Este documento descreve uma sentença judicial que extingue uma execução fiscal movida pelo Estado de Rondônia contra Roberto Eduardo Sobrinho. A sentença acolheu a exceção de pré-executividade do réu sob a alegação de que o Tribunal de Contas Estadual não tinha competência para julgar as contas de gestão do réu como prefeito, de acordo com decisão do STF. Assim, o título executivo era nulo e a execução fiscal foi extinta. O réu também teve valor penhorado restituído.
Execução fiscal extinta por incompetência do TCE para julgar contas de prefeito
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça de Rondônia
1ª Vara de Execuções Fiscais e Cartas Precatórias Cíveis da Comarca de Porto Velho
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Processo nº: 7048130-51.2016.8.22.0001
Classe: EXECUÇÃO FISCAL (1116)
EXEQUENTE: ESTADO DE RONDÔNIA
EXECUTADO: ROBERTO EDUARDO SOBRINHO
SENTENÇA
Vistos, etc.,
ROBERTO EDUARDO SOBRINHO apresenta exceção de pré-executividade em
face da Fazenda Pública do Estado de Rondônia, sob alegação de ineficácia do título
executivo.
Em síntese, sustenta que o Tribunal de Contas Estadual não possui competência
para julgar as contas de prefeitos, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal
nos Temas n. 835 e 157 de Repercussão Geral.
Aduz que tal competência é exclusiva da Câmara Municipal, de modo que o TCE
deveria atuar como órgão auxiliar e iniciador do procedimento de análise das
contas.
Aponta a existência de precedentes do STF nesse sentido.
Por sua vez, a Fazenda Pública argumenta que a multa sancionatória foi aplicada em
decorrência da apuração de irregularidades em processos de licitação e fiscalização
e não da tomada de contas anuais do Excipiente como prefeito.
Afirma que não há como aplicar o entendimento do STF no caso em exame pois: 1)
não se está diante de julgamento de contas anuais de prefeito; 2) os casos
paradigmas não dizem respeito a aplicação de multa pelas Cortes de Contas, mas
apenas aos casos de julgamento de contas anuais para o fim específico da
inelegibilidade prevista na Lei da Ficha Limpa (LC n. 135/2010); e 3) o paradigma
invocado teve como base a interpretação do art. 71, inciso I, da Constituição
Federal.
A execução fiscal foi ajuizada em 15/09/2016 para cobrança dos débitos não
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tributários relativos à condenação de multa pecuniária aplicada pelo Tribunal de
Contas Estadual, descritos nas Certidões de Dívida Ativa de números
20120200023545, 20120200023546, 20130200115186, 20130200115188,
20130200115189, 20130200115190, 20130200115191, 20140200068796,
20140200103127, 20140200274905, 20140200274910, 20140200274915,
20150200200835, 20150205824630, 20150205846073 e 20150205869988.
É o breve relatório. Decido.
A exceção de pré-executividade constitui instrumento adequado à arguição de
matérias de ordem pública, desde não haja necessidade de dilação probatória, como
no caso dos autos.
Inicialmente, para facilitar a elucidação da matéria, faz-se necessário a abordagem
dos conceitos de “contas de governo” e “contas de gestão”.
As chamadas contas de governo são prestadas anualmente pelo Chefe do Poder
Executivo e visam demonstrar as atividades financeiras da administração pública do
ente federado pelo qual é responsável no exercício financeiro a que se referem.
Elas evidenciam os resultados daquela gestão e tem como foco a avaliação de forma
ampla, de modo que os aspectos formais da gestão ficam em segundo plano. Por
consequência, seu julgamento está sujeito a apreciação de cunho político,
aplicando-se os critérios da conveniência e oportunidade.
Na referida hipótese, o Tribunal de Contas age como órgão auxiliar, elaborando
parecer prévio da conta, para subsidiar e dar elementos à decisão do Poder
Legislativo, conforme estabelece o art. 71, inciso I, da Constituição Federal:
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será
exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual
compete:
I – apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da
República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em
sessenta dias a contar de seu recebimento; [g. n.]
De outra forma, as contas de gestão, também chamadas de contas dos ordenadores
de despesa, referem-se à aplicação de recursos públicos praticados por aqueles que
foram responsáveis por geri-los, observando-se parâmetros como a legalidade,
legitimidade e economicidade dos atos praticados; regularidade e conformidade de
procedimentos, além de identificar possíveis lesões ao patrimônio público e atos de
improbidade administrativa.
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O que acontece em muitos casos é que os Chefes do Poder Executivo atuam tanto
na condição de administradores dos recursos públicos, praticando atos de gestão
financeira, quanto no papel de ordenadores de despesas.
Pois bem. Nos termos do inciso II, do art. 71 da Constituição Federal, aplicado aos
Municípios em virtude da regra de simetria prevista no caput art. 75, as contas de
gestão submetem-se ao julgamento das Cortes de Contas Estaduais, as quais pode
aplicar sanções, caso se constate irregularidade, in verbis:
Art. 71.: […]
II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por
dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta,
incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder
Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda,
extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário
público;
Em outras palavras, compete ao Tribunal de Contas julgar as contas dos
administradores e demais responsáveis por bens e valores públicos da
administração direta e indireta e as contas daqueles que derem causa a perda,
extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário.
Ocorre que, no recente julgamento do RE 848.826, em sede de Repercussão Geral,
o Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos (6x5), entendeu que as contas de
Prefeito, seja de governo ou de gestão, submetem-se ao julgamento exclusivo pela
Câmara de Vereadores. Naquela oportunidade, a tese fixada foi a seguinte:
Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Ministro
Ricardo Lewandowski (Presidente), que redigirá o acórdão, fixou tese
nos seguintes termos: "Para os fins do art. 1º, inciso I, alínea "g", da
Lei Complementar 64, de 18 de maio de 1990, alterado pela Lei
Complementar 135, de 4 de junho de 2010, a apreciação das contas
de prefeitos, tanto as de governo quanto as de gestão, será
exercida pelas Câmaras Municipais, com o auxílio dos Tribunais de
Contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de
prevalecer por decisão de 2/3 dos vereadores", vencidos os Ministros
Luiz Fux e Rosa Weber. Ausentes, justificadamente, os Ministros
Cármen Lúcia e Teori Zavascki. Plenário, 17.08.2016. [g. n.]
Ao analisar os acórdãos que originam as CDAs, verifica-se que o Tribunal de Contas
Estadual apurou irregularidades nos processos licitatórios em que o Excipiente
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atuava como responsável e, por consequência, impôs sanções de multa.
Desse modo, em que pese a alegação da Fazenda Pública de que a imposição de
multa decorrente de fiscalização de atos administrativos específicos não se amolda
às teses fixadas pelo STF, o TCE-RO julgou contas de gestão do Prefeito quando
este atuava no papel de ordenador de despesas nos processos administrativos para
contratação de serviços e compras de bens.
Assim, conclui-se que o caso sub judice se encaixa nos parâmetros de incidência do
precedente colacionado pelo Excipiente. Considerando a supracitada decisão,
competia à Câmara dos Vereadores o julgamento das contas de gestão de despesas
do Excipiente, mesmo em se tratando de apuração de conduta irregular em
processo de dispensa de licitação.
Nesse cenário, diante da incompetência do TCER em apurar as irregularidades
cometida pelo Excipiente como ordenador de despesa, a extinção da execução fiscal
pela ineficácia do título executivo é medida que se impõe.
Oportuno ressaltar que a existência de precedente firmado pelo Tribunal Pleno do
STF autoriza o julgamento imediato das causas que versem sobre a mesma
matéria, independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do
paradigma, bastando o a conclusão do julgamento do mérito da repercussão geral
(RCL 18412, Rel. Min. Roberto Barroso; ARE 650.574-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia;
AI 752.804-ED, Rel. Min. Dias Toffoli; AI 636.933-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa).
Por fim, sabe-se que a vedação à penhora de salário, insculpida no art. 833, IV, do
CPC, busca garantir o mínimo existencial ao devedor, como consequência do
princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III, da CRFB. A
intenção da regra é garantir um numerário mínimo que permita a subsistência digna
do executado, podendo ser afastada quando comprovado que o valor constrito não
possui natureza alimentar.
Em análise aos documentos anexados ao processo, verifico que a penhora via
Bacenjud, em 23.02.2017, recaiu sobre o vencimento recebido um dia antes, em
22.02.2017. Certo que valor constrito possui natureza alimentar, impenhorável por
força de lei, a quantia deve ser restituída ao Excipiente.
Ante o exposto, acolho a exceção de pré-executividade para julgar extinta a
execução fiscal, com fundamento no art. 924, inciso III, do CPC, em virtude da
nulidade dos acórdãos que embasam as CDAs 20120200023545, 20120200023546,
20130200115186, 20130200115188, 20130200115189, 20130200115190,
20130200115191, 20140200068796, 20140200103127, 20140200274905,
20140200274910, 20140200274915, 20150200200835, 20150205824630,
20150205846073 e 20150205869988, e determinar a imediata liberação do valor
penhorado ao Excipiente.
Em respeito ao princípio da causalidade, condeno a Fazenda Pública ao pagamento
de honorários advocatícios no percentual de 10% até o patamar de R$ 187.400,00
e 8% até o valor de R$ 1.874.000,00 sobre o valor da causa, nos termos dos
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artigos 85, §3º, I e II, c/c/ §5º do CPC.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com baixa.
P. R. I. C.
Porto Velho - RO, 4 de julho de 2017.
Fabíola Cristina Inocêncio
Juíza de Direito
(assinatura digital)
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