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A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
Página 149
A MANTENÇA DE ANIMAL SILVESTRE
A PROPÓSITO DE ESTIMAÇÃO
ADILSON LUÍS FRANCO NASSARO
Aluno do Curso de Direito das FIG
1. INTRODUÇÃO
A conduta de mantença de animal silvestre a propósito de estimação é muito
comum no Brasil, tanto no meio rural quanto no meio urbano. Ocorre que espécimes
diversos tais como papagaios, araras, macacos e tartarugas, integrantes da fauna
silvestre, são mantidos em ambiente doméstico sem autorização ou licença devida
e, em que pese a irregularidade de tal situação, verifica-se que se encontram os
animais quase sempre bem cuidados, submetidos à condição de ente de estimação
de quem exerce sobre eles a posse.
O vocábulo “mantença” é aplicado neste estudo porque significa exatamente
provimento de sustento, ou mantenimento, sendo o seu emprego adequado para
classificar a conduta do possuidor que trata do espécime simplesmente para o
propósito de estimação e nunca para finalidade comercial ou de utilização.
Manter um animal silvestre em ambiente doméstico a propósito de estimação
não representa uma mal em si e não constitui ação moralmente reprovável; aliás,
diversas espécies foram salvas da extinção em razão de que foram preservados
espécimes representativos em cativeiro. Porém, a conduta pode estimular a retirada
ilegal de espécimes do ambiente selvagem e o seu comércio clandestino,
comprometendo a perpetuação das espécies e o equilíbrio ecológico, e esta é a
grande preocupação dos ambientalistas e estudiosos das questões da fauna.
A Lei nº 9.605/98, que trata dos crimes ambientais, dá margem a algumas
interpretações, menos ou mais rigorosas, sobre o tema proposto. Afinal, a mantença
de animal silvestre é crime ou não? Pois bem, existem mais de 700.000 espécimes
da fauna silvestre no interior de casas e em quintais, apenas no Estado de São
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Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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Paulo, na condição de bichos de estimação. Qualquer um de nós conhece um
vizinho ou um parente que possui animal silvestre em casa e quase todos não têm
licença ou autorização para tanto. Essa é a realidade.
2. CONCEITOS BÁSICOS
A fim de que seja possível analisar com precisão as normas legais vigentes
que tratam sobre assunto tão específico, faz-se necessária preliminar verificação do
vocabulário freqüentemente utilizado para o estudo da legislação ambiental aplicada
à fauna.
O vocábulo animal possui dois sentidos básicos, encontrados no dicionário; o
primeiro, mais amplo e originado na zoologia, corresponde à: “ser organizado, com a
forma do corpo relativamente constante, órgãos na maioria internos, tecidos
banhados em solução que contém cloreto de sódio, células revestidas de
membranas delicadas, com crescimento limitado, e provido de irritabilidade ou
sistema nervoso, que lhe permite responder prontamente aos estímulos”; o segundo,
que exclui o ser humano, indica: “qualquer animal que não o homem; o animal
irracional”
1
.
Quando a lei utiliza a palavra “animais” sem qualquer adjetivo que a
qualifique, quer representar todo o conjunto de seres vivos excluindo as plantas e o
ser humano. O sentido jurídico da palavra, portanto, é o segundo, o mais restrito.
Assim, o “animal” a que se refere o texto legal, diz respeito ao ser vivo, - exceto o
homem - que é organizado e que, em oposição às plantas, é dotado de
sensibilidade e movimento.
O homem, coletivo, apesar de também constituir uma espécie animal no
sentido mais amplo da palavra em análise, coloca-se acima de todas as outras
espécies e racionalmente dita normas de aproveitamento, ou mesmo de
convivência, em relação a elas. Por isso, no plano legal, somente o ser humano é
sujeito de direitos e deveres, enquanto que os “animais”, em sentido estrito, são
considerados objetos jurídicos por ele tutelados.
1
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova
Fronteira, 1996.
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Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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Espécie é a unidade biológica fundamental. Representa um conjunto de
indivíduos que possuem várias características semelhantes entre si e em relação
aos seus ancestrais e que, além dessas semelhanças, ainda se entrecruzam.
Identificam-se as espécies animais particularmente em virtude das
qualidades do seu hábitat natural, ou seja, do ecossistema em que naturalmente
são encontrados os seus representantes; aliás, as próprias características das
espécies decorrem da influência do meio em que evoluíram, em razão da somatória
de mínimas variações genéticas, verificadas no ciclo da vida animal.
Podem ser as espécies, portanto, classificadas como próprias de uma região
ou de um país, em razão do local em que se encontra seu meio natural. Assim, para
aplicação da legislação pertinente, é fundamental observar que existem espécies
brasileiras, também denominadas próprias da fauna brasileira (ou simplesmente
"silvestres"), e aquelas que não integram a fauna nacional. Importante tal divisão
para se verificar, por exemplo, o valor ecológico de um animal em determinado
espaço natural, definindo-se sua condição de parte, ou não, essencial ao equilíbrio
do ecossistema local.
A palavra espécime possui um sentido totalmente diferente da palavra
“espécie” e, devido à semelhança de grafia dos dois vocábulos, tem sido observada
certa confusão em relação ao seu emprego, mesmo na redação das leis. A
distinção, porém, é simples: o espécime é um indivíduo representativo de um grupo
(espécie, gênero ou família), ou seja, qualquer animal ou planta, vivo ou morto, ao
contrário da espécie, que é toda uma coletividade de espécimes com características
comuns.
Fauna significa o conjunto dos animais próprios de uma certa região ou de
um dado período geológico. No texto legal, quase sempre a palavra é acompanhada
de um adjetivo que reduz o universo de sua abrangência, como por exemplo,
silvestre, doméstica, exótica (de outros países), ictiológica (dos animais que têm na
água o seu principal meio de vida), etc. Algumas vezes, inclusive, verifica-se a
combinação desses adjetivos, o que reduz ainda mais o conjunto de espécies
animais representadas, a exemplo do art. 2
o
da portaria do Ibama nº 93, de
07.07.98, que estabelece normas para importação e exportação de animais vivos,
além de produtos e subprodutos da “fauna silvestre exótica” (espécies selvagens
próprias de outros países). Quando empregada isoladamente, a palavras “fauna”
representa todas as espécies animais exceto a espécie humana.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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3. CLASSIFICAÇÃO LEGAL DOS ANIMAIS
3.1 Animais da fauna silvestre
O art. 1
o
da Lei nº 5.197/67 estabelece o critério geral de qualificação da
fauna silvestre: “Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase de seu
desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a
fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são
propriedade do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição,
caça ou apanha” (grifo nosso). Já o § 3
o
, do art. 29, da Lei nº 9.605/98, veio a
ampliar o conceito de fauna silvestre para abranger também os animais que, apesar
de não serem próprios do Brasil, nascidos ou não no país, têm ao menos parte do
seu ciclo natural de vida no território nacional: São espécimes da fauna silvestre
todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer
outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida
ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais
brasileiras”.
Portanto, nos limites do território nacional, os animais que pertencem a
espécies migratórias, oriundos de outros países, têm tratamento legal especial, pois
são reconhecidos como integrantes do conjunto da fauna silvestre nacional. Há
interesse do Estado na sua preservação, eis que desenvolvem relações de
interdependência com outras formas de vida locais, enquanto permanecem no meio
natural do território brasileiro.
O critério básico é a condição de viver naturalmente fora do cativeiro, ou
seja, é animal silvestre aquele que em razão de suas características físicas e
comportamentais vive naturalmente sem qualquer relação de dependência com o
homem. Como se observa, esta é uma norma em branco, que exige
complementação de outra fonte para a sua exata compreensão e justa aplicação.
Sendo assim, o Poder Público deveria apresentar regulamentação da matéria,
estabelecendo quais são efetivamente as espécies silvestres, particularmente as
brasileiras, no plano da classificação geral das espécies proposta pela biologia; no
entanto, essa é uma tarefa muito difícil, ou mesmo impossível, levando-se em conta
a quantidade e a mutabilidade das espécies existentes.
Atualmente são conhecidas mais de um milhão de espécies animais no
mundo e todos os anos este número cresce com a descoberta de novos
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Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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organismos. Na dinâmica da natureza, a própria evolução das espécies faz com que
umas se extingam e outras apareçam, com ou sem a interferência do homem, em
decorrência das transformações a que estão sujeitas ao longo do tempo. Como
tecnicamente é inviável relacionar em regulamentação quais as espécies que
naturalmente vivem fora do cativeiro - e por isso integram a fauna silvestre -, o que
abrangeria a maior parte dos bichos desde um simples inseto até uma onça-pintada,
os animais são legalmente considerados como silvestres por processo de exclusão,
na seguinte fórmula: são animais da fauna silvestre todos aqueles que não são
animais da fauna doméstica.
3.2 Animais da fauna doméstica
O conceito de fauna doméstica é trazido pelo inciso III, do art. 2
o
, da portaria
Ibama nº 93/98: "Fauna Doméstica: todos aqueles animais que através de
processos tradicionais e sistematizados de manejo e/ou melhoramento zootécnico
tornaram-se domésticos, apresentando características biológicas e comportamentais
em estreita dependência do homem, podendo apresentar fenótipo variável, diferente
da espécie silvestre que os originou.”
O anexo I da mesma portaria apresenta uma “listagem de fauna
considerada doméstica para fins de operacionalização do Ibama”, que traz o nome
comum, além do nome científico das espécies (nome composto, em latim). São
relacionados nessa listagem animais como: abelhas, cabra, cavalo, coelho,
cachorro, gado bovino etc.
Ao contrário do animal da fauna silvestre, o animal doméstico já está
naturalmente adaptado para a vida em cativeiro, apresentando características
físicas e comportamentais que indicam dependência do ser humano para a sua
sobrevivência. Isso em razão de que diversas gerações da mesma espécie viveram
em contato direto com o homem, impondo-se gradativa alteração do fenótipo dos
indivíduos (característica do exemplar, determinada pelo seu genótipo e pelas
condições ambientais locais) que, ao longo do tempo, muito lentamente foi sendo
incorporada às características do respectivo grupo animal.
As espécies hoje consideradas integrantes da fauna doméstica são o
provável resultado de um processo histórico em que o homem elegeu, desde
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Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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tempos remotos, alguns animais - que naturalmente já ofereciam pouca resistência
ao cativeiro - para viverem sob sua custódia, como uma garantia de provisão
quando lhe faltasse a caça habitual; deles poderia facilmente obter alimentos (carne
e ovos) e matérias para atender outras necessidades (peles para proteger-se do frio,
ossos e chifres para construção de armas etc.).
Gradualmente, o homem veio descobrindo outras formas de aproveitamento
dos animais, que passaram a ser utilizados como instrumento de locomoção e
transporte de objetos (cavalo com rédeas, cavalo ou boi atrelados a carros ou
charretes), como meio de prover segurança ou recurso de caça para captura de
outros animais (cães treinados para defesa, farejadores e cães de caça), como meio
de obtenção de medicamento (abelha, na produção de mel e própolis), como meio
de esporte e recreação (corridas, competições diversas envolvendo os próprios
animais em disputas) e tantas outras formas de aproveitamento que foram sendo
incorporadas à cultura dos diversos povos. Por isso, é possível classificar os animais
domésticos em “utilitários”, ou seja, aqueles que são objeto de utilização e os
domésticos chamados “de estimação”, estes mantidos pelo homem sem finalidade
de utilização.
Hoje em dia, aliás, quando se fala em animal doméstico, remete-se
automaticamente àqueles bichos tais como cães, gatos e pássaros que, apesar de
não serem utilizados economicamente ou como meio de obtenção de qualquer
vantagem, desempenham uma exata função junto ao seu mantenedor, a de simples
companhia e são recipiendários de gestos de afeto, o que proporciona ao homem
moderno um grande bem estar sobre o qual ele quase sempre desconhece a razão.
Pois o que lhe faz bem é o próprio contado com outra forma de vida animal, que
passou a denominar “de estimação” em vista de sua afeição e apreço desenvolvidos
por ela, pela vida. No meio urbano, onde atualmente habita a maior parte das
pessoas, é o animal de estimação quase sempre a ligação mais forte, tanto quanto
primitiva, do homem com a própria natureza.
3.3 Animais domesticados
Alguns espécimes integrantes da fauna silvestre que mantêm intenso contato
com o ser humano, em especial aqueles que ainda filhotes foram colocados em
cativeiro (por exemplo, papagaios, araras ou macacos), deixam com o tempo de
apresentar características selvagens. O animal nessa condição, apesar de seu
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Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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comportamento assemelhar-se muito ao dos animais domésticos, não será
classificado como tal, ainda que mantido a propósito de estimação; continuará
sendo espécime da fauna silvestre nacional, pois pertence à espécie que não é
legalmente considerada doméstica. O espécime nessa situação é considerado
animal silvestre domesticado, ou simplesmente animal domesticado.
3.4 Animais da fauna exótica
Os chamados animais da fauna exótica (ou da fauna alienígena), por
exemplo, o elefante, o leão e o canguru, são animais próprios de outros países que
comportam ecossistemas com características diversas dos ecossistemas localizados
no Brasil. Congregam, portanto, outros países, hábitat de permanência de espécies
que naturalmente não seriam encontradas no Brasil, salvo no caso dos espécimes
em rota migratória.
A questão do tráfico ilegal de animais silvestres é um grande mal que deve
ser combatido em âmbito internacional, para o bem do equilíbrio ecológico do
planeta. É ilusão imaginar que apenas animais da fauna alienígena são
transportados irregularmente pelas fronteiras, ingressando eventualmente no Brasil;
da mesma forma com que chegam animais da fauna exótica, vários espécimes da
fauna silvestre nacional (considerados exóticos em outros países) saem
irregularmente das fronteiras brasileiras, para suprir a demanda do comércio
clandestino no exterior.
4. A INTERPRETAÇÃO DO VOCÁBULO “UTILIZAÇÃO”
Na evolução da tutela legal da fauna no Brasil, a Lei nº 5.197, de 03.01.67,
conhecida como “Lei de Proteção à Fauna” e também como “Código de Caça”, veio
substituir o anterior Código de Caça (de 1943) e trouxe, logo em seu art. 1
o
, a
imposição de que os animais silvestres são propriedade do Estado, ou seja,
pertencem à União.
O mesmo artigo, ainda, estabeleceu proibição da “utilização, perseguição,
destruição, caça ou apanha” de animais silvestres, condutas doutrinariamente
conhecidas como “atos de caça”. Posteriormente, a rigorosa Lei nº 7.653/88 veio a
classificar tais condutas como crime inafiançável.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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Uma questão na época discutida, quanto à aplicação da Lei nº 5.197/67, era
a compreensão do vocábulo “utilização”. Para a mais restrita interpretação, a
conduta criminosa de utilização consistia em fazer uso do animal da fauna
silvestre com o objetivo de obtenção de real vantagem, como conseqüência da
prática da caça propriamente dita, excluindo-se da tipificação legal a conduta de
simples mantença a propósito de estimação.
Nesse entendimento, não praticaria crime quem mantivesse um papagaio,
uma arara, ou um macaco em seu quintal, na condição de animal de estimação e
sim, por exemplo, quem usasse um animal silvestre na condição de “chama”, ou
seja, para atrair outros animais a fim de capturá-los, quem expusesse uma arara em
estabelecimento comercial a fim de despertar a atenção de transeuntes para o
interior de seu comércio, quem mantivesse um papagaio ou um macaco preso a um
realejo para fazer sorteio de bilhetes vendidos ao público, ou, ainda, um artista que
exibisse uma onça-pintada, utilizando-a em seu espetáculo.
A corrente mais radical, no entanto, entendia que a própria relação de
afetividade desenvolvida pelo homem em relação ao animal silvestre no seu
convívio doméstico caracterizava a utilização, eis que o mantenedor dela tirava
proveito no que diz respeito ao seu equilíbrio emocional, aliado ao fato de que,
exercendo a posse injusta de propriedade da União, mantinha irregularmente o
animal como se doméstico fosse e, portanto, indevidamente integrado ao seu
patrimônio.
Com o passar do tempo, a primeira interpretação acabou por se revelar mais
coerente e a maioria absoluta dos julgados veio confirmar a posição de que a
mantença de animais silvestres em cativeiro a propósito de estimação não
configurava crime sob a forma de utilização, nos termos da Lei nº 5197/67.
2
Condicionou-se, então, no âmbito da fiscalização, a interpretação de que a
conduta “utilização” é configurada em razão da obtenção de real vantagem por parte
do agente que tem por instrumento, ou meio, o animal silvestre, compreendendo-se
atípica a prática de simples mantença do animal silvestre para o propósito de
estimação.
2
TRF 3a
Região – 1a
T. – AC – Rel. Ramza Tartuce – DJU 22.03.1994 – RJ 200/131; TRF 1a
Região –
3a
T. – Rec. – Rel. Tourinho Neto – RJ 196/98; TRF 3a
Reg., Acr. 03006148/SP, 2a
T., relator Juiz
Célio Benevides, julgado em 10.12.1996.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
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5. A CONDUTA DE “MANTENÇA” FACE O ART. 29 DA LEI Nº 9.605/98
A Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 consolidou, em parte, vários textos
legais que tratavam de crimes ambientais e, por essa razão, é ela conhecida como
“Lei de Crimes Ambientais”. No que se refere à matéria de fauna, não revogou todas
as disposições da Lei nº 5.197/67.
Dentre os artigos Lei nº 9.605/98 que prevêem condutas criminosas contra a
fauna, destaca-se o 29 (não aplicável aos atos de pesca, conforme § 6
o
), que
relaciona diversas ações especialmente em seu caput e nos três incisos do
parágrafo primeiro. É ele o primeiro de uma série de artigos que integram a Seção I,
sob o título “Dos Crimes contra a Fauna”. Traz, basicamente, as ações criminosas
de maior incidência na relação de exploração entre o homem e os animais e
seguramente é o mais complexo dos artigos da referida lei:
“Art. 29: Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da
fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida
permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou
em desacordo com a obtida:
Pena – detenção de seis meses a um ano, e multa.
§ 1
o
. Incorre nas mesmas penas:
I – quem impede a procriação da fauna, sem licença,
autorização ou em desacordo com a obtida;
II – quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo
ou criadouro natural;
III – quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire,
guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos,
larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota
migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos,
provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida
permissão, licença ou autorização da autoridade competente.
§ 2
o
. ...”
Detemo-nos no caput e nos três incisos do parágrafo primeiro, do art.
29, para destacar que foram relacionadas condutas anteriormente não consideradas
criminosas. O texto legal objetivou claramente alcançar não somente a proteção da
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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integridade dos animais silvestres, projetada no texto do caput do artigo, mas
também a proteção da capacidade de reprodução da fauna (inciso I, do § 1
o
), a
proteção da integridade dos ninhos, abrigos e criadouros naturais (inciso II, do
§ 1
o
) e a restrição da exploração econômica do animal silvestre e de seus
subprodutos (inciso III, § 1
o
), mediante imposição de igual sanção penal às práticas
criminosas, ou seja, na forma simples, a detenção de seis meses a um ano, além de
multa.
Observa-se, em princípio, que o caput do art. 29 da Lei nº 9.605/98 manteve
basicamente o mesmo conjunto de ações já previstas no art. 1
o
da Lei nº 5.197/67,
constituindo-se, à evidência, em um aperfeiçoamento da norma legal. Logo, a
interpretação da conduta criminosa de “utilizar” é a mesma da lei anterior, qual
seja, a obtenção de real vantagem por parte do agente.
Poderia o legislador ter suprimido, do caput, a conduta de “utilizar”, vez que a
especificou na seqüência, no inciso III, do parágrafo primeiro, em face da
predominante circunstância do aproveitamento econômico que caracteriza a
utilização, levando em conta que o enfoque desse inciso, conforme observado, é a
restrição da exploração econômica do animal silvestre e de seus subprodutos.
Confirmam o nítido enfoque da exploração econômica no inciso III, Vladimir
Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas
3
: “O inciso III refere-se ao comércio
de espécimes da fauna silvestre, em diversas modalidades, provenientes de
criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença, ou autorização da
autoridade competente. (...) O tipo penal, agora, utiliza várias formas de conduta
(vender, expor à venda, exportar, adquirir, ter em cativeiro ou depósito, utilizar ou
transportar). Visou o legislador evitar qualquer tipo de justificativa para o mais
condenável dos atos, que é o comércio de animais”.
Constata-se, no inciso III, certa semelhança com a seqüência de condutas do
art. 12 da Lei 6.736/76, sobre os crimes relacionados ao tráfico de entorpecentes, o
que serve como referência para estudo. Objetivando coibir o comércio ilícito de
entorpecentes aquele dispositivo apresentava diversas ações semelhantes àquelas
que vieram a constar na Lei 9.605/98 para restringir o comércio de espécimes da
3
Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas. Crimes Contra a Natureza. 6a
ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais. 2000. p. 80.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
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fauna silvestre e outros bens a ela relacionados (aliás, o comércio ilegal de animais
silvestres também é denominado tráfico). O art. 12 da Lei 6.736/76 apresenta,
dentre outras, as condutas de vender, expor à venda, exportar, adquirir, guardar,
ter em depósito e transportar.
A semelhança não é gratuita. O legislador em 1998 teve como evidente
referência e fonte de vocabulário a Lei 6.736/76 pois, tal como o tráfico de
entorpecentes, o tráfico de animais silvestres passou a representar um desafio para
o Poder Público a partir do momento em que se constatou o grave prejuízo que tal
prática causava à sociedade. Por ocasião do surgimento da Lei 9.605/98, tinha-se
notícia de que, na área dos negócios ilegais, em rota internacional, a venda de
animais silvestres somente perdia para o tráfico de drogas e para o comércio de
armas, em razão do cálculo de que 10 bilhões de dólares eram movimentados
nesse mercado por ano, sendo um décimo desse valor apenas no Brasil. Quando o
legislador se propôs a descrever, no inciso III do § 1
o
, da Lei 9.605/98, o crime
contra a fauna silvestre sob o enfoque da exploração econômica desautorizada,
pretendeu abordar de forma ampla (tal como na Lei de Tráfico de Entorpecentes),
todas as condutas relacionadas à abominável prática de comércio do precioso bem
ambiental.
Dentre as condutas do referido inciso, destacam-se duas que podem gerar
certa polêmica: guardar e ter em cativeiro ou depósito. Ao inadvertido observador
pode parecer que se quis nesse momento coibir a mantença de animais silvestres
a propósito de estimação, pois esta é a primeira imagem que vem à mente quando
se descreve um animal silvestre “guardado ou mantido em cativeiro”. Sem discordar
quanto ao prejuízo ambiental que essa prática comum de fato provoca (na ausência
de possível autorização), constata-se que a proibição de tal conduta não é o
propósito do dispositivo em questão.
Conforme demonstrado, buscou-se no inciso III abarcar todas as formas
possíveis de atos de comércio ou atos a ele relacionados, dentre os quais a guarda
(doméstica ou não) e a conduta de ter em cativeiro ou depósito (em casa, no
quintal ou em qualquer outro local) o bem jurídico em questão com finalidade
mercantil e não a simples manutenção do animal para o propósito de estimação.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
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Exemplo de criminosa guarda doméstica de espécime (ou espécimes) da
fauna silvestre é a conduta do cidadão que possui em seu quintal um viveiro onde
guarda, sem licença, canários-da-terra, pintassilgos e araçaris para serem
negociados com sua vizinhança, ou com qualquer pessoa que a ele recorra para
adquirir, mediante pagamento, um desses pássaros. O seu propósito evidentemente
não é a manutenção para a estima, pois aquele que mantém um animal a propósito
de estimação (doméstico ou silvestre), não o aliena; pelo contrário, esforça-se por
mantê-lo sob seus cuidados em virtude do vínculo afetivo que se estabeleceu entre
ele (o mantenedor) e o animal de estimação.
Cabe, aliás, a observação da sutil diferença da aplicação dos verbos “ter" e
“manter” no texto legal. Mesmo não constituindo propriedade particular, o animal
silvestre nas mãos do comerciante irregular é tratado como objeto de venda, sendo
negociado tal como um eletrodoméstico. Já nas mãos do mantenedor, a título de
estimação, o animal silvestre é destinatário de um esforço pessoal daquele, que se
sente responsável pela manutenção de sua vida, e mesmo de seu bem estar. Ao
contrário do comerciante, o mantenedor não deseja desfazer-se do animal e sim
preservá-lo. Sob os cuidados do mantenedor, o animal desempenha uma função
que vai muito além do benefício produzido por um simples objeto; por isso é mantido
como forma de vida.
6. A GUARDA DOMÉSTICA E A HIPÓTESE DE PERDÃO JUDICIAL
Ainda no complexo art. 29, da Lei 9.605/98, verifica-se:
Ҥ 2
o
. No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não
considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as
circunstâncias, deixar de aplicar a pena”.
A Lei, nesse momento, apresenta imprecisão. Correto seria o uso do
vocábulo “espécimes” e não espécie, que foi equivocadamente empregado. Isso
porque, sendo a espécie o conjunto de animais existentes identificados por
características semelhantes, que os qualificam como componentes de um mesmo
grupo, evidentemente é quase impossível alguém conseguir guardar em casa, ou
em seu quintal, todo esse conjunto de animais. Talvez o legislador buscasse
transmitir a idéia de número não definido de animais guardados (um ou mais); nesse
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sentido, porém, deveria ter utilizado a expressão “espécime ou espécimes” e esta
parece ser a compreensão mais adequada para o que indica o dispositivo legal.
Na seqüência da interpretação do art. 29, deduz-se que se o infrator for
surpreendido guardando em sua residência ou quintal (guarda doméstica) espécime
da fauna silvestre, no sentido da guarda já abordada no inciso III, do § 1
o
- ou seja,
com propósito mercantil - poderá o juiz deixar de aplicar a pena correspondente,
considerando as circunstâncias do caso concreto, desde que o animal não integre
espécie ameaçada de extinção. Por uma questão de lógica, o § 2
o
só pode ser
relacionado à conduta prevista no inciso III, do § 1
o
(guarda com finalidade
comercial), pois em nenhum outro momento, no art. 29, foi utilizado o vocábulo
“guarda”, mesmo diante de extensa e minuciosa descrição de atos lesivos ao bem
ambiental “fauna” verificada nesse artigo.
A resposta proporcional ao menor potencial de lesividade da conduta em
relação ao meio ambiente é a razão da ressalva. O infrator individualmente
identificado que responde criminalmente pela guarda doméstica de animal ou
animais silvestres (para fins de comércio), pode ser beneficiado com o perdão
judicial, pois, agindo no âmbito de suas relações particulares, dá causa a prejuízo
ambiental não tão grave (quando o objeto de sua empreitada não integra espécie
ameaçada de extinção) quanto àquele decorrente da atividade de verdadeiras
organizações comerciais clandestinas que promovem tráfico de animais silvestres
em quantidades e proporções incalculavelmente superiores, especialmente dirigido
a compradores que se encontram fora dos pais.
Outrossim, a quantidade de espécimes presentes em determinado ambiente
doméstico, além do espaço em que são guardados e a própria forma como são
tratados, pode evidenciar o propósito mercantil. Em princípio, quem mantém animais
a título de estimação o faz, normalmente, em relação a um, dois, ou três espécimes
no máximo, e estes quase sempre se encontram muito bem cuidados. Ao contrário,
o particular que pretende auferir lucros, por menor que seja a expectativa de ganho,
normalmente guarda ou tem em depósito, para si ou para outrem, no seu ambiente
doméstico, vários espécimes (salvo os casos de espécies raras), ou seja, detém
uma quantidade suficiente para que as eventuais perdas do objeto de
comercialização - próprias da guarda em cativeiro -, não constituam obstáculo para
a obtenção de vantagem pecuniária advinda de suas transações; o bem estar
desses animais é o que menos importa ao comerciante irregular, nos limites de sua
residência.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
Página 162
Não é coerente, outrossim, relacionar a hipótese de perdão judicial com as
condutas do caput do art. 29: "matar, perseguir, caçar, apanhar ou utilizar", mesmo
levando-se em conta que o benefício legal está consubstanciado em um dos
parágrafos do referido artigo (§ 2
o
). O vocábulo “guarda” não se coaduna com
qualquer das condutas relacionadas no caput, que são doutrinariamente
classificadas como atividades próprias de caça. Quando muito, em relação a essas
condutas, a referida “guarda doméstica” poderia ser associada ao ato de “utilizar”;
porém, se tal fosse o propósito, para a hipótese de perdão judicial a Lei teria
empregado a expressão “utilização doméstica” de animal silvestre e, ainda assim,
haveria ser observado que a jurisprudência entende, de longa data, que somente se
configura a utilização quando verificada a obtenção de real vantagem, não sendo
nela compreendida a simples mantença de animal a propósito de estimação.
7. A QUESTÃO ECONÔMICA NA PRESERVAÇÃO DAS ESPÉCIES
O acesso particular ao animal integrante da fauna doméstica não é difícil, pois
este se reproduz normalmente em cativeiro. Já os animais integrantes de espécies
silvestres, que vivem naturalmente livres no meio selvagem, não se reproduzem
com a mesma facilidade quando submetidos ao cativeiro; faz-se necessário um
longo período de adaptação, o que acaba impondo a domesticação do espécime e o
inevitável aparecimento de transformações de ordem física e comportamental
observadas nas gerações seguintes, nascidas em criadouro.
Existe nesse ponto uma questão de ordem econômica a ser solucionada:
espécimes integrantes da fauna silvestre, legalmente comercializados, custam muito
mais porque são raros; são raros porque não se reproduzem com a mesma
facilidade que os domésticos no cativeiro; não podem ser retirados do meio natural
(caçados), para aproveitamento por clara disposição legal; e, finalmente, o valor
alcançado na venda de espécimes silvestres raros no mercado clandestino é
incentivo ao tráfico ilegal - nacional e internacional - e à caça proibida que o
abastece. Por outro lado, a fascinação das pessoas pelos animais silvestres em
razão do seu caráter exótico, exatamente porque é raro, faz com que sua procura
seja grande, inversamente proporcional a quantidade de espécimes legalmente
disponíveis.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
Página 163
Não defendemos a propriedade privada do animal silvestre, mas sim a plena
possibilidade de seu aproveitamento comercial e privado, inclusive como forma de
garantir a continuidade das espécies. Permitindo e viabilizando o aproveitamento
privado do animal silvestre, mediante expedição de instrumentos públicos
competentes, o Estado promove indiretamente a perpetuação das espécies em
razão do aumento do número de animais procedentes de cativeiro legalizado, o que
diminui a pressão sobre os animais que se encontram no meio selvagem. Estes
instrumentos encontram-se previstos nas leis de proteção da fauna, a exemplo do
inciso III, do § 1
o
, do art. 29, da Lei 9605/98, classificados em três espécies: a
permissão, a licença, ou a autorização.
Além da permissividade do aproveitamento econômico da fauna silvestre, o
incentivo público direcionado à iniciativa privada, nessa disposição, deve ser
suficiente para compensar as maiores dificuldades encontradas para reprodução de
espécimes da fauna silvestre em cativeiro e desestimular o aproveitamento privado
ilegal. Ao mesmo tempo em que o Poder Público incentiva o surgimento de
criadouros legalizados, deve intensificar o combate à caça e ao comércio ilegal de
espécimes silvestres.
Como reflexo da gestão racional dos bens ambientais, que já tem sido
observada no Brasil, está cada vez mais acessível, por exemplo, alimentar-se de
carne de animais silvestres tais como capivara e jacaré, sem infração aos
dispositivos legais de proteção à fauna, ou adquirir um papagaio ou uma arara, para
fins de estimação, nascidos em criadouro legalizado. Suprindo-se a carência do
mercado com espécimes reproduzidos em cativeiro, é possível, com o trabalho de
fiscalização e combate à caça e ao tráfico, preservar efetivamente os espécimes
remanescentes da vida selvagem e todas as suas qualidades físicas e
comportamentais.
Enfim, diante do processo de evolução das espécies animais, em futuro não
muito distante, o papagaio que encontrarmos nos poleiros dos quintais (espécie que
hoje representa mais da metade dos animais silvestres possuídos irregularmente),
pertencerá a uma espécie doméstica, assim legalmente reconhecida, e será
reproduzida em quantidade e preços compatíveis com a expectativa da sociedade
quanto ao seu aproveitamento privado. Tal mudança, com efeito vislumbrada pela
gestão racional dos bens ambientais, constituirá a própria garantia de que a espécie
equivalente, no meio selvagem, será perpetuada junto às áreas verdes com todas
as sua características físicas e comportamentais originais.
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
Página 164
8. A CONDUTA DE MANTENÇA NA ESFERA ADMINISTRATIVA
Em que pese a mantença de animais silvestres não ser tipificada na Lei dos
Crimes Ambientais, conforme interpretação apresentada, verifica-se que o cidadão
que possui um animal silvestre em casa para o fim de estimação, ainda que bem
cuidado, porém sem autorização, encontra-se objetivamente em situação irregular.
A repressão da posse injusta, nessa circunstância deverá ser efetivada por via
administrativa, pois, na verdade, a responsabilização penal é o último mecanismo de
controle do Poder Público para coibir os atos prejudiciais à vida em sociedade,
sendo ela destinada às condutas mais gravosas tais como a caça proibida e o
comércio ilegal de animais silvestres que trazem incalculável prejuízo ao equilíbrio
ecológico.
O § 3
o
, do inciso VII, do art. 225, da Constituição Federal, estabelece que “as
condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou
jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de
reparar os danos causados”. Já o Decreto nº 3.179/99 (federal) regulamenta a
aplicação das sanções às infrações ambientais, na esfera administrativa, dispondo
em seu art. 1
o
: “toda a ação ou omissão, que viole as regras jurídicas de uso, gozo,
promoção, proteção e recuperação do meio ambiente é considerada infração
administrativa ambiental e será punida com as sanções do presente diploma legal,
sem prejuízo da aplicação de outras penalidades previstas na legislação”; na
seqüência, especifica as sanções às infrações administrativas que vão desde
advertência, até a reparação dos danos causados.
A sanção administrativa que pode coibir, com sucesso, a posse injusta do
animal silvestre, nos termos do inciso II, do art. 2
o
, do Decreto nº 3.179/99, é a
multa. Verifica-se bom exemplo desse mecanismo de combate à infração
administrativa ambiental aplicado com êxito pelos órgãos de fiscalização em relação
ao exercício de pesca profissional ou de pesca amadora sem as licenças
específicas para tais atividades.
Da mesma forma que o exercício da pesca, que é autorizada mediante
licença expedida pelo órgão público competente (Ibama), para o aproveitamento
privado de recursos da fauna ictiológica, a posse justa do animal silvestre, para o
propósito de estimação, é obtida mediante instrumento público permissivo, no caso
de animal oriundo de criadouro legalizado. Ainda na comparação com as regras
proibitivas e permissivas no que diz respeito à pesca, observa-se que o
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
Página 165
aproveitamento irregular da fauna ictiológica pode também constituir crime, como
por exemplo, a pesca em período proibido ou em lugares interditados por órgão
competente e a pesca mediante uso de explosivos ou substâncias tóxicas
(respectivamente arts. 34 e 35, da Lei 9.605/98).
No Estado de São Paulo, a Resolução nº 27/90, alterada pela Resolução nº
82/98, da Secretaria do Meio Ambiente, baixada com fundamento nos incisos VI e
VII, do art. 23 e no inciso VI, do art. 24, da Constituição Federal (que estabelece a
competência de cada ente da Federação) especificou os enquadramentos
administrativos para imposição do Auto de Infração Ambiental. Ocorre que dentre as
atividades irregulares listadas não foi prevista a mantença, manutenção ou posse
injusta de animal silvestre para o propósito de estimação, mesmo após a atualização
do seu texto, mediante Resolução SMA-82/98. Dos enquadramento existentes, o
que mais se aproxima é o da “utilização”, porém, conforme já amplamente discutido,
o aproveitamento privado na modalidade “mantença a propósito de estimação” não
caracteriza a utilização.
Portanto, a matéria necessita ser regulamentada, a exemplo do texto da
referida Resolução para que seja possível uma atuação preventiva e eficaz,
mediante fiscalização do aproveitamento privado do recurso ambiental fauna
silvestre, na modalidade estudada, reconhecida a falta de tipicidade no âmbito
criminal. E o Estado federado tem competência para tanto, ou seja, para legislar
sobre fauna, dentre outros bens ambientais, desde que evidentemente não se
estabeleçam conflitos com a legislação federal em vigor, conforme estabelecido na
própria Constituição Federal (art. 24, inciso VI).
9. CONCLUSÕES
Não se pode desconsiderar a realidade do exercício irregular da mantença de
animais silvestres a propósito de estimação. É preciso analisar as origens históricas
e estudar os aspectos culturais de tal conduta, buscando-se soluções legais que
viabilizem uma compatibilização entre o necessário equilíbrio ecológico do ambiente
e a natural aproximação entre o homem e espécimes da fauna silvestre.
O exemplo do papagaio é bem ilustrativo da questão da mantença de animal
silvestre a propósito de estimação no Brasil. A sociedade de uma forma geral insiste
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
Página 166
em manter no meio doméstico um animal silvestre, por suas qualidades sem similar,
apesar do caráter irregular de tal conduta quando desprovida do instrumento legal
permissivo; não obstante, impõe-se a necessidade de preservar os espécimes
selvagens remanescentes nas áreas protegidas. Como solução, surgem criadouros
devidamente legalizados, porém, ainda sem capacidade para atender à demanda,
em razão da pouca oferta e do preço elevado do seu produto.
Há que ser observado que a sanção deve ser sempre proporcional a
lesividade imposta ao meio ambiente, como conseqüência da irregular intervenção
humana no bem público especialmente protegido. Por isso a sanção administrativa
de multa é a mais coerente para a repressão da mantença irregular e os órgãos de
fiscalização devem possuir instrumentos para a sua imposição, sendo esta a melhor
solução para o problema apresentado.
Tal como ocorre na fiscalização dos atos de pesca, quem for surpreendido
em ato de mantença de animal silvestre a propósito de estimação, sem estar
legalmente licenciado, poderá ter a descrição de sua conduta lançada em Auto de
Infração Ambiental, recebendo sanção de multa com valor suficiente para
desestimular a conduta, ou seja, um valor maior do que o preço de um animal
silvestre similar oriundo de criadouro legalizado; isso, evidentemente, conforme
regulamentação da matéria na esfera administrativa.
Por outro lado, caso seja constatada a prática criminosa (por exemplo maus
tratos, comércio ilegal, utilização etc.), o procedimento deverá ser outro, qual seja, a
prisão em flagrante delito do infrator ou a elaboração do Termo Circunstanciado
(para os crimes com rito processual estabelecido na Lei nº 9.099/95), em razão das
disposições da Lei 9.605/98.
Finalmente, quanto a difícil questão da apreensão do animal, valem algumas
considerações. Se há ilegalidade na conduta do possuidor, na esfera penal ou
administrativa, o animal deve ser apreendido em face de dispositivo legal; porém, na
prática, a retirada do animal do meio doméstico em que já se encontra adaptado
pode representar a sua morte e, portanto, um prejuízo ambiental ainda maior do que
aquele que, em tese, já teria ocorrido em razão de sua ausência no meio natural.
Solução viável que se apresenta é a de designar como depositário fiel do
animal o próprio mantenedor, que até então vinha exercendo sobre ele a posse
A mantença de animal silvestre a propósito de estimação
Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001
Página 167
injusta, desde que verificadas condições e circunstâncias adequadas para tal
designação. Como a legislação específica não impõe restrição a essa forma de
depósito na esfera administrativa e enfrenta-se grande dificuldade quanto à
colocação de animais silvestres apreendidos em entidades especializadas, conclui-
se que ela é a melhor alternativa para o problema da destinação do espécime
apreendido em decorrência de infração administrativa do possuidor, quando
constatado que o animal está bem cuidado e não pertence à espécie ameaçada de
extinção.
No caso de apreensão em decorrência de prática de crime, porém, não será
possível o depósito, por falta de previsão legal, em vista do que dispõe
taxativamente o § 1
o
, do art. 25, da Lei 9605/98.
BIBLIOGRAFIA
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua
Portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1996.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro.
São Paulo: Saraiva, 2000.
FREITAS, Wladmir Passos de, e outro. Crimes Contra a Natureza. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.
MASCARENHAS PRADO, Alessandra Rapassi. Proteção Penal do Meio
Ambiente – Fundamentos. São Paulo: Atlas, 2000.
MCFETRIDGE, Donald G. e outros. Economia e Meio Ambiente, a
Reconciliação. Porto Alegre: Ortiz. 1992.
PRADO, Luiz Regis Prado. Crimes Contra o Ambiente. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1998.

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A mantença de animais silvestres como estimação

  • 1. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 149 A MANTENÇA DE ANIMAL SILVESTRE A PROPÓSITO DE ESTIMAÇÃO ADILSON LUÍS FRANCO NASSARO Aluno do Curso de Direito das FIG 1. INTRODUÇÃO A conduta de mantença de animal silvestre a propósito de estimação é muito comum no Brasil, tanto no meio rural quanto no meio urbano. Ocorre que espécimes diversos tais como papagaios, araras, macacos e tartarugas, integrantes da fauna silvestre, são mantidos em ambiente doméstico sem autorização ou licença devida e, em que pese a irregularidade de tal situação, verifica-se que se encontram os animais quase sempre bem cuidados, submetidos à condição de ente de estimação de quem exerce sobre eles a posse. O vocábulo “mantença” é aplicado neste estudo porque significa exatamente provimento de sustento, ou mantenimento, sendo o seu emprego adequado para classificar a conduta do possuidor que trata do espécime simplesmente para o propósito de estimação e nunca para finalidade comercial ou de utilização. Manter um animal silvestre em ambiente doméstico a propósito de estimação não representa uma mal em si e não constitui ação moralmente reprovável; aliás, diversas espécies foram salvas da extinção em razão de que foram preservados espécimes representativos em cativeiro. Porém, a conduta pode estimular a retirada ilegal de espécimes do ambiente selvagem e o seu comércio clandestino, comprometendo a perpetuação das espécies e o equilíbrio ecológico, e esta é a grande preocupação dos ambientalistas e estudiosos das questões da fauna. A Lei nº 9.605/98, que trata dos crimes ambientais, dá margem a algumas interpretações, menos ou mais rigorosas, sobre o tema proposto. Afinal, a mantença de animal silvestre é crime ou não? Pois bem, existem mais de 700.000 espécimes da fauna silvestre no interior de casas e em quintais, apenas no Estado de São
  • 2. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 150 Paulo, na condição de bichos de estimação. Qualquer um de nós conhece um vizinho ou um parente que possui animal silvestre em casa e quase todos não têm licença ou autorização para tanto. Essa é a realidade. 2. CONCEITOS BÁSICOS A fim de que seja possível analisar com precisão as normas legais vigentes que tratam sobre assunto tão específico, faz-se necessária preliminar verificação do vocabulário freqüentemente utilizado para o estudo da legislação ambiental aplicada à fauna. O vocábulo animal possui dois sentidos básicos, encontrados no dicionário; o primeiro, mais amplo e originado na zoologia, corresponde à: “ser organizado, com a forma do corpo relativamente constante, órgãos na maioria internos, tecidos banhados em solução que contém cloreto de sódio, células revestidas de membranas delicadas, com crescimento limitado, e provido de irritabilidade ou sistema nervoso, que lhe permite responder prontamente aos estímulos”; o segundo, que exclui o ser humano, indica: “qualquer animal que não o homem; o animal irracional” 1 . Quando a lei utiliza a palavra “animais” sem qualquer adjetivo que a qualifique, quer representar todo o conjunto de seres vivos excluindo as plantas e o ser humano. O sentido jurídico da palavra, portanto, é o segundo, o mais restrito. Assim, o “animal” a que se refere o texto legal, diz respeito ao ser vivo, - exceto o homem - que é organizado e que, em oposição às plantas, é dotado de sensibilidade e movimento. O homem, coletivo, apesar de também constituir uma espécie animal no sentido mais amplo da palavra em análise, coloca-se acima de todas as outras espécies e racionalmente dita normas de aproveitamento, ou mesmo de convivência, em relação a elas. Por isso, no plano legal, somente o ser humano é sujeito de direitos e deveres, enquanto que os “animais”, em sentido estrito, são considerados objetos jurídicos por ele tutelados. 1 Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1996.
  • 3. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 151 Espécie é a unidade biológica fundamental. Representa um conjunto de indivíduos que possuem várias características semelhantes entre si e em relação aos seus ancestrais e que, além dessas semelhanças, ainda se entrecruzam. Identificam-se as espécies animais particularmente em virtude das qualidades do seu hábitat natural, ou seja, do ecossistema em que naturalmente são encontrados os seus representantes; aliás, as próprias características das espécies decorrem da influência do meio em que evoluíram, em razão da somatória de mínimas variações genéticas, verificadas no ciclo da vida animal. Podem ser as espécies, portanto, classificadas como próprias de uma região ou de um país, em razão do local em que se encontra seu meio natural. Assim, para aplicação da legislação pertinente, é fundamental observar que existem espécies brasileiras, também denominadas próprias da fauna brasileira (ou simplesmente "silvestres"), e aquelas que não integram a fauna nacional. Importante tal divisão para se verificar, por exemplo, o valor ecológico de um animal em determinado espaço natural, definindo-se sua condição de parte, ou não, essencial ao equilíbrio do ecossistema local. A palavra espécime possui um sentido totalmente diferente da palavra “espécie” e, devido à semelhança de grafia dos dois vocábulos, tem sido observada certa confusão em relação ao seu emprego, mesmo na redação das leis. A distinção, porém, é simples: o espécime é um indivíduo representativo de um grupo (espécie, gênero ou família), ou seja, qualquer animal ou planta, vivo ou morto, ao contrário da espécie, que é toda uma coletividade de espécimes com características comuns. Fauna significa o conjunto dos animais próprios de uma certa região ou de um dado período geológico. No texto legal, quase sempre a palavra é acompanhada de um adjetivo que reduz o universo de sua abrangência, como por exemplo, silvestre, doméstica, exótica (de outros países), ictiológica (dos animais que têm na água o seu principal meio de vida), etc. Algumas vezes, inclusive, verifica-se a combinação desses adjetivos, o que reduz ainda mais o conjunto de espécies animais representadas, a exemplo do art. 2 o da portaria do Ibama nº 93, de 07.07.98, que estabelece normas para importação e exportação de animais vivos, além de produtos e subprodutos da “fauna silvestre exótica” (espécies selvagens próprias de outros países). Quando empregada isoladamente, a palavras “fauna” representa todas as espécies animais exceto a espécie humana.
  • 4. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 152 3. CLASSIFICAÇÃO LEGAL DOS ANIMAIS 3.1 Animais da fauna silvestre O art. 1 o da Lei nº 5.197/67 estabelece o critério geral de qualificação da fauna silvestre: “Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase de seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são propriedade do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha” (grifo nosso). Já o § 3 o , do art. 29, da Lei nº 9.605/98, veio a ampliar o conceito de fauna silvestre para abranger também os animais que, apesar de não serem próprios do Brasil, nascidos ou não no país, têm ao menos parte do seu ciclo natural de vida no território nacional: São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras”. Portanto, nos limites do território nacional, os animais que pertencem a espécies migratórias, oriundos de outros países, têm tratamento legal especial, pois são reconhecidos como integrantes do conjunto da fauna silvestre nacional. Há interesse do Estado na sua preservação, eis que desenvolvem relações de interdependência com outras formas de vida locais, enquanto permanecem no meio natural do território brasileiro. O critério básico é a condição de viver naturalmente fora do cativeiro, ou seja, é animal silvestre aquele que em razão de suas características físicas e comportamentais vive naturalmente sem qualquer relação de dependência com o homem. Como se observa, esta é uma norma em branco, que exige complementação de outra fonte para a sua exata compreensão e justa aplicação. Sendo assim, o Poder Público deveria apresentar regulamentação da matéria, estabelecendo quais são efetivamente as espécies silvestres, particularmente as brasileiras, no plano da classificação geral das espécies proposta pela biologia; no entanto, essa é uma tarefa muito difícil, ou mesmo impossível, levando-se em conta a quantidade e a mutabilidade das espécies existentes. Atualmente são conhecidas mais de um milhão de espécies animais no mundo e todos os anos este número cresce com a descoberta de novos
  • 5. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 153 organismos. Na dinâmica da natureza, a própria evolução das espécies faz com que umas se extingam e outras apareçam, com ou sem a interferência do homem, em decorrência das transformações a que estão sujeitas ao longo do tempo. Como tecnicamente é inviável relacionar em regulamentação quais as espécies que naturalmente vivem fora do cativeiro - e por isso integram a fauna silvestre -, o que abrangeria a maior parte dos bichos desde um simples inseto até uma onça-pintada, os animais são legalmente considerados como silvestres por processo de exclusão, na seguinte fórmula: são animais da fauna silvestre todos aqueles que não são animais da fauna doméstica. 3.2 Animais da fauna doméstica O conceito de fauna doméstica é trazido pelo inciso III, do art. 2 o , da portaria Ibama nº 93/98: "Fauna Doméstica: todos aqueles animais que através de processos tradicionais e sistematizados de manejo e/ou melhoramento zootécnico tornaram-se domésticos, apresentando características biológicas e comportamentais em estreita dependência do homem, podendo apresentar fenótipo variável, diferente da espécie silvestre que os originou.” O anexo I da mesma portaria apresenta uma “listagem de fauna considerada doméstica para fins de operacionalização do Ibama”, que traz o nome comum, além do nome científico das espécies (nome composto, em latim). São relacionados nessa listagem animais como: abelhas, cabra, cavalo, coelho, cachorro, gado bovino etc. Ao contrário do animal da fauna silvestre, o animal doméstico já está naturalmente adaptado para a vida em cativeiro, apresentando características físicas e comportamentais que indicam dependência do ser humano para a sua sobrevivência. Isso em razão de que diversas gerações da mesma espécie viveram em contato direto com o homem, impondo-se gradativa alteração do fenótipo dos indivíduos (característica do exemplar, determinada pelo seu genótipo e pelas condições ambientais locais) que, ao longo do tempo, muito lentamente foi sendo incorporada às características do respectivo grupo animal. As espécies hoje consideradas integrantes da fauna doméstica são o provável resultado de um processo histórico em que o homem elegeu, desde
  • 6. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 154 tempos remotos, alguns animais - que naturalmente já ofereciam pouca resistência ao cativeiro - para viverem sob sua custódia, como uma garantia de provisão quando lhe faltasse a caça habitual; deles poderia facilmente obter alimentos (carne e ovos) e matérias para atender outras necessidades (peles para proteger-se do frio, ossos e chifres para construção de armas etc.). Gradualmente, o homem veio descobrindo outras formas de aproveitamento dos animais, que passaram a ser utilizados como instrumento de locomoção e transporte de objetos (cavalo com rédeas, cavalo ou boi atrelados a carros ou charretes), como meio de prover segurança ou recurso de caça para captura de outros animais (cães treinados para defesa, farejadores e cães de caça), como meio de obtenção de medicamento (abelha, na produção de mel e própolis), como meio de esporte e recreação (corridas, competições diversas envolvendo os próprios animais em disputas) e tantas outras formas de aproveitamento que foram sendo incorporadas à cultura dos diversos povos. Por isso, é possível classificar os animais domésticos em “utilitários”, ou seja, aqueles que são objeto de utilização e os domésticos chamados “de estimação”, estes mantidos pelo homem sem finalidade de utilização. Hoje em dia, aliás, quando se fala em animal doméstico, remete-se automaticamente àqueles bichos tais como cães, gatos e pássaros que, apesar de não serem utilizados economicamente ou como meio de obtenção de qualquer vantagem, desempenham uma exata função junto ao seu mantenedor, a de simples companhia e são recipiendários de gestos de afeto, o que proporciona ao homem moderno um grande bem estar sobre o qual ele quase sempre desconhece a razão. Pois o que lhe faz bem é o próprio contado com outra forma de vida animal, que passou a denominar “de estimação” em vista de sua afeição e apreço desenvolvidos por ela, pela vida. No meio urbano, onde atualmente habita a maior parte das pessoas, é o animal de estimação quase sempre a ligação mais forte, tanto quanto primitiva, do homem com a própria natureza. 3.3 Animais domesticados Alguns espécimes integrantes da fauna silvestre que mantêm intenso contato com o ser humano, em especial aqueles que ainda filhotes foram colocados em cativeiro (por exemplo, papagaios, araras ou macacos), deixam com o tempo de apresentar características selvagens. O animal nessa condição, apesar de seu
  • 7. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 155 comportamento assemelhar-se muito ao dos animais domésticos, não será classificado como tal, ainda que mantido a propósito de estimação; continuará sendo espécime da fauna silvestre nacional, pois pertence à espécie que não é legalmente considerada doméstica. O espécime nessa situação é considerado animal silvestre domesticado, ou simplesmente animal domesticado. 3.4 Animais da fauna exótica Os chamados animais da fauna exótica (ou da fauna alienígena), por exemplo, o elefante, o leão e o canguru, são animais próprios de outros países que comportam ecossistemas com características diversas dos ecossistemas localizados no Brasil. Congregam, portanto, outros países, hábitat de permanência de espécies que naturalmente não seriam encontradas no Brasil, salvo no caso dos espécimes em rota migratória. A questão do tráfico ilegal de animais silvestres é um grande mal que deve ser combatido em âmbito internacional, para o bem do equilíbrio ecológico do planeta. É ilusão imaginar que apenas animais da fauna alienígena são transportados irregularmente pelas fronteiras, ingressando eventualmente no Brasil; da mesma forma com que chegam animais da fauna exótica, vários espécimes da fauna silvestre nacional (considerados exóticos em outros países) saem irregularmente das fronteiras brasileiras, para suprir a demanda do comércio clandestino no exterior. 4. A INTERPRETAÇÃO DO VOCÁBULO “UTILIZAÇÃO” Na evolução da tutela legal da fauna no Brasil, a Lei nº 5.197, de 03.01.67, conhecida como “Lei de Proteção à Fauna” e também como “Código de Caça”, veio substituir o anterior Código de Caça (de 1943) e trouxe, logo em seu art. 1 o , a imposição de que os animais silvestres são propriedade do Estado, ou seja, pertencem à União. O mesmo artigo, ainda, estabeleceu proibição da “utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha” de animais silvestres, condutas doutrinariamente conhecidas como “atos de caça”. Posteriormente, a rigorosa Lei nº 7.653/88 veio a classificar tais condutas como crime inafiançável.
  • 8. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 156 Uma questão na época discutida, quanto à aplicação da Lei nº 5.197/67, era a compreensão do vocábulo “utilização”. Para a mais restrita interpretação, a conduta criminosa de utilização consistia em fazer uso do animal da fauna silvestre com o objetivo de obtenção de real vantagem, como conseqüência da prática da caça propriamente dita, excluindo-se da tipificação legal a conduta de simples mantença a propósito de estimação. Nesse entendimento, não praticaria crime quem mantivesse um papagaio, uma arara, ou um macaco em seu quintal, na condição de animal de estimação e sim, por exemplo, quem usasse um animal silvestre na condição de “chama”, ou seja, para atrair outros animais a fim de capturá-los, quem expusesse uma arara em estabelecimento comercial a fim de despertar a atenção de transeuntes para o interior de seu comércio, quem mantivesse um papagaio ou um macaco preso a um realejo para fazer sorteio de bilhetes vendidos ao público, ou, ainda, um artista que exibisse uma onça-pintada, utilizando-a em seu espetáculo. A corrente mais radical, no entanto, entendia que a própria relação de afetividade desenvolvida pelo homem em relação ao animal silvestre no seu convívio doméstico caracterizava a utilização, eis que o mantenedor dela tirava proveito no que diz respeito ao seu equilíbrio emocional, aliado ao fato de que, exercendo a posse injusta de propriedade da União, mantinha irregularmente o animal como se doméstico fosse e, portanto, indevidamente integrado ao seu patrimônio. Com o passar do tempo, a primeira interpretação acabou por se revelar mais coerente e a maioria absoluta dos julgados veio confirmar a posição de que a mantença de animais silvestres em cativeiro a propósito de estimação não configurava crime sob a forma de utilização, nos termos da Lei nº 5197/67. 2 Condicionou-se, então, no âmbito da fiscalização, a interpretação de que a conduta “utilização” é configurada em razão da obtenção de real vantagem por parte do agente que tem por instrumento, ou meio, o animal silvestre, compreendendo-se atípica a prática de simples mantença do animal silvestre para o propósito de estimação. 2 TRF 3a Região – 1a T. – AC – Rel. Ramza Tartuce – DJU 22.03.1994 – RJ 200/131; TRF 1a Região – 3a T. – Rec. – Rel. Tourinho Neto – RJ 196/98; TRF 3a Reg., Acr. 03006148/SP, 2a T., relator Juiz Célio Benevides, julgado em 10.12.1996.
  • 9. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 157 5. A CONDUTA DE “MANTENÇA” FACE O ART. 29 DA LEI Nº 9.605/98 A Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 consolidou, em parte, vários textos legais que tratavam de crimes ambientais e, por essa razão, é ela conhecida como “Lei de Crimes Ambientais”. No que se refere à matéria de fauna, não revogou todas as disposições da Lei nº 5.197/67. Dentre os artigos Lei nº 9.605/98 que prevêem condutas criminosas contra a fauna, destaca-se o 29 (não aplicável aos atos de pesca, conforme § 6 o ), que relaciona diversas ações especialmente em seu caput e nos três incisos do parágrafo primeiro. É ele o primeiro de uma série de artigos que integram a Seção I, sob o título “Dos Crimes contra a Fauna”. Traz, basicamente, as ações criminosas de maior incidência na relação de exploração entre o homem e os animais e seguramente é o mais complexo dos artigos da referida lei: “Art. 29: Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida: Pena – detenção de seis meses a um ano, e multa. § 1 o . Incorre nas mesmas penas: I – quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida; II – quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural; III – quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. § 2 o . ...” Detemo-nos no caput e nos três incisos do parágrafo primeiro, do art. 29, para destacar que foram relacionadas condutas anteriormente não consideradas criminosas. O texto legal objetivou claramente alcançar não somente a proteção da
  • 10. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 158 integridade dos animais silvestres, projetada no texto do caput do artigo, mas também a proteção da capacidade de reprodução da fauna (inciso I, do § 1 o ), a proteção da integridade dos ninhos, abrigos e criadouros naturais (inciso II, do § 1 o ) e a restrição da exploração econômica do animal silvestre e de seus subprodutos (inciso III, § 1 o ), mediante imposição de igual sanção penal às práticas criminosas, ou seja, na forma simples, a detenção de seis meses a um ano, além de multa. Observa-se, em princípio, que o caput do art. 29 da Lei nº 9.605/98 manteve basicamente o mesmo conjunto de ações já previstas no art. 1 o da Lei nº 5.197/67, constituindo-se, à evidência, em um aperfeiçoamento da norma legal. Logo, a interpretação da conduta criminosa de “utilizar” é a mesma da lei anterior, qual seja, a obtenção de real vantagem por parte do agente. Poderia o legislador ter suprimido, do caput, a conduta de “utilizar”, vez que a especificou na seqüência, no inciso III, do parágrafo primeiro, em face da predominante circunstância do aproveitamento econômico que caracteriza a utilização, levando em conta que o enfoque desse inciso, conforme observado, é a restrição da exploração econômica do animal silvestre e de seus subprodutos. Confirmam o nítido enfoque da exploração econômica no inciso III, Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas 3 : “O inciso III refere-se ao comércio de espécimes da fauna silvestre, em diversas modalidades, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença, ou autorização da autoridade competente. (...) O tipo penal, agora, utiliza várias formas de conduta (vender, expor à venda, exportar, adquirir, ter em cativeiro ou depósito, utilizar ou transportar). Visou o legislador evitar qualquer tipo de justificativa para o mais condenável dos atos, que é o comércio de animais”. Constata-se, no inciso III, certa semelhança com a seqüência de condutas do art. 12 da Lei 6.736/76, sobre os crimes relacionados ao tráfico de entorpecentes, o que serve como referência para estudo. Objetivando coibir o comércio ilícito de entorpecentes aquele dispositivo apresentava diversas ações semelhantes àquelas que vieram a constar na Lei 9.605/98 para restringir o comércio de espécimes da 3 Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas. Crimes Contra a Natureza. 6a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2000. p. 80.
  • 11. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 159 fauna silvestre e outros bens a ela relacionados (aliás, o comércio ilegal de animais silvestres também é denominado tráfico). O art. 12 da Lei 6.736/76 apresenta, dentre outras, as condutas de vender, expor à venda, exportar, adquirir, guardar, ter em depósito e transportar. A semelhança não é gratuita. O legislador em 1998 teve como evidente referência e fonte de vocabulário a Lei 6.736/76 pois, tal como o tráfico de entorpecentes, o tráfico de animais silvestres passou a representar um desafio para o Poder Público a partir do momento em que se constatou o grave prejuízo que tal prática causava à sociedade. Por ocasião do surgimento da Lei 9.605/98, tinha-se notícia de que, na área dos negócios ilegais, em rota internacional, a venda de animais silvestres somente perdia para o tráfico de drogas e para o comércio de armas, em razão do cálculo de que 10 bilhões de dólares eram movimentados nesse mercado por ano, sendo um décimo desse valor apenas no Brasil. Quando o legislador se propôs a descrever, no inciso III do § 1 o , da Lei 9.605/98, o crime contra a fauna silvestre sob o enfoque da exploração econômica desautorizada, pretendeu abordar de forma ampla (tal como na Lei de Tráfico de Entorpecentes), todas as condutas relacionadas à abominável prática de comércio do precioso bem ambiental. Dentre as condutas do referido inciso, destacam-se duas que podem gerar certa polêmica: guardar e ter em cativeiro ou depósito. Ao inadvertido observador pode parecer que se quis nesse momento coibir a mantença de animais silvestres a propósito de estimação, pois esta é a primeira imagem que vem à mente quando se descreve um animal silvestre “guardado ou mantido em cativeiro”. Sem discordar quanto ao prejuízo ambiental que essa prática comum de fato provoca (na ausência de possível autorização), constata-se que a proibição de tal conduta não é o propósito do dispositivo em questão. Conforme demonstrado, buscou-se no inciso III abarcar todas as formas possíveis de atos de comércio ou atos a ele relacionados, dentre os quais a guarda (doméstica ou não) e a conduta de ter em cativeiro ou depósito (em casa, no quintal ou em qualquer outro local) o bem jurídico em questão com finalidade mercantil e não a simples manutenção do animal para o propósito de estimação.
  • 12. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 160 Exemplo de criminosa guarda doméstica de espécime (ou espécimes) da fauna silvestre é a conduta do cidadão que possui em seu quintal um viveiro onde guarda, sem licença, canários-da-terra, pintassilgos e araçaris para serem negociados com sua vizinhança, ou com qualquer pessoa que a ele recorra para adquirir, mediante pagamento, um desses pássaros. O seu propósito evidentemente não é a manutenção para a estima, pois aquele que mantém um animal a propósito de estimação (doméstico ou silvestre), não o aliena; pelo contrário, esforça-se por mantê-lo sob seus cuidados em virtude do vínculo afetivo que se estabeleceu entre ele (o mantenedor) e o animal de estimação. Cabe, aliás, a observação da sutil diferença da aplicação dos verbos “ter" e “manter” no texto legal. Mesmo não constituindo propriedade particular, o animal silvestre nas mãos do comerciante irregular é tratado como objeto de venda, sendo negociado tal como um eletrodoméstico. Já nas mãos do mantenedor, a título de estimação, o animal silvestre é destinatário de um esforço pessoal daquele, que se sente responsável pela manutenção de sua vida, e mesmo de seu bem estar. Ao contrário do comerciante, o mantenedor não deseja desfazer-se do animal e sim preservá-lo. Sob os cuidados do mantenedor, o animal desempenha uma função que vai muito além do benefício produzido por um simples objeto; por isso é mantido como forma de vida. 6. A GUARDA DOMÉSTICA E A HIPÓTESE DE PERDÃO JUDICIAL Ainda no complexo art. 29, da Lei 9.605/98, verifica-se: “§ 2 o . No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena”. A Lei, nesse momento, apresenta imprecisão. Correto seria o uso do vocábulo “espécimes” e não espécie, que foi equivocadamente empregado. Isso porque, sendo a espécie o conjunto de animais existentes identificados por características semelhantes, que os qualificam como componentes de um mesmo grupo, evidentemente é quase impossível alguém conseguir guardar em casa, ou em seu quintal, todo esse conjunto de animais. Talvez o legislador buscasse transmitir a idéia de número não definido de animais guardados (um ou mais); nesse
  • 13. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 161 sentido, porém, deveria ter utilizado a expressão “espécime ou espécimes” e esta parece ser a compreensão mais adequada para o que indica o dispositivo legal. Na seqüência da interpretação do art. 29, deduz-se que se o infrator for surpreendido guardando em sua residência ou quintal (guarda doméstica) espécime da fauna silvestre, no sentido da guarda já abordada no inciso III, do § 1 o - ou seja, com propósito mercantil - poderá o juiz deixar de aplicar a pena correspondente, considerando as circunstâncias do caso concreto, desde que o animal não integre espécie ameaçada de extinção. Por uma questão de lógica, o § 2 o só pode ser relacionado à conduta prevista no inciso III, do § 1 o (guarda com finalidade comercial), pois em nenhum outro momento, no art. 29, foi utilizado o vocábulo “guarda”, mesmo diante de extensa e minuciosa descrição de atos lesivos ao bem ambiental “fauna” verificada nesse artigo. A resposta proporcional ao menor potencial de lesividade da conduta em relação ao meio ambiente é a razão da ressalva. O infrator individualmente identificado que responde criminalmente pela guarda doméstica de animal ou animais silvestres (para fins de comércio), pode ser beneficiado com o perdão judicial, pois, agindo no âmbito de suas relações particulares, dá causa a prejuízo ambiental não tão grave (quando o objeto de sua empreitada não integra espécie ameaçada de extinção) quanto àquele decorrente da atividade de verdadeiras organizações comerciais clandestinas que promovem tráfico de animais silvestres em quantidades e proporções incalculavelmente superiores, especialmente dirigido a compradores que se encontram fora dos pais. Outrossim, a quantidade de espécimes presentes em determinado ambiente doméstico, além do espaço em que são guardados e a própria forma como são tratados, pode evidenciar o propósito mercantil. Em princípio, quem mantém animais a título de estimação o faz, normalmente, em relação a um, dois, ou três espécimes no máximo, e estes quase sempre se encontram muito bem cuidados. Ao contrário, o particular que pretende auferir lucros, por menor que seja a expectativa de ganho, normalmente guarda ou tem em depósito, para si ou para outrem, no seu ambiente doméstico, vários espécimes (salvo os casos de espécies raras), ou seja, detém uma quantidade suficiente para que as eventuais perdas do objeto de comercialização - próprias da guarda em cativeiro -, não constituam obstáculo para a obtenção de vantagem pecuniária advinda de suas transações; o bem estar desses animais é o que menos importa ao comerciante irregular, nos limites de sua residência.
  • 14. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 162 Não é coerente, outrossim, relacionar a hipótese de perdão judicial com as condutas do caput do art. 29: "matar, perseguir, caçar, apanhar ou utilizar", mesmo levando-se em conta que o benefício legal está consubstanciado em um dos parágrafos do referido artigo (§ 2 o ). O vocábulo “guarda” não se coaduna com qualquer das condutas relacionadas no caput, que são doutrinariamente classificadas como atividades próprias de caça. Quando muito, em relação a essas condutas, a referida “guarda doméstica” poderia ser associada ao ato de “utilizar”; porém, se tal fosse o propósito, para a hipótese de perdão judicial a Lei teria empregado a expressão “utilização doméstica” de animal silvestre e, ainda assim, haveria ser observado que a jurisprudência entende, de longa data, que somente se configura a utilização quando verificada a obtenção de real vantagem, não sendo nela compreendida a simples mantença de animal a propósito de estimação. 7. A QUESTÃO ECONÔMICA NA PRESERVAÇÃO DAS ESPÉCIES O acesso particular ao animal integrante da fauna doméstica não é difícil, pois este se reproduz normalmente em cativeiro. Já os animais integrantes de espécies silvestres, que vivem naturalmente livres no meio selvagem, não se reproduzem com a mesma facilidade quando submetidos ao cativeiro; faz-se necessário um longo período de adaptação, o que acaba impondo a domesticação do espécime e o inevitável aparecimento de transformações de ordem física e comportamental observadas nas gerações seguintes, nascidas em criadouro. Existe nesse ponto uma questão de ordem econômica a ser solucionada: espécimes integrantes da fauna silvestre, legalmente comercializados, custam muito mais porque são raros; são raros porque não se reproduzem com a mesma facilidade que os domésticos no cativeiro; não podem ser retirados do meio natural (caçados), para aproveitamento por clara disposição legal; e, finalmente, o valor alcançado na venda de espécimes silvestres raros no mercado clandestino é incentivo ao tráfico ilegal - nacional e internacional - e à caça proibida que o abastece. Por outro lado, a fascinação das pessoas pelos animais silvestres em razão do seu caráter exótico, exatamente porque é raro, faz com que sua procura seja grande, inversamente proporcional a quantidade de espécimes legalmente disponíveis.
  • 15. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 163 Não defendemos a propriedade privada do animal silvestre, mas sim a plena possibilidade de seu aproveitamento comercial e privado, inclusive como forma de garantir a continuidade das espécies. Permitindo e viabilizando o aproveitamento privado do animal silvestre, mediante expedição de instrumentos públicos competentes, o Estado promove indiretamente a perpetuação das espécies em razão do aumento do número de animais procedentes de cativeiro legalizado, o que diminui a pressão sobre os animais que se encontram no meio selvagem. Estes instrumentos encontram-se previstos nas leis de proteção da fauna, a exemplo do inciso III, do § 1 o , do art. 29, da Lei 9605/98, classificados em três espécies: a permissão, a licença, ou a autorização. Além da permissividade do aproveitamento econômico da fauna silvestre, o incentivo público direcionado à iniciativa privada, nessa disposição, deve ser suficiente para compensar as maiores dificuldades encontradas para reprodução de espécimes da fauna silvestre em cativeiro e desestimular o aproveitamento privado ilegal. Ao mesmo tempo em que o Poder Público incentiva o surgimento de criadouros legalizados, deve intensificar o combate à caça e ao comércio ilegal de espécimes silvestres. Como reflexo da gestão racional dos bens ambientais, que já tem sido observada no Brasil, está cada vez mais acessível, por exemplo, alimentar-se de carne de animais silvestres tais como capivara e jacaré, sem infração aos dispositivos legais de proteção à fauna, ou adquirir um papagaio ou uma arara, para fins de estimação, nascidos em criadouro legalizado. Suprindo-se a carência do mercado com espécimes reproduzidos em cativeiro, é possível, com o trabalho de fiscalização e combate à caça e ao tráfico, preservar efetivamente os espécimes remanescentes da vida selvagem e todas as suas qualidades físicas e comportamentais. Enfim, diante do processo de evolução das espécies animais, em futuro não muito distante, o papagaio que encontrarmos nos poleiros dos quintais (espécie que hoje representa mais da metade dos animais silvestres possuídos irregularmente), pertencerá a uma espécie doméstica, assim legalmente reconhecida, e será reproduzida em quantidade e preços compatíveis com a expectativa da sociedade quanto ao seu aproveitamento privado. Tal mudança, com efeito vislumbrada pela gestão racional dos bens ambientais, constituirá a própria garantia de que a espécie equivalente, no meio selvagem, será perpetuada junto às áreas verdes com todas as sua características físicas e comportamentais originais.
  • 16. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 164 8. A CONDUTA DE MANTENÇA NA ESFERA ADMINISTRATIVA Em que pese a mantença de animais silvestres não ser tipificada na Lei dos Crimes Ambientais, conforme interpretação apresentada, verifica-se que o cidadão que possui um animal silvestre em casa para o fim de estimação, ainda que bem cuidado, porém sem autorização, encontra-se objetivamente em situação irregular. A repressão da posse injusta, nessa circunstância deverá ser efetivada por via administrativa, pois, na verdade, a responsabilização penal é o último mecanismo de controle do Poder Público para coibir os atos prejudiciais à vida em sociedade, sendo ela destinada às condutas mais gravosas tais como a caça proibida e o comércio ilegal de animais silvestres que trazem incalculável prejuízo ao equilíbrio ecológico. O § 3 o , do inciso VII, do art. 225, da Constituição Federal, estabelece que “as condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Já o Decreto nº 3.179/99 (federal) regulamenta a aplicação das sanções às infrações ambientais, na esfera administrativa, dispondo em seu art. 1 o : “toda a ação ou omissão, que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente é considerada infração administrativa ambiental e será punida com as sanções do presente diploma legal, sem prejuízo da aplicação de outras penalidades previstas na legislação”; na seqüência, especifica as sanções às infrações administrativas que vão desde advertência, até a reparação dos danos causados. A sanção administrativa que pode coibir, com sucesso, a posse injusta do animal silvestre, nos termos do inciso II, do art. 2 o , do Decreto nº 3.179/99, é a multa. Verifica-se bom exemplo desse mecanismo de combate à infração administrativa ambiental aplicado com êxito pelos órgãos de fiscalização em relação ao exercício de pesca profissional ou de pesca amadora sem as licenças específicas para tais atividades. Da mesma forma que o exercício da pesca, que é autorizada mediante licença expedida pelo órgão público competente (Ibama), para o aproveitamento privado de recursos da fauna ictiológica, a posse justa do animal silvestre, para o propósito de estimação, é obtida mediante instrumento público permissivo, no caso de animal oriundo de criadouro legalizado. Ainda na comparação com as regras proibitivas e permissivas no que diz respeito à pesca, observa-se que o
  • 17. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 165 aproveitamento irregular da fauna ictiológica pode também constituir crime, como por exemplo, a pesca em período proibido ou em lugares interditados por órgão competente e a pesca mediante uso de explosivos ou substâncias tóxicas (respectivamente arts. 34 e 35, da Lei 9.605/98). No Estado de São Paulo, a Resolução nº 27/90, alterada pela Resolução nº 82/98, da Secretaria do Meio Ambiente, baixada com fundamento nos incisos VI e VII, do art. 23 e no inciso VI, do art. 24, da Constituição Federal (que estabelece a competência de cada ente da Federação) especificou os enquadramentos administrativos para imposição do Auto de Infração Ambiental. Ocorre que dentre as atividades irregulares listadas não foi prevista a mantença, manutenção ou posse injusta de animal silvestre para o propósito de estimação, mesmo após a atualização do seu texto, mediante Resolução SMA-82/98. Dos enquadramento existentes, o que mais se aproxima é o da “utilização”, porém, conforme já amplamente discutido, o aproveitamento privado na modalidade “mantença a propósito de estimação” não caracteriza a utilização. Portanto, a matéria necessita ser regulamentada, a exemplo do texto da referida Resolução para que seja possível uma atuação preventiva e eficaz, mediante fiscalização do aproveitamento privado do recurso ambiental fauna silvestre, na modalidade estudada, reconhecida a falta de tipicidade no âmbito criminal. E o Estado federado tem competência para tanto, ou seja, para legislar sobre fauna, dentre outros bens ambientais, desde que evidentemente não se estabeleçam conflitos com a legislação federal em vigor, conforme estabelecido na própria Constituição Federal (art. 24, inciso VI). 9. CONCLUSÕES Não se pode desconsiderar a realidade do exercício irregular da mantença de animais silvestres a propósito de estimação. É preciso analisar as origens históricas e estudar os aspectos culturais de tal conduta, buscando-se soluções legais que viabilizem uma compatibilização entre o necessário equilíbrio ecológico do ambiente e a natural aproximação entre o homem e espécimes da fauna silvestre. O exemplo do papagaio é bem ilustrativo da questão da mantença de animal silvestre a propósito de estimação no Brasil. A sociedade de uma forma geral insiste
  • 18. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 166 em manter no meio doméstico um animal silvestre, por suas qualidades sem similar, apesar do caráter irregular de tal conduta quando desprovida do instrumento legal permissivo; não obstante, impõe-se a necessidade de preservar os espécimes selvagens remanescentes nas áreas protegidas. Como solução, surgem criadouros devidamente legalizados, porém, ainda sem capacidade para atender à demanda, em razão da pouca oferta e do preço elevado do seu produto. Há que ser observado que a sanção deve ser sempre proporcional a lesividade imposta ao meio ambiente, como conseqüência da irregular intervenção humana no bem público especialmente protegido. Por isso a sanção administrativa de multa é a mais coerente para a repressão da mantença irregular e os órgãos de fiscalização devem possuir instrumentos para a sua imposição, sendo esta a melhor solução para o problema apresentado. Tal como ocorre na fiscalização dos atos de pesca, quem for surpreendido em ato de mantença de animal silvestre a propósito de estimação, sem estar legalmente licenciado, poderá ter a descrição de sua conduta lançada em Auto de Infração Ambiental, recebendo sanção de multa com valor suficiente para desestimular a conduta, ou seja, um valor maior do que o preço de um animal silvestre similar oriundo de criadouro legalizado; isso, evidentemente, conforme regulamentação da matéria na esfera administrativa. Por outro lado, caso seja constatada a prática criminosa (por exemplo maus tratos, comércio ilegal, utilização etc.), o procedimento deverá ser outro, qual seja, a prisão em flagrante delito do infrator ou a elaboração do Termo Circunstanciado (para os crimes com rito processual estabelecido na Lei nº 9.099/95), em razão das disposições da Lei 9.605/98. Finalmente, quanto a difícil questão da apreensão do animal, valem algumas considerações. Se há ilegalidade na conduta do possuidor, na esfera penal ou administrativa, o animal deve ser apreendido em face de dispositivo legal; porém, na prática, a retirada do animal do meio doméstico em que já se encontra adaptado pode representar a sua morte e, portanto, um prejuízo ambiental ainda maior do que aquele que, em tese, já teria ocorrido em razão de sua ausência no meio natural. Solução viável que se apresenta é a de designar como depositário fiel do animal o próprio mantenedor, que até então vinha exercendo sobre ele a posse
  • 19. A mantença de animal silvestre a propósito de estimação Revista do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos, ano 3 – n. 5, jul. / dez. 2001 Página 167 injusta, desde que verificadas condições e circunstâncias adequadas para tal designação. Como a legislação específica não impõe restrição a essa forma de depósito na esfera administrativa e enfrenta-se grande dificuldade quanto à colocação de animais silvestres apreendidos em entidades especializadas, conclui- se que ela é a melhor alternativa para o problema da destinação do espécime apreendido em decorrência de infração administrativa do possuidor, quando constatado que o animal está bem cuidado e não pertence à espécie ameaçada de extinção. No caso de apreensão em decorrência de prática de crime, porém, não será possível o depósito, por falta de previsão legal, em vista do que dispõe taxativamente o § 1 o , do art. 25, da Lei 9605/98. BIBLIOGRAFIA FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1996. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2000. FREITAS, Wladmir Passos de, e outro. Crimes Contra a Natureza. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. MASCARENHAS PRADO, Alessandra Rapassi. Proteção Penal do Meio Ambiente – Fundamentos. São Paulo: Atlas, 2000. MCFETRIDGE, Donald G. e outros. Economia e Meio Ambiente, a Reconciliação. Porto Alegre: Ortiz. 1992. PRADO, Luiz Regis Prado. Crimes Contra o Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.