1. alternativa
N
ão importa o estilo, a música sempre teve
Por: Hevlyn Celso
Fotos: Reinaldo Borges o poder de ultrapassar barreiras e no
passado, como no presente, grandes no-
mes como Johann Sebastian Bach, Ray Charles, Stevie
Wonder, Andrea Bocelli, entre tantos outros, mostra-
Música sem ram que a deficiência nunca foi impedimento para que
o talento aflorasse e se desenvolvesse. Mas e a música
fronteiras
eletrônica? Será que também é para todos?
A disc jockey Lisa Bueno, 30 anos, sempre gostou de
música. Aos 15 anos, ouvia música o dia inteiro e admi-
Alunos com deficiência aprendem rava as mixagens dos DJ’s da rádio comunitária perto
a arte da discotecagem de sua casa. Um dia, ao visitar a rádio, perguntaram
por que não seguia a carreira. Conta que “foi encos-
tar no vinil” para descobrir que era aquilo que queria
fazer. “Comecei a dar aulas em casa, no meu quarto,
foi encostar no vinil
comprei os equipamentos e a coisa foi crescendo; dou
para descobrir que era
aulas há 13 anos, e há sete, nos mudamos da Freguesia
do Ó para o Centro”, conta a proprietária da escola.
aquilo que queria fazer
– lisa bueno
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2. alternativa
O ensino para pessoas com deficiência aconteceu
por acaso, quando tocou em uma festa para pessoas
com deficiência auditiva no Museu de Arte Moderna
(MAM). O professor de Libras do museu, Leonardo
Barbosa Castilho, 24 anos, que possui deficiência au-
ditiva, foi o organizador da balada. Ele olhou, interes-
sou-se pelo sistema e foi convidado para assistir a uma
aula. Léo, como é chamado, é oralizado e frequente-
mente passa por espanhol devido ao “sotaque”. Se-
gundo Lisa, ele está se saindo muito bem. Ela diz que
praticamente não fez adaptações nas aulas, apenas
se utiliza de toques e gestos para chamar a atenção
do aluno, que fica de olho nos gráficos do compu-
tador, e o equipamento é programado para sa-
lientar sons graves, o que permite a Léo sentir
as vibrações das músicas posicionando o pé
em cima de uma caixa acústica, no chão.
Para ensinar o auxiliar administrativo
Anderson Souza da Mata, 26 anos, que
tem deficiência visual devido a uma do-
Senti-me privilegiado
ença degenerativa, poucas mudanças foram diz Anderson. Para Léo, ela é pura adrenalina. “Quando
necessárias. Autodidata, ele sempre teve a a sinto vibrar no meu corpo, percebo os detalhes e acho
por ter sido aceito no
música como um hobby, mas só “pegou firme”
uma coisa muito incrível, que mexe com minha cabeça, curso, gostei bastante
ao adquirir a deficiência. Com a intenção de se
abre mais, eu penso em muita coisa”, conta. da iniciativa
aprimorar, buscou a escola. “Senti-me privilegia-
do por ter sido aceito no curso, gostei bastante da Anderson sonha em tocar em baladas de prestígio
Lisa diz estar amando ensiná-los “Dou aulas há mui-
iniciativa”. Ele comprou o equipamento aos pou- como a Spirit of London; já Léo quer criar músicas fei-
to tempo, então estou mesmo à procura de desafios.
cos, memorizou onde fica cada botão, e com alguns tas especialmente para a comunidade surda. Questio-
Todo mundo tem que seguir o que realmente quer; não
adesivos colados no vinil, encontra os pontos de nados sobre a possibilidade de um dia tocarem juntos, existem barreiras, as barreiras vêm da gente. Não vejo
mixagem. Ele irá para o módulo avançado, e por
dizem nunca terem pensado nisso antes, que a ideia é a hora de vê-los participando de eventos e campeona-
enquanto, tem tocado em festas de amigos.
boa, mas um tanto engraçada. tos. Isso vai me emocionar muito”.
Mais do que uma futura carreira ou hobby,
a música é uma terapia para os dois. “Ela Além dos dois, a escola acaba de receber a matrícula
é motivação, ocupação... quando estou de um usuário de cadeira de rodas. Há também uma e-djs
‘pra baixo’, coloco um som, mexo nos www.e-djs.com.br
turma da terceira idade, com 15 alunos. As aulas são
Rua 24 de Maio, 116 – 1º andar
equipamentos, aí vem aquela energia individuais, para um melhor aprendizado, com duração República - São Paulo - SP
positiva, uma energia muito boa”, de uma hora. Cada módulo é composto por 24 aulas. Tel.: (11) 3331-0898
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