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Fundação Instituto de Administração – FIA
Autor: Eduardo Kormives
FINANCIANDO A INOVAÇÃO: UMA ANÁLISE
DO MODELO DE VENTURE CAPITAL AMERICANO
E SEU IMPACTO NO VALE DO SILÍCIO
Monografia apresentada como parte
dos requisitos para conclusão do Curso MBA,
Informações Econômico Financeiras e
Mercado de Capitais, Turma 9, sob a orientação do
Prof. Ms. Marcos Piellusch
São Paulo
Maio – 2011
2
A Michelli, Bento e Beatriz, as três pessoas que dão sentido
ao meu esforço para crescer pessoal e profissionalmente
3
Agradecimentos
À BM&FBovespa, pela bolsa de estudos sem a qual eu não poderia cursar este MBA.
À minha esposa Michelli, que assumiu de bom grado a tarefa complicada, para não
dizer impossível, de cuidar sozinha de duas crianças cheias de energia para que eu pudesse me
concentrar nesta tarefa.
Aos meus pais, Valter e Sara, os maiores exemplos de vida que eu tenho.
Ao Prof. Dr. José Roberto Securato, pela oportunidade de aprendizado.
Ao Prof. Ms. Marcos Piellusch, por sua compreensão e apoio no momento em que eu
pensei que não chegaria ao fim.
A todos os professores do MBA em Informações Econômico Financeiras e Mercado
de Capitais, em especial ao Prof. Dr. Edson Ferreira de Oliveira e ao Prof. Dr. Ricardo Ennio
Beccari, pelo aprendizado, paciência e disposição de aguentar uma sala cheia de jornalistas.
Ao meu chefe Nilson Vargas e colegas de redação, que seguraram as pontas nas oito
semanas em que estive afastado para frequentar as aulas.
Aos amigos Mário Sérgio Lima, Liana Rizzo, Marcelo Espinoza, João Grando e
Graziele Dal-Bó. Vocês tornaram a minha estada em São Paulo muito mais fácil e divertida.
Por último, mas não menos importante, a Deus, que nos dá infinitamente mais do que
pedimos ou pensamos.
4
“A inovação é o distingue um líder de um seguidor”
Steve Jobs
5
RESUMO
Em essência, o venture capital é uma forma de apoio baseada no investimento por
meio de participação em empresas que apresentem elevado potencial de crescimento. O
objetivo claro é uma posterior revenda com a realização de expressivos ganhos de capital.
O VC não é bom apenas para investidores, que emprestam dinheiro esperando taxas de
retorno que dificilmente obteriam em outras modalidades de aplicação em prazo tão curto. É
bom também para empresas iniciantes de tecnologia, as start-ups, caracterizadas pela falta de
capital para executar ou fabricar modelos de negócios, produtos ou serviços inovadores e
potencialmente disruptivos. Ou seja, ideias capazes de mudar radicalmente setores
estabelecidos ou de criar mercados completamente novos.
Neste trabalho, analisamos a relação entre investidor e empreendedor com foco no
impacto econômico da indústria de VC no Vale do Silício, estado da arte da inovação. Uma
região que, mesmo na adversidade, soube utilizar o capital de risco para se reinventar diversas
vezes e encontrar o caminho rumo à economia do conhecimento do século 21.
RESUMO
In essence, venture capital is an investiment-based support through equities of high
growth companies, aiming its later buyout with expressive capital gains. VC is not good just
for investors, who finance companies looking for high return taxes that they wouldn‟t earn
with any other financial application in such short term. VC is also good to start-ups,
characterized by lack of capital to execute potential breakthrough innovate business plans,
products or services. Put in another way, ideas capable to radically transform consolidated
sectors or to create completely new ones.
In this paper we analyze the relationship between investor and entrepreneur focusing
the economic impact of VC capital in the Silicon Valley, the state of the art of innovation. A
region that, despite all the adversity, figured out several times how to use VC to reinvent itself
and find the way to the 21st century economy of the knowledge.
6
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO ............................................................................................8
1.1.SITUAÇÃO PROBLEMA ...............................................................................................8
1.2. OBJETIVO ....................................................................................................................11
1.3. METODOLOGIA..........................................................................................................11
1.4. DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS.................................................................................12
CAPÍTULO 2 – A INDÚSTRIA DE VENTURE CAPITAL..............................................14
2.1. DEFINIÇÃO DO TERMO VC/PE................................................................................14
2.2. A NATUREZA E O PAPEL DO CAPITAL DE RISCO..............................................15
2.2.1. AGENTES INTERMEDIÁRIOS............................................................................16
2.2.2. VC/PE COMO FONTE DE FINANCIAMENTO..................................................17
2.2.3. CICLO DE CRESCIMENTO DA EMPRESA E FINANCIAMENTO .................19
2.3. START-UPS ...................................................................................................................21
2.4. ALTO RISCO................................................................................................................22
2.4.1. TAXA DE RETORNO............................................................................................23
2.4.2. RESULTADO CONCENTRADO..........................................................................24
2.5. CICLO DO VENTURE CAPITAL ...............................................................................26
2.5.1. FASE DE CAPTAÇÃO ..........................................................................................26
2.5.2. FASE DE INVESTIMENTO..................................................................................27
2.5.3. FASE DESINVESTIMENTO.................................................................................29
2.6. SELEÇÃO, GOVERNANÇA E MONITORAMENTO ...............................................31
CAPÍTULO 3 – O MODELO VENCEDOR AMERICANO ............................................34
3.1. BREVE HISTÓRICO....................................................................................................34
3.2. FATORES DECISIVOS................................................................................................37
3.3. IMPACTO ECONÔMICO ............................................................................................39
CAPÍTULO 4 – O QUE É QUE O VALE DO SILÍCIO TEM?........................................41
4.1. ONDAS DE INOVAÇÂO.............................................................................................42
4.2. A FÓRMULA DO SUCESSO.......................................................................................44
4.2.1. OUSADIA EMPREENDEDORA...........................................................................44
4.2.2. AMBIENTE ÚNICO...............................................................................................45
4.2.3. CAPITAL DE RISCO ABUNDANTE E MAIS ACESSÍVEL..............................45
7
4.2.4. FOCO EM SETORES, NÃO EM EMPRESAS .....................................................47
4.3. O PAPEL DO VENTURE CAPITAL...........................................................................48
4.3.1. O CASO GOOGLE.................................................................................................50
5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................51
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................53
8
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO
1.1.SITUAÇÃO PROBLEMA
Em janeiro de 2011, o valor de mercado da Apple ultrapassou os US$ 300 bilhões,
cifra que fez desta empresa, tida como morta há uma década, nas palavras do New York
Times, a segunda mais valiosa do mundo, atrás apenas da petrolífera Exxon Mobil.
Desde 2005, as ações da Apple se valorizam a uma média anual de 59%, segundo
levantamento do jornal USA Today. A explicação para tal crescimento reside na revolução do
consumo de eletrônicos provocada pela Apple por meio de uma sequência de produtos
inovadores lançados de 2001 para cá, que inclui iPod, iPhone e iPad.
Outra empresa de tecnologia americana, o Google, fundada em 1998 tendo como
carro-chefe um mecanismo de busca na internet, vale mais de US$ 150 bilhões hoje.
Google e Apple são expoentes de uma região ao Norte da Califórnia, conhecida como
Vale do Silício, que engloba 14 cidades e abriga as sedes de muitas das maiores empresas de
tecnologia do mundo. Esta região ganhou este nome por conta da sua liderança na produção
de semicondutores no passado, mas que se reinventou ao longo dos anos a ponto de se tornar
sinônimo da indústria de alta tecnologia americana.
O Vale do Silício é a região com a economia mais dinâmica do mundo por ser um
habitat para inovação e empreendedorismo (Lee et al., 2000). Em certo sentido, o principal
produto do Vale do Silício é a própria inovação.
Seria talvez o exemplo mais bem acabado da hipótese de que o desenvolvimento
econômico é conduzido pela inovação. Essa ideia remonta ao início do século 20
(Schumpeter, 1934). O economista austríaco Joseph Schumpeter mais tarde descreveria o
processo dinâmico da "destruição criadora", no qual a tecnologia - novos produtos, novos
métodos de produção - transformaria mercados de maneira cíclica essencialmente destruindo
o status quo e criando toda uma nova onda de inovação (Schumpeter 2002 apud Park 2005).
Apenas a idealização e a produção do iPhone, lançado em 2007, geraram 200 novas
patentes à Apple, mais do que o dobro do que o Brasil registrou em todo o ano de 2005 nos
Estados Unidos, segundo levantamento da revista Veja.
9
O McKinsey Global Institute confirmou a importância da inovação em uma série de
estudos sobre nove importantes setores industriais americanos na década de 1990 (Lewis,
2004). Entre outras coisas, a pesquisa aponta que:
O crescimento econômico foi produto de contínua inovação em face da competição
pela organização do trabalho de modos mais efetivos.
O crescimento da produtividade medido pelo PIB per capita é a chave para a
prosperidade.
Ao debater as razões que explicam por que alguns países são ricos e outros pobres,
Helpman (2004: 34-54) observa que pesquisas recentes sobre crescimento econômico têm
demonstrado que a acumulação de capital, incluindo mais maquinário e maiores níveis de
educação, não é principal fator a impulsionar o crescimento. Ele cita fortes evidências de que
a inovação, ao organizar equipamentos e trabalhadores de novas maneiras e usando
tecnologias, é uma força maior de produtividade.
Estudo contratado pelo Instituto Econômico da Região Metropolitana de San
Francisco, na Califórnia, Estados Unidos, argumenta que o crescimento da produtividade é a
chave para o aumento real de salários, o retorno aos acionistas e o incremento da renda per
capita de uma região ou mais. E o caminho para elevar a produtividade é a inovação. “No
longo prazo, uma economia avançada como os Estados Unidos não pode competir apenas
baixando custos ou incrementando a produção” (2004:9).
A única maneira de fazer parte desta nova onda de globalização nasce em muitas
novas regiões de inovação, como Taiwan, Índia, China e Israel, é encontrar novas e melhores
maneiras de usar recursos financeiros naturais e humanos a fim de incrementar a
produtividade. Resumindo, tudo depende da introdução de novas ideias e/ou processos.
Nas palavras de Drucker (1986: 45), “a inovação sistemática, portanto, consiste na
busca deliberada e organizada de mudanças, e na análise sistemática das oportunidades que
tais mudanças podem oferecer para a inovação econômica ou social”.
Ocorre que o Vale do Silício não é o único lugar do mundo em que a inovação está na
ordem do dia. Outras regiões dentro dos EUA, como Austin, no Texas, ou Boston, Israel,
China, Finlândia, Reino Unido e Canadá, além de cidades brasileiras como Campinas (SP) e
Florianópolis (SC), também desenvolvem indústrias inovadoras. Mas nenhum outro lugar
conseguiu reproduzir as condições que fizeram do Vale do Silício o que ele é hoje. Por quê?
Este trabalho se concentra em uma das explicações possíveis, que pode mais uma vez ser
10
derivada do trabalho de Schumpeter. Como enfatiza Streissler (1981: 60-83), tão importante
quanto o conceito de “destruição criadora” é a noção de Schumpeter de que o crédito bancário
era um pré-requisito à inovação e à fundação de novas empresas.
Autores como Zysman (1983) e Mowery (1992) analisaram a estrutura dos sistemas
financeiros de diversos países com o objetivo de demonstrar de que forma as especificidades
de cada país, no que tange ao seu padrão de financiamento, foram fundamentais no modelo de
desenvolvimento industrial adotado. Seus estudos mostram que cada país encontrou uma
solução particular para lidar com a incerteza que permeia o processo de inovação e,
consequentemente, o desenvolvimento tecnológico.
Por este motivo, escolhemos analisar a experiência dos Estados Unidos, país que
desenvolveu pioneiramente um sistema de financiamento da inovação através da indústria de
Private Equity/Venture Capital, também chamado de capital de risco no Brasil.
Segundo a National Venture Capital Association, que representa a indústria de PE/VC
nos Estados Unidos, em 2009, as empresas financiadas com capital de risco respondiam por
11% dos empregos no setor privado e 21% do Produto Interno Bruto (PIB) americanos.
Nascidos no final dos anos 1940, os fundos de VC possibilitaram o surgimento de gigantes do
setor de tecnologia como Oracle, Facebook e os já citados Apple e Google. Não por acaso, a
Sand Hill Road, em Melo Park, no Vale do Silício, reúne a maior concentração de empresas
de VC do mundo, sendo o equivalente para a indústria de tecnologia ao endereço Wall Street
para o mercado financeiro global.
Os intermediários financeiros do tipo PE/VC desempenham um importante papel nos
mercados financeiros, provendo recursos a companhias com acesso restrito a formas
tradicionais de financiamento (Gompers e Lerner, 2001), tais como empresas inovadoras, com
alta proporção de ativos intangíveis e companhias que necessitam de reestruturação.
Nos últimos 20 anos, esta modalidade de investimento ganhou o mundo, embora os
EUA ainda concentrem mais de 70% do capital levantado e mais da metade do capital
investido, como revela um estudo da consultoria PwC de 2004.
Ao estudar o modelo americano de VC, este trabalho pretende apontar caminhos para
esta indústria no Brasil, surgida há pouco mais de 10 anos. O crescimento do setor tem se
acelerado rapidamente desde a crise global de 2008. Em termos mundiais, o Brasil tem sido
tratado como a bola da vez. Pesquisa do Emerging Markets Private Equity Association revela,
por exemplo, que o país perdeu apenas para a China como principal destino do dinheiro de
11
private equity em 2009. Outro levantamento PwC indica que a participação deste tipo de
capital nos negócios de fusão e aquisição praticamente quadruplicou desde 2006: passou de
11% para 42%. Além disso, uma pesquisa KPMG realizada a pedido do jornal Valor
Econômico com 44 gestoras de fundos nacionais e estrangeiros atuando no Brasil aponta que
o dinheiro disponível nos fundos no país cresceu 31,5% entre março de 2009 e março de
2010, chegando a US$ 26,9 bilhões. O capital investido subiu de US$ 12 bilhões para US$ 14
bilhões, considerando os US$ 4,1 bilhões à espera de oportunidade de investimento.
O capital de risco é uma importante fonte de investimentos para pequenas e médias
empresas inovadoras (Pavani, 2003), perfil da indústria de tecnologia brasileira. Usá-lo de
maneira eficiente pode significar uma virada na economia brasileira, inserindo de fato o país
na economia do conhecimento. Dados da Associação Brasileira de Private Equity e Venture
Capital (ABVCAP) mostram que existem 1,9 mil universidades, 300 incubadoras e mais de 6
mil empresas de base tecnológica deste porte. Não apenas pela injeção de dinheiro. O capital
de risco agrega profissionalismo à empresa investida e propulsiona o empreendedorismo. Na
outra ponta, o critério de seleção rigoroso permite escolher os empreendimentos que
apresentam melhores possibilidades de retorno, com um nível de risco aceitável.
1.2. OBJETIVO
Este estudo tem como propósito demonstrar como estão estruturados os negócios de
PE/VC nos Estados Unidos, país com alta maturidade empresarial, e apontar o impacto provocado
por este tipo de financiamento no Vale do Silício, região que é a grande criadora por ondas de
inovação globais.
1.3. METODOLOGIA
Cervo A. L. (1983) afirma que toda investigação nasce de algum problema observado
ou sentido, de tal modo que não se pode prosseguir na análise a menos que se faça uma
seleção do tema a ser tratado. Esta seleção necessita de alguma hipótese que sirva como guia
sobre o assunto a ser pesquisado.
Como método de pesquisa, partiu-se da situação problema, descrita no item 1.1 deste
capítulo. Ou seja, o faz do Vale do Silício o maior centro de inovação global? Formulou-se,
então, uma hipótese de que o modelo americano de financiamento da inovação, baseado no
12
capital de risco, teria um papel fundamental neste processo e que a esta região específica
reuniria particularidades não verificadas em nenhum outro centro de inovação do mundo.
A proposta para o desenvolvimento deste trabalho mescla a revisão da bibliografia
corrente sobre o objeto – a indústria de capital de risco –, a pesquisa documental e o
levantamento de dados numéricos.
Cervo A L. (1983) observa que a pesquisa bibliográfica procura explicar um problema
a partir de referências teóricas publicadas em documentos. Busca conhecer e analisar as
contribuições culturais ou científicas do passado existentes sobre um determinado assunto,
tema ou problema. Como o assunto ainda não dispõe de extensa pesquisa no Brasil e no
mundo, além de dissertações e teses de autores brasileiros e estrangeiros, alguns artigos e
reportagens de jornal foram de grande valia para o aprofundamento do tema. Procuramos
valorizar, quando possível, as pesquisas de autores que também são empreendedores e
conhecem por experiência própria as peculiaridades do Vale do Silício.
Para a realização da pesquisa descritiva sobre o modelos de capital de risco dos EUA,
a análise documental revelou-se importante. Para Lüdke & André (1986:38), a análise
documental pode se constituir numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos seja
complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos
de um tema ou problema.
Segundo Sá Silva et al (2009:5), tanto a pesquisa documental quanto a bibliográfica
têm no documento o seu objeto de investigação, sendo que o conceito de documento
ultrapassa a idéia de textos escritos e/ou impressos. O documento como fonte de pesquisa
inclui filmes, vídeos, slides, fotografias ou pôsteres. Por isso, também utilizamos uma série de
estudos e dados levantados por empresas renomadas de consultoria e entidades relacionadas à
tecnologia, inovação e à industria de capital de risco, que serviram para quantificar
comparações.
1.4. DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS
Este trabalho considera as características mais importantes da indústria de capital de
risco e seu papel impulsionador em economias dinâmicas baseadas na inovação.
O Capítulo 1, que se apresenta como a introdução deste trabalho, explica em linhas
gerais a relação entre financiamento e inovação e como as fontes as quais as empresas
13
tradicionalmente recorrem para obter linhas de crédito se mostram ineficazes no contexto das
empresas de base tecnológica.
No Capítulo 2 “A indústria de Venture Capital”, abordaremos a natureza e a razão
de ser desta indústria, que representa uma fonte vital de estímulo à inovação.
Também analisaremos o perfil das start-ups de tecnologia, seu ciclo de vida e as
vantagens que o capital de risco representa a este tipo de empresa em relação aos empréstimos
bancários tradicionais.
No capítulo 3, “O modelo vencedor americano”, nos concentraremos na indústria de
VC dos EUA. E buscaremos respostas para explicar por que, desde a sua consolidação, no
final dos anos 1970, esta indúsitra domina o segmento com folga no âmbito global, a ponto de
os fundos americanos ainda concentrarem mais de 70% do capital levantado e mais da metade
dos investimentos. .
No capítulo 4, “O que é que o Vale do Silício tem?”, analisaremos o sucesso desta
região da Califórnia, hoje a Meca da tecnologia, onde inovação e capital de risco andam lado
a lado. Também debatedores as razões que fizeram o Vale liderar sucessivas ondas de
inovação disruptiva, criando mercados novos e moldando a economia global. E os motivos
pelos quais a atuação da indústria de VC americana ainda não se reproduziu em outro lugar.
O desfecho deste trabalho é apresentado nas considerações finais, capítulo 5, em que
também sugerimos novos temas para pesquisa.
14
CAPÍTULO 2 – A INDÚSTRIA DE VENTURE CAPITAL
2.1. DEFINIÇÃO DO TERMO VC/PE
A diferenciação entre os termos private equity e venture capital está normalmente
relacionada ao estágio de desenvolvimento em que se encontram as empresas no momento do
aporte de capital. Em geral, o termo venture capital (VC) refere-se ao investimento feito nos
estágios iniciais, enquanto a expressão private equity (PE) é empregada para designar os
investimentos em companhias mais maduras e já estabelecidas (Carvalho et al, 2006). A
Tabela 1 apresenta as diversas modalidades dos investimentos.
Tabela 1: Descrição das modalidades de investimento conforme estágio das empresas investidas
quando do primeiro aporte de PE/VC
Venture Capital
Capital semente (seed capital)
Investimento em empresas de pequeno porte, feito em fase
pré-operacional, para desenvolvimento de uma idéia, de um
projeto ou ainda para testes de mercado ou registro de
patentes.
Estruturação inicial (start-up) Aporte de capital em empresa em fase de estruturação, em
geral no primeiro ano de funcionamento, quando ainda não
vende seus produtos/serviços comercialmente. Nesta fase,
a empresa já iniciou a contratação de profissionais e efetuou
todos os estudos necessários para colocar em prática o plano
de negócios.
Expansão (expansion) Aporte de capital, em geral de giro, para a expansão de
empresa que já vende seus produtos/serviços
comercialmente. O aporte também pode ser destinado à
expansão da planta, da rede de distribuição ou ainda para ser
investido em comunicação e marketing.
Private Equity
Estágio avançado (later stage) Investimento em empresa que já atingiu uma taxa de
crescimento relativamente estável e apresenta fluxo
de caixa positivo.
Financiamento de aquisições
(acquisition finance)
Aporte de capital para expansão por meio da aquisição de
outras empresas.
Tomada de controle
pelos executivos
(management buyout)
Aporte de capital para financiar uma equipe de gestores, da
própria empresa ou externos, que objetivam adquirir o
controle de uma empresa.
Estágio pré-emissão
(bridge finance)
Aporte feito quando a empresa planeja entrar em bolsa de
valores em até dois anos. Também pode envolver a
reestruturação de posições de grandes acionistas.
15
Recuperação empresarial
(turnaround )
Financiamento para empresas com dificuldade operacional
e/ou financeira quando existe possibilidade de recuperação.
Mezanino Investimentos em companhias em estágios avançados de
desenvolvimento por meio de dívidas subordinadas.
PIPEs (Private Investment
in Public Equity))
Aporte em ações pouco líquidas de empresas listadas em
bolsa de valores.
Fonte: Carvalho et al. (2006)
Sharp (2002), no entanto, argumenta que esta distinção, originada nos Estados Unidos,
é uma maneira simplificada de separar os estágios de investimento, muito difundida em
alguns países. Comodo (2009: 14) é da opinião que a atividade de VC está incorporada à de
PE, “uma vez que ambas as atividades tratam de investimentos em participações de empresas
não listadas em bolsa com boas expectativas de ganhos de capital”.
Seguindo na mesma linha, neste trabalho, não haverá distinção entre essas atividades.
O termo PE/VC, quando utilizado, estará relacionado à aquisição, por um determinado
investidor/sócio capitalista, de participação em uma empresa mediante a subscrição de
cotas/ações em operação privada entre as partes que, via de regra, não envolve o mercado de
bolsa de valores.
2.2. A NATUREZA E O PAPEL DO CAPITAL DE RISCO
Não há na literatura uma definição única para a expressão VC, traduzida no Brasil
como capital de risco, embora Pavani (2003) afirme que o termo mais adequado seja capital
empreendedor. Gorgulho (1996: 3-4) entende capital de risco como sendo:
uma forma de financiamento que envolve a participação, através da aquisição de ações ou de
outros instrumentos financeiros sem contrapartidas no que tange a garantias (equity ou
quasi-equity), em empresas ou empreendimentos com alto potencial de crescimento, com
vistas à sua revenda e à realização de expressivos ganhos de capital a médio e longo prazos.
Em suma: é uma modalidade de financiamento que pressupõe a aceitação de um alto
risco em troca da perspectiva de um alto retorno no futuro.
16
O capital de risco pode envolver empresas de qualquer tamanho e de qualquer setor
industrial, mas, em geral, são as pequenas e médias de base tecnológica que mais atraem os
investidores capitalistas, porque oferecem perspectivas de retorno bastante elevadas
(Gorgulho, 1996). Entenda-se por empresas de base tecnológica aquelas na qual tecnologia é
parte essencial dos processos, incorporando-se no produto ou serviço vendido ou como parte
importante do processo de produção. Essas empresas trabalham com tecnologias novas e
atuam tanto em setores de tecnologia de ponta quanto tradicionais.
A associação entre capital de risco e PMEs de base tecnológica tem sido chamada de
“capital de risco clássico”, em constraste a um perfil de investimentos mais conservador, ao
qual Bygrave e Timmons (1992) designaram merchant capital. Este último envolveria a
injeção de dinheiro em empresas mais maduras de setores tradicionais, normalmente através
de operações de engenharia financeira complexas, muitas vezes envolvendo leveraged
buyouts (LBO) e management buyouts (MBO), com objetivo de proporcionar o retorno dos
investimentos em prazos mais curtos.
No processo de capital de risco clássico, as três principais entidades envolvidas são: 1)
o investidor institucional, tais como fundos de pensão, capitalistas individuais, empresas e
companhias de seguro; 2) o empreendedor que recebe e faz uso dos recursos; e 3) os agentes
ou agências intermediárias, as empresas de capital de risco, que usualmente identificam,
selecionam, monitoram e operacionalizam os investimentos, além de levantarem fundos
adicionais para as empresas (Brophy, 1996).
2.2.1. AGENTES INTERMEDIÁRIOS
Gorgulho (1996) dividiu a atividade de VC a partir de algumas formas organizacionais
em que ela pode ser realizada.
Fundos – geridos por uma empresa administradora cujos sócios são investidores de
longo prazo. O administrador pode ser independente ou ligado a uma instituição financeira.
Subsidiárias corporativas – neste caso, a atividade de VC/PE é exercida por uma
subsidiária corporativa de uma instituição financeira ou de uma grande empresa, e os recursos
do fundo são provenientes do caixa destas instituições.
Holdings independentes – atuam como um fundo, mas seu formato jurídico é o de
uma holding. Este tipo de fundo é bastante comum no mercado brasileiro. A forma de
17
constituição é a de uma empresa fora do país, em geral em paraíso fiscal, a integralização do
capital é realizada fora, e o dinheiro entra no país sob a rubrica capital estrangeiro.
Seguindo na linha proposta por Gorgulho, este trabalho considera fundos de VC/PE ou
capital de risco as organizações que realizem atividades de capital de risco, qualquer que seja
a forma jurídica adotada.
Entre as principais características de um Fundo de VC/PE, Gorgulho (1996) destaca
três: 1) é gerido por equipe de administradores ou gestores profissionais; 2) em geral, suas
atividades são financiadas por uma taxa de administração sobre o capital comprometido do
fundo, variando entre 2% e 3% ao ano; 3) e, adicionalmente, os gestores do fundo têm uma
remuneração quando do processo de desinvestimentos – os percentuais mais utilizados são
80% do ganho de capital são distribuídos aos investidores do fundo e 20% para a equipe
gestora do fundo.
2.2.2. VC/PE COMO FONTE DE FINANCIAMENTO
Para Ribeiro (2005), a atividade de PE/VC se apresenta como uma alternativa viável
ao financiamento tradicional obtido por meio de bancos (i.e. empréstimos bancários) para
PMEs geradoras de projetos com elevada expectativa de risco e retorno, mas que só podem
ser executados por meio da injeção de novos recursos.
Ele argumenta que gestores de PE/VC são agentes melhor adaptados para mitigar o
risco associado ao investimento em empresas com pouco ou nenhum histórico financeiro ou
ativos tangíveis que possam se constituir como garantia real para empréstimos.
Diferentemente de investidores típicos do mercado de capitais, esses gestores
costumam participar diretamente da gestão das empresas em que investem, influenciando
decisões estratégicas e a própria governança corporativa. São investidores ativos, conforme a
definição de Jensen (1991). Só assim conseguem mitigar os riscos e influenciar a
possibilidade de sucesso e saída do negócio.
Pavani (2003) afirma que a lógica da operação de VC resolve três questões críticas
para o financiamento de pequenas e médias empresas, quando comparado aos empréstimos
bancários: 1) foge da análise financeira dos bancos, que se baseia no desempenho passado da
empresa, refletido em seus demonstrativos financeiros. O método estima se a empresa
conseguirá gerar caixa para pagar os juros e amortizações dos empréstimos, história essa que
uma nova empresa não possui; 2) o tomador do empréstimo não precisa apresentar garantias
18
reais às instituições financeiras, e uma PME dificilmente acumulou ativos com liquidez para
apresentar como garantias; 3) o pagamento de juros e das amortizações de um empréstimo
exige uma geração de caixa estável, característica incomum em empresas pequenas e médias.
O resultado, pondera Gorgulho (1996), é que os empréstimos feitos a novas empresas,
se ocorrem, têm taxas de juros elevadas e prazos curtos. Ou seja, para empresas com rápido
crescimento, como as de tecnologia, o capital de risco prevalece devido à atratividade que
essas empresas oferecem aos investidores e a dificuldade delas em captar recursos por meio
de modalidades que exigem ativos fixos e fluxo de caixa.
As diferenças entre o VC e o empréstimo bancário para as PMEs de base tecnológica
podem ser resumidas na tabela 2 abaixo.
Tabela 2: Diferenciação entre capital de risco e empréstimo bancário
Capital de risco Empréstimo bancário
Investimento de médio no longo prazo Investimento de curto a longo prazos.
Compromisso até a "saída". Investidor
sócio, solidário ao risco.
Em princípio, não há compromisso se a
segurança do empréstimo estiver ameaçada.
Fornece uma base de capital sólida e flexível
para ir ao encontro de seus planos de
crescimento e desenvolvimento.
Fonte de financiamento útil se a empresa
tiver uma autonomia financeira razoável e
se possuir um bom fluxo de caixa.
Bom para o fluxo de caixa porque a estrutura
do financiamento está adequada
às necessidades da empresa.
Requer fluxos de caixa estáveis para
pagar os juros e o reembolso de capital.
Os rendimentos do investidor dependem
do crescimento e do sucesso do negócio.
Depende de a empresa cumprir o serviço da dívida e
manter o valor dos ativos que servem de garantia.
Se o negócio falhar, os investidores
estão no mesmo nível de outros investidores,
depois dos bancos e propensos
a perder o seu investimento.
Se o negócio falhar, o financiador
geralmente tem a primeira palavra
sobre os ativos da empresa. Garantias reais.
Se a empresa estiver em dificuldades,
a empresa de capital de risco
fará tudo para conseguir superar
a má situação.
Se o negócio estiver preste a falhar,
o financiador pode liquidar o seu negócio a fim de salvar o
seu investimento, e pode causar falências se tiverem sido
usadas garantias pessoais.
19
Um verdadeiro parceiro de negócios,
partilhando os riscos e as recompensas, com
conselhos práticos e experiência.
A assistência disponível varia consideravelmente.
Fonte: ABVCAP, 2001
2.2.3. CICLO DE CRESCIMENTO DA EMPRESA E FINANCIAMENTO
Pavani (2003, capítulo 1) adotou uma segmentação híbrida dos estágios de
crescimento de uma empresa que se encaixa perfeitamente no contexto da indústria da
inovação, escopo deste trabalho.
1) Concepção/Criação – a empresa concentra seus esforços no desenvolvimento de
estudos, pesquisas preliminares, planos de negócios e projetos, pesquisas de mercado, criação
jurídica. Nesta fase são consumidos recursos, e o faturamento é zero.
2) Start-up – a empresa está finalizando os protótipos, contratando profissionais,
comprando equipamentos, aprofundando as pesquisas de mercado, desenvolvendo os produtos
e serviços e buscando os primeiros clientes. O faturamento é baixo e não estável. A empresa
necessita recursos para investir e cobrir prejuízos operacionais.
3) Estágio Inicial – as atenções da empresa estão em estruturar as atividades de
produção, de marketing e de vendas. A empresa está investindo na compra de equipamentos,
contratando pessoas, estruturando sua equipe de vendas. Dificilmente terá atingido o ponto de
equilíbrio operacional, e necessitará recursos para investimento e para cobrir prejuízos
operacionais.
4) Crescimento/Expansão – a empresa foca suas atenções em atividades de
marketing (expansão do canal de distribuição, comunicação, estabelecimento da marca), em
desenvolver novos produtos e serviços, em estruturar as atividades de produção em escala. Os
recursos são para investimento ou capital de giro, pois a empresa já deve ter atingido o
equilíbrio operacional.
5) Maturidade – as atividades estão voltadas para a manutenção da competitividade
(novos produtos/serviços, fortalecimento da marca), a reestruturação e o reposicionamento.
Ao analisar o processo de crescimento de empresas, Deutscher (2001) apresenta o
gráfico 1, onde é possível visualizar o resultado do fluxo de caixa e as vendas a partir do ciclo
de crescimento antes apresentado.
20
Gráfico 1: Estágios da empresa: receita de vendas e fluxo de caixa
Fonte: Deutscher, 2001. Modificado por Pavani, 2003
Fica claro pelo gráfico 1 que, dentre as diversas fontes de financiamento possíveis aos
empreendedores, a sua adequação está ligada ainda ao estágio de crescimento da empresa, em
função dos montantes, das regras de financiamento, do fluxo de caixa do tomador e das
restrições impostas pelo financiador (Pavani, 2003), como expresso na tabela 3.
Tabela 3: Estágios da empresa e fontes de recursos
Fontes de recursos
Estágio de crescimento e desenvolvimento da empresa
Concepção/Criação Start-up Estágio inicial Crescimento/
Expansão
Maturidade
Lucros acumulados X X
Clientes X X X
Fornecedores X X X X
Parceiros X X X X
21
Governo (doações) X X X X X
Incentivos fiscais X X X
Recursos do próprio
empreendedor ou de família
e amigos
X X X
Sócios - Business angels X X
Sócios – VC X X X
Sócios – PE X X
Sócios - Emissões públicas X
Financiamentos bancários X X X
Fonte: Pavani, 2003, a partir de diversos autores
2.3. START-UPS
Não é toda empresa de base tecnológica que atrai financiamento de PE/VC. Dado o
elevado risco do negócio, os investidores capitalistas só terão interesse em investir em
empresas através de instrumentos que permitam a participação em resultados
excepcionalmente favoráveis. É por estes motivos que o capital de risco é especialmente
adequado a um tipo de empresa que Marcus Regueira, da firma de VC/PE Fir Capital, citado
em Pavani (2003), define como aquela que “cresce aritmeticamente devido a limitações de
capital”, mas que, com a injeção de capital de risco e a experiência adequada e necessária da
indústria de VC/PE, pode crescer exponencialmente. Ou, em outras palavras, “o capital de
risco busca empresas emergentes que apresentem vantagens competitivas e estejam em
mercados de rápido crescimento” (citado em Pavani, 2003).
Empresas como estas são conhecidas, no jargão da indústria de VC/PE, como start-
ups. Existe um grande debate na literatura e na própria indústria sobre as características
definidoras de uma start-up – idade, faturamento, modelo de negócios? Neste trabalho
adotamos o conceito elaborado por Steve Blank, renomado professor das universidades de
Berkeley e Columbia, nos Estados Unidos, e empreendedor serial, criador de oito empresas no
Vale do Silício, para quem uma start-up “é uma organização formada para buscar um modelo
de negócios replicável e escalonável”.
22
Para Eckermann (2006), o termo VC já denota recursos que investidores
especializados oferecem a start-ups a fim de ajudá-las a comercializar a sua principal
tecnologia de ponta: ideias. Plagge (2006) acrescenta que o dinheiro do VC normalmente se
constitui na única possibilidade para uma empresa start-up novata financiar as idéias e
trabalhar em seus produtos até que eles sejam introduzidos no mercado. Esta definição seria
especialmente verdadeira nos setores onde uma ideia promissora de negócios sugere um
mercado potencial suficientemente grande – i.e, biotecnologia ou internet.
Neste sentido, o sistema financeiro tem um papel fundamental porque cabe a ele, em
última instância, “a tarefa de selecionar as inovações que serão ou não implementadas através
da decisão acerca da concessão dos financiamentos necessários” (Gorgulho, 1997).
Conforme visto anteriormente na Tabela 3, o investimento de VC/PE em start-ups se dá pelo
financiamento privado (Pavani, 2003). Ele consiste na compra, por investidores, de ações
emitidas por sociedades anônimas fechadas.
Além dos investidores formais – fundos, holdings ou subsidiárias corporativas –, é
importante citar a existência de um mercado informal. Embora vá além do escopo deste
trabalho, a figura do investidor-anjo (business angel) é importante fonte de recursos para
empresas nos estágios iniciais de desenvolvimento – concepção/criação e start-ups. Pavani
(2003: 34) define os investidores anjos como “pessoas ricas, muitas vezes com experiência
profissional (...) que aportam, em geral, recursos financeiros, rede de contatos e experiência
profissional”.
Segundo reportagem da revista Economist, estima-se que os investidores anjos sejam
responsáveis, nos EUA, pela introdução de aproximadamente 40% das novas oportunidades
de negócios das empresas de VC/PE.
2.4. ALTO RISCO
A atividade de PE/VC pressupõe a aceitação de riscos elevados em troca de obtenção
de altos retornos (Soledade et alli, 1997). Mas que altos riscos seriam estes?
Eckermann (2006: 23-25) elenca uma série deles apenas nos estágios iniciais de uma
empresa inovadora. Em primeiro lugar, uma vez que a maioria das start-ups se fundamenta
em apenas um produto, o seu progresso está intimamente ligado ao ciclo de vida do produto
em si. E esses novos produtos estão frequentemente imersos em incertezas uma vez que
investidores de fora e de dentro não podem prever a receita potencial do projeto.
23
Além disso, não há nenhuma evidência de aceitação de seu conceito no mercado nem
como dizer ao certo se as estratégias de marketing desenvolvidas são apropriadas. Quando
entra em um mercado emergente, o empreendedor ainda se depara com incertezas acerca da
execução técnica de sua concepção e, eventualmente, sobre o design do produto. Finalmente,
a inexperiência do próprio empreendedor adiciona risco de má gestão nas empresas em
estágio inicial.
Reichert (2006), citado em Rieche; Santos ( 2006) observa que o que faz uma idéia
ser atrativa para um investidor capitalista é a solução prática para um grande problema ou a
sinalização de uma boa oportunidade de mercado.
Existem dois grupos amplos de oportunidades de investimento. No primeiro, o
mercado ou o produto são, em alguma medida, conhecidos. A empresa está fazendo a melhor
execução ou uma versão melhorada de um produto ou serviço existente em um mercado já
consolidado. O segundo refere-se a mercados ou modelos de negócios totalmente novos, nos
quais os investidores acham que conhecem suas apostas, mas, na prática, têm pouca idéia do
negócio.
2.4.1. TAXA DE RETORNO
Já foi dito que a atividade de VC/PE financia apenas negócios com alto potencial de
retorno por conta dos altos riscos derivados de modelos de negócios muitas vezes não
testados. Uma questão importante aqui é quantificar esse alto potencial de retorno.
Plagge (2006: 6-7) diz que a taxa de retorno (hurdle rate) que uma firma de VC/PE
espera “pode ser interpretada como os juros que ela espera ganhar em um investimento, e é
dada de maneira exógena (de fora para dentro)”.
Como conseqüência, a taxa de retorno determina quais propostas de investimento são
aceitáveis para um investidor capitalista. Em outras palavras, Se alguém leva a uma firma de
VC/PE um plano de negócios que promete um retorno de investimento (ROI) de 10% ao ano,
enquanto a taxa de retorno está estabelecida em 20%, o investidor capitalista declinará do
negócio. Pelo ponto de vista do empreendedor, o custo do financiamento via VC é a sua taxa
de retorno. Uma start-up demandará capital de risco apenas se for capaz de obter um retorno
superior aos 20% ao ano exigidos pelo dinheiro do investidor capitalista.
24
Plagge (2006: 7) propõe a seguinte analogia para clarificar o que significa a demanda
por capital de risco. Imagine um vendedor de carros oferecendo um BMW por US$ 50 mil,
cifra exatamente igual ao custo do carro. A demanda pelo BMW seria, então, igual ao número
de pessoas dispostas a pagar os US$ 50 mil. Da mesma maneira, um investidor capitalista
oferecerá dinheiro e assistência no gerenciamento para start-ups interessadas com a condição
de que seu retorno seja um determinado preço, que é equivalente ao retorno anual esperado do
seu dinheiro de risco.
Segundo Gorgulho (1996), os investidores capitalistas esperam uma taxa de retorno
superior a 50% para investimentos em estágios iniciais, de 30% a 40% para investimentos em
expansão e entre 25% e 30% para estágios avançados. Uma regra geral é um retorno em cinco
anos de sete vezes sobre o primeiro aporte, o que equivale à taxa média composta de 48% a.a.
Zider (1998) afirna que a taxa de retorno esperada varia entre 25% e 35% a.a. sobre a
duração do investimento. Segundo ele, pelo financiamento de um ou dois anos de uma start-
up, os investidores capitalistas projetam um retorno de 10 vezes sobre o capital injetado no
período de cinco anos. Isso combinado a sua posição preferencial de sócio – nos EUA, os
contratos normalmente incluem a aquisição de 40% das ações – explica por que o capital de
risco tem um alto custo: trata-se de um empréstimo a taxa de juros compostas de 58% a.a.
Bygrave e Timmons (1992) analisaram as taxas de retorno anualizadas médias de todos os
fundos americanos formados entre 1969 e 1985. Estes dados mostram que os retornos tipicamente
são menores que 20%, com breves picos acima de 30%. Contudo, o quartil superior teve uma
performance bem melhor, apresentando retornos acima de 20% em nove dos 16 anos, acima de
30% em quatro destes anos e acima de 40% em um ano.
No Brasil, estudo de Titericz (2003) conclui que os fundos de investidores de risco
aplicam seus recursos, em média, durante 3 a 5 anos, que é o tempo considerado suficiente
para alcançar retornos superiores a 31%. Esses investimentos, na ordem de R$ 500 mil a R$ 1
milhão, não representam menos de 36% da participação acionária.
2.4.2. RESULTADO CONCENTRADO
A lógica de formação de carteira do capital de risco prevê que poucas empresas sejam
responsáveis pela maior parte dos ganhos (Gorgulho, 1996). Bygrave e Timmons (1992)
citam estudo que analisou 383 investimentos realizados por 13 firmas de VC entre 1969 e
1985. Quase metade do valor final da carteira resultou de apenas 6,8% de todos os seus
25
investimentos e 75% vieram de 15,7%, tendo havido perdas em 34,5% dos investimentos.
Exemplos de retornos impressionantes são Apple (235 vezes o investimento inicial), Lotus
(63) e Compaq (38).
Outro estudo, citado em Florida e Kenney (1988), avaliando a performance dos 10
principais fundos de capital de risco nos Estados Unidos no período 1972/83, mostrou que,
dos 525 investimentos realizados, apenas os 56 vencedores (ou 10,7%) geraram mais da
metade do valor total da carteira (US$ 823 milhões), quintuplicando o valor investido,
enquanto 38% dobraram o investimento original e aproximadamente metade deles (266) ficou
no break-even point ou resultou em perdas. Este desempenho gerou um retorno ponderado
para a carteira de 35% a.a. no período.
Zider (1998) diz que, na média, empresas com bons planos de negócios e bom pessoal
são bem-sucedidas apenas uma em cada 10 vezes, dada a quantidade de componentes críticos
para o seu sucesso. As melhores companhias teriam 80% de sucesso em um destes
componentes, o que mesmo assim lhe daria uma probabilidade de sucesso abaixo de 20%,
como mostra a tabela 4.
Tabela 4. Probabilidade combinada de sucesso
Evento individual Probabilidade
Capital suficiente 80%
Gestão capaz e focada 80%
Desenvolvimento de produto segue o planejado 80%
Produção e fontes de componentes seguem o planejado 80%
Competidores se comportam como o esperado 80%
Consumidores querem o produto 80%
Projeção de preço correta 80%
Patentes são concedidas e vigentes 80%
Probabilidade combinada de sucesso 17%
Fonte: Ziber, 1998. Adaptado pelo autor
Se uma única das variáveis acima cair para 50% de probabilidade, a chance combinada
de sucesso cai para apenas 10%.
Zider (1998: 139) explica, então, que a formação de carteira e a estrutura de
negociação de acordos de uma firma de capital de risco americana permitem que a taxa de
retorno perseguida, de 25% a 30%, seja alcançada se apenas 10% a 20% das empresas que
receberem investimento forem vencedoras. Mais da metade das empresas do portfólio, na
26
melhor das hipóteses, apenas devolverá o investimento original. Segundo Zider, “de fato, as
reputações de firmas de VC são normalmente construídas sobre um ou dois bons
investimentos”. A tabela 5 ajuda a descrever esta característica da indústria de VC/PE.
Tabela 5. Performance típica de um portfólio de VC para cada US$ 1 mil investidos
Ruim Sobreviveu Ok Boa Ótima Total
$ investido 200 400 200 100 100 1.000
Retorno no ano 5 0 1x 5x 10x 20x
Retorno bruto 0 400 1.000 2.000 2.000 4.400
Retorno líquido (200) 0 800 900 1.900 3.400
Fonte: Zider, 1998. Adaptado pelo autor.
2.5. CICLO DO VENTURE CAPITAL
O ciclo de VC se constitui no centro de todo investimento desta modalidade. Para descrevê-lo,
resumiremos os conceitos apresentados por Plagge (2006, capítulo 1), que elenca três estágios
principais: captação de fundos, investimento e desinvestimento. Todas as três fases
desempenham um papel crucial para os investidores capitalistas e para as empresas, incluindo
potenciais candidatas, no seu portfólio.
2.5.1. FASE DE CAPTAÇÃO
Toda atividade de VC/PE começa com a fase de captação de fundos. Nela, os investidores
capitalistas procurarão investidores institucionais e investidores individuais qualificados como
o objetivo de levantar dinheiro para um fundo.
Normalmente, as empresas de VC/PE americanas são estruturadas no modelo Limited Partner
(LP). Conforme Ribeiro (2005), essa estrutura compreende pelo menos duas partes, o gestor
(General Partner) e o investidor ou grupo deles (Limited Partner). O LP fornece os recursos
necessários à formação do fundo. Tais recursos são protegidos pela cláusula de
responsabilidade limitada. Ou seja, o investidor não corre o risco de perder mais do que o
capital investido no veículo. Para garantir esse direito, os LPs só precisam seguir uma regra:
manterem-se afastados da gestão do veículo no dia a dia.
É importante ressaltar que o que leva os LPs a aplicarem num fundo não é um investimento
específico, mas o histórico da firma de VC/PE e a confiança nos GPs em si (Zider, 1998).
27
Além disso, as LPs também contam com tributação mais adequada à realidade dos
investimentos em PE/VC. Ganhos são tributados apenas no final do prazo, conforme o
resultado final obtido pelo veículo. Quando recebe os recursos de volta, cada investidor paga
a alíquota a qual está sujeito. Caso a distribuição de ganhos seja feita na forma de títulos
mobiliários (Gompers e Lerner, 1999), o investidor só arca com o eventual imposto quando de
sua alienação ou liquidação. Assim, investidores isentos de impostos de renda, tais como os
fundos de pensão, são beneficiados.
Por causa destes fatores citados, a LP acabou se tornando a estrutura legal de preferência da
indústria de PE/VC. Foi implantada nos sistemas jurídicos de países tais como Canadá, Chile
e paraísos fiscais como Bermuda, Panamá e Ilhas Cayman. Ribeiro (2005) destaca que, como
tal estrutura não está prevista na legislação brasileira, as LPs atuantes no país têm todas elas
sede no exterior.
2.5.2. FASE DE INVESTIMENTO
O segundo estágio, o processo de investimento dos fundos levantados em empresas do
portfólio é o passo mais importante no ciclo do capital de risco. Conforme Plagge (2006),
neste estágio, investidores capitalistas buscam investimentos com alta taxa de retorno, que
varia de mais de 100% no caso de capital semente para até 30% em financiamentos de
empresas em estágios mais avançados. Como o risco de uma perda total do investimento gira
em torno dos 20%, essas altas taxas de possíveis retornos são cruciais para compensar as
perdas resultantes dos inevitáveis fracassos. No fim das contas, um retorno estimado de 20%
ao ano é necessário para justificar a existência de um determinado fundo em função dos altos
riscos e baixa liquidez associados ao dinheiro de capital de risco.
Pelo ponto de vista do investidor, o investimento de capital de risco apresenta as
seguintes características (Tosta de Sá,1994 e Leonardos ,1994):
a) Participação minoritária;
b) Participação temporária do investidor (de cinco a sete anos);
c) Participação ativa, por meio do apoio gerencial de alto nível prestado;
d) Expectativas de elevado retorno sobre o capital aplicado; e
e) Realização por meio de instrumentos de investimentos sem garantias.
28
Existem alguns critérios de avaliação costumeiramente empregados pelos fundos de
capital de risco na hora de selecionar as empresas que receberão os investimentos. São eles:
Capital humano de primeira classe;
Retorno sobre o investimento (5 a 10 vezes);
Vantagem competitiva;
Regras de saída;
Influência do investidor na gestão do negócio.
Como forma de mitigar riscos, os capitalistas investidores normalmente realizam
aportes de capital por etapas ou rodadas, no jargão da indústria. Ou seja, injetam dinheiro em
diferentes estágios do ciclo de vida de uma empresa no seu portfólio, geralmente quando
alguma meta é atingida. Isso não apenas reduz o risco de perder grandes somas de dinheiro
como ajuda os investidores a exercer influência nas empresas nas quais são sócios.
Se um investimento não obtiver a performance esperada ou se cresceram divergências
sobre a direção a ser tomada no futuro por uma empresa, os investidores capitalistas podem
simplesmente cortar o investimento e assim virtualmente forçar os gestores de uma empresa
de seu portfólio a mudar de posição. Afinal, como afirmam Bergemann e Hege (1998) e
Lerner (1995), o monitoramento próximo por meio do conselho de administração é um
componente essencial das atividades dos capitalistas investidores e podem adicionar um valor
considerável à companhia.
Bygrave e Timmons (1992) discutiram as diversas alternativas do financiamento por
ações para os diversos estágios de crescimento e desenvolvimento da empresa. A Tabela na
página a seguir mostra as suas conclusões.
29
Tabela 6. Financiamento em ações e estágio de crescimento das empresas
Anos de vida da
empresa
Estágio da
empresa
Faturamento da
empresa/ano (US$)*
Fonte de financiamento
-3 a 0 Concepção/
Criação
Até 250 mil Poupança pessoal, família
e amigos
0 a 2 Start-up De 50 mil a 500 mil Angel investors
2 a 4
Estágio Inicial
Acima de 1 milhão Capital de risco
Acima de 350 mil Small Business
Investment Companies
(SBIC)
Acima de 350 mil Parcerias e alianças
estratégicas
4 em diante
Crescimento/
Expansão
De 350 mil a 5 milhões Private Equity
De 1 milhão em diante Captações em mercado
aberto
* O valores de faturamento anual na tabela acima não são valores absolutos. Eles devem ser adaptados às características de cada país.
Fonte: Bygrave e Timmons, 1992; Deutscher, 2001. Adaptado por Pavani, 2003
2.5.3. FASE DESINVESTIMENTO
Se um investimento for bem-sucedido, os capitalistas investidores tentaram encerrar o
seu ciclo com um desinvestimento. O prazo para atingir esta etapa varia de país para país: nos
Estados Unidos é de 5 a 7 anos, na Europa está em torno de 10 e no Japão chega a 17 anos
(OECD, 1998). Os investidores podem optar por três caminhos, basicamente, conforme
Pavani (2003):
Mercado de ações – a empresa do portfólio do fundo de capital de risco faz a
abertura de seu capital e, através de uma oferta pública inicial, oferece ao mercado
as participações para o público. Esta forma permite que a empresa alcance o maior
valor, e o investidor, o maior retorno;
Venda privada – pode ser feita para outra empresa, geralmente interessada em
algum ativo estratégico, outro investidor ou empregados. O investidor pode
conseguir retorno expressivo em algumas operações.
30
Recompra – É a venda para a própria empresa ou para os acionistas fundadores, e
se realiza quando o investimento foi mal sucedido do ponto de vista de atrair
terceiros para o negócio, sendo, no entanto, um empreendimento auto-sustentável.
Segundo Plagge (2006), esta última operação de recompra é mais restrita ao
financiamento nos estágios de crescimento mais avançados. Normalmente, jovens empresas
de alta tecnologia não possuem recursos para fechar este acordo. No caso delas, o IPO ou a
venda privada representam a saída mais adotada por investidores capitalistas.
Uma vez que os três estágios tenham se completado, o ciclo do capital de risco pode
começar novamente. Como a vida da maioria dos fundos fica na casa dos oito ou dez anos, o
dinheiro ressultante da venda de empresas no portfólio para terceiros retorna aos investidores
originais, que têm a liberdade para decidir se querem colocar o dinheiro em um novo fundo
criado pelos menos investidores capitalistas, se querem apostar em uma nova parceria que
promete retornos mais altos ou migrar para outros tipos de aplicações. O gráfico 2 resume o
ciclo de investimento do capital de risco.
Gráfico 2. Ciclo de investimento em uma start-up
Fonte: NVCA
31
2.6. SELEÇÃO, GOVERNANÇA E MONITORAMENTO
Para poderem financiar projetos com as características mencionadas anteriormente, os
gestores de PE/VC utilizam práticas sofisticadas de seleção, governança e monitoramento
(Sahlman, 1990).
Como uma regra geral, afirma Plagge (2006), as instituições de PE/VC englobam
intermediários financeiros que têm no alvo – start-ups inovadoras de alto risco – e nos
métodos as suas características identificadoras. Esses métodos incluem relacionamentos
próximos, monitoramento formal e informal, mentoreamento e aconselhamento, que se
constituem na chave da vantagem competitiva da indústria de PE/VC como opção de funding
para start-ups em relação aos empréstimos bancários tradicionais ou outras fontes de recursos.
Titericz (2003) acrescenta que, na sua escolha de investimentos, investidores
capitalistas verificam três principais atributos: estratégia de saída, potencial de crescimento e
equipe gerencial competente. Como a demanda geralmente é superior à oferta, Pavani (2003)
nota que, em geral, uma empresa de capital de risco analisa muitos planos de negócios e
investe em poucos. Nos Estados Unidos, o número que é citado por profissionais de mercado
é um investimento para mil planos recebidos. Número citado pela Invent, investidor
brasileiro, foi de receber cerca de 1.350 planos de negócios e investir em sete empresas.
Para Gorman e Sahlman (1989), citados em Ribeiro (2005), a atividade de VC
representa um modelo de atuação que, ao longo do tempo, incorporou princípios de
governança que o permite lidar com situações de elevada incerteza, informação assimétrica,
baixa liquidez e pouca ou nenhuma garantia real nos investimentos. Esses princípios são
relativamente custosos de serem implantados e mantidos. Daí a sua limitação a projetos com
elevada expectativa de retorno.
Com base nos trabalhos de Gorman e Sahlman, Ribeiro (2005) agrupou os princípios
de governança utilizados pela indústria de PE/VC em cinco:
• Investimento por etapas: realização de investimentos por etapas – ou rodadas,
preservando a opção de abandono;
• Remuneração por resultado: remuneração do agente ligada ao resultado;
• Garantias de liquidez futura: possibilidade de impor ao agente a devolução do
capital;
32
• Monitoramento constante: acompanhamento frequente do desempenho e influência
sobre a gestão e a governança corporativa. Os principais são investidores ativos,
conforme descrito por Jensen (1991);
• Restrições ao desalinhamento de Interesses: demais medidas para garantir que o
agente represente os interesses do principal.
Muitos estudos empíricos indicam que os capitalistas de risco precisam de experiência
para selecionar, monitorar e dar apoio de forma exitosa a empresas de alta tecnologia e que
precisam de reputação para levantar recursos de investidores externos. Por sua vez, o acúmulo
de experiência e a reputação adquirida ao longo dos anos geram uma interdependência na
trajetória de sucesso das empresas, ao passo que ondas sucessivas de empresas malsucedidas
apoiadas por capitalistas de risco sem experiência minam a gênese dos mercados de capital de
risco (Schertler, 2002b).
Pavani (2003) ressalta que ao se tornar sócio do negócio, “o investidor capitalista
passa a ser mais do que um mero „fornecedor‟ de capital”. Seu envolvimento com a empresa é
alto, o que significa, muitas vezes, interferência na condução do negócio. Esse alto
envolvimento implica, de um lado, na perda de independência dos gestores da empresa e na
necessidade de informar o investidor sobre o desempenho da companhia; de outro, encaminha
a empresa para uma maior organização, profissionalização da gestão e criação de processos.
Na prática, além da etapa de monitoramento do investimento ou pós-investimento, a
fase de seleção, avaliação e enquadramento dos investimentos, ou seja, as fases de pré-
investimento, são aquelas que mais demandam tempo e esforço do gestor de PE/VC. É
também a fase em que a capacidade e a experiência do analista podem agregar mais valor no
processo, ou seja, em que se pode incrementar o retorno (Kaplan e Strömberg, 2001). Tal
afirmação confirma a tese de que não existe na literatura um modelo de avaliação para
precificar os investimentos de capital de risco amplamente aceito entre os capitalistas de risco,
investidores e empreendedores, conforme observação de Amit et alli. (1999).
O trabalho de Hellman and Puri (2000) conclui que o capital de risco é um fator
interno importante nos estágios iniciais de uma start-up. Evidências indicam que a presença
de funding de capital de risco é relevante para explicar diferenças entre empresas iniciantes.
Isso porque o capital de risco possui características que o diferenciam de outras opções de
financiamento (Gompers e Lerner, 1999, capítulo 7), devotando recursos significativos de
33
gestão para entender novas tecnologias e mercados, encontrar start-ups promissoras e provê-
las do capital necessário e realizar o coaching delas durante os seus estágios iniciais.
34
CAPÍTULO 3 – O MODELO VENCEDOR AMERICANO
3.1. BREVE HISTÓRICO
Embora o Vale do Silício seja, sem dúvida, o principal centro de capital de risco do
mundo hoje, esta indústria, na verdade, começou do outro lado dos EUA, em Boston. O seu
surgimento formal está relacionado à fundação da American Research and Development
Corporation (ARDC), em 1946, por Georges Dorit, chamado mais tarde de "pai do capital de
risco", ao lado de dois sócios (Bygrave and Timmons, 1992; Kenney and Florida, 2000).
Mas o investimento que trouxe fama e lucros à ARDC ocorreu bem mais tarde, em
1957, um ano antes da criação da primeira firma de capital de risco da Costa Oeste americana,
a Draper, Gaither & Anderson. Trata-se do aporte de US$ 70 mil e mais R$ 2 milhões em
empréstimos à DEC, empresa líder na venda de sistemas de computador, software e
periféricos dos anos 1960 aos anos 1990. Esse investimento inicial foi multiplicado várias
vezes depois do IPO da empresa, em 1966. A ARDC continuou realizando aportes até 1971,
data da aposentaria de Doriot, contabilizando investimentos em mais de 150 empresas.
Os fundos de capital de risco tornaram-se relevantes apenas a partir da década de 1970
(RIECHE e Santos, 2006). Desde a criação dos primeiros fundos, os EUA despontam como a
principal referência da indústria mundial. Segundo Tosta de Sá (1994), as principais lições
extraídas da primeira fase da atividade de capital de risco nos EUA foram as seguintes:
A captação de recursos do grande público mostrou-se inadequada para esse tipo de
atividade;
O retorno sobre o investimento é de longo prazo;
É fundamental a manutenção de uma posição líquida para socorrer empresas ao
longo da maturação de seus projetos;
O acompanhamento gerencial é fundamental; e
Às vezes, o retorno excepcional é garantido por um único investimento da carteira
Em 1979, depois que o governo americano anunciou nova regulamentação para os
investimentos dos fundos de pensão e reduziu os impostos sobre ganhos de capital, os
investimentos desses fundos foram alavancados. Naquele ano, eles representavam apenas
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a
l
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B
35
15% do capital da indústria. Em 1986, os fundos de pensão já eram responsáveis pela metade
do capital comprometido em PE/VC (Sahlam, 1990).
Ribeiro (2005) observa que o grande ciclo de institucionalização da indústria de
capital de risco americana ocorreu entre o início dos anos 1960 e a primeira parte dos 1980.
“Em 1983, o modelo já estava suficientemente formatado e testado para que pudesse receber
US$ 4,5 bilhões em novos recursos”. A cifra representava uma captação recorde em
comparação a períodos anteriores. Ao final de 1983, a indústria já contabilizava US$ 12,1
bilhões, ou três vezes mais do que havia sob gestão ao final da década de 1970.
Desde então, a indústria cresceu de forma exponencial até atingir pico em 2000,
quando foram aplicados US$ 106 bilhões. Embora a indústria de PE/VC tenha sofrido suas
maiores modificações nos anos 1980, a macroestrutura do setor evoluiu.
Cornelius (2005) analisou mudanças na indústria americana nos últimos 15 anos e
focou na mudança de perfil profissional dos gestores. A autora observou que o gestor
contemporâneo de PE/VC vem do setor financeiro e teve formação equivalente ao MBA.
Comparado ao gestor de outrora, é mais avesso a risco e, em geral, menos qualificado a
auxiliar empreendedores na superação de obstáculos ligados à execução de estratégias
empresariais. Conseqüentemente, os investimentos feitos por este gestor estão direcionados
para empresas maduras, onde já há um corpo de executivos experientes no negócio.
Zider (1998) explica que, ao contrário da percepção popular, o capital de risco
desempenha apenas um papel menor no funding de inovação básica. Prova disso é que
investidores capitalistas fizeram aportes de mais de US$ 10 bilhões em 1997, mas apenas 6%,
ou US$ 600 milhões, foram destinados a start-ups.
Além disso, a estimativa do autor é que menos de US$ 1 bilhão do bolo tenha sido
aplicado em pesquisa e desenvolvimento. A maioria do dinheiro foi para novas rodadas de
investimento em projetos desenvolvidos através de aportes governamentais (US$ 63 milhões)
e de corporações (US$ 133 bilhões).
Nos EUA, uma importante fonte de capital semente são os chamados business angels,
investidores ricos que ajudam a suprir a falta de recursos de fontes externas para financiar as
empresas iniciantes. Além de prover o capital semente, tais investidores costumam auxiliar as
empresas a encontrarem importantes clientes e a recrutar funcionários. Como dito
anteriormente, estimativa da revista The Economist aponta que os business angels sejam
responsáveis, nos EUA, pela introdução de aproximadamente 40% das novas oportunidades
36
de negócios das empresas de capital de risco. Onde, então, a indústria de capital de risco
desempenha um papel importante no ciclo de vida das empresas inovadoras? Nas palavras de
Zider (1998, 32):
(...) no período na vida de uma empresa quando ela começa a comercializar a sua inovação.
Nós estimamos que 80% do dinheiro investido por investidores capitalistas é destinado à
construção da infraestrutura necessária para o crescimento do negócio – em investimentos
caros (manufatura, marketing e vendas) e no seu balanço (provendo ativos fixos e capital
humano). Capital de risco não é dinheiro de longo prazo. A ideia é investir no balanço e
infraestrutura até a empresa atingir um tamanho e credibilidade suficientes para que possa
ser vendida a uma corporação ou de modo a permitir que fundos de equity possam entrar e
prover liquidez.
Na essência, o capital de risco compra uma fatia da ideia de um empreendedor, nutre-a
por um período de tempo determinado e depois sai do negócio com a ajuda de um banco de
investimento.
Gráfico 3: como funciona a indústria de capital de risco nos EUA
Fonte: Zider (1998). Modificado pelo autor
Na indústria de capital de risco, timing é tudo. E o período ideal, segundo Zider (1998)
é a fase adolescente do ciclo de vida de uma empresa. Nesta fase de crescimento acelerado, o
financiamento de eventuais vencedores e perdedores é notavelmente parecido, o que explica o
alto risco e a conseqüente alta taxa de retorno demandada por deste tipo de funding, como
explica o gráfico a seguir.
37
Gráfico 4: qual etapa da vida de uma empresa concentra o capital de risco
Fonte: Zider (1998). Modificado pelo autor
3.2. FATORES DECISIVOS
Para Gorgulho (2006), a estrutura do sistema financeiro americano foi um poderoso
fator de estímulo ao desenvolvimento da atividade de capital de risco no país.
38
Isso porque a legislação restritiva em relação ao sistema bancário contribuiu para que
os bancos não tivessem o mesmo papel que representaram na experiência de industrialização
de outros países. Esta legislação limitou o porte dos bancos, ao proibi-los de atuar em âmbito
nacional, e tornou-os especializados, restringindo aos bancos comerciais a operação com
títulos e seguros, bem como a aquisição de ações de empresas não-financeiras, como acontece
com os bancos múltiplos em outros países.
Outro ponto importante foi o precoce estabelecimento de mercados de ações, inclusive
de mercados exclusivos para empresas de menor porte, que se constitui em um ingrediente
fundamental para a concretização do ciclo de investimento de capital de risco. A título de
comparação, a Nasdaq, bolsa eletrônica que funciona no mercado de balcão americano e
negocia ações de empresas de alta tecnologia, tem listadas mais de 3,5 mil companhias de 46
países, representando um valor total de mercado de US$ 6,9 trilhões. O número de empresas
listadas na BM&FBovespa é quase 10 vezes menor, ficando na faixa das 400.
Historicamente, nos EUA, uma companhia não entra no mercado de capitais sem
faturamento de US$ 15 milhões, ativos de US$ 10 milhões e um histórico razoável de lucros
(Zider, 1998). Menos de 2% das cinco milhões de empresas nos EUA possui faturamento
superior a US$ 10 milhões. Mesmo com a redução de custos para a realização de um IPO, o
autor aponta que a janela de financiamento para start-ups abaixo desta linha continua
pequena. E é aí que entra o capital de risco, preenchendo o espaço entre os fundos para
inovação e as fontes tradicionais de financiamento.
Desde a sua formação, no início dos anos 1970, a indústria de capital de risco
americana investiu US$ 456 bilhões em mais de 27 mil empresas (National Venture Capital
Association, 2008). Embora muitas destas empresas tenham falido, sucessos como eBay,
Apple, Intel e Google levaram à criação de novas indústrias e novas maneiras de fazer
negócios. Segundo a NVCA, depois de muitos anos de crescimento anômalo e contração
promovidos pela bolha de tecnologia e o seu estouro em 2000, a indústria de capital de risco
retornou, nos últimos anos, para uma trajetória de crescimento constante, com os investidores
capitalistas investindo entre US$ 20 bilhões e US$ 30 bilhões por ano.
A indústria aprendeu que não pode avançar para novos patamares nos setores existentes da
indústria. Entretanto, com inovações promissoras ocorrendo na área de energia limpa, novas
descobertas no campo da medicina personalizada e avanços na computação em nuvem,
espera-se que o capital de risco continue a crescer de maneira firme nos próximos anos.
39
Um crescimento que vem com a promessa de mais empregos e receita para a economia dos
EUA (NVCA, 2008).
Gráfico 5: Investimento de capital de risco nos EUA 1970-2008
Fonte: MoneyTree Report da PwC e NVCA,com base em dados da Thomson Reuters.Modificado pelo autor
3.3. IMPACTO ECONÔMICO
Segundo estudo da NVCA, para cada dólar de capital de risco investido nos EUA
entre 1970 e 2008, foram gerados US$ 6,36 em receita em 2008. Além disso, foi criado um
emprego no país para cada US$ 37.702 de capital de risco aplicados no mesmo período.
O mesmo estudo diz que, ainda em 2008, as empresas com aporte de capital de risco
eram responsáveis por 12,1 milhões de empregos, ou 11% do total do setor privado
americano, e receita de US$ 2,9 trilhões, o equivalente a 21% do Produto Interno Bruto (PIB)
americano. Os setores em que o impacto do capital de risco era maior na geração de emprego
e receita eram os de varejo/distribuição, serviços de saúde, indústria/energia e computadores e
periféricos.
Além disso, há evidências de que o apoio via capital de risco faz com que as empresas
jovens cresçam mais rápido, criem mais valor e gerem mais emprego do que outras empresas
iniciantes. Pesquisas empíricas nos EUA mostraram que o capital de risco pode aumentar de
forma significativa a habilidade de novas firmas para criar emprego e riqueza. As empresas
40
apoiadas por capital de risco perseguem inovações mais radicais e estratégias de
comercialização mais agressivas.
O capital de risco aumenta a velocidade de profissionalização e o crescimento dessas
empresas (Keuschnigg, 2004). Por outro lado, cabe mencionar que é mais difícil estudar a
indústria de capital de risco - em comparação com outras indústrias financeiras -, uma vez que
muito pouca informação relevante é de domínio público (as empresas financiadas são
privadas). Além disso, não existem bolsas organizadas para investimentos de capital de risco,
o que reduz ainda mais a oferta de informações (Amit et al., 1998).
Quando comparadas às demais empresas, aquelas financiadas por PE/VC
apresentavam o dobro da receita, pagavam três vezes mais impostos, exportavam o dobro e
investiam o triplo em pesquisa e desenvolvimento (P&D) em relação ao ativo total. (Taylor et
al ). Mais importante, o gasto em P&D se revertia em inovação, como revelou o estudo de
Kortum e Lerner (2000) sobre o impacto do investimento de PE/VC na geração de patentes.
Graças aos investimentos de PE/VC, empresas como Microsoft, Compaq, Fedex,
Apple, Sun, Amazon, Lotus, Cisco, Staples, Netscape, eBay, JetBlue, Intel, Amgen,
Medtronic, Oracle e Google cresceram e, rapidamente, tornaram-se grandes corporações. As
evidências quanto ao impacto econômico-social da atividade de PE/VC são ainda mais
impressionantes quando se considera que os investimentos realizados pelo setor em 2002
representavam não mais de 0,6% do PIB americano.
41
CAPÍTULO 4 – O QUE É QUE O VALE DO SILÍCIO TEM?
Em dezembro de 1980, menos de cinco anos após a sua fundação, a Apple Computer
abriu o seu capital, no que se tornou a maior oferta pública inicial do mercado de ações
americano desde a Ford Motor Company, em 1956, criando mais milionários instantâneos do
que qualquer outra empresa até então. A oferta de capital de risco explodiu depois do bem-
sucedido IPO de US$ 1,3 bilhão de uma empresa criada numa garagem por Steve Jobs e Steve
Wozniak (Livingston, 2007).
Hoje a Apple é uma das muitas empresas que se tornaram símbolos do sucesso de uma
região ao Norte da Califórnia, conhecida como Vale do Silício, que engloba 14 cidades. Essa
região ficou assim conhecida por conta da sua liderança na produção de semicondutores no
passado, mas se reinventou ao longo dos anos a ponto de se tornar sinônimo da indústria de
alta tecnologia americana.
Além da Apple, um número significativo de empresas de alta tecnologia inovadoras
foram fundadas na região e criaram milhares de empregos. Hewlett Packard, National
Semiconductor, Intel, AMD, Oracle, Cisco Systems, Yahoo! eBay e Google, apenas para citar
as mais conhecidas, foram fundadas e têm a sua sede no vale.
Para Ferrary e Granovetter (2009), a região "é um objeto privilegiado de pesquisa no
esforço de entender clusters industriais e inovações”.
Os números ajudam a dimensionar esta Meca da tecnologia. Em 2005, o Vale do
Silício contava 1,15 milhão de empregos e 22 mil companhias (Joint Venture, 2008). Em
2008, de cada 1.000 trabalhadores da área de tecnologia empregados nos EUA no setor
privado, 285,9 estavam na região de São José/Vale do Silício (AEA, 2008), a maior
concentração do país.
De acordo com este mesmo estudo, esses trabalhadores também eram os mais bem
pagos, com salário médio anual de US$ 144,8 mil, seguidos por San Francisco (US$ 118,5
mil) e Austin, Texas (US$ 100,5 mil). E em termos de números de patentes registradas, 11 das
top 20 cidades dos EUA em 2006 pertenciam à região do Vale do Silício (Joint Venture,
2008). Mas Ferrary e Granovetter (2009) observam que, "a despeito da enorme cobertura
jornalística e dos numerosos livros, não ainda não entendemos por que o Vale do Silício foi o
berço de tantas inovações disruptivas e grandes empresas”.
42
Para os autores, o fracasso de vários legisladores mundo afora em reproduzir o cluster
do Vale do Silício revela uma incompreensão da dinâmica de inovação da região, cuja
durabilidade da competência inovadora nos últimos 70 anos também precisa ser melhor
explicada. Neste debate, Steven M Davidoff, articulista do jornal The New York Times,
ressalta que não existe nenhum consenso sobre como criar o próximo Vale do Silício. E o fato
de não haver uma fórmula pronta é um grande problema para aqueles países que têm se
aventurado neste caminho. Davidoff argumenta que “França, Noruega e Malásia fracassam,
apesar dos seus esforços. Nos EUA, A Califórnia continua dominando”.
4.1. ONDAS DE INOVAÇÂO
Não é de hoje que o Vale do Silício atrai as melhores mentes empreendedoras.
Historicamente, esta região se caracteriza por uma alta taxa de criação de start-ups. De 1990 a
2000, 2,1 mil empresas de alta tecnologia foram fundadas por ano, na média (Zhang, 2003).
Uma das especialidades do Vale do Silício sempre foi provocar terremotos
econômicos que abalam as fundações da economia global. Cataclismas como estes
aconteceram ao menos três vezes nos últimos 60 anos: a comercialização dos circuitos
integrados, o desenvolvimento do computador pessoal e a aplicação da internet. Cada uma
destas inovações mudou a natureza da economia de modo fundamental, assim como as
estradas de ferro, a eletricidade e o rádio fizeram no passado (Join Venture, 2001).
Gráfico 6: Evolução do Vale do Silício 1950 -2000
Fonte: Silicon Valley Edge. Alterado pelo autor
43
Cada onda de inovação transformou de maneira disruptiva a economia do Vale do
Silício e foi seguida por uma onda de crescimento. A região sofreu diversas crises, mas
conseguiu se reinventar e fortalecer a sua capacidade inovadora (Kenney & Von Burg, 2000).
Estudo da Joint Venture (2001) aponta motivos para os principais cenários de recessão
enfrentados pelo Vale do Silício.
1970 - cortes nos gastos da Secretaria de Defesa americana do Vietnã;
1985 - excesso de oferta e competição estrangeira na indústria de semicondutores;
1990 - cortes nos gastos da Defesa americana e excesso de oferta na indústria de
computadores pessoais;
.
2000 - estouro da chamada bolha das ponto.com, as empresas de internet, e o excesso
de oferta na indústria de telecomunicações.
Em cada ciclo, no entanto, o Vale do Silício provou ser um grande centro de inovação
e empreendedorismo e surfou a onda seguinte. Durante a recessão dos anos 1970, as empresas
do Vale transformaram as tecnologias de defesa em aplicações comerciais. O circuito
integrado, em particular, fez a transição do uso militar para o uso comercial. Durante a
recessão dos semicondutores, em 1985, as empresas substituíram os chips tratados como
commodities por microprocessadores com alto valor agregado. Nos anos 1990, o Vale do
Silício aprendeu como transformou a rede ARPANET, bancada pelos militares americanos, na
internet comercialmente viável.
Esse sucesso ocorreu mesmo num contexto de competição cada vez mais acentuada.
Se o Japão e outros países demoraram 25 anos competir com a indústria dos semicondutores
do Vale do Silício nos anos 1980, a vantagem competitiva da região durou menos de cinco
anos com a internet nos anos 1990 (Join Venture, 2001).
44
4.2. A FÓRMULA DO SUCESSO
Como já foi dito anteriormente, ninguém ao certo sabe a fórmula do sucesso do Vale
do Silício. Ao menos cinco razões têm sido apontadas nos últimos anos, que serão brevemente
tratadas a seguir:
Ousadia empreendedora;
Ambiente único;
Capital de risco mais abundante e mais fácil de ser obtido;
Foco em setores e não em empresas; e
O papel desempenhado pelo capital de risco, motivo sobre o qual falaremos mais
detalhadamente.
4.2.1. OUSADIA EMPREENDEDORA
A adversidade sempre funcionou como um motor de inovação para o Vale do Silício,
seja ela resultante de crise financeira ou pela competitividade ameaçada. A mesma ideia,
embora com mais licença poética, está contida em uma afirmação de Paul Saffo, um futurista
da tecnologia de Menlo Park: “O fracasso é uma parte essencial do nosso ecossistema. É
como um incêndio florestal abrindo espaço para um novo crescimento” (Join Venture, 2001).
Zider (1998) faz uma observação mais pessimista, porém igualmente relevante. Para
ele, as empresas financiadas pelo capital de risco atraem pessoas talentosas apelando para a
“mentalidade de loteria”.
Apesar do alto risco de fracasso em novas empreitadas, engenheiros e homens de
negócio deixam seus empregos demonstrando falta de capacidade ou de vontade de perceber
qual arriscada pode ser uma start-up. A situação deles pode ser comparada aos dos jogadores
de basquete esperançosos no segundo grau, que devotam horas ao esporte apesar da
minúscula probabilidade de se tornarem profissionais e ganharam milhões.
Em resumo, a mentalidade de que o fracasso é algo positivo no contexto da inovação e
do empreendedorismo estimula novas tentativas. Como disse uma vez o criador da Apple,
Steve Jobs, "Eu sou a única pessoa que conheço que perdeu um quarto de bilhão de dólares
em um ano. Isso é muito edificante."
45
4.2.2. AMBIENTE ÚNICO
Steven M. Davidoff, articulista do jornal The New York Times, afirma que alguns
teóricos apontam o ambiente inovador e empreendedor único do Vale do Silício como
resultado do gasto militar na área, combinado a duas grandes instituições de pesquisa e o
surgimento de empresas de tecnologia derivadas de companhias com o lendário centro de
pesquisa da Xerox, na cidade de Palo Alto, "criou a massa crítica que estimulou a formação
de fundos de capital de risco e seduziram as pessoas inovadoras".
Estudo da Joint Venture (2001) afirma que o segredo do Vale do Silício é o fato de ele
ser um habitat especial para inovação e empreendedorismo, que consiste de redes e
relacionamentos densos e flexíveis entre empreendedores, investidores capitalistas,
pesquisadores universitários, advogados, consultores e empregados altamente qualificados,
que sabem como traduzir ideias em novos produtos comerciais e serviços de maneira rápida o
suficiente para estar sempre à frente na curva da inovação.
Essas redes de relacionamento densas e a proximidade geográfica promovem a
interação face a face necessária para este arranjo funcionar, o que não acontece em outros
lugares criativos, como os centros financeiros de Londres, Manhattan e Hong Kong ou na
indústria cinematográfica de Hollywood. O estudo completa:
Inovação é um processo “social”. Raramente ele ocorre porque um único indivíduo ou uma
empresa levam uma ideia ao mercado. Ao contrário, envolve muitas pessoas desempenhando
muitos papéis em um processo colaborativo dinâmico ao redor de equipes criativas e
interação face a face. Trabalho criativo, ao contrário da rotina de produção, requer
proximidade. Inovação não é um processo linear, mas um processo ativo de aprendizado
através da tentativa e erro.
De fato, o Vale do Silício se tornou mais conhecido por sua inovação e
empreendedorismo do que por uma indústria específica ou tecnologia.
4.2.3. CAPITAL DE RISCO ABUNDANTE E MAIS ACESSÍVEL
Trinta e cinco das 50 maiores empresas financiadas por capital de risco nos EUA estão
na Califórnia, segundo a lista de 2011 elaborada pelo Wall Street Journal.
46
Uma das explicações para o resultado é que, ao contrário de outras partes dos EUA, a
indústria de VC no Vale do Silício investe a maior parte dos seus fundos em negócios locais
(Florida e Kenney, 2000) – vale lembrar que o Facebook foi fundado em Boston, mas migrou
para a região em busca de funding. (Von Burg e Kenney, 2000) argumentam que o pool
impressionante de empreendedores na região é a causa deste fenômeno.
O desenvolvimento dos fundos de VC ocorreu paralelamente ao rápido crescimento
das indústrias de alta tecnologia do Vale do Silício e o capital de risco ajudou a bancar cada
onda de inovação na região. Levantamento de Ferrary e Granovetter (2009) mostra que, de
1995 a 2005, investidores capitalistas fizeram aportes de US$ 111 bilhões, 32,48% de todo o
capital de risco aplicado nos EUA no período.
Uma comparação do investimento per capita de capital de risco entre o Vale do Silício
e outros centros inovadores do mundo evidencia a diferença. Apenas em 2005, o Vale do
Silício registrou investimento per capita 32 vezes maior do que o da Inglaterra, 120 vezes ao
da França e 181 vezes ao da Alemanha.
Tabela 7: investimento do capital de risco no mundo
População
(milhões)
Investimento 2005
(US$ milhões)
Investimento
1995-2005
(US$ bilhões)
US$/hab
2005
US$ /hab
1995-2005
EUA 295,6 2.276,8 341,7 77 1.158
Vale do Silício 2,2 8.115,0 111,0 3.341 45.691
Europa 460,2 15.205,4 119,3 33 259
Inglaterra 59,9 6.278,1 35,2 105 588
Alemanha 82,0 1.518,7 19,9 18 242
França 60,6 1.686,3 16,4 28 270
Bélgica 10,5 136,0 3,2 13 304
Dinamarca 5,1 1.003,3 2,6 185 487
Finlândia 5,2 179,8 1,9 34 364
Fonte: Ferrary e Granovetter, 2009, com dados da NVCA. Modificado pelo autor
Com base nos dados de aportes de capital de risco realizados entre 1992 e 2001, o que
inclui 22,4 mil rodadas de investimento e 11 mil empresas, Zhang (2005) concluiu que as
start-ups do Vale do Silício têm acesso mais fácil ao capital de risco. “Elas recebem a
primeira rodada de capital de risco numa idade mais jovem e completam mais rodadas de
financiamento. Esse acesso mais fácil tem um efeito significativo na performance de uma
start-up no Vale do Silício”.
47
Ainda no Vale do Silício, start-ups completaram a primeira rodada de VC com a idade
média de 11,48 meses. A média dos EUA foi de 19,33 meses. Em relação ao número total de
rodadas completas, as start-ups do Vale do Silício alcançaram 2,61 no período de 1992 a
2001, contra a média nacional foi de 2,23 rodadas. Para completar, as start-ups do Vale do
Silício receberam os maiores aportes a cada rodada: US$ 10,91 milhões.
Gráfico 7: investimento de VC por regiões no 1º tri de 2011 nos EUA
Fonte: Money Tree Report
4.2.4. FOCO EM SETORES, NÃO EM EMPRESAS
Zider (1998), empreendedor do Vale do Silício, afirma que a noção de que
investidores capitalistas investem em boas pessoas e boas idéias é um mito. “A realidade é
que eles investem em boas indústrias - ou seja, indústrias que são mais competitivas do que o
mercado como um todo”.
O autor cita que, em 1980, quase 20% dos investimentos de capital de risco nos EUA
foram para a indústria de energia. Mais tarde, o fluxo de capital mudou rapidamente de
engenharia genética, varejo de nicho e hardware para CD-ROMS, multimídia,
telecomunicações e empresas de software.
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
Vale do
Silício
Boston
Nova York
Los Angeles
202
90
67
41
1.528,20
749
566
464 No. Negócios
Aporte (US$ milhões)
48
Segundo Zider, a aparente aleatoriedade destas mudanças entre tecnologias e
segmentos da indústria é mal compreendida: o segmento-alvo em cada caso estava crescendo
rapidamente, e sua capacidade prometia estar limitada pelos próximos cinco anos – ou seja,
seria impossível suprir a demanda.
Na verdade, investidores capitalistas focam no meio da clássica curva em S da
indústria. Eles evitam tanto os estágios iniciais, quando as tecnologias são incertas e as
demandas do mercado desconhecidas, e os estágios avançados, quando turbulências
competitivas e consolidações são inevitáveis e as taxas de crescimento caem dramaticamente.
Um exemplo é a indústria de hard disk drives (HDs). Em 1983, havia mais de 80 delas
nos EUA, metade financiada por capital de risco. No final de 1984, o valor de mercado da
indústria havia caído de US$ 5.4 bilhões para US$ 1,4 bilhão. Em 1998, havia sobrado apenas
cinco grandes players.
Zider reforça que a ideia é que se expandir num setor de alto crescimento é muito mais
fácil do que se ele estiver desacelerando ou decrescendo, como todo gestor sabe. Em outras
palavras, a despeito de todo o talento ou carisma de um empreendedor, ele raramente recebe
dinheiro da indústria de VC se estiver num segmento de mercado de baixo crescimento.
Investindo em áreas com altas taxas de crescimento, as firmas de VC, em primeiro
lugar, transferem o seu risco à habilidade dos gestores da companhia em executar. Além
disso, ficam maiores às chances de desinvestir, porque os bancos de investimento, neste
ponto, estão atrás de empresas de alto crescimento para trazê-las ao mercado de capitais.
4.3. O PAPEL DO VENTURE CAPITAL
Para Ferrary e Granovetter (2009), o Vale do Silício deve ser visto como um cluster de
inovação e não industrial.
Um cluster industrial é caracterizado por sua capacidade em gerar e desenvolver
inovações incrementais, que reforçam sua excelência e competitividade num domínio
específico da indústria. Por exemplo, a indústria financeira em Wall Street ou a indústria
cinematográfica em Hollywood. Já um cluster de inovação é caracterizado por sua habilidade
em gerar e desenvolver tecnologias disruptivas, que criam novos domínios para a indústria e
redesenham radicalmente o valor da sua cadeia produtiva.
49
Mas o que explica a durabilidade da capacidade inovadora do Vale do Silício? Para
responder a esta pergunta, os autores recorreram à teoria de redes complexas (CNT). Essa
teoria ajuda a explicar um fenômeno (biológico, tecnológico, sociológico etc.), que não
resulta da simples interação de um número reduzido de agentes de forma linear, mas é
produto de múltiplas interações não-lineares entre vários e diversos agentes caracterizadas. A
dinâmica da inovação no Vale do Silício, argumentam os autores, é às vezes reduzida a
apenas um agente (a Universidade de Stanford ou a HP) ou a interações entre poucos agentes
(universidades, laboratórios de pesquisa e grandes empresas). Na verdade, existem muitos
outros agentes envolvidos.
A CNT enfatiza a robustez (ou resiliência) de sistemas mais do que a sua estabilidade
para explicar como um sistema pode ou não superar mudanças radicais externas ou choques
competitivos. Como um sistema complexo, o Vale do Silício é formado por redes de agentes
heterogêneos, complementares e interdependentes. Ferrary e Granovetter afirmam que os
investidores capitalistas são a principal (e mais subestimada) fonte de robustez da rede
complexa de inovação do Vale do Silício. E apontam dois motivos principais.
Uma minoria das start-ups de alta tecnologia são financiadas por investidores
capitalistas no estágio inicial. O índice é de 9%, em média. Ou seja, de cada 2,1 mil
empresas de alta tecnologia criadas por ano, apenas 200 conseguem capital semente.
Por outro lado, quase todas as grandes empresas de alta tecnologia do Vale do Silício
foram financiadas por VC. Ou seja, as firmas de VC financiam o estágio inicial das
start-ups mais bem-sucedidas
Estudos internacionais sobre clusters de alta tecnologia apontam que a maior diferença
entre o Vale do Silício e outros centros ao redor do mundo não é o tamanho das
universidades, a presença de grandes companhias ou a qualidade dos laboratórios de
pesquisa. Mas a enorme presença de firmas de VC (Lee, Miller,Hancock & Rowen,
2000). Em 2006, havia 180 delas no Vale do Silício, 650 nos EUA.
A investigação das redes complexas da região aponta para cinco funções específicas
da indústria de VC como sua contribuição à robustez do sistema. Além de financiar start-ups,
os fundos selecionam os projetos mais promissores da região, sinalizam as melhores start-ups
para a comunidade de negócios, acumulam e espalham conhecimento empresarial no cluster e
servem de ligação para os agentes interdepententes da rede.
50
4.3.1. O CASO GOOGLE
Ferrary e Granovetter (2009) afirmam que, ao menos, 12 diferentes agentes são
envolvidos na criação e no desenvolvimento de start-us bem sucedidas.
Um exemplo disso, observam os autores, pode ser visto com clareza na criação do
Google. Ela envolveu a Universidade de Stanford, onde os fundadores estudaram para receber
o título de PhD. Mais tarde, a universidade forneceu empregados à empresa e continua a testar
novos serviços desenvolvidos pelo Google. Dois dos maiores fundos de capital de risco da
região, Sequoia Capital e Kleiner, Perkins, Caufield & Byers (KPCB), aportaram dinheiro na
start-up. A firma de advogados Wilson, Sonsini, Goodrich & Rosati, localizada em Palo Alto,
foi encarregada da dimensão legal do empreendimento.
Yahoo! (financiado pela Sequoia Capital) e AOL (financiado pela KPCB) foram os
dois primeiros clientes do Google. Jornais locais, como o San Jose Mercury News e o San
Francisco Chronicle, deram visibilidade è companhia. O Hambrecht & Quist e o CSFB, dois
bancos de investimento de San Francisco, organizaram o IPO do Google. Em 2006, a empresa
já era uma das maiores do Vale do Silício e contribuiu para o sistema complexo adquirindo
start-ups na região, entre elas o YouTube (do portfólio da Sequoia Capital).
No Vale do Silício existem (Ferrary e Granovetter, 2009):
10 universidades;
40 centros de pesquisas privados ou públicos;
8,7 mil grandes empresas, com mais de 100 empregados;
180 fundos de VC;
3,2 mil escritórios de advocacia especializados;
329 agências de recrutamento e seleção;
1.913 firmas de contabilidade;
311 companhias de relações públicas;
700 bancos comerciais e 47 de investimento;
100 jornais voltados ao ambiente de alta tecnologia do Vale do Silício, que empregam
em torno de 500 jornalistas.
São estes 12 agentes que interagem entre si no ciclo de vida de uma start-up.
51
5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desde os anos 1950, o Vale do Silício soube se reinventar sempre que exposto a crises
e choques competitivos. Cada recessão foi seguida de uma onda de inovação disruptiva que
mudou a economia global (JOIN VENTURE, 2008).
Ferrary e Granovetter (2009) observam que os fundos de VC ajudaram a bancar cada
uma destas ondas de inovação. Mas criar uma indústria de capital de risco de sucesso não é
uma tarefa fácil. Das 36 economias com uma associação nacional do setor, menos de 10 têm
indústrias com alguma relevância. Como uma instituição, a indústria de VC é muito frágil e
requer um certo número de pré-condições para crescer. (Šinkovec e Cizelj, 2011).
Apesar da atividade de PE/VC ocorrer em diversas regiões do globo, a situação dos
EUA é tão diferenciada que Gompers e Lerner (1998) questionam até a adaptabilidade deste
modelo americano à realidade de outros países. Ferrary e Granovetter (2009) citam o caso da
França, que tem buscado criar clusters de inovação há mais de 30 anos.
Nos anos 1970, o país tentou criar perto de 20 "tecnópolis", que geraram poucas start-
ups e nenhum crescimento de dentro para fora. Em 2006, ouve nova investida, mas, a
exemplo do passado, os legisladores franceses definiram um cluster de inovação como um
grupo localizado de universidades, laboratórios e grandes empresas. Para os autores, o
governo ignorou o agente mais importante e mais substimado: os fundos de capital de risco.
Šinkovec e Cizelj (2011) afirmam que o fator crucial para explicar o desenvolvimento
de uma indústria de VC vibrante é a disponibilidade de investimentos suficientemente grandes
para que os retornos justifiquem o alto risco. Aí esbarra-se em outro problema. Não são todas
as empresas de tecnologia que oferecem serviços ou produtos disruptivos, capazes de trazer
altos retornos e fazer o ciclo do capital de risco girar. É mais fácil copiar ideias bem sucedidas
no Vale do Silício, sobretudo em países com um público potencial gigante, como China e
Brasil, do que apostar em ideias originais e não testadas.
Outro fator importante para fazer da indústria de VC um motor impulsionador da
economia é a existência de mecanismos de saída ou desinvestimento bem desenvolvidos. Isso
porque o sucesso da atividade pressupõe um desinvestimento no menor prazo possível e com
o maior retorno possível (Gorgulho, 1996 e Ribeiro, 2005). Neste sentido, a pouca
representatividade e o difícil acesso ao mercado de capitais brasileiro são um ponto
52
desfavorável - os IPOs são a maneira mais lucrativa de um fundo recuperar o invesimento em
uma start-up.
Por último, Ferrary e Granovetter (2009), lembram que o Vale do Silício deve ser visto
como um cluster de inovação, que busca desenvolver tecnologias disruptivas, e não como um
cluster industrial, cujo objetivo é gerar e desenvolver inovações incrementais.
Davidoff (2011) lembra que grandes programas do governo podem funcionar bem na
criação de clusters industriais para competir em áreas estabelecidas. A Coreia do Sul e a
China se tornaram tremendos sucessos econômicos ajudadas pelo investimento público
focado nas grandes empresas exportadoras. "Mas governantes não são tão bons para criar o
próximo Facebook ou tecnologia inovadora. Isso segue domínio das redes de capital de risco"
Este trabalho apresenta limitações por não avançar na pesquisa qualitativa. O uso de
questionários e entrevistas enriqueceria a discussão, uma vez que há pouca informação sobre
o comportamento dos empreendedores brasileiros nesta área.
Como sugestão para futuros trabalhos, recomendamos estudos sobre o impacto do
capital de risco no Brasil nos resultados das empresas.
53
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMIT, R. et al. Why Do Venture Capital Firms Exist? Theory and Canadian
Evidence. Journal of Business Venturing13: 441–466, 1999
BERGEMANN, D, e HEGE U. Dynamic Venture Capital Financing, Learning and Moral
Hazard. Journal of Banking and Finance, 22, 703-735, 1998
BROPHY, D. J. U.S. venture capital markets. In Organisation for Economic Co-operation and
Development, Venture capital and innovation, 1996
BYGRAVE, Willian D., Timmons, Jeffry .A. Venture Capital at the Crossroads, Harvard
Business School Press, Boston, Massachusetts, 1992
BUSSINESS ANGELS: Giving ideas wings. The Economist, 14 de setembro de 2006.
Disponível em: http://www.economist.com/node/7905466. Acesso em 14 de abril de 2011.
CARVALHO, A. G.; RIBEIRO, L. L.; FURTADO, C. V. A indústria de Private Equity e
Venture Capital: primeiro censo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2006. 135 p.
CERVO, A.L. e BERVIAN, P.A. Metodologia Científica: para uso de estudantes
universitários. 3a.ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1983
COMODO, Gustavo Cardoso. Uma Análise Comparativa entre as Estruturas de Private
Equity e Venture Capital nos EUA e no Brasil. Dissertação (Mestrado em Administração),
Fundação Getulio Vargas, São Paulo, 2009
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  • 1. Fundação Instituto de Administração – FIA Autor: Eduardo Kormives FINANCIANDO A INOVAÇÃO: UMA ANÁLISE DO MODELO DE VENTURE CAPITAL AMERICANO E SEU IMPACTO NO VALE DO SILÍCIO Monografia apresentada como parte dos requisitos para conclusão do Curso MBA, Informações Econômico Financeiras e Mercado de Capitais, Turma 9, sob a orientação do Prof. Ms. Marcos Piellusch São Paulo Maio – 2011
  • 2. 2 A Michelli, Bento e Beatriz, as três pessoas que dão sentido ao meu esforço para crescer pessoal e profissionalmente
  • 3. 3 Agradecimentos À BM&FBovespa, pela bolsa de estudos sem a qual eu não poderia cursar este MBA. À minha esposa Michelli, que assumiu de bom grado a tarefa complicada, para não dizer impossível, de cuidar sozinha de duas crianças cheias de energia para que eu pudesse me concentrar nesta tarefa. Aos meus pais, Valter e Sara, os maiores exemplos de vida que eu tenho. Ao Prof. Dr. José Roberto Securato, pela oportunidade de aprendizado. Ao Prof. Ms. Marcos Piellusch, por sua compreensão e apoio no momento em que eu pensei que não chegaria ao fim. A todos os professores do MBA em Informações Econômico Financeiras e Mercado de Capitais, em especial ao Prof. Dr. Edson Ferreira de Oliveira e ao Prof. Dr. Ricardo Ennio Beccari, pelo aprendizado, paciência e disposição de aguentar uma sala cheia de jornalistas. Ao meu chefe Nilson Vargas e colegas de redação, que seguraram as pontas nas oito semanas em que estive afastado para frequentar as aulas. Aos amigos Mário Sérgio Lima, Liana Rizzo, Marcelo Espinoza, João Grando e Graziele Dal-Bó. Vocês tornaram a minha estada em São Paulo muito mais fácil e divertida. Por último, mas não menos importante, a Deus, que nos dá infinitamente mais do que pedimos ou pensamos.
  • 4. 4 “A inovação é o distingue um líder de um seguidor” Steve Jobs
  • 5. 5 RESUMO Em essência, o venture capital é uma forma de apoio baseada no investimento por meio de participação em empresas que apresentem elevado potencial de crescimento. O objetivo claro é uma posterior revenda com a realização de expressivos ganhos de capital. O VC não é bom apenas para investidores, que emprestam dinheiro esperando taxas de retorno que dificilmente obteriam em outras modalidades de aplicação em prazo tão curto. É bom também para empresas iniciantes de tecnologia, as start-ups, caracterizadas pela falta de capital para executar ou fabricar modelos de negócios, produtos ou serviços inovadores e potencialmente disruptivos. Ou seja, ideias capazes de mudar radicalmente setores estabelecidos ou de criar mercados completamente novos. Neste trabalho, analisamos a relação entre investidor e empreendedor com foco no impacto econômico da indústria de VC no Vale do Silício, estado da arte da inovação. Uma região que, mesmo na adversidade, soube utilizar o capital de risco para se reinventar diversas vezes e encontrar o caminho rumo à economia do conhecimento do século 21. RESUMO In essence, venture capital is an investiment-based support through equities of high growth companies, aiming its later buyout with expressive capital gains. VC is not good just for investors, who finance companies looking for high return taxes that they wouldn‟t earn with any other financial application in such short term. VC is also good to start-ups, characterized by lack of capital to execute potential breakthrough innovate business plans, products or services. Put in another way, ideas capable to radically transform consolidated sectors or to create completely new ones. In this paper we analyze the relationship between investor and entrepreneur focusing the economic impact of VC capital in the Silicon Valley, the state of the art of innovation. A region that, despite all the adversity, figured out several times how to use VC to reinvent itself and find the way to the 21st century economy of the knowledge.
  • 6. 6 SUMÁRIO CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO ............................................................................................8 1.1.SITUAÇÃO PROBLEMA ...............................................................................................8 1.2. OBJETIVO ....................................................................................................................11 1.3. METODOLOGIA..........................................................................................................11 1.4. DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS.................................................................................12 CAPÍTULO 2 – A INDÚSTRIA DE VENTURE CAPITAL..............................................14 2.1. DEFINIÇÃO DO TERMO VC/PE................................................................................14 2.2. A NATUREZA E O PAPEL DO CAPITAL DE RISCO..............................................15 2.2.1. AGENTES INTERMEDIÁRIOS............................................................................16 2.2.2. VC/PE COMO FONTE DE FINANCIAMENTO..................................................17 2.2.3. CICLO DE CRESCIMENTO DA EMPRESA E FINANCIAMENTO .................19 2.3. START-UPS ...................................................................................................................21 2.4. ALTO RISCO................................................................................................................22 2.4.1. TAXA DE RETORNO............................................................................................23 2.4.2. RESULTADO CONCENTRADO..........................................................................24 2.5. CICLO DO VENTURE CAPITAL ...............................................................................26 2.5.1. FASE DE CAPTAÇÃO ..........................................................................................26 2.5.2. FASE DE INVESTIMENTO..................................................................................27 2.5.3. FASE DESINVESTIMENTO.................................................................................29 2.6. SELEÇÃO, GOVERNANÇA E MONITORAMENTO ...............................................31 CAPÍTULO 3 – O MODELO VENCEDOR AMERICANO ............................................34 3.1. BREVE HISTÓRICO....................................................................................................34 3.2. FATORES DECISIVOS................................................................................................37 3.3. IMPACTO ECONÔMICO ............................................................................................39 CAPÍTULO 4 – O QUE É QUE O VALE DO SILÍCIO TEM?........................................41 4.1. ONDAS DE INOVAÇÂO.............................................................................................42 4.2. A FÓRMULA DO SUCESSO.......................................................................................44 4.2.1. OUSADIA EMPREENDEDORA...........................................................................44 4.2.2. AMBIENTE ÚNICO...............................................................................................45 4.2.3. CAPITAL DE RISCO ABUNDANTE E MAIS ACESSÍVEL..............................45
  • 7. 7 4.2.4. FOCO EM SETORES, NÃO EM EMPRESAS .....................................................47 4.3. O PAPEL DO VENTURE CAPITAL...........................................................................48 4.3.1. O CASO GOOGLE.................................................................................................50 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................51 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................53
  • 8. 8 CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO 1.1.SITUAÇÃO PROBLEMA Em janeiro de 2011, o valor de mercado da Apple ultrapassou os US$ 300 bilhões, cifra que fez desta empresa, tida como morta há uma década, nas palavras do New York Times, a segunda mais valiosa do mundo, atrás apenas da petrolífera Exxon Mobil. Desde 2005, as ações da Apple se valorizam a uma média anual de 59%, segundo levantamento do jornal USA Today. A explicação para tal crescimento reside na revolução do consumo de eletrônicos provocada pela Apple por meio de uma sequência de produtos inovadores lançados de 2001 para cá, que inclui iPod, iPhone e iPad. Outra empresa de tecnologia americana, o Google, fundada em 1998 tendo como carro-chefe um mecanismo de busca na internet, vale mais de US$ 150 bilhões hoje. Google e Apple são expoentes de uma região ao Norte da Califórnia, conhecida como Vale do Silício, que engloba 14 cidades e abriga as sedes de muitas das maiores empresas de tecnologia do mundo. Esta região ganhou este nome por conta da sua liderança na produção de semicondutores no passado, mas que se reinventou ao longo dos anos a ponto de se tornar sinônimo da indústria de alta tecnologia americana. O Vale do Silício é a região com a economia mais dinâmica do mundo por ser um habitat para inovação e empreendedorismo (Lee et al., 2000). Em certo sentido, o principal produto do Vale do Silício é a própria inovação. Seria talvez o exemplo mais bem acabado da hipótese de que o desenvolvimento econômico é conduzido pela inovação. Essa ideia remonta ao início do século 20 (Schumpeter, 1934). O economista austríaco Joseph Schumpeter mais tarde descreveria o processo dinâmico da "destruição criadora", no qual a tecnologia - novos produtos, novos métodos de produção - transformaria mercados de maneira cíclica essencialmente destruindo o status quo e criando toda uma nova onda de inovação (Schumpeter 2002 apud Park 2005). Apenas a idealização e a produção do iPhone, lançado em 2007, geraram 200 novas patentes à Apple, mais do que o dobro do que o Brasil registrou em todo o ano de 2005 nos Estados Unidos, segundo levantamento da revista Veja.
  • 9. 9 O McKinsey Global Institute confirmou a importância da inovação em uma série de estudos sobre nove importantes setores industriais americanos na década de 1990 (Lewis, 2004). Entre outras coisas, a pesquisa aponta que: O crescimento econômico foi produto de contínua inovação em face da competição pela organização do trabalho de modos mais efetivos. O crescimento da produtividade medido pelo PIB per capita é a chave para a prosperidade. Ao debater as razões que explicam por que alguns países são ricos e outros pobres, Helpman (2004: 34-54) observa que pesquisas recentes sobre crescimento econômico têm demonstrado que a acumulação de capital, incluindo mais maquinário e maiores níveis de educação, não é principal fator a impulsionar o crescimento. Ele cita fortes evidências de que a inovação, ao organizar equipamentos e trabalhadores de novas maneiras e usando tecnologias, é uma força maior de produtividade. Estudo contratado pelo Instituto Econômico da Região Metropolitana de San Francisco, na Califórnia, Estados Unidos, argumenta que o crescimento da produtividade é a chave para o aumento real de salários, o retorno aos acionistas e o incremento da renda per capita de uma região ou mais. E o caminho para elevar a produtividade é a inovação. “No longo prazo, uma economia avançada como os Estados Unidos não pode competir apenas baixando custos ou incrementando a produção” (2004:9). A única maneira de fazer parte desta nova onda de globalização nasce em muitas novas regiões de inovação, como Taiwan, Índia, China e Israel, é encontrar novas e melhores maneiras de usar recursos financeiros naturais e humanos a fim de incrementar a produtividade. Resumindo, tudo depende da introdução de novas ideias e/ou processos. Nas palavras de Drucker (1986: 45), “a inovação sistemática, portanto, consiste na busca deliberada e organizada de mudanças, e na análise sistemática das oportunidades que tais mudanças podem oferecer para a inovação econômica ou social”. Ocorre que o Vale do Silício não é o único lugar do mundo em que a inovação está na ordem do dia. Outras regiões dentro dos EUA, como Austin, no Texas, ou Boston, Israel, China, Finlândia, Reino Unido e Canadá, além de cidades brasileiras como Campinas (SP) e Florianópolis (SC), também desenvolvem indústrias inovadoras. Mas nenhum outro lugar conseguiu reproduzir as condições que fizeram do Vale do Silício o que ele é hoje. Por quê? Este trabalho se concentra em uma das explicações possíveis, que pode mais uma vez ser
  • 10. 10 derivada do trabalho de Schumpeter. Como enfatiza Streissler (1981: 60-83), tão importante quanto o conceito de “destruição criadora” é a noção de Schumpeter de que o crédito bancário era um pré-requisito à inovação e à fundação de novas empresas. Autores como Zysman (1983) e Mowery (1992) analisaram a estrutura dos sistemas financeiros de diversos países com o objetivo de demonstrar de que forma as especificidades de cada país, no que tange ao seu padrão de financiamento, foram fundamentais no modelo de desenvolvimento industrial adotado. Seus estudos mostram que cada país encontrou uma solução particular para lidar com a incerteza que permeia o processo de inovação e, consequentemente, o desenvolvimento tecnológico. Por este motivo, escolhemos analisar a experiência dos Estados Unidos, país que desenvolveu pioneiramente um sistema de financiamento da inovação através da indústria de Private Equity/Venture Capital, também chamado de capital de risco no Brasil. Segundo a National Venture Capital Association, que representa a indústria de PE/VC nos Estados Unidos, em 2009, as empresas financiadas com capital de risco respondiam por 11% dos empregos no setor privado e 21% do Produto Interno Bruto (PIB) americanos. Nascidos no final dos anos 1940, os fundos de VC possibilitaram o surgimento de gigantes do setor de tecnologia como Oracle, Facebook e os já citados Apple e Google. Não por acaso, a Sand Hill Road, em Melo Park, no Vale do Silício, reúne a maior concentração de empresas de VC do mundo, sendo o equivalente para a indústria de tecnologia ao endereço Wall Street para o mercado financeiro global. Os intermediários financeiros do tipo PE/VC desempenham um importante papel nos mercados financeiros, provendo recursos a companhias com acesso restrito a formas tradicionais de financiamento (Gompers e Lerner, 2001), tais como empresas inovadoras, com alta proporção de ativos intangíveis e companhias que necessitam de reestruturação. Nos últimos 20 anos, esta modalidade de investimento ganhou o mundo, embora os EUA ainda concentrem mais de 70% do capital levantado e mais da metade do capital investido, como revela um estudo da consultoria PwC de 2004. Ao estudar o modelo americano de VC, este trabalho pretende apontar caminhos para esta indústria no Brasil, surgida há pouco mais de 10 anos. O crescimento do setor tem se acelerado rapidamente desde a crise global de 2008. Em termos mundiais, o Brasil tem sido tratado como a bola da vez. Pesquisa do Emerging Markets Private Equity Association revela, por exemplo, que o país perdeu apenas para a China como principal destino do dinheiro de
  • 11. 11 private equity em 2009. Outro levantamento PwC indica que a participação deste tipo de capital nos negócios de fusão e aquisição praticamente quadruplicou desde 2006: passou de 11% para 42%. Além disso, uma pesquisa KPMG realizada a pedido do jornal Valor Econômico com 44 gestoras de fundos nacionais e estrangeiros atuando no Brasil aponta que o dinheiro disponível nos fundos no país cresceu 31,5% entre março de 2009 e março de 2010, chegando a US$ 26,9 bilhões. O capital investido subiu de US$ 12 bilhões para US$ 14 bilhões, considerando os US$ 4,1 bilhões à espera de oportunidade de investimento. O capital de risco é uma importante fonte de investimentos para pequenas e médias empresas inovadoras (Pavani, 2003), perfil da indústria de tecnologia brasileira. Usá-lo de maneira eficiente pode significar uma virada na economia brasileira, inserindo de fato o país na economia do conhecimento. Dados da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) mostram que existem 1,9 mil universidades, 300 incubadoras e mais de 6 mil empresas de base tecnológica deste porte. Não apenas pela injeção de dinheiro. O capital de risco agrega profissionalismo à empresa investida e propulsiona o empreendedorismo. Na outra ponta, o critério de seleção rigoroso permite escolher os empreendimentos que apresentam melhores possibilidades de retorno, com um nível de risco aceitável. 1.2. OBJETIVO Este estudo tem como propósito demonstrar como estão estruturados os negócios de PE/VC nos Estados Unidos, país com alta maturidade empresarial, e apontar o impacto provocado por este tipo de financiamento no Vale do Silício, região que é a grande criadora por ondas de inovação globais. 1.3. METODOLOGIA Cervo A. L. (1983) afirma que toda investigação nasce de algum problema observado ou sentido, de tal modo que não se pode prosseguir na análise a menos que se faça uma seleção do tema a ser tratado. Esta seleção necessita de alguma hipótese que sirva como guia sobre o assunto a ser pesquisado. Como método de pesquisa, partiu-se da situação problema, descrita no item 1.1 deste capítulo. Ou seja, o faz do Vale do Silício o maior centro de inovação global? Formulou-se, então, uma hipótese de que o modelo americano de financiamento da inovação, baseado no
  • 12. 12 capital de risco, teria um papel fundamental neste processo e que a esta região específica reuniria particularidades não verificadas em nenhum outro centro de inovação do mundo. A proposta para o desenvolvimento deste trabalho mescla a revisão da bibliografia corrente sobre o objeto – a indústria de capital de risco –, a pesquisa documental e o levantamento de dados numéricos. Cervo A L. (1983) observa que a pesquisa bibliográfica procura explicar um problema a partir de referências teóricas publicadas em documentos. Busca conhecer e analisar as contribuições culturais ou científicas do passado existentes sobre um determinado assunto, tema ou problema. Como o assunto ainda não dispõe de extensa pesquisa no Brasil e no mundo, além de dissertações e teses de autores brasileiros e estrangeiros, alguns artigos e reportagens de jornal foram de grande valia para o aprofundamento do tema. Procuramos valorizar, quando possível, as pesquisas de autores que também são empreendedores e conhecem por experiência própria as peculiaridades do Vale do Silício. Para a realização da pesquisa descritiva sobre o modelos de capital de risco dos EUA, a análise documental revelou-se importante. Para Lüdke & André (1986:38), a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos seja complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema. Segundo Sá Silva et al (2009:5), tanto a pesquisa documental quanto a bibliográfica têm no documento o seu objeto de investigação, sendo que o conceito de documento ultrapassa a idéia de textos escritos e/ou impressos. O documento como fonte de pesquisa inclui filmes, vídeos, slides, fotografias ou pôsteres. Por isso, também utilizamos uma série de estudos e dados levantados por empresas renomadas de consultoria e entidades relacionadas à tecnologia, inovação e à industria de capital de risco, que serviram para quantificar comparações. 1.4. DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS Este trabalho considera as características mais importantes da indústria de capital de risco e seu papel impulsionador em economias dinâmicas baseadas na inovação. O Capítulo 1, que se apresenta como a introdução deste trabalho, explica em linhas gerais a relação entre financiamento e inovação e como as fontes as quais as empresas
  • 13. 13 tradicionalmente recorrem para obter linhas de crédito se mostram ineficazes no contexto das empresas de base tecnológica. No Capítulo 2 “A indústria de Venture Capital”, abordaremos a natureza e a razão de ser desta indústria, que representa uma fonte vital de estímulo à inovação. Também analisaremos o perfil das start-ups de tecnologia, seu ciclo de vida e as vantagens que o capital de risco representa a este tipo de empresa em relação aos empréstimos bancários tradicionais. No capítulo 3, “O modelo vencedor americano”, nos concentraremos na indústria de VC dos EUA. E buscaremos respostas para explicar por que, desde a sua consolidação, no final dos anos 1970, esta indúsitra domina o segmento com folga no âmbito global, a ponto de os fundos americanos ainda concentrarem mais de 70% do capital levantado e mais da metade dos investimentos. . No capítulo 4, “O que é que o Vale do Silício tem?”, analisaremos o sucesso desta região da Califórnia, hoje a Meca da tecnologia, onde inovação e capital de risco andam lado a lado. Também debatedores as razões que fizeram o Vale liderar sucessivas ondas de inovação disruptiva, criando mercados novos e moldando a economia global. E os motivos pelos quais a atuação da indústria de VC americana ainda não se reproduziu em outro lugar. O desfecho deste trabalho é apresentado nas considerações finais, capítulo 5, em que também sugerimos novos temas para pesquisa.
  • 14. 14 CAPÍTULO 2 – A INDÚSTRIA DE VENTURE CAPITAL 2.1. DEFINIÇÃO DO TERMO VC/PE A diferenciação entre os termos private equity e venture capital está normalmente relacionada ao estágio de desenvolvimento em que se encontram as empresas no momento do aporte de capital. Em geral, o termo venture capital (VC) refere-se ao investimento feito nos estágios iniciais, enquanto a expressão private equity (PE) é empregada para designar os investimentos em companhias mais maduras e já estabelecidas (Carvalho et al, 2006). A Tabela 1 apresenta as diversas modalidades dos investimentos. Tabela 1: Descrição das modalidades de investimento conforme estágio das empresas investidas quando do primeiro aporte de PE/VC Venture Capital Capital semente (seed capital) Investimento em empresas de pequeno porte, feito em fase pré-operacional, para desenvolvimento de uma idéia, de um projeto ou ainda para testes de mercado ou registro de patentes. Estruturação inicial (start-up) Aporte de capital em empresa em fase de estruturação, em geral no primeiro ano de funcionamento, quando ainda não vende seus produtos/serviços comercialmente. Nesta fase, a empresa já iniciou a contratação de profissionais e efetuou todos os estudos necessários para colocar em prática o plano de negócios. Expansão (expansion) Aporte de capital, em geral de giro, para a expansão de empresa que já vende seus produtos/serviços comercialmente. O aporte também pode ser destinado à expansão da planta, da rede de distribuição ou ainda para ser investido em comunicação e marketing. Private Equity Estágio avançado (later stage) Investimento em empresa que já atingiu uma taxa de crescimento relativamente estável e apresenta fluxo de caixa positivo. Financiamento de aquisições (acquisition finance) Aporte de capital para expansão por meio da aquisição de outras empresas. Tomada de controle pelos executivos (management buyout) Aporte de capital para financiar uma equipe de gestores, da própria empresa ou externos, que objetivam adquirir o controle de uma empresa. Estágio pré-emissão (bridge finance) Aporte feito quando a empresa planeja entrar em bolsa de valores em até dois anos. Também pode envolver a reestruturação de posições de grandes acionistas.
  • 15. 15 Recuperação empresarial (turnaround ) Financiamento para empresas com dificuldade operacional e/ou financeira quando existe possibilidade de recuperação. Mezanino Investimentos em companhias em estágios avançados de desenvolvimento por meio de dívidas subordinadas. PIPEs (Private Investment in Public Equity)) Aporte em ações pouco líquidas de empresas listadas em bolsa de valores. Fonte: Carvalho et al. (2006) Sharp (2002), no entanto, argumenta que esta distinção, originada nos Estados Unidos, é uma maneira simplificada de separar os estágios de investimento, muito difundida em alguns países. Comodo (2009: 14) é da opinião que a atividade de VC está incorporada à de PE, “uma vez que ambas as atividades tratam de investimentos em participações de empresas não listadas em bolsa com boas expectativas de ganhos de capital”. Seguindo na mesma linha, neste trabalho, não haverá distinção entre essas atividades. O termo PE/VC, quando utilizado, estará relacionado à aquisição, por um determinado investidor/sócio capitalista, de participação em uma empresa mediante a subscrição de cotas/ações em operação privada entre as partes que, via de regra, não envolve o mercado de bolsa de valores. 2.2. A NATUREZA E O PAPEL DO CAPITAL DE RISCO Não há na literatura uma definição única para a expressão VC, traduzida no Brasil como capital de risco, embora Pavani (2003) afirme que o termo mais adequado seja capital empreendedor. Gorgulho (1996: 3-4) entende capital de risco como sendo: uma forma de financiamento que envolve a participação, através da aquisição de ações ou de outros instrumentos financeiros sem contrapartidas no que tange a garantias (equity ou quasi-equity), em empresas ou empreendimentos com alto potencial de crescimento, com vistas à sua revenda e à realização de expressivos ganhos de capital a médio e longo prazos. Em suma: é uma modalidade de financiamento que pressupõe a aceitação de um alto risco em troca da perspectiva de um alto retorno no futuro.
  • 16. 16 O capital de risco pode envolver empresas de qualquer tamanho e de qualquer setor industrial, mas, em geral, são as pequenas e médias de base tecnológica que mais atraem os investidores capitalistas, porque oferecem perspectivas de retorno bastante elevadas (Gorgulho, 1996). Entenda-se por empresas de base tecnológica aquelas na qual tecnologia é parte essencial dos processos, incorporando-se no produto ou serviço vendido ou como parte importante do processo de produção. Essas empresas trabalham com tecnologias novas e atuam tanto em setores de tecnologia de ponta quanto tradicionais. A associação entre capital de risco e PMEs de base tecnológica tem sido chamada de “capital de risco clássico”, em constraste a um perfil de investimentos mais conservador, ao qual Bygrave e Timmons (1992) designaram merchant capital. Este último envolveria a injeção de dinheiro em empresas mais maduras de setores tradicionais, normalmente através de operações de engenharia financeira complexas, muitas vezes envolvendo leveraged buyouts (LBO) e management buyouts (MBO), com objetivo de proporcionar o retorno dos investimentos em prazos mais curtos. No processo de capital de risco clássico, as três principais entidades envolvidas são: 1) o investidor institucional, tais como fundos de pensão, capitalistas individuais, empresas e companhias de seguro; 2) o empreendedor que recebe e faz uso dos recursos; e 3) os agentes ou agências intermediárias, as empresas de capital de risco, que usualmente identificam, selecionam, monitoram e operacionalizam os investimentos, além de levantarem fundos adicionais para as empresas (Brophy, 1996). 2.2.1. AGENTES INTERMEDIÁRIOS Gorgulho (1996) dividiu a atividade de VC a partir de algumas formas organizacionais em que ela pode ser realizada. Fundos – geridos por uma empresa administradora cujos sócios são investidores de longo prazo. O administrador pode ser independente ou ligado a uma instituição financeira. Subsidiárias corporativas – neste caso, a atividade de VC/PE é exercida por uma subsidiária corporativa de uma instituição financeira ou de uma grande empresa, e os recursos do fundo são provenientes do caixa destas instituições. Holdings independentes – atuam como um fundo, mas seu formato jurídico é o de uma holding. Este tipo de fundo é bastante comum no mercado brasileiro. A forma de
  • 17. 17 constituição é a de uma empresa fora do país, em geral em paraíso fiscal, a integralização do capital é realizada fora, e o dinheiro entra no país sob a rubrica capital estrangeiro. Seguindo na linha proposta por Gorgulho, este trabalho considera fundos de VC/PE ou capital de risco as organizações que realizem atividades de capital de risco, qualquer que seja a forma jurídica adotada. Entre as principais características de um Fundo de VC/PE, Gorgulho (1996) destaca três: 1) é gerido por equipe de administradores ou gestores profissionais; 2) em geral, suas atividades são financiadas por uma taxa de administração sobre o capital comprometido do fundo, variando entre 2% e 3% ao ano; 3) e, adicionalmente, os gestores do fundo têm uma remuneração quando do processo de desinvestimentos – os percentuais mais utilizados são 80% do ganho de capital são distribuídos aos investidores do fundo e 20% para a equipe gestora do fundo. 2.2.2. VC/PE COMO FONTE DE FINANCIAMENTO Para Ribeiro (2005), a atividade de PE/VC se apresenta como uma alternativa viável ao financiamento tradicional obtido por meio de bancos (i.e. empréstimos bancários) para PMEs geradoras de projetos com elevada expectativa de risco e retorno, mas que só podem ser executados por meio da injeção de novos recursos. Ele argumenta que gestores de PE/VC são agentes melhor adaptados para mitigar o risco associado ao investimento em empresas com pouco ou nenhum histórico financeiro ou ativos tangíveis que possam se constituir como garantia real para empréstimos. Diferentemente de investidores típicos do mercado de capitais, esses gestores costumam participar diretamente da gestão das empresas em que investem, influenciando decisões estratégicas e a própria governança corporativa. São investidores ativos, conforme a definição de Jensen (1991). Só assim conseguem mitigar os riscos e influenciar a possibilidade de sucesso e saída do negócio. Pavani (2003) afirma que a lógica da operação de VC resolve três questões críticas para o financiamento de pequenas e médias empresas, quando comparado aos empréstimos bancários: 1) foge da análise financeira dos bancos, que se baseia no desempenho passado da empresa, refletido em seus demonstrativos financeiros. O método estima se a empresa conseguirá gerar caixa para pagar os juros e amortizações dos empréstimos, história essa que uma nova empresa não possui; 2) o tomador do empréstimo não precisa apresentar garantias
  • 18. 18 reais às instituições financeiras, e uma PME dificilmente acumulou ativos com liquidez para apresentar como garantias; 3) o pagamento de juros e das amortizações de um empréstimo exige uma geração de caixa estável, característica incomum em empresas pequenas e médias. O resultado, pondera Gorgulho (1996), é que os empréstimos feitos a novas empresas, se ocorrem, têm taxas de juros elevadas e prazos curtos. Ou seja, para empresas com rápido crescimento, como as de tecnologia, o capital de risco prevalece devido à atratividade que essas empresas oferecem aos investidores e a dificuldade delas em captar recursos por meio de modalidades que exigem ativos fixos e fluxo de caixa. As diferenças entre o VC e o empréstimo bancário para as PMEs de base tecnológica podem ser resumidas na tabela 2 abaixo. Tabela 2: Diferenciação entre capital de risco e empréstimo bancário Capital de risco Empréstimo bancário Investimento de médio no longo prazo Investimento de curto a longo prazos. Compromisso até a "saída". Investidor sócio, solidário ao risco. Em princípio, não há compromisso se a segurança do empréstimo estiver ameaçada. Fornece uma base de capital sólida e flexível para ir ao encontro de seus planos de crescimento e desenvolvimento. Fonte de financiamento útil se a empresa tiver uma autonomia financeira razoável e se possuir um bom fluxo de caixa. Bom para o fluxo de caixa porque a estrutura do financiamento está adequada às necessidades da empresa. Requer fluxos de caixa estáveis para pagar os juros e o reembolso de capital. Os rendimentos do investidor dependem do crescimento e do sucesso do negócio. Depende de a empresa cumprir o serviço da dívida e manter o valor dos ativos que servem de garantia. Se o negócio falhar, os investidores estão no mesmo nível de outros investidores, depois dos bancos e propensos a perder o seu investimento. Se o negócio falhar, o financiador geralmente tem a primeira palavra sobre os ativos da empresa. Garantias reais. Se a empresa estiver em dificuldades, a empresa de capital de risco fará tudo para conseguir superar a má situação. Se o negócio estiver preste a falhar, o financiador pode liquidar o seu negócio a fim de salvar o seu investimento, e pode causar falências se tiverem sido usadas garantias pessoais.
  • 19. 19 Um verdadeiro parceiro de negócios, partilhando os riscos e as recompensas, com conselhos práticos e experiência. A assistência disponível varia consideravelmente. Fonte: ABVCAP, 2001 2.2.3. CICLO DE CRESCIMENTO DA EMPRESA E FINANCIAMENTO Pavani (2003, capítulo 1) adotou uma segmentação híbrida dos estágios de crescimento de uma empresa que se encaixa perfeitamente no contexto da indústria da inovação, escopo deste trabalho. 1) Concepção/Criação – a empresa concentra seus esforços no desenvolvimento de estudos, pesquisas preliminares, planos de negócios e projetos, pesquisas de mercado, criação jurídica. Nesta fase são consumidos recursos, e o faturamento é zero. 2) Start-up – a empresa está finalizando os protótipos, contratando profissionais, comprando equipamentos, aprofundando as pesquisas de mercado, desenvolvendo os produtos e serviços e buscando os primeiros clientes. O faturamento é baixo e não estável. A empresa necessita recursos para investir e cobrir prejuízos operacionais. 3) Estágio Inicial – as atenções da empresa estão em estruturar as atividades de produção, de marketing e de vendas. A empresa está investindo na compra de equipamentos, contratando pessoas, estruturando sua equipe de vendas. Dificilmente terá atingido o ponto de equilíbrio operacional, e necessitará recursos para investimento e para cobrir prejuízos operacionais. 4) Crescimento/Expansão – a empresa foca suas atenções em atividades de marketing (expansão do canal de distribuição, comunicação, estabelecimento da marca), em desenvolver novos produtos e serviços, em estruturar as atividades de produção em escala. Os recursos são para investimento ou capital de giro, pois a empresa já deve ter atingido o equilíbrio operacional. 5) Maturidade – as atividades estão voltadas para a manutenção da competitividade (novos produtos/serviços, fortalecimento da marca), a reestruturação e o reposicionamento. Ao analisar o processo de crescimento de empresas, Deutscher (2001) apresenta o gráfico 1, onde é possível visualizar o resultado do fluxo de caixa e as vendas a partir do ciclo de crescimento antes apresentado.
  • 20. 20 Gráfico 1: Estágios da empresa: receita de vendas e fluxo de caixa Fonte: Deutscher, 2001. Modificado por Pavani, 2003 Fica claro pelo gráfico 1 que, dentre as diversas fontes de financiamento possíveis aos empreendedores, a sua adequação está ligada ainda ao estágio de crescimento da empresa, em função dos montantes, das regras de financiamento, do fluxo de caixa do tomador e das restrições impostas pelo financiador (Pavani, 2003), como expresso na tabela 3. Tabela 3: Estágios da empresa e fontes de recursos Fontes de recursos Estágio de crescimento e desenvolvimento da empresa Concepção/Criação Start-up Estágio inicial Crescimento/ Expansão Maturidade Lucros acumulados X X Clientes X X X Fornecedores X X X X Parceiros X X X X
  • 21. 21 Governo (doações) X X X X X Incentivos fiscais X X X Recursos do próprio empreendedor ou de família e amigos X X X Sócios - Business angels X X Sócios – VC X X X Sócios – PE X X Sócios - Emissões públicas X Financiamentos bancários X X X Fonte: Pavani, 2003, a partir de diversos autores 2.3. START-UPS Não é toda empresa de base tecnológica que atrai financiamento de PE/VC. Dado o elevado risco do negócio, os investidores capitalistas só terão interesse em investir em empresas através de instrumentos que permitam a participação em resultados excepcionalmente favoráveis. É por estes motivos que o capital de risco é especialmente adequado a um tipo de empresa que Marcus Regueira, da firma de VC/PE Fir Capital, citado em Pavani (2003), define como aquela que “cresce aritmeticamente devido a limitações de capital”, mas que, com a injeção de capital de risco e a experiência adequada e necessária da indústria de VC/PE, pode crescer exponencialmente. Ou, em outras palavras, “o capital de risco busca empresas emergentes que apresentem vantagens competitivas e estejam em mercados de rápido crescimento” (citado em Pavani, 2003). Empresas como estas são conhecidas, no jargão da indústria de VC/PE, como start- ups. Existe um grande debate na literatura e na própria indústria sobre as características definidoras de uma start-up – idade, faturamento, modelo de negócios? Neste trabalho adotamos o conceito elaborado por Steve Blank, renomado professor das universidades de Berkeley e Columbia, nos Estados Unidos, e empreendedor serial, criador de oito empresas no Vale do Silício, para quem uma start-up “é uma organização formada para buscar um modelo de negócios replicável e escalonável”.
  • 22. 22 Para Eckermann (2006), o termo VC já denota recursos que investidores especializados oferecem a start-ups a fim de ajudá-las a comercializar a sua principal tecnologia de ponta: ideias. Plagge (2006) acrescenta que o dinheiro do VC normalmente se constitui na única possibilidade para uma empresa start-up novata financiar as idéias e trabalhar em seus produtos até que eles sejam introduzidos no mercado. Esta definição seria especialmente verdadeira nos setores onde uma ideia promissora de negócios sugere um mercado potencial suficientemente grande – i.e, biotecnologia ou internet. Neste sentido, o sistema financeiro tem um papel fundamental porque cabe a ele, em última instância, “a tarefa de selecionar as inovações que serão ou não implementadas através da decisão acerca da concessão dos financiamentos necessários” (Gorgulho, 1997). Conforme visto anteriormente na Tabela 3, o investimento de VC/PE em start-ups se dá pelo financiamento privado (Pavani, 2003). Ele consiste na compra, por investidores, de ações emitidas por sociedades anônimas fechadas. Além dos investidores formais – fundos, holdings ou subsidiárias corporativas –, é importante citar a existência de um mercado informal. Embora vá além do escopo deste trabalho, a figura do investidor-anjo (business angel) é importante fonte de recursos para empresas nos estágios iniciais de desenvolvimento – concepção/criação e start-ups. Pavani (2003: 34) define os investidores anjos como “pessoas ricas, muitas vezes com experiência profissional (...) que aportam, em geral, recursos financeiros, rede de contatos e experiência profissional”. Segundo reportagem da revista Economist, estima-se que os investidores anjos sejam responsáveis, nos EUA, pela introdução de aproximadamente 40% das novas oportunidades de negócios das empresas de VC/PE. 2.4. ALTO RISCO A atividade de PE/VC pressupõe a aceitação de riscos elevados em troca de obtenção de altos retornos (Soledade et alli, 1997). Mas que altos riscos seriam estes? Eckermann (2006: 23-25) elenca uma série deles apenas nos estágios iniciais de uma empresa inovadora. Em primeiro lugar, uma vez que a maioria das start-ups se fundamenta em apenas um produto, o seu progresso está intimamente ligado ao ciclo de vida do produto em si. E esses novos produtos estão frequentemente imersos em incertezas uma vez que investidores de fora e de dentro não podem prever a receita potencial do projeto.
  • 23. 23 Além disso, não há nenhuma evidência de aceitação de seu conceito no mercado nem como dizer ao certo se as estratégias de marketing desenvolvidas são apropriadas. Quando entra em um mercado emergente, o empreendedor ainda se depara com incertezas acerca da execução técnica de sua concepção e, eventualmente, sobre o design do produto. Finalmente, a inexperiência do próprio empreendedor adiciona risco de má gestão nas empresas em estágio inicial. Reichert (2006), citado em Rieche; Santos ( 2006) observa que o que faz uma idéia ser atrativa para um investidor capitalista é a solução prática para um grande problema ou a sinalização de uma boa oportunidade de mercado. Existem dois grupos amplos de oportunidades de investimento. No primeiro, o mercado ou o produto são, em alguma medida, conhecidos. A empresa está fazendo a melhor execução ou uma versão melhorada de um produto ou serviço existente em um mercado já consolidado. O segundo refere-se a mercados ou modelos de negócios totalmente novos, nos quais os investidores acham que conhecem suas apostas, mas, na prática, têm pouca idéia do negócio. 2.4.1. TAXA DE RETORNO Já foi dito que a atividade de VC/PE financia apenas negócios com alto potencial de retorno por conta dos altos riscos derivados de modelos de negócios muitas vezes não testados. Uma questão importante aqui é quantificar esse alto potencial de retorno. Plagge (2006: 6-7) diz que a taxa de retorno (hurdle rate) que uma firma de VC/PE espera “pode ser interpretada como os juros que ela espera ganhar em um investimento, e é dada de maneira exógena (de fora para dentro)”. Como conseqüência, a taxa de retorno determina quais propostas de investimento são aceitáveis para um investidor capitalista. Em outras palavras, Se alguém leva a uma firma de VC/PE um plano de negócios que promete um retorno de investimento (ROI) de 10% ao ano, enquanto a taxa de retorno está estabelecida em 20%, o investidor capitalista declinará do negócio. Pelo ponto de vista do empreendedor, o custo do financiamento via VC é a sua taxa de retorno. Uma start-up demandará capital de risco apenas se for capaz de obter um retorno superior aos 20% ao ano exigidos pelo dinheiro do investidor capitalista.
  • 24. 24 Plagge (2006: 7) propõe a seguinte analogia para clarificar o que significa a demanda por capital de risco. Imagine um vendedor de carros oferecendo um BMW por US$ 50 mil, cifra exatamente igual ao custo do carro. A demanda pelo BMW seria, então, igual ao número de pessoas dispostas a pagar os US$ 50 mil. Da mesma maneira, um investidor capitalista oferecerá dinheiro e assistência no gerenciamento para start-ups interessadas com a condição de que seu retorno seja um determinado preço, que é equivalente ao retorno anual esperado do seu dinheiro de risco. Segundo Gorgulho (1996), os investidores capitalistas esperam uma taxa de retorno superior a 50% para investimentos em estágios iniciais, de 30% a 40% para investimentos em expansão e entre 25% e 30% para estágios avançados. Uma regra geral é um retorno em cinco anos de sete vezes sobre o primeiro aporte, o que equivale à taxa média composta de 48% a.a. Zider (1998) afirna que a taxa de retorno esperada varia entre 25% e 35% a.a. sobre a duração do investimento. Segundo ele, pelo financiamento de um ou dois anos de uma start- up, os investidores capitalistas projetam um retorno de 10 vezes sobre o capital injetado no período de cinco anos. Isso combinado a sua posição preferencial de sócio – nos EUA, os contratos normalmente incluem a aquisição de 40% das ações – explica por que o capital de risco tem um alto custo: trata-se de um empréstimo a taxa de juros compostas de 58% a.a. Bygrave e Timmons (1992) analisaram as taxas de retorno anualizadas médias de todos os fundos americanos formados entre 1969 e 1985. Estes dados mostram que os retornos tipicamente são menores que 20%, com breves picos acima de 30%. Contudo, o quartil superior teve uma performance bem melhor, apresentando retornos acima de 20% em nove dos 16 anos, acima de 30% em quatro destes anos e acima de 40% em um ano. No Brasil, estudo de Titericz (2003) conclui que os fundos de investidores de risco aplicam seus recursos, em média, durante 3 a 5 anos, que é o tempo considerado suficiente para alcançar retornos superiores a 31%. Esses investimentos, na ordem de R$ 500 mil a R$ 1 milhão, não representam menos de 36% da participação acionária. 2.4.2. RESULTADO CONCENTRADO A lógica de formação de carteira do capital de risco prevê que poucas empresas sejam responsáveis pela maior parte dos ganhos (Gorgulho, 1996). Bygrave e Timmons (1992) citam estudo que analisou 383 investimentos realizados por 13 firmas de VC entre 1969 e 1985. Quase metade do valor final da carteira resultou de apenas 6,8% de todos os seus
  • 25. 25 investimentos e 75% vieram de 15,7%, tendo havido perdas em 34,5% dos investimentos. Exemplos de retornos impressionantes são Apple (235 vezes o investimento inicial), Lotus (63) e Compaq (38). Outro estudo, citado em Florida e Kenney (1988), avaliando a performance dos 10 principais fundos de capital de risco nos Estados Unidos no período 1972/83, mostrou que, dos 525 investimentos realizados, apenas os 56 vencedores (ou 10,7%) geraram mais da metade do valor total da carteira (US$ 823 milhões), quintuplicando o valor investido, enquanto 38% dobraram o investimento original e aproximadamente metade deles (266) ficou no break-even point ou resultou em perdas. Este desempenho gerou um retorno ponderado para a carteira de 35% a.a. no período. Zider (1998) diz que, na média, empresas com bons planos de negócios e bom pessoal são bem-sucedidas apenas uma em cada 10 vezes, dada a quantidade de componentes críticos para o seu sucesso. As melhores companhias teriam 80% de sucesso em um destes componentes, o que mesmo assim lhe daria uma probabilidade de sucesso abaixo de 20%, como mostra a tabela 4. Tabela 4. Probabilidade combinada de sucesso Evento individual Probabilidade Capital suficiente 80% Gestão capaz e focada 80% Desenvolvimento de produto segue o planejado 80% Produção e fontes de componentes seguem o planejado 80% Competidores se comportam como o esperado 80% Consumidores querem o produto 80% Projeção de preço correta 80% Patentes são concedidas e vigentes 80% Probabilidade combinada de sucesso 17% Fonte: Ziber, 1998. Adaptado pelo autor Se uma única das variáveis acima cair para 50% de probabilidade, a chance combinada de sucesso cai para apenas 10%. Zider (1998: 139) explica, então, que a formação de carteira e a estrutura de negociação de acordos de uma firma de capital de risco americana permitem que a taxa de retorno perseguida, de 25% a 30%, seja alcançada se apenas 10% a 20% das empresas que receberem investimento forem vencedoras. Mais da metade das empresas do portfólio, na
  • 26. 26 melhor das hipóteses, apenas devolverá o investimento original. Segundo Zider, “de fato, as reputações de firmas de VC são normalmente construídas sobre um ou dois bons investimentos”. A tabela 5 ajuda a descrever esta característica da indústria de VC/PE. Tabela 5. Performance típica de um portfólio de VC para cada US$ 1 mil investidos Ruim Sobreviveu Ok Boa Ótima Total $ investido 200 400 200 100 100 1.000 Retorno no ano 5 0 1x 5x 10x 20x Retorno bruto 0 400 1.000 2.000 2.000 4.400 Retorno líquido (200) 0 800 900 1.900 3.400 Fonte: Zider, 1998. Adaptado pelo autor. 2.5. CICLO DO VENTURE CAPITAL O ciclo de VC se constitui no centro de todo investimento desta modalidade. Para descrevê-lo, resumiremos os conceitos apresentados por Plagge (2006, capítulo 1), que elenca três estágios principais: captação de fundos, investimento e desinvestimento. Todas as três fases desempenham um papel crucial para os investidores capitalistas e para as empresas, incluindo potenciais candidatas, no seu portfólio. 2.5.1. FASE DE CAPTAÇÃO Toda atividade de VC/PE começa com a fase de captação de fundos. Nela, os investidores capitalistas procurarão investidores institucionais e investidores individuais qualificados como o objetivo de levantar dinheiro para um fundo. Normalmente, as empresas de VC/PE americanas são estruturadas no modelo Limited Partner (LP). Conforme Ribeiro (2005), essa estrutura compreende pelo menos duas partes, o gestor (General Partner) e o investidor ou grupo deles (Limited Partner). O LP fornece os recursos necessários à formação do fundo. Tais recursos são protegidos pela cláusula de responsabilidade limitada. Ou seja, o investidor não corre o risco de perder mais do que o capital investido no veículo. Para garantir esse direito, os LPs só precisam seguir uma regra: manterem-se afastados da gestão do veículo no dia a dia. É importante ressaltar que o que leva os LPs a aplicarem num fundo não é um investimento específico, mas o histórico da firma de VC/PE e a confiança nos GPs em si (Zider, 1998).
  • 27. 27 Além disso, as LPs também contam com tributação mais adequada à realidade dos investimentos em PE/VC. Ganhos são tributados apenas no final do prazo, conforme o resultado final obtido pelo veículo. Quando recebe os recursos de volta, cada investidor paga a alíquota a qual está sujeito. Caso a distribuição de ganhos seja feita na forma de títulos mobiliários (Gompers e Lerner, 1999), o investidor só arca com o eventual imposto quando de sua alienação ou liquidação. Assim, investidores isentos de impostos de renda, tais como os fundos de pensão, são beneficiados. Por causa destes fatores citados, a LP acabou se tornando a estrutura legal de preferência da indústria de PE/VC. Foi implantada nos sistemas jurídicos de países tais como Canadá, Chile e paraísos fiscais como Bermuda, Panamá e Ilhas Cayman. Ribeiro (2005) destaca que, como tal estrutura não está prevista na legislação brasileira, as LPs atuantes no país têm todas elas sede no exterior. 2.5.2. FASE DE INVESTIMENTO O segundo estágio, o processo de investimento dos fundos levantados em empresas do portfólio é o passo mais importante no ciclo do capital de risco. Conforme Plagge (2006), neste estágio, investidores capitalistas buscam investimentos com alta taxa de retorno, que varia de mais de 100% no caso de capital semente para até 30% em financiamentos de empresas em estágios mais avançados. Como o risco de uma perda total do investimento gira em torno dos 20%, essas altas taxas de possíveis retornos são cruciais para compensar as perdas resultantes dos inevitáveis fracassos. No fim das contas, um retorno estimado de 20% ao ano é necessário para justificar a existência de um determinado fundo em função dos altos riscos e baixa liquidez associados ao dinheiro de capital de risco. Pelo ponto de vista do investidor, o investimento de capital de risco apresenta as seguintes características (Tosta de Sá,1994 e Leonardos ,1994): a) Participação minoritária; b) Participação temporária do investidor (de cinco a sete anos); c) Participação ativa, por meio do apoio gerencial de alto nível prestado; d) Expectativas de elevado retorno sobre o capital aplicado; e e) Realização por meio de instrumentos de investimentos sem garantias.
  • 28. 28 Existem alguns critérios de avaliação costumeiramente empregados pelos fundos de capital de risco na hora de selecionar as empresas que receberão os investimentos. São eles: Capital humano de primeira classe; Retorno sobre o investimento (5 a 10 vezes); Vantagem competitiva; Regras de saída; Influência do investidor na gestão do negócio. Como forma de mitigar riscos, os capitalistas investidores normalmente realizam aportes de capital por etapas ou rodadas, no jargão da indústria. Ou seja, injetam dinheiro em diferentes estágios do ciclo de vida de uma empresa no seu portfólio, geralmente quando alguma meta é atingida. Isso não apenas reduz o risco de perder grandes somas de dinheiro como ajuda os investidores a exercer influência nas empresas nas quais são sócios. Se um investimento não obtiver a performance esperada ou se cresceram divergências sobre a direção a ser tomada no futuro por uma empresa, os investidores capitalistas podem simplesmente cortar o investimento e assim virtualmente forçar os gestores de uma empresa de seu portfólio a mudar de posição. Afinal, como afirmam Bergemann e Hege (1998) e Lerner (1995), o monitoramento próximo por meio do conselho de administração é um componente essencial das atividades dos capitalistas investidores e podem adicionar um valor considerável à companhia. Bygrave e Timmons (1992) discutiram as diversas alternativas do financiamento por ações para os diversos estágios de crescimento e desenvolvimento da empresa. A Tabela na página a seguir mostra as suas conclusões.
  • 29. 29 Tabela 6. Financiamento em ações e estágio de crescimento das empresas Anos de vida da empresa Estágio da empresa Faturamento da empresa/ano (US$)* Fonte de financiamento -3 a 0 Concepção/ Criação Até 250 mil Poupança pessoal, família e amigos 0 a 2 Start-up De 50 mil a 500 mil Angel investors 2 a 4 Estágio Inicial Acima de 1 milhão Capital de risco Acima de 350 mil Small Business Investment Companies (SBIC) Acima de 350 mil Parcerias e alianças estratégicas 4 em diante Crescimento/ Expansão De 350 mil a 5 milhões Private Equity De 1 milhão em diante Captações em mercado aberto * O valores de faturamento anual na tabela acima não são valores absolutos. Eles devem ser adaptados às características de cada país. Fonte: Bygrave e Timmons, 1992; Deutscher, 2001. Adaptado por Pavani, 2003 2.5.3. FASE DESINVESTIMENTO Se um investimento for bem-sucedido, os capitalistas investidores tentaram encerrar o seu ciclo com um desinvestimento. O prazo para atingir esta etapa varia de país para país: nos Estados Unidos é de 5 a 7 anos, na Europa está em torno de 10 e no Japão chega a 17 anos (OECD, 1998). Os investidores podem optar por três caminhos, basicamente, conforme Pavani (2003): Mercado de ações – a empresa do portfólio do fundo de capital de risco faz a abertura de seu capital e, através de uma oferta pública inicial, oferece ao mercado as participações para o público. Esta forma permite que a empresa alcance o maior valor, e o investidor, o maior retorno; Venda privada – pode ser feita para outra empresa, geralmente interessada em algum ativo estratégico, outro investidor ou empregados. O investidor pode conseguir retorno expressivo em algumas operações.
  • 30. 30 Recompra – É a venda para a própria empresa ou para os acionistas fundadores, e se realiza quando o investimento foi mal sucedido do ponto de vista de atrair terceiros para o negócio, sendo, no entanto, um empreendimento auto-sustentável. Segundo Plagge (2006), esta última operação de recompra é mais restrita ao financiamento nos estágios de crescimento mais avançados. Normalmente, jovens empresas de alta tecnologia não possuem recursos para fechar este acordo. No caso delas, o IPO ou a venda privada representam a saída mais adotada por investidores capitalistas. Uma vez que os três estágios tenham se completado, o ciclo do capital de risco pode começar novamente. Como a vida da maioria dos fundos fica na casa dos oito ou dez anos, o dinheiro ressultante da venda de empresas no portfólio para terceiros retorna aos investidores originais, que têm a liberdade para decidir se querem colocar o dinheiro em um novo fundo criado pelos menos investidores capitalistas, se querem apostar em uma nova parceria que promete retornos mais altos ou migrar para outros tipos de aplicações. O gráfico 2 resume o ciclo de investimento do capital de risco. Gráfico 2. Ciclo de investimento em uma start-up Fonte: NVCA
  • 31. 31 2.6. SELEÇÃO, GOVERNANÇA E MONITORAMENTO Para poderem financiar projetos com as características mencionadas anteriormente, os gestores de PE/VC utilizam práticas sofisticadas de seleção, governança e monitoramento (Sahlman, 1990). Como uma regra geral, afirma Plagge (2006), as instituições de PE/VC englobam intermediários financeiros que têm no alvo – start-ups inovadoras de alto risco – e nos métodos as suas características identificadoras. Esses métodos incluem relacionamentos próximos, monitoramento formal e informal, mentoreamento e aconselhamento, que se constituem na chave da vantagem competitiva da indústria de PE/VC como opção de funding para start-ups em relação aos empréstimos bancários tradicionais ou outras fontes de recursos. Titericz (2003) acrescenta que, na sua escolha de investimentos, investidores capitalistas verificam três principais atributos: estratégia de saída, potencial de crescimento e equipe gerencial competente. Como a demanda geralmente é superior à oferta, Pavani (2003) nota que, em geral, uma empresa de capital de risco analisa muitos planos de negócios e investe em poucos. Nos Estados Unidos, o número que é citado por profissionais de mercado é um investimento para mil planos recebidos. Número citado pela Invent, investidor brasileiro, foi de receber cerca de 1.350 planos de negócios e investir em sete empresas. Para Gorman e Sahlman (1989), citados em Ribeiro (2005), a atividade de VC representa um modelo de atuação que, ao longo do tempo, incorporou princípios de governança que o permite lidar com situações de elevada incerteza, informação assimétrica, baixa liquidez e pouca ou nenhuma garantia real nos investimentos. Esses princípios são relativamente custosos de serem implantados e mantidos. Daí a sua limitação a projetos com elevada expectativa de retorno. Com base nos trabalhos de Gorman e Sahlman, Ribeiro (2005) agrupou os princípios de governança utilizados pela indústria de PE/VC em cinco: • Investimento por etapas: realização de investimentos por etapas – ou rodadas, preservando a opção de abandono; • Remuneração por resultado: remuneração do agente ligada ao resultado; • Garantias de liquidez futura: possibilidade de impor ao agente a devolução do capital;
  • 32. 32 • Monitoramento constante: acompanhamento frequente do desempenho e influência sobre a gestão e a governança corporativa. Os principais são investidores ativos, conforme descrito por Jensen (1991); • Restrições ao desalinhamento de Interesses: demais medidas para garantir que o agente represente os interesses do principal. Muitos estudos empíricos indicam que os capitalistas de risco precisam de experiência para selecionar, monitorar e dar apoio de forma exitosa a empresas de alta tecnologia e que precisam de reputação para levantar recursos de investidores externos. Por sua vez, o acúmulo de experiência e a reputação adquirida ao longo dos anos geram uma interdependência na trajetória de sucesso das empresas, ao passo que ondas sucessivas de empresas malsucedidas apoiadas por capitalistas de risco sem experiência minam a gênese dos mercados de capital de risco (Schertler, 2002b). Pavani (2003) ressalta que ao se tornar sócio do negócio, “o investidor capitalista passa a ser mais do que um mero „fornecedor‟ de capital”. Seu envolvimento com a empresa é alto, o que significa, muitas vezes, interferência na condução do negócio. Esse alto envolvimento implica, de um lado, na perda de independência dos gestores da empresa e na necessidade de informar o investidor sobre o desempenho da companhia; de outro, encaminha a empresa para uma maior organização, profissionalização da gestão e criação de processos. Na prática, além da etapa de monitoramento do investimento ou pós-investimento, a fase de seleção, avaliação e enquadramento dos investimentos, ou seja, as fases de pré- investimento, são aquelas que mais demandam tempo e esforço do gestor de PE/VC. É também a fase em que a capacidade e a experiência do analista podem agregar mais valor no processo, ou seja, em que se pode incrementar o retorno (Kaplan e Strömberg, 2001). Tal afirmação confirma a tese de que não existe na literatura um modelo de avaliação para precificar os investimentos de capital de risco amplamente aceito entre os capitalistas de risco, investidores e empreendedores, conforme observação de Amit et alli. (1999). O trabalho de Hellman and Puri (2000) conclui que o capital de risco é um fator interno importante nos estágios iniciais de uma start-up. Evidências indicam que a presença de funding de capital de risco é relevante para explicar diferenças entre empresas iniciantes. Isso porque o capital de risco possui características que o diferenciam de outras opções de financiamento (Gompers e Lerner, 1999, capítulo 7), devotando recursos significativos de
  • 33. 33 gestão para entender novas tecnologias e mercados, encontrar start-ups promissoras e provê- las do capital necessário e realizar o coaching delas durante os seus estágios iniciais.
  • 34. 34 CAPÍTULO 3 – O MODELO VENCEDOR AMERICANO 3.1. BREVE HISTÓRICO Embora o Vale do Silício seja, sem dúvida, o principal centro de capital de risco do mundo hoje, esta indústria, na verdade, começou do outro lado dos EUA, em Boston. O seu surgimento formal está relacionado à fundação da American Research and Development Corporation (ARDC), em 1946, por Georges Dorit, chamado mais tarde de "pai do capital de risco", ao lado de dois sócios (Bygrave and Timmons, 1992; Kenney and Florida, 2000). Mas o investimento que trouxe fama e lucros à ARDC ocorreu bem mais tarde, em 1957, um ano antes da criação da primeira firma de capital de risco da Costa Oeste americana, a Draper, Gaither & Anderson. Trata-se do aporte de US$ 70 mil e mais R$ 2 milhões em empréstimos à DEC, empresa líder na venda de sistemas de computador, software e periféricos dos anos 1960 aos anos 1990. Esse investimento inicial foi multiplicado várias vezes depois do IPO da empresa, em 1966. A ARDC continuou realizando aportes até 1971, data da aposentaria de Doriot, contabilizando investimentos em mais de 150 empresas. Os fundos de capital de risco tornaram-se relevantes apenas a partir da década de 1970 (RIECHE e Santos, 2006). Desde a criação dos primeiros fundos, os EUA despontam como a principal referência da indústria mundial. Segundo Tosta de Sá (1994), as principais lições extraídas da primeira fase da atividade de capital de risco nos EUA foram as seguintes: A captação de recursos do grande público mostrou-se inadequada para esse tipo de atividade; O retorno sobre o investimento é de longo prazo; É fundamental a manutenção de uma posição líquida para socorrer empresas ao longo da maturação de seus projetos; O acompanhamento gerencial é fundamental; e Às vezes, o retorno excepcional é garantido por um único investimento da carteira Em 1979, depois que o governo americano anunciou nova regulamentação para os investimentos dos fundos de pensão e reduziu os impostos sobre ganhos de capital, os investimentos desses fundos foram alavancados. Naquele ano, eles representavam apenas Y e a r T o t a l C u m u l a t i v e F u n d s T o t a l C u m u l a t i v e F i r m s T o t a l C u m u l a t i v e C a p i t a l ( $ B
  • 35. 35 15% do capital da indústria. Em 1986, os fundos de pensão já eram responsáveis pela metade do capital comprometido em PE/VC (Sahlam, 1990). Ribeiro (2005) observa que o grande ciclo de institucionalização da indústria de capital de risco americana ocorreu entre o início dos anos 1960 e a primeira parte dos 1980. “Em 1983, o modelo já estava suficientemente formatado e testado para que pudesse receber US$ 4,5 bilhões em novos recursos”. A cifra representava uma captação recorde em comparação a períodos anteriores. Ao final de 1983, a indústria já contabilizava US$ 12,1 bilhões, ou três vezes mais do que havia sob gestão ao final da década de 1970. Desde então, a indústria cresceu de forma exponencial até atingir pico em 2000, quando foram aplicados US$ 106 bilhões. Embora a indústria de PE/VC tenha sofrido suas maiores modificações nos anos 1980, a macroestrutura do setor evoluiu. Cornelius (2005) analisou mudanças na indústria americana nos últimos 15 anos e focou na mudança de perfil profissional dos gestores. A autora observou que o gestor contemporâneo de PE/VC vem do setor financeiro e teve formação equivalente ao MBA. Comparado ao gestor de outrora, é mais avesso a risco e, em geral, menos qualificado a auxiliar empreendedores na superação de obstáculos ligados à execução de estratégias empresariais. Conseqüentemente, os investimentos feitos por este gestor estão direcionados para empresas maduras, onde já há um corpo de executivos experientes no negócio. Zider (1998) explica que, ao contrário da percepção popular, o capital de risco desempenha apenas um papel menor no funding de inovação básica. Prova disso é que investidores capitalistas fizeram aportes de mais de US$ 10 bilhões em 1997, mas apenas 6%, ou US$ 600 milhões, foram destinados a start-ups. Além disso, a estimativa do autor é que menos de US$ 1 bilhão do bolo tenha sido aplicado em pesquisa e desenvolvimento. A maioria do dinheiro foi para novas rodadas de investimento em projetos desenvolvidos através de aportes governamentais (US$ 63 milhões) e de corporações (US$ 133 bilhões). Nos EUA, uma importante fonte de capital semente são os chamados business angels, investidores ricos que ajudam a suprir a falta de recursos de fontes externas para financiar as empresas iniciantes. Além de prover o capital semente, tais investidores costumam auxiliar as empresas a encontrarem importantes clientes e a recrutar funcionários. Como dito anteriormente, estimativa da revista The Economist aponta que os business angels sejam responsáveis, nos EUA, pela introdução de aproximadamente 40% das novas oportunidades
  • 36. 36 de negócios das empresas de capital de risco. Onde, então, a indústria de capital de risco desempenha um papel importante no ciclo de vida das empresas inovadoras? Nas palavras de Zider (1998, 32): (...) no período na vida de uma empresa quando ela começa a comercializar a sua inovação. Nós estimamos que 80% do dinheiro investido por investidores capitalistas é destinado à construção da infraestrutura necessária para o crescimento do negócio – em investimentos caros (manufatura, marketing e vendas) e no seu balanço (provendo ativos fixos e capital humano). Capital de risco não é dinheiro de longo prazo. A ideia é investir no balanço e infraestrutura até a empresa atingir um tamanho e credibilidade suficientes para que possa ser vendida a uma corporação ou de modo a permitir que fundos de equity possam entrar e prover liquidez. Na essência, o capital de risco compra uma fatia da ideia de um empreendedor, nutre-a por um período de tempo determinado e depois sai do negócio com a ajuda de um banco de investimento. Gráfico 3: como funciona a indústria de capital de risco nos EUA Fonte: Zider (1998). Modificado pelo autor Na indústria de capital de risco, timing é tudo. E o período ideal, segundo Zider (1998) é a fase adolescente do ciclo de vida de uma empresa. Nesta fase de crescimento acelerado, o financiamento de eventuais vencedores e perdedores é notavelmente parecido, o que explica o alto risco e a conseqüente alta taxa de retorno demandada por deste tipo de funding, como explica o gráfico a seguir.
  • 37. 37 Gráfico 4: qual etapa da vida de uma empresa concentra o capital de risco Fonte: Zider (1998). Modificado pelo autor 3.2. FATORES DECISIVOS Para Gorgulho (2006), a estrutura do sistema financeiro americano foi um poderoso fator de estímulo ao desenvolvimento da atividade de capital de risco no país.
  • 38. 38 Isso porque a legislação restritiva em relação ao sistema bancário contribuiu para que os bancos não tivessem o mesmo papel que representaram na experiência de industrialização de outros países. Esta legislação limitou o porte dos bancos, ao proibi-los de atuar em âmbito nacional, e tornou-os especializados, restringindo aos bancos comerciais a operação com títulos e seguros, bem como a aquisição de ações de empresas não-financeiras, como acontece com os bancos múltiplos em outros países. Outro ponto importante foi o precoce estabelecimento de mercados de ações, inclusive de mercados exclusivos para empresas de menor porte, que se constitui em um ingrediente fundamental para a concretização do ciclo de investimento de capital de risco. A título de comparação, a Nasdaq, bolsa eletrônica que funciona no mercado de balcão americano e negocia ações de empresas de alta tecnologia, tem listadas mais de 3,5 mil companhias de 46 países, representando um valor total de mercado de US$ 6,9 trilhões. O número de empresas listadas na BM&FBovespa é quase 10 vezes menor, ficando na faixa das 400. Historicamente, nos EUA, uma companhia não entra no mercado de capitais sem faturamento de US$ 15 milhões, ativos de US$ 10 milhões e um histórico razoável de lucros (Zider, 1998). Menos de 2% das cinco milhões de empresas nos EUA possui faturamento superior a US$ 10 milhões. Mesmo com a redução de custos para a realização de um IPO, o autor aponta que a janela de financiamento para start-ups abaixo desta linha continua pequena. E é aí que entra o capital de risco, preenchendo o espaço entre os fundos para inovação e as fontes tradicionais de financiamento. Desde a sua formação, no início dos anos 1970, a indústria de capital de risco americana investiu US$ 456 bilhões em mais de 27 mil empresas (National Venture Capital Association, 2008). Embora muitas destas empresas tenham falido, sucessos como eBay, Apple, Intel e Google levaram à criação de novas indústrias e novas maneiras de fazer negócios. Segundo a NVCA, depois de muitos anos de crescimento anômalo e contração promovidos pela bolha de tecnologia e o seu estouro em 2000, a indústria de capital de risco retornou, nos últimos anos, para uma trajetória de crescimento constante, com os investidores capitalistas investindo entre US$ 20 bilhões e US$ 30 bilhões por ano. A indústria aprendeu que não pode avançar para novos patamares nos setores existentes da indústria. Entretanto, com inovações promissoras ocorrendo na área de energia limpa, novas descobertas no campo da medicina personalizada e avanços na computação em nuvem, espera-se que o capital de risco continue a crescer de maneira firme nos próximos anos.
  • 39. 39 Um crescimento que vem com a promessa de mais empregos e receita para a economia dos EUA (NVCA, 2008). Gráfico 5: Investimento de capital de risco nos EUA 1970-2008 Fonte: MoneyTree Report da PwC e NVCA,com base em dados da Thomson Reuters.Modificado pelo autor 3.3. IMPACTO ECONÔMICO Segundo estudo da NVCA, para cada dólar de capital de risco investido nos EUA entre 1970 e 2008, foram gerados US$ 6,36 em receita em 2008. Além disso, foi criado um emprego no país para cada US$ 37.702 de capital de risco aplicados no mesmo período. O mesmo estudo diz que, ainda em 2008, as empresas com aporte de capital de risco eram responsáveis por 12,1 milhões de empregos, ou 11% do total do setor privado americano, e receita de US$ 2,9 trilhões, o equivalente a 21% do Produto Interno Bruto (PIB) americano. Os setores em que o impacto do capital de risco era maior na geração de emprego e receita eram os de varejo/distribuição, serviços de saúde, indústria/energia e computadores e periféricos. Além disso, há evidências de que o apoio via capital de risco faz com que as empresas jovens cresçam mais rápido, criem mais valor e gerem mais emprego do que outras empresas iniciantes. Pesquisas empíricas nos EUA mostraram que o capital de risco pode aumentar de forma significativa a habilidade de novas firmas para criar emprego e riqueza. As empresas
  • 40. 40 apoiadas por capital de risco perseguem inovações mais radicais e estratégias de comercialização mais agressivas. O capital de risco aumenta a velocidade de profissionalização e o crescimento dessas empresas (Keuschnigg, 2004). Por outro lado, cabe mencionar que é mais difícil estudar a indústria de capital de risco - em comparação com outras indústrias financeiras -, uma vez que muito pouca informação relevante é de domínio público (as empresas financiadas são privadas). Além disso, não existem bolsas organizadas para investimentos de capital de risco, o que reduz ainda mais a oferta de informações (Amit et al., 1998). Quando comparadas às demais empresas, aquelas financiadas por PE/VC apresentavam o dobro da receita, pagavam três vezes mais impostos, exportavam o dobro e investiam o triplo em pesquisa e desenvolvimento (P&D) em relação ao ativo total. (Taylor et al ). Mais importante, o gasto em P&D se revertia em inovação, como revelou o estudo de Kortum e Lerner (2000) sobre o impacto do investimento de PE/VC na geração de patentes. Graças aos investimentos de PE/VC, empresas como Microsoft, Compaq, Fedex, Apple, Sun, Amazon, Lotus, Cisco, Staples, Netscape, eBay, JetBlue, Intel, Amgen, Medtronic, Oracle e Google cresceram e, rapidamente, tornaram-se grandes corporações. As evidências quanto ao impacto econômico-social da atividade de PE/VC são ainda mais impressionantes quando se considera que os investimentos realizados pelo setor em 2002 representavam não mais de 0,6% do PIB americano.
  • 41. 41 CAPÍTULO 4 – O QUE É QUE O VALE DO SILÍCIO TEM? Em dezembro de 1980, menos de cinco anos após a sua fundação, a Apple Computer abriu o seu capital, no que se tornou a maior oferta pública inicial do mercado de ações americano desde a Ford Motor Company, em 1956, criando mais milionários instantâneos do que qualquer outra empresa até então. A oferta de capital de risco explodiu depois do bem- sucedido IPO de US$ 1,3 bilhão de uma empresa criada numa garagem por Steve Jobs e Steve Wozniak (Livingston, 2007). Hoje a Apple é uma das muitas empresas que se tornaram símbolos do sucesso de uma região ao Norte da Califórnia, conhecida como Vale do Silício, que engloba 14 cidades. Essa região ficou assim conhecida por conta da sua liderança na produção de semicondutores no passado, mas se reinventou ao longo dos anos a ponto de se tornar sinônimo da indústria de alta tecnologia americana. Além da Apple, um número significativo de empresas de alta tecnologia inovadoras foram fundadas na região e criaram milhares de empregos. Hewlett Packard, National Semiconductor, Intel, AMD, Oracle, Cisco Systems, Yahoo! eBay e Google, apenas para citar as mais conhecidas, foram fundadas e têm a sua sede no vale. Para Ferrary e Granovetter (2009), a região "é um objeto privilegiado de pesquisa no esforço de entender clusters industriais e inovações”. Os números ajudam a dimensionar esta Meca da tecnologia. Em 2005, o Vale do Silício contava 1,15 milhão de empregos e 22 mil companhias (Joint Venture, 2008). Em 2008, de cada 1.000 trabalhadores da área de tecnologia empregados nos EUA no setor privado, 285,9 estavam na região de São José/Vale do Silício (AEA, 2008), a maior concentração do país. De acordo com este mesmo estudo, esses trabalhadores também eram os mais bem pagos, com salário médio anual de US$ 144,8 mil, seguidos por San Francisco (US$ 118,5 mil) e Austin, Texas (US$ 100,5 mil). E em termos de números de patentes registradas, 11 das top 20 cidades dos EUA em 2006 pertenciam à região do Vale do Silício (Joint Venture, 2008). Mas Ferrary e Granovetter (2009) observam que, "a despeito da enorme cobertura jornalística e dos numerosos livros, não ainda não entendemos por que o Vale do Silício foi o berço de tantas inovações disruptivas e grandes empresas”.
  • 42. 42 Para os autores, o fracasso de vários legisladores mundo afora em reproduzir o cluster do Vale do Silício revela uma incompreensão da dinâmica de inovação da região, cuja durabilidade da competência inovadora nos últimos 70 anos também precisa ser melhor explicada. Neste debate, Steven M Davidoff, articulista do jornal The New York Times, ressalta que não existe nenhum consenso sobre como criar o próximo Vale do Silício. E o fato de não haver uma fórmula pronta é um grande problema para aqueles países que têm se aventurado neste caminho. Davidoff argumenta que “França, Noruega e Malásia fracassam, apesar dos seus esforços. Nos EUA, A Califórnia continua dominando”. 4.1. ONDAS DE INOVAÇÂO Não é de hoje que o Vale do Silício atrai as melhores mentes empreendedoras. Historicamente, esta região se caracteriza por uma alta taxa de criação de start-ups. De 1990 a 2000, 2,1 mil empresas de alta tecnologia foram fundadas por ano, na média (Zhang, 2003). Uma das especialidades do Vale do Silício sempre foi provocar terremotos econômicos que abalam as fundações da economia global. Cataclismas como estes aconteceram ao menos três vezes nos últimos 60 anos: a comercialização dos circuitos integrados, o desenvolvimento do computador pessoal e a aplicação da internet. Cada uma destas inovações mudou a natureza da economia de modo fundamental, assim como as estradas de ferro, a eletricidade e o rádio fizeram no passado (Join Venture, 2001). Gráfico 6: Evolução do Vale do Silício 1950 -2000 Fonte: Silicon Valley Edge. Alterado pelo autor
  • 43. 43 Cada onda de inovação transformou de maneira disruptiva a economia do Vale do Silício e foi seguida por uma onda de crescimento. A região sofreu diversas crises, mas conseguiu se reinventar e fortalecer a sua capacidade inovadora (Kenney & Von Burg, 2000). Estudo da Joint Venture (2001) aponta motivos para os principais cenários de recessão enfrentados pelo Vale do Silício. 1970 - cortes nos gastos da Secretaria de Defesa americana do Vietnã; 1985 - excesso de oferta e competição estrangeira na indústria de semicondutores; 1990 - cortes nos gastos da Defesa americana e excesso de oferta na indústria de computadores pessoais; . 2000 - estouro da chamada bolha das ponto.com, as empresas de internet, e o excesso de oferta na indústria de telecomunicações. Em cada ciclo, no entanto, o Vale do Silício provou ser um grande centro de inovação e empreendedorismo e surfou a onda seguinte. Durante a recessão dos anos 1970, as empresas do Vale transformaram as tecnologias de defesa em aplicações comerciais. O circuito integrado, em particular, fez a transição do uso militar para o uso comercial. Durante a recessão dos semicondutores, em 1985, as empresas substituíram os chips tratados como commodities por microprocessadores com alto valor agregado. Nos anos 1990, o Vale do Silício aprendeu como transformou a rede ARPANET, bancada pelos militares americanos, na internet comercialmente viável. Esse sucesso ocorreu mesmo num contexto de competição cada vez mais acentuada. Se o Japão e outros países demoraram 25 anos competir com a indústria dos semicondutores do Vale do Silício nos anos 1980, a vantagem competitiva da região durou menos de cinco anos com a internet nos anos 1990 (Join Venture, 2001).
  • 44. 44 4.2. A FÓRMULA DO SUCESSO Como já foi dito anteriormente, ninguém ao certo sabe a fórmula do sucesso do Vale do Silício. Ao menos cinco razões têm sido apontadas nos últimos anos, que serão brevemente tratadas a seguir: Ousadia empreendedora; Ambiente único; Capital de risco mais abundante e mais fácil de ser obtido; Foco em setores e não em empresas; e O papel desempenhado pelo capital de risco, motivo sobre o qual falaremos mais detalhadamente. 4.2.1. OUSADIA EMPREENDEDORA A adversidade sempre funcionou como um motor de inovação para o Vale do Silício, seja ela resultante de crise financeira ou pela competitividade ameaçada. A mesma ideia, embora com mais licença poética, está contida em uma afirmação de Paul Saffo, um futurista da tecnologia de Menlo Park: “O fracasso é uma parte essencial do nosso ecossistema. É como um incêndio florestal abrindo espaço para um novo crescimento” (Join Venture, 2001). Zider (1998) faz uma observação mais pessimista, porém igualmente relevante. Para ele, as empresas financiadas pelo capital de risco atraem pessoas talentosas apelando para a “mentalidade de loteria”. Apesar do alto risco de fracasso em novas empreitadas, engenheiros e homens de negócio deixam seus empregos demonstrando falta de capacidade ou de vontade de perceber qual arriscada pode ser uma start-up. A situação deles pode ser comparada aos dos jogadores de basquete esperançosos no segundo grau, que devotam horas ao esporte apesar da minúscula probabilidade de se tornarem profissionais e ganharam milhões. Em resumo, a mentalidade de que o fracasso é algo positivo no contexto da inovação e do empreendedorismo estimula novas tentativas. Como disse uma vez o criador da Apple, Steve Jobs, "Eu sou a única pessoa que conheço que perdeu um quarto de bilhão de dólares em um ano. Isso é muito edificante."
  • 45. 45 4.2.2. AMBIENTE ÚNICO Steven M. Davidoff, articulista do jornal The New York Times, afirma que alguns teóricos apontam o ambiente inovador e empreendedor único do Vale do Silício como resultado do gasto militar na área, combinado a duas grandes instituições de pesquisa e o surgimento de empresas de tecnologia derivadas de companhias com o lendário centro de pesquisa da Xerox, na cidade de Palo Alto, "criou a massa crítica que estimulou a formação de fundos de capital de risco e seduziram as pessoas inovadoras". Estudo da Joint Venture (2001) afirma que o segredo do Vale do Silício é o fato de ele ser um habitat especial para inovação e empreendedorismo, que consiste de redes e relacionamentos densos e flexíveis entre empreendedores, investidores capitalistas, pesquisadores universitários, advogados, consultores e empregados altamente qualificados, que sabem como traduzir ideias em novos produtos comerciais e serviços de maneira rápida o suficiente para estar sempre à frente na curva da inovação. Essas redes de relacionamento densas e a proximidade geográfica promovem a interação face a face necessária para este arranjo funcionar, o que não acontece em outros lugares criativos, como os centros financeiros de Londres, Manhattan e Hong Kong ou na indústria cinematográfica de Hollywood. O estudo completa: Inovação é um processo “social”. Raramente ele ocorre porque um único indivíduo ou uma empresa levam uma ideia ao mercado. Ao contrário, envolve muitas pessoas desempenhando muitos papéis em um processo colaborativo dinâmico ao redor de equipes criativas e interação face a face. Trabalho criativo, ao contrário da rotina de produção, requer proximidade. Inovação não é um processo linear, mas um processo ativo de aprendizado através da tentativa e erro. De fato, o Vale do Silício se tornou mais conhecido por sua inovação e empreendedorismo do que por uma indústria específica ou tecnologia. 4.2.3. CAPITAL DE RISCO ABUNDANTE E MAIS ACESSÍVEL Trinta e cinco das 50 maiores empresas financiadas por capital de risco nos EUA estão na Califórnia, segundo a lista de 2011 elaborada pelo Wall Street Journal.
  • 46. 46 Uma das explicações para o resultado é que, ao contrário de outras partes dos EUA, a indústria de VC no Vale do Silício investe a maior parte dos seus fundos em negócios locais (Florida e Kenney, 2000) – vale lembrar que o Facebook foi fundado em Boston, mas migrou para a região em busca de funding. (Von Burg e Kenney, 2000) argumentam que o pool impressionante de empreendedores na região é a causa deste fenômeno. O desenvolvimento dos fundos de VC ocorreu paralelamente ao rápido crescimento das indústrias de alta tecnologia do Vale do Silício e o capital de risco ajudou a bancar cada onda de inovação na região. Levantamento de Ferrary e Granovetter (2009) mostra que, de 1995 a 2005, investidores capitalistas fizeram aportes de US$ 111 bilhões, 32,48% de todo o capital de risco aplicado nos EUA no período. Uma comparação do investimento per capita de capital de risco entre o Vale do Silício e outros centros inovadores do mundo evidencia a diferença. Apenas em 2005, o Vale do Silício registrou investimento per capita 32 vezes maior do que o da Inglaterra, 120 vezes ao da França e 181 vezes ao da Alemanha. Tabela 7: investimento do capital de risco no mundo População (milhões) Investimento 2005 (US$ milhões) Investimento 1995-2005 (US$ bilhões) US$/hab 2005 US$ /hab 1995-2005 EUA 295,6 2.276,8 341,7 77 1.158 Vale do Silício 2,2 8.115,0 111,0 3.341 45.691 Europa 460,2 15.205,4 119,3 33 259 Inglaterra 59,9 6.278,1 35,2 105 588 Alemanha 82,0 1.518,7 19,9 18 242 França 60,6 1.686,3 16,4 28 270 Bélgica 10,5 136,0 3,2 13 304 Dinamarca 5,1 1.003,3 2,6 185 487 Finlândia 5,2 179,8 1,9 34 364 Fonte: Ferrary e Granovetter, 2009, com dados da NVCA. Modificado pelo autor Com base nos dados de aportes de capital de risco realizados entre 1992 e 2001, o que inclui 22,4 mil rodadas de investimento e 11 mil empresas, Zhang (2005) concluiu que as start-ups do Vale do Silício têm acesso mais fácil ao capital de risco. “Elas recebem a primeira rodada de capital de risco numa idade mais jovem e completam mais rodadas de financiamento. Esse acesso mais fácil tem um efeito significativo na performance de uma start-up no Vale do Silício”.
  • 47. 47 Ainda no Vale do Silício, start-ups completaram a primeira rodada de VC com a idade média de 11,48 meses. A média dos EUA foi de 19,33 meses. Em relação ao número total de rodadas completas, as start-ups do Vale do Silício alcançaram 2,61 no período de 1992 a 2001, contra a média nacional foi de 2,23 rodadas. Para completar, as start-ups do Vale do Silício receberam os maiores aportes a cada rodada: US$ 10,91 milhões. Gráfico 7: investimento de VC por regiões no 1º tri de 2011 nos EUA Fonte: Money Tree Report 4.2.4. FOCO EM SETORES, NÃO EM EMPRESAS Zider (1998), empreendedor do Vale do Silício, afirma que a noção de que investidores capitalistas investem em boas pessoas e boas idéias é um mito. “A realidade é que eles investem em boas indústrias - ou seja, indústrias que são mais competitivas do que o mercado como um todo”. O autor cita que, em 1980, quase 20% dos investimentos de capital de risco nos EUA foram para a indústria de energia. Mais tarde, o fluxo de capital mudou rapidamente de engenharia genética, varejo de nicho e hardware para CD-ROMS, multimídia, telecomunicações e empresas de software. 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600 Vale do Silício Boston Nova York Los Angeles 202 90 67 41 1.528,20 749 566 464 No. Negócios Aporte (US$ milhões)
  • 48. 48 Segundo Zider, a aparente aleatoriedade destas mudanças entre tecnologias e segmentos da indústria é mal compreendida: o segmento-alvo em cada caso estava crescendo rapidamente, e sua capacidade prometia estar limitada pelos próximos cinco anos – ou seja, seria impossível suprir a demanda. Na verdade, investidores capitalistas focam no meio da clássica curva em S da indústria. Eles evitam tanto os estágios iniciais, quando as tecnologias são incertas e as demandas do mercado desconhecidas, e os estágios avançados, quando turbulências competitivas e consolidações são inevitáveis e as taxas de crescimento caem dramaticamente. Um exemplo é a indústria de hard disk drives (HDs). Em 1983, havia mais de 80 delas nos EUA, metade financiada por capital de risco. No final de 1984, o valor de mercado da indústria havia caído de US$ 5.4 bilhões para US$ 1,4 bilhão. Em 1998, havia sobrado apenas cinco grandes players. Zider reforça que a ideia é que se expandir num setor de alto crescimento é muito mais fácil do que se ele estiver desacelerando ou decrescendo, como todo gestor sabe. Em outras palavras, a despeito de todo o talento ou carisma de um empreendedor, ele raramente recebe dinheiro da indústria de VC se estiver num segmento de mercado de baixo crescimento. Investindo em áreas com altas taxas de crescimento, as firmas de VC, em primeiro lugar, transferem o seu risco à habilidade dos gestores da companhia em executar. Além disso, ficam maiores às chances de desinvestir, porque os bancos de investimento, neste ponto, estão atrás de empresas de alto crescimento para trazê-las ao mercado de capitais. 4.3. O PAPEL DO VENTURE CAPITAL Para Ferrary e Granovetter (2009), o Vale do Silício deve ser visto como um cluster de inovação e não industrial. Um cluster industrial é caracterizado por sua capacidade em gerar e desenvolver inovações incrementais, que reforçam sua excelência e competitividade num domínio específico da indústria. Por exemplo, a indústria financeira em Wall Street ou a indústria cinematográfica em Hollywood. Já um cluster de inovação é caracterizado por sua habilidade em gerar e desenvolver tecnologias disruptivas, que criam novos domínios para a indústria e redesenham radicalmente o valor da sua cadeia produtiva.
  • 49. 49 Mas o que explica a durabilidade da capacidade inovadora do Vale do Silício? Para responder a esta pergunta, os autores recorreram à teoria de redes complexas (CNT). Essa teoria ajuda a explicar um fenômeno (biológico, tecnológico, sociológico etc.), que não resulta da simples interação de um número reduzido de agentes de forma linear, mas é produto de múltiplas interações não-lineares entre vários e diversos agentes caracterizadas. A dinâmica da inovação no Vale do Silício, argumentam os autores, é às vezes reduzida a apenas um agente (a Universidade de Stanford ou a HP) ou a interações entre poucos agentes (universidades, laboratórios de pesquisa e grandes empresas). Na verdade, existem muitos outros agentes envolvidos. A CNT enfatiza a robustez (ou resiliência) de sistemas mais do que a sua estabilidade para explicar como um sistema pode ou não superar mudanças radicais externas ou choques competitivos. Como um sistema complexo, o Vale do Silício é formado por redes de agentes heterogêneos, complementares e interdependentes. Ferrary e Granovetter afirmam que os investidores capitalistas são a principal (e mais subestimada) fonte de robustez da rede complexa de inovação do Vale do Silício. E apontam dois motivos principais. Uma minoria das start-ups de alta tecnologia são financiadas por investidores capitalistas no estágio inicial. O índice é de 9%, em média. Ou seja, de cada 2,1 mil empresas de alta tecnologia criadas por ano, apenas 200 conseguem capital semente. Por outro lado, quase todas as grandes empresas de alta tecnologia do Vale do Silício foram financiadas por VC. Ou seja, as firmas de VC financiam o estágio inicial das start-ups mais bem-sucedidas Estudos internacionais sobre clusters de alta tecnologia apontam que a maior diferença entre o Vale do Silício e outros centros ao redor do mundo não é o tamanho das universidades, a presença de grandes companhias ou a qualidade dos laboratórios de pesquisa. Mas a enorme presença de firmas de VC (Lee, Miller,Hancock & Rowen, 2000). Em 2006, havia 180 delas no Vale do Silício, 650 nos EUA. A investigação das redes complexas da região aponta para cinco funções específicas da indústria de VC como sua contribuição à robustez do sistema. Além de financiar start-ups, os fundos selecionam os projetos mais promissores da região, sinalizam as melhores start-ups para a comunidade de negócios, acumulam e espalham conhecimento empresarial no cluster e servem de ligação para os agentes interdepententes da rede.
  • 50. 50 4.3.1. O CASO GOOGLE Ferrary e Granovetter (2009) afirmam que, ao menos, 12 diferentes agentes são envolvidos na criação e no desenvolvimento de start-us bem sucedidas. Um exemplo disso, observam os autores, pode ser visto com clareza na criação do Google. Ela envolveu a Universidade de Stanford, onde os fundadores estudaram para receber o título de PhD. Mais tarde, a universidade forneceu empregados à empresa e continua a testar novos serviços desenvolvidos pelo Google. Dois dos maiores fundos de capital de risco da região, Sequoia Capital e Kleiner, Perkins, Caufield & Byers (KPCB), aportaram dinheiro na start-up. A firma de advogados Wilson, Sonsini, Goodrich & Rosati, localizada em Palo Alto, foi encarregada da dimensão legal do empreendimento. Yahoo! (financiado pela Sequoia Capital) e AOL (financiado pela KPCB) foram os dois primeiros clientes do Google. Jornais locais, como o San Jose Mercury News e o San Francisco Chronicle, deram visibilidade è companhia. O Hambrecht & Quist e o CSFB, dois bancos de investimento de San Francisco, organizaram o IPO do Google. Em 2006, a empresa já era uma das maiores do Vale do Silício e contribuiu para o sistema complexo adquirindo start-ups na região, entre elas o YouTube (do portfólio da Sequoia Capital). No Vale do Silício existem (Ferrary e Granovetter, 2009): 10 universidades; 40 centros de pesquisas privados ou públicos; 8,7 mil grandes empresas, com mais de 100 empregados; 180 fundos de VC; 3,2 mil escritórios de advocacia especializados; 329 agências de recrutamento e seleção; 1.913 firmas de contabilidade; 311 companhias de relações públicas; 700 bancos comerciais e 47 de investimento; 100 jornais voltados ao ambiente de alta tecnologia do Vale do Silício, que empregam em torno de 500 jornalistas. São estes 12 agentes que interagem entre si no ciclo de vida de uma start-up.
  • 51. 51 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS Desde os anos 1950, o Vale do Silício soube se reinventar sempre que exposto a crises e choques competitivos. Cada recessão foi seguida de uma onda de inovação disruptiva que mudou a economia global (JOIN VENTURE, 2008). Ferrary e Granovetter (2009) observam que os fundos de VC ajudaram a bancar cada uma destas ondas de inovação. Mas criar uma indústria de capital de risco de sucesso não é uma tarefa fácil. Das 36 economias com uma associação nacional do setor, menos de 10 têm indústrias com alguma relevância. Como uma instituição, a indústria de VC é muito frágil e requer um certo número de pré-condições para crescer. (Šinkovec e Cizelj, 2011). Apesar da atividade de PE/VC ocorrer em diversas regiões do globo, a situação dos EUA é tão diferenciada que Gompers e Lerner (1998) questionam até a adaptabilidade deste modelo americano à realidade de outros países. Ferrary e Granovetter (2009) citam o caso da França, que tem buscado criar clusters de inovação há mais de 30 anos. Nos anos 1970, o país tentou criar perto de 20 "tecnópolis", que geraram poucas start- ups e nenhum crescimento de dentro para fora. Em 2006, ouve nova investida, mas, a exemplo do passado, os legisladores franceses definiram um cluster de inovação como um grupo localizado de universidades, laboratórios e grandes empresas. Para os autores, o governo ignorou o agente mais importante e mais substimado: os fundos de capital de risco. Šinkovec e Cizelj (2011) afirmam que o fator crucial para explicar o desenvolvimento de uma indústria de VC vibrante é a disponibilidade de investimentos suficientemente grandes para que os retornos justifiquem o alto risco. Aí esbarra-se em outro problema. Não são todas as empresas de tecnologia que oferecem serviços ou produtos disruptivos, capazes de trazer altos retornos e fazer o ciclo do capital de risco girar. É mais fácil copiar ideias bem sucedidas no Vale do Silício, sobretudo em países com um público potencial gigante, como China e Brasil, do que apostar em ideias originais e não testadas. Outro fator importante para fazer da indústria de VC um motor impulsionador da economia é a existência de mecanismos de saída ou desinvestimento bem desenvolvidos. Isso porque o sucesso da atividade pressupõe um desinvestimento no menor prazo possível e com o maior retorno possível (Gorgulho, 1996 e Ribeiro, 2005). Neste sentido, a pouca representatividade e o difícil acesso ao mercado de capitais brasileiro são um ponto
  • 52. 52 desfavorável - os IPOs são a maneira mais lucrativa de um fundo recuperar o invesimento em uma start-up. Por último, Ferrary e Granovetter (2009), lembram que o Vale do Silício deve ser visto como um cluster de inovação, que busca desenvolver tecnologias disruptivas, e não como um cluster industrial, cujo objetivo é gerar e desenvolver inovações incrementais. Davidoff (2011) lembra que grandes programas do governo podem funcionar bem na criação de clusters industriais para competir em áreas estabelecidas. A Coreia do Sul e a China se tornaram tremendos sucessos econômicos ajudadas pelo investimento público focado nas grandes empresas exportadoras. "Mas governantes não são tão bons para criar o próximo Facebook ou tecnologia inovadora. Isso segue domínio das redes de capital de risco" Este trabalho apresenta limitações por não avançar na pesquisa qualitativa. O uso de questionários e entrevistas enriqueceria a discussão, uma vez que há pouca informação sobre o comportamento dos empreendedores brasileiros nesta área. Como sugestão para futuros trabalhos, recomendamos estudos sobre o impacto do capital de risco no Brasil nos resultados das empresas.
  • 53. 53 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMIT, R. et al. Why Do Venture Capital Firms Exist? Theory and Canadian Evidence. Journal of Business Venturing13: 441–466, 1999 BERGEMANN, D, e HEGE U. Dynamic Venture Capital Financing, Learning and Moral Hazard. Journal of Banking and Finance, 22, 703-735, 1998 BROPHY, D. J. U.S. venture capital markets. In Organisation for Economic Co-operation and Development, Venture capital and innovation, 1996 BYGRAVE, Willian D., Timmons, Jeffry .A. Venture Capital at the Crossroads, Harvard Business School Press, Boston, Massachusetts, 1992 BUSSINESS ANGELS: Giving ideas wings. The Economist, 14 de setembro de 2006. Disponível em: http://www.economist.com/node/7905466. Acesso em 14 de abril de 2011. CARVALHO, A. G.; RIBEIRO, L. L.; FURTADO, C. V. A indústria de Private Equity e Venture Capital: primeiro censo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2006. 135 p. CERVO, A.L. e BERVIAN, P.A. Metodologia Científica: para uso de estudantes universitários. 3a.ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1983 COMODO, Gustavo Cardoso. Uma Análise Comparativa entre as Estruturas de Private Equity e Venture Capital nos EUA e no Brasil. Dissertação (Mestrado em Administração), Fundação Getulio Vargas, São Paulo, 2009