada deste modo resultará improdutiva e o Trabalho Experimental inútil, do ponto de vista pedagógico-didáctico; daí a necessidade de reconceptualizar o Trabalho Experimental. Cachapuz (1995) considera ainda que a riqueza educativa do ensino experimental das Ciências não é compatível com protocolos experimentais estereotipados pelo que sugere algumas “pistas” para a implementação do Trabalho Experimental coerente com a perspectiva de trabalho científico nomeadamente o uso de situações problemáticas com diferentes graus de abertura, integrando percursos de pesquisa. Também Martins e Veiga (1999) se referem à necessidade de planificar as actividades experimentais a partir do tratamento de situações problemáticas abertas, susceptíveis de mobilizarem os alunos para o desenvolvimento de um plano experimental coerente e não indicado pelo professor (pp 40). Garcia Barros et al (1995), consideram que a educação científica não deve limitar-se a introduzir leis e teorias mas deve também aproximar os alunos do trabalho científico, entendido este não apenas como actividades práticas tradicionais, assimiladas geralmente ao trabalho de laboratório. Citando Driver, 1989, Hodson, 1992, Tobin, 1990 e Woolnough, 1991, Garcia Barros et al (1995) referem que actualmente a investigação especializada propõe uma alteração ao tratamento do trabalho prático que o torne mais coerente com a própria epistemologia da ciência e com a visão construtivista da aprendizagem. Esta concepção de Trabalho Experimental que tem vindo a ser apresentada insere-se no âmbito da Resolução de Problemas. Mas nem todo o Trabalho Experimental constitui actividade de Resolução de Problemas. Entre outros autores, Vinas et Lozano (1994) referem-se a outros formatos de Trabalho Experimental que designam por:  experiências (experiências qualitativas, breves e directas, cuja finalidade é proporcionar conhecimento tácito de fenómenos a fim de possibilitar a posterior compreensão de conceitos abstractos, ou ainda ilustrar conceitos teóricos já introduzidos para os tornar significativos);  experiências ilustrativas8 (actividades mais complexas e menos directas que as experiências, que podem ser qualitativas ou quantitativas e requerem controle de variáveis). 7 A referência à sobreutilização surge tendo em conta muitos países, como por exemplo Inglaterra, em que se utiliza muito o trabalho experimental 8 Os autores designam-nas por “experimentos ilustrativos”
  • 42. 42 Quer as experiências quer as experiências ilustrativas podem constituir demonstrações feitas pelo professor e em qualquer das circunstâncias estas actividades podem desempenhar um papel importante para a construção dos conceitos mas, para que tal aconteça, há que estimular os alunos mediante perguntas adequadas para fazer emergir as suas concepções a fim de as explorar, desenvolver e modificar. Isso implica, por um lado a exploração do aspecto qualitativo, muitas vezes subestimado e, por outro, uma adequação das actividades, onde importa dar ênfase à previsão-observação-explicação. Gunstone et al (1988), citados por Hodson (1994) e Gunstone (1991), citado por Viñas e Lozano (1994), dão muita importância a estas tarefas de previsão-observação-explicação- tarefas de Gunstone- que para além do desenvolvimento do conhecimento processual, poderão favorecer a criação de conflitos cognitivos e contribuir para uma mudança conceptual. Do que foi referido ressalta que o TE deve ser pensado mais em qualidade do que em quantidade. A este propósito, Hodson (1994) refere que grande parte do TE convencional contribui para distrair os alunos dos conceitos importantes, podendo dificultar a aquisição e o desenvolvimento dos conceitos. Daí que o autor proponha “menos prática e mais reflexão” (pp306). É pois importante que a selecção de actividades experimentais tenha em conta alguns critérios, nomeadamente:  que não criem “ruído” (o que acontece muitas vezes com experiências muito sofisticadas, de difícil montagem ou acompanhadas de um protocolo que não foi precedido de reflexão por parte dos alunos)  que permitam o desenvolvimento dos conhecimentos conceptual, processual e atitudinal. Tendo em conta o que acaba de ser referido, vão ser apresentadas algumas actividades experimentais, cujo mérito residirá essencialmente na reflexão que podem proporcionar. Actividade 1 Esta actividade, proposta a alunos de 10ºano inclui-se ( constitui a ficha 6) num dos momentos da planificação para a unidade 29 a apresentar pormenorizadamente no capítulo 8. De actividades devem ter sido propostas aos alunos anteriormente, deverá surgir a necessidade de explorar um pouco mais a relação entre as grandezas I e V. Serão fornecidas aos alunos, para análise, tabelas e/ou gráficos com dados sobre a 9 Unidade 2- Transferência e conversão de energia num circuito eléctrico percorrido por uma corrente em regime estacionário”
  • 43. 43 variação I = I(V) para condutores óhmicos e não óhmicos. De seguida ser-lhes-á proposta uma questão, para resolverem através de uma actividade experimental. A “resistência que te é fornecida será um condutor óhmico? 1-Planeia uma experiência que permita responder à questão levantada; discute o planeamento com os colegas e com a professora 2-Executa a experiência planeada, solicitando o material de que necessites 3- Mede, com um ohmímetro a resistência da “resistência” de carvão 4-Usa, para a resistência que te é fornecida, a informação contida no teu livro sobre o código de cores 5- Propõe uma resposta para a questão levantada no início Actividade 2 Esta actividade, posterior à actividade 1, destina-se também a alunos de 10º ano e inclui-se ainda num dos momentos da mesma planificação 2 ( constitui a ficha 7), a apresentar no capítulo 8. Começa por ler as informações contidas no casquilho da lâmpada que te é fornecida? Qual será o significado dessas informações? Debate com os teus colegas antes de se proceder a um debate alargado na turma. Supõe agora que realizavas a seguinte experiência: 1-Calcular, por via experimental, a resistência da lâmpada fornecida tendo em conta a relação R = V/I 2-Medir a resistência da lâmpada com um ohmímetro. 3-Calcular a resistência da lâmpada tendo em conta as indicações do fabricante 4-Comparar os valores obtidos em 1,2,3 Prevê os resultados que deves obter, fundamentando Realiza experiência e confronta os resultados com as previsões Formula questões que te tenham surgido pós a realização desta actividade Nestas duas actividades emergem conceitos referidos ao longo deste livro; assim na 1ª actividade é proposta uma actividade investigativa, enquanto que na 2ª actividade se utiliza a sequência “Prever- observar- explicar”. O confronto dos resultados destas actividades tem-se mostrado estimulante para os alunos, pois enquanto que na actividade 1 os valores obtidos são razoavelmente concordantes, na actividade 2 o valor obtido com o ohmímetro é muito
  • 44. 44 inferior aos outros dois. Isto levará os alunos a formular questões cuja exploração (a fazer no capítulo 8), é potencialmente muito rica quer do ponto de vista conceptual, quer processual e atitudinal. Actividade 3 Esta actividade pode ser proposta a alunos de 9º ano no âmbito do estudo da unidade “Produção e Consumo de Energia”. O professor poderá levar para a aula uma cafeteira eléctrica das que têm revestimento metálico. Com os alunos deverá começar por levantar questões Como é aquecida a água ? Por que razão a resistência está no fundo? Por que razão a asa não é em metal? Por que razão é polida a cafeteira? O que acontece à energia “fornecida” pela resistência eléctrica ? Como podemos calcular essa energia? Como podemos calcular a energia transferida para a água? Depois de um debate seguido de exposição por parte do professor, será proposta a seguinte actividade experimental: Dispões de um vaso metálico, um cronómetro, uma resistência de aquecimento de potência 300 W e um termómetro. 1ª Parte 1-Planeia uma experiência que permita calcular a energia transformada na resistência, que não foi aproveitada para o aquecimento da água. Discute o planeamento com os colegas e com a professora 2-Executa a experiência planeada 3- Interpreta os resultados obtidos 2ª Parte Como poderias proceder de modo a aumentar a fracção de energia aproveitada para o aquecimento da água? 3ª Parte10 Após o debate que se seguiu à questão colocada na 2ª parte: 1-Realiza novamente a experiência planeada na 1ª parte, mas usando desta vez um calorímetro. 2-Comenta os resultados obtidos ao longo de toda a actividade. 3-Indica sugestões que poderiam ser dadas aos construtores de cafeteiras eléctricas, para aumentarem a “eficácia” das mesmas. 10 A actividade proposta nesta 3ª parte só será apresentada aos alunos, após a conclusão da 1ªe da 2ª parte
  • 45. 45 Esta actividade muito simples, enquadrada numa perspectiva CTS, permite desenvolver uma série de conceitos (convexão, condução, radiação, potência, energia, calor, temperatura, conservação e degradação de energia) e uma série de capacidades e atitudes numa perspectiva de educação para a cidadania. Actividade 4 A experiência que descrevo a seguir é, em meu entender, uma experiência interessante, numa perspectiva CTS, a propor no 10 º ano, na unidade 2, e que poderá ajudar os alunos a consolidar os conceitos de potência eléctrica e potência térmica. É realizada com uma “resistência” de aquecimento, daquelas que muitas vezes usamos em casa para aquecer água, e que têm indicadas a potência e a tensão a que funciona Observa a resistência de aquecimento que te é fornecida 1-Identifica características da mesma 2-Planeia uma experiência que te permita verificar se a respectiva potência motora é a indicada pelo fabricante 3-Planeia ainda uma experiência que te permita calcular a sua potência térmica. 4-Prevê, fundamentando, se deve existir alguma relação entre os valores da potência obtidos em 2 e 3 5-Observa a experiência a realizar pela professora ; recolhe, organiza e trata os dados Esta experiência não deve ser realizada pelos alunos porque o circuito inclui uma tomada e, se não houver cuidado, os terminais da ficha da resistência de aquecimento, podem ficar “ a descoberto”. Os alunos devem propor a medição de V e I para medir a potência motora. Se na escola houver um wattímetro, a medição de P= VI será feita directamente no aparelho e nesse caso será interessante que os alunos reflictam nas ligações a fazer para o intercalar no circuito. Caso não haja wattímetro, será montado, sempre em interacção com os alunos, um circuito de modo a poder medir V e I. Dado que não estão habituados a intercalar num circuito, dispositivos como o proposto, os alunos têm evidenciado alguma dificuldade em fazer sugestões, pelo que se requer uma grande interacção com eles. Curiosamente emerge, por vezes, a concepção errónea de que dentro do cabo da resistência de aquecimento existe um só fio. Os alunos devem também propor a medição de R com um ohmímetro para calcular P = RI2, tal como devem fazer previsões relativamente à relação entre os valores das duas potências. Acontece que geralmente o valor obtido para a potência térmica é ligeiramente diferente do obtido para a potência eléctrica, o que levará a um debate muito interessante com os alunos, que deverão propor razões para a discrepância observada.
  • 46. 46 Actividade 5 Ainda numa perspectiva CTS, a actividade que aqui se descreve, poderá ser utilizada no 8º ano, na unidade “Nós e o mundo material”, para introduzir e/ou aplicar conceitos. Apresentar-se-ão vários rótulos de embalagens de leite e pedir-se-á aos alunos que formulem questões. (Incluir figura) Algumas das questões que importa fazer emergir são:  Porque razão são diferentes as informações contidas nos diferentes rótulos?  Será que a soma das massas dos constituintes referidos em cada rótulo, pode corresponder à massa de leite contido na respectiva embalagem? Colocadas estas questões deve surgir outra:  Que outros constituintes terá então o leite?
  • 47. 47 A primeira questão permite explorar (introduzir ou revisitar) os conceitos de substância, mistura, solução, soluto, solvente, concentração em massa. A segunda e a terceira questões permitirão explorar, para além dos conceitos anteriormente referidos, processos físicos de separação, particularmente a destilação. A terceira questão e o debate que se lhe deve seguir, deverão conduzir às actividades experimentais A51 e A52, seguintes: A51 Planeia uma experiência que permita calcular a massa de água contida num dos pacotes de leite a que se referem os rótulos. Realiza a actividade planeada após discussão no grupo e com a professora Confronta os resultados obtidos pelo teu grupo , com os obtidos pelos colegas 11 A52 Planeia uma experiência que te permita verificar que o leite contem água. Realiza a actividade planeada após discussão no grupo e com a professora. Confronta os resultados obtidos pelo teu grupo , com os obtidos pelos colegas Estas actividades, para além de contribuírem para a construção/reconstrução de conceitos, deverão levar ao desenvolvimento de conhecimento processual. Assim, para além de planear experiências os alunos deverão interpretar informação, formular questões ( por ex: Poderemos considerar que no leite apenas existem a água e os constituintes referidos nos rótulos ?), propor explicações, medir, executar, analisar resultados. Relativamente a A51, espera-se que os alunos planeiem a medição da massa da embalagem cheia e vazia ( para isso o professor deverá levar embalagens já vazias dos respectivos “leites” para além de uma embalagem cheia de cada um). Relativamente a A52, o professor deverá ir colocando questões aos alunos, que os ajudarão a fazer o planeamento. Algumas dessas questões poderão ser: Como explicar que no testo de uma panela, por exemplo com sopa, se formem gotículas líquidas transparentes? Em alguns países a água doce é obtida a partir da água do mar; como se poderá proceder? Concluída toda a actividade poderão ainda consolidar-se os conceitos de densidade, ponto de ebulição, substância e mistura, explorando questões tais como: Terá sentido falar genericamente em densidade do leite? Porque razão os outros constituintes do leite, para além da água, não “apareceram” no destilado? Actividade 6 Grande parte das escolas têm hoje marcadores electromagnéticos, fundamentalmente para estudo de movimentos e transformações de energia 11 Cada grupo deverá fazer o estudo de um dos “leites” em causa
  • 48. 48 mecânica. Mais importante que a utilização do equipamento (que obviamente tem que ser utilizado pelo menos uma vez pelos alunos para perceberem como se obtêm as fitas marcadas), é a interpretação das fitas, pelo que se os alunos já tiverem usado o equipamento, o professor pode realizar previamente as experiências, fotocopiar as fitas obtidas e propor aos alunos a sua interpretação. É precisamente isso que se descreve nesta actividade Nesta actividade vais reflectir sobre uma experiência realizada com uma montagem que já utilizaste em experiências anteriores 6V ~ e M h B a b calha F B F-fita M-marcador h- haste e-elástico B-bases de suportes 1ª Parte Supõe que realizavas a seguinte experiência 1-Utilizando a montagem, segurar com fita cola, no carrinho, cerca de 70 cm de fita com a face mais clara voltada para cima; 2-Fazer passar a fita entre a e b , no marcador; 3-Fazer na calha uma marca que identifique a posição inicial do elástico; 4-Colocar o carrinho encostado ao parafuso e fazer passar pela haste, h, o elástico (marcar na calha a posição do ponto do elástico mais afastado das bases B). Segurar o carrinho para evitar que se desloque; 4-Ligar a caixa de alimentação e simultaneamente largar o carrinho; 5- Imobilizar o carrinho quando se estiver a aproximar do fim da calha, para evitar que caia; desligar então a caixa de alimentação; Prevê qual deve ser o aspecto da fita depois de marcada nas condições da experiência, fundamentando as previsões Observa a fita obtida12 e confronta os resultados com as previsões (incluir desenho) início fim Propõe uma explicação para o aspecto da fita Propõe uma estratégia de resolução para o seguinte problema: Houve conservação da energia mecânica na transferência de energia do elástico para o carrinho? Utiliza a estratégia, depois de discutida no grupo e com a professora, na resolução do problema proposto 12 A fita só será apresentada aos alunos após terem feito previsões
  • 49. 49 Esta actividade é interessante por permitir aos alunos reflectir sobre o seu próprio pensar. Assim, na resposta ao problema, muitos alunos dizem logo que não houve conservação de energia dado que a fita mostra que o movimento a partir de dada altura é “ amortecido” . Ora a questão que lhes é proposta refere-se à eventual dissipação de energia durante a transformação de energia potencial do elástico em energia cinética do carro e não à dissipação posterior devida ao atrito com a calha. Também o aspecto da fita permite reflexões interessantes que vale a pena explorar com os alunos.  Por que razão, de início, cresce o afastamento entre as marcas?  Por que razão o afastamento entre as marcas decresce posteriormente?  Como calcular a energia cinética máxima adquirida pelo carro?  Que relação deve ter essa energia com a variação de energia potencial do elástico?  Como calcular essa variação de energia potencial? Mais do que pela realização da experiência, esta actividade vale pela reflexão que pode proporcionar. Daí que o que importa não seja realizar muitas experiências, mas realizar experiências, cuja exploração permita o desenvolvimento de conhecimentos, capacidades e atitudes. A finalizar este capítulo gostaria de referir o seguinte: Planear actividades experimentais a propor aos alunos é uma tarefa estimulante, mas que envolve algum tempo na preparação. Há no entanto, tal como já emergiu no capítulo 3, a propósito da modificação de exercícios em problemas, pequenas alterações que podemos introduzir nas nossas práticas e que não são difíceis de implementar. Trata-se, neste caso, de preceder os protocolos estereotipados, de uma reflexão por parte dos alunos, usando as tarefas de Gunstone (prevê-observa-explica), como acabou de ser ilustrado nas actividades 2 e 6 e se ilustrará novamente no capítulo 8.
  • 50. 50 A resposta à questão colocada no início deste capítulo parece óbvia, no entanto nem sempre isso acontece. Assim, e tendo em conta que no ensino-aprendizagem da Física, nas práticas lectivas vigentes, genericamente se enfatiza a aprendizagem de conceitos, seria de esperar que a classificação atribuída à resposta a uma questão colocada para avaliação, decorresse do facto de um aluno evidenciar ou não essa aprendizagem. Os exemplos 1 e 2, seguintes, mostram que nem sempre isso acontece. 1- Numa prova global foi colocado o seguinte exercício: Considere as configurações electrónicas dos átomos X ,Y,Z e W (as letras não correspondem a símbolos químicos) X: K2La2Lb6Ma1 Z: K2La2Lb6Ma2Mb6 Na1 Y: K2La2Lb6Ma2Mb5 W: K2La2Lb6Ma2Na2 Nb2 .......... 2.3-Indique, justificando, qual dos elementos X ou Y apresenta maior raio atómico 2.4- Indique, justificando, qual dos elementos X ou Z apresenta maior energia de ionização. Um determinado aluno responde correctamente á questão 2.3 e na resposta a 2.4 escreve(sic): O elemento Y pois a sua carga nuclear é superior à de X, e como o raio atómico é menor que em X a distância ao núcleo é menor, logo era necessário fornecer mais energia a um átomo Y gasoso para este perder o electrão, apesar de a sua blindagem ser superior ao do X. Não há, não duas folhas iguais em toda a criação. Ou nervura a menos, ou célula a mais, não há de certeza, duas folhas iguais(...) (...) Nas formas presentes, nos actos distantes, mesmo semelhantes são sempre diferentes(...) In “Pastoral”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa 7- Que coerência deve existir entre o que pretendemos ensinar e o que pretendemos avaliar?
  • 51. 51 Não foi atribuída qualquer cotação na resposta. É óbvio que se pedia para comparar X com Z e o aluno compara X com Y( eventualmente influenciado pela alínea anterior ). Mas importa reflectir sobre o seguinte: O que se pretendia avaliar com esta questão era essencialmente o conhecimento conceptual, dado que na matriz da prova há apenas referência a conceitos; se assim era, não deveria o aluno, dado que evidencia ter compreendido os conceitos, ter tido alguma cotação na resposta? 2-Nos critérios de classificação de uma questão, é habitual atribuir-se cotação à simples escrita de uma fórmula, podendo essa cotação atingir 20 a 25 % da cotação total. Acho que este aspecto deveria ser ponderado. A resposta dada por um aluno à questão E (ver capítulo 3): Não é possível resolver pela fórmula Ec= ½ mv2 porque não temos o volume, mostra como a simples escrita da fórmula não dá qualquer informação sobre o conhecimento conceptual do aluno. Situações de avaliação como as que acabam de ser referidas ocorrem muitas vezes pelo que deveriam ser alvo de reflexão cuidada. O problema da avaliação é um problema muito complexo, mas é indiscutível que se deve avaliar o conhecimento que se pretendeu ensinar. E se, como é desejável tendo em conta tudo o que foi referido nos capítulos anteriores, os professores devem ensinar não apenas conhecimento conceptual, deverão avaliar os alunos também nos outros domínios do conhecimento. Como fazê- lo? Em primeiro lugar elaborando um plano de avaliação que deve incluir vários meios (observação dos alunos no desempenho das tarefas de sala de aula, nomeadamente nas actividades experimentais, técnicas interrogativas, dados de auto e hetero-avaliação dos alunos, relatórios, portfolios, trabalhos de pesquisa, etc) e não quase exclusivamente os testes sumativos. Sánchez et al, 1995, referem que numa perspectiva construtivista da aprendizagem, particularmente por investigação, se devem considerar como situações de avaliação todas aquelas em que os alunos podem avaliar os seus avanços, expor as suas dificuldades e/ou necessidades a outros grupos de alunos e/ou aos professores. Mas a prática de sala de aula é, em geral, bastante diferente. Em muitas escolas secundárias é habitual haver, nos princípios de Novembro, uma primeira reunião de conselho de turma. Nessa reunião trocam-se impressões sobre a turma e é muito frequente ouvir dos professores o seguinte comentário: Quanto à avaliação ainda não tenho dados porque ainda não dei teste. Isto revela a exagerada importância atribuída aos testes sumativos. Não sendo os testes os instrumentos mais adequados para avaliar o pensamento dos alunos (Kulm, 1990), a sua utilização fica um pouco comprometida e tanto mais quanto as questões que habitualmente se colocam nos testes são geralmente meros exercícios.
  • 52. 52 Relativamente à observação no trabalho na sala de aula e aos testes sumativos, gostaria de acrescentar um pouco mais. Foi referida anteriormente a importância da observação dos alunos no desempenho das tarefas de sala de aula, nomeadamente nas actividades experimentais Essa avaliação deve ser sistematizada e a forma de a sistematizar depende de vários factores (nível etário dos alunos, capacidades ou destrezas a desenvolver, etc). A ficha anexa (figura 4) é um exemplo que poderá servir de base a uma reflexão. Figura 4- Ficha de observação e avaliação do trabalho experimental Identificação do aluno 1ª Parte13 Identificação do problema /Estratégia de resolução/ Planeamento experimental Previsão e fundamentação Análise dos resultados Resposta ao problema/conclusões 2ª parte14 Manipula correctamente o equipamento Respeita as normas de segurança Faz observações cuidadas Respeita o protocolo Regista organizadamente os dados Distribui adequadamente o tempo na realização das tarefas Utiliza e organiza adequadamente o espaço de trabalho Observações- Relatório- 13 É preenchida de forma descritiva e depende do tipo de trabalho proposto; o preenchimento da 1ª linha terá lugar se se tratar de um trabalho investigativo; o preenchimento da 2ª linha terá lugar se se tratar de uma tarefa de Gunstone; a referência a estas tarefas surgiu no capítulo 6 14 É preenchida usando uma escala de classificação (1 a 4)
  • 53. 53 Relativamente aos testes e tendo em conta algumas das considerações acima tecidas, há já alguns anos que os testes que proponho aos alunos são, por vezes, com consulta do livro, dos apontamentos que tiram nas aulas, bem como de outros elementos de que os alunos queiram dispor. Um dos objectivos é levar a que os alunos não memorizem um conjunto de fórmulas sem lhes atribuir qualquer significado. Apesar de nunca ter feito um estudo objectivo sobre esta prática, não me parece que traga malefícios para a aprendizagem dos alunos, bem antes pelo contrário. É óbvio, que as questões propostas nesse testes não podem ser de aplicação directa das fórmulas15, mas precisamente porque o não são, devem levar à avaliação de capacidades que importa desenvolver. Um teste de consulta pode ter ainda vantagens relativamente ao conhecimento atitudinal; os alunos deixam de ter a preocupação de fazer cábulas para usar clandestinamente no teste. No fim do ano lectivo 1998/1999 apresentei aos alunos, todos de 10 º ano, num total de 38 (12 de TLF e 26 de FQ) um questionário (figura 5) para saber qual a opinião que tinham sobre os testes de consulta. Os resultados, que se apresentam a seguir ao questionário, não podem, de modo algum ser generalizáveis (a amostra é muito pequena e o contexto em que a experiência tem decorrido é um contexto particular), mas, e insisto mais uma vez, com este livro apenas pretendo lançar pistas para reflexão. 15 No capítulo 8 serão apresentadas algumas questões que poderão ser colocadas em testes de consulta
  • 54. 54 Figura 5- Questionário colocado aos alunos sobre testes de consulta Ao longo deste ano foram propostos testes sumativos em que podias fazer consulta de livros, apontamentos, etc. Gostaria de saber a tua opinião sobre esta prática. Nesse sentido agradecia-te que respondesses ao questionário anexo. Nas questões de resposta condicionada assinala com X o rectângulo correspondente à tua resposta. Nas questões de resposta livre, deves escrever o que pensas relativamente à questão proposta. Não deves identificar-te, pois o que interessa é a opinião genérica dos alunos e não a de cada um em particular. Obrigada desde já. 1- Consideras que os testes de consulta conduzem a que os alunos: Sim Não 1.1-estudem menos porque sabem que podem utilizar os elementos de consulta durante o teste 1.2-estudem mais conscientemente pois sabem que não têm que se preocupar com a memorização 1.3-se habituem a seleccionar informação 1.4-se habituem a pesquisar 1.5-resolvam o teste com mais seriedade, sem a preocupação de copiar 1.6-estejam mais calmos durante a resolução do teste 1.7-tenham melhores resultados porque os testes são mais fáceis 1.8-tenham piores resultados porque os testes são mais difíceis 2-Concordas com testes de consulta em Físico-Químicas/TLF? Justifica tua resposta 3-Se respondeste afirmativamente à questão 2, indica, justificando, se vias vantagens em que em outras disciplinas os referidos testes fossem utilizados e, em caso afirmativo, quais seriam essas disciplinas
  • 55. 55 Tratamento das respostas ao questionário Relativamente à questão 1, o tratamento dos resultados conduziu à construção do gráfico anexo Da análise do gráfico emerge que uma maioria significativa dos alunos considera que o facto de o teste ser de consulta não conduz a que se estude menos, não afecta significativamente os resultados e conduz a que se vá mais calmo para o teste, se estude mais conscientemente, se desenvolvam as competências de seleccionar informação e pesquisar, e a atitude de resolver o teste com mais seriedade. Relativamente à questão 2, 92% dos alunos respondeu sim. Dos restantes, 4% dos alunos responderam não e 4% responderam que era indiferente. Dada a dimensão da amostra não é possível categorizar as justificações das respostas; foram no entanto “agrupadas” as de significado idêntico. Para o “sim” temos:  Vai-se mais calmo e confiante para os testes  É um bom artifício para compreender a matéria  É um bom artifício para não se copiar  A consulta motiva para a disciplina Para o não temos:  Fazem pensar que não é preciso estudar tanto  Não adianta fazer consultas durante o teste  Na prova global não há consulta  Um teste de consulta para quem não estuda é um mau teste Para a resposta indiferente há apenas uma justificação  Não tem influência na nota Relativamente à questão 3, a maior parte dos alunos indica várias disciplinas, pelo que as respostas estão assim distribuídas: Resposta à questão 1 do questionário 0 20 40 60 80 100 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.7 1.8 Questão Percentagemde respostas SIM NÂO
  • 56. 56 Ciências da Terra e da Vida 13% Nenhuma 17% Técnicas laboratoriais de Química 21% Filosofia 25% Matemática 58% Físico-Químicas16 83% Quase a terminar este capítulo gostaria de citar um episódio que vem referido no artigo "Assessing Student Growth in Mathematical Problem Solving (Lester e Kroll, 1990, pp 54) . Quando FranK Lester fazia uma comunicação para um grupo de supervisores e coordenadores curriculares de matemática, sobre a RP no ensino dessa disciplina, um dos participantes fez o seguinte comentário: "Por muito que eu goste do que está a dizer, receio que nenhuma das suas ideias tenha sucesso a não ser que os professores mudem as suas práticas avaliativas e o estado mude os seus programas de testagem". Essa necessidade de mudança é referida por muitos autores, entre eles Fernandes, (1994): A avaliação faz parte integrante do desenvolvimento do currículo e só faz real sentido se os professores a utilizarem para que o ensino e a aprendizagem sejam sistematicamente reformulados e melhorados (pp 17) Retomo o que referi no capítulo 1; considero que as mudanças institucionais dificilmente ocorrem sem pressão dos cidadãos, pelo que se queremos que o sistema mude, teremos que ser nós a mudar e a exercer pressão com vista à mudança. Estas considerações poderão ser sintetizadas numa frase: "É mais fácil que a avaliação mude o currículo do que o currículo mude a avaliação". E mudar a avaliação significa utilizar estratégias de avaliação que privilegiem várias técnicas e instrumentos e não dar ênfase quase exclusiva aos testes. Relativamente a estes será de privilegiar a colocação de problemas e não apenas a de exercícios. 16 A referência à disciplina de Físico-Químicas surge, obviamente, apenas nos alunos de TLF
  • 57. 57
  • 58. 58 Na planificação de uma unidade didáctica, ou de uma fracção da mesma, é importante ter em conta diferentes propostas emergentes de várias linhas de investigação no ensino-aprendizagem das Ciências, nomeadamente os aspectos referidos ao longo dos capítulos anteriores. Assim, para cada unidade a planificar, o professor deverá fazer uma pesquisa bibliográfica sobre CA dos alunos em relação aos conceitos a explorar. A identificação dessas CA será fundamental para a selecção de actividades a incluir na planificação, tendo em vista, por exemplo, provocar conflitos cognitivos. Será também importante que ao seleccionar as actividades o professor reflicta sobre os conhecimentos processual e atitudinal a desenvolver e a avaliar. O esquema anexo (figura 6), sem pretender ser um algoritmo a utilizar, pretende sistematizar o que foi referido. Eles não sabem que o sonho é (...) (...) passarola voadora, pára-raios, locomotiva, barco de proa festiva, alto-forno, geradora, cisão do átomo, radar, ultra-som, televisão, Desembarque em foguetão na superfície lunar.(...) In “ Pedra Filosofal”, Poesias Completas de António Gedeão, 1968, Portugália Editora, Lisboa 8- Como construir estratégias de ensino-aprendizagem ?
  • 59. 59 Figura 6- Aspectos que devem ser tidos em conta ao elaborar uma planificação 1-Identificação de conteúdos 2-Identifcação de conhecimento conceptual a construir/ reconstruir. Nível de desenvolvimento Programas Oficiais Conteúdos disciplinares 3-Pesquisa sobre concepções alternativas dos alunos Desenvolvimento cognitivo e aprendizagem 4-Selecção do conhecimento processual e atitudinal a desenvolver Referentes teóricos Concepções alternativas 5-Escolha de estratégias Perspectiva CTS 6-Estratégia centrada na resolução de problemas Resolução de problemas 7-Escolha de uma situação física que permita criar contextos problemáticos Avaliação História e Filosofia das Ciências Apresentarei agora uma planificação construída tendo por base o anteriormente referido e em que as estratégias utilizadas assentaram num modelo proposto por Lopes(1994). De acordo com o modelo de Lopes (1994), todo o processo na sala de aula deve ser iniciado por exploração e problematização a partir de situações problemáticas, trazidas do exterior, do conhecimento e do agrado dos alunos. A partir das referidas situações irão ser criados contextos problemáticos que originarão uma rede de problemas e actividades. O ambiente criado deverá envolver os alunos e, consequentemente, propiciar o crescimento progressivo do conhecimento conceptual e o desenvolvimento de capacidades. Entende-se precisamente por contexto problemático um ambiente de ensino aprendizagem criado na sala de aula, a partir de situações problemáticas, que podem ser notícias, objectos, filmes, etc. cuja exploração originará uma rede de problemas e Comment [M1]:
  • 60. 60 questões que vão permitir um envolvimento dos alunos. Pretende-se que este ambiente favoreça o crescimento do conhecimento (conceptual, processual e atitudinal). Descrição pormenorizada de uma estratégia utilizada para o estudo da corrente eléctrica no 10º ano Na planificação que vou apresentar, relativa à unidade “Corrente eléctrica” de 10 ºano, foram criados quatro contextos problemáticos. Começou-se por apresentar um diaporama aos alunos que conduziu a um debate onde emergiram entre outros aspectos, a importância da energia eléctrica e alguns dados relativos à evolução histórica. A exploração deste contexto (contexto 1) fez emergir as regras de segurança, que por sua vez fez emergir o uso do busca-pólos e o risco de se ligarem vários electrodomésticos a uma mesma tomada. Surgiram então dois contextos um centrado no problema “ Como funciona um busca-pólos? “(Contexto 2) e o outro no problema “ Por que razão é perigoso ligar vários electrodomésticos a uma mesma tomada?” (Contexto 3). Após a exploração destes contextos surgiu um quarto centrado no problema “O que acontece quando um receptor não é puramente resistivo?” (contexto 4). A exploração destes contextos permitiu construir/reconstruir todos os conceitos propostos no programa. Apenas será descrita em pormenor a planificação relativa ao contexto criado pelo problema “Como funciona um busca-pólos?”17 Antes de apresentar a estratégia, gostaria de referir como surgiu a ideia da utilização do busca-pólos. Em 1994/1995 uma professora estagiária, após ter dado um aula ao 8º ano entrou no gabinete de estágio, onde me encontrava com mais dois estagiários, uma jovem da Licenciatura em Química e um jovem da Licenciatura em Física, e disse: Uma aluna perguntou-me como funciona um busca-pólos, mas eu não soube responder. Nem soube a professora, nem nenhum de nós. Resolvemos então desmontar um busca-pólos e apercebemo-nos como a partir do estudo do seu funcionamento muitos conceitos poderiam ser explorados. Foi assim que surgiu a ideia de construir a estratégia que se passa a descrever18.  Quando se pergunta aos alunos como funciona um busca-pólos, geralmente eles referem a utilização prática, mas poucos têm “coragem” de o utilizar numa tomada. Acresce ainda, que alguns dos “corajosos”, quando vão utilizá-lo, têm a preocupação de apenas tocar na parte plástica do 17 São incluídas , no fim da planificação, as fichas de trabalho apresentadas aos alunos 18 A primeira estratégia criada a partir do busca-pólos, descrita em Gouveia (1995) foi implementada na disciplina de TLF, bloco III; posteriormente sofreu várias alterações
  • 61. 61 invólucro. Quando o professor ou algum aluno se propõe a utilizá-lo de forma correcta levantam-se logo vozes interrogativas: “E não vão apanhar um choque ?”  Após a utilização pede-se então aos alunos que prevejam como será constituído (ainda antes de o desmontar). Geralmente é referida uma lâmpada e pouco mais. De seguida distribui-se a cada grupo de trabalho um busca-pólos desmontável e pede-se aos alunos que o desmontem e proponham agora uma nova explicação para o seu funcionamento.  Quando desmontado, em cima da mesa ficam uma mola, um parafuso, um tubo de descarga e um corpo cilíndrico acastanhado (nos busca-pólos que utilizo, a resistência de carvão não apresenta código de cores mas este aspecto) e os alunos começam a propor explicações, que geralmente são as seguintes: Há uma bobina (a mola), uma lâmpada (o tubo de descarga) e um íman (a resistência). É-lhes proposto planear uma experiência para testar o “íman”. Geralmente os alunos aproximam-no de clips e concluem que não deve ser íman.  Seguir-se- á agora um debate em que os alunos acabam por concluir que todos aqueles corpos têm que ser condutores e por isso oferecerão resistência à passagem da corrente. Surgem então as seguintes previsões quanto à resistência: a bobina deve ter uma resistência muito grande para deixar passar pouca corrente e não apanharmos um choque, o resto deve ter uma pequena resistência. Com um ohmímetro os alunos irão verificar que as suas previsões estão erradas.  Ao verificarem que a resistência do “cilindro” é muito elevada querem saber como é constituído e ao constatarem que o alcance do ohmímetro não permite medir a resistência da lâmpada os alunos observam-na mais atentamente e geralmente referem que está fundida dados que os dois eléctrodos no tubo de descarga estão afastados. É- lhes então proposto que testem esta previsão. Os alunos vão novamente montar o busca-pólos e quase invariavelmente perguntam: “ É importante a ordem porque se montam as peças? È que já não me lembro como estavam.19 Como resposta é- lhes dito para montarem como entenderem (mais tarde ser- lhes-á proposta uma tarefa com base nesta questão- ficha 5 em anexo). Após a 19 Aqui emerge nitidamente a CA subjacente a F2, capítulo 4
  • 62. 62 montagem os alunos vêem, com algum espanto que a lâmpada acende e querem saber como aquela lâmpada funciona. A exploração de algumas das questões que foram surgindo vai levar a uma série de actividades (fichas 1,2,3) que permitirão explorar conceitos como: condução nos metais (mola e parafuso), nos semicondutores (a partir da resistência de carvão), nos gases (a partir do tubo de descarga)20 e nos electrólitos (a partir da condução pelo corpo humano)21.  O facto de o busca-pólos acender quando se encosta à “fase” da tomada mas não quando se encosta ao “neutro” permitirá explorar o conceito de diferença de potencial. O uso de uma tomada de ca, levará a uma breve distinção entre corrente alterna e contínua (ficha 4) e aos conceitos de corrente estacionária e intensidade da corrente. A actividade proposta na ficha 5, servirá para introduzir a lei de Pouillet. O debate que se lhe seguirá deverá ajudar os alunos a compreender a diferença entre intensidade da corrente (que se conserva ao longo do circuito) e energia eléctrica que “diminui” ao transformar-se no circuito.  Da actividade proposta na ficha 3 surgirá a necessidade de explorar um pouco mais a relação entre as grandezas I e V. Serão fornecidas aos alunos tabelas e/ou gráficos com dados sobre a variação I = I(V) para condutores óhmicos e não óhmicos. Poderá fornecer-se aos alunos uma resistência de carvão e pedir- lhes o planeamento de uma experiência que permita concluir se essa resistência se comporta ou não como condutor óhmico. Realizada a experiência e tratados os dados obtidos, os alunos deverão confrontar o valor obtido para o cociente V/I com o valor de R, lido com base na interpretação do código de cores e com o valor medido com o ohmímetro (esta actividade foi apresentada como actividade 1, no capítulo 6). Será altura de explorar o significado da razão R = V/I e do significado de R = V/I = constante.  A referência à condição “a temperatura constante” necessária ao estabelecimento correcto da lei de Ohm, emergirá conjuntamente das actividade 6 e 7 (estas actividade foram apresentadas como actividades 1 e 2, no capítulo 6). A análise dos resultados conjuntos destas actividades levará a uma primeira abordagem do conceito de resistividade, da sua variação com a 20 Se possível, o professor deverá fazer aqui uma demonstração experimental usando a bobina de Runkorff e experiências sobre descargas em gases rarefeitos 21 Não são sugeridas aqui actividades experimentais porque foi feita a transferência para as realizadas sobre condução eléctrica em soluções aquosas de ácidos bases e sais, quando do estudo das reacções ácido-base, na Química