1) O documento discute histeria e atuação corporal e gozo, especificamente no caso de uma paciente que se envolve em atos de risco como uso de drogas e relações sexuais.
2) A paciente questiona seu lugar no trabalho e nas relações, e se autolesa através de cortes no corpo.
3) O tratamento pode ajudá-la a reapropriar-se de sua condição desejante através das atuações, por mais problemáticas que sejam.
CURSO CLÍNICA PSICANALÍTICA 2012 - Aula 4 - Histeria e atuação: corpo e gozo
1. Clínica Psicanalítica:
manejo e subjetivações na contemporaneidade
Tema:
Histeria e atuação: corpo e gozo
ALEXANDRE
SIMÕES
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2. De início, as primeiras histéricas
escutadas por Freud mantinham um
aparente distanciamento das atuações
3. Elas exibiam um
mal-estar que, em
boa medida, era
veiculado pelo
sintoma clássico da
histeria:
o sintoma conversivo
5. Mas, havia a ideia de que enquanto uma
histérica falasse do seu sofrimento, ela
não atuaria
O sintoma
histérico na
sua
perspectiva
conversiva
era zeloso
quanto ao
corpo
6. Tanto que no caso de uma
convulsão histérica havia um
imaginário que, em certa
medida, guiava a clínica:
se os desmaios e convulsões trouxessem
um sério risco à integridade do
corpo, estaríamos diante de uma
epilepsia.
Se o desmaio - seguido ou não de
convulsões - não implicasse em danos
ao corpo, estaríamos nas águas da
7. O que esta fórmula - de
alcance duvidoso - acaba
por mostrar é precisamente
a forma como o corpo estava
apropriado na histeria:
tratava-se ali de um corpo erótico, envolvido pela lógica
libidinal;
8. A partir principalmente do caso da jovem homossexual
(“Sobre a psicogênese de um caso de homossexualidade feminina”, de 1920), o
modelo clínico da histeria começa a passar, em Freud, por
uma transição
Trata-se de uma jovem que, em um dado
momento, joga-se de uma ponte sobre os trilhos
do trem
9. O tratamento psicanalítico foi iniciado seis meses
após esse acontecimento. A adolescente já se
encontrava refeita dos seus ferimentos – estes
foram muito sérios, mas não deixaram sequelas
físicas.
10. Essa atitude da jovem paciente de
Freud foi considerada mais do que
uma simples encenação:
foi tomada por Freud como uma
autêntica tentativa de suicídio
11. Temos, pois:
Um corpo
tocado
pelo
sintoma
Um corpo que se
deixa cair
12. Um pouco mais do que
isto, na atualidade:
Um corpo tocado
pelo sintoma
Um corpo que se deixa
cair, rasgar, abrir, transformar.
13. Como o mal-estar se
inscreve, hoje, no corpo do
sujeito histérico?
14. Fragmento clínico:
Há alguns anos, recebi em meu consultório uma
jovem na faixa dos 27 anos de idade, muito vivaz
e de inteligência bem afinada.
Nascida no interior do Estado, ela vai para a
capital completar o segundo grau e dar ingresso à
vida universitária. Em Belo Horizonte, foi
acolhida pela tia (uma executiva bem
sucedida, solteira e sem filhos) e assim realizou
seus estudos, desfrutando das melhores
condições materiais que podia obter na época.
Ao lado dos estudos, destacou-se como
nadadora, chegando a ganhar alguns torneios e
, em alguns momentos, foi uma praticante de
triathlon.
15. Via-se como uma jovem aplicada em
seus estudos e com uma vida bastante
saudável.
A sua trilha universitária iniciou-se em
meio a um desagrado. O seu curso
superior foi, segundo ela, decidido pela
tia. A tia preocupava-se muito com a
futura inserção profissional de sua
sobrinha e a conduziu a se decidir por
fazer o mesmo curso realizado
anteriormente por ela (a própria tia) e
que tinha relação direta com a sua área
de atuação.
Esperava-se, assim, que
a sobrinha desse
continuidade à carreira
da tia.
16. Aqui, há um detalhe acerca do vínculo bastante estreito
entre esta menina e a sua tia. A relação da paciente com a
sua mãe era extremamente tensa, desde os anos iniciais
da infância. A mãe surgia como uma mulher descuidada
acerca da maternidade e, adicionado a isto o uso de
álcool, não se mostrava em condições de cuidar da filha.
Neste cenário, é desde bem cedo que esta tia ocupará um
lugar de referência para a paciente: uma referência
feminina transversalizada por uma atitude fálica.
Esta referência não era feita sem se acompanhar da
indicação do desmerecimento da progenitora em ser mãe.
17. A paciente se forma na área de atuação almejada pela
tia e dá início às suas atividades profissionais.
Porém, nos locais em que ela atuou, rapidamente se
embaralhou em dificuldades de relacionamento com
alguns colegas e também com os gestores, aliadas a
um questionamento político que ela fazia de sua
atuação e da lógica do mercado que acabava
influenciando diretamente sua atuação profissional.
18. Não tardou o aparecimento de questionamentos
cada vez mais inviáveis acerca de sua carreira e
a manifestação de uma grande infelicidade
quanto à sua profissão.
A permanência em Belo Horizonte e na atuação
direta da profissão tornaram-se inviáveis e a
paciente voltou para sua cidade, vindo a exercer
um cargo burocrático junto à Prefeitura.
Na sua nova atuação profissional, não cessava
de considerar os gestores e seus chefes
imediatos como pessoas sem inteligência e
como legítimos burocratas de plantão. Neste
cenário, ela se via desperdiçada em suas
qualidades.
19. Nos últimos anos, com o retorno
para a sua cidade natal, esta
paciente começa a notar algo que até
então não fazia parte de sua vida:
um conjunto amplo de atuações com sérias
repercussões para sua integridade física e saúde.
Ao lado disso, havia também diversas exposições
de caráter erótico que, em alguma medida,
tornavam melindroso o lugar desta paciente em
meio às suas relações sociais e profissionais.
20. Um encontro bastante intenso com
vários tipos de drogas associou-se ao
uso de álcool. Tornou-se cada vez mais
frequente estes usos se darem em meio
a uma atmosfera boêmia: a paciente
passava muitas noites seguidas em
bares, chegando em casa de dia.
Em alguns momentos, após diversas aventuras sexuais
(tanto hetero quanto homoeróticas, algumas delas
arriscadas), era tomada de forte culpabilidade. Era
sobretudo nestas ocasiões que a paciente punha-se a cortar
seu corpo insistentemente com um estilete. Ao lado
disso, ela realizava um intenso uso de medicamentos
vindo, mais de uma vez, a ser encontrada desacordada após
a associação fármaco-álcool.
21. Em mais de uma ocasião, seja na vida
profissional ou na trajetória boêmia, esta pessoa
„qual é o meu
portava a indagação:
lugar?‟, „o que sou para o
Outro?‟
22. O que, em termos de condução do
tratamento, pode nos conduzir a indagar se as
atuações - por mais problemáticas que
possam ser - não possibilitam a este sujeito
um chamado:
reapropriar-se de sua
condição desejante
23. Prosseguiremos com o tema:
07/05: Adolescência e transgressão: o supereu imperativo
Até lá!
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