Este documento é uma coletânea de poemas escritos por Marco Llobus intitulada "Asas do Intento". Inclui uma introdução de Clevane Pessoa de Araújo Lopes descrevendo a trajetória do autor e analisando seus poemas, que exploram temas como infância, amor, liberdade e espiritualidade. Os poemas de Llobus usam uma linguagem simbólica e evocativa para expressar experiências pessoais e visões de mundo.
3. Asas do Intento
Poemas
Marco Llobus
1ª Edição
2012
Belo Horioznte
REDE CATITU CULTURAL
4. Llobus, Marco
Asas do Intento / Marco Llobus.
Belo Horizonte: Rede Catitu Cultural, 2010.
44 p.
1. Poesia brasileira.
1. Título.
ISBN - AINDA NÃO REGISTRADO
C Marco Llobus
Asas do Intento
Ilustração - Capa - Marco Llobus e Marcos Fabrício
1º Edição
Rede Catitu Cultural
Série - Os Azuis digitais
Revisão: Clevane Pessoa
Coordenação: Clevane Pessoa e Marco Llobus
Projeto Gráfico: Marco Llobus e Marcos Fabrício
Todos os direitos reservados.
REDE CATITU CULTURAL
2012
5. ASAS do INTENTO
Estremeci ao receber os originais da Poesia
egrégia de Marco Llobus, sob esse título. Sei da
força necessária de intentar, mas sei ainda que
alguns caminhantes do Planeta nem sabem
desse verbo. Muitos seguem intuitivamente.
Outros atribuem direções e acontecências a algo
natural e a que chamam acaso. Pensam talvez
estar assim livres da responsabilidade de ser.
Poucos os eleitos que intentam suas ações. Os
que o fazem, devem conhecer-se e atribuir a si o
necessário grau de liberdade pessoal que lhe
dará força ao intento.
Lembrei-me de que, nos Anos 80, logo após o
nascimento de meu filho caçula, escrevi e
mandei imprimir:
A liberdade de ser
É a expressão do estar,
Na expansão do saber, sendo...
Então, os poetas cujos atributos os fazem voar,
podem argamassar intentos? Sua asa diretriz
pode intentar-se? Até que ponto escrever versos
é inspiração libertária e até que ponto é direção
objetiva? Os brujos toltecas sempre afirmaram
que intentar não seria assim difícil, mas seus
requerimentos, necessidades internas, esses
podem dificultar o vôo da águia - a poiesis grega
em sentido mais que lato - isso porque o cada
6. um de si pode mesclar o pessoal com o geral ou
coletivo.
Mas conhecendo o Poeta Marco Antonio de
Melo Rodrigues, xamanicamente chamado
Llobus, com dois “elles”- aquele que sabe
aquilitar a essência numérica da criação pela
energia inegável da palavra, cujo trabalho é
derramado sobre o Outro, muitas vezes antes de
voltar a ânfora de água para matar sua própria
sede, bem sei que sim, ele é capaz da asas do
intento que nomeia este livro novo.
Ainda volto aos brujos toltecas, para lembrar
que recomendam treinar o suficiente, para
manter o foco, mas enfocar apenas o necessário
enquanto se precisa comandar um intento,
silenciar os burburinhos da mente, para
desegocentrar-se e no silêncio criativo, ouvir os
próprios ecos aos quais ninguém mais poderá
escutar, e depois desse exercício vital, ser de tal
forma livre que poderá esquecer o intento.
Parece paradoxal, mas não o é. Apenas livre de
conflitos, medos, angústias, pode-se clarificar a
claridade para ser genuinamente um poeta,
creio eu. Enquanto os outros se repetem, o
condutor de seu intento saberá direcionar suas
asas. E escrever, pensar poeticamente.
O poeta Marco Llobus designa-se, destina-se.
Não apenas tenta, mas intenta. E o verso,
desse nascedouro de palavras, sublima-se no
fervedouro em permanente ebulição. Versos
7. douro, alquimicamente.
Pelo conhecimento tradicional, intentar é a
motivação que gera a força motriz, algo de tal
forma direcionado que poderá mudar, moldar o
entorno do bardo, o real, a percepção captada ao
ser transmitida pelos que alcançarem o tipo, a
extensão do vôo. Um poeta pode ser geratriz de
acontecências? Por que não? Todos os
verdadeiros, sim. Os demais são bem capazes de
ferventar um caldo de caos ao repetir as
mesmices e metáforas óbvias.
O poeta espalha na floresta de sua vontade,
desarmadilhas. Conhece a “linguagem
inominável “burla” a brancura do Nada”, ao
clamar por esse “verbo do mundo”. É, a um
só tempo, sua caça e caçador de seu self. Esse
moço maduro, que “revive os ventos” e os
reconhece, irmãos de liberdade, quando
passam novamente, por sua presença. Não é
para qualquer um, o exercício da memória, sem
perder o foco, mas sem a prisão dos que buscam
o que não sabem ou repetem vidas inávidas,
desvividas, à semelhança do alheio, sempre. Ele
sabe. Ele vive, ele é.
Acompanho essa trajetória sem luxos, de quem,
repito, primeiro, estendeu a mão ao outro.
Diagramou livros de outrem. E somente em
2010, veio à luz seu As Dores do Indaiá nas
Memórias de Tapuia, parido há tempos no
recôndito de sua alcova mágica, aclamado por
8. quem sabe. Para ser prefaciadora deste, andei
em trajes de meditação, folheei-me ao luar,
desnudei-me para vestir intentos. E somente
então, escrevo.
Sobretudo, ASAS do INTENTO é a busca de sua
própria história, das bijoux douradas dadas à
professora ao colo da mãe, das traquinagens de
menino, ao saber que “deus castiga pior que
cinta”. Catarse e reencontro. Mineiramente, o
menino artista desenha coisas “mãe,
desenhei procê”. Não usará colares de
palavras gastas ou preciosismos. Será precioso
ao dialogar com a simplicidade da palavra sã.
Da palavra santa. Saberá extrair linhas
melódicas, sanfoneiro em madrepérola, mesmo
sem perceber, intentará arremedos de fundo do
mar, abalon, pérolas, corais. A mesma asa que o
transportou, intentado, não atentado, ao azul
absoluto, transforma-se em barbatanas
direcionais, intencionais, em guelras e o deixa
respirar nas profundezas abismais. Ele é, abre
um olhar inexistente e vê o fundo do mar, dos
rios. Registra. Ao subir e vir dar à praia de seus
sonhos, plumagens nascerão das escamas e
novas asas abrir-se-ão em leques e ventarolas.
D'aquelas “areias translúcidas”, brotarão
mais versos, por onde for, metamorfosear-se-á
de acordo com sua singularidade. Aformoseará
as faces de adolescentes com acne e será capaz
de reconstruir os diques dos castores levados
por enxurradas.
9. Esse, o poeta Marco Llobus, que acompanho em
Asas do Intento, cada baque contra o catavento,
cada segredo murmurado ao vento: alguém que
fez caso do acaso e dos nadas, tantas intenções e
tantos tudos. Linda, essa viagem em busca de
seu próprio eu, essa entrega aos demais, de
olhos marejados mas forte o suficiente para
promover tantos en/cantamentos.
Clevane Pessoa de Araújo Lopes
10. ... pois é delas o reino dos céus
Mestre Jesus de Nazaré
12. assim,
rabisquei paredes.
os rupestres de minha infância
assim...
descrevi orações
numa linguagem inominável,
a primavera do tempo
assim...
num deslize
de giz,
burlei a brancura do nada
e,
no semi-breve instante,
clamei o verbo do mundo
e me fiz
homem-menino-criança
13. pendurado em galhos,
e sujo de sangue de amora
a morada que amei.
“despendurado” pelas pontas dos dedos,
deslizei eternidades
na morada que amei.
assim,
amei,
e despejei
a minha inocência,
e
agora,
tal como anjo caído,
relembro
da morada que amei
(paraíso)
14. foi com o mindinho e o anelar
que estendi as asas e voei
foi de mindinho e anelar
e visitei o tempo
lá,
menino
ao me ver
sorri,
e abracei-me.
e num mundo das não palavras,
falei,
pelo olhar:
sana me,
perdoe me,
liberta me
foi
entre o mindinho e o anelar
que revoei o passado
e revivi os ventos por onde vim
(intentado)
15. entre nimbus, extratos e cirros
vi as imagens de são josé,
são geraldo
e benedito.
e
chamam-me,
descem escadas no ar
que guiam-me
aos céus.
brincadeiras de anjos,
barrocos anjos, de (a)penas
cabeças e asas
delírios barrocos,
do dia em que perambulei
pelas nuvens
(* neném)
* dedicado a Neném, meu priminho encantado.
16. berlineda botoque
cor azul mar
sem rodinhas
sem saber frear
e foi assim
por muito tempo.
i,
antes de bater
me jogo num pulo
o equilíbrio, só em velocidade
parado é perigoso cair
17. o cadafalso berlinda
sonoridades da araponga
fia mundo pequeno,
ruelas e linhas
pipas
memórias corriqueiras
gingando buscas
e peneira
e eu,
fosso fundo
descubro
bamburrei
a vida inteira
18. e como aranha de pernas nas costas
subi corredores
assuntando e lambrecando
as paredes sem medo,
com liberdade
pelos ombros, pés e mãos
eu subia...
aconcágua
até o teto
de um corredor
19. o meu primeiro grande amor,
foi fessora
roubei, bugigangas de mamãe
... coisas enferrujadas
e partidas
porém douradas
então,
lhe mostrei
o ouro de meu amor
20. soa sinal é recreio...
e o pátio ficou pequeno.
a velocidade das coisas gigantes
deus...
isso deve ser a liberdade
ir, rir, correr o mais que possível
do tédio das coisas
21. e ela apareceu,
um encanto
meu maioramar
na verdade não há palavras,
vê-la, me levava, lavava e me dizia leve
tudo ela
tudo era perto dela
tudo era ela.
veio de grátis
e foi assim,
um amor de anjos,
sem sexo,
e sem nada
eu passei de ano
e ela não...
nunca mais vi,
este meu amor
sem fim
22. na época do tráfico das rolimãs
nós nos agarrávamos
tapas, mordidas e unhadas
não sei ou não sabia
donde vinha tanta rinha
que deixava marcas,
desenhava territórios,
mapas
cicatrizes,
e os nossos olhos roxos
transbordavam de vida
23. rodopio numa dança sacra
o terror do deus homem
no inferno de crer
na dor daqueles medos
nada em dez anos
aos nove pecados
um inferno da boca
de quem abusa
e fusa...
... imaginações
deus castiga,
pior que cinta...
a danação de um deus, o culpado
desocupado
deus-sou-culpado
um deus carrasco
pintado e bordado
na boca dos filhos do diabo
25. uma vez, foi assim
me soltaram numa praia,
cheio de minas.
nas capixabas paraíso
e eu corria, corria, corria
singrando entre tantas e tantas tangas
e explodia
no meio das minas,
felicidades
liberdades
semi-nus
semi-breves
nas águas salgadas
das marataizes
26. foi na rua angustura,
que vesti as vestes em capa dura.
eu, um super-herói!
rompi os laços que prendiam
aquelas areias translúcidas...
janelas de meu terceiro andar
... eu?
eu vou voar!
tiraram-me a alegria,
logo após a primeira tentativa
candearam a fantasia,
um cadeado onde não tinha.
27. assombrações
saiam das torneiras,
e uma valsa de ventos
descortinava a minha fina flor da coragem
meu pé?
este,
não tocava o chão - perto da cama.
lá, logo, tão perto e abaixo de meu extrato,
a morada de todo o meu medo.
psiu!
mas é só de noite.
de dia,
com os poderes do sol, a coragem surgia
e era lá
morada e esconderijo,
fuga minha,
dos poderes achinelados
29. e janeiro caiu de água
nas praias capixabas
e maria fecha porta
e se despedia
um mundo de areia e mais nada
e exalava,
o delicioso
tédio
das damas da noite
(1979)
31. meu irmão rodrigo nunca veio
mas ganhei nandica
ela veio com tv phillips vermelha e graça...
deus é muito bom
32. levanto os mastros de almofadas e as cabanas leigas
em dengos mundos, a construção imagética de um
tapa olho:
- tragam mares revoltos... pois o capitão há
de singrar por estas feras, por estes tubarões de pés
descalços, que saltam em tom de cambalhotas...
- uma ilha distante... avisto, de meu
caleidoscópio mágico. está garantido, não aportarei
em terra vã!
- e minha bandeira hasteada é das cores que
não existem, e não há de firmar em meros
substantivos...
os tacos, o chão-mar, desenham as mil amarelinhas;
trilhas, o mapa de meu tesouro...
- ainda: que em cada vão deste cômodo, um
arquipélago será. e que cada embarcação: velhos,
puídos sofás... sofram as minhas batalhas
porém,
um dia
ascendi uma vela...
e acendi uma vela
prenunciou-se um nevoeiro...
o sofá em pira nórdica,
ardeu até acabar.
a cinta cantou alto,
muito mais pelo medo de minha possível morte,
que quase chorou
minha nau
naufragou,
sem afundar
33. de quem são estes rostos
que povoam estas lembranças
e porque estão aí?
no mais longe de mim
não sei seus nomes,
e porque estão aí?
apenas sei
que vocês estão em mim
34. a brincadeira mais séria do mundo
era o avião de papel
uma andorinha-falcão,
voava mais longe do que qualquer outro ...
desdobrei em seu segredo
até que gravei.
só eu sabia.
e os barões vermelhos
caiam,
frente ao meu gozo de céu
35. mas nem mesmo a andorinha
fez me voar tanto
quando a guerra das pipas
mas isto,
são outras memórias
36. um dia
meu pé de amora
me metralhou
de vida
e sujo de sangue
roxo das delicias,
eu vivia
e revivia
revivia
37. com os meus super poderes
com a minha super inteligência
não suportei,
dar cabo
a vilã andorinha
ela se pôs a mira
entre a bifurcação das entrelinhas,
e as gomas esticadas da minha danação
eu,
assassino confesso,
desagüei
e após a dolorida sina,
fiz lhe o velório;
... a minha mais linda caixa de sapato,
as velas de meu aniversário,
sepultei.
e foi no meu melhor buraco de armadilha...
e vilã, foi agonia
38. e assim... será para sempre
tudo mais meu
egoicamente meu
somente meu
impassível de responsabilidade
ou de mera transferência
é meu,
minha infância
era minha,
as minhas inocências
(agostiniana)
39. abro a janela do tempo
e me vejo voando de novo,
com os braços abertos,
a capa chicoteia o ar.
repentinamente paro
... acho que ateei-me a outra idéia.
milhares de mistérios,
rodeiam as bolhas de sabão.
40. após uma grande aventura,
e fantasiado de methiolate
cascas e feridas,
lhe apresento
de peito aberto
o meu orgulho de soldado.
só não te conto,
que chorei,
no colo de mamãe
41. um trenzinho vivo
de porquinhos da índia,
trafegam auroras
de minha infância
trilham o gramado
por onde caminhei,
e somem em seus pêlos lisos,
em suas nobres bandeiras de cores;
é...
nada terei de volta
nem futuro ou passado
apenas,
preencherei o vazio de deus
com este amor,
que tenho destas lembranças
43. Sujeito Muito Vivo Marcos Fabrício Lopes da Silva
Memórias Vivas de um
A poesia, quando me arrepia, me
deixa sem cadeira e com a bunda no
chão. O coração fica no lugar da
cabeça. A cabeça se acotovela com o
estômago para ocupar o lugar de
destaque nas tribunas da memória.
Divago nas Asas do Intento com o
companheiro de voos, o poeta-
pássaro Marco Llobus. Bendita a
fruta que gerou a vida na sequência
"homem-menino-criança", como um
filme de processo feliz fellini.
Equilíbrio em velocidade se chama
agilidade. Agilidade para se chegar
ao "teto de um corredor" alumiado.
Subida plena no salto atirado de um
amor primeiro - educação
sentimental, sem ser professoral.
Deus, não se culpe tanto! Mas que
diabo ter a exceção como regra.
Humano dente de leite: brincar é
extrair a raiz quadrada do
problema, fazendo dele amarelinha.
Entre o céu e o inferno, "sujo de
sangue" e "roxo de delícias", o poeta
sai do quadrado mundo para entrar
na dança de roda movida a
"trenzinho vivo". Memórias vivas de
um sujeito muito Vivo. Coisas de um
sujeito muito lírico. Ou melhor, lírio.
44. Agradecimentos,
Pai e Mãe, os guardiões da minha alegria e vida.
Às minhas três flores Juliana, Mariana e Fernanda.
A Clevane Pessoa, minha madrinha das Letras.
Ao amigo Marcos Fabrício, pelo delírio do aviãozinho.
e ao meu pé de Amora.